Nº 19 | Novembro de 2011
Avança a luta contra a privatização da água e da energia
Páginas 4 e 5
Não às alterações do Código Florestal! Página 3 Jornal do MAB | Novembro de 2011
O dilema de Belo Monte Página 8
O lucro e o caos nas barragens do rio Madeira Página 9 1
EDITORIAL
Atingidos por barragens se organizam em grupos de base
Muita gente organizada, muita luta, com grande qualidade
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ara responder aos grandes desafios de nossa época, as organizações populares necessitam ampliar sua força. Se olharmos os planos na área energética, veremos que as grandes empresas têm muito claro o seu objetivo, que é, ao dominar o sistema todo, ampliar os seus lucros explorando os trabalhadores e se apropriando dos recursos naturais. Reconhecemos que a força econômica, política e ideológica dos empresários capitalistas é grande. Para combater essa força, é só com outra enorme força: a dos trabalhadores organizados, no campo e na cidade, para impulsionar as mudanças necessárias em nosso país. Ao terminarmos este ano de 2011, decidimos que nos próximos anos uma das principais tarefas dos atingidos por barragens no Brasil é aumentar nossa força. Apontamos que para termos força precisamos de muita gente organizada, muitas lutas e com grande qualidade. Bom final de 2011.
Muita luta e felicidade em 2012!
No final de outubro, uma brigada de militantes do MAB fez um grande mutirão de organização das famílias atingidas pela barragem de Castanhão, no Ceará (foto). A proposta é a organização em grupos de base (GBs), como forma de avançar na produção, na formação e nas lutas. Com o mutirão, os militantes visitaram as famílias para apresentar a mensagem do Movimento e reforçar a importância da organização nos grupos de base. Durante o dia, a brigada fez as visitas nas casas e à noite realizou as reuniões formando os grupos. Já em Minas Gerais, os militantes estão animados com a meta de organizar os grupos de base. Já houveram reuniões nas três regiões do estado com os coordenadores e também encontros regionais das mulheres para fortalecer a pertença delas na organicidade do MAB.
Expediente
Jornal do MAB
Uma publicação do Movimento dos Atingidos por Barragens Produção: Setor de Comunicação do MAB Projeto Gráfico: MDA Comunicação Integrada Tiragem: 8.000 exemplares
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VISITE O SITE DO MAB Em www.mabnacional.org.br é possível ler notícias sobre o Movimento, ver fotos e vídeos, ler artigos e ouvir músicas. Acompanhe as novidades e compartilhe com os companheiros e companheiras! Jornal do MAB | Novembro de 2011
Não às alterações do Código Florestal! Proposta ruralista de mudança na legislação tramita no Senado
“O objetivo maior será pressionar o governo federal, para que a presidenta garanta o veto às questões centrais, como
a anistia e regularização dos desmatamentos feitos até 2008 e a possibilidade de novos desmatamentos, e pressionar para que os pontos secundários sejam resolvidos no Senado”, afirma Luiz Zarref, da Via Campesina. A Via Campesina está articulada com a CUT (Central Única dos Trabalhadores), a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e uma série de entidades ambientalistas no Comitê Brasil em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável, que organizou um abaixo-assinado contra as altera-
ções do código. O objetivo é coletar um milhão de assinaturas. Ainda este ano, as organizações realizarão diversos atos nos estados e em Brasília. No Senado, o projeto passa pelas comissões de Constituição e Justiça, Ciência e Tecnologia e Agricultura e Meio Ambiente. Depois disso, o texto passa pelo Plenário e retorna à Câmara dos Deputados, onde a proposta do Senado deve ser aprovada ou rejeitada (sem novas modificações). E, daí, segue para a sanção ou veto da presidenta. Foto: João Zinclar
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pós ser aprovado na Câmara dos Deputados em junho deste ano, o projeto de lei do deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB), que altera o Código Florestal brasileiro para pior, tramita no Senado. Diante desse quadro, o objetivo dos movimentos da Via Campesina é unir forças para sensibilizar os senadores e pressionar a presidenta Dilma a vetar a proposta.
