Brasil de Fato SP - Especial Eleições

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Maior descoberta energética, pré-sal é passaporte para o futuro do país p.7

Joka Madruga

Petróleo

Empresas sob investigação financiam campanha de Alckmin ao governo p.4

SÃO PAULO

Set/Out de 2014 • Edição Especial • brasildefato.com.br • distribuição gratuita

São Paulo no fundo do poço 40% da população já sofre racionamento

Rafael Stedile

Agência Petrobras

cartel do metrô

habitação

Em quatro anos, governo estadual constrói só 2 mil moradias p.3

USP

Finanças de universidades públicas estão em situação crítica p.6


editorial

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brasildefato.com.br

No dia 5 de outubro, você decide Há uma forte campanha que questiona o processo político e eleitoral no Brasil e bandeiras se levantam para pedir por reforma política. Não podemos negar os muitos problemas que o atual sistema político possui. Por isso, acreditamos que só processos de muito debate e luta do povo brasileiro conseguirão melhorar o país. Uma das distorções da política é o uso do poder econômico pelos mais ricos e que usam seus recursos financeiros para garantir a eleição de candidatos que, na maioria das vezes, não têm nenhum compromis-

so com o país e a população. Outra grave distorção é a influência dos meios de comunicação empresariais - os grandes jornais, emissoras de rádio e televisão -, que, sendo seus donos algumas das famílias mais ricas do Brasil, como é a Rede Globo, querem que seus negócios continuem dando lucros e influenciando o poder público. Sempre devemos perguntar, ao ouvir uma notícia, quem irá se beneficiar? Assim, na hora de decidir seu voto, é muito importante saber que essa decisão poderá valer por quatro anos. E

que corremos o risco de eleger candidatos que apoiam as causas dos mais ricos, em prejuízo dos mais pobres.

» Nós acreditamos no Brasil e no povo trabalhador. Na hora do voto, vamos ajudar o país a avançar. Diante disso, propomos alguns pontos para pensarmos sobre as eleições e, de maneira tranquila, decidir o voto. - A vida do povo brasileiro melhorou nos últimos anos?

- Existem oportunidades de educação, inclusive universidade, atualmente? E há possibilidades de trabalho? - O Estado vem se empenhando para o aumento e a descoberta de novas riquezas naturais que venham a beneficiar o povo brasileiro? - Estão sendo criadas medidas para melhorar a saúde, a moradia e o acesso a bens essenciais para a vida, como a água? Caso você não tenha informações suficientes, pesquise, compare os atuais governantes com o de períodos anteriores, pergunte para os mais velhos,

professores, amigos. Além disso, é importante não ter a ilusão de que basta votar para mudar o país. Para isso, será necessário exigir, lutar e se organizar para que nosso país seja cada vez melhor. Nós acreditamos no Brasil e no povo trabalhador brasileiro, homens e mulheres que constroem a cada dia um grande país. Na hora de decidir o voto, vamos ajudar o Brasil a avançar mais para o bom e para o melhor. Sem aventuras e sem retrocessos. Que a leitura deste jornal ajude-nos a decidir bem.

Caio Palazzo/A Ponte Jornalismo

PM realiza reintegração de posse violenta de famílias que ocupavam prédio no Centro (16/09)

DAHMER - malvados.wordpress.com

SÃO PAULO O jornal Brasil de Fato circula semanalmente em todo o país com uma edição nacional e em edições regionais, no Rio de Janeiro, em Minas Gerais e em São Paulo. Queremos contribuir no debate de ideias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais em nosso país. Contato: redacaosp@brasildefato.com.br | (11) 2131-0800 Conselho Editorial: Aton Fon Filho, Carla Bueno, Gabriel Sollero, Igor Felippe, Igor Fuser, João Paulo Rodrigues, Neuri Rossetto, Ricardo Gebrim, Ronaldo Pagotto e Vitor Polacchini • Diretores executivos: Igor Felippe e Ronaldo Pagotto • Editora: Vivian Fernandes • Repórteres: Guilherme Weimann, Norian Segatto e Rafael Tatemoto • Fotógrafo: Rafael Stedile • Jornalista responsável: Vivian Fernandes – Mtb 14.245/MG • Coordenação da distribuição: Laryssa Sampaio • Administração: Ana Karla Monteiro • Publicidade: publicidadesp@brasildefato.com.br • Endereço: Al. Eduardo Prado, 676 – Campos Elíseos – CEP 01218-010 – Tel. (11) 2131-0800 / Fax: (11) 3666-0753 – São Paulo-SP


