INSTITUTO ESTADUAL DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO DE MINAS GERAIS
GUIA DE BENS TOMBADOS IEPHA/MG
62
BELO HORIZONTE
Acervo IEPHA/MG
Automóvel Clube
Fig. 1 – Edifício do Automóvel Clube de Minas Gerais situado à avenida Afonso Pena, nº 1394, em Belo Horizonte
O imóvel foi tombado por meio do Decreto Estadual nº. 27.927 de 15 de março de 1988 e abrange o prédio sede o Automóvel Clube e respectiva área de terreno, à Avenida Afonso Pena, nº. 1.394, e foi inscrito no Livro de Tombo nº. II, do Tombo de Belas Artes e no Livro de Tombo nº. III, do Tombo Histórico, das obras de Arte Históricas e dos Documentos Paleográficos ou Bibliográficos.
O
edifício do Automóvel Clube de Minas Gerais é um ícone da arquitetura eclética da capital mineira e objeto representativo das primeiras construções da implantação da cidade. A construção está ligada ao crescimento em todo o mundo dos chamados clubes privados, no final do século XIX e início do XX. Tais agremiações pautavam-se pelo caráter social e reuniam membros de destaque da sociedade. A história do Automóvel Clube em Belo Horizonte se inicia em 17 de dezembro de 1925, quando um grupo de nove homens da sociedade belorizontina funda o Clube Central. O objetivo dos idealizadores era desenvolver a prática do automobilismo no estado de Minas Gerais, além de reunir interessados em um ambiente agradável que proporcionasse o entretenimento entre os membros. O estatuto do Clube intencionava ações como a melhoria e conservação da malha rodoviária, o fomento da indústria de automóveis e acessórios, a criação de um autódromo e a realização de festas e eventos.
247
GUIA DE BENS TOMBADOS IEPHA/MG
AUTOMÓVEL CLUBE
Fig. 2 – Automóvel Clube de Minas Gerais na década de 1980
Acervo IEPHA/MG
Acervo IEPHA/MG
Em 1926, já em pleno funcionamento, a agremiação inaugurou a sua primeira sede que ficava no Palacete Dantas, na Praça da Liberdade1. Um ano após a inauguração, em 1927, a denominação do clube foi alterada para Automóvel Clube de Minas Gerais, e filiado ao Automóvel Clube do Brasil. O médico e memorialista Pedro Nava relembrou o episódio da fundação, em seu livro Beira–mar. Segundo o escritor, o “Automóvel Clube, fundado a 19 de dezembro de 1925 só foi inaugurado a 11 de junho de 1926 com um grandioso baile.” 2. Nesse período, a prosperidade da associação era grande, o que tornou necessária a construção de uma sede própria e definitiva. Assim, nesse mesmo ano de 1926, através de uma permuta legal com a prefeitura, foi adquirido o terreno, com área de 790m2, localizado no cruzamento das Avenidas Afonso Pena e Álvares Cabral, junto ao Palácio da Justiça. De acordo com a escritura lavrada em 26 de agosto de 1926 foi concedido o prazo de três anos para concluir o futuro edifício.3 O projeto escolhido, entre as oito propostas apresentadas, foi o do arquiteto Luiz Signorelli e seguia a sugestão da diretoria do clube composta por “linhas sóbrias, conjunto majestoso, tendo em vista a commoda e ampla disposição de todas as installações necessárias”. Segundo o jornal da época, a construção seguia o estilo Luiz XIV e, no projeto, nenhum detalhe foi esquecido, quer sobre o ponto de vista estético, quer sobre o ponto de vista do conforto.4 O novo espaço foi totalmente planejado com a intenção de promover o encontro da elite de Belo Horizonte em um ambiente apropriado para o glamour. Intenção percebida primeiramente na arquitetura do prédio e, posteriormente, na elegância da decoração interna de seus salões. A construção, iniciada em 1927, ficou a cargo da Firma Carneiro de Rezende e Companhia que, em pouco tempo, ergueu os quatro pavimentos da obra. Em 1928, as notícias eram de que o edifício estava praticamente concluído.5 Assim, a nova sede do Automóvel Clube de Minas Gerais foi inaugurada em 17 de dezembro de 1929 com uma grande e luxuosa festa que contou com a presença da elite mineira, incluindo intelectuais e políticos.
