PUC-Rio Departamento de Artes e Design Dsg1031 Projeto Comunicação Visual / Turma 1AB Professora Suzana Valladares / Orientadora Evelyn Grumach Alunas Ana Luiza Mello / Eduarda de Aquino Título do projeto Teogonia
Relat贸rio G2 Dsg1031 | Turma 1ab Professora Suzana Valladares Orientadora Evelyn Grumach Alunas Ana Luiza Mello Eduarda de Aquino
Agradecimentos À Ligia Saramago, Musa que nos deu a ouvir revelações; aos mestres Evelyn Grumach, Miguel Carvalho, Suzana Valladares e Vera Bernardes pela generosidade com a qual compartilharam seus conhecimentos conosco e nos incentivaram ao longo de todo o projeto; à amizade.
SUMÁRIO
Introdução 9 Desenvolvimento e metodologia 11 1.Levantamento de dados 11 1a.Estudo do poema 10 1b.Seleção de trechos 10 1c.Referências visuais 14
2.Questões práticas 16 2a.Quem é o nosso leitor 16 2b.Suporte 16
3.Projeto 16
3a.Pranchas / Definição da linguagem 16 Projeto gráfico 17 Definição de cores 17 3b.Livro / tipografia 17 projeto gráfico 18 encadernação 19 3c.Invólucro 18
4.Especificações técnicas 19 5.Sequência pranchas 20 6.Considerações finais 22 Referências bibliográficas 23
INTRODUÇÃO
Nosso desejo inicial era desenvolver um projeto essencialmente visual, no qual poderíamos nos debruçar sobre a experiência sensível e a relação estética com a forma. Buscamos, portanto, uma história que nos permitisse a elaboração de representações abstratas, nas quais poderíamos explorar os elementos básicos da linguagem visual. Hesíodo (séc. VII a.C.) foi o primeiro poeta a narrar a origem dos deuses na Grécia arcaica. A Teogonia, mito de origem do universo, foi composta quando o pensamento racional começava a se configurar. Este pensamento mítico aparentemente tão distante do nosso, no qual a própria enunciação das palavras tornava presentes fatos passados e futuros, permanece atual na subsistência do mistério da origem do mundo, que a nós só cabe imaginar.
O projeto compreende um livro que contém o texto do poema e treze pranchas com imagens abstratas que representam seus trechos mais emblemáticos. Dado seu conteúdo numinoso e sublime, optamos por elaborar imagens de natureza digital, que ocultam sua produção humana; são pura cor, concebidas a partir das quatro primárias: ciano, magenta, amarelo e preto. O movimento, ritmo e forma gerados pelas misturas e contrastes entre os matizes suscitam sensações e conotações visuais que trazem à tona os significados de cada momento da Teogonia. Este conjunto compõe um ensaio visual que narra a primeira obra poética do homem sobre o enigma de sua própria existência.
DESENVOLVIMENTO / METODOLOGIA
1. Levantamento de dados 1.a Estudo do poema
No início, havia apenas o Caos, cenário pré-cósmico que preside a procriação e a separação. Deste vazio originário, também pleno de possibilidades, surgirão as outras três potestades: Terra, “de todos sede irresvalável sempre”, fundamento de tudo; Tártaro, abismo sem fim no fundo da Terra e expressão do não ser; e Eros, força cósmica de fecundação e multiplicação. Terra, o andrógino original, gera por partenogênese Urano, o Céu, criando as polaridades masculino e feminino. Esses dois planos superpostos, complementares e iguais, unidos pela força de Eros, procriarão numerosamente. Urano, entretanto, não deixava seus filhos virem à luz, mantendo-os na cova da Terra. Esta, desesperada, instiga seu filho caçula, o titã Crono, a tomar o lugar do pai. Quando Céu novamente se aproxima da Terra para copular, Crono o castra, atirando seus órgãos genitais ao mar. Este primeiro ato de rebeldia engendra uma organização no universo, separando de fato o Céu da Terra.