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questões para a eleição

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moradia

Marcelo Camargo/ABr

Divulgado em propaganda, número é menos de 1% do déficit do estado

A falta de moradias atinge mais de 1,495 milhão de pessoas, segundo o Censo 2010 por Rafael Tatemoto

Artônio Cruz/ABr

Ao final de seu atual mandato (2010-2014), o governador Geraldo Alckmin (PSDB) terá entregado à população de São Paulo pouco mais de 2.000 unidades habitacionais populares através do programa Casa Paulista, da Secretaria estadual de Habitação. O número foi veiculado, ao lado de outros dados, como um grande feito do governo. Quando comparado ao número estimado de pessoas sem moradia, é possível relativizar o sucesso das medidas adotadas na construção de casas para a população de renda mais baixa. Segundo dados publicados em 2013 pela Fundação João Pinheiro, entidade responsável pela elaboração dos índices re-

ferentes ao déficit habitacional em todo o país através da sistematização dos dados colhidos pelo Censo, no Brasil o déficit habitacional era de aproximadamente 6,5 milhões de unidades. A região sudeste concentra 38% desse total – o equivalente a 2,6 milhões de casas. Desses 38%, São Paulo representa mais da metade (1,5 milhões). Ou seja, o estado concentra 23% de toda a demanda por habitação no país – quase um quarto. Diante destes dados, o volume anunciado pela propaganda governamental representa muito pouco. As cerca de 2.000 unidades construídas não representam sequer 1% do total de habitações que deveriam ser construídos no estado de São Paulo para sanar a demanda.

VIOLÊNCIA Além da timidez no volume de investimentos na construção de habitação popular, o governo de Alckmin vem se notabilizando pela atuação desproporcional e exagerada por parte da Polícia em casos de reintegração de posse de terrenos ocupados por movimentos sociais. Em janeiro de 2012, a PM realizou a desocupação da comunidade do Pinheirinho, onde moravam cerca de 9 mil pessoas - as primeiras chegaram ao terreno em 2004. A operação policial foi marcada por abusos: o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa reuniu cerca de 1800 denúncias de violações a direitos humanos na reintegração do Pinheirinho. 13,6% do total das denúncias diziam respeito a humilhações e ameaças. Mais de 20% dos entrevistados relataram ter sofrido agressões físicas. Mais recentemente, a PM repetiu sua maneira de agir, transformando a região central da cidade em uma cenário de guerra, na reintegração do antigo hotel Aquário, vazio havia dez anos e ocupado por movimentos sociais em fevereiro deste ano.

Opinião

“Alckmin é cúmplice da violência contra a mulher” por Luiza Mançano*

Dados do estado de São Paulo apontam que em apenas dois meses, junho e julho deste ano, aconteceram 3.099 denúncias de lesão corporal contra mulheres e 28 denúncias de estupro na capital e região metropolitana. Ainda ocorreram 5.373 denúncias de lesão corporal e 34 de estupro no interior paulista. Embora esses dados sejam alarmantes, sabemos que muitos casos de violência não foram denunciados pelas vítimas. O cenário de retrocesso no atendimento à violência contra mulheres em São Paulo, bem como a ausência de recursos e equipamentos, principalmente, no interior do estado, já foi levantado pela CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) de Violência Contra as Mulheres, em audiência pública de junho de 2012. Entre essas deficiências está a ausência de Secretaria de Políticas para as Mulheres, com poder efetivo para articular as políticas de diversos órgãos e com orçamento próprio. Também há falta de investimentos para a ampliação da rede de atendimento às vítimas e para capacitação de profissionais

