Jornal do MAB | Nº 27 | Outubro de 2015

Page 1

Nº 27 | Outubro de 2015

Foto: Stefano Figalo

Atingidos de todo o país saem às ruas em defesa da Petrobrás

Atingidos por enchentes são indenizados no Paraná

Após luta, BNDES assume compromissos com o MAB

MAB e MST conquistam terra no RS

Página 12

Página 13

Página 16


EDITORIAL

A erva daninha chamada PMDB

É

muito comum quando andamos pela roça ver ervas daninha nas árvores, são parasitas, que sugam os nutrientes da planta até que ela morra. Na atual conjuntura é assim que o PMDB vem agindo dentro do Governo Dilma. O atual mandato da Presidenta Dilma passa por momento diferente do anterior, a crise econômica mundial afeta diretamente o país com uma queda considerável no crescimento econômico. Oportunamente à direita, através do PSDB com o apoio da mídia, em especial a Globo, pressiona o governo a ceder aos interesses do Império Norte Americano, que nos últimos 12 anos não conseguiu garantir sua agenda de submissão ao país.

A postura do PMDB de hoje não diverge da postura do PMDB em sua história. Após a ditadura militar, sempre esteve na composição de governos, desde quando José Sarney assumiu a presidência em 1985, com a morte de Tancredo Neves, passou por FHC, foi base aliada de Lula e primeiro mandato de Dilma. Como diria o senador Sérgio Souza “O PMDB não está no governo; o PMDB é governo”.

Infelizmente o governo tem cedido a esses interesses. Contraditoriamente, as saídas da crise propostas pelo governo, tem atendido aos interesses desses grupos de direita, sendo chantageado inclusive pelo seu principal “aliado” o PMDB, que mesmo assim continuam atacando e “sugando” o governo, pedindo inclusive o impeachment da Presidenta. O PMDB tem jogado dos dois lados, por um lado não rompe com o governo oficialmente, mas se alia a direita no Congresso nacional. Para se ter uma ideia, recentemente o presidente da Câmara Eduardo Cunha recebeu o principal pedido de impeachment da Presidenta em um ato político em seu gabinete que contou com a presença do PSDB, e movimentos contra o governo. Outro fato importante ocorreu com a retirada do vice-presidente Michel Temer das articulações políticas e emitindo opiniões de que o governo não se sustenta até 2018. Para piorar vem articulando com o PSDB uma possível aliança caso ele assuma a presidência da república em uma eventual renúncia de Dilma. Ao mesmo tempo o presidente do Senado Renan Calheiros que no início do ano também atacou duramente o governo hoje tem garantindo as pautas e evitado desgastes com o Planalto, já manifestando que não aceitará pedido de impeachment contra Dilma. EXPEDIENTE Jornal do MAB Uma publicação do Movimento dos Atingidos por Barragens Produção: Setor de Comunicação do MAB Projeto Gráfico: MDA Comunicação Integrada Tiragem: 10.000 exemplares

2

Em uma conjuntura tão delicada e ao mesmo tempo tão acelerada nos exige cuidados nas ações e dedicação maior na formação para não cometer equívocos. Não podemos vacilar! Defender a democracia brasileira é fundamental, mas não podemos nos limitar a combater os movimentos golpistas, devemos enfrentar as tentativas de entreguismo da Petrobrás, do ajuste fiscal, e à retirada de direitos dos trabalhadores. O governo precisa entender que a única saída viável é à esquerda, reaproximar da classe trabalhadora e dar um basta nessa meia dúzia de ricos que parasitam o Brasil. Para acabar com a erva daninha não há outro remédio se não arrancá-la e não deixar nenhum pedacinho, porque se não ela volta a crescer e a árvore volta a ficar em risco de morte.

VISITE O SITE DO MAB Em www.mabnacional.org.br é possível ler notícias sobre o Movimento, ver fotos e vídeos, ler artigos e ouvir músicas. Acompanhe as novidades e compartilhe com os companheiros e companheiras! Jornal do MAB | Outubro de 2015


A surdez do Estado e o barulho das doações privadas; Constituinte já!

N

os meses de junho e julho de 2013 os jovens brasileiros foram às ruas para reivindicarem melhores condições de acesso ao transporte público nas grandes cidades brasileiras. As reivindicações tomaram o corpo de pautas há muito tempo solicitadas pelos brasileiros, e pouco atendidas. Os direitos pelo acesso à saúde, moradia, terra, atendimento às populações atingidas por barragens foram brotando e impulsionados pelos gritos das ruas. Para unir essa força e capacidade de pautar a conjuntura, uma vez que nas campanhas foram sempre mencionadas “as marchas de junho e julho de 2015”, há necessidade de novos canais de democráticos que escutem os gritos das ruas. O Estado brasileiro pouco escuta essas reivindicações. A “surdez” dos governantes revela que os “tapa ouvidos” há muito tempo tem dificultado a consolidação de uma democracia mais próxima ao povo. É fato que, movimentos sociais, partidos de esquerda e sindicatos já vêm gritando a necessidade de suas pautas serem atendidas há muito tempo. Porém, quem/que são esses que dificultam sermos ouvidos? Em sua maioria temos grandes empresas privadas, que financiam as campanhas para deputados, vereadores, prefeitos, governadores e presidência. Dessa maneira, ao investirem nas campanhas aliançam Jornal do MAB | Outubro de 2015

com os candidatos seus interesses privados, por meio dos poderes do Estado Brasileiro. E, se beneficiam com redução de impostos, licenças para construção de obras, e até garantia pelos juízes com interditos proibitórios, como é o caso dos militantes do MAB na região de Altamira/PA, Belo Monte.

Só a construtora Andrade Guitierrez S.A. deu 7 vezes mais do que a prefeitura de Altamira/PA gastou com serviços públicos de saúde no 1º semestre de 2015, (R$ 3.043.465,75 publicado no site do município*). A força politica das empresas está em cada investimento feito nas campanhas eleitorais e seus candidatos pagos. Assim, pautas populares esbarram nos interesses dos capitais de grandes empresas e assim, instaura-se a “surdez” histórica do Estado brasileiro, impregnado pelos interesses das empresas privadas. Em decorrência disso, assistimos há décadas o atraso na discussão e consolidação da lei dos atingidos por barragens, por exemplo, que esbarram em deputados e vereadores com interesses pautados por esses lobby’s.

