Jornal do MAB - 23ª edição/dezembro 2013

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Os resultados do leilão de Libra Página 3

Leilão é privatização Páginas 4 e 5

Nº 23 | Dezembro de 2013

Belo Monte contra o tempo Página 6

Plebiscito Popular pela redução da energia mobiliza mais de 300 cidades em Minas Gerais Página 7

Atingidos realizam encontro histórico em São Paulo


EDITORIAL

2013, ano de muita luta e organização. Esperamos 2014 melhor. 2013 está se encaminhando para o final,momento de fazer balanços e apontar desafios. Nós não temos dúvida que foi um ano importante, muitas e grandeslutas foram realizadas pelos trabalhadores/as no Brasil e no mundo. Para os atingidos por barragensa esperança é terminar o ano com uma inédita politica nacional de direitos aprovada legalmente pelo governo. É importante lembrar que nosso país está vivendo um momento diferente. A partir da metade deste ano, milhares de pessoas nas ruas protestando é a marca central. Acreditamos que surgiu um novo estado de animo para quem quer mudanças estruturais no país. Porém, reconhecemos que apesar das manifestações ainda vivemos numa sociedade extremamente desigual e sem sinais claros que esta situação tenda a mudar no curto prazo. Lembrar também que a crise do sistema capitalista continua, e nestes momentos aumenta a exploração sobre os trabalhadores e a apropriação dos recursos naturais em todo o mundo. O leilão do petróleo no campo de Libra, apesar de estar inserido em nova lei que

Expediente Jornal do MAB Uma publicação do Movimento dos Atingidos por Barragens Produção: Setor de Comunicação do MAB Projeto Gráfico: MDA Comunicação Integrada Tiragem: 10.000 exemplares

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a princípio garante maiores ganhos para o Brasil, reforça o domínio das grandes empresas privadas e estrangeiras. Comemoramos o final de 2013, pois foi um ano de muita luta e organização, e queremos que 2014 chegue e nos encontre animados para seguirmos sempre lutando para a construção de uma sociedade justa, fraterna e igualitária. Os desafios centrais para o próximo período foram decididos em nosso Encontro Nacional, realizado em Setembro, e apontam para a necessidade de ampla e qualificada organização dos atingidos por barragens em todo o País, intensa articulação entre os camponeses e operários e estreitamento de laços com lutadores e lutadoras de outros países. A construção de um projeto energético popular e a conquista dos direitos dos atingidos certamente não será obra divina e nem favor de governantes, só existirá com a luta e organização do nosso povo. Bom final de ano, que venha 2014. Água e energia com soberania, distribuição da riqueza e controle popular!

VISITE O SITE DO MAB Em www.mabnacional.org.br é possível ler notícias sobre o Movimento, ver fotos e vídeos, ler artigos e ouvir músicas. Acompanhe as novidades e compartilhe com os companheiros e companheiras! Jornal do MAB | Dezembro de 2013


Os resultados do leilão de Libra

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o dia 21 de outubro de 2013 foi realizado o leilão de venda do campo de Libra, maior reserva de petróleo em regiões do pré-sal. As reservas recuperáveis estão estimadas em 12 bilhões de barris de petróleo. Inscreveram-se 11 empresas para disputar o leilão, mas, ao final, apenas um consórcio participou da “disputa”. O consórcio de empresas que abocanhou Libra será formado pela Petrobrás com participação de 40% -, por empresas estrangeiras privadas - Shell (holandesa) e Total (francesa) com 20% cada - e por estatais chinesas - CNOOC e CNPC com 20%. As estrangeiras ficarão com 60% de Libra. O consórcio pagará ao país apenas o preço mínimo exigido, ou seja, 41,65% do óleo excedente.

avançando, também é uma grande dúvida. Parte do petróleo irá para o custo de produção (investimentos, pessoal, etc), estimado entre 15 e 30%. Outros 15% ficarão para os royalties, que será distribuído entre governo federal (5), estados (5) e municípios (5). Por fim, o lucro se dividirá entre o governo (41,65%) e para as empresas (58,35%). Na melhor situação, de cada barril produzido, 15% cobriria os custo de produção, 63% ficaria com o governo e 22% com os acionistas privados. Em pior cenário, 30% seria custo de produção, 52% para o governo e 18% ao privado. Quer dizer que a taxa média de lucro do capital privado ficará na faixa de 18 a 22%. Mais de 90 organizações populares e sindicais do campo e da cidade reali-

zaram um intenso processo de mobilização a nível nacional com passeatas, acampamentos, greves, ocupações para reivindicar o repasse integral do pré-sal para a Petrobrás, que representaria maior ganho ao povo. Mesmo assim o governo não dialogou e seguiu o caminho do leilão e da privatização da principal reserva estratégica de petróleo já descoberta em território nacional. Passado o leilão, a luta para que o petróleo seja inteiramente do povo brasileiro deverá seguir. Cabe a todos os lutadores e lutadoras seguirmos firmes contra as privatizações, pela participação popular nas decisões estratégicas do País, pela soberania nacional e pela distribuição da riqueza ali gerada.

Empresa

Porcentagem

Petrobrás

40%

SHELL (privada holandesa)

20%

Total (privada francesa)

20%

CNPC (estatal chinesa)

10%

CNOOC (estatal chinesa)

10%

FOTO: Douglas Mansur

O Brasil perdeu soberania, era dono de 100% e agora só tem 40% do campo de Libra.

