A luta contra as transnacionais, pelos direitos e por soberania energética

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ÁGUA E ENERGIA NÃO SÃO MERCADORIAS!


EXPEDIENTE A cartilha “A luta dos atingidos por barragens contra as transnacionais, pelos direitos e por soberania energética” é uma publicação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) Projeto Gráfico

MDA Comunicação Integrada

Secretaria Nacional do MAB Av. Thomás Edison, 301 Bairro Barra Funda São Paulo/SP - CEP: 01140-000 Fone: (11) 3392.2660 www.mabnacional.org.br


APRESENTAÇÃO

Companheiros e companheiras!

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Movimento dos Atingidos por Barragens, em sua trajetória de quase 20 anos, tem procurado despertar e potencializar a organização de milhares de brasileiros atingidos pela construção de barragens que, com seu engajamento, mobilizam-se por justiça social e defendem seu direito de permanência na terra. Para qualificar ainda mais o processo de conscientização e participação dos atingidos na luta pela resistência e pela mudança estrutural deste país, achamos importante que todos nós elevemos nosso nível de compreensão da realidade para interferir coletivamente, enquanto movimento social nacional, pois nossos inimigos agem em todas as regiões do Brasil, assim como nos demais países da América Latina. Esta cartilha tem o objetivo de propiciar a discussão interna no Movimento e com a sociedade em geral sobre temas ligados à soberania energética; ao cenário das hidrelétricas no Brasil; as estratégias e as táticas usadas pelas empresas na construção das obras; as violações dos direitos humanos; e nossa proposta de luta pelos nossos direitos. Que este material seja discutido com o maior número de companheiros e companheiras em cada uma de nossas regiões, nos grupos de base e em todas as oportunidades de formação, pois como já dizia o grande mártir da Independência de Cuba, José Martí, “só o conhecimento liberta”, portanto, conheçamos e acreditemos, teremos muitas vitórias! Boa leitura, boa luta!

Coordenação Nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) São Paulo, dezembro de 2008.



1 ELEMENTOS DA REALIDADE

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s atingidos por barragens e os demais trabalhadores brasileiros vivem um período difícil e contraditório. Difícil por diversos motivos: quase não existem mais rios sem planos ou projetos de pequenas ou grandes barragens. As que já foram construídas atingiram mais de 1 milhão de pessoas, sendo que muitas destas foram excluídas de qualquer direito e as conquistas que tivemos foram depois de muita luta e organização. Nas barragens em construção a regra das empresas tem sido excluir e diminuir os direitos das famílias. Mesmo com tantas barragens, em muitos países da América Latina mais de 40% da população não tem acesso à luz elétrica, e em todos os países, o povo paga caro para que as grandes empresas consumidoras possam ter luz elétrica barata. Nas cidades, o povo convive com o fantasma do desemprego, o aumento do preço da comida, o aumento da violência e a destruição do meio ambiente. A vida do povo está cada vez mais difícil, estamos trabalhando cada vez mais (mais horas por dia e mais dias), mas sobra cada vez menos renda. Mas há um Brasil com outra situação! Nunca os bancos e as grandes empresas, principalmente as estrangeiras, lucraram tanto. As empresas se instalam no Brasil e lucram com a exploração dos recursos naturais (energia, água, minerais, biodiversidade, etc) e dos produtos primários (soja, cana de açúcar, celulose, etc). O lucro do Itaú cresceu 30% e chegou a 1,9 bilhão de reais nos três primeiros meses de 2007, o Bradesco anunciou ganho líquido de 1,705 bilhão de reais. A Companhia Vale do Rio Doce, em 2007, obteve lucro superior a 20 bilhões de reais, ultrapassando a Petrobrás como a empresa que obteve os maiores lucros. A previsão de faturamento na geração das barragens de

Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, em Rondônia, ultrapassará 365 mil reais por hora. E considerando o faturamento na totalidade (geração, transmissão e distribuição), significa mais de 950 mil reais por hora.

Um Brasil rico

com a população pobre. Por quê? A primeira certeza que devemos ter é que não faltam riquezas, e sim que elas (a água, as indústrias, o comércio, as terras...) estão concentradas nas mãos das grandes empresas e bancos. Vejamos o exemplo das barragens: com todo o lucro que os empresários acumulam, o que justifica deixarem milhares de famílias excluídas? O problema está no modelo de sociedade capitalista que vivemos, onde os trabalhadores do campo e da cidade produzem cada vez mais e geram as riquezas, mas não podem usufruir delas. Ou seja: quem produz todas as mercadorias são os operários, quem produz quase toda comida são os camponeses, quem atende nos comércios são os trabalhadores, e assim por diante. Mas quem manda, quem lucra, quem tem o poder e aplica este modelo de sociedade violenta e excludente são as grandes empresas do capital privado. Estes são os inimigos do povo! Para facilitar a atuação das empresas, a maioria das estruturas do Estado (governos, judiciário, polícia, meios de comunicação, etc) se coloca à serviço das empresas. Motivadas pelos altos lucros que geram as barragens e pela crise de falta de petróleo no mundo (crise energética), as empresas planejam construir muitas hidrelétricas (hoje são 1.443 projetos em construção, inventariados ou com estudo de viabilidade). Sem organização, milhares de famílias serão expulsas de suas terras e do seu trabalho.

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2 O CENÁRIO Das

HIDRELÉTRICAS NO BRASIL

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o mundo existem mais de 45.000 grandes barragens construídas que já expulsaram cerca de 80 milhões de pessoas de suas terras. Além disso, existem hoje em torno de 1.600 barragens em construção no mundo. No Brasil, são mais de 2.000 barragens já construídas, destinadas à produção de energia elétrica ou para abastecimento de água. Deste total, em torno de 400 são para geração de energia (156 delas são grandes hidrelétricas e 253 são pequenas centrais elétricas - PCHs). Estas barragens já expulsaram mais de 1 milhão de pessoas, sendo que, em média, 70% das famílias atingidas não recebem nenhum tipo de direito. O destino da maioria destas famílias acaba sendo

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engrossar os bolsões de pobreza nas cidades, ficando sem emprego, sem terra e sem casa. O Plano Decenal de Expansão de Energia Elétrica (PDEE 2007/2016) apresenta um conjunto de 90 usinas hidrelétricas que totalizam uma geração prevista de 36.834 MW. Para os próximos anos (até 2.030), conforme o Plano Nacional de Energia (PNE 2030) há uma previsão de acrescentar mais 130.113 MW de energia elétrica ao sistema brasileiro (deste total, 94.700 MW deverão ser de fonte hídrica (87.700 MW através de hidrelétricas de grande porte e 7.000 MW de PCHs), com necessidade de investimentos na ordem de 286 bilhões de dólares (cerca de 500 bilhões de reais).


Por que tanto interesse e tantos projetos de barragens?

Hoje a energia é o que impulsiona o movimento e o avanço da sociedade, tanto das sociedades socialistas como capitalistas, mas para as capitalistas a energia é indispensável, pois sem ela as indústrias e fábricas deixam de produzir e os empresários deixam de lucrar em grande escala. Um dos destinos da geração de energia elétrica em nosso país é abastecer os grandes consumidores, principalmente a chamada indústria eletrointensiva (indústria de celulose, alumínio, ferro, aço, entre outras) e os grandes supermercados (shoppings). No Brasil, atualmente existem 665 grandes consumidores de energia e sozinhos consomem aproximadamente 30% de toda energia elétrica brasileira, além disso, recebem energia ao preço de custo real. Por exemplo: As mineradoras VALE e ALCOA e a produtora de celulose Votorantim, recebem energia do governo brasileiro a 4 centavos ao kWh (seus contratos são de 20 anos), enquanto a população brasileira paga 50 centavos pela mesma quantidade de energia consumida. Ou seja, com a privatização do setor elétrico as tarifas representam um verdadeiro roubo sobre toda população brasileira.