E, por falar em Belo Monte. As empresas que compõe o consórcio construtor de Belo Monte (J. Malucelli, Andrade Guitierrez, Odebrecht, OAS, Queiroz, Camargo Corrêa e outras), segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, investiram a soma de R$ 41.255.457,05 nas últimas campanhas.

Por essa via, que nós Atingidos/as por Barragens engrossamos o coro das ruas por uma Constituinte Soberana e Exclusiva do Sistema Político Brasileiro. Como parte de uma luta para o projeto energético popular. Constituinte Já!

* http://altamira.pa.gov.br/portal/download/transparencia_2015/ 1BIMESTRE2015.PDF

3


Cinco razões para lutar contra a privatização da Petrobras Defendemos que os erros, desvios e corrupção sejam investigados, julgados e principalmente corrigidos. Todavia, sabemos que é muito melhor para o Brasil manter o controle do petróleo nas mãos do Estado, do que qualquer privatização.

veitáveis no pré-sal. Pelo atual consumo do Brasil, teríamos petróleo para mais 150 anos. Isto representa aproximadamente 27 trilhões de reais e a Petrobras tem a melhor e mais eficiente tecnologia para a exploração desta riqueza.

A Petrobras é hoje uma das empresas mais eficientes do mundo e cresce, em média, 9% ao ano. Atua desde a retirada do petróleo até o posto de gasolina para distribuir o combustível, incluindo a operação de usinas térmicas que produzem energia elétrica.

V

Defendemos que os erros, desvios e corrupção sejam investigados, julgados e principalmente corrigidos. Todavia, sabemos que é muito melhor para o Brasil manter o controle do petróleo nas mãos do Estado, do que qualquer privatização. Com a Petrobras sob controle estatal, os recursos provenientes da extração do pré-sal podem ser investidos na educação, saúde, empregos e direitos. Por isso, listamos cinco razões para lutarmos contra a privatização da Petrobras:

1. No Brasil há muito petróleo O último estudo, realizado por Cleveland Jones e Hernane Chaves, do Instituto Nacional de Óleo e Gás da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), aponta a existência de 176 bilhões de barris apro4

E com o pré-sal, criou-se um fundo social que, junto com os royalties, deverão ser aplicados principalmente na educação e saúde.

4. A Petrobras é uma das maiores e mais eficientes empresas do mundo

Por Luiz Dalla Costa

ivemos um momento de intenso ataque dos grandes capitais privados, nacional e internacional, e de seus aliados nas esferas política, judicial e midiática para atacar os trabalhadores e as riquezas da nação brasileira, em especial na área do Petróleo.

duais e municipais. O estado se São Paulo foi o estado que mais aumentou seu ganho, recebendo mais de 500 milhões de reais no ano apenas em royalties.

2. Retirar e industrializar o petróleo gera muito emprego Em 2013, a Petrobras movimentou mais de 400 bilhões de reais e gastou 263 bilhões de reais na compra de insumos. Com isso, movimentou uma grande cadeia produtiva como navios, sondas, helicópteros, alimentos, ferro e tantas outras mercadorias. A maioria delas foi produzida no Brasil, por empresas nacionais e com trabalhadores locais. Isto só é possível por que a Petrobras continua no domínio do Estado.

3. A produção de petróleo e seus derivados gera muito dinheiro que fica nos municípios, estados e nação No ano de 2013, a Petrobras repassou 106 bilhões de reais, arrecadados na forma de tributos, para as esferas federal, esta-

Neste caso, quando a empresa tem dificuldade num setor, outra área serve como compensação, o que mantém o alto nível da estatal e possibilita investimentos em novas descobertas de petróleo e gás.

5. Os trabalhadores do setor do petróleo são muito eficientes Atualmente, a Petrobras emprega cerca de 80 mil trabalhadores diretos e mais de 200 mil indiretos – terceirizados -, que atuam na cadeia do petróleo. São eles que produzem estas extraordinárias riquezas e milhares de produtos que são utilizados pela sociedade todos os dias. Por estas razões precisamos lutar para garantir que o petróleo e a Petrobrás estejam nas mãos do estado brasileiro, com controle popular. Pela soberania nacional, precisamos evitar que esta riqueza se esvaia para os bolsos do capital privado. Jornal do MAB | Outubro de 2015


O pré-sal tem que ser nosso Segundo especialistas, a educação brasileira poderá perder 25 bilhões de reais por ano, caso projetos, como o do senador tucano José Serra para o pré-sal, sejam aprovados. A mudança poderá comprometer diretamente as metas traçadas para o Plano Nacional de Educação. O projeto de Serra

O

projeto de lei redigido e apresentado pelo senador José Serra (PLS 131) altera o regime de exploração da camada do pré-sal, retirando a obrigatoriedade da Petrobrás ser a exploradora única e exclusiva do pré-sal e, consequentemente, abrindo caminho para que outras empresas privadas tenham acesso à exploração. Segundo especialistas, a alteração no marco regulatório representa uma ofensiva golpista dos setores conservadores do país, atrelados a interesses imperialistas norte-americanos, podendo trazer consequências graves e retrocessos no que diz respeito às conquistas garantidas por meio do modelo de partilha e da criação do chamado Fundo Social, uma espécie de “poupança” que pode ser utilizada para investimentos sociais. Para o presidente da Federação Única dos Petroleiros (FUP), José Maria Rangel, a luta contra projetos de privatização da estatal não é de hoje. “Durante a época em que o tucano FHC era o presidente, houve uma forte ofensiva no sentido de privatizar a Petrobrás, abrindo o capital para empresas estrangeiras. Hoje, os mesmos setores da sociedade ainda tem o mesmo objetivo, ou seja, o de retirar essa grande riqueza do povo brasileiro”, afirmou. Segundo ele, as mudanças estruturais no país, como o desenvolvimento do Plano Jornal do MAB | Outubro de 2015

