Corrupção Elísio Macamo
A corrupção é, talvez, um dos mais versáteis verbetes que existem para dar conta da constituição social. O seu significado etimológico de ruptura, o qual sugere a ideia de adulteração, degeneração, impureza e destruição, é por si só revelador. Dessa polissemia vem a facilidade através da qual a noção pode ser empregue no discurso quotidiano ao mesmo tempo que se torna difícil usá-la analiticamente. Talvez seja importante, antes de prosseguir, referir que conceitos têm uma dimensão discursiva e outra analítica.1 A discursiva consiste no emprego do termo na sua acepção mais geral e sem atenção à necessidade de especificação das condições precisas que devem vigorar para que interlocutores tenham a mesma ideia do que ele refere. A dimensão discursiva é própria do quotidiano, onde o desiderato da comunicação fácil e informal faz da precisão semântica um obstáculo. A dimensão analítica, por sua vez, consiste no emprego do termo numa acepção precisa. Nela o termo é reduzido às suas partes constituintes e, por via disso, não só refere como também descreve o que nomeia. Esta dimensão é do pelouro da comunicação académica onde os aspectos intencionais — no sentido filosófico de atributos e 1 Esta distinção foi feita por Reinhard Schulze, um especialista alemão da religião islâmica, durante uma palestra na Universidade de Bayreuth, em 8 de julho de 1994.
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