2 - Pela alta lucratividade do negócio No Brasil, as 30 maiores empresas de energia elétrica formam o setor com segundo maior lucro em 2007. Faturam nas obras de construção, venda de materiais, venda de equipamentos, construindo as obras com financiamento público, superfaturando as obras, vendendo a energia a um preço muito caro para a população, e o governo subsidiando os preços para as grandes indústrias. No mundo, as obras de construção de barragens movimentam aproximadamente 50 bilhões de dólares por ano.

Maiores empresas do setor da energia por lucro líquido ajustado 1. Petrobras (Estatal) 2. Tractebel Energia (Belga-Francesa) 3. AES Eletropaulo (EUA) 4. Chesf (Estatal) 5. CPFL - Paulista (Brasil) 6. Cemig Distribuição (Estatal) 7. Transmissão Paulista (Estatal) 8. Cemig GT (Estatal) 9. Furnas (Estatal) 10. Coelba (Espanha) 11. 12. 13. 14.

AES Tietê (EUA) Copel Distribuição (Estatal) Copel Geração (Estatal) Comgás - Inglaterra / Países Baixos (Holanda) 15. Elektro (EUA)

Milhões de dólares - em 2007 11.404,5 549,6 539,8 538,2 535,2 482,3 454,0 445,4 440,9 391,7 384,4 301,9 287,3 286,7 258,6

Fonte: Revista Exame

1 - Pela importância que ela assumiu na sociedade

3 - Pelo potencial hidrelétrico existente no Brasil O aproveitamento do potencial hidrelétrico no mundo revela que na maioria dos países ricos e desenvolvidos, os principais rios já foram utilizados para construção de usinas. Nestes países, o aproveitamento chegou ao seu limite máximo, apresentando enormes dificuldades na construção de novas barragens. Com isso, a indústria de barragens (formada pelas empresas Siemens, Alstom, General Electric, VA Tech, etc) buscam encontrar novas regiões no mundo para manter seus negócios e altos faturamentos. No Brasil, além de suprir a escassez energética de muitas multinacionais, os capitalistas hegemônicos estão buscando apropriar-se tanto do potencial hidrelétrico já implantado no nosso país como do potencial ainda possível de ser aproveitado. Isso se acelerou com as privatizações das estatais no início da década de 90. Possuímos um dos maiores potenciais do mundo de geração de energia hidrelétrica, algo em torno de 10% do potencial mundial, cerca de 251.490 MW. Deste potencial, 30,9 % já são aproveitados. Em potencial perdemos apenas para Rússia (13%) e China (12%).

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Distribuição do Potencial por região do Brasil: l

64% está na região norte;

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21% está na região Sul;

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8% no sudeste;

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3 a 4% no nordeste;

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2 a 3% no centro oeste.

Fonte: Empresa de Pesquisa Energética-EPE

sim, dependendo da usina, é possível armazenar grande parte da água para utilizá-la posteriormente. e) O Brasil possui um dos sistemas mais eficientes do mundo, é o chamado “Sistema Interligado Nacional”, que permite levar energia de uma região para outra, conforme a intensidade das chuvas, fazendo os lagos das hidrelétricas funcionarem como uma grande caixa de água.

4 - Pela eficiência da fonte hidráulica em produzir energia elétrica a) A mesma água de um rio pode ser utilizada diversas vezes, basta que sejam construídas diversas hidrelétricas num mesmo rio, como se fosse uma escadaria de usinas. Pelo fato de ser interligado pode produzir um ganho de 22% só com sua eficiência. Ou seja, o sistema interligado permite o controle sobre todo rio, sobre a bacia hidrográfica, inter-bacias e inter-regiões.

Eficiência energética é a capacidade que o sistema possui de perder o mínimo de energia possível no processo de transformação de uma energia em outra. No caso da barragem, de transformar a energia mecânica (fluxo da água) em energia elétrica através da turbina. 1

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b) A fonte hidráulica apresenta alta produtividade. A energia hídrica possui alta eficiência energética, algo em torno de 94%. Já a energia elétrica de fonte térmica, predominante no mundo, apresenta no máximo 30% de eficiência.1 c) É a fonte de menor custo de produção, pois a matéria prima utilizada nas turbinas (água) não apresenta nenhum custo, está estocada no lago, por isso o custo médio para gerar 1 Mwh gira em torno de 20 dólares. Devemos lembrar que este baixo custo deve-se à negação dos direitos sociais pelas empresas e por não repararem os danos ambientais. d) É uma energia dita “renovável”, alterando apenas sua intensidade de geração conforme as estações do ano e a intensidade das chuvas. Mesmo as-

Mesmo com todas estas vantagens e o baixo custo para produzir, o Brasil tem a 5º tarifa de energia mais cara do mundo. Por quê? Isto ocorre porque dentro do modelo de sociedade capitalista, a mercadoria “energia elétrica” produzida a baixo custo nas barragens não tem seu preço estabelecido pelo custo de produção real, e sim, pela fonte energética que tiver o maior


custo de produção, no caso, pelo preço do petróleo. Isto aumenta muito o lucro das empresas: produz a energia barata, mas vende cara para a população. E neste cenário de crise do petróleo, a busca de alternativas energéticas, o grande potencial hidráulico nos países da América Latina e os altos lucros obtidos com a hidroeletricidade, fazem com que ocorra uma aceleração na construção de hidrelétricas em todas as regiões do Brasil.

Quem são os donos da energia no Brasil? Os chamados “donos da energia” têm sido uma fusão de grandes bancos (Santander, Bradesco, Citigroup, Votorantim...), grandes empresas energéticas mundiais (Suez Tractebel, AES, Duke, Endesa, General Eléctric, Votorantin...), grandes empresas mineradoras e metalúrgicas mundiais (Alcoa, BHP Billiton, Vale, Votorantim, Gerdau, Siemens, General Motors, Alstom...), grandes empreiteiras (Camargo Correa, Odebrecht, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão...), e grandes empresas do agronegócio (Aracruz, Klabin, Amaggi, Bunge Fertilizantes, Stora Enso, etc). Pelo organograma exibido abaixo, vemos que os planos de construção de hidrelétricas, da forma como a produção de energia está organizada, são planos pensa-

dos para satisfazer interesses de grandes bancos e grandes empresas, chamadas multinacionais, que querem controlar principalmente a energia, a água, o rio e todas as riquezas para aumentar seus lucros. No entanto, grande parte do dinheiro investido nestas empresas vem do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que tem acelerado a liberação de recursos, principalmente em cima do discurso do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Este banco, inclusive, mudou até seu estatuto para permitir maiores liberações. Por exemplo: - A mineradora VALE teve um financiamento aprovado pelo BNDES há pouco tempo de 7,3 bilhões de reais; - Para Hidrelétrica de Simplício (localizada no rio Paraíba do Sul - RJ), o BNDES aprovou 1 bilhão de reais; - Para a UHE Foz do Chapecó (na região sul do Brasil), aprovou 1,6 bilhões de reais. Como já mencionamos acima, estas empresas batem recordes de lucro ano após ano: 2007 foi o ano que as empresas de energia conseguiram os maiores lucros da história do setor elétrico brasileiro. As 17 maiores companhias de energia (excluindo a Eletrobrás) tiveram uma receita líquida de R$ 64 bilhões, sendo que R$ 12 bilhões foram de lucro limpo.

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3 ESTRATÉGIAS E TÁTICAS “As empresas democratizaram seu discurso, mas sua prática é como na ditadura.” Hélio Mecca, agricultor atingido pela UHE Itá-RS

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USADAS PELAS MULTINACIONAIS NA CONSTRUÇÃO DE HIDRELÉTRICAS

s empresas, os governos e os meios de comunicação divulgam todos os dias que as barragens são de “interesse público”, que será para o “desenvolvimento da região”, para “geração de empregos”, que será para “abaixar o preço da energia”, etc. Na verdade, estes projetos não são nem de interesse da classe trabalhadora brasileira, e muito menos da população atingida pelos lagos. Os verdadeiros interessados são as grandes empresas multinacionais. A seguir buscaremos explicar como elas agem para conseguir seus objetivos.

