Nº 9 | Junho de 2009
Camponeses lutam no sul para garantir soluções aos problemas da seca
Protesto na Ponte de Barracão durante as mobilizações
A luta do povo brasileiro na Campanha do Petróleo Página 2 Jornal do MAB | Junho de 2009
Perseguições e prisões marcam luta dos atingidos no Pará Página 3
Atingidos pela barragem de Acauã lutam pela terra na Paraíba Página 6 1
EDITORIAL
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A crise e as saídas
atual crise mundial demonstra mais uma vez que o sistema econômico não é viável para a maioria do povo. A crise é econômica, social, ambiental e política e, para os capitalistas, historicamente a saída tem sido aumentar a exploração sobre os trabalhadores (com demissões, retirada de direitos e aumento da intensidade do trabalho); apostar em um novo padrão produtivo (com tecnologias que produzam mais mercadorias em menos tempo); e a apropriação da natureza que ofereça ganhos extraordinários (as melhores fontes de energia, as melhores terras, as melhores fontes de minérios e de água, etc). Finalmente, os capitalistas, que antes diziam que o Estado não servia pra nada e deveria privatizar tudo, agora querem também todo o dinheiro que o Estado tiver (que chamamos de mais valia social) para salvá-los da falência. No nosso entendimento, a saída da crise para os trabalhadores não será esta que os capitalistas querem, pois isto significa mais exploração, mais destruição ambiental e mais miséria para todo o povo. Também a crise não será resolvida simplesmente por uma eleição neste ou naquele país e nem será a partir da elaboração de idéias brilhantes escritas em livros. Para nós que queremos construir as transformações necessárias, o momento é de lutas permanentes e concretas do nosso povo contra todas as estruturas injustas da sociedade. Para sairmos da crise é necessária a construção dessas lutas e de programas unitários com todas as forças de esquerda que querem um Projeto Popular para o Brasil. Para nós é fundamental a luta na campanha “O Petróleo tem que ser nosso” e a luta pela soberania energética e alimentar em grandes ações a serem realizadas na primeira quinzena de agosto deste ano de 2009. Todos os (as) militantes do MAB estão convocados (as) a discutir com nosso povo a natureza da atual crise, realizar reuniões, encontros e processos de animação de todos os camponeses e trabalhadores das cidades, pois será de nossa luta concreta que emergirão as reais saídas desta crise mundial. Boa leitura! Coordenação Nacional do MAB Expediente
Jornal do MAB
Uma publicação do Movimento dos Atingidos por Barragens Produção: Setor de Comunicação do MAB Projeto Gráfico: MDA Comunicação Integrada Tiragem: 5.000 exemplares
www.mabnacional.org.br 2
A luta do povo brasileiro na Campanha do Petróleo
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Mobilização na Petrobrás, no Rio de Janeiro
petróleo tem que ser nosso! Este é o nome da Campanha que promete chegar em todos os cantos do Brasil. Assim como a Campanha Contra o Alto Preço da Luz, a campanha do petróleo também discutirá sobre o atual modelo energético e a importância do petróleo e das riquezas naturais sob controle dos trabalhadores. Um dos objetivos da campanha é denunciar que o grande capital e o imperialismo querem dominar o petróleo já existente no Brasil, e também todo o petróleo que está sendo encontrado na camada pré-sal, para resolver os seus problemas com a crise. “Queremos coletar assinaturas para o projeto de lei que propõe a mudança na lei do Petróleo, restabelecendo o monopólio estatal e pedindo o fim dos leilões. Esta é uma forma de envolver, organizar e dar unidade de ação à militância dos movimentos sociais, sindicatos, professores, estudantes e igreja, como fizemos no plebiscito da ALCA”, afirma Luiz Dalla Costa, da coordenação do MAB. Entre as reivindicações da campanha está a criação de um fundo social soberano de investimento voltado para as necessidades do povo brasileiro: educação, saúde, reforma agrária, trabalho e renda, etc; a redução do uso do petróleo e o avanço nas pesquisas sobre a nova matriz energética; e que a exploração, produção e transporte do petróleo seja realizada pela Petrobrás, integralmente estatal. Jornal do MAB | Junho de 2009