que atuam no atendimento da rede de proteção. Além disso, a CPMI fez várias recomendações ao governador Geraldo Alckmin, ao Poder Judiciário e ao Ministério Publico, apontando as deficiências do governo estadual no combate à violência contra a mulher. Entre essas, estão a ampliação dos serviços de abortamento legal e qualificação dos já existentes, a capacitação dos plantões das delegacias 24 horas - para a correta recepção e processamento dos crimes cometidos contra mulheres e cumprimento da Lei Maria da Penha -, e a criação de delegacias da mulher nas cidades que não as possuem. Mesmo após as recomendações vindas do Congresso Nacional, pouco se avançou em relação à situação de precariedade do atendimento e combate à violência. Os obstáculos para mudar esta realidade estão fundados na omissão do governo do PSDB, há 20 anos no governo de São Paulo, somado ao machismo impregnado no sistema judiciário, secretarias de Seguranças e órgãos afins. *Luíza Mançano é integrante da Marcha Mundial das Mulheres. Cristine Rochol/ PMPA

Em quatro anos, governo do PSDB constrói só 2 mil casas

Em dois meses SP registra 3.000 casos de violência contra a mulher


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corrupção Antônio Cruz / ABr

Empresas sob investigação financiam campanha do PSDB 56% das doações são de corporações ligadas a escândalos do Metrô por Rafael Tatemoto

Governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), é candidato à reeleição em São Paulo

Três das empresas que doaram à campanha de Alckmin já são rés em processos na Justiça: a construtora Queiroz Galvão, a CR Almeida S/A Engenharia de Obras e a construtora OAS S/A, que fizeram doações de R$ 4,1 milhões, R$ 1 milhão e R$ 860 mil, respectivamente, ao comitê financeiro eleitoral do PSDB. Parte do dinheiro oferecido pela Queiroz Galvão - R$ 2,1 milhões - foi pago por uma subsidiária, a Queiroz Galvão Alimentos S/A. A Serveng Civilsan S/A Empresas Associadas de Engenharia, que é investigada pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), colaborou com R$ 2 milhões. Executivos de consórcios integrados pela CR Almeida S/A Engenharia de Obras, pela OAS S/A e pela Queiroz Galvão foram denunciados em 2012 pelo Ministério Público sob a acusação de fraude e formação de cartel no processo de licitação para ampliar a linha 5-lilás

As empresas investigadas por escândalos em licitações dos metrôs de São Paulo e do Distrito Federal são as maiores doadoras da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB) à reeleição no governo estadual. Somando todas as contribuições financeiras, quatro entidades suspeitas foram responsáveis por R$ 8,3 milhões – 56% dos R$ 14, 7 milhões arrecadados no total. Os dados são das prestações de contas parciais enviadas ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). No início da campanha, de acordo com a primeira prestação de contas, a contribuição dessas empresas correspondia a 70% do total da campanha do atual governador – R$ 4 milhões de R$ 5,7 milhões. Segundo esse levantamento, no começo da arrecadação, Alckmin concentrava 54,7% de todas as doações feitas aos candidatos ao Palácio dos Bandeirantes.

metrô

Desde que assumiu o governo estadual, em 1995, o PSDB inaugura a maior parte das novas estações de metrô em ano de eleições. Das 24 estações construídas nesse período, 19 foram abertas no mesmo ano da disputa para o governo estadual. O número equivale a 79% do total. O ritmo de expansão da malha metroviária na última Gestão Alckmin ficou abaixo das promessas de campanha. Em 2012, o atual candidato à reeleição prometeu em 2012 construir 30 km até esse ano. Deve encerrar sua gestão com apenas 4 km – 13% do que propagandeou. Segundo um levantamento

Carol Teresa / Metrô de São Paulo

79% das estações são inauguradas em ano eleitoral

A expansão metroviária ficou abaixo das promessas de campanha

da BBC Brasil, no atual ritmo de expansão, o Metrô paulista demoraria 172 anos para alcançar o tamanho atual da rede da cidade de Londres. Desde que foi criado, o sistema londrino tem expansão média de 2,69 km por ano. Já a taxa média paulista é de 1,9 km.