Para melhor compreendermos o universo da poesia de Hesíodo e seu contexto de sua produção, nos debruçamos sobre diversos textos indicados pelas professoras Lígia Saramago, que ministra o curso de Estética, e Isabella Fernandes, que ensina Mitologia. Trechos de Paideia, de Werner Jaeger; Mitos Gregos, de Robert Graves; O Universo, os Deuses, os Homens, de Jean-Pierre Vernant e estudos do próprio Jaa Torrano, tradutor da versão do poema escolhida por nós, foram de grande auxílio no entendimento da natureza das figuras míticas e na determinação dos principais momentos da história a serem representados vi- Amaldiçoado pelo pai, que profetiza sua deposição por um filho, Crono engole toda a sua prole, sualmente nas pranchas. fruto da união com a irmã Réia. Esta recorre à A Teogonia é um discurso sobre a experiência do Terra para que, oculta, pudesse dar à luz Zeus. sagrado. Apesar de ainda pertencer a uma con- No lugar do bebê, Réia dá a Crono uma pedra encepção de mundo mágica, arquetípica e divina, rolada num manto, que ele engole sem perceber trata-se de um dos primeiros atos totalizantes do o engano. Zeus cresce vigorosamente e, disfarçapensamento racional, em sua busca por organizar do de copeiro, oferece a Crono uma poção que o os mitos. Hesíodo era um aedo, poeta-cantor, que faz vomitar todos os filhos. Com este ato, instaudisseminava por meio da palavra aquilo que a ele ra-se uma guerra que dura milhares de anos: a havia sido revelado pelas Musas, forças divinas Titanomaquia, na qual os Titãs, filhos do Céu, lunascidas de Zeus e de Mnemosyne, a deusa da tarão contra os deuses olímpios, irmãos e filhos memória. A poesia, pois, tem um poder ontofâni- de Zeus. Após uma árdua vitória, Zeus assume co de presentificação das deidades no momento a soberania e distribui com justiça as honrarias em que as palavras são enunciadas. A aletheia, ou entre os deuses. revelação por meio do canto, é a experiência grega fundamental da verdade. Há, portanto, uma imanência recíproca entre linguagem e ser, o po- 1.b Seleção dos trechos para o der sagrado de nomear e o não esquecimento. desenvolvimento das pranchas A configuração do mundo, segundo Hesíodo, completou-se em três fases cósmicas que não se dispõem numa sucessão cronológica ou simultânea, pois não pertencem a um horizonte temporal uno. A primeira fase é o reinado do Céu, com sua força fecundante; a segunda é o reinado de Crono, cujo poder é o exercício de seu curvo pensamento; e a terceira e última é o reinado de Zeus, que corresponde à perfeita ordem e à plenitude de poderes.
Após realizarmos um estudo aprofundado do poema, delineamos seus principais momentos para representarmo-los visualmente. Nossa escolha também foi guiada pela divisão do mito em treze trechos por Jaa Torrano, tradutor e estudioso do poema. Escolhemos os versos que consideramos mais expressivos e potentes de cada passagem. A partir deles, fizemos associações e criamos palavras-chave para nos inspirar e orientar na criação de imagens.
1.Revelação
revelação inspiração iluminação algo que vem de cima
bipartição separação polaridades criação de opostos
Elas um dia a Hesíodo ensinaram belo canto quando pastoreava ovelhas ao pé do Hélicon divino. Esta palavra primeiro disseram-me as Deusas Musas olímpiades, virgens de Zeus porta-égide: “Pastores agrestes, vis infâmias e ventres só, sabemos muitas mentiras dizer símeis aos fatos e sabemos, se queremos, das ouvir a revelações.
2.Terra gera Urano
Terra primeiro pariu igual a si mesma Céu constelado, para cercá-la toda ao redor E ser aos Deuses venturosos sede irresvalável sempre. 3.Crono castra Urano
corte castração rasgo sangue
Veio com a noite o grande Céu, ao redor da Terra desejando amor sobrepairou e estendeu-se a tudo. Da tocaia o filho alcançou com a mão esquerda, com a destra pegou a prodigiosa foice longa e dentada. E do pai o pênis ceifou com ímpeto e lançou-o a esmo para trás. Mas nada inerte escapou da mão:
4.Filhos da noite não-ser forças de negação escuridão pesado
Noite pariu hediondo Lote, Sorte negra e morte, pariu Sono e pariu a grei de Sonhos. A seguir Escárnio e Miséria cheia de dor. Com nenhum conúbio divina pariu-os Noite trevosa.