1. O único objetivo das empresas é o lucro

seus aliados. As empresas defendem que a origem dos conflitos sociais e ambientais existentes em uma região é a falta de informações das “coisas boas que a obra traz” para essa enorme quantidade de gente “ignorante” que vivem no entorno das construções das barragens. As empresas e os governos não entram em debate se deve ou não ser construída tal obra, ou a quem isso vai servir, etc. Toda estratégia é colocada para que os “indesejados” que habitam nesta região “DIGAM SIM” da forma mais obediente possível. Para obter este sim, até a polícia e o exército são colocados sobre o povo.

O objetivo dos capitalistas quando vêm se instalar em uma região é um só: extrair muito lucro. Para isso, precisam apropriar-se das riquezas naturais mais estratégicas e explorar o povo. Para garantir este lucro, em taxas mais altas possíveis, no menor tempo possível, com o menor risco e por muitos anos, as empresas elaboram uma estratégia de dominação sobre toda região (ou território) em que vão instalar seus planos. Nas diferentes fases de implantação dos seus projetos há um conjunto de interesses aliados a um conjunto de práticas que buscam garantir e dar sustentação a seus objetivos. A isso chamamos de estratégias e táticas das empresas.

2. Como as empresas agem

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A estratégia adotada pelas empresas geralmente é a mesma. Tentam esconder que a riqueza dos empresários vem da exploração sobre o povo e sobre a natureza. Buscam tornar os afetados (prejudicados) e os descontentes em

Exército ameaça atingidos pela barragem de Tucuruí, PA

Antes de iniciar a construção de uma hidrelétrica, geralmente são elaborados levantamentos e estudos iniciais, feitos de forma discreta para evitar que a população desperte interesse e curiosidade sobre o que será implantado ali nesta região. É o tempo necessário para elaborar o plano do que será feito. Montado o projeto da obra, aí vem uma fase de muita propaganda e promessas sobre as “coisas boas” que a obra vai trazer para a região. É o período que se inicia a implantação do projeto. Nesse período,


a estratégia principal utilizada pelas empresas é o “convencimento através de promessas”, ou seja, desenvolvem um conjunto de ações para informar aos “desinformados” sobre os benefícios que esta obra ‘vai’ trazer para região. Utilizam diferentes formas e práticas: estudos técnicos, governos, seminários, reuniões, uso do sistema S (Sebrae, Senai, etc), universidades, pesquisadores, escolas, empresas, falsas organizações, etc. Tudo isso para convencer e fazer com que a população aceite, apóie e até defenda seus projetos de exploração. Isso tem feito muita gente ficar do lado das empresas sem sequer saber o que está em jogo. No caso do aparecimento de conflitos em torno da implantação, a estratégia de tratamento e a solução do conflito é sempre a individualização e o fracionamento, tratando a situação caso a caso (barragem por barragem, município por município, comunidade por comunidade, categoria por categoria, família por família) para nos enfraquecer, diminuir nossa capacidade de resistência e, desta forma, explorar ao máximo a fragilidade de cada família e de cada pessoa. A partir do momento que a população se encontra desorganizada e sem força, buscam então a solução “negociada”. O uso da “negociação” é sempre para a desmobilização social. Buscam enquadrar os descontentes (organizados) em espaços paritários de participação para neutralizá-los, é a chamada governança. Por isso insistem e querem que participemos dos foros de negociações, comissões, conselhos, mesas, equipes paritárias, etc, espaços sempre dominados por eles ou por seus aliados. Instituições como o Banco Mundial e Centros de Investigação e Apoio das multinacionais criaram planos e manuais com técnicas e passos para poder controlar melhor a população, principalmente aqueles setores mais descontentes e mais organizados. Para implantar suas obras numa região, com “paz e harmonia” as empresas estabelecem um processo de despolitização dos conflitos através de táticas de negociação direta e individualizada.

Em nome de oferecer “uma técnica de solução de conflitos rápida, ágil, flexível e particularizada a cada caso” e “uma justiça menos dispendiosa (mais barata)”, tratam de psicologizar o dissenso e tecnificar seu tratamento através de manuais destinados a transformar os “pontos quentes” em “comunidades de aprendizado”. Os pontos ditos “quentes” são aqueles em que a sociedade se organiza para defender-se da dominação que sobre ela é exercida. As “comunidades de aprendizagem”, por sua vez, são os grupos “convidados” a se submeter a esta dominação sem fazer tantos questionamentos. As ações são realizadas para que a comunidade se desorganize e para que não dê tempo de raciocinar sobre a raiz dos problemas que a população vive. Este receituário do conformismo, de alienação das pessoas, de instalação do medo e do desespero, ou até mesmo da ilusão, tem o objetivo de levar as comunidades a “DIZER SIM” aos grandes projetos de interesse das multinacionais. As técnicas que obtém sucesso no controle de conflitos sociais e ambientais, depois as empresas passam utilizar em outros lugares do país e do mundo como técnicas que “deram certo” para dominar e controlar o povo com o menor custo possível. Para quem não entra no jogo deles, aí aplicam todas as regras da luta de classes (correlação de forças) para tentar neutralizar ou liquidar os setores mais organizados e conscientes. Inclusive os direitos historicamente conquistados através de muita luta, para as empresas é uma questão de tempo e de correlação de força. Na hora em que a gente diminui a nossa organização e nossa força de luta eles tentam dar o golpe. Isso acontece justamente nos países que exportam seus recursos naturais, através de barragens e minérios por exemplo. Para tornar aceitável este saqueio internacional sobre nossa economia, se faz necessário neutralizar, de algum modo, a ação das populações que resistem aos processos de concentração de recursos naturais nas mãos de grandes grupos econômicos (multinacionais e bancos). Principalmente projetos relacionados à gestão das águas, das terras, dos minérios, das fontes energéticas, da biodiversidade e das obras de infra-estrutura.

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3. Mais barragens, menos direitos A energia elétrica no Brasil tem garantido enormes lucros às empresas de energia principalmente porque as tarifas tem significado um verdadeiro roubo. Nos próximos anos as empresas querem construir muitas hidrelétricas. Para aumentar ainda mais os lucros, querem diminuir ainda mais os gastos com os problemas sociais e ambientais que causam. É notória, por parte das empresas, a tentativa de diminuir a quantidade e a qualidade nos direitos da população atingida. Quando concedem algum direito, o fazem de maneira que não fortaleça a organização dos atingidos ou então que a conquista não se transforme em ganho de todos ou para todos, resultado da luta e organização.

Para executar estes projetos a empresa envolve diversos atores da região como institutos, ONGs, Universidades, profissionais das diversas áreas técnicas, etc. Não raro, envolvem pessoas com uma trajetória de “esquerda”. Os projetos visam sempre transformar os atingidos em “empreendedores”, de forma que não apareçam os conflitos. Outro fato que devemos considerar na prática das empresas é o aumento da exploração dos trabalhadores das próprias empreiteiras, ou seja, não respeitam nem seus próprios funcionários, como exemplificaremos Família atingida pela Barragem de Cana Brava, GO. adiante. A Tractebel nega os direitos das famílias.

Esta situação piorou a partir do momento que a energia elétrica foi privatizada pelo governo FHC. Agora, mesmo com vários anos de governo Lula, a situação não se alterou e as empresas continuam agindo da mesma maneira: impediram a aplicação do conceito de atingido aprovado pela Eletrobrás, barraram a discussão da garantia de direitos mínimos ao atingidos, estão negando o direito ao reassentamento, etc.

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de São Paulo com um gerente já designado e financiam projetos de desenvolvimento para as famílias interessadas. Os juros são altos, mas a propaganda é enorme.