Em comparações globais, o estado de São Paulo se sai ainda pior. Inaugurado vinte anos após o metrô paulista, a rede de Xangai, na China, já ultrapassou a de Londres. Nova Deli, na Índia, inaugurou sua rede em 2002 e é mais que o dobro do sistema paulista.

do Metrô paulista. No total, 14 funcionários de 12 construtoras foram denunciados no caso. Segundo o documento, as empresas teriam se articulado para combinar e propor um valor maior que o usual, encarecendo as obras. A licitação foi realizada em 2008, na gestão de José Serra (PSDB) - atual candidato ao Senado e que chegou a afirmar em entrevista que “cartel não é sinônimo de delito”, contrariando o que está disposto na lei de crimes contra a ordem econômica. A Serveng é investigada pelo Cade por suspeita de fraude em licitações realizadas em 2007 para compra de equipamento ferroviário e manutenção do metrô no Distrito Federal. As empresas e a campanha de Alckmin afirmam que as doações foram feitas de acordo com a lei eleitoral. Questionados sobre um possível conflito de interesses, não responderam até o fechamento desta edição.


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crise da água

Gestão Alckmin insiste em esconder racionamento de água Falta d’água já afeta 38% dos paulistanos e tendência é de agravamento por Guilherme Weimann

Tudo indica que a previsão estava correta: a água do Cantareira poderá secar logo após as eleições. Em relatório divulgado no final de junho, a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), controlada pelo governo estadual, afirmou que o reservatório secaria no dia 27 de outubro, apenas 24 horas após o segundo turno eleitoral. De acordo com o coordenador da FNSA (Frente Nacional de Saneamento Ambiental), Edson Aparecido da Silva, as 8 milhões de pessoas na capital e Grande São Paulo abastecidas pelo Sistema Cantareira podem ficar sem água já no final do próximo mês. Segundo ele, “caso a situação atual se mantenha, com uma média de queda de 0,2% por dia do reservatório,

teremos água por até 45 dias”. Atualmente, o Sistema Cantareira está com menos de 9% do seu volume. Diante disso, o governo do estado solicitou a retirada de mais 100 bilhões de litros de água da reserva técnica, chamada de “volume morto”, o que poderia garantir o abastecimento até março do próximo ano. No entanto, o colapso que se aproxima já é realidade para 38% da população paulistana que sofre com a falta de água, segundo pesquisa do Ibope divulgada no início de setembro. Para o professor da UFABC, Ricardo Moretti, os “bairros mais distantes já têm sofrido um racionamento camuflado”. Ele avalia que “um plano transparente de racionamento deveria ter começado em março, mas, devido ao cronograma eleitoral, não há coragem política”.

PROTESTO No dia 7 de setembro, durante o Grito dos Excluídos, 10 mil pessoas foram à Avenida Paulista para pautar a reforma política e denunciar a responsabilidade do governo de Geraldo Alckmin (PSDB) em relação à situação da água. A participante do ato, Louise Löbler, aponta que “além de negar o racionamento que já é um fato em quase toda a cidade, o Alckmin ainda tenta se safar das consequências eleitorais”. Compartilha da mesma visão sobre o atual governo o coordenador da Frente Nacional de Saneamento Ambiental. Para Edson Silva, não há dúvidas que “o governo de São Paulo é o único responsável pela crise da água que o estado enfrenta”.

Sistema Canteira há meses faz uso do volume morto

Lucro

Governo estadual viola os direitos humanos, diz ONU

Movimentos sociais protestaram no dia 7 de setembro com o tema da crise da água

Durante discussão sobre a crise da água, na ALESP (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo), em 27 de agosto, a relatora especial de Direitos Humanos, Água e Saneamento da ONU, Catarina Albuquerque, afirmou que “está havendo uma violação de direitos humanos, sim, por parte do governo do estado de São Paulo”. Segundo ela, o Marco Jurídico de Direitos Humanos obriga os estados a investirem o máximo de recursos disponíveis na realização dos direitos fundamentais, como o direito à água. “Aqui em São Paulo faço uma indagação, será que foi investido o máximo de recursos disponíveis?”. No ano de 2004, a Agência Nacional de Águas e o Departamento de Águas e Energia Elétrica renovaram o contrato da Sabesp para utilizar o Sistema