Nacional de Educação, só serão garantidas com a manutenção da Lei de Partilha, que garante à Petrobrás a exclusividade nas pesquisas e o mínimo de 30% na produção de jazidas de petróleo e gás natural do pré-sal. De acordo com especialistas, 360 bilhões de reais é o valor que a educação brasileira deixará de receber, nos próximos 15 anos, caso os projetos de alteração na lei de partilha do pré-sal sejam aprovados.“A gente só viabiliza o Plano Nacional da Educação explorando o pré-sal pela Petrobrás. Um dos seus pilares fundamentais é o financiamento, que está alicerçado no pré-sal. Por isso precisamos unir forças para combater o projeto de José Serra”, opinou Rangel. Além do projeto do tucano José Serra, outros cinco da mesma natureza estão circulando no Congresso Nacional.

populares asseguraram a destinação de 50% do montante do Fundo Soberano e a totalidade dos royalties do pré-sal para a saúde e educação. Atualmente, a lei de partilha do pré-sal garante que 75% dos royalties gerados sejam destinados diretamente para a educação, cerca de 360 bilhões de reais. Além disso, 25% teriam como destino certo os investimentos na área de saúde pública. Rangel acredita que é necessário construir uma grande frente de mobilização, mas chama atenção para a importância da educação para sensibilizar o maior número de pessoas. “A educação pode ser a água que vai mover esse moinho para acabar com essa tentativa de mudar a lei do petróleo no nosso país”, opinou.

O modelo de partilha A lei de partilha foi criada pelo governo Lula e aprovada pelo Congresso Nacional no final de 2009. Diferente do modelo de concessão, adotado em outros períodos e que destina todo o recurso dos poços de petróleo ao ganhador do leilão, o regime de partilha destina a maioria da riqueza produzida e a propriedade do petróleo ao Estado brasileiro. Com a aprovação da Lei 12.858, no final de 2013, após uma série de mobilizações, uma frente composta por setores 5


Desde o início do ano 65 milhões de casas pagam mais caro nas contas de luz Com os aumentos, os consumidores residenciais poderão desembolsar R$ 25 bilhões a mais nas contas de luz neste ano.

O

Brasil possuiu 80 % de sua matriz energética da energia hidrelétrica, uma das mais baratas maneiras de se obter energia. Entretanto, o brasileiro paga umas das contas de luz mais caras do mundo. Desde o início de março, as contas de luz de todos os brasileiros estão 40 % mais caras, após duas medidas aprovadas pela Aneel. As Bandeiras Tarifárias foram a primeira. Desde o primeiro dia de 2015, as contas de energia elétrica vêm acompanhadas com cores que indicam o nível dos reservatórios no país: verde, amarelo e vermelho. Dependendo da cor mensal definida pela ANEEL, a população pode pagar mais caro. A população passará a pagar 25 reais a mais para cada 1000KWh consumidos quando a bandeira for amarela e quando a bandeira for vermelha pagará 55 reais a mais na conta para cada 1000KWh consumidos. Estamos no décimo mês seguido onde a bandeira tarifária é a vermelha.

Posteriormente, em março, a “Revisão Extraordinária” provocou um novo aumento de 23%, em média, para todos os consumidores residenciais. Esse aumento pode ser solicitado pelas distribuidoras a Aneel a qualquer momento, quando alegam que estão com problemas econômicos. De acordo com o governo, a medida foi aplicada para cobrir o valor que foi gasto a mais com as termoelétricas, acionadas pela falta de chuva. Somadas as duas medidas, os 71 milhões de consumidores residenciais poderão desembolsar, este ano, 25 bilhões a mais nas contas de luz. Ainda se somam a esses aumentos os “Reajustes Tarifários Anuais”. As 63 distribuidoras de energia elétrica no Brasil possuem uma data anual na qual solicitam a Aneel um aumento nas tarifas. As datas dos aumentos variam de acordo com cada distribuidora. Por exemplo, somados aos dois aumentos (Bandeiras Tarifárias e Revisão

6

Extraordinária) o reajuste tarifário anual da Eletropaulo deixou as contas de 20 milhões de pessoas na região metropolitana de são Paulo 15,2 % mais cara desde agosto. Uma dessas pessoas é Ondina Maria da Costa, de 53 anos, que trabalha como coletora de dados para pesquisas. Moradora do bairro de Sapopemba, localizado na Zona Leste de São Paulo. Ondina relata que os aumentos já impactaram seu orçamento desde o início do ano. “Daqui a pouco vou trabalhar só para pagar a conta de luz. Tive que diminuir produtos do supermercado como iogurte e carne. Isso é um absurdo, porque a gente não vive apenas de arroz e feijão", afirma. De janeiro para junho deste ano, a conta de Ondina, que vive com mais quatro pessoas, passou de R$ 156,51 para R$ 223,28. Mesmo mantendo o mesmo consumo de energia (355 kWh e 354 kWh, respectivamente), houve um aumento de 42% em apenas seis meses. Jornal do MAB | Outubro de 2015


Empresas do setor elétrico lucraram mais de R$ 60 milhões por dia nos três primeiros meses do ano O lucro líquido chegou a R$ 5,2 bilhões de reais de janeiro a março; Em ranking dos maiores lucros, empresas ficaram atrás apenas de Bancos e setor de Petróleo e Gás.

N

ão existe crise para as empresas de energia elétrica no Brasil. Segundo a consultoria econômica Economática, empresas do setor elétrico, que negociam suas ações na bolsa de valores, tiveram um lucro de 5,2 bilhões de reais nos três primeiros meses deste ano. No mesmo período do ano passado o valor foi de R$ 4,9 Bilhões. No ranking das empresas que atingiram os maiores lucros no Brasil neste período, as de energia elétrica ocupam o terceiro lugar, perdendo apenas para o setor bancário, com um lucro de R$17,7 bilhões, e para o setor de Petróleo e Gás, com R$ 5,3 bilhões.