Veja as mudanças do Código propostas pelos ruralistas 4 Anistia a quem agrediu o meio ambiente até 2008 4 Garantia da manutenção de pastagem em topos de morro e bordas de chapada 4 Acesso por parte dos grandes proprietários a fundos públicos para recuperar os desmatamentos que fizeram ilegalmente 4 Redução da área de proteção permanente (beiras de rios e encostas e topos de morros) de 30 para 15 metros para recuperação nos casos que não forem consolidados 4 Permissão de compensação da reserva legal desmatada dentro do mesmo bioma, ou seja, um fazendeiro pode desmatar uma
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área inteira e dizer que está conservando uma outra imprópria para a agricultura num outro estado 4 Manutenção da possibilidade de que médias e grandes propriedades possam se subdividir em propriedades de quatro módulos e, com isso, ficarem livres de recompor a reserva legal desmatada 4 Continua permitindo a recuperação da reserva legal com 50% de espécies exóticas. Ou seja, as grandes empresas de celulose podem considerar o monocultivo de eucalipto como parte da reserva legal
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Movimentos sociais e sindicais contra a privatização da água
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reocupados com o avanço na privatização da água em diversos municípios brasileiros, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a Federação Nacional dos Urbanitários (FNU) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT), entre outros, lançaram no início de novembro, em Maceió (AL), uma campanha contra as parceiras público-privadas (PPPs) nos serviços de tratamento de água e esgoto.
O nome da campanha é “Água para o Brasil – um direito de todos não pode virar lucro de alguns” e seu primeiro objetivo será envolver a sociedade no debate sobre a questão. “As pessoas não costumam considerar PPP como uma privatização, mas também é. As companhias públicas passam ao controle privado, as tarifas sobem e as experiências de hoje mostram que o serviço fica pior”, disse José Josivaldo 4
Alves de Oliveira, da coordenação Entre as denúncias feitas pela nacional do MAB. As Parcerias campanha está a de que as grandes Público-Privadas são as diversas empresas buscam institucionalimodalidades de envolzar seu modelo e inQuem vimento de empresas teresses através de um privadas em projetos defende a conjunto de regras e de investimento de normas, que posteriorprivatização interesse público, ou mente transformam-se seja, os empresários em leis, acordos e trada nossa água passam a controlar tados, em que o povo não tem um setores estratégicos do passa a ser submetido Estado, fazendo valer e obrigado a segui-los, pingo de razão os seus interesses. como se fossem de seus interesses. As organiza-
ções que integram a campanha defendem que o serviço de água seja público e estatal, ou seja, que é um papel do Estado oferecer este serviço com qualidade a todos os brasileiros e brasileiras. A experiência da privatização de diversos serviços no país durante a década de 90 já mostrou que quem paga a conta desse processo é a população, sobretudo os mais pobres, que sofrem com o aumento no preço dos serviços e a piora na qualidade. “Para nós, a água não é um recurso privatizável. É um bem de todos. Sem água não há vida. Por isso, deve permanecer em mãos públicas, não devendo, de forma alguma, virar objeto de exploração comercial”, afirma Franklin Moreira, presidente da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU).
Segundo Josivaldo de Oliveira existe um movimento intenso de apropriação da água no saneamento, na geração de hidroeletricidade, no agro e hidronegócio, nos processos industriais e mineração, nas transposições de rios, nas concessões dos rios e lagos, na apropriação e comercialização das reservas de águas minerais. Entre os principais interessados neste processo estão grandes corporações, como Nestlé, Suez, Coca-Cola, Vivendi, Odebrecht, Camargo Correa, entre outras.