Perseguições e prisões políticas marcam a luta dos atingidos no Pará
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usina hidrelétrica de Tucuruí tem um longo histórico de repressão e violações aos direitos humanos. O caso mais recente foi a desocupação das eclusas e a prisão de 18 atingidos por barragens e pescadores no dia 26 de abril, durante um acampamento do MAB e do movimento de pescadores. Depois de 19 dias presos, 14 trabalhadores foram libertados e até o fechamento desta edição do jornal (01/06) quatro pessoas, três homens e uma mulher, permanecem presos com a alegação de que eram as lideranças do grupo, o que reforça a denúncia de movimentos sociais de que as prisões foram de ordem política. A usina de Tucuruí está localizada no Rio Tocantins, no Pará, foi feita em plena ditadura militar. Na época o Estudo e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) foi elaborado durante a construção da obra, em conseqüência disso, milhares de pessoas tiveram que sair às pressas de suas casas, pois a água já estava próxima. A barragem
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deslocou cerca de 32.000 pessoas e há 25 anos elas lutam para garantir direitos. De lá para cá, a usina já foi palco de muitos conflitos, entre eles a “guarda” da barragem pelo exército brasileiro em 2005, para “prevenir manifestações no local e evitar uma possível interrupção da produção de energia”. A construção de hidrelétricas na Amazônia faz parte de um projeto maior baseado na expropriação intensiva dos recursos naturais da região. Os conflitos sociais pela construção de barragens e pela questão agrária faz com que o Pará seja um dos estados com o maior índice de ameaças de morte e de assassinatos, segundo dados da CPT, nos últimos três anos foram assassinadas 14 lideranças rurais nessa região, em decorrência da luta pela terra. Em julho de 2007 a Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), ligada ao Ministério da Justiça, visitou Tucuruí e constatou que na implementação da barragem foram violados onze
Marcha de protesto em Tucuruí
direitos humanos, entre eles o direito à dignidade da pessoa humana. Hoje o passivo social na região inclui o não reassentamento de centenas de famílias atingidas e o não reconhecimento de categorias, como os pescadores, enquanto atingidos. Enquanto isso, grandes indústrias de alumínio como a Alcoa e a Vale recebem energia subsidiada (quase dois terços da energia gerada) e pagam cerca de R$ 5 centavos por kilowatt de energia, enquanto grande parte da população não tem energia elétrica em casa, ou então paga em média R$ 0,50 pelo mesmo Kilowatt, isso significa que as famílias pagam até 10 vezes mais que as empresas.
Via Campesina busca soluções para os problemas da seca
ilhares de camponeses e trabalhadores do comércio saíram às ruas no Rio Grande do Sul e Santa Catarina para reivindicar dos governos estaduais e federal soluções para os problemas da seca e da crise econômica na agricultura. “A situação no campo está insustentável e as perdas somam cerca de 1 bilhão de
Agricultores de Santa Catarina em assembléia preparando a jornada de lutas
Jornal do MAB | Junho de 2009
reais. A conseqüência direta disso são as dificuldades dos agricultores em pagar as dívidas, os prejuízos no comércio e nas prefeituras da região e a desestruturação das propriedades rurais, fazendo com que os agricultores abandonem o campo”, dizem as lideranças do MAB que participaram das mobilizações. Na avaliação da Via Campesina, a unificação das organizações de trabalhadores rurais com o comércio e as prefeituras dos municípios atingidos pela seca é histórico: “Temos que reconhecer a importância das lutas unificadas, a história nos mostra que as conquistas só vem com muita luta, e com a luta de todas as forças, desta vez não será diferente”, afirmou Ricardo Montagner, da coordenação do MAB.
