Nº 10 | Setembro de 2009
Foto: João Zinclar
Lula reconhece dívida histórica do Estado com os atingidos por barragens
Marcha na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, durante o Acampamento Nacional
Seminário internacional unifica atingidos por modelo de desenvolvimento Página 2 Jornal do MAB | Setembro de 2009
Resistência do povo contra as barragens: 20 anos de luta no Vale do Ribeira (SP) Página 6
A construção de barragens aumenta a violência no campo Página 7 1
Seminário internacional O trem enferrujado, unifica atingidos por EDITORIAL
será que vai andar? modelo de desenvolvimento
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ocê já tentou fazer andar um trem enferrujado? Não é fácil. O trem é pesado, e como criou ferrugem fica ainda mais pesado. Assim que vemos o trem dos direitos dos atingidos no atual momento da história do Brasil, é um trem enferrujado. Mas somos otimistas, o trem pode andar. Vejam porque achamos isso.
Primeiro motivo O povo está mais ativo e se mobilizando (estes sim podem colocar rapidamente o óleo necessário e, se for o caso, até empurrar o trem para ele andar). Foi assim que aconteceram inúmeras lutas pelo Brasil neste mês de agosto - por reforma agrária, pelos direitos dos atingidos, pela redução da jornada de trabalho, para que o petróleo seja nosso, pelo direito das mulheres, para baixar o preço da luz e tantos outros motivos justos que nosso povo tem para lutar. As mobilizações foram boas, mas para o trem andar teremos que fazer muito mais força, e lubrificar ainda mais esta máquina pesada.
Segundo motivo Alguns já reconhecem que o trem está enferrujado e foi assim com o presidente Lula ao admitir, depois de quase sete anos de governo, que o Estado Brasileiro tem muitas dívidas com os atingidos por barragens. E é verdade. Tem muita gente revoltada com o progresso que nunca chega, com o dinheiro público e o lucro indo só pras multinacionais e nós sendo expulsos das terras e pagando a conta. E tinha gente nos ministérios que dizia que estava tudo resolvido, que não tinha problema. Êta ferrugem! E foi bem interessante ver que depois deste recado do presidente muita coisa que não andava há tempo passou a ser azeitada de novo e parece que vai andar. Nosso sonho é que os direitos dos atingidos andem na velocidade do trem bala e que a ferrugem fique para quem explora o povo e destrói a natureza. Boa leitura! Coordenação Nacional do MAB Expediente
Jornal do MAB
Uma publicação do Movimento dos Atingidos por Barragens Produção: Setor de Comunicação do MAB Projeto Gráfico: MDA Comunicação Integrada Tiragem: 5.000 exemplares
www.mabnacional.org.br 2
O seminário teve a participação de 47 entidades de seis países
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m meados de julho, o MAB e o Núcleo de Direitos Humanos da Fase organizaram, no Rio de Janeiro, um seminário histórico para a luta dos trabalhadores: o Seminário Internacional dos Atingidos, que reuniu atingidos por barragens, mineradoras, extração de petróleo e gás, os atingidos pela transposição do Rio São Francisco, atingidos pela usina nuclear de Angra dos Reis, quilombolas e pescadores, entre outros. O seminário teve a participação de 47 entidades de seis países com o objetivo de debater e traçar estratégias de ação frente ao atual modelo de desenvolvimento que expropria os trabalhadores de suas terras, privatiza a água, a energia, o petróleo e todos os recursos naturais. Pelos depoimentos, foi possível verificar que o que acontece com os atingidos por barragens, acontece também com os demais atingidos por grandes obras de infraestrutura em toda a América Latina. “A ação do capital contra os trabalhadores obedece a mesma cartilha no Brasil e em diversos países. É necessário que neste momento de crise, quando são os trabalhadores quem mais sofrem perdas, fortaleçamos a unidade e pautemos outro modelo de desenvolvimento onde as populações sejam respeitadas em seus locais de trabalho e de moradia”, disseram os representantes da Fase. No final do seminário foi elaborado um documento, no qual os participantes criticam o atual modelo de desenvolvimento da América Latina, monopolizado principalmente pelo capital financeiro, pela metalurgia, pelas empresas de energia e do agronegócio e pelas construtoras. “Questionamos este modelo que privilegia a concentração do capital e a apropriação dos recursos estratégicos nas mãos de poucos. O mais importante deste seminário foi perceber que a violação dos direitos e a expropriação de nossas formas de vida nos identificam como atingidos pelo mesmo modelo de desenvolvimento capitalista. As corporações transnacionais e grandes grupos empresariais nacionais são os principais responsáveis pela miséria do povo e pela destruição ambiental”, afirmaram os coordenadores do seminário. Jornal do MAB | Setembro de 2009