Cantareira por mais dez anos. Na outorga, foi determinado que a Sabesp que a Sabesp apresentasse, em 30 meses, estudos para viabilizar a redução de sua dependência do Cantareira. Mas isso não ocorreu. De acordo com Catarina, a remessa de lucros aos acionistas é uma das causas da falta de investimentos em expansão e infraestrutura do sistema. “Quando vemos uma porcentagem dos lucros da Sabesp sendo distribuída aos acionistas em Nova York e aqui na Bolsa de Valores, percebemos que os recursos que deveriam ter sido investidos estão indo para outras mãos”. Com base em dados da Sabesp, entre 2003 e 2013, aproximadamente um terço do lucro líquido total foram repassados aos acionistas, o que equivale à R$ 4,3 bilhões.


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Banco Central: o que é sua independência? O Banco Central do Brasil (BC) cumpre um papel fundamental de regulação e controle de todo o sistema econômico e financeiro. Ele fiscaliza os bancos comerciais e determina toda a política que envolve dinheiro. Uma de suas principais funções é determinar qual é a taxa máxima que o país vai pagar pelos títulos de sua dívida, a chamada taxa Selic. Hoje, a dívida que o Estado tem com os bancos é de mais de R$ 2 trilhões. A atual taxa de juros é de 11% ao ano. Portanto, o governo vai gastar R$ 220 bilhões em 2014 para pagar juros aos bancos. Na gestão FHC, por exemplo, o BC chegou a estabelecer uma taxa de 48%, ou seja, o governo paga-

ria aproximadamente R$ 1 trilhão de ele, acontecem os financiamentos de juros aos bancos. casa própria e agricultura. O BC também controla quanto O BC deveria controlar a taxa de os bancos podem cobrar de juros câmbio entre a moeda brasileira e as de seus clientes em estrangeiras. A taxa empréstimos. Outra » Imagine entregar do câmbio determifunção é o recolhi- a política monetária na qual será o lucro mento de 40% de todo que as empresas que de um país a quem dinheiro que a popuse dedicam à exporlação deixa deposi- só tem interesse no tação ou importatada nos bancos sem próprio lucro. ção vão ter. Através receber juros. Ao inda emissão do papel vés dos bancos pegarem seu dinheiro moeda, o BC também pode restringir depositado e emprestarem a 48% de ou estimular o comércio, a circulação juros anuais para outros, sem lhe pa- de mercadorias e controlar a inflação. gar nada e lucrando ainda mais, o BC Os bancos comerciais movimentam determina que os bancos repassem bilhões. Cabe ao BC elaborar regras e uma parte desse valor ao Estado. Com fazer uma fiscalização rigorosa sobre

por João Pedro Stedile as suas contas, cuidando para evitar que eles cometam abusos ou coloquem em risco os depósitos da população, entre outras questões. Agora, imagine um poder tão grande não estar sob os cuidados do governo, eleito pelo povo a cada quatro anos, mas sim sendo administrado por um conselho formado pelos próprios bancos? Seria entregar o controle do galinheiro para a raposa. Isso significa “independência do Banco Central”. E é isso o que a candidata Marina Silva defende. Julgue você se será bom ou ruim para o Brasil. João Pedro Stedile é coordenador nacional do MST.

ensino superior

cotas

Finanças de universidades públicas preocupam

USP não representa composição da sociedade

Por Rafael Tatemoto

As três universidades estaduais paulistas viveram uma situação crítica este ano. Funcionários, estudantes e professores paralisaram as atividades na USP, Unicamp e em parte da Unesp. Nas duas primeiras, não ocorriam greves gerais desde 2009. Pela sua duração, esta foi a greve mais longa da história das entidades. A opção por cruzar os braços foi motivada pela decisão do Cruesp (Conselho de Reitores das Universidades Estaduais de São Paulo), órgão que congrega os três dirigentes das universidades paulistas, de não dar aumento salarial em 2014. Segundo o reitor Marco Antonio Zago, a USP está gastando mais do que recebe. 105% do orçamento está

