Petição

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JOSÉ ROBERTO BATOCHIO ADVOGADOS ASSOCIADOS

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 13ª VARA CRIMINAL FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE CURITIBA/PR

"El juicio es un mecanismo delicado como un aparato de relojería: basta cambiar la posición de una ruedecilla para que el mecanismo resulte desequilibrado e comprometido".1

Ação Penal n.º 5046512-94.2016.4.04.7000/PR LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e MARISA LETÍCIA LULA DA SILVA, já qualificados nos autos da ação penal em epígrafe, vêm, por seus advogados infra-assinados, à presença de Vossa Excelência, respeitosamente, expor e requerer o que segue. I. NÃO RECONHECIMENTO DA COMPETÊNCIA E DA LEGITIMIDADE DO JUÍZO Primeiramente, necessário salientar que os Peticionários não reconhecem a competência do Juízo da 13ª Vara Criminal de Curitiba para a condução e julgamento do presente feito, pois ainda estão sub judice exceções de suspeição e incompetência opostas pela Defesa.

1

CARNELUTTI, Francesco. Derecho Procesal Civil y Penal, México: Episa, 1997, p. 342.


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II. A INICIATIVA PROBATÓRIA DO JUÍZO Outrossim, em 23.11.2016, Vossa Excelência, agindo de ofício na instrução do presente feito, requisitou à 10ª Vara Federal de Brasília/DF informações acerca da fase atual de ações penais que tramitam perante aquele Juízo em desfavor do Primeiro Peticionário, bem como o encaminhamento de cópia das respectivas denúncias (evento 264).

Em resposta, a 10ª. Vara Federal de Brasília/DF encaminhou a este Juízo informações processuais a respeito de duas ações penais que lá tramitam em desfavor do Primeiro Peticionário, bem como cópia da denúncia e do aditamento referente à ação penal n.º 0042543-76.2016.4.01.3400 e, ainda, cópia da denúncia referente à ação penal n.º 16093-96.2016.4.01.3400 (evento 278).

No

entanto,

data

venia,

tais

documentos

devem

ser

desentranhados, (i) seja porque ferem o sistema acusatório, (ii) seja porque não encontram ligação com o objeto da presente ação penal.

Senão, vejamos. III. DA VIOLAÇÃO AO SISTEMA ACUSATÓRIO E DE MAIS UM ATO QUE DEMONSTRA AGIR O JUIZ NO PAPEL DE ACUSADOR

De longa data o Peticionário demonstra que Vossa Excelência perdeu a necessária imparcialidade para julgá-lo. Nessa linha, eis alguns fatos que foram devidamente comprovados: (i) buscas e apreensões na residência e escritório do Primeiro Peticionário e de seus familiares, com fundamentação destoante das disposições legais de regência e antecipação de juízo de valor sobre os fatos postos em controvérsia; (ii) sua condução coercitiva sem prévia intimação, com manifesta infringência ao disposto no artigo 260 do Código de Processo Penal; (iii) determinação da interceptação telefônica dos terminais de titularidade do Primeiro Peticionário, familiares e advogados, com afronta às regras da Lei n.


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9.296/96 e à garantia constitucional da inviolabilidade das comunicações (CF/88, artigo 5º, XII); (iv) monitoramento da estratégia da defesa técnica, em afronta aberta ao princípio maior da ampla defesa (CF/88, artigo 5º, LV) e do livre exercício da própria advocacia; (v) ilícito levantamento do sigilo de diálogos interceptados e gravados, decisum que, sobre ser ilegal, denota fins estranhos ao processo; (vi) usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal ao divulgar e fazer juízo de valor sobre diálogos mantidos com autoridades detentoras de foro especial por prerrogativa de função na Corte Excelsa; (vii) exteriorização de juízo de condenação preconcebida ao prestar informações ao STF; (viii) confissão expressa da ilegalidade por si próprio cometida, com subsequente pedido de escusas ao STF; (ix) infinitas e sucessivas prorrogações de competência, com dedicação exclusiva de Vossa Excelência à cognição dos feitos relativos à Operação "Lava-Jato", em afronta ao artigo 5º, XXXVII, da Constituição Federal; (x) proximidade com setores da imprensa, que promovem o vazamento sistemático de atos processuais e dados pessoais do Peticionário; (xi) participação em eventos organizados por inimigos políticos que se opõem ao Primeiro Peticionário, hostilizando-o; (xii) edição de 03 (três) livros que tem por tema a pessoa de Vossa Excelência e a Operação "Lava-Jato" — com a presença do magistrado em pelo menos um dos lançamentos, corroborando o conteúdo da obra inclusive em relação às acusações feitas ao Primeiro Peticionário; (xiii) pessoal, direto e completo envolvimento nos atos da fase investigatória, a contaminar sua imparcialidade para decidir a causa. (xiv) antecipação de juízo de valor condenatório em decisão que recebeu a denúncia que deflagrou a ação penal.

Não bastasse, os fatos que demonstram a ausência de um julgamento justo e imparcial para os Peticionários se avolumam a cada dia. A própria condução das audiências de instrução também serve para corroborar esse cenário, máxime quando Vossa Excelência acusa a Defesa de atuar de forma “retórica” e “sem argumentos”.