5.Poder e Violência poder estável violência que leva à ordem pertencem a Zeus
Estige filha do Oceano unida a Palas no palácio pariu Zelo e Vitória de belos tornozelos e pariu poder e Violência, insignes filhos. Longe deles não há morada de Zeus nem pouso nem percurso por onde o Deus não os guie mas sempre perto de Zeus gravitroante repousam.
6.Hino à Hécate
sorte acaso generosidade abundância opulência
Hoje ainda, se algum homem sobre a terra com belos sacrifícios conforme os ritos propicia e invoca Hécate, muita honra o acompanha facilmente, a quem a Deusa propensa acolhe a prece; e torna-o opulento, porque ela tem a força.
7.Nascimento de Zeus
ocultação proteção profundidade
Mas quando a Zeus pai dos Deuses e dos homens ela devia parir, suplicou então aos pais queridos aos seus, à Terra e ao Céu constelado, comporem um ardul para que oculta parisse o filho e fosse punido pelas Erínias do pai e filhos engolidos o grande Crono de curvo pensar.
8.Vômito de Crono
vômito novo ciclo queda de Crono ascenção de Zeus
bonita por fora obscura por dentro sedução sexualidade vagina
Rápido o vigor e os brilhantes membros do príncipe cresciam. E com o girar do ano, enganado por repetidas instigações da Terra, soltou a prole o grande Crono de curvo pensar, vencido pelas artes e violência do filho. Primeiro vomitou a pedra por último engolida.
9.Mulher
Dela descende a geração das femininas mulheres. Dela é a funesta geração e grei das mulheres, grande pena que habita entre homens mortais, parceiras não da penúria cruel, porém do luxo
10.Titanomaquia
choque tensão luta das duas gerações desordem calor
O calor prodigioso traspassou o Caos. Parecia, a ver-se com olhos e ouvir-se com ouvidos a voz, quando a Terra e o Céu amplo lá em cima tocavam-se, tão grande clangor erguia-se dela desabada e dele desabando-se por cima, tal o clangor dos Deuses batendo-se na luta.
11.Abismo
abismo infinito escuridão sem rumo
Vasto abismo, nem ao termo de um ano atingiria o solo quem por suas portas entrasse mas de cá para lá o levaria tufão após tufão torturante, terrível até para os Deuses imortais este prodígio. A casa terrível da Noite trevosa eleva-se aei oculta por escuras nuvens.
12.Furor dos ventos
movimento tempestade furor devastação
De Tifeu vem o furor dos ventos que sopram úmidos, não Notos, Bóreas e Zéfiro clareante, estes vêm de Deuses, grande valia dos mortais, os outros sopram às cegas sobre o mar e, ao caírem no alto-mar cor de névoa, impetuam ruim procela, grande ruína dos mortais.
13.Divisão das honras
poder que se origina de um ponto decisão divina ordenação
Quando os venturosos completaram a fadiga e decidiram pela força as honras dos Titãs, por conselhos da Terra exortavam o Olímpio longividente Zeus a tomar o poder e ser rei dos imortais. E bem dividiu entre eles as honras.
Como as figuras do pensamento arcaico são caracterizada pela ambiguidade e pletora de sentidos, nos guiamos pelos seguintes recursos para determinar a natureza e o sentido de cada divindade: o nome, o epíteto (expressão que acompanha o nome) e a descendência, que explicita o ser da divindade genitora.