comprometido com pessoal. Na Unicamp e na Unesp cerca de 95% das receitas estão voltadas para a folha de pagamento. Para os reitores, esse percentual deveria ser no máximo de 85%. Atualmente, 9,57% do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), tributo que incide sobre o comércio, é destinado ao ensino superior público em São Paulo. Funcionários, estudantes e professores defendem que essa alíquota suba para 11,6%. Além do aumento desse percentual, também se reivindica uma nova interpretação sobre a lei que regula os repasses. “A interpretação que o governo adota permite que sejam feitos descontos no que se considera como o total do ICMS acumulado”, afirma Francisco Miraglia,

USP Imagens

Entidades criticam falta de transparência na gestão de recursos

Retorno às aulas inicia em 22 de setembro, aós 4 meses de greve

professor do Insituto de Matemática e diretor da Adusp (Associação dos Docentes da USP). Segundo ele, com isso, só em 2013 deixou-se de receber R$ 413 milhões. Para Miraglia, a luta em torno da universidade deve ser

mais abrangente: “É necessário abrir as contas da Universidade, ter transparência”. Como resultado da greve, as três universidades aprovaram reajuste salarial de 5,2%, além de abono de 28,6% aos seus funcionários.

Na USP, praticamente 80% dos alunos aprovados no vestibular de 2013 são brancos. Fora de seus muros, somente 46,2% da população é branca, enquanto 52,9% são pardos ou pretos. Para os movimentos sociais, essa exclusão precisa ser combatida com a reserva de vagas nas universidades – as chamadas cotas. “Ações como essa servem para garantir que a igualdade não fique apenas na letra da lei”, afirma o advogado Hédio Silva Júnior, professor da Faculdade Zumbi dos Palmares, voltada para a inclusão social dos negros. Na USP, um estudante pode conseguir até 25% de bônus na nota. Alunos de escola pública recebem até 20% na pontuação; os outros 5% seguem o critério racial.. De acordo com Hédio Silva Júnior, esse modelo é um avanço, mas não é suficiente. “Já passa da hora de as estaduais terem um programa substantivo de ação afirmativa”, diz o professor.


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A maior descoberta energética do mundo das últimas décadas

Agência Petrobras

PRÉ-SAL

A gigantesca bacia de petróleo do pré-sal pode transformar o Brasil no segundo maior exportador de petróleo do mundo

por Norian Segatto

No litoral do Brasil, a cerca de 7 mil metros de profundidade do nível do mar, encontra-se a maior reserva de petróleo descoberta nos últimos anos no planeta. Parecido com um lago de petróleo gigante escondido nas profundezas do oceano, o pré-sal é a principal riqueza mineral do nosso país. Um tesouro avaliado em 14 trilhões de dólares. Para se ter uma ideia, esse valor seria suficiente para comprar 160 milhões de ambulâncias do SAMU, construir 258 milhões de casas populares, criar 41 milhões de postos de saúde. Ou seja, investir essa riqueza no desenvolvimento do país pode representar a base para garantir o futuro do Brasil. Para descobrir o pré-sal, a Petrobras investiu mais de 200 milhões de dólares em pesquisas e perfurações de poços em alto mar, valor que nenhuma empresa privada se disporia a arriscar. Isso foi possível, pois o governo brasileiro é o maior acionista da Petrobras e bancou o projeto. Hoje, o pré-sal é uma realidade. Dos 2 milhões de barris

de petróleo que o país consome por dia, 500 mil barris vêm do pré-sal, que são resultado da extração de oito anos em apenas 25 poços. Ao longo de sua história, a Petrobras precisou de 31 anos para chegar a este volume de produção, furando 4.108 poços. Porém, o ex-coordenador geral da FUP (Federação Única dos Petroleiros), João Antônio de Moraes, faz um alerta. “Se não se priorizar o pré-sal, vamos importar petróleo e pode faltar energia”, adverte. Ele ainda afirma que “a cada ano, se não houver novas reservas agregadas, o país perde 10% da sua capacidade produtiva. Logo, se não tivéssemos descoberto o pré-sal poderia estar faltando combustível hoje no Brasil. Por isso, considero insanidade ou má fé a Marina [Silva, candidata à Presidência] dizer que não vai priorizá-lo”. RIQUEZA E EMPREGOS O setor de gás e energia é responsável por cerca de 13% do PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil e a Petrobras responde por 99% deste setor, através das atividades próprias e contratações de serviços, construções de novas refina-