Para o integrante da coordenação da Plataforma Operária e Camponesa da Energia, Luiz Dalla Costa, o alto lucro das empresas está ligado ao atual modelo energético brasileiro. “Deveríamos ter a conta de luz mais barata do mundo, mas ocorre exatamente o contrário. Como explicar os altos preços nas contas de luz, enquanto o custo de produção no país é extremamente baixo, baseado nas hidrelétricas? Isso só se explica pelas privatizações ocorridas no setor nos anos 90, que passou a priorizar os lucros”, avalia. A partir dos anos 90 o modelo de privatização do setor fez com que a venda e compra de energia no chamado “mercado de curto prazo” fosse determinante para o lucro das empresas através da especulação. O presidente do sindicato dos Eletricitários de São Paulo, Gentil Freitas denuncia: “No ano de 2013, quando a presidente renegociou as concessões das hidrelétricas com as empresas do setor elétrico, os estados de SP, PR e MG, governados pelo PSDB, não renovaram as concessões. Essas usinas tem o custo de produção de 16 a 18 reais por 1000 KWh e chegam a vender essa energia no mercado livre a absurdos R$ 822”. O exemplo de duas hidrelétricas, uma estatal e outra privada, localizadas, ambas no rio Grande, divisa entre MG e SP, mostra a diferença. Enquanto a hidrelétrica Luiz Carlos

Jornal do MAB | Outubro de 2015

Barreto, de Furnas, vende sua energia a R$ 33,00/ 1000KWh, a Jaraguá da CEMIG, 30 km rio abaixo , cobra R$ 822,83/1000 KWh pela energia gerada pela mesma água. “O que aconteceu foi um verdadeiro golpe do setor elétrico. As empresas apenas se preocuparam com o lucro de seus acionistas e repassaram tudo para o bolso da população”, protesta Dalla Costa. Das 20 empresas mais lucrativas do trimestre, quatro dela são do setor elétrico, e ficam atrás apenas dos bancos. A que mais lucrou foi a Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais) que ocupa a sexta posição com lucro de R$ 1,4 bilhões. Em oitavo lugar aparece a Eletrobrás com lucro de R$1,2 bilhão. Outras elétricas como a Copel e Tractebel também figuram nessa lista das que mais faturaram. 7


Milhares de pessoas vão às ruas Movimentos populares que integram a Frente Brasil Popular realizaram atos em 20 estados do país no Dia Nacional de Luta em Defesa da Democracia, da Petrobrás e Contra o Ajuste Fiscal.

O

dia 3 de outubro é uma data histórica para a maior empresa estatal do Brasil. Este sábado marca o aniversário de 62 anos da Petrobrás. Entretanto, para milhares de pessoas, a comemoração foi realizada por meio de mobilizações pelo país.

Atualmente, cinco projetos de lei referente à Petrobrás tramitam no Senado e na Câmara dos Deputados. O mais polêmico deles é o Projeto de Lei 131, de autoria do senador José Serra (PSDB-SP), que pretende retirar a exclusividade da Petrobrás da operação do pré-sal. De acordo com a FBP, o interesse por trás da proposta é a privatização da estatal.

históricos da empresa. Um dos pontos altos da apresentação foi a representação da greve de 1995, uma das mobilizações mais importantes da história da classe trabalhadora. Para Cibele Vieira, da (FUP), a lembrança da greve dos anos 90 tem uma grande importância pela semelhança com a conjuntura atual. “O momento atual é similar ao vivido nos anos 90, com ataques permanentes à empresa por alas conservadoras da sociedade e pela mídia, sobretudo aos trabalhadores petroleiros. Hoje, mais do que nunca, devemos defender a Petrobrás e o pré-sal, contra a privatização”, declarou.

da luta do povo e é uma conquista histórica. Entretanto, somos contra o ajuste fiscal promovido pela política econômica do governo federal, que retira os direitos e prejudica os trabalhadores. Nós queremos que esse ajuste seja aplicado aos ricos e não à classe que trabalha”, defendeu o integrante da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Gilberto Cervinski. Além de São Paulo, os atingidos por barragens estiveram presentes em atos de outras sete capitais.

Minas Gerais Foto: Lydiane Ponciano

Organizadas na recém-formada Frente Brasil Popular, movimentos populares saíram às ruas de 20 estados e do Distrito Federal no Dia Nacional em Defesa da Democracia, da Petrobrás e contra o Ajuste Fiscal.

Segundo Cibele, assim como nos anos 90, o sindicato dos petroleiros podem entrar em greve a qualquer momento para defender o patrimônio da estatal. “Em 95, a greve era chamada de “greve do fim do mundo”. Hoje, estamos com uma nova greve aprovada, infelizmente não vai haver alternativa. Essa luta não é só dos petroleiros, é de toda a sociedade”, afirmou. Na capital paulista, cerca de 5 mil pessoas foram à Avenida Paulista, em frente ao escritório da Petrobrás, para protestar contra o projeto do tucano. O ato começou de forma lúdica, com um teatro que recordou momentos 8

Os manifestantes também reafirmaram a defesa da legalidade democrática, mas reprovaram o ajuste fiscal e os cortes de direitos realizados pelo governo federal. “Nós estamos defendendo a democracia, pois ela faz parte

Na capital mineira mais de 450 pessoas foram às ruas, às 8 horas da manhã, do bairro Pedreira Prado Lopes. As mulheres do bairro fizeram um bolo, distribuído posteriormente à população, em comemoração Jornal do MAB | Outubro de 2015


no aniversário da Petrobrás Ceará

Rio de Janeiro

Rio Grande do Sul

Foto: Stefano Figalo/Brasil de Fato

ao aniversário da Petrobrás. “Hoje é um dia histórico: são 62 anos da Petrobras. Estamos em luta nacional em defesa da democracia, do direito dos trabalhadores e das trabalhadoras, e contra o ajuste fiscal”, afirmou a integrante da coordenação nacional do MAB, Soniamara Maranho. Durante o período da tarde, mais de duas mil pessoas marcharam pelo centro da cidade.

A capital carioca antecipou o clima de mobilizações da Frente Brasil de Popular. Centenas foram às ruas na sexta-feira (02) em defesa da Petrobrás e da soberania nacional. Mais de 350 atingidos por barragens dos estados de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e do próprio Rio de Janeiro se somaram às manifestações.