60%

O tempo do contrato de concessão será de 35 anos, sendo que os primeiros 5 serão reservados para concluir a etapa de exploração e os outros 30 anos restantes se destinarão à produção. Conforme o professor da USP, Ildo Sauer, a partilha poderá ser menor ainda, podendo ficar, na média final, em 37,38%, já que a partilha é variável de acordo com dois fatores, o preço internacional do barril do petróleo e a produtividade média dos poços. A distribuição da riqueza gerada, à medida que a produção de petróleo for 3

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Leilão é

R

ecém saído do Encontro Nacional, o MAB encarou diversas lutas durante o mês de outubro em todas as regiões do país. As mobilizações se apresentaram como respostas à ofensiva contra o patrimônio público e, conseqüentemente, à soberania nacional, além de reivindicar pautas históricas da classe trabalhadora. Logo no início do mês, a partir de 03 de outubro, dia em que a Petrobrás completou 60 anos de história desde sua fundação, militantes do MAB, da Federação Única dos Petroleiros (FUP) e de outras organizações iniciaram um acampamento em Brasília, em defesa da soberania energética e contra a privatização do pré-sal. Ao invés de comemoração, a data foi marcada pelo início do processo que ganhou força e se estendeu por todo o país: Leilão é privatização. Dalí há alguns dias, estava marcado o leilão do campo de Libra, a maior descoberta estimada de petróleo dos últimos anos, com uma reserva estimada entre 12 e 15 bilhões de barris.

O acampamento ganhou mais força com a presença de outros movimentos ligados à Via Campesina, que foram às ruas na semana do dia 16, dia internacional de Luta pela Soberania Alimentar. Além da pauta contra a privatização do petróleo, os movimentos do campo denunciaram o combate ao modelo do agronegócio e defenderam a reforma agrária e a produção de alimentos saudáveis. Por isso, na quarta-feira, dia 16, diversos movimentos ocuparam o Ministério da Agricultura e, no dia seguinte (17), o Ministério de Minas e Energia. Os militantes exigiram o cancelamento do leilão do petróleo, reforma agrária e a criação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB). Em outros locais, o MAB, que se mobilizou em 13 estados, também se colocou ao lado dos petroleiros, que deflagraram greve nacional no dia 17, encerrada quase uma semana depois, no dia 23. Na região Centro-oeste, cerca de 500 integrantes do MAB, MST, CUT e Fetaet trancaram a rodovia Belém-Brasília, em Palmas (TO) por mais de três horas para panfletar contra o leilão. 4

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privatização Na região Sudeste, 300 manifestantes trancaram rodovia Fernão Dias (BR 381), na região metropolitana de Belo Horizonte (MG), depois de desocuparem o Departamento Nacional de Produção Mineral. Além disso, diversas organizações ocuparam, na manhã do dia 18, o prédio da Petrobrás, na Avenida Paulista, em São Paulo. Na região Sul, aproximadamente 1000 trabalhadores ocuparam, no dia 15, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), em Porto Alegre (RS). No mesmo dia, movimentos da Via Campesina ocuparam o INCRA em Santa Catarina, cobrando as pautas do campo. Já dia 17, cerca de 600 petroleiros e agricultores paralisaram todos os trabalhadores da Refinaria Alberta Pasqualini (REFAP), quinta maior usina do país, localizada no município de Canoas, no Rio Grande do Sul. Na região Norte, 350 famílias atingidas pelas usinas hidrelétricas de Santo Antônio, Jirau e Samuel, em Rondônia, bloquearam as duas entradas de acesso à usina, na BR 364, no sentido Jaci-Paraná. Neste mesmo dia, em Belém (PA), movimentos realizaram uma ocupação no prédio da Petrobrás, posteriormente acompanhada de uma grande marcha pelas ruas do centro da cidade, em solidariedade aos professores. Já no dia 18, atingidos ocuparam a sede da Norte Energia, consórcio de Belo Monte, em Altamira. No dia 21, 500 atingidos pelo Complexo Tapajós bloquearam a rodovia Transamazônica, na altura do município de Itaituba. Na região Nordeste, 2500 camponeses marcharam 70 quilômetros de Caaporã até João Pessoa, capital paraibana, por reforma agrária. Em Petrolina (PE), três mil pessoas ocuparam, no dia 15, a unidade da Monsanto, como denúncia às práticas de uma das maiores multinacionais da região. No dia 16, as ruas de Juazeiro (BA) amanheceram tomadas por bandeiras vermelhas, quando 6000 mil agricultores ocuparam a sede da CODEVASF. Já em Fortaleza, centenas de pessoas ocuparam a sede da Associação de Desenvolvimento Econômico do Ceará, além de realizar uma marcha no centro da cidade, pelo cancelamento do leilão do petróleo. Apesar da realização do leilão, o MAB avaliou positivamente as mobilizações da classe trabalhadora contra a entrega do patrimônio nacional. Esta foi apenas uma batalha, já que para o próximo ano poderá ocorrer mais uma rodada de leilão de petróleo. É necessário, por isso, manter um debate permanente sobre o petróleo e a importância de impedir a entrega dos recursos naturais brasileiros. Jornal do MAB | Dezembro de 2013

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ESTUDO

Belo Monte contra o tempo*

A

Norte Energia, dona da hidrelétrica de Belo Monte, se apressa para dar destino a quase 40 mil pessoas na cidade de Altamira, oeste do Pará. Até julho de 2014, o consórcio, formado por empresas do grupo Eletrobrás e privadas, precisa concluir as obras dos reassentamentos e mudar todas as famílias atingidas pela barragem que optarem por receber uma nova casa. A pressa é para não atrasar seu cronograma, que prevê a ligação da primeira turbina em fevereiro de 2015. Isso significa que, em pouco mais de 7 meses, a Norte Energia terá de dar destino a 7.790 famílias cadastradas na cidade, ou quase 40 mil pessoas. Já há estimativa que a população de Altamira tenha atingido 150 mil habitantes após o início das obras da terceira maior hidrelétrica do mundo, em 2011. Antes dela, a população era por volta de 99 mil. Ainda em novembro, as primeiras 290 famílias devem “inaugurar” um dos setores do reassentamento Jatobá. Elas receberão as primeiras casas de uma leva de 4.100 que devem ser construídas para os deslocados pela barragem em cinco áreas na periferia da cidade.