O presidente Lula, em discurso, disse que durante muito tempo se construiu hidrelétricas no país sem que os atingidos recebessem indenizações e reassentamentos. Lula afirmou ainda que não quer deixar o governo sem pagar essa dívida. “Esse (o MAB) é um movimento que eu pedi para o companheiro Dulci conversar e ver qual é a dívida que o Estado Brasileiro tem com eles, porque certamente nós temos dívidas com eles. Durante muito tempo se construiu hidrelétricas, se prometia dar casas, e não veio as casas e não veio as terras”, reconheceu o presidente.
apenas em reparar os danos do passado, e sim que ela evolua para a criação de uma política social de tratamento às populações atingidas. No Brasil, não há uma legislação que assegure e estabeleça quais são os direitos dos atingidos por barAcampamento Nacional de Luta Pela Reforma Agrária, em Brasília ragens, nem há um órgão público encarregado Acampamento Nacional de realizar as indenizações e Uma das ações que impulsioreassentamentos. Sendo assim, nou as negociações dos movimentos há muitos casos de indenizações sociais com o governo foi o Acaminjustas e de desrespeito aos dipamento Nacional de Luta Pela Rereitos humanos no processo de forma Agrária, em Brasília, do qual instalação de uma barragem. participaram mais de 200 atingidos por Foto: João Zinclar
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Movimento dos Atingidos por Barragens está tendo bons motivos para comemorar ultimamente. Depois de anos de luta e pressão por parte do MAB, finalmente um presidente da república admitiu que o Estado Brasileiro tem dívidas históricas com os atingidos por barragens no Brasil.
barragens de Minas Gerais, Tocantins e Goiás.
Durante o acampamento, o MAB protocolou uma carta ao presidente Lula e ao ministro Luiz Por causa dessas Dulci, propondo a criação declarações, o ministro de uma Comissão que possa Luiz Dulci convocou elaborar diretrizes e critérios uma série de reuniões a serem adotados nas obras para negociar a pauta do do setor elétrico nacional, MAB. A coordenação em especial na construção nacional do Movimento de barragens. Ou seja, que O acampamento contou com a participação de mais de 200 atingidos por barragens de Minas Gerais, Tocantins e Goiás. entende este gesto como se crie essa nova política uma porta aberta para social. O Movimento ainda resolver problemas históricos “Em todos os estados os atinnão recebeu uma resposta positiva em das famílias atingidas em todo o relação a esta proposta. gidos ficam a mercê das empresas Brasil. “Nós fomos bem recebidos donas da barragem, que estão inNa proposta do MAB, algumas nos ministérios em que estivemos teressadas somente no lucro e não questões centrais devem ser objeto reunidos e todos reconheceram as nos direitos humanos. Não podede estudo da Comissão: estabelecer dívidas com os atingidos. Porém, mos deixar esta situação continuar. o conceito de atingido; estabelecer ainda estamos esperando resultaÉ por isso que nós não queremos quais são os direitos dos atingidos e dos concretos das nossas reuniões somente resolver os problemas as formas de garantir esses direitos; com o governo”, afirmaram. do passado, e sim criar uma nova e que se realize um amplo levantapolítica”, afirmou a coordenação mento dos problemas sociais e amO MAB espera também bientais das obras construídas. nacional do MAB. que a negociação não se resuma Jornal do MAB | Setembro de 2009
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Foto: João Zinclar
Lula admite: o Estado Brasileiro tem dívida com os atingidos por barragens
Jornada Nacional de Lutas - de 10 a 14 de agosto
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Atingidos por barragens:
e 10 a 14 de agosto os trabalhadores e trabalhadoras do Brasil fizeram manifestações contra a crise e as demissões, pela manutenção dos direitos e pela sua ampliação. Os movimentos sociais da Via Campesina também se mobilizaram por Reforma Agrária e por uma política agrícola voltada aos camponeses. O MAB esteve em luta fazendo ações em diversos estados reivindicando os direitos dos atingidos, a redução do preço da energia elétrica e a aplicação da Tarifa Social de energia. Historicamente, a luta conjunta é que fortalece a possibilidade de ganhos políticos e foi nesse sentido que trabalhadores do campo e da cidade se uniram.