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Como exposto acima, desta feita, a Defesa se depara com iniciativa probatória de Vossa Excelência ao requisitar informações e cópia de ações penais que tramitam perante a 10ª. Vara Federal de Brasília.

Essa situação, à toda evidência, colide com o sistema acusatório adotado pelo direito pátrio.

De fato, a despeito de o art. 156 do Código de Processo Penal possibilitar a produção de provas de ofício pelo Magistrado, tem-se que tal possibilidade fere de morte o sistema acusatório, atribuindo a este verdadeiro papel inquisitorial, contrariando o disposto na Constituição da República (art. 129, I).

A assunção dos papéis de julgador e de investigador pelo magistrado é incompatível, pois afeta a necessária – e imprescindível – imparcialidade do juiz.

A esse respeito, luminosa a percepção de AURY LOPES JR.: "Fica evidente a insuficiência de uma separação inicial de atividades se, depois, o juiz assume um papel claramente inquisitorial. O juiz deve manter uma posição de alheamento, afastamento da arena das partes, ao longo de todo o processo. Deve-se descarregar o juiz de atividades inerentes às partes, para assegurar sua imparcialidade. Nesse contexto, o art. 156 do CPP funda um sistema inquisitório, pois representa uma quebra da igualdade, do contraditório, da própria estrutura dialética do processo. Como decorrência, fulminam a principal garantia da jurisdição, que é a imparcialidade do julgador. Está desenhado um processo inquisitório." (destacou-se)2

Com a maestria que lhe é habitual, também lecionou NEREU GIACOMOLLI, destacando, igualmente, que a iniciativa probatória judicial culmina o processo inquisitivo: "Parte-se do devido processo, engendrado pela convencionalidade e constitucionalidade, razão de ser da delimitação funcional dos sujeitos no processo penal. Montero Aroca afirma que o denominado processo inquisitivo 2

LOPES JR. Aury. Bom para quê(m)? Boletim IBCCRIM, ano 188, Julho/2008. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/3684-Bom-para-quem> Acesso em: nov. 2016


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(contraditio in terminis, por não se tratar de processo) nunca foi um verdadeiro processo, não havendo processo se o acusador é, ao mesmo tempo, juiz ou assume poderes materiais, inclusive de realizar prova de ofício. (...) Nesse modelo acusatório incumbe à acusação e não ao magistrado a proposição e a produção da prova condenatória. A única admissibilidade válida é da atuação ex officio do magistrado para garantir e proteger os direitos e a liberdade do imputado, como guardião das liberdades. A função do juiz no processo é analisar a admissibilidade dos meios de prova e da metodologia probatória, avaliando o que for produzido nos autos."3 (destacouse)

Nessa senda, EUGÊNIO PACELLI

DE

OLIVEIRA destaca a violação

não só ao sistema acusatório, mas também à paridade de armas. "Nesse ponto, o princípio acusatório imposto pela Constituição Federal de 1988, no qual foram delimitadas as funções do juiz e as atribuições do Ministério Público, deverá funcionar como um redutor e/ou controlador da aplicação do mencionado dispositivo, em face da imparcialidade que deve nortear a atuação judicial. (...) Falamos, agora, na imparcialidade no que se refere à atuação concreta do juiz no processo, de modo a impedir que este adote postura tipicamente acusatória no processo, quando, por exemplo, entender deficiente a atividade desenvolvida pelo ministério Público. O juiz não poderá desigualar as forças produtoras da prova no processo, sob pena de violação dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, ambos reunidos na exigência de igualdade e isonomia de oportunidades e faculdades processuais."4 (destacou-se)

Nesse sentido, também é o entendimento de GERALDO PRADO: "Quem procura sabe ao certo o que pretende encontrar e isso, em termos de processo penal condenatório, representa uma inclinação ou tendência perigosamente comprometedora da imparcialidade do julgador. Desconfiado da culpa do acusado, investe o juiz na direção da introdução de meios provas que sequer foram consideradas pelo órgão de acusação, ao qual, nestas circunstancias, acaba por substituir. Mais do que isso, o mesmo tipo de comprometimento psicológico objeto das reservas quanto ao poder do próprio juiz iniciar o processo, aqui igualmente se verificará, na medida em que o juiz se fundamentara, normalmente, nos elementos de prova que ele mesmo incorporou ao feito, por considerar importantes para o deslinde da questão, o que afastará da desejável posição de seguro distanciamento das partes e de seus interesses contrapostos, posição esta apta a permitir a melhor ponderação e conclusão."5 (destacou-se)

3

GIACOMOLLI. Nereu José. O devido Processo Penal. São Paulo: Atlas, 2014, p. 181.182 OLIVEIRA, Eugênio Paccelli. Curso de processo penal. São Paulo: Atlas, 2014, p. 338. 5 PRADO, Guilherme. Sistema acusatório: a conformidade constitucional das leis processuais penais. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 137. 4