Agora a novidade na prática das empresas é ganhar o apoio da própria população atingida. É o que estão fazendo nas barragens de Cana Brava, Foz do Chapecó, Campos Novos, Barra Grande, Estreito e diversas outras em todo o país. Nestas barragens citadas, as empresas criaram um fundo (crédito rotativo chamado de Fundo de Desenvolvimento Regional) com o discurso de que este crédito vai “solucionar os problemas sociais e gerar desenvolvimento às famílias”. Colocaram o SEBRAE para gerenciar, trouxeram uma cooperativa de crédito

4. Centros de estudos das multinacionais e Banco Mundial ‘sugerem’ licenciamento ambiental submisso aos empresários Recentemente foi tornado público o resultado do estudo realizado pelo Banco Mundial, por solicitação do Ministério de Minas e Energia. O estudo intitula-se "Licenciamento ambiental de empreendimentos hidrelétricos no Brasil: uma contribuição para o debate". O estudo é apresentado pelo governo, por empresas privados nacionais e estrangeiras, e pelas Instituições Financeiras Internacionais, como o FMI, BIRD e Banco Mundial. Apresentam a estratégia para desmontar as leis e exigências ambientais do país. Uma das sugestões propostas é a emissão de licenças únicas por bacia hidrográfica, um sinal verde para a construção de várias usinas numa mesma região. A Asso-


ciação Brasileira da Infra-estrutura e Indústrias de Base (ABDIB), que reúne as empresas privadas no país voltadas para o setor, há muito tempo faz pressão por redução do tempo e facilitação do licenciamento ambiental. O estudo atende este “pedido”. Para as empresas ainda é pouco, agora querem diminuir os gastos com compensações ambientais e sociais. “Incerteza regulatória e margem de lucro inferior ou igual à média internacional não atraem investidores”, diz a chantagem na forma de “estudo técnico". Querem saber inclusive como impedir que o Ministério Público se interponha como revisor técnico do processo de licenciamento.

SOBRE QUEM E COMO AS EMPRESAS PRESSIONAM [ Pressão sobre o Estado e os governos Os chamados “donos da energia” querem e usam o Estado e os governos (federal, estaduais e municipais) para servir aos seus interesses: garantir o máximo de lucro aos capitalistas da energia e ao mesmo tempo desorganizar e controlar o povo. Vejamos algumas ações:

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O custo de todo e qualquer investimento do setor elétrico é repassado na tarifa final através dos aumentos na conta de luz. Por isso a tendência é o povo pagar cada vez mais caro pela energia elétrica. Não é especifico só das empresas do setor energético, mas várias regras foram criadas para permitir a remessa dos lucros para o exterior.

2. Implantação das Parcerias Público-Privadas (PPPs): há pouco tempo a privatização ocorria de forma direta, agora se tornou um pouco mais disfarçada. Nas PPPs, as empresas públicas podem ser apenas “sócias” minoritárias nas obras. Ou seja, sempre a empresa privada tem maior poder de decisão. No entanto é o BNDES (dinheiro público) quem financia até 80% da obra. O povo paga e quem fica de dono são as multinacionais.

Licença Ambiental Prévia antes da licitação, ou seja, quando uma obra é leiloada já vem com a licença. Antes a grande queixa era de que uma empresa ganhava a licitação, mas depois tinha dificuldade de obter a licença para construir a obra.

3. Divisão do IBAMA (IBAMA e Instituto Chico Mendes) buscando facilitar a liberação das licenças: como mencionamos acima, recentemente foi divulgado estudo feito pelo Banco Mundial por encomenda do Governo Federal cujo objetivo foi obter recomendações para agilizar os licenciamentos. Uma das constatações foi culpar principalmente os promotores públicos pelos atrasos na liberação das licenças. Aqui cabe lembrar que as Audiências Públicas exigidas pela legislação não passam de meras farsas. Muitas obras continuam operando sem Licença de Operação, e outras não sofrem nenhuma penalização apesar de não estarem cumprindo as chamadas condicionantes.

Leilões de energia: significa lucro garantido para as empresas por 30 anos sem necessariamente gerar energia. Uma obra que passará a produzir energia somente em 2010 ou 2012, já tem garantida a venda desta energia pelos próximos 30 anos. Depois de construída a hidrelétrica, caso esteja sobrando energia, a empresa continuará recebendo normalmente o dinheiro como se estivesse gerando energia.

4. A falta de regras no tratamento sócioambiental: atualmente cabe a empresa interessada fazer o estudo e relatório de impacto ambiental (EIA/Rima). Com isso criaram uma “indústria” que define, por critérios próprios, quem tem ou não direito, quem vai ou não ser indenizado (conceito de atingido), qual vai ser o valor da indenização e como aplicar esta indenização. São as próprias empresas que definem isto.

1. Em 2004 foi apresentado pelo governo o “novo” marco regulatório do setor elétrico. Estas são algumas das medidas desse marco: l

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5. Programa de Aceleração do Crescimento (PAC): dos 503.9 bilhões de reais que estão previstos para serem gastos, 274,8 bilhões são para criação de infra-estrutura na área da energia.

As obras no rio Madeira são consideradas pelo governo como prioritárias no PAC

6. Facilitou e ampliou a liberação de recursos públicos para obras privadas principalmente através do BNDES que pode financiar até 80% do total da obra. Como as barragens na sua maioria são superfaturadas o BNDES acaba financiando toda obra. 7. Violência e criminalização dos movimentos sociais e das lideranças: este é um dos elementos mais agravantes. É uma ditadura na barranca dos rios. Na UHE Estreito, um agricultor atingido pela barragem levou um tiro de capangas da empresa construtora da obra durante a mobilização. Sempre que os atingidos fazem alguma luta, são ameaçados, perseguidos e processados. Em quase todas as obras em construção os serviços de inteligência, a polícia e grande parte do judiciário utilizam as mesmas práticas: ameaçam as famílias, perseguem, processam lideranças, prendem, multam através dos órgãos ambientais, etc. Por outro lado, é comum ver empresas reformar prédios do judiciário ou até mesmo ver denúncias de pagamento de diárias a policiais.

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8. A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) é um verdadeiro ninho das empresas privadas. Enquanto deveriam estar fiscalizando as empresas, na verdade o que mais fazem é conceder aumentos

nas tarifas de energia elétrica e liberação de novas hidrelétricas. 9. Os meios de comunicação, em sua maioria, que recebem concessão para prestar serviços públicos, na verdade não fazem isso e os governos não dão a mínima importância para este tipo de atitude. As empresas passam a financiar através de patrocínios e de outras formas obscuras os meios de comunicação local (rádios, TVs, jornais,...) com o objetivo de divulgar notícias a seu favor ou até mesmo para omitirem notícias verdadeiras. Há casos em que rádios foram proibidas de dar espaço a pessoas que eram ligadas ao MAB e em outros casos as empresas exigiram a demissão de alguns trabalhadores de rádios ou cortariam os patrocínios. [ Pressão sobre a sociedade As ações iniciais das empresas são, principalmente, ganhar a opinião pública para legitimar e até mesmo buscar apoio para fazer coisas que contrariam os “valores” da sociedade, como expulsar agricultores violentamente e destruir o meio ambiente,, por exemplo. Geralmente fazem um discurso de duplo caráter: cheio de promessas para a sociedade em geral ou de ameaças para os que resistem. No primeiro caso, são bastante otimistas e direcionados para o conjunto da população ou para algumas categorias específicas. Já o discurso de ameaças pressiona grupos ou toda população, fazendo com que ela assuma um sentimento de culpa caso questione ou coloque em risco as obras. A seguir, relacionamos algumas formas de promessas e ou de ameaças: l

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Dizem que as obras serão para “geração de empregos”, e quem não concorda é porque não quer gerar empregos; Dizem que farão “aproveitamento da mão de obra local”. Para iludir o povo desenvolvem cursos de “qualificação técnica”, criando uma falsa esperança na população;


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Dizem que quem não concorda com a obra são os que “retardam o progresso e o desenvolvimento da região e do país”; Ameaçam a população com o discurso de que “caso as hidrelétricas não forem construídas faltará energia ao povo”, criando a falsa idéia de um apagão; Dizem que com a hidrelétrica vai ajudar a diminuir o preço da energia ao povo;

l Dizem que a hidroeletricidade é a ener-

gia mais limpa e vai ajudar para preservação do meio ambiente, etc.