Fig. 3 – Fachada do Automóvel Clube, década de 1940
O Automóvel Clube consolidou-se, ao longo dos anos, como um espaço de referência para a elite, e cada vez mais, os bailes, promovidos em seu interior, passaram a fazer parte do cotidiano da cidade. Eram comuns os festejos e banquetes em homenagem a figuras ilustres, bem como eventos para reunir os associados. Entre os sócios, além da elite mineira, figuravam políticos como Juscelino Kubitschek, Tancredo Neves e Oswaldo Pieruccetti. Entre os bailes e recepções promovidos e abrigados pelo Automóvel Clube de Minas Gerais, destaca-se o realizado em 1931 quando o Clube recepcionou o Príncipe de Gales, Eduardo e seu irmão Albert, futuro rei George VI da Inglaterra. O evento teve repercussão internacional e, em homenagem a visita, foi instalada uma placa no salão, que ficou conhecido como Salão Príncipe de Gales. Na placa estão os dizeres: “SS. AA. RR. Britânicas, o Príncipe de Gales e o Príncipe George, honraram o Automóvel Clube de Minas Gerais com suas presenças no baile do dia 04 de abril de 1931.” 6 Pedro Nava registrou o episódio em suas memórias, revelando um tom menos glamouroso na visita da realeza britânica em terras mineiras. Nava recorda-se que: Também em roupas de verão imaculadas vi descerem em nossa estação Eduardo de Windsor, Príncipe de Gales, e seu irmão Jorge, o futuro Duque de Kent. (...). Vi-os também entrando no Automóvel Clube, já bem altos, quebrando o protocolo, cada qual dum lado e dando o braço ao Presidente Olegário Maciel. (...) Era o grande baile dado em sua honra. 7 1
O Estado de Minas Gerais, 9 março de 1928. Atualmente o Palacete Dantas é um imóvel tombado pelo IEPHA/MG, conferir fascículo 13 NAVA, Pedro. Beira-mar. São Paulo: Ateliê Editorial: Giordano, 2003. p.358. Existe um equivoco na data apresentada por Nava, a data de criação do Automóvel Clube de Minas Gerais foi 17 de dezembro de 1925. IEPHA/MG – Processo de Tombamento do Automóvel Clube de Minas Gerais. Belo Horizonte, 1988. 4 O Estado de Minas Gerais, 9 março de 1928. 5 O Estado de Minas Gerais, 9 março de 1928. 6 Em 1931, o Príncipe de Gales, Eduardo, era o primeiro na linha de sucessória da coroa inglesa. Com a morte de seu pai, George V, em 1936, Eduardo tornou-se o rei Eduardo VIII. Todavia, menos de um ano depois, abdicou de seus privilégios para se casar com uma plebeia e o seu irmão Albert assumiu o trono, tornando-se George VI. 7 NAVA, Pedro. Beira-mar. São Paulo: Ateliê Editorial: Giordano, 2003. p.307. 2
248
3
GUIA DE BENS TOMBADOS IEPHA/MG Acervo IEPHA/MG
AUTOMÓVEL CLUBE
APCBH/SMARU
Fig. 4 – Detalhe da Fachada do Automóvel Clube
APCBH/SMARU
Fig. 5 – Detalhe da assinatura de Angelo A. Murgel no projeto da pérgola em 1934
Fig. 7 – Detalhe do vitral no interior do edifício 8
Acervo IEPHA/MG
Acervo IEPHA/MG
Fig. 6 – Detalhe da assinatura de Luis Signoreli no projeto de ampliação e modificação em 1951
As atividades sociais do clube foram intensas, nas referências coletadas durante anos pelo historiador Hélio Gravatá é possível verificar, por exemplo, várias homenagens feitas ao poeta Carlos Drummond de Andrade. Entre elas há o registro do banquete por motivo da publicação de seu livro “Alguma Poesia”, que contou com discursos de Milton Campos, do próprio Carlos Drummond de Andrade e Cavalcante Freitas. 