Para cumprir a meta, a empresa fará casas mais precárias do que as anunciadas inicialmente. As famílias se mudarão para casas com paredes de concreto, padronizadas em 63 metros quadrados e com três dormitórios. Cerca de um ano atrás, o consórcio divulgou um informativo dizendo que as casas seriam feitas em alvenaria, com três modelos de tamanhos diferentes (60, 69 e 78 m²) e com dois ou três dormitórios. A desconfiança quanto ao material das casas e à temperatura em seu interior, descontentamento quanto ao seu tamanho e a distância do centro e do rio Xingu estão entre os problemas comumente apresentados pelos atingidos por Belo Monte na área urbana de Altamira. A maioria deles são moradores de casas de palafitas, em áreas que chegam a passar mais de dois meses alagadas durante o inverno amazônico. Belo Monte atinge exatamente aquela parcela da população historicamente abandonada pelo poder público, que vive em ruas sem pavimentação, sem coleta de esgoto ou fornecimento de água, com energia elétrica precária.

“A Norte Energia está oferecendo aquela casinha bonitinha, que mais parece uma casa de boneca, mas eu tenho dúvida se não é melhor minha casa de madeira do que aquela lá”, conta Nalda Oliveira, uma das atingidas pela barragem, moradora de uma casa de palafita na área alagada de Altamira. Ouve-se, dos próprios trabalhadores que constroem as casas, que elas não estão firmes sobre solo arenoso, pois “não tem fundação”, sendo construídas apenas sobre uma laje. Contam que algumas casas já apresentam rachaduras. Nalda participa de um grupo de base do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). Na última sexta-feira (18 de outubro), por volta de 200 integrantes do Movimento, das cidades de Altamira e Brasil Novo, ocuparam o escritório da Norte Energia, dentro do reassentamento Jatobá. A pauta: moradia de qualidade para os atingidos. Os manifestantes demandavam da empresa que ela voltasse a oferecer três modelos de casa em alvenaria. Nas grades que cercavam o escritório, lia-se um cartaz: “Quem tem pressa é a Norte Energia, queremos casas de qualidade!”

Ação na justiça No final de outubro, o Ministério Público Federal entrou com uma ação judicial contra a Norte Energia e o IBAMA (órgão responsável pelo licenciamento da hidrelétrica) por irregularidades na construção do reassentamento. Essa foi a vigésima ação do MPF com relação a Belo Monte. Antes de entrar na justiça, o MPF recomendou ao IBAMA que indicasse a suspensão das obras por uma série de irregularidades. O MPF apontou falhas no sistema elétrico, pavimentação inadequada, além de desacordo com o código de obras do município. *Reportagem originalmente publicada no site da Carta Capital. Para ler na íntegra, acesse: site do MAB

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Especial

Encontro Nacional do MAB Água e energia com soberania, distribuição da riqueza e controle popular.

MAB faz encontro nacional histórico em São Paulo

2013 será marcado como um ano de importância histórica para a construção do movimento de atingidos por barragens no Brasil. Foi o ano da realização do 7º Encontro Nacional do MAB, que reuniu 2500 pessoas vindas de 17 Estados do Brasil, representantes de 20 países e de 65 entidades parceiras e apoiadoras da luta dos atingidos. De 2 a 5 de setembro fizemos lutas nas ruas de São Paulo, denunciando o cartel das grandes empresas que atuam na construção de barragens e no sistema de trens e metrôs das grandes cidades. Realizamos panfletagens nas estações de metrô discutindo o alto preço da luz e alertando que os trabalhadores urbanos também são atingidos pelo atual modelo do setor elétrico brasileiro que cobra taxas abusivas nas tarifas de energia elétrica. Na Marcha pela Soberania, em plena Avenida Paulista, denunciamos que leiloar o petróleo é privatizar umas das principais riquezas estratégicas da nação. Em plenária e nas ruas, os debates sobre a necessidade da política de direitos dos atingidos por barragens fizeram o governo, mais uma vez, se comprometer em criá-la. E na relação com nossos companheiros e companheiras de classe também nos fortalecemos: os debates sobre a política energética nacional, envolvendo os atingidos e os trabalhadores do setor elétrico, dos petroleiros,

dos metalúrgicos e dos químicos aproximou a aliança que buscamos construir nestes últimos anos. Outra marca do nosso encontro foi a presença de cerca de 120 crianças na ciranda infantil, os atos artísticos e culturais, as batucadas que embalaram e animaram o povo. As homenagens trouxeram presentes pessoas e organizações, que no decorrer dos principais momentos da política nacional e da construção do MAB, foram e são parte dessa história. E nos estados, outro sinal do grande avanço organizativo do nosso movimento: mobilizamos a base, realizamos atos políticos de lançamento, garantimos a comida para as refeições, fizemos reuniões com amigos do MAB, falamos aos meios de comunicação, doamos o sangue e o suor do nosso envolvimento militante com o Movimento para garantirmos a realização deste grande encontro que está e permanecerá na memória dos atingidos e nas lutas que virão. E isso é o que aponta as afirmações políticas do encontro: “Acreditamos que a luta coletiva é a única forma de avançar. Por isso, nos propomos a construir, de forma permanente, ousados planos de lutas, entendidos como processo e desafio de toda militância, homens e mulheres, jovens e crianças”.