Para a coordenação da Via Campesina as medidas anunciadas pelos governos até agora foram insuficientes para amenizar as perdas. Os movimentos sociais exigem medidas emergenciais, entre elas a anistia das dívidas e ajuda de manutenção aos camponeses, e medidas estruturais que possibilitem que o pequeno agricultor recupere as perdas e plante na próxima safra. “Os avanços nas reivindicações só acontecem pela mobilização popular. Por isso os movimentos sociais já definiram que retomarão as lutas no próximo período com acampamentos em frente aos bancos e nas rodovias até que a pauta seja integralmente atendida”, finalizou Montagner. 3
MAB debate o Plano Decenal de
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quem serve a energia prevista no Plano Decenal de Energia? Por que a Amazônia é o principal alvo das empresas do setor elétrico? Pensar novas formas de energia alternativa é o melhor caminho para mudar o modelo energético? Foi pra responder essas e outras perguntas que o MAB resolveu reunir pesquisadores, entidades e movimentos sociais no seminário “Estratégias de ação frente ao atual modelo energético”, na Escola Nacional Florestan Fernandes, no dia 1º de abril. “No momento em que, no Brasil, está em debate o novo Plano Decenal de Energia é muito importante ouvirmos o máximo de opiniões e análises possível para, a partir do debate coletivo, traçar linhas de ação e estratégias a serem adotadas pelas entidades que lutam por um novo modelo energético”, afirmou um dos dirigentes do MAB. Para ajudar no debate, primeiramente, o seminário contou com a análise do professor e pesquisador da USP, Célio Bermann, do professor Luis Novoa (Unir), de Gilberto Cervinski, pelo MAB e da Dr. Maria Rita Reis, representante da 4ª Câmara Federal do Ministério Público Federal (MPF). Logo após, foi a vez das demais entidades presentes darem suas opiniões sobre o assunto. Foram mais de 70 participantes de 22 organizações. 4
Para Célio Bermann, o Plano Decenal de Energia traduz uma visão “ofertista” da energia, sem levar em consideração para que e para quem serve este insumo. Ou seja, incentiva-se a construção de novas hidrelétricas, principalmente na Amazônia, para que haja energia em abundância, mas sem discutir o destino dela. O professor aponta que normalmente, 30% da energia vai para as empresas eletrointensivas, que fabricam alumínio para exportação. Além disso, boa parte da energia também serve para suprir a demanda de combustíveis.
manda e o destino da energia com a sociedade, cabendo aos movimentos sociais, principalmente o MAB, estar à frente dessa discussão. Apesar da crise internacional não podemos esperar do governo brasileiro uma mudança de rota na implementação do modelo energético. Essa é a opinião do professor Luis Novoa sobre o principal alvo do governo e dos capitalistas: a Amazônia. Do potencial brasileiro hidrelétrico, 70 % estão na Amazônia e é lá que estão previstas as principais hidrelétricas do Plano Decenal (nos rios Madeira, Xingu e Tapajós). A partir da contribuição da Dr. Maria Rita Reis, do MPF, ficamos sabendo que no atual Plano Decenal, 70% das obras previstas têm algum ponto que está em debate na justiça, ou seja, que está judicializado. Além disso, o Ministério Público, em recente audiência realizada em Brasília, apontou vários questionamentos ao Plano, dentre eles, a total ausência ou insuficiência de debate com a sociedade e a imparcialidade das fontes utilizadas para as análises dos impactos ambientais e socais das obras, que são somente de algumas empresas privadas que tem interesse nos empreendimentos. Foto: Fernando Arias
O evento teve a participação de 70 pessoas, de 22 entidades nacionais e internacionais
Usina Hidrelétrica de Cana Brava, em Goiás
Segundo o professor da USP, se continuarmos nessa lógica de produzir energia para a acumulação capitalista não haverá energia alternativa que substitua a atual demanda. Sendo assim, temos que pensar num novo modelo de desenvolvimento e não simplesmente buscar meios alternativos de produção. Com a atual crise mundial, há uma diminuição na previsão do crescimento econômico do Brasil, que passou de 4% para 2%. Certamente, a produção de energia deveria diminuir também, mas, de acordo com a análise de Bermann, o governo não quer discutir a de-
Gilberto Cervinski, do MAB, destacou quem de fato manda na energia no Brasil, que, segundo ele, são os grandes bancos mundiais e as grandes empresas (a maioria multinacionais) energéticas, mineradoras, construtoras e empresas que vendem instrumentos. “A lógica delas é produzir energia para exportar produtos eletrointensivos”, conclui. Além disso, Jornal do MAB | Junho de 2009
Energia em seminário nacional Cervinski denunciou a exploração sofrida pelos trabalhadores através da conta de luz. As altas tarifas residenciais têm sido uma forma das empresas também lucrarem com a energia. A energia nuclear também faz parte dos planos do governo. Está sendo pensada a retomada de Angra III. Na análise de Sérgio Dialetachi, da Fundação Heinrich Boell, a questão ambiental das usinas nucleares não está sendo levada em conta como deveria. O governo estaria mascarando a questão se atendo a pequenos pontos como a medição do grau de poluição na região em torno da usina. Ainda, o professor Ildo Sauer, da USP, fez uma contextualização
da questão da energia na sociedade capitalista. Para ele, o capitalismo, como sistema que acumula e concentra riquezas, explora o trabalho e divide a sociedade em classes, necessita cada vez mais de aumento da população, aumento da produção e de consumo. E a energia é fundamental para isso, porque consegue ser ela em si mesma uma mercadoria para acumulação e um insumo para produção de outras mercadorias. A partir da contribuição da plenária, as entidades puderam traçar algumas linhas de ação para o próximo período. Entre elas, propor como tema da Campanha da Fraternidade em 2011 a questão energética, envolvendo para isso as Pastorais Sociais no debate da energia, incentivar a organização
dos atingidos, através do MAB, em todos os locais onde existem projetos de construção de barragens e
Mobilização durante a Campanha da Energia
dar seqüência as atuais campanhas contra os altos preços da energia elétrica, contra a transposição do Rio São Francisco e da campanha o petróleo, levando em conta todos os seus aspectos.
