Nº 6 | Setembro de 2008
Foto: Erius Tiaraju
Juventude que ousa lutar, constrói o poder popular!
Jovens participam do 1º Encontro da Juventude do Campo e da Cidade, que aconteceu em Niterói/RJ
Mulheres se levantam por soberania alimentar e energética
Empresas do setor elétrico utilizam técnicas para amenizar conflitos sociais
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Páginas 4 e 5
Jornal do MAB | Setembro de 2008
Ribeirinhos são despejados para dar lugar ao lago da UHE Santo Antônio? Página 6 1
Encontro nacional
EDITORIAL
Companheiros e companheiras
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os últimos meses estivemos envolvidos em muitas atividades de formação, luta e fortalecimento de nossa organização. Cabe a nós a tarefa de construirmos um país para o povo brasileiro, e só o faremos com o embate às forças do capital, como a Vale, Votorantim, Bradesco e tantas outras empresas que exploram o povo e as nossas riquezas. Na Jornada Nacional de Lutas de junho, junto com os demais movimentos da Via Campesina e da Assembléia Popular, demonstramos nossa força. No entanto, o embate deve ser permanente e devemos nos preparar para o próximo período, que há de ser duro! Para contribuir com isso, preparamos mais esta edição do jornal do MAB, um instrumento de estudo e diálogo entre os (as) militantes envolvidos na luta e na organização dos atingidos por barragens em todo o país. Entre outros assuntos, trazemos uma entrevista com o professor Henri Acselrad, que abordou o que as empresas estão fazendo para legitimar suas obras e matérias sobre o encontro das mulheres e o encontro da juventude. Também merecem destaque nesta edição a situação dos ribeirinhos de Rondônia e a luta dos indígenas por suas terras na Raposa Serra do Sol. Boa leitura! Coordenação Nacional do MAB
aponta para o desafio da
organização dos jovens
“O
s jovens são o futuro do Brasil”. Não é assim que pensam os 1.000 jovens que participaram do I Encontro da Juventude do Campo e da Cidade, que aconteceu em Niterói, no Rio de Janeiro, em meados de agosto. Representando 24 movimentos populares de trabalhadores, desempregados, negros, mulheres, sem-teto, estudantes e camponeses de todo o Brasil, esses jovens demonstraram que têm uma ação concreta a realizar no presente. Para tanto, o foco das discussões passou pelo papel da juventude no debate político, desafios e problemas que enfrentam. Além disso, o encontro foi um espaço de estudo e deliberação da juventude organizada. Diversos temas foram debatidos, entre eles o capitalismo na atualidade, educação, saúde, trabalho e renda, violência, gênero e sexualidade. Nívea Diógenes, da coordenação do encontro pelo MAB, disse que há 51 milhões de jovens entre 15 a 19 anos no país, ou seja, quase um terço da população brasileira, e que os jovens dos movimentos sociais tem uma tarefa fundamental frente a esse contingente. “Nós, jovens do MAB, temos que nos envolver na organização e na luta dos atingidos por barragens. É nosso dever sermos referência de engajamento para outros jovens de nossas regiões. Não podemos concordar que aumente o número de jovens sem garantias de estudo e emprego. Nós sabemos o que é perder o local de trabalho pela inundação de nossas terras com o lago das barragens, no entanto, milhões de jovens nunca tiveram nenhum tipo de trabalho, e quando tem, com condição precária”, ressaltou. No encerramento, os participantes realizaram uma marcha no centro do Rio de Janeiro com o objetivo de denunciar os impactos da criminalização da pobreza e dos movimentos sociais, fato ressaltado no documento final do encontro: “Exigimos o cumprimento imediato dos direitos fundamentais, como trabalho, educação, saúde, moradia, reforma agrária e cultura. O Estado não pode ser forte na repressão dos pobres e dos movimentos sociais e se omitir em relação ao cumprimento desses direitos”.