Para o coordenador, esse movimento do capital se legitima também pelo discurso da escassez e das secas e desastres ambientais. “Esse discurso ideológico usado pelas grandes empresas e pelos meios de comunicação tem sido instrumentos de ameaça, chantagem e convencimento para impor seus interesses sobre os povos. Inclusive, para estabelecer um novo conceito à água, que passa ter valor de mercado, tal como propôs a Nestlé de transformar a água em commodities, onde seu preço seria definido na bolsa de valores”, disse. Jornal do MAB | Novembro de 2011
Trabalhadores em defesa da renovação
das concessões do setor elétrico
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s movimentos e entidades articulados na Plataforma Operária e Camponesa para Energia lançaram no mês de novembro uma campanha pela renovação das concessões do setor elétrico, que vão vencer entre 2015 e 2017. No entendimento das organizações, a realização de novos leilões significa aprofundar a privatização do setor e com isso piorar a qualidade do serviço, aumentar o preço da luz, aumentar a exploração dos trabalhadores e retroceder no reconhecimento dos direitos das populações atingidas. As entidades da Plataforma, como o MAB e os sindicatos dos trabalhadores do setor elétrico, entre outros, realizaram o lançamento da campanha pela renovação no dia 18 de novembro, em Paulo Afonso, Bahia. O local é simbólico porque o complexo hidrelétrico de Paulo Afonso pertence à Chesf, uma das principais estatais do setor elétrico. Se o leilão for realizado, a maior parte do patrimônio dessa estatal corre risco de ser privatizada. “Isso significa menos emprego e, com isso, menos desenvolvimento para a região Nordeste”, afirmou Edvaldo Gomes, da Federação dos Urbanitários do Nordeste. As concessões que vão vencer representam 23% da capacidade de geração, 74% da transmissão e 33% da distribuição da energia elétrica. A maior parte dos contratos, principalmente de geração, está sob controle de empresas estatais, como Chesf, Furnas, Eletronorte, Cesp, Cemig e Copel. Por isso, diversos setores empresariais, como a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e Abracel (Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres), estão defendendo a realização dos leilões, ou seja, a privatização. Astutamente, a Fiesp veiculou a campanha afirmando que isso vai Jornal do MAB | Novembro de 2011
garantir tarifas mais baixas para a energia que o cidadão consome em sua casa. Mas o que está de fato por trás dessa investida empresarial é o desejo de adquirir empresas de energia e usá-las a seu favor. O raciocínio é simples: o dono da companhia de geração de energia vai poder usar essa mesma energia em suas indústrias por preço muito baixo, e transferir os custos para o consumidor residencial, aumentando as tarifas.
Movimentos fazem marcha nas ruas de Paulo Afonso
O aumento do preço da energia, em até 400%, desde a onda de privatização dos anos 90 prova essa intenção. Hoje em dia, um cidadão comum paga, em média, mais de R$ 500 por megawatt/hora. Uma fabricante de alumínio, por exemplo, paga pelo
mesmo megawatt/hora apenas R$ 50, em média. “Isso quer dizer que nós, os trabalhadores, estamos pagando muito mais só para sustentar o grande desconto que os empresários desfrutam”, traduz Gilberto Cervinski, da Coordenação Nacional do MAB. “Sem falar que muitas dessas empresas não geram empregos, tomam recursos públicos subsidiados, são poluentes e ainda destinam a maior parte de sua produção para exportação”, diz ele. Por conta desses e outros fatores, a Plataforma defende a renovação das concessões já existentes no setor elétrico. No entanto, as organizações enfatizam que só renovar não basta: “É preciso que no processo de renovação sejam definidas regras que garantam a qualidade do serviço, o baixo preço da tarifa, e os direitos dos trabalhadores do setor, dos atingidos e da população”, afirma Joceli Andrioli, da Coordenação Nacional do MAB. “Para isso, o movimento sindical e os movimentos sociais vão ter de estar mobilizados para pressionar por essas mudanças”, afirma Artur Henrique, presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores). *Com informações da CUT
“Nossa principal preocupação é com a qualidade do serviço, o preço da tarifa e as condições de trabalho dos trabalhadores.” Artur Henrique, presidente da CUT
“Queremos que a energia que já foi amortizada seja para a população. A população já pagou por essa energia e não deve pagar novamente.” Franklin Moreira Gonçalves, presidente da FNU
“Essa é a principal disputa política no campo da energia nesse momento, por isso vai exigir unidade entre os movimentos e organizações da classe trabalhadora.” Joceli Andrioli, MAB
“Já sofremos na carne as consequências da privatização, com o sofrimento maior da sociedade brasileira, que vê todo o lucro ir para fora do país.” Mário Jorge Maia, Sinergia
“Há quatro anos vivo sem luz. E se o setor elétrico for privatizado, nem meus filhos terão luz elétrica em casa. Estamos juntos nessa luta, que é mais que justa.” José Adalberto, MST
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A luta pelos direitos dos atingidos