Curtas Rompimento de barragem no Piauí No dia 27 de maio o rompimento da barragem de Algodões inundou toda a cidade de Cocal da Estação, no norte do Piauí. A água chegou a 20 metros em alguns pontos e pegou os moradores de surpresa. Pelos menos 500 famílias tiveram suas casas destruídas. Há duas semanas a barragem ameaçava se romper por causa da pressão da água, mas um grupo de engenheiros fez uma avaliação e declarou que não havia risco de rompimento. A barragem foi construída há quase 10 anos e servia como reservatório de água. Para o MAB, as grandes barragens são uma ameaça à população desde o início do projeto até muito tempo depois da construção, pois as famílias que moram próximo ao lago vivem constantemente com a insegurança do rompimento, seja por problemas técnicos, seja por causa das enchentes, como foi o caso da barragem de Algodões. Jornal do MAB | Junho de 2009
Jornada de agroecologia Debater, trocar experiências e planejar um projeto popular sustentável de segurança alimentar e nutricional a partir da agroecologia é o principal objetivo da Jornada de Agroecologia que aconteceu em Francisco Beltrão, no Paraná, de 27 a 30 de maio. A Jornada reuniu cerca de 3.000 pessoas nesta 8ª edição e contou com a presença de camponeses, agricultores, trabalhadores rurais, pesquisadores, engenheiros agrônomos, ecologistas e estudantes de várias áreas, delegação de agricultores do Paraguai e representantes africanos e cubanos. Na área da energia, militantes do MAB do Paraná expuseram as placas solares, o que despertou o interesse de centePlacas foram instaladas nas casas dos reassentados nas de pessoas. “O principal interesse é conhecer o funcionamento das placas e instalar em suas casas para diminuir o preço da luz, que está muito caro”, disse Verilson Gheno, organizador do espaço na jornada. 5
Atingidos pela barragem de Acauã lutam pela terra na Paraíba
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luta pela terra na Paraíba também é bandeira do Movimento dos Atingidos por Barragens. No início de maio cerca de 120 famílias atingidas pela barragem de Acauã ocuparam a Fazenda Mascadi, no município de Itatuba. Elas reivindicam a revisão das indenizações pagas e que sejam providenciadas condições que lhes garantam o modo de vida que possuíam anteriormente, respeitando-se, principalmente, o fato de serem oriundas de comunidades rurais. Na jornada de lutas de março, centenas de pessoas protestaram em frente ao palácio do Governo do Estado para cobrar urgência nas medidas que solucionem os problemas sociais e ambientais da região. Durante o ato, receberam a promessa de agendamento de uma reunião, no entanto o retorno não foi dado e, depois de sete anos do fechamento da barragem, as famílias decidiram pela ocupação da fazenda. “Reconquistaremos nossa terra pela nossa organização”, afirma a coordenação do MAB na Paraíba. Em abril de 2008, a Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (ligada ao Ministério da Justiça) visitou as comunidades atingidas e constatou que a barragem provocou degradação nas condições de vida das pessoas, com a ruptura de redes culturais, sociais e econômicas, colocando as famílias em situação de exclusão social. Conforme o relatório da Comissão, “os reassentamentos são acampamentos precários e isolados que não oferecem perspectivas de vida aos seus moradores”. 6
“Podemos afirmar que houve e permanece uma frontal violação ao Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que reconhece ‘o direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si própria e para sua família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas assim como a uma melhoria contínua de suas condições de vida’”, declaram os relatores.