Atingidos e atingidas de todo o país cobram do governo política nacional de direitos

Uma das bandeiras históricas do MAB foi levantada bem alto durante o encontro nacional: a bandeira pela criação da política nacional de direitos dos atingidos por barragens. A grande expectativa era de que o governo anunciasse a criação da política, conforme havia se comprometido. O ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria Geral da Presidência da República, esteve presente no encontro e publicamente, perante os atingidos, prometeu que a política nacional de direitos será assinada ainda neste ano. “Posso dizer pra vocês, em nome da presidenta Dilma, que ainda neste ano a presidenta vai assinar o decreto que institui a política nacional para os atingidos e que reconhece a dívida social, econômica e moral do Estado com os atingidos por barragens”, afirmou o ministro.

Não existe um marco legal para os atingidos

O

s atingidos e atingidas de todo o país lembram ao senhor Ministro e à Presidenta que estamos quase encerrando o ano de 2013 e a política ainda não foi assinada. “Esta pressão que fazemos é para ter um mínimo de garantia de que nossos direitos serão considerados com a construção de barragens. Hoje, com as obras avançando rapidamente em todo o país sob o mando de grandes empresas nacionais e estrangeiras, não temos nada que nos assegure o direito”, disse José Josivaldo Alves de Oliveira, da coordenação nacional do MAB. A única garantia jurídica é o Decreto 3.356, de 1941, que reconhece como 2

atingidos apenas os proprietários de terras e estabelece a indenização como única política de compensação.O MAB já apresentou ao governo sua proposta de Política Nacional de Direitos dos Atingidos (PNAB), que define o conceito de atingido de maneira ampla e versa sobre formas de reparação e direitos dessas populações. Além disso, o MAB reivindica a criação de fundo que destine recursos para a viabilização da política de direitos e a elaboração de projetos de recuperação e desenvolvimento das comunidades e municípios atingidos. No último dia 7 de novembro, o MAB participou de mais uma reunião com representantes do governo federal e

apresentou a preocupação dos atingidos com o retrocesso que a política de tratamento aos atingidos sofreu nos últimos anos. “Já se passaram 11 anos de governo democrático, três do governo Dilma e nada se concretizou na pauta dos atingidos, muito pelo contrário”, apontaram as lideranças. Mais uma vez, o ministro Carvalho se comprometeu em concluir a política de direitos até o final do ano e garantiu uma reunião com a presidenta Dilma em dezembro para oficializar a PNAB. “Realmente não dá mais para enrolar, ações concretas precisam ser feitas”, admitiu. Especial Encontro Nacional do MAB


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Trabalhadores protestam contra as transnacionais, em defesa do pré-sal e por direitos nas ruas de São Paulo

m dos pontos fortes do encontro nacional do MAB foram os atos realizados em duas das principais ruas do Brasil: a Marginal Tietê e a Avenida Paulista. No dia 4 de setembro, o MAB e o Levante Popular da Juventude protagonizaram uma das principais lutas já realizadas em São Paulo no último período contra grandes transnacionais do setor de transporte e energia. Os manifestantes fizeram um escracho em frente às sedes das empresas Siemens e Alstom, na Marginal Tietê.

de metrô e trens em São Paulo, que ficou conhecido como propinoduto tucano.

Essas duas empresas foram o alvo escolhido, pois denúncias apontam que elas montaram um esquema de corrupção para fraudar licitações das obras, reformas e fornecimento de equipamentos para o sistema

O MAB denunciou que a Alstom e a Siemens também atuam na área da energia, no fornecimento de equipamentos e turbinas. A Alstom, por exemplo, fornece turbinas para Belo Monte e assinou com a Norte Energia

um contrato de R$3,5 bilhões. “As empresas corruptoras nas obras de metrô e barragens têm nomes: Alstom e Siemens. Essas empresas se sustentam em um modelo corrupto. Os recursos públicos desviados devem ser voltados para melhorar o transporte público do povo”, disse Robson Formica, da coordenação do MAB.

Avenida Paulista foi palco de grande luta em defesa do pré-sal e pela soberania nacional Para João Antônio de Moraes, da Federação Única dos Petroleiros, essa riqueza é um bem que pertence ao povo brasileiro, e que, portanto, os recursos gerados têm que ser voltados plenamente aos brasileiros, e não entregues às grandes empresas.

F

na área do pré-sal, contra a concessão das hidrelétricas devolvidas ao governo federal e por uma política nacional de direitos às populações atingidas pelas barragens.

Os manifestantes marcharam pelo cancelamento do leilão do campo de Libra,

“Lutamos pela soberania energética, seja ela do petróleo ou das hidrelétricas, pois são as grandes transnacionais que controlam a energia em nosso país”, disse Gilberto Cervinski, do MAB.

oram cerca de quatro mil integrantes do MAB, petroleiros, trabalhadores do setor elétrico e agricultores sem terra, entre outros que, por mais de três horas, bloquearam a Avenida Paulista, um dos centros financeiros da cidade de São Paulo.

Segundo dados apresentados pela própria federação, o valor concedido às empresas que pretendem explorar o petróleo equivaleria a 280 anos do orçamento da saúde, 800 anos do orçamento da educação e 260 milhões de moradias populares. O ato terminou em frente ao prédio da Secretaria Geral da Presidência da República, onde os movimentos sociais e sindicatos entregaram uma carta destinada à presidenta Dilma Rousseff apresentando as reivindicações. 3


Encontro do MAB fortalece a mística e cultura popular Chapéus, enxadas, remos de barco, flores, bandeiras, colchas de retalhos, artesanato de vários tipos. Estes são exemplos de instrumentos de trabalho e da produção cotidiana dos atingidos por barragens de todas as regiões do país que estiveram participando do encontro nacional do MAB. “As regiões trouxeram para o encontro simbologias que fazem pensar e valorizar a luta em sua perspectiva mística, na geração de uma energia que faz avançar a animação e a reflexão sobre a importância de sair do papel de vítima e colocar-se como sujeito de sua história e da luta coletiva”, afirmou Fernanda de Oliveira Portes, da coordenação nacional do movimento. Pensando em trazer o máximo possível das diferentes culturas, etnias e questões típicas, foram divididas grandes regiões do país para apresentações em cada momento das atividades, nos quatro dias de encontro. “É importante salientar que a construção do encontro foi sendo trabalhada nos estados desde 2011, caminhando na perspectiva da mensagem política de nosso encontro”, destacou Fernanda.