As empresas interessadas nas obras, como a Tractebel, Alcoa, Votorantin, Bradesco, Vale, etc, não aparecem com seus verdadeiros nomes para evitar que a população da região saiba de fato quem são os beneficiados. Criam e utilizam nomes como se fossem do local (Consórcio Foz do Chapecó, Consórcio Madeira Energia, Consórcio Estreito, etc). Esses nomes são máscaras e isso confunde muita gente! Outra forma bastante utilizada são os “financiamentos”, “patrocínios” ou até mesmo doações a determinadas pessoas e/ou entidades, com recursos contabilizados nos custos gerais da obra. Financiam pequenos projetos para comunidades e bairros, financiam reforma de prédios do fórum, de delegacias, construção de casas para alguns policias, fazem doação de ambulâncias para o corpo de bombeiros, etc.

de cooperativas. E fazem isso das mais diferentes formas: dando dinheiro, dando estrutura, financiando pequenos projetos, convidando para eventos, etc. Mas a lista não acaba aí, compram também estudiosos, professores, pesquisadores, setores das universidades através de projetos de pesquisa ou extensão que são financiados em forma de parcerias. Por fim, criam comitês e frentes próbarragem, envolvendo fundações, institutos, políticos, cooperativas, sindicatos, imobiliárias, governos, partidos, mídia, judiciário, etc, para ajudar a fazer pressão e propaganda a favor da obra. As pessoas e entidades que, num primeiro momento, são envolvidas no processo de legitimação de obra, depois são abandonadas pelas empresas. Em diversos lugares do Brasil as situações são as mesmas, depois que a barragem já está instalada e gerando energia, as empresas donas das barragens se retiram da região, encerram contratos e convênios, enganando pessoas e entidades. [ Pressão sobre os atingidos por barragens Depois de ganhar a opinião pública vem a construção da obra, a retirada das famílias e remoção das comunidades. O grande objetivo das empresas é fazer tudo isso gastando o mínimo possível, pois menos custo significa mais lucro.

Além disso, compram espaços nos veículos de comunicação, patrocinam programas e fazem propagandas em horários nobres. Se não bastasse, financiam campanhas de governadores, deputados, prefeitos e vereadores ou líderes de entidades para deixá-los de “rabo preso”, como se diz popularCasa queimada durante despejo de família na UHE Foz do Chapecó mente. Na verdade é uma forma de fazer estas pessoas trabalhar a serviço Outro fator importante é fazer a obra dos interesses destas multinacionais. Tem dentro do cronograma estabelecido, ou seja, um ditado popular que diz: “Quem paga a atraso significa perder dinheiro. Como a probanda, escolhe a música”. dução da energia é muito lucrativa e tem um Buscam comprar líderes comunitários, presidentes de associações, de sindicatos,

retorno imediato, quanto antes estiver gerando energia melhor para a empresa.

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Aqui nos parece que foi onde as empresas mais qualificaram sua atuação. “Vendem” uma imagem da barragem como sinônimo de desenvolvimento, como única forma de promover desenvolvimento, principalmente para regiões pobres e sem acesso a políticas públicas. Este encantamento inicial encontra apoio em parte da sociedade e até boa parte dos atingidos são enganados por este discurso. Mas o tempo e a realidade, principalmente perante a população diretamente envolvida, desmentem este discurso. Parece que no último período, as empresas se deram conta que o discurso e a promessa de desenvolvimento para a “sociedade” já não atende mais seus objetivos. Agora tentam “liberar” pequenos projetos ou criam fundos de desenvolvimento para propagar a idéia de empreendedorismo. Ao mesmo tempo, as empresas não querem aumentar a concessão de direitos aos atingidos. Então criam e qualificam uma série de artimanhas voltadas principalmente para neutralizar e acalmar os atingidos pela barragem e não deixar fortalecer sua organização.

Formas de indenização aplicadas pelas empresas O plano de ação para retirar a população atingida se desenvolve seguindo vários passos. Este plano de ação ocorre paralelamente aos “passos utilizados na construção e viabilização de toda hidrelétrica”. A construção de barragens iniciou-se a mais de 100 anos aqui no Brasil. Mas os primeiros direitos das famílias passaram ser reconhecidos apenas a partir dos anos 80. Todos os direitos que existem hoje são frutos de muita luta e organização. Nada foi ganho, tudo foi conquistado. Novamente as empresas querem diminuir os direitos, negando ou até diminuindo as formas de indenização.

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Para aquelas famílias que conseguem o direito, a principal opção

aplicada e utilizada pelas empresas é a indenização em dinheiro, aproximadamente 60% a 70% das famílias são obrigadas a receber desta forma, pois custa mais barato para as empresas. Depois a empresa busca liberar a chamada carta de crédito (20%). O reassentamento é algo que as empresas buscam evitar, pois isso mantém as famílias organizadas além de custar mais caro para a empresa. A recuperação das comunidades ribeirinhas é outra coisa que as empresas evitam reconhecer. E se falarmos em investimento para o desenvolvimento da região é praticamente zero.

A seguir explicaremos como as empresas fazem para retirar a população atingida 1. Fase de elaboração dos estudos e reconhecimento da região, para pensar o plano de retirada das famílias. A retirada das famílias se dará após a liberação da Licença de Instalação da obra e quanto mais rápida é a construção da obra, maior é a pressão sobre as famílias. 2. Depois de montado o plano, vem então a chamada “limpeza” do território: com a Licença de Instalação, as empresas passam a fazer o trabalho de retirada da população para poder implantar a barragem. Muitas famílias são expulsas sem receber nenhum tipo de direito e outras recebem valor injustos. A primeira área a ser “limpada” é o canteiro de obras. Nesta área as empresas aplicam práticas e métodos que servirão de exemplos pedagógicos, indenizações altas para alguns, direito negado e/ou despejo judicial para outros, queima de casas, etc. Depois da “limpeza” do canteiro, vem a fase de “limpeza” das demais comunidades. Como fazem esta limpeza? Através da aquisição de propriedades.


A prática principal é a aquisição somente das terras dos proprietários, chamamos isto de concepção territorial patrimonialista. Para as empresas, atingido é só o proprietário de terra encoberta pelo lago com o título/escritura da terra. Neste conceito não há propriamente prejuízos e nem famílias atingidas e menos ainda qualquer coisa que possa ser entendida como direito dos atingidos. O que há é o interesse de desapropriação do território por interesse público exercido pela empresa. Neste sentido, o “problema” se reduz a negociar apenas com os proprietários o valor da propriedade. Para adquirir esta propriedade a empresa faz um levantamento e elabora uma proposta de valor a ser pago pela indenização. O mais estranho neste processo é que a empresa interessada que “contratou” os estudos de viabilidade da obra, é quem por seus critérios define quem são os atingidos e qual o tipo de indenização ele tem direito (o valor, a carta de crédito, o reassentamento, o remanescente). Por fim é ela quem aplica o direito. Se a família achar injusto e não aceitar, a empresa torna a vida desta família um verdadeiro inferno, pressionando e ameaçando. Se não houver uma “negociação amigável” para se chegar a um acordo, a empresa encaminha para a disputa judicial, ou seja, faz o depósito em juízo do valor que a empresa acha justo e encaminha o despejo desta família. A demora do setor judiciário, que pode levar anos até o julgamento final, faz as famílias aceitarem os baixos valores pagos. É muito comum ocorrer isso. As famílias que vivem na comunidade são os verdadeiros donos das terras e não precisam “provar” sua atividade para perceber que dependem desta região, mas a grande parte acaba com direito negado. Quando a empresa chega com as Licenças e o poder de “desapropriação” por utilidade pública, passa a ser dona das ter-

ras e a situação se inverte: os donos deixam de ser donos e a empresa (invasora) passa a ser a dona das terras. O próximo passo dado pela empresa é negar o direito aos atingidos, para mostrar que a empresa é quem detém o poder de agora em diante. Não ter direito é igual a não existir. Para reverter o caso negado ou o valor das indenizações, a família de vítima passa a ser suspeita, pois é ela que terá de provar que tem direito. A empresa passa a exigir todo o tipo de provas e documentos e informações, mas tudo para gerar um grande apavoramento e desespero. Com medo de perder tudo muitas famílias acabam aceitando qualquer “migalha” oferecida pelas empresas ou aceitando a condição de direito negado. Muitas ainda saem endeusando a própria empresa.