Em Fortaleza (CE), a Frente Brasil Popular mobilizou aproximadamente quatro mil pessoas no Dia Nacional em Defesa da Democracia, da Petrobras e contra a política de ajuste fiscal. Os manifestantes saíram da Praça da Lagoinha, no Centro, e foram até a Praça do Ferreira.

Em Porto Alegre (RS), aproximadamente 700 pessoas se reuniram na torre histórica de petróleo, localizada na Praça da Alfândega, para comemorar o aniversário da Petrobrás e rechaçar o projeto do senador José Serra (PSDB-SP), que pretende retirar a exclusividade da estatal no controle do pré-sal. “Nós, da Plataforma Operária e Camponesa, estamos denunciando como o capital vem explorando a cadeia de energia para gerar lucro. Não vamos permitir qualquer forma de desmonte da Petrobrás”, afirmou a militante do MAB, Neudicléia Oliveira.

Paraná

No início da manhã, movimentos populares protestaram contra a privatização da Companhia Paranaense de Energia, em Curitiba (PR). Os manifestantes realizaram um abraço coletivo na estatal para simbolizar o repúdio às ofensivas contra a empresa. Após o ato, os militantes seguiram em marcha até a Boca Maldita. Jornal do MAB | Outubro de 2015

Rondônia

Já no interior do estado, em Caxias do Sul (RS), os movimentos sociais da Serra Gaúcha realizaram um seminário para debater a importância da destinação das riquezas provenientes do pré-sal para as áreas de saúde e educação. O evento foi sucedido por uma caminhada até o centro da cidade, com a participação de 200 pessoas.

Mais de 150 pessoas marcharam pela Avenida Sete de Setembro, em Porto Velho (RO). Em frente ao Palácio do Governo, os movimentos populares que integram a Frente Brasil Popular realizaram um ato contra o ajuste fiscal.

Pará Em Belém (PA), aproximadamente 400 militantes do MAB, MST, CUT, CTB, PT, PCdoB, Levante Popular da Juventude e Consulta Popular marcharam da região das docas até a Praça do Relógio. Além de se somarem às pautas nacionais, os movimentos populares também fizeram fortes críticas ao atual governador Simão Jatene (PSDB). De acordo com o integrante da coordenação do MAB, Rogério Hohn, o ato mostrou o esforço das organizações em construir a unidade dos trabalhadores no estado. “Vamos continuar nesse processo, pois acreditamos na pressão popular para avançarmos nas nossas pautas”, afirmou. No município de Altamira (PA), atingidos pela barragem de Belo Monte, além de integrantes da Casa de Educação Popular, Comissão de Justiça e Paz de Brasil Novo, Movimento de Mulheres, PT, PCdoB, UJS e Levante Popular da Juventude, marcharam durante o período da manhã pelo centro urbano. 9


Belo Monte: sem casa nem lar

C

arla procura uma sombra para sentar-se enquanto Jesus continua a dar marretadas nas tábuas que até a noite anterior eram as paredes da casa do casal. A cada golpe, as palafitas balançam. Carla está grávida de oito meses e tinha esperança de dar à luz antes de ter de se mudar da rua Bonfim. Mas a Norte Energia não agüenta mais esperar para evacuar toda a área da cidade de Altamira que deve dar lugar ao lago de Belo Monte. O caminhão chega ao local antes das 8h. - Ainda temos 400 mudanças para fazer comenta um dos trabalhadores da empresa, enquanto vai colocando no caminhão um fogão, uma geladeira, caixas com pertences diversos e por último o cachorro Spike. O número de famílias por remover ainda era bastante alto naquela sexta-feira, 26 de setembro, em especial considerando que, na previsão da Norte Energia, no dia 15 de setembro o Ibama daria a licença de operação da hidrelétrica, autorizando o início da geração de energia. Surpreendentemente, o Ibama negou a licença. Além da mudança das famílias, o atraso notável se dá no desmatamento na área do lago, nas remoções na área rural, na constru-

1010

ção dos reassentamentos e nas obras de saneamento básico – na cidade de Altamira, por exemplo, a situação beira à calamidade, pois o esgoto pode ser jogado direto no lago da hidrelétrica. Após mais de um ano de lutas do MAB, a família de Carla e outras 400 conseguiram ser cadastradas pela Norte Energia. Elas haviam sido excluídas do primeiro cadastro, que calculou 7.790 famílias na área urbana de Altamira. Apesar disso, para as 400 novas cadastradas nunca foi oferecida a possibilidade de reassentamento, apenas indenização. Por isso, Carla e Jesus receberam menos de R$ 30 mil, o que não garante uma nova casa na cidade de Altamira. Sem alternativas, pegaram o dinheiro para construir nova vida em uma comunidade rural chamada Quatro Bocas, no Assurini, em um lote aonde a energia elétrica ainda não chegou. Belo Monte, que deve ser a maior hidrelétrica em solo nacional, é uma geradora de sem-tetos. Algumas famílias utilizaram a indenização para dar entrada em um terreno, outras se lamentam por serem obrigadas a gastar o dinheiro em aluguel.

- Vocês não se esqueçam da Leila, ela vai ficar sozinha aí. – adverte Carla. Todas as famílias da vizinhança, aos poucos foram aceitando a indenização. Só Leila resistia a negociar. Mas pressão é cada vez maior sobre os remanescentes, já que a energia da área já havia sido cortada e o fornecimento de água ficou precário. Enquanto Carla e o menino Jonatan partiram no carro da mudança, Jesus ficou para trás desmontando a casa. A Norte Energia não garantiria o transporte da madeira para a nova moradia e ele se apressava em tentar vender as tábulas que sobraram. Antes de partir, Carla grava um último recado para essa reportagem: - Se hoje eu estou fazendo a minha mudança, foi depois de muita luta junto com os meninos do MAB. Estou com o coração na mão porque alguns companheiros vão ficar para trás, mas nós não vamos esquecer deles. Eu estou indo embora, mas a gente tem que continuar lutando, não é?