rias, encomendas de navios, plataformas, sondas, entre outros investimentos. Isso equivale a três vezes o orçamento de São Paulo. No entanto, nem sempre foi assim. No final do ano 2000, este setor da economia representava apenas 3% do PIB. Quando Luiz Inácio Lula da Silva passou a governar o país, em 2003, tomou a decisão estratégica de fortalecer a Petrobras. Interrompeu o projeto de privatização da estatal, herdado do governo anterior - de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) -, dobrou os investimentos da empresa e nacionalizou as encomendas de plataformas e navios. Atualmente, a Petrobras investe apenas nos estaleiros paulistas R$ 141 milhões por dia. A empresa é a maior responsável pela revitalização da indústria naval brasileira. Em 2003, a indústria naval contava com apenas dois estaleiros e empregava 7.465 trabalhadores. Em pouco mais de dez anos foram construídos oito novos estaleiros e mais de 700 empresas de navipeças. O setor gera hoje 80 mil empregos diretos e 320 mil indiretos.

Fundo social

Investimento nas futuras gerações Criado em 2010, no final do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o Fundo Social do pré-sal é destinado para receber a parcela dos recursos do pré-sal que cabem ao governo federal, como os royalties (valor cobrado pelo poder público das empresas que ganharam a concessão para explorar uma matéria-prima, de acordo com sua quantidade), além de participações especiais. Em dez anos, o poder público

prevê arrecadar R$ 112 bilhões. Em setembro de 2013, a presidente Dilma Rousseff sancionou um projeto de lei que destina 75% dos royalties do petróleo e 50% do Fundo Social do pré-sal para a Educação, até que sejam atingidas as metas do PNE (Plano Nacional de Educação), subindo dos atuais 6,1% para 10% do PIB (Produto Interno Bruto) para essa área, além de 25% dos royalties para a Saúde.

sob o mar

Trabalhadores vão às ruas em defesa da Petrobrás No último dia 15, 10 mil trabalhadores realizaram, no Rio de Janeiro, o ato em Defesa do Pré-sal, da Petrobrás e do Brasil com o objetivo de denunciar o movimento orquestrado por interesses privados contra a Petrobrás. Para as lideranças, os ataques à estatal são um plano de fundo para a privatização e ameaçam a soberania nacional.

No ato, o ex-presidente Lula destacou o poder do pré-sal para o desenvolvimento do país: “O petróleo é o passaporte para o futuro. Imagina se sem petróleo a gente já tem filho de pedreiro se formando engenheiro, filho de empregada doméstica se formando médico, imagina o que podemos fazer quando estivermos tirando 4 mil barris de petróleo?”


entrevista

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Guaracy Mingardi

brasildefato.com.br

Rafael Stedile

Mídia Ninja

por Mariana Desidério

“Muitas vezes polícia vê população como inimiga” A atuação exagerada durante protestos demonstram o despreparo da Polícia Militar para lidar com manifestações de rua. Para o cientista político Guaracy Mingardi, essas ações se explicam, em parte, pela forma como as polícias do país veem a população: muitas vezes como um inimigo. Nesta entrevista ao Brasil de Fato SP, Mingardi fala ainda da falta de vontade política dos governos do PSDB em São Paulo em acabar com a violência policial. Guaracy Mingardi tem doutorado em ciência política pela USP, e foi secretário de Segurança Pública de Guarulhos e subsecretário nacional de Segurança Pública. O comportamento violento e repressor da PM é sistemático no Brasil. O que explica essa postura? A polícia é quem detém o monopólio da violência do Estado. A questão é como ela encarna isso. O que acontece no Brasil é que a polícia, muitas vezes, vê a violência como algo que resolve tudo. É um absurdo o tanto que a nossa polícia mata. A polícia não foi feita para negociar. Existem dois aspectos do trabalho policial: a manutenção da ordem e a atuação contra o crime. A nossa polícia tem muito mais a ver com o controle da ordem do que com o controle do crime. Também tem a ver com o caráter militar da polícia? A partir da ditadura militar se deu cada vez mais características militares para a PM. E a atividade militar tem mais a ver