Dados da juventude brasileira:
No Brasil há 51 milhões de jovens entre 15 a 19 anos; Deste segmento, na faixa dos 15 aos 17, apenas 48% estão matriculados no ensino médio; Nesta faixa etária, 18% estão fora das escolas e o percentual de evasão eleva-se a 66% na faixa dos 18 a 24 anos; As principais causas para tais números, no caso dos meninos é o trabalho, para as meninas é a gravidez na adolescência; O percentual de jovens matriculado no ensino superior cai drasticamente para 13% entre os jovens de 18 a 24 anos; Água e energia O desemprego atinge 46% do total de jovens entre 15 anos e 29 anos; não são mercadorias! 50% dos ocupados entre 18 anos e 24 anos são assalariados sem carteira; 31% dos jovens de 15 a 29 anos apresentam renda domiciliar per Expediente capita inferior a meio salário mínimo, dado agravado para as mulheJornal do MAB res e também para os negros; Projeto Gráfico: Uma publicação do MDA Comunicação Integrada Movimento dos Atingidos Os negros representam 70% dos jovens pobres; por Barragens Tiragem: 5.000 exemplares A violência e os homicídios correspondem a 38% das mortes entre os jovens brasileiros. www.mabnacional.org.br 2
Jornal do MAB | Setembro de 2008
Mulheres se levantam por
Eram muitas mulheres, militantes de diversos movimentos sociais, vindas de todas as regiões do país. Camponesas, urbanas, indígenas, negras, atingidas por barragens, quebradeiras de coco, moças jovens, senhoras experientes. Formavam um grupo com mais de 500 vozes que chamavam gritos de ordem por soberania, feminismo, socialismo.
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las participaram do Encontro Nacional Mulheres em Luta por Soberania Alimentar e Energética, que aconteceu no final de agosto em Belo Horizonte (MG), e debateram estes temas tão estratégicos para a soberania dos povos. Entre outras companheiras da Via campesina e da Marcha Mundial de Mulheres, entidades organizadoras do encontro, foram as representantes do MAB que, em três mesas, pautaram o tema da energia, do hidronegócio e da Campanha Contra os Altos Preços da Energia Elétrica. Em sua fala, Soniamara Maranho, de Minas Gerais, destacou que o movimento do capitalismo com relação à energia agrava significativamente a superexploração do trabalho e avança, cada vez mais, sobre o controle do território, sementes, mineração e de toda biodiversidade. “As hidrelétricas são uma forma muito barata de produzir energia, e para as grandes empresas uma forma muito lucrativa”, disse. Hoje, 70% da energia Jornal do MAB | Setembro de 2008
Foto: Nina Fidelis
soberania alimentar e energética
Plenária do Encontro Nacional de Mulheres - 2008
produzida no mundo é consumida pelos países centrais, que já não possuem mais grandes reservas. E no Brasil, as empresas Vale, Alcoa e Odebrecht consomem 16% da energia produzida. “Frente a isso, está comprovado que não existe desenvolvimento do imperialismo sem energia e quem está pagando a conta é o trabalhador e as trabalhadoras”, finalizou. Além de determinar o controle sobre o território, o controle das hidrelétricas determina também o controle sobre grandes reservas de água doce. Foi o que ressaltou Daiane Hohn, do Pará. Segundo ela, do total de água doce no mundo, 12% está no Brasil, no entanto, essa água é mal distribuída, sendo que 70% do total é destinada à agricultura e 20% à indústria. “A água é sinônimo de poder e riqueza, por isso é alvo das grandes empresas, seja as do hidronegócio, seja as construtoras de hidrelétricas”, destacou Daiane. Já Cristiane Nadaletti, do Rio Grande do Sul, abordou o tema da Campanha Contra os Altos Preços da Energia Elétrica: “Mais
que reduzir o preço da luz, queremos que a campanha da energia seja um instrumento de organização popular pelo trabalho de base. Numa sociedade que preza pelo individualismo, a coletividade urbana é um desafio”, reforçou. Nalu Faria, da coordenação do encontro pela Marcha Mundial de Mulheres, disse que a questão energética e alimentar é estratégica para a organização social e para empoderamento popular e está ligada ao trabalho cotidiano das companheiras. Outro ponto destacado por Nalu é que existem alternativas e que as mulheres podem se envolver e se fortalecer cada vez mais com as lutas concretas. Neste sentido, entre os compromissos assumidos no documento final do encontro estão a luta pela reestatização do setor elétrico, a defesa do uso sustentável das águas e dos recursos energéticos, a realização de mobilizações unificadas no próximo mês de outubro e no 8 de março, a participação na campanha contra o preço de energia e a construção do Projeto Popular pelo Brasil. 3