8 De acordo com a documentação existente no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte – APCBH, em 1934, foi contratado o projeto do escritório de Angelo A. Murgel, localizado na rua Rio de Janeiro 385, na capital mineira, para a construção de uma pérgola para cobrir o terraço da edificação (Fig. 5). Aparentemente a intervenção durou pouco tempo, pois alguns anos mais tarde, na década de 1950, Luis Signoreli foi novamente chamado para elaborar o projeto de ampliação e modificação do edifício (Fig. 6), e na oportunidade foi construído mais um pavimento na edificação. Em relação ao imóvel, de acordo o dossiê de tombamento elaborado pelo IEPHA/MG em 1988, a edificação, implantada na esquina das avenidas Afonso Pena e Álvares Cabral, possui um partido arquitetônico quadrangular com quatro pavimentos, o que proporciona volumetria compacta e imponente. As fachadas possuem a mesma composição e sua confluência arrematada em chanfros arredondados. O tratamento ornamental é expressivo com forte influência do repertório neoclássico. No interior, conserva-se ainda elementos ornamentais da época de sua construção tais como vitrais, elementos decorativos em estuque, em madeira e mármore entre outros. Conserva também rico acervo em bens móveis como peças de mobiliário, lustres, pratarias, pinacoteca, espelhos, porcelanas, cristais e tapetes.
Fig. 8 – Detalhe da fachada do Automóvel Clube
Os documentos coletados pelo pesquisador Hélio Gravatá estão reunidos no Arquivo Publico de Minas Gerais – APM, com a denominação Plataforma Hélio Gravatá. Ver: www.siaapm.cultura.mg.gov.br
249
GUIA DE BENS TOMBADOS IEPHA/MG
AUTOMÓVEL CLUBE
Fig. 9 – Salão Nobre
Acervo IEPHA/MG
Acervo IEPHA/MG
A agremiação conta atualmente com os seguintes ambientes: hall de entrada e Salão de Música, no primeiro piso, Salão Dourado e o Salão Príncipe de Gales, no segundo piso; Salão Verde, Salão Privé e Salão Bridge, no terceiro piso e Salão de Televisão, Sala de Leitura e Salão de Sinuca, no quarto piso. Ao longo dos anos, o Automóvel Clube de Minas Gerais se tornou uma referência no ambiente social da cidade. Sua importância cultural e sua elegância arquitetônica fizeram com que o prédio fosse tombado de pelo IEPHA/MG em 1988.
Fig. 10 – Vista interna do Automóvel Clube
Luis Signorelli Natural de Cristina, Sul de Minas, Luís Signorelli formou-se em Arquitetura pela Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, em 1925. Além de fundador e organizador da Escola de Arquitetura da UFMG, foi seu primeiro diretor. Entre 1930 e 1938, assinou projetos de autoria de Raffaello Berti, que se encontrava impedido de assiná-los, devido a sua condição de imigrante não-naturalizado. Entre esses se incluem os prédios da Prefeitura Municipal e da antiga Feira Permanente de Amostras. Dentre os projetos de Signorelli destacam-se os prédios das antigas secretarias de Agricultura e de Segurança Pública, da sede do Automóvel Clube, da Casa da Família Falci, da casa paroquial da Igreja da Boa Viagem e do prédio do atual Museu Mineiro.9
Autoria: Luis Gustavo Molinari Colaboração: Hugo Mateus Gonçalves Rocha Setembro, 2011 INDICAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS: NAVA, Pedro. Beira-mar. São Paulo: Ateliê Editorial: Giordano, 2003. p. 469. IEPHA/MG – Processo de Tombamento do Automóvel Clube de Minas Gerais. Belo Horizonte, 1988. DICIONÁRIO BIOGRÁFICO DE CONSTRUTORES E ARTISTAS DE BELO HORIZONTE: 1894/1940. Belo Horizonte: IEPHA/MG, 1997.
9
250
DICIONÁRIO BIOGRÁFICO DE CONSTRUTORES E ARTISTAS DE BELO HORIZONTE: 1894/1940. Belo Horizonte: IEPHA/MG, 1997.