Além da luta pelos direitos, o grande questionamento do MAB nesta jornada foi sobre a construção de novas barragens num período em que o consumo de energia, principalmente pelas indústrias, sofreu uma queda acentuada. Para os próximos anos, estaria sobrando o equivalente à geração das barragens de Jirau e Santo Antônio juntas. Mesmo assim, as empresas continuam construindo usinas hidrelétricas. Vitória dos trabalhadores no Ceará Os atingidos pelas barragens do Ceará fizeram manifestações em Fortaleza ocupando a Secretaria de Desenvolvimento Agrário e a distribuidora de energia do estado, a Coelce. 4
Na Secretaria, depois de três dias acampados, saíram com o compromisso do INCRA e do governo estadual em fazer o cadastramento das famílias sem terra das barragens de Castanhão, Figueiredo e Aracoiaba. Também foi organizada uma comissão que fará
de comunicação. “Por outro lado, as entidades e movimentos sociais vão continuar organizando o povo para a entrega de autodeclarações coletivas na distribuidora, que se comprometeu em aplicar a lei”, afirmou um dos coordenadores do MAB no Ceará.
Na região sul: atingidos querem o BNDES ajudando o povo
Fortaleza - CE
o levantamento das demandas e iniciará a reestruturação das condições sociais das famílias atingidas pela barragem de Castanhão, que exigem acesso à água e cisternas de placas, entre outros. Também ficou definido que a Secretaria de Recursos Hídricos acompanhará a pauta dos atingidos pela barragem de Aracoiaba. Já na Coelce, o protesto do dia 14 forçou um canal de negociações que se abriu entre os manifestantes e a distribuidora de energia. A Coelce reconheceu a existência da Tarifa Social de Energia e afirmou que não aplicava a lei aos usuários que consomem até 140 Kw/h mês, o limite de consumo do estado para se enquadrar no direito.O sucesso da ação foi a preparação da luta com antecedência nos bairros e vilas da cidade e a unidade entre os movimentos e entidades urbanos e camponeses. Como encaminhamento da negociação, as partes acertaram que a Coelce vai divulgar a Tarifa Social nas contas de energia e em canais
Centenas de agricultores de vários movimentos sociais montaram acampamento em Pinhal da Serra, no Rio Grande do Sul, próximo da Usina Hidrelétrica de Barra Grande. Eles debateram sobre os direitos da população e pressionaram para o encaminhamento das reivindicações como o direito à água, luz e tarifa social; defesa, preservação e recuperação do meio ambiente; perdão da dívida aos pequenos agricultores e crédito especial para a produção de alimentos.
Pinhal da Serra - RS
Além disso, debateram sobre as barragens e o financiamento do BNDES. Na região, o banco colocou mais de 5 bilhões de reais para construir usinas, além disso, só em 2007, as sete barragens da região faturaram quase 6 bilhões de reais. “Isso tudo vai para empresas como Tractebel, Engevix, Alcoa, CBA e outras. Nós não concordamos com Jornal do MAB | Setembro de 2009
só a luta faz valer! isso, acampamos e discutimos que parte desse dinheiro deveria ser investido na melhoria de vida da população”, afirmaram os coordenadores do MAB. No último dia do acampamento, os atingidos marcharam até a usina de Barra Grande e denunciaram que as empresas donas das barragens promovem fraudes nos estudos de impacto ambiental para garantir licenças e autorização dos órgãos ambientais, como foi o caso de Barra Grande, que teve o EIA/Rima fraudado para ser construída. Também no Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, os atingidos e demais movimentos e organizações sociais se mobilizaram no Ministério da fazenda e no INCRA.