Empresas superexploram seus próprios operários A situação dos trabalhadores/as nas hidrelétricas é de superexploração. Isso tem causado revoltas cada vez mais freqüentes. Em março de 2008, aproximadamente dois mil funcionários da barragem Foz do Chapecó (no rio Uruguai) se revoltaram dentro do canteiro de obras, incendiaram caminhões, alojamentos, saquearam os caixas eletrônicos, etc. Por três dias a empresa perdeu o controle total da construção no canteiro.

Inconformados, operários destruíram alojamentos do canteiro de obras da UHE Foz do chapecó

Quais são as queixas mais freqüentes dos trabalhadores/as? _ Baixos salários; _ As jornadas de trabalho são longas, na maioria sem direitos trabalhistas, pois

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grande parte os serviços é terceirizado e através de contratos temporários; _ O trabalho é insalubre e sem segurança; _ As empresas trouxeram os trabalhadores de estados distantes e agora não pagam a passagem de volta para a região de origem; _ Grande parte dos operários não pode sair do canteiro de obras nem para depositar dinheiro para suas famílias que moram longe; _ Há excesso de violência dos seguranças da obra com relação aos trabalhadores e as condições são bem diferentes das promessas e das propagandas da própria empresa; _ O canteiro de obras tem cerca e valas; _ A alimentação é de péssima qualidade.

As cercas estão em volta de todo o canteiro de obras impedindo os operários de saírem por qualquer lugar.

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O caso de Foz do Chapecó não é o único! No dia 24 de março de 2008, um grupo de 1200 operários que trabalham na construção do complexo industrial da Votorantim Celulose e Papel e da empresa International Paper, em Três Lagoas (MS), se revoltaram e atearam fogo em um dos pavilhões, reclamando de falta de comida e condições de trabalho. Recentemente, na UHE Estreito (TO/MA), ocorreu reação semelhante. Além dos próprios trabalhadores das obras, os trabalhadores do setor elétrico também são muito prejudicados. Em Minas Gerais, por exemplo, os eletricitários estão vivenciando uma mudança drástica na sua relação de trabalho. Os trabalhadores terceirizados que prestam serviços para a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) recebem salários menores que trabalhadores que ainda são da empresa, possuem menos direitos e piores condições de trabalho. Além disso, devido o treinamento precário, são eles as principais vítimas de acidentes graves e fatais. De 1999 até junho de 2007, 68 trabalhadores morreram prestando serviço, dentre as vítimas, 48 eram trabalhadores terceirizados pela Cemig, judicialmente co-responsável pelos acidentes.


4 BARRAGENS É VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS:

OS ATINGIDOS PAGAM A CONTA

O

MAB e alguns pesquisadores sempre afirmaram que são os atingidos por barragens, em específico, e o povo brasileiro, de modo geral, quem paga a conta dos grandes projetos hidrelétricos do país e do baixo preço da energia pago pelas grandes empresas. Em breve isto poderá ser provado por A + B. Uma comissão especial criada pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), da Secretaria Especial dos Direitos Humanos ligado ao Ministério da Justiça, está analisando denúncias de violações de direitos humanos na construção de hidrelétricas. A comissão realizou visitas a todas as regiões do país e está analisando os seguintes casos: - Usina hidrelétrica de Tucuruí, no Pará; - Barragem de Acauã (captação água), na Paraíba; - PCH’s de Emboque e Fumaça, e Barragem de Aimorés, em Minas Gerais; - Usina hidrelétrica de Cana Brava, em Goiás; - Usina hidrelétrica de Foz do Chapecó (Rio Grande do Sul e Santa Catarina). Os resultados preliminares do trabalho da comissão confirmaram aquilo que o MAB sempre denunciou: o “progresso” causa retrocesso nas condições de vida da população atingida. O Brasil reconhece o direito de toda pessoa humana ao “não retrocesso nas suas condições de vida”. Este direito está reconhecido pelo artigo 11 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), nos seguintes termos: “é obrigação do Estado (governo) garantir um nível de vida adequado para si próprio e para sua família, inclusive a alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim

como uma melhora contínua nas suas condições de vida”. Ao dizer que está garantida uma melhora contínua das condições de vida, está se afirmando que as obras e ações do Estado (governo), como as barragens e outros grandes projetos, devem melhorar as condições de vida dos atingidos, e não piorar! Ou seja, não pode haver retrocesso. Por exemplo, se antes da obra, os pescadores tinham a sua atividade de pescadores e com ela sobreviviam, depois da obra, estas pessoas não podem perder suas atividades, ou deve lhe ser garantido outra atividade. Outro exemplo: se antes da obra as pessoas tinham direito à posse da terra e a moradia, não podem ficar sem terra ou moradia depois da obra.

“O povo bate na barragem dura até que fura!” Dito popular de atingidos por barragens do Equador

Todavia, não é isto o que vem acontecendo no Brasil. Em todos os casos analisados pela comissão, os indícios são de que, cada vez mais as condições de vida pioram: alimentação, moradia, perda de atividades econômicas, perdas ambientais. Também está sendo comprovado que não estão ocorrendo “justas e prévias” indenizações aos atingidos, e que ocorrem uma série de violações de direitos humanos.

Os estudos de caso têm provado que as violações de direitos mais comuns são: a) violação do direito à informação, na medida em que não são realizadas audiências públicas nos municípios e comunidades atingidas, como tampouco tiveram os cidadãos acesso a outras fontes de informação acerca da situação que vivenciariam, ou seja, quando teria início a construção, quando se daria o enchimento do lago, a que tipo de reparação teriam direito, que casas e outras edificações seriam alagadas etc.

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b) violação do direito ao trabalho: - daqueles que eram agricultores e que foram reassentados em áreas que não lhes permitam trabalhar na agricultura; - dos não proprietários aos quais não foi dado oportunidade de reinserção produtiva, resultando grave desemprego; - na medida em que a supressão das condições ambientais pré-existentes inviabilizou as capacidades técnicas de muitos atingidos, e em outros casos ocorreu a eliminação das condições de exercício de qualificações profissionais sem uma adequada requalificação dos trabalhadores ou reposição daquelas condições; c) violação do direito à propriedade e a justa indenização, na medida em que proprietários não receberam indenizações pela desapropriação de seus imóveis ou receberam indenizações que não recompuseram sua situação anterior; d) violação do direito à moradia, visto que: - as populações reassentadas foram alojadas em construções inadequadas, ou seja, em condições piores às anteriores; - parte da população deslocada não reassentada recebeu indenização insuficiente para garantir uma moradia adequada, ou não recebeu nenhum tipo de indenização (trabalhadores rurais); e) violação direito à educação, uma vez que houve uma degradação das condições de acesso à educação adequada; f) violação do direito à saúde em razão da inexistência de postos médicos nos reassentamentos ou alternativas de atendimento médico acessíveis; bem como precariedade ou inexistência de infraestrutura de saneamento básico; g) violação do direito à alimentação, na medida em que ocorre o comprometimento da dieta alimentar das famílias com o comprometimento da agricultura de várzea, a redução dos estoques pesqueiros e de espécies vegetais tradicionais;