Apresentações culturais trazem ainda mais animação Cultura e arte estão sempre fazendo parte do movimento. Dentro do Encontro Nacional não foi diferente. Além dos momentos de mística preparados pelos próprios militantes e das batucadas levadas pelo Levante Popular da Juventude, algumas apresentações fizeram parte da programação. A Orquestra Sanfônica de São Paulo, que reúne dezenas de sanfoneiros, foi um dos destaques do programa cultural do encontro, que envolveu também animação com cantores populares e um repertório bastante ligado às lutas do MAB.

A criançada criou seu espaço no encontro As crianças tiveram papel importante no encontro nacional. Foram cerca de 120 crianças participantes. Daiane Carlos, coordenadora da Ciranda, o espaço dedicado às crianças dentro do encontro, enfatiza que durante os quatro dias discutiram a importância da água e da energia, “para que aprendam desde pequenas que a energia é um bem público e não é uma mercadoria”. Suerda Almeida, mãe e militante do MAB no Ceará, reforçou que a ciranda é fundamental porque propicia a participação dos pais, principalmente das mães. “Podemos deixar nossos filhos para participar dos debates e das lutas de forma

mais tranquila. A ciranda ainda ajuda as nossas crianças a conhecer desde pequenos as lutas do povo e ir formando consciência”, disse Suerda. Elas fizeram a Carta das Crianças Atingidas por Barragens, que fala da importância da infância e seus direitos. Entre os pedidos está que a educação seja de qualidade, que na escola tenha merenda e educadores para ensinar, que a alimentação seja saudável, sem agrotóxicos e para que tenham terra para plantar e casa para morar, além de um espaço para a gente brincar, “do mesmo jeito ou melhor que a gente tinha antes da barragem”, diz a carta.


A

Plebiscito Popular pela redução da energia mobiliza mais de 300 cidades em Minas Gerais

conta de luz é terceiro gasto mensal que mais pesa no bolso do consumidor em Minas Gerais. Este dado foi constatado a partir de pesquisa de opinião realizada pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de Minas Gerais. A energia elétrica perde apenas para água e alimentação, na lista dos serviços que mais pesam no orçamento da população. Na tentativa de buscar uma solução para o povo mineiro, mais de 100 organizações construíram um processo de debate em torno do preço da luz no estado, distribuída pela Companhia de Energia de Minas Gerais (CEMIG). Atualmente, aproximadamente 75% de todo o patrimônio da CEMIG, uma companhia “estatal”, está nas mãos de investidores privados, a grande maioria estrangeiros. No ano passado, esses acionistas receberam 4,5 bilhões de reais, número superior ao lucro da empresa no ano, que foi de 4,2 bilhões de reais. Por outro lado, toda família mineira paga dez vezes mais pelo consumo de energia elétrica que grandes empresas, como as mineradoras. Além disso, as tarifas aumentaram 120% acima da inflação nos últimos 15 anos. E, além dos interesses privados, o consumidor mineiro paga o maior imposto sobre a conta de luz no país. A cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS), um imposto estadual, representa 42,86% da conta de energia elétrica no estado. Uma família que paga uma conta de R$100, por exemplo, está pagando R$ 30 de imposto, que incide sobre a energia. A partir dessas comprovações, movimentos sociais, sindicais, igrejas e diversos Jornal do MAB | Dezembro de 2013

setores organizados da sociedade civil se articularam desde janeiro em torno da realização do Plebiscito Popular pela Redução das Tarifas de Energia Elétrica e do ICMS na Conta de Luz. Entre os dias 19 de outubro e 03 de novembro, milhares de urnas foram espalhadas por mais de 300 municípios, onde aproximadamente um milhão de pessoas respondeu às perguntas: 1) “Você concorda que o governo de MG deve reduzir o ICMS, que representa 42% da conta de luz, para 14% (como é em São Paulo e no Distrito Federal)?”; 2) “Você concorda que a CEMIG deve reduzir em 50% (no mínimo) a tarifa de energia para o povo de MG?”. Apesar da apuração das urnas ainda não estar concluído até o término desta edição, a estimativa é que 97% dos participantes foram favoráveis a redução das tarifas de energia elétrica no estado.

Segundo os organizadores, após o término da contagem dos votos, o resultado será entregue a setores do governo e políticos de todo o estado, para exigir a criação de um projeto de lei de iniciativa popular para a diminuição do preço da luz no estado. Para a coordenadora do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) no estado, Talita Vitorino, a votação não é o último passo da mobilização no estado. “Conseguimos escancarar, através do Plebiscito, uma enorme contradição, na qual os pequenos pagam mais e os grandes pagam menos. Apesar disso, só com pressão popular vamos efetivar a vontade da maioria da população, ou seja, a diminuição da conta de luz”, explicou. Também está prevista para o ano que vem um encontro de movimentos sociais e sindicais de Belo Horizonte, reunindo mais de cinco mil pessoas de todo o estado, para definir os próximos passos da mobilização. 7


Iberdrola: CULPADA! Organizações de 16 países se encontram no País Vasco para discutir estratégias de luta contra as transnacionais os outros da cidade, e que custou aos cofres públicos da capital do País Vasco 20 milhões de Euros. Os manifestantes também aproveitaram para denunciar o BBVA, banco daquele país, que financia a indústria armamentista e a energia suja ao redor do mundo, causando graves violações de direitos humanos.