Jornal MAB | Outubro 2015 Jornal do do MAB | Outubro dede 2015


Foto: Regina Santos/Norte Energia

Governo anuncia plano de construção de hidrelétricas até 2024

O

Ministério de Minas e Energia publicou no último dia 16, o Plano Decenal de Energia (PDE 2024), elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). O documento com 466 páginas apresenta os principais planos de expansão em energia elétrica, petróleo e gás e agrocombustíveis. Os investimentos previstos são de R$ 1,407 bilhões, sendo 70,6% em Petróleo e Gás (R$ 993 bi), 26,7% em Energia Elétrica (R$376 bi), e 2,6% em agrocombustíveis. Na energia elétrica, a capacidade instalada atual é de 133.000 MW, sendo 71% de matriz hídrica (95.000 MW). A previsão é chegar ao ano 2.024 com 207.000 MW de potência instalada, ou seja, um acréscimo de 55%. Dos 74.000 MW que serão construídos, cerca de 30.000 MW virão de fonte hídrica, 19.000 de eólica, 11.400 de térmica, e os demais é solar e biomassa. Jornal do MAB | Outubro de 2015

Na geração de energia elétrica, estimam-se investimentos necessários de R$ 268 bilhões, com prioridade para hidrelétricas (R$ 73 bi), termoelétricas (R$ 40 bi) e as chamadas renováveis (eólicas, solar, biomassa e PCHs) com R$ 155 bi previstos. Em hidrelétricas, o plano apresenta lista com 38 usinas, sendo que 22 deverão ser concluídas até 2.024 e outras 16 estão com estudos de viabilidade na ANEEL aguardando aprovação. A distribuição está concentrada, principalmente, no PA, MT, PR e RS/SC. Em relação às Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), serão cerca de 3.000 MW, que aparecem em torno de 50 usinas, principalmente MG, GO, PR, SC, RS e RJ. Também deve se levar em conta, que há diversas usinas em estudos que tendem a aparecer à medida que os levantamentos forem sendo finalizados.

O plano estima que 38 mil pessoas sejam atingidas pelas hidrelétricas. No entanto, somente a usina de Belo Monte sozinha, já ultrapassou este número, demonstrando que os dados apresentados pelo governo não são reais. Sobre as áreas de terras que serão atingidas, o plano indica que cerca de 410.000 hectares de terras serão alagados por hidrelétricas e PCHs e outros 340.000 serão ocupados por cerca de 480 parques eólicos, principalmente nos estados do nordeste. 11


Atingidos por enchentes são indenizados no Paraná Em vitória histórica, atingidos foram ressarcidos pela COPEL; reconstruções já começaram.

A

Companhia Paranaense de Energia – COPEL e Secretaria de Assuntos Fundiários do Paraná cumpre acordo feito com o MAB, Ministério Público Estadual – MPE e Defensoria Pública Estadual e Federal para indenizar as vítimas da tragédia ocasionada pela abertura das comportas da Usina Hidrelétrica Salto Caxias no PR. O valor total das indenizações chegam a um valor aproximado de R$4,5 Milhões.

Histórico Em junho de 2014, intensas chuvas provocaram prejuízos incalculáveis e conseqüências graves à população do estado do Paraná. O caso mais grave ocorreu na UHE de Salto Caxias, onde Companhia Paranaense de Energia – Copel, mandou que as comportas da usina fossem abertas, ao ponto de colocar em risco a segurança e a estrutura da barragem. Osmar Wolmer, da coordenação do MAB questiona “por que a Copel não se preveniu, soltando a água de forma mais regulada? O que se percebe é que a Copel fez acumulação da água no reservatório. Os dados mostram o aumento da geração de energia e o aumento do lucro, atendendo exclusivamente aos interesses dos acionistas e os atingidos é que pagam o preço! A COPEL não é do governo do Estado?” A intensidade das águas devastou plantações, arrastou animais, estruturas, destruiu casas, construções, benfeitorias e acessos, que afetaram mais de 400 famí12

lias, nos municípios de Nova Prata do Iguaçu, Capitão Leônidas Marques, Realeza e Capanema. “Em primeiro lugar, gostaria de falar sobre Direitos Humanos. Nós ficamos por mais de dois dias totalmente isolados pela água, sem água potável, sem luz, sem telefone. Não apareceu ninguém nem pra ver se estávamos vivos ou mortos. Foi muito triste dormir e acordar sem nada, sem ter pra onde ir”, lamenta Waldomiro, atingido do município de Realeza - PR.

A luta, organização e a conquista: A partir da organização das famílias atingidas iniciou, ainda no mês de junho de 2014, a luta pela indenização das perdas ocasionadas pela enchente. O primeiro ato ocorreu no dia 25 de junho de 2014, em uma audiência pública na Assembléia Legislativa do PR, onde foi entregue um manifesto das famílias atingidas, contendo 11 pontos de reivindicação. Desde então, várias atividades foram realizadas para garantir minimamente, o restabelecimento das condições de vida destas populações.

A luta foi de muita persistência e paciência, pois várias reuniões de negociação foram desmarcadas pela COPEL, além de novas exigências a cada acordo estabelecido. Somente, após um ano de muita luta (mobilizações, audiências e reuniões), finalmente os atingidos pelas enchentes estão sendo ressarcidos pelas perdas e dos danos ocasionados na época. Ailton Padilha, também da coordenação do MAB fala com alegria: “Somente após muita cobrança foi possível obter essa conquista. É justo a Copel se sensibilizar e assumir a responsabilidade pelos danos que causou a todo esse pessoal aqui dos municípios.” Essa conquista histórica mostrou que a organização e a coletividade são transformadoras. A luta gera conquistas concretas. A maioria das famílias já iniciou o processo de reconstrução. “Já começamos reerguer nossas vidas, o pessoal está reconstruindo suas casas. Mas a luta não acaba aqui tem muito para reivindicar. Continuaremos organizados”, diz Fernando Martini, atingido de Capanema-PR. Jornal Outubro de de 2015 2015 Jornal do do MAB | Outubro


Após protesto, atingidos conquistam compromissos do BNDES Luciano Coutinho, presidente do banco, recebeu a coordenação do MAB para discutir as reivindicações.