Empresas do setor elétrico amenizar conflitos Professor da UFRJ diz que essas técnicas são utilizadas pelas empresas exploradoras dos recursos naturais em toda a América Latina
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a situação de ribeirinhos, milhares de brasileiros sentem na pele o que é ser desapropriado para, onde crescia o milho e o feijão, erguer-se o muro da barragem e formar-se o lago da usina. Para melhor compreendermos o que as empresas fazem para legitimar suas obras que tanto prejudicam os povos e o meio ambiente, conversamos com Henri Acselrad, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que procura entender a rede de processos sociais, ecológicos e políticos que põem a natureza no centro dos conflitos sociais. Jornal do MAB: Quais as principais razões para o uso de técnicas de desmobilização social e formação do consenso em áreas de conflito na América Latina? Henri Acselrad: Neste início do século XXI, em inúmeros países da América Latina, é 4
Em nome de oferecer “uma técnica de solução de conflitos rápida, ágil, flexível e particularizada a cada caso” e “uma justiça menos dispendiosa”, tratam de psicologizar o dissenso e tecnificar seu tratamento através de manuais destinados a transformar os “pontos quentes” em “comunidades de aprendizado”. Isso acontece justamente nos países que exportam seus recursos naturais, através de barragens, por exemOficina de artesanato, oferecida pelo consórcio responsável plo. Para tornar aceipela UHE Barra Grande, no sul do país. táveis as condições de inserção internavisível o esforço para a criação cional destas economias, seria de projetos voltados à difusão necessário neutralizar, de algum de técnicas de “resolução de modo, a ação das populações conflitos ambientais”. Origique resistem aos processos nadas em instituições sediadas de concentração de recursos em países centrais e voltadas naturais nas mãos de grandes para a “capacitação” de entidainteresses econômicos, seja no des de países periféricos, tais âmbito da gestão das águas, dos iniciativas pretendem a difusão solos, da biodiversidade ou das de modelos de análise e ação redes de infra-estruturas. que pressupõem que a paz e a harmonia deveria surgir de um Jornal do MAB: Em que consisprocesso de despolitização dos tem essas regras e manuais e o conflitos através de táticas de que seriam os “pontos quentes” negociação direta capazes de e as “comunidades de aprendi“fornecer ganhos mútuos”, tanto zagem” de que você fala? para as comunidades que serão H.A.: Os pontos ditos “quentes”, prejudicadas, quanto para os na linguagem dos agentes da empreendedores. Foto: Arquivo MAB
Há tempos está em pauta a disputa pelo controle e exploração dos recursos naturais por grandes empresas multinacionais. A biodiversidade, a água e minérios, são os principais alvos.
Jornal do MAB | Setembro de 2008
utilizam técnicas para sociais no Brasil
Jornal do MAB: “O encaminhamento do conflito não se dá pela discussão sobre aquilo que é justo ou injusto, mas pela maior ou menor capacidade dos agentes barganharem seus interesses”. Quando você afirma isso, significa dizer que a organização da população atingida possibilita maior poder de ganho das comunidades? H.A.: Para estabilizar a especialização do Brasil na exportação de recursos naturais - água, energia barata, minérios, etc.os grandes interesses econômicos procuram tratar os conflitos caso a caso. Buscam evitar Jornal do MAB | Setembro de 2008
riências nas quais as empresas tentam, a todo custo, desmobilizar a população. No entanto, existe a reação das comunidades atingidas. Você poderia destacar a forma como isso acontece?
Foto: Arquivo do MAB
neutralização da crítica dos movimentos sociais, são aqueles em que a sociedade se organiza para problematizar a dominação que sobre ela é exercida. As “comunidades de aprendizagem”, por sua vez, são os grupos convidados a se submeter a uma pedagogia da desorganização, a apreender a não fazer tantos questionamentos. Este ideário do conformismo pretende que as comunidades sejam levadas a “dizer sim” aos projetos de infra-estrutura. As técnicas de formação de consenso são formuladas de modo a caracterizar todo conflito como problema a ser eliminado. E todo conflito restante tenderá a ser visto como resultado da carência de capacitação para o consenso e não como expressão de diferenças reais entre as comunidades e as empresas.