Iberdrola no Brasil

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nergia suja, maquiagem verde, microssalários, insegurança no trabalho, terceirização, monopólio, colonização, evasão fiscal, destruição social e ambiental, corrupção, violação de direitos humanos... A transnacional vasca Iberdrola foi declarada CULPADA pelo Tribunal Popular instaurado por mais de 30 movimentos sociais de 16 países no centro antigo de Bilbao, no País Vasco, no dia 30 de outubro. A atividade fez parte da programação do Seminário Internacional “Alimentos, água e energia não são mercadorias”, que ocorreu em Bilbao entre os dias 29 e 31 de outubro. A atividade, organizada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e pela Mundubat, buscou reunir diversos movimentos e organizações. Após o julgamento, os manifestantes escracharam a transnacional, com uma marcha pelas ruas de Bilbao, que culminou em frente à sede da empresa. O foco do seminário foi identificar as estratégias do capital para enfrentar esse momento de crise econômica e fortalecer a união dos trabalhadores para lutar por um outro modelo. “Nesse momento de crise, o capital toma medidas muito mais agressivas contra os trabalhadores e a natureza e as transnacionais aparecem como uma dessas formas, que não respeitam pátria, nem trabalhadores, nem recursos naturais, apenas o lucro”, afirmou Leonardo Bauer, da coordenação nacional do MAB. Nesse enfoque, a Iberdrola foi a transnacional “homenageada” como um símbolo desse modelo econômico. A sede da empresa é localizada em Bilbao. Trata-se de um prédio gigantesco, muito maior que todos 8

A Iberdrola aparece no setor elétrico brasileiro como Neoenergia, um consórcio formado, além dela (com 39% das ações), pelo fundo de pensão Previ (49%) e pelo Banco do Brasil (12%). É a principal distribuidora da região nordeste do país, respondendo por 43% do mercado, após ter adquirido, no processo de privatização do fim dos anos 90, as distribuidoras Coelba (BA), Celpe (PE), Cosern (RN). Também comprou a distribuidora Elektro, de São Paulo, atendendo a 11,5 milhões de pessoas – mais clientes que no Estado espanhol, sede da empresa (10 milhões de pessoas). Na área de geração, a empresa possui a capacidade instalada de 2.077 MW, dos quais 1.075 MW são de hidrelétricas. Entre as hidrelétricas já em operação, encontram-se Dardanelos (MT), Baguari (MG), Itapebi (BA) e Corumbá III (DF). Sua presença no setor vai aumentar muito nos próximos anos, já que seus novos projetos correspondem a 13.691 MW. Entre eles, a principal é a hidrelétrica de Belo Monte (PA), com 11.223 MW, no qual a Neoenergia tem 10% das ações. Outros projetos são a hidrelétrica de Teles Pires (MT) e Baixo Iguaçu (PR). “A rentabilidade da empresa é astronômica, já que a Iberdrola está operando em um país onde se paga a 5ª tarifa mais cara do mundo, apesar de utilizar um dos tipos de geração mais baratos que existe, a hidreletricidade”, afirmou o pesquisador vasco Luis Miguel Uharte Pozas em seu estudo sobre a atuação da transnacional no Brasil e no México. Luis Miguel aponta diversos impactos da empresa no país, como deslocamento de comunidades, demissões massivas e subcontratação, destruição ambiental, entre outros. Jornal do MAB | Dezembro de 2013


Baixo Iguaçu, mais um caso de violação

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O Consórcio Geração Céu Azul, responsável pela usina, é formado pela Companhia Paranaense de Energia (Copel) e, majoritariamente, pela corporação Neoenergia, composta pelo Fundo de Previdência do Banco do Brasil (Previ), Banco do Brasil e pela multinacional espanhola Iberdrola. “Há um ano estamos tentando negociar com a empresa pra saber como ficará a situação das famílias. Muitas delas estão adoecendo, tanto que o número de pessoas que estão procurando os postos de saúde aumentou muito nos últimos dias. Por isso declaramos a Iberdrola culpada”, contou Rosane, professora e atingida pela UHE Baixo Iguaçu. A declaração foi realizada em praça pública, no antigo centro de Bilbao, na Espanha, no dia 31 de outubro, durante o Tribunal de Rua que agrupou mais de 60 organizações, de 15 países, para julgar as violações de direitos humanos cometidas pela Iberdrola, na cidade onde a sede da empresa está situada. Atualmente, a multinacional é uma das cinco maiores companhias elétricas do mundo, com presença em 40 países. “Não, nada da energia ficará para nós, nada da riqueza ficará para nós, tudo será exportado. O que fica é o tratamento da empresa ao povo atingido por essa usina. São pessoas que estão no canteiro de obras, passando dia e noite com o barulho das detonações das rochas e com o barulho das máquinas trabalhando no canteiro de obras”, continuou Rosane. Jornal do MAB | Dezembro de 2013

FOTO: Joka Madruga

Usina Hidrelétrica Baixo Iguaçu, prevista para ser construída no rio Iguaçu, no sudoeste paranaense, faz parte da atual política de expansão do setor elétrico nacional. Apenas no Paraná, o MAB estima a construção de aproximadamente 200 barragens para o próximo período, que poderão atingir entre 09 e 10 mil famílias.