N

o primeiro dia do mês de outubro, o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, recebeu membros da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) para discutir a pauta de reivindicações das famílias atingidas que fizeram um protesto com mais de 400 pessoas na entrada da sede do banco, no centro da cidade do Rio de Janeiro.

Além do presidente, também estavam presentes o Diretor de Infraestrutura, Nelson Siffert, o Diretor de Inclusão Social, Jose Henrique Paim Fernandes e diversos superintendentes. Durante o encontro, o MAB apresentou todas as pauta de reivindicação. Durante o debate, Luciano Coutinho afirmou que todas as reivindicações estão dentro da perspectiva de atuação do banco. “A pauta apresentada está de acordo com o que nós queremos fazer na área de inclusão social, com iniciativas para a produção sustentável, o desenvolvimento comunitário, a proteção ambiental, entre outras”, afirmou. Neste sentido, ela se comprometeu a liberar R$ 50 milhões para o investimento em iniciativas de inclusão produtiva como as Hortas de Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (PAIS). Deste montante, R$ 40 milhões virão do Fundo Amazônia para serem trabalhados com comunidades ameaçadas e atingidas nos estados amazônicos e o restante do Fundo Social do banco a serem investidos no restante do país. Os ameaçados pela barragem de Itaocara,

Jornal do MAB MAB || Outubro Outubrode de2015 2015 Jornal do

na divisa entre Minas Gerais e Rio de Janeiro, ouviram de Luciano Coutinho o compromisso de debater com o Movimento a forma como o consórcio Light-Cemig terá que agir para garantir todos os direitos das comunidades. Esta será umas das etapas para a liberação do financiamento da obra que já foi solicitado pelos empreendedores.

BNDES discutirá Planos de Recuperação das Comunidades e Fundo específico O banco também aceitou debater a criação de uma Política Pública que garanta um tratamento mais justo a todos os atingidos por barragens do país, bem como de um Fundo específico para tal fim como já existem outros dentro do banco. Também surgiu a proposta de incluir o MAB na Linha ISE - Investimentos Sociais de Empresas que financia iniciativas em programas de investimentos sociais em todo o país, o que ficou para ser debatido nos próximos encontros. Para Joceli Andrioli, da coordenação nacional do MAB, o encontro desta quinta-feira foi um avanço e as conquistas são frutos da mobilização do povo. “Eles sentiram a pressão popular e colocaram a negociação em um novo patamar, agora com uma agenda mais pensada, sistemática. O BNDES tem uma grande dívida conosco porque ele também é o responsável pelos impactos que sofremos em nossas comunidades,” lembrou. "Agora precisamos continuar mobilizados, fortalecer a luta em todas as regiões para não deixar a pauta discutida cair no esquecimento”, concluiu.

Pauta dos atingidos: - Criação de programas de recuperação e desenvolvimento das regiões atingidas - Criação de um Comitê Gestor Paritário entre representantes do BNDES e dos atingidos - Criação de condicionantes sociais com a participação dos atingidos nas obras financiadas pelo banco - Destinação de recursos para a construção de 5 mil unidades de hortas agroecológicas e projetos de produção junto à CONAB - Destinação de recursos para realização do diagnóstico social - Apoio para realizar ações de enfrentamento à crise hídrica e para a implementação de placas solares de aquecimento de água - Retomar o Fórum de Diálogo com a Sociedade Civil - Reformulação da política socioambiental e social - Voltar a excluir dos empréstimos as empresas flagradas com trabalho escravo

13 13


Arpilleras: a costura como ferramenta política Sediada no Memorial da América Latina, a mostra organizada pelo MAB reúne peças de mulheres afetadas por conflitos de vários países do mundo.

P

rovavelmente você nunca ouviu falar em Elaine Souza. Negra, pobre e atingida por barragem. Uma história invisível como de muitas outras pessoas que lutam contra as constantes violações de direitos no Brasil. Uma história calada. Tímida. Sufocada. Até mesmo pelo machismo discursivo dos movimentos sociais.

de gênero, mas também ao enfrentar um “grande inimigo” que transformou completamente sua vida e comunidade.

gidos pela hidrelétrica. Os relatos incluem depressão coletiva e uma série de tentativas de suicídio em decorrência da usina.

Inaugurada há nove anos, a Usina Hidrelétrica Aimorés foi construída sobre o leito do rio Doce, por meio de uma parceria entre a Vale e a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), e atingiu milhares de pessoas na região norte de Minas Gerais, incluindo Elaine e sua família.

Mas, agora, histórias de resistência como a de Elaine saem da invisibilidade. Reunidas no Encontro Regional de Mulheres do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), em novembro do ano passado, no município de Resplendor (MG), a mineira e outras atingidas pela hidrelétrica de Aimorés se utilizaram de uma ferramenta inusitada para contar suas dores e potencializar a resistência: bordar.

Seu município, Itueta, foi inundado pelo lago da barragem. A população rural, localizada na região norte, ficou isolada. “Nós, do interior, perdemos a estrada que passava na beira do rio e isso aumentou em trinta quilômetros o percurso para chegar à cidade”, recorda Elaine.

Elaine Souza

Entretanto, a militante precisava tecer os fios da memória e construir sua história. Contar ao mundo as dores e alegrias de sua luta. Não apenas no combate às barreiras 14

O resultado do “progresso energético” foi aterrador. De acordo com o relatório do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), que analisou durante quatro anos as denúncias de violações na construção de barragens no Brasil (20062010), onze direitos humanos foram infrin-

Quebrando barreiras No dia 22 de setembro, Elaine chegou cedo ao Terminal Rodoviário Tietê, vindo para a exposição que seria lançada três dias depois. Entre malas, carrinhos e ônibus, a mineira acabava de cumprir mais um desafio: conhecer sozinha a maior metrópole do país. Mas não era só isso. Com o olhar curioso, algumas vezes preocupado, Elaine se encaminhou apressada para a Barra Funda, na região Oeste da capital paulista. Jornal do MAB | Outubro de 2015


“Eu vim até aqui representar milhares de atingidas que ficaram na minha região e em outras espalhadas pelo Brasil. Eu estou carregando comigo essa responsabilidade”, afirmou. Na mochila, a atingida trazia com cuidado sua “própria terra costurada” por diversas mãos. “Durante uma oficina, nós resgatamos a técnica de costura das arpilleras, que foi utilizada pelas mulheres chilenas como forma de denúncia durante a ditadura militar, para também denunciar os nossos carrascos”, rememorou. O bordado “Epidemia Psicosocial”, produzido por uma técnica em que a costura é elemento de reflexão política e social, foi uma das escolhidas para representar as violações de direitos humanos cometidas contra as populações atingidas por barragens, em especial às mulheres.