Marcha em direção à sede da Aneel, no Distrito Federal.
que eles sejam politizados e que levem a uma discussão mais ampla sobre o modelo de desenvolvimento. Quando os movimentos se organizam e apontam a dimensão política dos grandes empreendimentos e dos processos de concentração dos recursos do território nas mãos dos grandes interesses econômicos, entra em pauta a questão da democratização do território. Surgem então os questionamentos: para que fins os camponeses devem ceder seu espaço de vida para beneficiar as acumulação de riqueza em poucas mãos? Porque razão as comunidades indígenas e de pescadores devem perder o acesso à água limpa e à biodiversidade para abrir espaço para os lucros da monocultura exportadora? Jornal do MAB: No Brasil, o processo de construção de barragens é coberto de expe-
H.A: Se considerarmos a democracia como algo mais do que o sentido hoje vulgarizado de um simples regime políticoeleitoral, mas sim como um processo social que legitima o debate sobre o que é legítimo e o que é ilegítimo, perceberemos que o Movimento dos Atingidos por Barragens alinha-se entre os atores sociais estratégicos da construção democrática em nosso país. E o que os movimentos em geral apreenderam, e têm procurado nos ensinar, é que é legítimo não se submeter às imposições dos dominadores, notadamente internacionais, do poder de investir - imposições estas que via de regra ameaçam esgotar nossa base de recursos e desestabilizar espaços de vida de populações pobres. E isto eles, os atingidos, o fazem transformando-se de forma inovadora: de simples vítimas de projetos autoritários tornam-se sujeitos da discussão ampliada das políticas energéticas e pretendem que sejam melhor discutidas, de modo a não concentrar seus custos sociais e ambientais sobre as populações mais despossuídas, como tem sido praxe mesmo vinte anos após o fim da ditadura. 5
Ribeirinhos são despejados para Muito antes de ser emitida a Licença de Instalação da hidrelétrica de Santo Antônio, o consórcio Madeira Energia, responsável pela obra, já “negociava” a saída dos ribeirinhos que terão suas casas, terras e meio de sustento alagados.
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pesar da pressão dos povos que serão prejudicados pela barragem, a licença saiu em 11 de agosto, como queriam as principais acionistas do consórcio, Furnas e Odebrecht. Quem passa pela margem esquerda do rio Madeira, local onde será instalado o canteiro de obras, vê casas desmontadas ou queimadas, caminhonetes com móveis na caçamba, rostos tristes. É o povo ribeirinho que durante muitos anos viveu na beira do maior afluente do rio Amazonas, e agora é obrigado a sair de seu lugar de origem para dar lugar ao lago da barragem de Santo Antônio. Seu Neudir saiu há 60 dias da casa onde morava, ou seja, antes da emissão da Licença de Instalação. Por enquanto está na casa de parentes, mas tem esperança de que em setembro terá uma casa nova, segundo ele, prometida pelo consórcio. “Do final de setembro não passa, eles prometeram”. A casa nova a que se refere ficará em uma agrovila, que ainda não está pronta, e dificilmente estará até o prazo dado pela empresa. Dona Lúcia também está desmontando sua casa, local em que viveu durante 50 anos com seus filhos e marido. “Ouvi falar que arrumaram 6
um lugar pra eu ficar na cidade até aprontarem minha casa nova (na Agrovila)”, disse sem muita segurança. Mesmo sem ter certeza de onde vai ficar já começou a desmontar a casa, pois “eles mandaram a gente sair no domingo (7/9). Nós não queremos, mas não tem jeito, né? Tem que sair”, lamentou.
Foto: Arquivo MAB
dar lugar ao lago da UHE Santo Antônio
Para que esses despejos fossem feitos, foi preciso muita “conversa” do consórcio com os moradores. Neudete, ribeirinha cuja família mora na região desde 1913, participou de algumas reuniões e denuncia que o clima era de intimidação. “Eles tentaram fazer com que um ribeirinho não conversasse com o outro. Disseram pra gente não falar quanto vai ganhar de indenização, pro outro não querer roubar. E desde quando ribeirinho rouba ribeirinho? A gente se conhece desde que nasceu.”
Indenizações injustas Para o consórcio, a posse do título de propriedade da terra é essencial para garantir a indenização. No entanto, segundo levantamentos, apenas um quarto da população local possui o título, o que significa que a maioria não receberá nada. Ainda há casos daqueles que tem o título, mas estão com parcelas atrasadas. Seu Leonel, por exemplo, foi ao banco tentar regularizá-lo, preocupado com a indenização. Porém, o banco recusou-se a aceitar o dinheiro. Além disso, ribeirinhos que procuram algum tipo de crédito para agricultura, também não conseguem. Ou seja, a hidrelétrica, antes mesmo de ser construída, está prejudicando a atividade econômica de quem vive às margens do rio Madeira.