1.c Referências visuais Após realizarmos algumas buscas na internet e em sebos, concluímos que grande parte das narrativas mitológicas ilustradas contêm imagens figurativas e realistas que, apesar de possuírem um tratamento coerente com a tradição da representação clássica, por vezes limitam a compreensão de deidades essencialmente abstratas como Poder e Violência ou Sono e Morte, por exemplo. Já em nossa pesquisa por referências de narrativas essencialmente gráficas, encontramos fértil terreno na poesia visual, conceito desenvolvido pelo movimento concretista nos anos 1960 que teve Lygia Pape, Augusto de Campos e Raymundo Colares dentre seus expoentes. Os Gibis de Colares e o Livro das Criações de Pape propõem experiências táteis e tridimensionais, fazendo uso de recortes e planos de cor para alterar a percepção do todo a cada virada de página. Já em A Ave, de Wlademir Dias Pino e em Poemóbiles, de Júlio Plaza e Augusto de Campos, há uma intensa investigação da forma tipográfica que, em composições específicas e dotada de volume e cor, agrega novos sentidos à linguagem verbal. El Lissitzky e Gonçalo Tavares, por sua vez, produziram obras nas quais transformam o tipo em figura de um modo lúdico e perspicaz. Flicts, de Ziraldo, também é uma inspiração, pois justapõe as narrativas verbal e visual de modo que uma enriqueça a outra, utilizando-se essencialmente de formas geométricas esquemáticas e planos de cor. E Experiência Neoconcreta, de Ferreira Gullar, é uma compilação de manifesto e livros-poema que permitem ao usuário recortar e desvelar as composições. Quanto à produção de imagens abstratas, nos espelhamos em diversos artistas modernos que articulam elementos gráficos em composições intrigantes e significantes. Diversas obras de Luiz Sacilotto, Carlos Cruz-Díez e Victor Vasarely criam a sensação de volume, profundidade e movimento apenas com o uso de linhas. Já alguns trabalhos de Joseph Albers, Hércules Barsotti e Geraldo de Barros o fazem por meio de planos de cor, que também evocam determinadas sensações. Numa abordagem mais contemporânea, encontramos uma estética interessante no trabalho de Rafaël Rozendaal. Sua produção totalmente digital é elaborada a partir de planos de cor que geram luminosas imagens abstratas.
Waldemiro Dias Pino
Flicts, de Ziraldo
Carlos Cruz-Díez
Josef Albers
Rafaël Rozendaal
Victor Vasarely
2. Questões práticas
3. Projeto
2.a Quem é nosso leitor
3.a Pranchas
Por tratar-se de um poema antigo e erudito, cuja linguagem é rebuscada e cujo tema explora questões transcendentais, assim como em função de nossa escolha por compor imagens abstratas, definimos que nosso leitor tem familiaridade e interesse pela linguagem gráfica e pela cultura clássica. Esta delimitação nos permite uma abordagem conceitual à interpretação visual do mito, assim como um projeto gráfico experimental e sofisticado. Do mesmo modo, pressupomos que este público também possui maior poder aquisitivo, o que nos possibilita projetar para uma produção de maior qualidade e custo mais elevado.
i. Definição da linguagem
2.b Suporte Tendo em visto nosso leitor, optamos por desenvolver suportes distintos para o poema e para as imagens, uma vez que não queríamos compor um livro ilustrado, mas imagens abstratas inspiradas na atmosfera do poema. Além disso, desejávamos que as imagens expressassem seus sentidos independentemente das palavras, em consonância com a oralidade que caracterizava a Grécia arcaica. Trabalhar com suportes distintos também nos permitiria projetar para formatos diferentes, de modo que as imagens poderiam ser maiores e emolduráveis, enquanto o livro poderia ser lido confortavelmente. Sendo assim, elaboramos treze pranchas com representações visuais dos trechos expressivos do poema e um livro com o texto do mito. Estes dois itens, no entanto, necessitariam de uma embalagem, que também deveria ser conceitual. Optamos por desenvolver uma caixa negra, que simbolizaria o Caos, potestade originária, que contêm todas as possibilidades.
Após nos aprofundarmos no estudo do poema, concluímos que numerosas deidades sequer assumem formas concebíveis, simbolizando potências vitais e forças obscuras. Para além disso, a diversidade de versões do mito que chegaram até nós envolvem seu teor original numa aura de mistério que impede que uma única interpretação seja eleita. Sendo assim, decidimos produzir representações visuais abstratas, que expressassem a narrativa a por meio dos elementos básicos da linguagem visual. Iniciamos nossos experimentos trabalhando com dois eixos possíveis: imagens elaboradas a partir de pontos, linhas e planos e imagens feitas de cor. De qualquer forma, definimos desde o princípio que trabalharíamos com as ferramentas digitais, pois não desejávamos a presença de traços de manufatura, exatamente por tratar-se de um mito anterior ao homem. Elaboramos diversos estudos do momento em que Terra gera Urano (abaixo). Percebemos que a primeira abordagem, apesar de interessante, é mais figurativa e remete a um entendimento racional matemático, enquanto a segunda demanda mais da nossa sensibilidade para poder senti-la e compreende-la. Esta linguagem melhor atendeu ao nosso desejo inicial de trabalhar com a experiência sensível. Além de ser abstrata, não há formas fechadas na imagem, apenas cor em movimento, provocando sensações e associações visuais no leitor. Esta “imaterialidade” dialoga com o aspecto divino e amorfo do tema, também deixando em aberto a cada um a possibilidade de conceber a sua própria leitura para este momento de origem do universo.