história da humanidade tem sido a história da luta de classes. De um lado estão os capitalistas, donos dos meios de produção, terras, fabricas, e, de outro, os trabalhadores, que possuem a força de trabalho. Mas, sendo o trabalho humano a base fundamental para desenvolver qualquer sociedade, os capitalistas sempre necessitam explorar o trabalho dos trabalhares para cada vez mais acumular capital. Nesta relação antagônica entre capital e trabalho, sempre que houve algumas conquistas de direitos básicos dos trabalhadores, foi através de muitas lutas. Estas lutas sempre serviram para denunciar a situação de exploração, reivindicar e conquistar direitos e forçar a criação de leis que diminuíssem a violação dos direitos humanos da classe trabalhadora. Assim tem sido a historia de luta das populações atingidas por barragens: de um lado estão o Estado e as empresas donas
das barragens, que em nome do “desenvolvimento” produzem energia como uma mercadoria para acumular riquezas, e de outro as populações atingidas que precisam se organizar, lutar e resistir para garantir seus direitos básicos de ter terra, casa e trabalho. No Brasil só se obteve conquistas e reconhecimento dos direitos dos atingidos pelas barragens onde os atingidos se organizaram e lutaram. São muitos os exemplos, que vão desde a luta para poder ter o direito de dizer não à barragem até para ter reassentamento, créditos, infraestrutura comunitária. Nos lugares onde não houve condição da organizar os atingidos, estes receberam indenizações que não possibilitam sua realocação digna. O lamentável disso é que até hoje não existe, por parte do Estado brasileiro, uma política de tratamento às populações atingidas. Isso fica a critério de cada empresa do setor elétrico. Como reflexo desse quadro, um estudo re-
cente feito pelo MAB, apresentado ao governo, demonstrou que nos últimos anos ouve um retrocesso no tratamento dos direitos das populações atingidas, o que reflete, por exemplo, na diminuição do número de famílias reassentadas por obra. Há um padrão de violação dos direitos humanos em áreas de construção de barragens, como comprova relatório da Comissão Especial “Atingidos por Barragens”, aprovado pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana em 2010. Inconformados com esta realidade de desrespeito às populações atingidas, o Movimento dos Atingidos por Barragens tem travado uma luta para garantir que os direitos dos atingidos sejam respeitados. Ao mesmo tempo, o MAB afirma a urgência em criar critérios e políticas que possam ser a garantia de um padrão de tratamento digno aos atingidos em qualquer lugar do território brasileiro.
Mulheres atingidas protestam em Brasília
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por barragens no Brasil Das promessas à realidade No final do mandato do ex presidente Lula, houve um reconhecimento público do governo de que o Estado brasileiro tem uma dívida social com os atingidos por barragens e, em outubro de 2010, foi assinado o decreto presidencial que institui o cadastro socioeconômico dos atingidos por barragens. Para o MAB, isso foi visto como um sinal positivo, pois o decreto admite um avanço no conceito de atingido, incluindo todos aqueles que têm seu modo de vida afetado pela obra e não somente os proprietários das terras. No entanto, um ano já se passou e a regulamentação deste decreto ainda não foi concluída pelo Comitê Provisório, coordenado pelo Ministério de Minas Energia. O Movimento tem manifestado preocupação com um possível retrocesso: “A nosso
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ver, alguns pontos estão sendo modificados no processo de regulamentação e demonstram um recuo do governo no compromisso assumido publicamente de que Estado brasileiro tem uma dívida histórica com os atingidos por barragens”, diz uma carta do MAB entregue ao governo recentemente. Além de pautar a necessidade de respeitar o decreto e que sua regulamentação seja para beneficiar os atingidos e não mais uma vez as empresas do setor elétrico, o Movimento dos Atingidos por Barragens também está empenhado, com base na experiência histórica, na elaboração de uma proposta básica para uma política de tratamento das populações atingidas. Esta proposta já foi apresentada ao governo e continuará sendo discutida, devendo ganhar o caráter de um amplo debate popular junto às populações atingidas e entidades parceiras.
Nossos direitos só a organização e a luta fazem valer Como a história mostra que só através da luta e da organização é possível os trabalhadores obterem conquistas, o MAB vem buscando cada vez mais fortalecer a organização de base e fazer a luta. Os atingidos e atingidas devem ser protagonistas desta história, tanto na garantia de conquistas concretas, como no acúmulo de forças para a criação de leis que possam dar parâmetros de tratamento aos atingidos por barragens. Por isso, o Movimento tem insistido na necessidade da organização dos grupos de base (GB), com o princípio do exercício da democracia, da solidariedade e do fortalecimento da luta permanentemente. Cada vez mais, para cada problema uma pauta, para cada pauta uma luta, para obtermos conquistas. Isso só é possível com uma organização firme.