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Veja-se que, sob o mesmo entendimento, decidira o E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região: “Cabe à acusação, preleciona o jurista Fernando da Costa Tourinho Filho, ´provar a existência do fato e demonstrar sua autoria. Também lhe cabe demonstrar o elemento subjetivo que se traduz por dolo ou culpa. Se o réu goza de presunção de inocência, é evidente que a prova do crime, quer a parte objecti, quer a parte subjecti, deve ficar a cargo da acusação` (Processo Penal. 14.ed. Saraiva: São Paulo, 1993. v. III, p. 213). Assim, não tendo o Ministério Público Federal arcado com o ônus material de provar a imputação penal atribuída ao réu na denúncia, encargo que lhe é conferido pelo art. 156, 1ª parte, do CPP, deve ser reformada a r. sentença condenatória em relação aos crimes dos arts. 334, § 1º, alínea "c", e 288, ambos do CP.” (TRF4, ACR 2005.04.01.009927-8, OITAVA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 10/01/2007) ---------------------------------------------------------------------------------------------PENAL. PROCESSUAL PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ARTIGO 168-A C/C ARTIGO 71, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO ACUSATÓRIO. ARTIGO 156, CAPUT E INCISO II, DO CÓDIGO PENAL. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS DA AUTORIA DELITIVA. ABSOLVIÇÃO. ARTIGO 386, VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. 1. Em face do princípio acusatório que deve reger o processo penal brasileiro, a iniciativa e consequente ônus probatório deve ficar prioritariamente nas mãos das partes e apenas supletivamente nas mãos do órgão jurisdicional. 2. O artigo 156, II, do Código Penal expressa que a determinação, por parte do magistrado, de diligências, antes de proferida a sentença, é permitida nos casos em que se pretende dirimir dúvida sobre ponto relevante, o que não se confunde com substituir a atividade do órgão acusatório, o qual, in casu, não requereu a produção de nenhuma prova que corroborasse a sua tese. 3. Se o Ministério Público Federal não se desincumbiu de provar a imputação penal consubstanciada na denúncia, ônus que lhe é atribuído pelo artigo 156, 1ª parte, do Código de Processo Penal, impõe-se absolvição do réu, forte no artigo 386, VII, do referido diploma legal. (TRF4, ACR 000032282.2008.404.7116, OITAVA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, D.E. 23/05/2013)

Dessa forma, resta evidente que, ao agir de ofício, determinando a juntada das referidas denúncias – que, conforme se verá, sequer guardam relação com os autos –, Vossa Excelência, vênia concedida, afrontou o preceito constitucional do sistema acusatório. Ao assumir o papel de juiz-acusador, demonstra-se, mais uma vez, a perda da necessária imparcialidade para julgar os aqui Peticionários.


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IV. DA AUSÊNCIA DE RELAÇÃO ENTRE A PRESENTE AÇÃO PENAL E AQUELAS QUE TRAMITAM PERANTE A 10ª VARA FEDERAL DE BRASÍLIA.

Primeiramente, é preciso recordar que a ação penal nº 004254376.2016.4.01.3400 foi distribuída à Justiça Federal do Distrito Federal após r. decisão proferida pelo Eminente Ministro Teori Zavascki declinando a competência do Excelso Supremo Tribunal Federal. Naquela oportunidade, a Suprema Corte fez consignar que essa demanda não tem conexão com os processos da Lava Jato que tramitam perante este Juízo.

Para maior clareza, confira-se o seguinte trecho da r. decisão proferida pelo Eminente Ministro Teori Zavascki:

(...)

Não bastasse, é preciso reafirmar que os temas tratados nas ações penais 0042543-76.2016.4.01.3400 e 0016093-96.2016.4.01.3400 são distintos daqueles


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tratados na presente ação penal, não havendo fundamento jurídico que justifique seu acautelamento nos presentes autos.

Relativamente

à

primeira

ação

penal

supramencionada,

acrescente-se, ainda, esta já se encontra em fase mais avançada, tendo a Defesa apresentado Resposta à acusação, no bojo da qual foram desconstruídas todas as acusações feitas ao Primeiro Peticionário. Também, em audiências realizadas nos dias 08.11.2016 e 28.11.2016, as testemunhas ouvidas nada imputaram ao Primeiro Peticionário e foram de encontro ao teor da denúncia. V. DOS PEDIDOS Dessa forma, é a presente para requerer o desentranhamento das denúncias acostadas no evento 278, vez não guardarem qualquer ligação com o objeto destes autos.

Caso Vossa Excelência assim não entenda, o que se aventa pela condescendência dialética, requer-se seja expedido novo ofício ao juízo da 10ª Vara Criminal Federal do Distrito Federal para que sejam encaminhados para estes autos os vídeos e áudios relativos aos termos de depoimento já prestados pelas testemunhas arroladas — os quais ainda não estão disponíveis para acesso da defesa. É o que fica postulado. Termos em que, Pedem deferimento. Curitiba (PR), 05 de dezembro de 2016.

ROBERTO TEIXEIRA OAB/SP 22.823

CRISTIANO ZANIN MARTINS OAB/SP 172.730

JOSÉ ROBERTO BATOCHIO OAB/SP 20.685

JUAREZ CIRINO DOS SANTOS OAB/PR 3.374


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