ii. Projeto gráfico
235 mm
T E O G O N I A
235 mm
As pranchas possuem formato A3, grande o suficiente para se dar o devido destaque à imagem e adequado para ser enquadrado e disposto em série. É um tamanho flexível, pois também permite o fácil manuseio e o arquivamento no invólucro. Na frente, a imagem sangrada ocupa todo o espaço do papel. No verso, próximo à margem inferior esquerda, os trechos do poema que inspiraram a imagem e o título que demos a ela aparecem acompanhados do número da página em que o texto se encontra no livro. A diagramação dos 140 mm versos é idêntica à do livro, decrescida do restante do texto. No canto superior esquerdo, há uma indicação da posição que aquela imagem ocupa na série, de um a treze; e nossos créditos. A tipografia utilizada foi a mesma do livro: Swift para os versos, créditos e números de página; Akzidenz-Grotesk para os títulos.
Imagem 1 de 13 do ensaio visual inspirado no poema Teogonia, de Hesíodo. Ana Luiza Mello e Eduarda de Aquino , 2013.
420 mm
créditos
outros imortais sempre vivos. / Elas um dia a Hesíodo ensina-
trecho
ram belo canto / quando pastoreava ovelhas ao pé do Hélicon divino. / Esta palavra primeiro disseram-me as Deusas / Musas olimpíades, virgens de Zeus porta-égide: / “Pastores agrestes, vis infâmias e ventres só, / sabemos muitas mentiras dizer símeis aos fatos / e sabemos, se queremos, dar a ouvir revelações”. / página 5
REVELAÇÃO
297 mm
prancha / frente
prancha / verso
iii. Definição das cores Como decidimos trabalhar apenas com cor, queríamos delimitar seu uso para criar uma cartela adequada ao tema, com uma qualidade originária. Os tons primários, tais quais as potestades iniciais, geraram todos os demais matizes. Sendo assim, determinamos o uso do CMYK - ciano, magenta, amarelo e preto - e definimos os tons exatos de cada um para atingirmos matizes que acreditamos possuir a intensidade e a versatilidade que cada momento do mito requer. Para cada momento representado, partimos de um conceito simples e de formas geométricas básicas para em seguida complexificá-las, criando passagens e encontros entre as cores. Usamos sobretudo o gradiente e as ferramentas do Adobe Illustrator blend, distort e warp.
P R O Ê M I O : H I N O À S M U S A S — H I N O À H É C AT E
O NASCIMENTO DE ZEUS — OS DEUSES OLÍMPIOS
140 mm
capa / verso
capa / frente - falar que o texto é em silk
3b - papelLivro X cor preta
i. Tipografia Buscávamos, para compor o texto do poema, uma tipografia serifada, clássica, mas com um desenho contemporâneo. Acreditamos que Swift, de Gerard Unger, atendeu às nossas expectativas em sua capacidade de transmitir a imponência do conteúdo, ao mesmo tempo em que concede leveza para uma leitura confortável. Como tipografia auxiliar, queríamos uma não serifada simples e sofisticada. Optamos pela Akzidenz Grotesk, uma das primeiras tipografias modernas, remetendo-se ao nosso conceito de criações originárias. Usada para os títulos e folio em versão condensada e com um grande espaçamento, esse tipo gera um bloco de texto que contrasta com a forma mais arredondada da Swift, dotando o projeto gráfico de contemporaneidade.