Casa de ribeirinhos desmontada em Rondônia.
Enquanto a agrovila não fica pronta, um plano de compensação foi prometido aos ribeirinhos. Vejamos o exemplo de seu José Machado, que mora na comunidade de Engenho Velho. Como piloto de voadeira (um pequeno barco com motor), ele consegue uma renda de 550 reais por mês. Além disso, utiliza a pesca para alimentar seus 7 filhos e a esposa. Quando sair de sua comunidade, José Machado, através do plano de compensação, terá uma renda de 415 reais (um salário mínimo) durante 18 meses, renda essa menor do que possui atualmente. Além disso, não terá mais o peixe como fonte de alimento gratuito e saudável. “Quando acabar esses 18 meses ou vou fazer o que?”, perguntou José. Na primeira visita do consórcio à casa do sogro de José a indenização pelo terreno foi avaliada em R$ 227 mil. Porém, se ele quiser uma casa na agrovila será descontada do valor da indenização. Como irá precisar de duas casas, uma para ele e outra para o filho mais velho, a indenização passou para R$ 198 mil. Caso o sogro de seu José queira ainda uma terra para plantar e tirar seu sustento, também será descontado da indenização: três hectares de terra custam R$ 10 mil. “Então, quem vai pagar pela casa dele é ele mesmo, e não o consórcio” concluiu José Machado. Jornal do MAB | Setembro de 2008
Índios e camponeses em defesa da
reserva Raposa Serra do Sol
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esde que arrozeiros reagiram com violência, no início deste ano, quando a Polícia Federal mobilizou-se para retirálos da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, ouvimos muito falar da tal “homologação em área contínua”, finalmente sancionada em 2005, após décadas de lutas dos índios de Roraima para que suas terras fossem reconhecidas. Homologar, segundo o dicionário, significa aprovar, admitir, dar a autoridade judiciária ou administrativa. Neste caso, depois da homologação sancionada pelo presidente Lula em 2005, a Terra Indígena Raposa Serra do Sol passou a ser admitida como pertencente juridicamente aos povos indígenas que lá vivem há séculos. A saber, são 19 mil indígenas que vivem em 194 comunidades, das tribos Makuxi, Wapichana, Ingaricó, Taurepang e Patamona. Do outro lado são seis famílias de rizicultores, ocupando 6 mil hectares de terra. Todos são grileiros em terra da União.
A terra indígena Raposa Serra do Sol situa-se no nordeste do estado de Roraima, no extremo norte do Brasil, fronteira com Guiana e Venezuela. Após a homologação, o governo federal passou três anos tentando negociar a retirada dos rizicultores-invasores de forma pacífica da reserva, mas eles não aceitaram nenhuma proposta e criaram um fato político que fez o Superior Tribunal Federal (STF) suspender Jornal do MAB | Setembro de 2008
as ações da Polícia Federal no local até que seja julgada uma Ação Popular do governo de Roraima que pede a nulidade da homologação conquistada em 2005. No dia 27 de agosto, indígenas de Roraima e de outros estados do país, além de representantes de movimentos sociais do campo foram até Brasília, participar da votação do STF. O ministro do Supremo, Carlos Ayres Britto, relator da ação que contesta a demarcação contínua da reserva indígena Raposa Serra do
Foto: Aty Guasu - Guarani Kaiowá e Terena
Após a homologação, o governo federal passou três anos tentando negociar a retirada dos rizicultores-invasores de forma pacífica da reserva, mas eles não aceitaram nenhuma proposta.
Mobilização indígena na reserva em Roraima.
Sol, votou a favor da manutenção da demarcação, no entanto, a votação final foi suspensa e a situação dos indígenas ainda está indefinida.