Acampamento dos atingidos pela barragem de Acauã, no Estado da Paraíba
Antes e depois da barragem Antes da construção da barragem, as populações das comunidades atingidas viviam em áreas rurais, possuindo modo de vida compatível com o local de moradia e trabalho. Havia pesca de subsistência e, mesmo em condições humildes, os moradores possuíam uma vida digna, com habitações adequadas ao número de membros de cada família, acesso à água, alimentação adequada, garantida pelo trabalho que desempenhavam nas pequenas lavouras e pequenas criações, lazer, vida religiosa e social, escolas e postos de saúde, etc, além da possibilidade de negociar a produção nas comunidades vizinhas. Depois da barragem, não foram garantidos aos atingidos os meios de vida que possuíam antes de serem desalojados de suas propriedades. Eles foram obrigados a mudar seu modo de vida: saíram de uma vida tradicionalmente rural para um meio “urbano” (sem que tenha a estrutura de uma aglomeração urbana). Não há terras agricultáveis, nem terrenos que permitam a criação de animais. A degradação social e econômica elevou o número de casos de alcoolismo, além de aumentar os episódios de violência. As crianças não estudam, ou estudam sob péssimas condições. O esgoto corre a céu aberto. Muitos moradores não têm registro civil. Nenhum assentado possui documentação relativa à propriedade do imóvel que recebeu e em que reside. As comunidades são praticamente inacessíveis ou têm acesso muito difícil. Nenhuma é servida por transporte público regular. Nenhuma possui ambulância. Apenas alguns moradores são beneficiados por programas sociais do governo federal, sendo que os municípios não utilizam todos os benefícios previstos para serem concedidos às suas populações. As comunidades não recebem informações acerca desses programas, não sabendo como pleiteá-los. Muitos não têm acesso aos mesmos por não possuírem documentos de identidade. Com informações do relatório da Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana
Está disponível no site do MAB (www.mabnacional.org.br) o vídeo O canto de Acauã, que conta a história dos atingidos pela barragem. Acompanhe! Jornal do MAB | Junho de 2009
Ditadura nas margens do Rio Madeira Nota do MAB frente à ditadura nas margens do Rio Madeira
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Assembléia nas comunidades atingidas
s barragens de Santo Antônio e Jirau que estão sendo construídas no Rio Madeira, em Rondônia, trazem consigo um rastro de destruição ambiental e de desestruturação social. Recentemente, os atingidos denunciaram as ameaças, perseguições e multas dos órgãos de repressão do governo, da polícia ambiental, IBAMA e por órgãos da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental (Sedam). As famílias afirmam que depois da mobilização de março em Porto Velho, estes órgãos estão monitorando sistematicamente as comunidades ribeirinhas, em especial as comunidades com maior organização da população, como Joana D’arc III, localizada entre as barragens de Santo Antônio e Jirau. “A prática adotada pelas empresas que se apropriaram do rio são muito agressivas. A perseguição aos atingidos é mais uma das táticas usadas para intimidar e expulsar as pessoas que vivem à beira do Rio Madeira”, afirmou Tânia Leite, da coordenação do MAB no estado. As multas (que chegam a 60 mil reais) estão sendo aplicadas como forma de conter as manifestações e as denúncias que a população vem fazendo dos crimes sociais e ambientais, como a queima de casas dos atingidos e a morte de toneladas de peixes. Uma das lideranças das comunidades, além de ter sido multada em 31 mil Jornal do MAB | Junho de 2009
reais, teve toda a propriedade interditada, ficando impossibilitada de fazer qualquer manejo na terra, sob pena de ter a multa triplicada. No mínimo 5 mil famílias serão atingidas pelas hidrelétricas e todas as reuniões que o consórcio Mesa (administrado pelas empresas Furnas e Odebrecht, da UHE Santo Antônio) faz nas comunidades são acompanhadas pela polícia, que intimida aqueles que questionam. Assim como ocorreu com os atingidos pela UHE de Samuel (RO), a pressão é muito grande para as famílias saírem de suas terras, sem garantia nenhuma de direitos. “Para onde vamos se não recebemos nada de indenização?”, perguntam os atingidos. Recentemente aconteceram assembléias em diversas comunidades ribeirinhas ao Madeira. As lideranças do MAB afirmaram que as empresas fizeram todo o tipo de boicote para que as pessoas não participassem, como festa para as mães das comunidades, cinema itinerante, entre outras coisas. Mesmo assim, centenas de atingidos debateram sobre a situação das comunidades com a chegada das barragens. Por outro lado, o consórcio também realiza suas assembléias para convencimento do povo, porém em algumas delas não teve sucesso, como aconteceu na comunidade Joana D’arc III, onde a população reagiu com indignação.