Em % C c: 100 m: 50 y: 0 k: 40
Y c: 0 m: 27 y: 100 k: 0
M c: 0 m: 100 y: 61 k: 0
K c: 40 m: 0 y: 0 k: 100
exemplo do procedimento de produção das pranchas: o primeiro passo é desenhar em vetor para em seguida, aplicar as ferramentas no Illustrator
a bela voz, / imperecível dança. Em torno gritava a terra negra / ao hinearem, dos pés amável ruído erguia-se / ao irem a seu pai. Ele reina no céu / tendo consigo o trovão e o raio flamante, / venceu no poder o pai Crono, e aos imortais / bem distribuiu e indicou cada honra; / isto as Musas cantavam, tendo o palácio olímpio, / nove filhas nascidas do grande Zeus: / Glória, Alegria, Festa, Dançarina, / Alegra-coro, Amorosa, Hinária, Celeste / e Belavoz, que dentre todas vem à frente. / Ela é que acompanha os reis venerandos. / A quem honram as virgens do grande Zeus / e dentre reis sustentados por Zeus vêem nascer, / elas lhe vertem sobre a língua o doce orvalho / e palavras de mel fluem de sua boca. Todas / as gentes o olham decidir as sentenças / com reta justiça e ele firme falando na ágora / logo à grande discórdia cônscio põe fim, / pois os reis têm prudência quando às gentes / violadas na ágora perfazem as reparações / facilmente, a persuadir com brandas palavras. / Indo à assembléia, como a um Deus o propiciam / pelo doce honor e nas reuniões se distingue. / Tal das Musas o sagrado dom aos homens. / Pelas Musas e pelo golpeante Apoio / há cantores e citaristas sobre a terra, / e por
235 mm
Zeus, reis. Feliz é quem as Musas / amam, doce de sua boca flui 8
27 mm 21 mm 21 mm
21 mm
2100 mm esquema do livro aberto com as marcas de vinco
ii. Projeto gráfico Nosso livro possui formato 140mm x 235mm. 27 homogêmm Para produzirmos uma mancha gráfica nea e surpreendente, ao mesmo tempo em que diminuiríamos o tamanho total de páginas, decidimos suprimir as marcações de parágrafo entre os versos e substituí-los pela barra (/). Optamos, então, por uma diagramação clara, com a mancha centralizada na página, para não causar maior estranhamento. Decidimos utilizar as cores preto e azul, no mesmo matiz utilizado para as pranchas. Como queríamos dar destaque aos versos que inspiraram as imagens, colocamo-los em azul. Este contraste destaca o trecho sem intervir na leitura e2100nammmancha gráfica, produzindo um resultado discreto e sofisticado. / depois Zeus pai dos Deuses e dos homens, / no começo e fim
do canto hineiam as Deusas / o mais forte dos Deuses e o maior em poder, / e ainda o ser de homens e de poderosos Gigantes. /
Hineando alegram o espírito de Zeus no Olimpo / Musas olimpí-
ades, virgens de Zeus porta-égide. / Na Piéria gerou-as, da união do Pai Cronida, / Memória rainha nas colinas de Eleutera, / para oblívio de males e pausa de aflições. / Nove noites teve uniões
com ela o sábio Zeus longe dos imortais subindo ao sagrado
leito. / Quando girou o ano e retornaram as estações / com as
iii. Encadernação
demonstração da encadernação sanfona
minguas das luas e muitos dias findaram, / ela pariu nove moças
concordes que dos cantares / têm o desvelo no peito e não-triste ânimo, / perto do ápice altíssimo do nevoso Olimpo, / aí os seus
coros luzentes e belo palácio. / Junto a elas as Graças e o Desejo
têm morada /nas festas, pelas bocas amável voz lançando / dan-
çam e gloriam a partilha e hábitos nobres / de todos os imortais,
voz bem amável lançando. / Elas iam ao Olimpo exultantes com a bela voz, / imperecível dança. Em torno gritava a terra negra / ao hinearem, dos pés amável ruído erguia-se / ao irem a seu
pai. Ele reina no céu / tendo consigo o trovão e o raio flamante,
/ venceu no poder o pai Crono, e aos imortais / bem distribuiu
e indicou cada honra; / isto as Musas cantavam, tendo o palácio
235 mm
olímpio, / nove filhas nascidas do grande Zeus: / Glória, Alegria, Festa, Dançarina, / Alegra-coro, Amorosa, Hinária, Celeste / e Belavoz, que dentre todas vem à frente. / Ela é que acompanha os
reis venerandos. / A quem honram as virgens do grande Zeus / e
dentre reis sustentados por Zeus vêem nascer, / elas lhe vertem sobre a língua o doce orvalho / e palavras de mel fluem de sua
boca. Todas / as gentes o olham decidir as sentenças / com reta justiça e ele firme falando na ágora / logo à grande discórdia
cônscio põe fim, / pois os reis têm prudência quando às gentes
/ violadas na ágora perfazem as reparações / facilmente, a per-
suadir com brandas palavras. / Indo à assembléia, como a um
Deus o propiciam / pelo doce honor e nas reuniões se distingue.