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O dilema de Belo Monte
ndar por Altamira e região nesses últimos meses é como atravessar um grande canteiro de obras. A única diferença é que em Altamira as famílias residem dentro dele. Assim, as obras seguem seu ritmo no meio do povo, trazendo à tona as contradições que o Movimento dos Atingidos por Barragens já havia alertado que aconteceriam antes mesmo do início da construção. A posição do MAB sempre foi contrária à construção da usina de Belo Monte, porque esta obra é um desastre social e ambiental e não se justifica pela sua capacidade de geração de energia. Em fevereiro de 2010, quando o Movimento foi recebido por Lula, o MAB solicitou publicamente: “que não se leve adiante a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte
e que esta questão seja um dos pontos de debate com a população brasileira”. Já em abril de 2011, quando 500 mulheres atingidas por barragens foram recebidas pela presidenta Dilma, mais uma vez o MAB manifestou: “reafirmamos nossa posição contrária a construção da usina de Belo Monte e pedimos a imediata suspensão dos trabalhos naquela região”.
sados de fora, para atender a demanda de fora.
Movimentos sociais protestam em frente à Norte Energia, em Altamira
Mesmo com as ações de protesto dos atingidos, de diversos movimentos sociais e ambientais, de artistas, estudantes, da comunidade nacional e internacional, Belo Monte está sendo construída no coração da Amazônia em nome de velhos discursos da ditadura militar: trazer a integração e o desenvolvimento a uma região esquecida. De fato, o desenvolvimento para a população foi esquecido, mas o potencial energético, mineral e do agronegócio não! São projetos penMoradores da periferia de Altamira cobram direitos
Neste momento em que as obras ganham força, o Estado não tem propostas claras de tratamento à população. Só em Altamira estima-se que serão cerca de 40 mil atingidos, e até o momento, nada existe de concreto que sinalize a chegada do desenvolvimento às populações locais. “Falam em reassentamentos urbanos, e afirmam que as famílias têm que escolher entre a casa e a indenização. Mas como escolher se não existe nem sequer área comprada para construção dessas novas casas? São mais de 5 mil casas que devem ser construídas e ninguém sabe para onde vai”, denuncia uma militante do MAB na região.
Exploração na obra gera primeiros protestos dos operários No início de novembro, quase 300 trabalhadores cruzaram os braços na localidade Santo Antônio, onde estão sendo construídos os alojamentos para os operários da usina. Os operários denunciam que estão sendo obrigados a cumprir tarefas para as quais não foram contratados, além de outros mecanismos de exploração. Um operário, que não quis se identificar por medo de perseguição, disse que em Jirau, no Rio Madeira, a cesta básica era 170 reais e, em Belo Monte, são apenas 70 reais. E com apenas uma falta o trabalhador recebe, 8
como punição, o corte de 25% no valor da cesta básica e perde os sábados, domingos e feriados. Outro problema é com o pagamento das horas extras. Um trabalhador disse que deixou de receber quase 400 reais. “O salário é pequeno para um profissional. São R$ 4,20 por hora, e a hora extra faz muita diferença no final do mês”, afirmou. Eles temem que, diante de tanto descaso e exploração, a empresa não garanta as condições para que possam ir para casa no final de ano. Jornal do MAB | Novembro de 2011
O lucro e o caos
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nas barragens do rio Madeira
usina hidrelétrica de Santo Antônio, que está sendo construída no rio Madeira, em Rondônia, já tem data para o início da operação comercial: 15 de dezembro. Enquanto que para o consórcio Santo Antônio Energia o lucro com a venda da energia é antecipado [o início da geração era projetado para o próximo ano], os atingidos pela barragem sofrem com o rastro de problemas deixados pelas empresas em mais de três anos de construção, período em que as empresas implementaram um padrão de violações igual ou pior daquele verificado pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana.