l Afirmamos que o Complexo não beneficiará a população do nosso país, pois está à serviço das grandes empresas multinacionais. O governo brasileiro por sua vez, está a serviço dessas empresas transformando prioridades privadas em prioridades “nacionais”; l Criticamos a tentativa de destruir a Amazônia através dos projetos previstos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e na Iniciativa de Integração da Infra-estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), cujo fim é beneficiar apenas as empresas eletrointensivas e o agronegócio; l Repudiamos toda e qualquer forma de perseguição e intimidação aos atingidos por barragens por órgãos de repressão e de fiscalização ambiental que, ao invés de protegê-los, pune-os com multas altíssimas; l Anunciamos que todas as comunidades ribeirinhas estarão em assembléia nos próximos dias para fortalecer a organização e a resistência contra esses projetos de morte; l Conclamamos a todos os órgãos de defesa dos direitos humanos e demais organizações sociais e ambientais que intervenham frente a essa situação de ditadura por que passam os atingidos pelas usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau; l Reafirmamos nossa luta contra a venda do Rio Madeira e em defesa da Amazônia e das comunidades atingidas. 7
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Atingidos por barragens estudam medicina em Cuba
esde 2007, seis jovens filhos de camponeses atingidos por barragens estudam medicina em Cuba. Neste ano, mais um jovem ingressou nas turmas. A iniciativa do Movimento de Atingidos por Barragens de enviar jovens para aquele país faz parte da solidariedade entre os povos. Além disso, Cuba, pela qualidade do ensino na área médica e pelo histórico de eficiência, é referência para o mundo.
destina jovens para estudarem engenharia hídrica naquele país e medicina e agroecologia na Venezuela. No Brasil, vários cursos formais agregam atingidos por barragens. “Temos estudantes nos cursos de administração, pedagogia, direito, música, saúde comunitária, energia e outros”, disse Liciane Andrioli, coordenadora do Setor de Educação do MAB. Segundo ela, para o forJovens estudantes do MAB na Praça Central de Havana, capital talecimento da organização dos de Cuba, durante os atos do 1º de maio, Dia do Trabalhador trabalhadores é extremamente mente importante para a luta e orga“A precarização do sistema importante que tenham acesso ao nização dos trabalhadores”, afirmou de saúde no Brasil é uma realidade conhecimento técnico e científico, Michele Christmann, que está no e quem mais sofre são os pobres. associado à formação política e ideBrasil no período de férias. Lá, além da excelente qualidade no ológica. “Isso é o diferencial para os ensino, temos contato com a cultura Além de estudantes de mediciatingidos por barragens e para toda a e com a história cubana, extremaclasse trabalhadora”, finalizou. na enviados a Cuba, o MAB também
Rondônia recebe pessoas
de todo o Brasil para o
12º Encontro Intereclesial de Cebs
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ntre os dias 21 e 25 de julho, a cidade de Porto Velho (Rondônia) sediará o 12° Intereclesial das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Neste ano, o encontro terá como tema: “CEBs: Ecologia e Missão” e o lema: “Do Ventre da Terra, o Grito que vem da Amazônia”. Iniciado em 1975, os encontros mostram a caminhada das CEBs como uma forma de organização das comunidades e a cada edição apresentam um tema diferente, relacionado à realidade de vida do povo. Desta vez o encontro acontece na Amazônia, nas margens do Rio Madeira, onde estão sendo construídas a usina hidrelétrica de Jirau e Santo Antônio. Será um espaço propício para o Brasil conhecer a realidade em que vivem os atingidos, expulsos de suas terras por estas grandes obras que são construídas para o saqueio das nossas riquezas naturais. 8
Rio Xingu Lar de peixes, tartarugas, jacarés... Fonte de vida, de inspiração, E com certeza, fonte de muitas paixões. Não sei o que mais tu tens, Se são pedras ou bancos de areia, Não sei se corres pra esquerda ou direita, Mas sei que és lindo! Tanta beleza, tanta riqueza, tantas correntezas, Tantas lendas, tantas ilhas, tantas filhas. De Gurupá ao Mato Grosso, que alvoroço, Quase que ouço você clamar. Não deixemos, por favor não deixem Que o capital, minhas águas venha represar, Não me façam para dentro dele minhas filhas avançar E de outras, eu me retirar! O que será de minhas belas águas Em uma lagoa a parar, O que farei a minha irmã floresta Quando nela minhas águas adentrar. Temo pelas minhas filhas, sem meu amparo, Temo por minhas filhas, com meu excesso, Temo pela natureza, pelo meu desequilíbrio; Temo pela população, com minha anunciada morte! Há que se cuidar da vida! Rogério de Sousa Januário Escola Nacional de Militantes – PA/TO
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