Bordado e política? “Talvez essa seja a exposição de arpilleras mais bonita que eu já vi”, afirmou no

Jornal do Jornal do MAB MAB || Outubro Outubrode de2015 2015

dia 25 de setembro a curadora internacional da exposição Conflict Textiles, que reúne arpilleras produzidas em vários países do mundo. Roberta Bacic entrou em contato com as arpilleras ainda durante os anos de terror vividos em seu país. No período da ditadura chilena, que ocorreu entre os anos de 1973 e 1990, Roberta observou como a costura se contrapôs à brutalidade comandada pelo general Augusto Pinochet. As mulheres com parentes desaparecidos se reuniam, geralmente na periferia de Santiago, para costurar relatos das violações que aconteciam no Chile. Muitas dessas peças foram enviadas à Europa e serviram como uma das principais armas de denúncia ao regime ditatorial. Depois de se envolver em diversas atividades de resgate à memória, incluindo a Comissão Nacional de Reparação e Reconciliação (1993-1996), Roberta decidiu exportar a técnica das arpilleras para outros lugares do mundo. No Brasil, esta técnica foi resgatada em

parceria com o MAB, que organizou, desde 2013, mais de 100 oficinas com a participação de 900 mulheres atingidas das cinco regiões do país. Para a integrante da coordenação nacional do MAB, Tchenna Maso, esta é uma transgressão do papel da costura. “Utilizamos uma atividade corriqueira na vida das mulheres para aperfeiçoar um método de trabalho feminista e popular nas áreas atingidas por barragens”, afirmou. Todo esse trabalho desenvolvido durante esses dois anos faz parte da exposição Arpilleras: bordando a resistência, que reúne 25 peças produzidas pelas atingidas brasileiras e 12 costuradas por mulheres de seis países, envolvidas em conflitos policiais, desaparecimentos políticos, encarceramento, imigração, minas terrestres ou lutas indígenas. A exposição, lançada no dia 25 de setembro, seguirá até o dia 25 de outubro no Salão de Atos Tiradentes, no Memorial da América Latina. Durante a programação, também está previsto a exibição de filmes, debates e oficinas de costura.

15 15


Famílias do MAB e MST comemoram conquista da terra no RS vivemos com nossos pais na infância e o que eu vou repassar agora para os meus filhos”, afirmou.

Famílias comemoram reassentamento no Rio Grande do Sul, após ocuparem por mais de um ano a Fazenda São Clemente.

O assentamento onde Marinez vai morar e produzir é o primeiro federal criado este ano no Rio Grande do Sul. Ele é fruto da luta de famílias ligadas ao Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que ocuparam a Fazenda São Clemente em agosto de 2014. No último mês de setembro, o Governo Federal oficializou a aquisição de uma área de 2.045 hectares, por R$ 25,7 milhões.

O

dia 9 de outubro se tornou uma data para nunca ser esquecida por 143 famílias camponesas do Rio Grande do Sul. Após sete anos vivendo embaixo de lona preta, elas conquistaram um pedaço de terra no reassentamento Dom Orlando Dotti, nome que homenageia o bispo emérito do município de Vacaria, e planejam produzir alimentos saudáveis e livres de venenos. O novo assentamento é o primeiro conquistado por famílias expulsas pela construção de barragens que não foram contempladas por empresas construtoras. A atingida por barragem de 39 anos e mãe de seis filhos, Marinez de Jesus Gasperin, finalmente conquistou o seu pedaço de terra. A agricultora é filha de reassentados e destaca que a luta valeu a pena. “Essa conquista é tudo para a gente que se criou na agricultura. Ela é a continuação do que

Ato comemorativo Para celebrar a conquista do assentamento Dom Orlando Dotti, o MST e o MAB organizaram um ato comemorativo, que contou com a participação de mais de 700 pessoas. De acordo o dirigente nacional do MST, Cedenir de Oliveira, a conquista reafirma a importância da reforma agrária, mas o desafio está apenas no início. “A nossa luta não para aqui, ela só vai parar no dia em

que todas as famílias tiverem um pedaço de terra para poderem produzirem com dignidade”, defendeu Oliveira. Já a representante da Via Campesina e dirigente nacional do MAB, Sônia Mara Maranho, abordou a necessidade da unificação dos movimentos sociais e a desapropriação de novas áreas. “Isolados não conseguimos nos organizar para irmos às ruas defender a democracia e a dignidade dos trabalhadores e trabalhadoras. Precisamos continuar a nossa luta, porque nós perdemos somente quando desistimos. As lutas que continuamos, nós conquistamos”, argumentou Maranho.

Estruturação do assentamento Os beneficiários da Reforma Agrária serão contemplados com créditos iniciais para a instalação das famílias e a compra de bens duráveis de uso doméstico e equipamentos produtivos. Eles também receberão auxílio do Incra para o encaminhamento de projetos do programa Minha Casa, Minha Vida, do Governo Federal. Além disso, os agricultores terão assistência técnica por meio de entidades contratadas pelo Instituto, podendo desenvolver, através do Fomento, projetos produtivos com vistas à sua soberania alimentar e nutricional, e à geração de trabalho e renda. Os assentados terão ainda a implantação ou recuperação da infraestrutura básica, como construção ou complementação de estradas vicinais, saneamento básico e a eletrificação rural, obras que são executadas por meio de licitações públicas ou convênios com estados e municípios, ou em parceria com outros órgãos governamentais.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.