com identificar o inimigo. A atividade de polícia não tem a ver com o inimigo. Ela tem como tarefa identificar criminosos e levá-los para a Justiça. Mas como nós tivemos toda essa trajetória militar, a ideia militarizada foi muito reforçada e é muito difícil perder isso. Você é a favor da desmilitarização? Eu sou totalmente favorável. Só que a PM é militar por causa de uma cláusula da Constituição. Então a coisa é um pouco mais complexa. E mesmo que consiga desmilitarizar, não significa que a estrutura vai mudar. Para acabar com essa estrutura tem que, em primeiro lugar, acabar com a IGPM (Inspetoria Geral das Polícias Militares), que foi criada pela ditadura e que vincula a polícia ao Exército. Polícia deveria responder ao Ministério da Justiça. Em segundo lugar, tem que acabar com a Justiça Militar Estadual, que é quem julga o policial militar. Todo mundo tem que ser julgado da mesma forma. A terceira coisa é o código disciplinar, que precisa ser modificado de cabo a rabo. Essas mudanças ajudariam a ter uma polícia mais humanizada? Isso demanda tempo e pressão da

“Em SP, nos 20 anos de PSDB, poucos secretários de segurança tiveram políticas para os direitos humanos”

sociedade. A ditadura acabou já faz 20 anos e a gente não tem uma polícia humanizada. A polícia melhorou, mas não é suficiente. Lembre-se que aqui em São Paulo, por exemplo, em 1992, ano do massacre do Carandiru, a PM matou 1.400 pessoas. Mais que o dobro do que está matando agora. Boa parte da desumanização da polícia tem a ver com essa cultura, que vem da Ditadura Militar, mas já existia antes dela. Já na República Velha a polícia civil usava a tortura contra determinadas classes sociais. Mas por que a polícia segue violenta? Porque não houve um esforço do Estado. O Estado discute muito a questão dos direitos humanos, mas não trabalha com isso. Em São Paulo, nesses 20 anos que o PSDB está no poder, foram poucos os secretários de segurança que propuseram uma política para essa área. A Rota, por exemplo, foi criada pelos militares para cuidar dos roubos a bancos em São Paulo, que na época eram feitos pelo pessoal da resistência armada à ditadura. Ela foi feita para o confronto, para dar tiro na rua. A Rota pode ser extinta em uma canetada, mas não teve um governante que acabou com ela. A polícia age de maneira discriminatória? Na verdade, a Polícia foca em um tipo de indivíduo, com vários fatores: de determinada idade, com certas características físicas, incluindo a cor,

que é considerado suspeito automaticamente. Eles atuam muito em cima de pessoas com características que eles acham que são o perfil criminoso. Normalmente são mais jovens, vão mais em cima dos negros do que dos outros. É uma coisa que tem que mudar, mas que é difícil, é cultural, “aprendida” na rua, com os policiais mais velhos. E quanto à atuação em protestos? Em primeiro lugar, nem todo protesto deve ser reprimido. Quando este for o caso, a Polícia deve estar preparada para separar e distinguir aqueles que estão agindo de forma violenta daqueles que apenas desejam se manifestar de forma legítima, que devem ser deixados em paz. É necessário agir com mais inteligência, mais organização. Tem de adquirir esse conhecimento, os protestos vieram para ficar, não vão acabar de uma hora para outra. Qual o primeiro passo para melhorar a segurança pública no país? O ponto zero é que Estado, governantes, o Congresso, precisam se preocupar com o problema, não apenas em períodos de crise. A municipalização da polícia é uma das possibilidades. A outra é unificar as polícias, outra ainda é a desmilitarização. O importante é a gente mexer em alguma coisa, ao menos melhorar o sistema que está aí. É preciso tomar decisões. Não pode ficar como está.


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