/ Tal das Musas o sagrado dom aos homens. / Pelas Musas e pelo
golpeante Apoio / há cantores e citaristas sobre a terra, / e por
A Teogonia possui uma narrativa não linear, seus eventos não tem uma temporalidade única e por diversas vezes se sobrepõem e se contradizem. Queríamos transmitir ao leitor esta impossibilidade de estabelecer uma rigorosa relação de anterioridade e de posteridade. Portanto, escolhemos a encadernação sanfona, que comunica continuidade e movimento cíclico, nublando as noções de passado, presente e futuro.
Zeus, reis. Feliz é quem as Musas / amam, doce de sua boca flui 8
27 mm
3.c Invólucro
27 mm
21 mm 21 mm
/ depois Zeus pai dos Deuses e dos homens, / no começo e fim do canto hineiam as Deusas / o mais forte dos Deuses e o maior em poder, / e ainda o ser de homens e de poderosos Gigantes. / Hineando alegram o espírito de Zeus no Olimpo / Musas olimpíades, virgens de Zeus porta-égide. / Na Piéria gerou-as, da união do Pai Cronida, / Memória rainha nas colinas de Eleutera, / para oblívio de males e pausa de aflições. / Nove noites teve uniões com ela o sábio Zeus longe dos imortais subindo ao sagrado leito. / Quando girou o ano e retornaram as estações / com as minguas das luas e muitos dias findaram, / ela pariu nove moças concordes que dos cantares / têm o desvelo no peito e não-triste
mancha gráfica da massa de texto
ânimo, / perto do ápice altíssimo do nevoso Olimpo, / aí os seus coros luzentes e belo palácio. / Junto a elas as Graças e o Desejo têm morada /nas festas, pelas bocas amável voz lançando / dançam e gloriam a partilha e hábitos nobres / de todos os imortais, voz bem amável lançando. / Elas iam ao Olimpo exultantes com a bela voz, / imperecível dança. Em torno gritava a terra negra / ao hinearem, dos pés amável ruído erguia-se / ao irem a seu pai. Ele reina no céu / tendo consigo o trovão e o raio flamante, / venceu no poder o pai Crono, e aos imortais / bem distribuiu e indicou cada honra; / isto as Musas cantavam, tendo o palácio olímpio, / nove filhas nascidas do grande Zeus: / Glória, Alegria, Festa, Dançarina, / Alegra-coro, Amorosa, Hinária, Celeste / e Belavoz, que dentre todas vem à frente. / Ela é que acompanha os reis venerandos. / A quem honram as virgens do grande Zeus / e dentre reis sustentados por Zeus vêem nascer, / elas lhe vertem sobre a língua o doce orvalho / e palavras de mel fluem de sua boca. Todas / as gentes o olham decidir as sentenças / com reta justiça e ele firme falando na ágora / logo à grande discórdia cônscio põe fim, / pois os reis têm prudência quando às gentes / violadas na ágora perfazem as reparações / facilmente, a persuadir com brandas palavras. / Indo à assembléia, como a um Deus o propiciam / pelo doce honor e nas reuniões se distingue. / Tal das Musas o sagrado dom aos homens. / Pelas Musas e pelo golpeante Apoio / há cantores e citaristas sobre a terra, / e por Zeus, reis. Feliz é quem as Musas / amam, doce de sua boca flui 8
27 mm 21 mm 21 mm
21 mm
21 mm
Sim bem primeiro nasceu Caos. Esta potestade
primordial, que preside a procriação por cissiparidade, é ilimitada em magnitude e potência. Ela tudo contém, dela tudo surge – é a divindade originária que biparte-se, permanecendo ela própria ao mesmo tempo. Concluímos que nosso invólucro, portanto, deveria transmitir este universo a ser desvelado pelo leitor, traduzindo em matéria, cor e textura o mistério e obscuridade deste momento inicial da origem do universo. Desenvolvemos uma caixa revestida em papel preto texturizado para guardar as pranchas e o livro num bolso interno. Ela se mantém fechada por uma cinta também preta, onde a palavra Teogonia reluz em serigrafia preta. O ato de retirar a cinta e revelar o conteúdo desta misteriosa “caixa preta” gera uma excitante experiência que remete à revelação da verdade do canto de Hesíodo, além de também se referir ao Caos, negro absoluto, como a origem de tudo que se seguirá.