------------ Histórico -----------è Década de 1970: a União iniciou o processo de regularização da região secularmente habitada pelos cinco povos. è 1992: foi concluído o relatório de identificação da terra. Mesmo identificada, as invasões se intensificaram com a chegada dos rizicultores. è 1995: o governo de Roraima criou o município de Uiramutã, apesar de sua evidente inconstitucionalidade, dentro dos limites de Raposa Serra do Sol. Antes de ser município, o vilarejo servia de base de apoio à garimpagem ilegal na terra indígena. è 1998: o Ministério da Justiça editou a Portaria nº 820/98 que declarou a posse permanente da terra aos povos indígenas da RSS. Nessa época, o Estado de Roraima e os rizicultores impetraram Mandado de Segurança contra o ato administrativo do Ministro da Justiça. Todas as ações foram julgadas improcedentes pelo STJ. è 2005: por Decreto Presidencial de Homologação, a demarcação da terra indígena RSS determinada pela Portaria 534 de 2005, do Ministério da Justiça, foi ratificada. Essa portaria ministerial também instituiu o prazo de um ano para a desintrusão total dos ocupantes não-índios da Raposa Serra do Sol (RSS), prazo este não cumprido. è 2005 – 2008: o governo federal passou três anos tentando negociar a retirada dos rizicultores-invasores de forma pacífica, mas eles não aceitaram nenhuma proposta. è Março de 2008: a Polícia Federal iniciou a operação “Upatakon 3” para retirar os ocupantes não-indígenas. Os invasores reagiram com ações violentas, como incêndio e bloqueio de pontes, explosões de bombas artesanais, tentativas de homicídios contra lideranças indígenas e outras ações, lideradas pelo invasor Paulo César Quartiero. è 9 de abril de 2008: em função da violência praticada pelos arrozeiros, o STF determinou a suspensão da operação da PF. A operação só poderá ser retomada depois que o STF deve julgar o mérito de uma Ação Popular do governo de Roraima que pede a nulidade da Portaria n. 534, de abril de 2005. Com dados do Conselho Indigenista Missionário (CIMI)
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“Este curso ajuda a derrubar os muros que nos cercam”, afirma reitor da UFRJ Curso de Energia fortalece parceria entre MAB e IPPUR Foto: Arquivo do MAB
científico acadêmico e contribuir para a capacitação dos mesmos, aprofundando o conhecimento sobre as relações entre energia, meio ambiente e sociedade.
Reitor da UFRJ na abertura do Curso de Energia
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MAB e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), através do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR), firmaram o convênio para a realização do curso
“Energia e Sociedade no Capitalismo Contemporâneo”, cuja primeira etapa aconteceu em julho, no Rio de janeiro. Os principais objetivos são ampliar o acesso de militantes de movimentos sociais ao saber
Rio São Francisco Falo aqui do velho Chico, Riqueza da região agredida por barragens. Temo que o riacho seque, ameaçando o sertão Pra quem olha com bons olhos, É grande a preocupação Difícil é encarar, aceitar a situação, E pra ficar mais complicado vem breve Uma punhalada: uma tal de transposição. Vamos aí juntos ao MAB, lutar pra que isso acabe, Essa ousada intenção! Guerreiros que deram o sangue, Pra esse país mudar, Terra de gente bacana, gostosa de se morar. Se escuta as correntezas, o canto do Sabiá, Ribeirinha ou sequeira, tem sempre o que apreciar. Esse paraíso lindo, tão querendo transformar, Me desculpe a má notícia, num mundo capitalista, Não podemos aceitar. João Aparecido (Curso de Militantes da Região Nordeste)
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Participaram da primeira etapa 84 militantes de 23 organizações vindas de quatro países. O curso será realizado em quatro etapas presenciais, com duração de duas semanas cada etapa, realizadas em períodos de férias escolares da universidade. O reitor da UFRJ, Aloísio Teixeira, disse que o curso permite a universidade conhecer uma necessidade para qual muitas vezes ela não está atenta. “Eu tenho a expectativa de que se possa aprender com esses movimentos e incorporar o conhecimento que eles geram aos nossos próprios conhecimentos e com isso tornar a universidade mais próxima da sociedade e reafirmar os nossos compromissos sociais”, afirmou o reitor.
Vídeo “O preço da luz é um roubo!” O MAB e a Assembléia Popular produziram o vídeo “O preço da luz é um roubo” para ser mais um instrumento da Campanha Contra os Altos PreVídeo está disponível na internet, no site ços da Energia Elédo MAB (www.mabnacional.org.br) e no trica. O vídeo pode Youtube (www.youtube.com.br) ser assistido no site do MAB e no youtube (basta digitar “O preço da luz é um roubo”) e mostra, de uma maneira didática e divertida, como o atual modelo energético favorece as grandes empresas em detrimento do povo brasileiro, impõe altíssimas tarifas a serem pagas pela população, expulsa trabalhadores de suas comunidade e agride o meio ambiente. Jornal do MAB | Setembro de 2008