Usina de Santo Antônio, em Porto Velho
E não satisfeitos com os 50 bilhões de reais que terão de lucro com a venda da energia em 30 anos (cerca de 200 mil reais por hora), agora o consórcio quer aumentar a profundidade do reservatório, com o objetivo de gerar mais energia. A cota subiria dos 70,5 metros para 71,3 metros, de acordo com pedido em análise na Aneel, podendo gerar 200 MW de energia a mais, mas aumentando também o número de atingidos. Tal pedido tem gerado uma disputa entre o consórcio construtor da barragem de Santo Antônio e o consórcio dono da UHE Jirau, que já conseguiu a liberação da Aneel para instalação de mais seis turbinas no ano passado. Jornal do MAB | Novembro de 2011
Brigas entre empresas à parte, levantamento constatou que para 88% o que preocupa a coordenação do dos atingidos, a situação piorou. MAB é o descaso com a população. A realidade das famílias “A inexistência de uma política atingidas se reflete na cidade de nacional que garanta os direitos Porto Velho, com o mínimos às famílias O consórcio Santo aumento da violênatingidas concede Antônio Energia é cia. O relatório ditotal liberdade para formado por vulgado pela Plataque as empresas Furnas (39%), Odebrecht forma Dhesca mosconstrutoras adotem (18,6%), Cemig (10%), trou várias conseuma política discriquências, entre elas Andrade Gutierrez minatória, preconque “entre 2008 e (12,4%) e FIP da ceituosa, injusta e 2010, o número de Amazônia (20%). autoritária de tratahomicídios doloO FIP tem como mento”, afirmam as acionistas o FI-FGTS e sos cresceu 44% lideranças. e a quantidade de A falta de uma a empresa canadense crianças e adolesMaple Leaf, que, política séria e de centes vítimas de critérios para inde- recentemente, comprou abuso ou exploranização, aliada ao a participação do banco ção sexual subiu desrespeito à realida- de investimentos Banif. 18%. Entre 2007 e de local e à vivência 2010, o número de histórica dos atingidos é uma das estupros cresceu 208%”. principais marcas das empresas Para a coordenação do MAB, construtoras de barragens em Ronos responsáveis pela atual situação, dônia. Os consórcios impuseram um tanto dos casos de violência como da modelo de reassentamentos que já população atingida, são as empresas apresentam inúmeros problemas. Se donas das usinas, que em nome do antes as famílias podiam sobreviver lucro, avançam sobre a Amazônia. Se em suas áreas de terras, agora receos problemas com os atingidos pela beram pequenos lotes que variam de UHE Santo Antônio são enormes, 400 m² a 10 hectares de terras, longe não é diferente com os atingidos dos rios e com condições precárias. pela UHE Jirau. No antigo distrito O único reassentamento com 50 de Mutum Paraná viviam mais de hectares é o de Santa Rita, sendo 400 famílias, formadas predominanque 40 hectares seriam de reserva, temente por pescadores, ribeirinhos, mas a empresa ainda não comprou a extrativistas e agricultores. As famíárea. Cabe ressaltar que nesta região lias foram removidas e apenas 125 o módulo mínimo do INCRA é de delas foram transferidas para uma 60 hectares. área urbana, denominada Nova MuAlém disso, um recente estudo tum Paraná.O que para o consórcio do próprio consórcio construtor sobre configura-se num reassentamento o monitoramento da população atincoletivo urbano, na realidade trata-se gida pela UHE Santo Antônio mostra de uma cidade com inúmeros proque as condições de vida pioraram: blemas, onde as casas pré-fabricadas 74% da população constatou que a sipara os atingidos são de péssima tuação em relação ao trabalho e renda qualidade e não estão de acordo com piorou. Com relação à pesca, o mesmo a vontade dos moradores. 9
ESTUDO
Empresas donas de hidrelétricas controlam territórios
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a bacia do rio Uruguai, na região Sul, já foram construídas sete usinas hidrelétricas: Itá, Machadinho, Barra Grande, Campos Novos, Foz do Chapecó, Passo Fundo e Monjolinho. Além dessas, vários outros projetos estão em processo acelerado para liberação e implementação. Entre elas destacam-se nas prioridades do governo federal as usinas de Itapiranga, Garabi, Pai Querê, Garibaldi e São Roque.