4. Especificações técnicas 4.a Materiais, técnicas de impressão \ Tiragem
i. Livro Miolo Papel Vergé Plus Madrepérola 80g/m3 Impressão ofsete Capa e quarta capa Papel Paraná revestido de Color Plus preto _ Título impresso em serigrafia com tinta vinílica preta [Tiragem de 500 exemplares]
ii. Pranchas Papel Canson Photo Rag 308g/m3 Impressão fine art
[Tiragem de 100 séries de 13 unidades cada]
iii. Invólucro Caixa Papel Paraná revestido de papel Cialux preto Cinta Formato: 8cm x 64cm Papel Color Plus preto _Título impresso em serigrafia com tinta vinílica preta [100 unidades]
ilustração do projeto da caixa negra
T E O G O N I A A ORIGEM DOS DEUSES sequĂŞncia pranchas
Ana Luiza Mello e Eduarda de Aquino
REVELAÇÃO
TERRA GERA URANO
CRONO CASTRA URANO
FILHOS DA NOITE
PODER E VIOLÊNCIA
HINO À HÉCATE
NASCIMENTO DE ZEUS
CRONO VOMITA DE CRONO
MULHER
TITANOMAQUIA
ABISMO
FUROR DOS VENTOS
DIVISÃO DAS HONRAS
6. Considerações finais Ana Luiza
Eduarda
Neste projeto, tive a rara oportunidade de mergulhar numa história grandiosa, exercitando minha sensibilidade para lograr compreendê-la e representá-la em sua dimensão mítica e metafísica. Pude me dedicar, com propriedade e liberdade, à criação de imagens que comunicam sensações físicas e sutilezas poéticas, fazendo uso da cor como principal significante.
Escolher um tema de enorme beleza e nos aprofundar até o limite de seu conteúdo poético e sublime foi uma experiência muito bacana. Sinto que durante esse período, além de ter aprendido sobre um mito de tamanha importância, foi bastante frutífero para o desenvolvimento de um pensamento gráfico, desde a experimentação de ferramentas digitais desconhecidas até então até a meticulosa escolha do papel e da técnica de impressão a ser usada. Foi um projeto que levantou problemas curiosos — as regras que nos impomos foram rigorosas e isso apresentou obstáculos muitas vezes limitadores — como corresponder aos significados somente com o uso das cores exatas e o desafio de desenhar formas abstratas capazes de transmitir uma sensação específica.
Este prazeroso exercício de transformar palavras em percepções e percepções em imagens me instigou a refletir longamente sobre a questão da representação e, consequentemente, sobre meu próprio ofício. Alegra-me contemplar o resultado e vivenciar nesta série a iluminação das Musas e a obscuridade da Noite; a ascensão ao Céu e a infinita queda no abismo; a violência de Zeus e a perigosa sensualidade da mulher.
Em um processo de escolhas formais delicadas, não tenho dúvidas que o trabalho em equipe foi enriquecedor e nós duas nos complementamos enormemente durante todo o desenvolvimento desse projeto tão envolvente.
Bibliografia HESÍODO. Teogonia: a origem dos deuses. Tradução: Jaa Torrano. Editora Iluminuras, Rio de Janeiro, 2012. VERNANT, Jean-Pierre. O Universo, os deuses, os homens. Companhia das Letras, 2005. KANDINSKY, Wassily. Point and line to plane. Dover Publications, New York. ARNHEIM, Rudolf. Art and Visual Perception: A Psychology of the Creative Eye. University of California Press. MIRANDA, Antonio. Poesia brasileira em livros de arte. Disponível em: <http://www. antoniomiranda.com.br/ensaios/poesia_em_ livros_de_arte%20-%20 c%20-.html> Acesso em setembro de 2013.