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h) violação do direito ao meio ambiente seguro e sadio, na medida em que as barragens causam graves danos para as

populações que dependiam do seu meio ambiente original para sobrevivência (pescadores, ribeirinhos, indígenas, etc), algumas inclusive, sem estudo prévio de impactos ambientais; i) violação dos direitos culturais, na medida em que a construção de barragens ocasiona a perda dos conhecimentos e costumes tradicionais, que conformavam a identidade histórica das pessoas e dos lugares, e também ligada ao sentimento religioso das famílias, pela perda de locais tradicionais de culto e onde estavam enterrados seus antepassados, ocorrendo inclusive, casos de cemitérios que não são removidos e ficam embaixo d’água; j) violação do direito à razoável duração do processo legal e ao acesso a justiça, na medida em que os atingidos não possuem condições de pagar advogados para ingressar com ações judiciais e que na maioria dos casos não há defensoria pública, e ainda, aqueles que conseguem ingressar com ações judiciais, pela excessiva demora no julgamento dos processos; O caso da Barragem de Acauã é emblemático, pois até o Ministério Público Federal da Paraíba entrou com uma ação civil pública contra o estado e a União por não ter disponibilizado os meios de vida que os moradores possuíam antes da barragem. O reservatório, concluído em agosto de 2002, provocou o deslocamento de aproximadamente 4.500 pessoas (cerca de 800 famílias) que viviam às margens do rio e dali tiravam seu sustento. As águas atingiram as zonas rurais das mencionadas cidades, inundando completamente esses povoados. Para o Ministério Público Federal, a remoção das comunidades situadas na bacia da Barragem de Acauã trouxe desestruturação para as economias familiares dos atingidos, provocando carências derivadas da suspensão das atividades produtivas e do deslocamento para conjuntos habitacionais sem nenhum serviço de atendimento e atividades essenciais para a vida. “A situação de milhares de pessoas lançadas ao desamparo de conjuntos habitacionais situados no meio do nada, impossibilitando a seus habitantes o exercício de qualquer atividade produtiva


Conjuntos habitacionais para onde foram deslocados os atingidos pela barragem de Acauã

reclama, urgentemente, a adoção de medidas que venham a suprir as carências mais elementares (alimentação, escola, creche, saúde pública, infra-estrutura, transporte público, lazer, segurança pública) da população deslocada, até que se cumpra a obrigação governamental de lhes conferir uma convivência sustentável em seus novos lares”, argumenta o Ministério Público. Citamos o caso de Acauã, mas assim também acontece em Tucuruí, no Pará; em Cana Brava, no estado de Goiás, e na maioria dos lugares onde as barragens são construídas, e depois de muitos anos da obra concluída as famílias ainda esperam solução para seus problemas, criados em função da obra. De um modo geral, hoje no Brasil, onde não há legislação que assegure e estabeleça quais são os direitos dos atingidos por barragens, nem há um órgão público encarregado de realizar as indenizações e reassentamentos dos atingidos, que ficam na mão dos proprietários

da obra e que se pautam pelo lucro; pode-se afirmar que a construção de barragens constitui uma afronta ao direito à dignidade da pessoa humana, na medida em que, no seu conjunto, as violações de direitos humanos ocorridas na implementação de barragens, impossibilitam a reestruturação da vida individual e coletiva, com graves impactos sobre a identidade, a estima e as perspectivas de futuro dos atingidos. Os atingidos precisam lutar por um novo modelo de desenvolvimento e dentro deste, um novo modelo energético, onde o desenvolvimento seja concebido como “um processo econômico, social, cultural e político abrangente, que visa o constante melhoramento do bem-estar da população e de cada pessoa, na base de sua participação ativa, livre e significativa e na justa distribuição dos benefícios resultantes dele” (Declaração sobre o direito dos povos ao desenvolvimento, de 18/10/1993, da Comissão dos Direitos Humanos da ONU).

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5 NOSSAS PROPOSTAS

C

omo vimos, a raiz do problema energético nacional está na lógica do sistema que faz da energia uma mercadoria e que, ao persistir esta lógica, não haverá tecnologia A ou B que resolva a questão da população pobre. É impossível pensar em economia de energia quando se quer vender o máximo para obter o máximo de lucro. Da mesma forma, é impossível pensar em usos e fontes que sejam mais favoráveis ao povo e menos prejudiciais ao meio ambiente quando o único objetivo é a acumulação de riquezas nas mãos de poucos. Fontes variadas (água, sol, vento, biomassa,etc) existem e podem ser usadas para o bem estar de todo o povo, porém, não haverá fonte ou tecnologia que favoreça a maioria, se não houver uma organização econômica, política e social que se coloque para o bem de toda a humanidade. Pensar, neste momento, em uma nova política é começar pensar em novos princípios norteadores para as nossas ações e lutas. Na construção de um projeto popular energético o MAB definiu os seguintes pontos como princípios que devem nortear esta construção: 1. Prosseguir e fortalecer a luta contra as barragens; 2. Lutar para que a energia esteja nas mãos do Estado brasileiro, a serviço e sob controle do povo brasileiro;

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3. Lutar para garantir todos os direitos dos atingidos por barragens, o acesso as políticas públicas, incluindo a luta para resgatar a dívida social e ambiental nas barragens já construídas;

4. Lutar para que a energia não se firme como simples mercadoria para dar lucro aos grupos empresariais que a comercializam; 5. Lutar para que o seu uso seja racional e atenda as necessidades vitais do povo brasileiro, em primeiro lugar. Portanto, devemos nos colocar contra modelos de produção cuja finalidade é expropriar os recursos naturais e energéticos brasileiros; 6. Lutar para que a energia seja institucionalmente garantida a todas as famílias brasileiras, como direito. Isto significa empreender uma luta nacional, no campo e na cidade, pelo “direito à energia elétrica”; 7. Lutar por tarifas subsidiadas para produção de bens e serviços destinados à melhoria da qualidade de vida do povo brasileiro, priorizando a alimentação, a moradia, a educação, a saúde, o transporte e o lazer das maiorias; 8. Lutar pela suspensão dos subsídios aos grandes consumidores, em particular às indústrias eletrointensivas; 9. Lutar pela diminuição das tarifas da energia elétrica com isenção no pagamento de até 100 kwh/mês para todas as famílias brasileiras, e que o preço do que for consumido acima dos 100 Kwh/mês tenha igualdade com o valor pago pelas grandes empresas; 10. Lutar para que as múltiplas fontes de energia sejam prioritaria-


mente selecionadas pelos critérios de economicidade e sustentabilidade ambiental, visando o atendimento das necessidades fundamentais da vida para esta e para as gerações futuras; 11. Lutar para superar o discurso da escassez de energia já impregnado em parte da população que teme ficar sem luz, pois este discurso foi montado pelos capitalistas que adquiriram

as empresas de energia elétrica brasileira, com a finalidade de aumentar brutalmente o preço da energia elétrica para o povo brasileiro; 12. Lutar para que a classe trabalhadora brasileira – assalariada e camponesa – participe em todos os processos de planejamento e organização da produção e distribuição da energia, no âmbito da sociedade brasileira.

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6 NOSSOS DIREITOS,

SÓ A LUTA FAZ VALER “Para cada problema uma pauta, para cada pauta uma luta!”

N

a história de lutas e conquistas das populações atingidas por barragens tem sido assim: quando os governos e as empresas do setor elétrico decidem construir uma barragem para produzir energia, a população que será atingida é a última a ficar sabendo do que irá acontecer com a vida de suas famílias, com as terras, com os postos de trabalho, com as comunidades, com o rio.