As principais empresas que controlam as barragens na bacia do rio Uruguai são a GDF Suez, Tractebel, CSN, Votorantim, Alcoa, Vale, Camargo Correa e CPFL Energia. Segundo o estudo, em 2009, o faturamento da Tractebel, filial da GDF Suez, foi de 3,496 bilhões de reais, sendo que seu lucro foi de R$ 1,134 bilhões. De 2004 até 2008, conforme relatórios financeiros da própria empresa, o lucro foi repassado integralmente aos seus acionistas na França e na Bélgica.
Estas sete usinas construídas já expulsaram quase 13 mil famílias de suas terras, aproximadamente 60 mil pessoas. E nas regiões ribeirinhas aos lagos formados pelas barragens mais de 300 comunidades atingidas ficaram desestruturadas, ocasionando problemas para cerca de 10 mil famílias, em torno de 40 mil pessoas. Esse número pode aumentar com as ameaças das empresas de não reconhecimento das famílias atingidas pelas Atingidos por Garibaldi fazem ato por seus direitos barragens de Garabi, Panambi e Garibaldi.
A geração de riqueza na bacia do rio Uruguai para acumulação privada As hidrelétricas, no atual modo de produção, nada mais são que grandes fábricas de produzir eletricidade. Em um estudo apresentado para a Universidade Federal do Rio de Janeiro, um militante do MAB aponta os lucros obtidos pelas empresas que controlam as sete barragens da bacia do rio Uruguai. Nos 30 anos de concessão, as empresas vão lucrar mais de 95 bilhões de reais, equivalente a mais de 3,2 bilhões por ano ou 364 mil reais por hora. Isso apenas na geração, se considerarmos também a transmissão e a distribuição dessa energia, o total alcança cerca 180 bilhões em 30 anos de concessão. “O lucro que as hidrelétricas geram e poderão gerar em todos os anos de concessão, se torna o único objetivo das empresas que constroem e se apropriam desta fonte de geração de eletricidade”, afirma Gilberto Cervinski, autor do estudo. 10
Lucro privado X investimentos federais Para uma análise mais pedagógica, o estudo faz uma comparação entre o faturamento que as sete hidrelétricas geram por ano com o total dos recursos transferidos pelo governo federal durante o mesmo ano a todos os municípios atingidos pelas sete barragens.
As sete hidrelétricas atingiram territórios e populações de 50 municípios, em 2009, a transferência total de recursos do governo federal a esses municípios foi de 479 milhões de reais. Se compararmos com o faturamento das empresas no mesmo ano (3,19 bilhões de reais), podemos verificar que as sete hidrelétricas geram um faturamento seis vezes maior que todo recurso vindo do governo federal aos 50 municípios. Ou seja, o recurso federal nestes municípios equivale à apenas 15% daquilo que cinco empresas estão faturando com a venda da energia das sete barragens no mesmo período. Estes dados comprovam que o tão anunciado discurso do desenvolvimento e progresso regional com a construção de barragem é uma mentira e quem lucra com as barragens são as empresas privadas. O que acontece na bacia do rio Uruguai se repete no Brasil inteiro, fato que tende a se agravar com as barragens previstas para os próximos anos. Jornal do MAB | Novembro de 2011
Famílias atingidas constroem cisternas Conquista garante acesso à água, um direito fundamental para a sobrevivência
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través de um longo processo de lutas, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) conquistou cisternas para o armazenamento de água em diversas regiões do Brasil. O projeto, em parceria com a Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (Aecid) e o Instituto Ambiental Brasil Sustentável (IABS), viabilizado através do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, beneficia 610 famílias nos estados de Minas Gerais, Ceará, Bahia, Pernambuco, Pará, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Rondônia. No Nordeste, região castigada pela seca, estão sendo construídas 267 cisternas. São 122 nas comunidades na região do Vale do São Francisco (Pernambuco e Bahia) e 145 cisternas no Ceará, distribuídas nas regiões do Maciço de Baturité e da barragem de Castanhão. Celso Rodrigues, militante do MAB em Pernambuco, conta que “através do projeto as famílias podem armazenar água da chuva para o consumo humano, uma água pura e sem poluição, pois a água do rio São Francisco está poluída pelo veneno jogado pelo agronegócio e pelos esgotos”. Celso também destaca que esse projeto está ajudando o MAB a organizar as famílias na região, já que são os próprios assentados que se organizam para construir as cisternas, aprendendo a técnica e trabalhando em conjunto. Para Graça Silva, atingida pela barragem de Castanhão e coordenadora de grupo de base, “o projeto vai melhorar muito a vida da comunidade, porque antes a gente ia buscar água nos açudes e era muito longe e agora temos água da chuva na porta de casa”. Graça também destaca o papel das cisternas para fortalecer o Movimento: “Com a conquista do projeto de cisternas temos mais facilidade para organizar as famílias no MAB porque elas estão tendo ganhos concretos e passam a entender que só através da luta podemos ter conquistas”. De acordo com o MAB, as cisternas se inserem dentro da proposta de acesso à água pelos atingidos, já que muitas vezes são privados do uso da água dos rios e dos lagos das barragens. Esse é um projeto piloto, que deve ser concluído no primeiro semestre de 2012. A perspectiva é ampliar o número de cisternas para as famílias nos próximos anos. Cabe ressaltar que o MAB é quem está desenvolvendo as primeiras experiências de construção de cisternas em outras regiões, além do Nordeste. Jornal do MAB | Novembro de 2011
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Basta de violência contra as mulheres!