Violação de

Direitos

Segundo o Plano Básico Ambiental (PBA), estudo que serve como diretriz ao longo da construção de hidrelétricas, a UHE Baixo Iguaçu atingirá 360 famílias, número subestimado nas contas do MAB, que estipula algo em torno de 800 famílias atingidas pela usina. No município de Planalto, por exemplo, das 27 famílias levantadas pelos próprios atingidos, apenas 11 constam no PBA. Isso é um caso crônico na realidade das barragens, onde o número de indenizados é sempre inferior à realidade. Um dos casos mais críticos de violação no tratamento aos atingidos ocorreu no canteiro de obras, localizado entre os municípios de Capanema e Capitão Leônidas Marques, onde 11 famílias foram atingidas diretamente em suas propriedades. “Já entraram com a reintegração de posse e não deram tempo pra nada, nem pra gente tirar o gado. Eles disseram que a gente deveria tirar o nosso gado se não iriam multar, como se a terra fosse deles. Tem famílias que vivem há cinquenta anos aqui”, afirmou Éder Junior Pichette, arrendatário de uma área invadida pelo consórcio no canteiro de obras.

Para Rodrigo, no próprio estado do Paraná, houve exemplos opostos na conquista de direitos. “Ao mesmo tempo em que temos Salto Caxias, que é exemplar na conquista de direitos dos atingidos a nível nacional, observamos aqui no estado Salto Santiago ou mesmo Itaipu, as quais os atingidos saíram praticamente sem nenhuma compensação. E essa diferença se deu praticamente por um aspecto: a luta e organização dos atingidos. Nós costumamos dizer que o tamanho dos direitos é resultado da intensidade da luta”, observou. A Neoenergia tenta reproduzir em Baixo Iguaçu uma velha prática das construtoras de barragens, que é negar os direitos das populações atingidas, desde o direito à informação até a possibilidade de indenização e reassentamentos. Porém, mais uma vez a luta e organização dos atingidos transformam os rumos da história. Hoje, com muita mobilização os atingidos estão pressionando a empresa a mudar sua postura e propostas de indenizações. “Mais uma vez provamos que só através de nossa luta, organização é possível fazer a empresa reconhecer nossos direitos” afirma Rodrigo. 9


Bordar, ato transgressor? O sofrimento e a dor de cada uma não são comparáveis, são vivências pessoais ou sociais. Mas o desafio e o ânimo de se converter em autora da sua própria história podem, sim, ser comparados.

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afirmação é da chilena Roberta Bacic, curadora da exposição Arpilleras da Resistência Política Chilena, que percorreu mais de trinta países, inclusive o Brasil, com circulação em cinco capitais no primeiro semestre do ano passado. A exposição traz fragmentos da memória chilena de 1973 a 1990, período de repressão e terror da ditadura militar no país, comandados pelo general Augusto Pinochet, através de uma técnica de bordado conhecida como arpillera. Essa é uma técnica antiga que surgiu a partir de uma tradição popular de Isla

Negra, no Chile, onde grupos de mulheres se reuniam para produzir peças de bordados como forma de subsistência. No período da ditadura, diversos grupos de mulheres se apropriaram das arpilleras e transformaram uma atividade tipicamente familiar em uma arma de comunicação contra a repressão. Ou, como afirmou Roberta, “transgrediram todos estes papeis e utilizaram a costura para não somente sobreviver economicamente, mas também para fazer a perspectiva de se tornar parte dos fatos que estavam ocorrendo”. Nas oficinas de arpilleras que se espalharam pelo país, mulheres bordavam telas com as roupas de seus parentes desaparecidos pelo regime ditatorial. Estas obras foram enviadas através da Vicaria de Solidariedad, uma instituição ligada à Igreja, a diversos países da Europa e Canadá, e serviram como denúncia internacional ao sistema de Pinochet. A partir desta experiência, Roberta expandiu essa expressão a mulheres de diversos países do mundo que também sofrem com violações de direitos humanos. O Movimento

dos Atingidos por Barragens (MAB) pretende se apropriar desta técnica aqui no Brasil. Através do projeto realizado em parceria com a União Europeia, que tem como objetivo diminuir os riscos de violação dos direitos humanos em áreas atingidas por barragens, o MAB irá desenvolver um trabalho com as arpilleras. O objetivo é realizar diversas oficinas nacionais e regionais até 2014, envolvendo 3.300 mulheres atingidas das regiões norte, nordeste, sudeste e sul para comunicarem através das telas as violações sofridas com a implantação das obras. Segundo relatório da Comissão Especial “Atingidas por Barragens”, do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), “as mulheres são atingidas de forma particularmente grave e encontram maiores obstáculo para a recomposição de seus meios e modos de vida; [...] elas não têm, via de regra, sido consideradas em suas especificidades e dificuldades particulares” e, por isso, “têm sido as principais vítimas dos processos de empobrecimento e marginalização decorrentes do planejamento, implementação e operação de barragens”. Para integrante da coordenação do MAB, Ivanei Dalla Costa, o principal objetivo é fortalecer o processo organizativo das mulheres dentro do movimento. “Esse projeto, mais do que contar a história de violação dos direitos humanos na construção das barragens, contribuirá para a organização das mulheres atingida, para podermos avançar na luta contra as desigualdades de gênero, reivindicando nossos direitos e pela emancipação das mulheres”, afirmou. A dor não pode ser comparável, mas o ânimo e vontade de se tornar autora da sua própria história sim. Para Violeta Parra, uma precursora da técnica, “as arpilleras são como canções que se pintam”. Por isso, talvez as atingidas possam materializar o coro entoado há anos: “pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer, participando sem medo de ser mulher”.

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Os sentimentos

eles nunca vão indenizar “Que mal a gente tinha cometido pra ter medo da polícia, do quartel?!”, bradou em um típico tom de indagação afirmativa. Guardadas na memória, diversas “peleias” travadas durante a ditadura militar brasileira.