De forma mais organizada foi nos anos 80 que as populações atingidas articularam uma forte luta de resistência e através desta obtiverem várias conquistas importantes.

as autoridades locais, fizeram passeatas, trancaram estradas, arrancaram os marcos e sinalizações que as empresas fizeram e até hoje a barragem não saiu. Fato semelhante ocorreu no Rio Uruguai onde queriam fazer a barragem de Itapiranga e no primeiro projeto da UHE Machadinho, na divisa do Rio Grande do Sul com Santa Catarina. No Vale do Ribeira, em São Paulo e Paraná, há mais de 20 anos o povo luta contra as barragens e até agora nenhuma delas foi construída. Existe um primeiro projeto básico aprovado para construção no Alto Vale do Ribeira no Paraná, mas o povo ainda resiste e impede a obra. Na bacia do Rio São Francisco a Barragem de Itaparica foi construída, os atingidos não conseguiram impedir a obra. No entanto, o povo lutou muito, fizeram várias ocupações, abaixo - assinados, concentrações, muitas reuniões, audiências, e conseguiram com uma grande ocupação que durou mais de uma semana um dos primeiros projetos de reassentamento do Brasil com a participação dos atingidos, garantindo o direito até para quem não tinha terra. Nem tudo foi cumprido pela empresa construtora da barragem, problemas ainda existem, mas houve avanços porque o povo lutou.

Marcos são arrancados em Machadinho/RS, 1988.

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No estado do Paraná, foi apresentado um projeto de construir a barragem de Capanema no Rio Iguaçu, o povo se organizou, fez protestos, expulsou os técnicos da empresas, pressionou

Na barragem de Machadinho, no sul, quando a empresa dizia ter encerrado o processo das indenizações, muitas famílias estavam excluídas, estas se organizaram ocuparam a obra e garantiram reassentamento para mais 280 famílias. Portanto, afirmamos que onde tem luta e organização as empre-


sas são obrigadas a respeitar os direitos, porém onde não houve um forte processo de luta e organização das famílias atingidas, geralmente estas populações são expulsas de suas terras, sem garantia de como continuarão suas vidas em outros lugares. Além das lutas em cada local, existem lutas nacionais conjuntas como em 2004, quando as negociações não avançavam com o governo Federal, o MAB decidiu fazer uma marcha, mais de 500 atingidos de vários estados caminharam durante 13 dias de Goiânia a Brasília, fazendo a denúncia dos projetos de construção de barragens e o tratamento das populações atingidas. Além disso, exigiram o cumprimento da pauta emergencial e, naquele momento, vários programas de governo foram conquistados. Podemos citar, dentre eles: alfabetização para jovens e adultos, cestas básicas para 18 mil famílias, como forma de amenizar a miséria criada pela construção da barragem, um programa de educação ambiental e energético chamado Pecea. Hoje, todos

estes programas, exceto as cestas básicas, foram extintos, e também não existe perspectiva de serem renovados ou criados novos programas. Já faz mais de ano que estamos em diálogo e negociação, e nada de concreto acontece. Nossa história mostra que as conquistas só acontecem com muita luta, e mais uma vez não será diferente, nós atingidos não devemos esperar calados. Nos últimos anos, a luta dos atingidos tem, também, servido de exemplo e o MAB tem contribuído em lutas que, além de questionar as obras e garantir os direitos do povo atingido, discute com a população das cidades a questão de um novo projeto energético popular. Entendemos de onde vem tanto lucro das empresas privadas que se apropriam dos recursos naturais da Nação, usam para produzir e exportar outras riquezas naturais do País como os minérios, usam o dinheiro público para fazer as obras, não pagam imposto para exportar, geram pouquíssimos empregos e ainda dizem que isto tudo é para o bem de toda a sociedade, dizem que isto é interesse público. Assim, o debate do novo projeto energético popular para o Brasil passa por estudarmos o atual modelo que na lógica capitalista beneficia as grandes empresas, que expulsa o povo de suas terras e se apropria da energia vendendo-a por preços muito altos para as famílias brasileiras (cobram até 50 centavos por Kilowat/hora-mês). Por isso muitas organizações e movimentos populares urbanos estão junto com o MAB fazendo grandes lutas para denunciar esta exploração e lutando para baixar o preço da luz. Em alguns estados as famílias que se organizaram já tiverem conquistas: conseguiram baixar o preço da luz.

Educanda nas turmas de alfabetização de jovens e adultos

Centenas de trabalhadores foram até concessionárias de energia e entregaram a autode-

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claração que garante um desconto na tarifa. Em Rondônia, uma moradora que participou da luta, em março de 2008 pagou 53 reais pelo consumo de 108 Kwh, no mês seguinte, depois de entregar a autodeclaração na distribuidora, pagou 37 reais por 119 Kwh. Ela teve um desconto de 16 reais. Em Brasília, um consumidor que antes de entregar a autodeclaração pagou 45 reais por 135 Kwh, com a tarifa social, pagou 32 reais por 142 Kwh. Ou seja, com a tarifa social o morador que participou das lutas pagou 13 reais a menos. Mesma situação aconteceu no RS com desconto de até 17 reais para outra família. O momento que estamos vivendo exige cada vez mais que organizemos a luta. As populações atingidas sofrem

Mobilização em Viçosa, MG

com os problemas causados pela obra, a pauta de negociações com o governo e empresas não avança. Nossa tarefa é: discutir os problemas e as necessidades com o povo e de cada problema tornar uma pauta, de toda pauta organizar a luta e de cada luta avançar rumo às conquistas e vitórias. Cada vez mais também precisamos organizar o Movimento, fazer alianças com outros que compartilham dos mesmos interesses que nós e realizar todos os tipos de lutas possíveis, para impedir que as riquezas nacionais fiquem nas mãos de quem só quer explorar o povo e destruir a natureza. Estas lutas são nossas e devem ser assumidas, organizadas e articuladas pelo MAB em todo o Brasil, com solidariedade e articulação com atingidos de outros países da América Latina e do Mundo.

Então devemos organizar o MAB em: - Comunidades e locais que serão ou já foram atingidos por barragens. - Todos os lugares que tenha pessoas dispostas a assumir a luta.

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Idéias centrais do II ENCONTRO NACIONAL DO MAB

R

eunidos em Curitiba (*), estado do Paraná, Brasil, nos dias 13 a 17 de março de 2006, avaliando nossa história e o momento que vivemos, reafirmamos que:

1. Água e energia não são mercadorias. Água e energia são patrimônios do povo e devem estar sob o controle popular. 2. É necessário construir um modelo energético alternativo, com a utilização dos recursos naturais, que sirva aos interesses da classe trabalhadora, hoje e no futuro. 3. A luta é contra toda privatização da água e da energia (e reaver o já privatizado) e que se estende à luta contra as barragens e pelos direitos dos atingidos. 4. Lutamos também para combater a exportação de produtos de alta densidade energética (eletrointensivos) utilizados para fins da acumulação capitalista. 5. O MAB é um movimento nacional, autônomo, de massa, de luta, com direção coletiva, em todos os níveis, com rostos regionais, sem distinção de sexo, cor, religião, partido político e grau de instrução. 6. Nossa principal forma de luta é a pressão popular. 7. Só o povo organizado e consciente é capaz de transformar, pela raiz, as estruturas opressoras na sociedade. 8. Nossa prática militante é orientada pela pedagogia do exemplo. 9. Construiremos alianças com movimentos e com a sociedade no nível nacional e internacional. 10. A luta do MAB se alimenta no profundo sentimento de amor ao povo e amor à vida. Água e energia não são mercadorias! Nossa terra, nosso rio, não se vende; nossa terra, nosso rio, se defende! Terra Sim, Barragens não! Águas para a vida e não para a morte! (*) Estiveram presentes 1.200 pessoas, de 15 estados (BA, CE, GO, MA, MG, MT, PA, PB, PR, RO, RS, SE, SC, SP, TO) com a maioria de jovens e 4 delegações latino-americanas(Argentina, Bolívia, Nicarágua, Venezuela), além de outros movimentos, entidades, autoridades, estudantes e personalidades apoiadoras.

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