om a perspectiva de que não é possível construir uma sociedade mais igualitária se persistir a opressão de gênero, os movimentos da Via Campesina estão engajados em uma campanha para erradicar a violência contra as mulheres. A ideia é denunciar todas as formas dessa violência, cobrar medidas do poder público e incentivar as mulheres a se organizarem para lutar contra esses problemas.
Os movimentos da Via entendem que a violência contra as mulheres é fruto do modelo patriarcal de sociedade, no qual as relações pessoais não estão fundamentadas no afeto, mas nas relações de poder e propriedade. Nesse modelo, a mulher aparece como um objeto que pertence ao homem e tem por obrigação lhe servir e dar prazer. Dessa forma, a violência é vista como algo natural, que serve para manter a ordem estabelecida. Por isso, muitas vezes as mulheres têm dificuldade para entender que o que estão sofrendo é violência, em especial quando a violência praticada contra elas não é física. A dificuldade para lidar com esse assunto decorre do fato de que, na maioria das vezes, a violência é praticada dentro de casa, pelos próprios companheiros. Há diversos tipos de violência sofridos pelas mulheres além da física (ou seja, as agressões e até assassinato) e da sexual (estupros e outros atos contra a sua vontade). Há também a violência psicológica (ameaças e chantagens), patrimonial (omissão ou destruição de objetos) e moral (calúnias e injúrias).
Violência contra as mulheres do campo Adriana Mezadri, do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), explica que, para as mulheres do campo, há alguns agravantes. “Por causa do isolamento e das relações mais conservadoras nas famílias, acabamos tendo mais dificuldade para denunciar esses casos. Há muita dificuldade em se separar dos maridos, porque as mulheres são mais culpabilizadas pelo fim dos relacionamentos”, conta. Além desse tipo de violência praticado dentro de casa, as mulheres camponesas estão sujeitas à violência do agronegócio e dos grandes projetos, como os de barragens. “Eles avançam sobre os nossos territórios e nos expulsam. E sabemos que esses problemas atingem as mulheres com mais força, com casos de violência sexual e prostituição, que acompanham esses projetos”. O MAB vem tratando desse assunto com bastante destaque este ano, a partir do Encontro das Mulheres Atingidas por Barragens, realizado em abril em Brasília. O Movimento também publicou uma cartilha sobre as violações dos direitos humanos das mulheres na construção de barragens, comprovando que elas são as mais prejudicadas por esses projetos. Além disso, diversos estados estão organizando encontros estaduais de mulheres para discutir o tema da campanha, entre outros assuntos. A militante do MMC destaca a importância das mulheres se unirem para combater esse problema: “É fundamental a organização entre as mulheres. Se você não tem com quem conversar, em quem se apoiar, acha que não tem saída. Organizadas nós nos ajudamos, encaramos os problemas e conseguimos lutar por mudanças”, explica.
A violência em números Mais de 40% das mulheres brasileiras já sofreram violência doméstica; A cada 24 segundos, uma mulher sofre violência física no país; Entre 1997 e 2007, 10 mulheres foram assassinadas por dia no Brasil; Até 47% das mulheres do mundo tiveram sua primeira relação sexual forçada. Fontes: Fundação Perseu Abramo, Instituto Sangari/DATASUS e OMS
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Jornal do MAB | Novembro de 2011