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política desenvolvimentista do período ficou marcada pela intensificação dos grandes projetos hidrelétricos em todo o país, como Tucuruí, no Pará, e Itaipu, construída na divisa entre Brasil e Paraguai. Claides Helga Kowahld vivia há 38 anos na comunidade Água Verde, no município gaúcho de Marcelino Ramos, quando a notícia do projeto de construção de 25 hidrelétricas na bacia do rio Uruguai chegou à região, no início dos anos 80.

mim, porque eu fui a única mulher entre os 120 homens na comissão dos atingidos”, lembrou sorrindo. A luta foi acompanhada sempre de perto pela polícia e pelo exército, mas os atingidos não se intimidaram. Até garfo e faca eles foram impedidos de carregar, mas nas manifestações a enxada sempre esteve presente. “Não é por menos que nossa ferramenta de trabalho é uma ferramenta de luta.” Foram diversos anos de luta até a conquista, em 1987, do acordo, entre os atingidos e a estatal Eletrosul, que propiciou o reassentamento de famílias atingidas e contribuiu para a reconstrução das cidades e vilas a partir de um processo de participação da população na tomada de decisão. Apesar disso, para Dona Claides, hoje residente em Marmeleiro, no Paraná, a questão da energia no Brasil continua a mesma: “sabemos que a energia não foi construída pra nós, a energia foi construída para as empresas” e, além disso, “o progresso não veio pra nós, atingidos. E para o povo brasileiro, com certeza, o progresso também não veio”. Ao final da entrevista, Claides, uma das homenageadas durante o Encontro Nacional do MAB, que aconteceu entre os dias 2 e 5 de setembro em São Paulo, ainda fez questão de apontar que “mesmo que eles indenizem muito bem, os sentimentos eles nunca vão indenizar”.

Ao todo, as barragens previstas para os estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina expulsariam 40 mil famílias, totalizando 200 mil pessoas, na sua grande maioria pequenos agricultores. “A gente tirava todo o sustento da terra. Então a gente se perguntava: pra onde nós vamos?”, rememorou. Passados a surpresa e o luto pela descoberta da barragem de Itá, os moradores de Água Verde, e de outras comunidades próximas, iniciaram um intenso processo de organização, que culminou na criação da Comissão Regional dos Atingidos por Barragens, que posteriormente foi um dos pilares na nacionalização da luta dos atingidos, com o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). Na ocasião, Claides foi a única mulher entre os 120 integrantes da CRAB. “Brincavam que eu tinha um banheiro feminino só pra Jornal do MAB | Dezembro de 2013

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MAB investe na produção e comercialização de alimentos saudáveis

limentação saudável, sem agredir o meio ambiente, respeitando a cultura humana e a natureza. Estas são algumas características do modelo de produção agroecológico, que esta sendo adotado pelas áreas de reassentamentos e comunidades do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB). Os movimentos sociais do campo tem, com a sociedade brasileira, o dever de produzir alimentos saudáveis, já que o modelo de agricultura adotada em nosso país não atende ao pequeno produtor e está voltado aos interesses do agronegócio.

Na região Sul, as famílias ameaçadas pela construção do Complexo Binacional Garabi afirmam que continuarão investindo em suas propriedades e resistindo contras as barragens projetadas para o trecho internacional do Rio Uruguai. “Queremos, através da produção de alimentos, mostrar que é possível contribuirmos para o desenvolvimento de nossa região sem barragens e melhorar a qualidade de vida das pessoas”, explicou Gilberto Jahns, moradora da comunidade Barra do Santo Cristo, no município de Alecrim, no Rio Grande do Sul.

As organizações têm feito esforços para buscar recursos que fortaleçam a capacidade produtiva, além de garantir renda às famílias camponesas. O Programa Nacional de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa Agrícola Integrado Sustentável (PAIS), são alguns dos programas que garantem a renda mensal de muitos assentados e reassentados.

Incentivo à produção camponesa

De acordo com Marcio Caldart, técnico agrícola do MAB, os camponeses atingidos por barragens não dependem somente dos programas governamentais para continuarem produzindo e garantindo sua renda. “As medidas do governo adotadas para a agricultura são um incentivo para que os nossos agricultores busquem a cada dia sua autonomia, viabilizando a venda da sua produção em outros espaços como feiras e mercados, assim eles conseguem a auto-organização contra o modelo do agronegócio”. Recentemente, os camponeses organizados no MAB começaram a implantar experiências de produção de alimentos nas áreas de reassentamento, utilizando o programa denominado Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (PAIS). A experiência consiste em construir um galinheiro que é rodeado por uma horta de canteiros circulares, de uma estufa e de um pomar com mudas frutíferas, além de um sistema de irrigação. A construção das unidades PAIS é uma parceria entre o MAB e a Fundação Banco do Brasil (FBB).

No Rio Grande do Sul, paralelamente à produção de alimentos através dos PAIS, está sendo implantado o Plano Camponês. No mês de abril deste ano, centenas de camponeses reivindicaram e tiveram uma conquista importante: o Programa da Agricultura Camponesa. Este programa prevê investimentos na agricultura camponesa que beneficiará o agricultor/a que produz alimentos no campo e o trabalhador/a da cidade, que irá consumir comida saudável, gradativamente sem agrotóxicos. No Programa da Agricultura Camponesa serão investidos R$100 milhões na economia gaúcha, exclusivamente na produção de alimentos, transporte, processamento, produção de insumos, criação de pontos populares de trabalho, centros de distribuição e estrutura logística. Estes investimentos serão canalizados pela Via Campesina para produção, industrialização e comercialização de alimentos saudáveis, diversificados e gradativamente sem venenos, que serão destinados principalmente aos trabalhadores das fábricas, aos estudantes beneficiados pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar, ao público dos bairros populares beneficiados pelo Programa de Aquisição de Alimentos e pelas compras governamentais.


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