Atingidos por barragens de Rondônia acampam em frente à obra de Santo Antônio Durante a jornada de lutas, as famílias atingidas pelas usinas de Jirau, Santo Antônio e Samuel montaram um acampamento próximo às obras da barragem de
Protesto em Rondônia
Santo Antônio. Além dos estudos sobre a construção de barragens na Amazônia, eles marcharam até o canteiro de obras. “Nós Jornal do MAB | Setembro de 2009
demarcamos nosso território fazendo mais esse acampamento. Demonstramos que estamos dispostos à luta para garantir os reassentamentos, a reestruturação das comunidades e o reconhecimento dos pescadores, indígenas e garimpeiros como atingidos por barragens”, afirmou uma das coordenadoras do MAB. No entanto, além de declarar que não deve nada aos atingidos, a empresa Odebrecht, recorreu a Polícia Militar que levou até o acampamento uma liminar de interdito proibitório, proibindo os atingidos de bloquear a entrada do canteiro de obras. Os atingidos não se intimidaram e no último dia de acampamento, marcharam até a Ceron, distribuidora de energia do Estado, onde entregaram dezenas de autoclarações exigindo a Tarifa Social de Energia.
Em Estreito, acampamento pelos direitos dos atingidos Centenas de pessoas estão acampadas (até o fechamento desta edição, em 28 de agosto) em frente à Usina Hidrelétrica de Estreito desde o dia 21 de julho. Elas exigem que as empresas Camargo Corrêa, Alcoa, Vale e a Suez-Tractebel, donas da barragem, reconheçam os pescadores, meeiros e indígenas como atingidos por barragens e solucionem os problemas causados pela obra. Entre outros pontos, os atingidos reivindicam a definição dos parques aquícolas para criação de peixe em tanques redes, a construção de um atracadouro com infra-estrutura
para processamento e armazenamento dos peixes, definição coletiva dos critérios para as indenizações. Como uma das principais reivindicações é a dos pescadores, no dia 18 de agosto, aconteceu uma reunião com a presença de aproximadamente 2000 atingidos, e representantes do representantes do Ministério da Pesca e Aqüicultura.
Mobilização em Estreito
Como encaminhamento, entre outros avanços, definiu-se que se iniciará o levantamento das demandas da pesca artesanal, impactos e conseqüências na vida dos pescadores (as) e comunidades atingidas, através de um processo de monitoramento sócio econômico e dos recursos pesqueiros avaliando os impactos no desenvolvimento regional da pesca e aqüicultura.
A construção das barragens é feita, principalmente, por empresas eletro intensivas multinacionais, que declararam falência nos países centrais e se instalam em países como o Brasil, que tem energia subsidiada e muitos recursos naturais. 5
Jornada Nacional de Lutas - de 10 a 14 de agosto Atingidos por barragens e atingidos pela mineração protestam em Minas Gerais Centenas de famílias atingidas por mineradoras e atingidas por barragens, juntamente com sindicatos e Assembléia Popular trancaram a BR 040 para alertar a sociedade para os problemas que as grandes empresas multinacionais, donas de mineradoras e barragens, trazem à região. O trancamento ocorreu após um encontro onde debateram os impactos que empresas como Vale, CSN, Sumitomo e Valorec, vêm causando em toda a região do Alto Paraopeba. “Bairros inteiros vão desaparecer com a expansão dessas empresas mineradoras e o governo do estado de Minas é conivente com isso”, disseram os coordenadores do ato.
Campo e cidade protestam em Salvador No dia 14, atingidos por barragens e centenas de manifestantes protestaram em frente ao Banco Central e pelas ruas de Salvador contra a crise mundial, o alto preço da energia e por reforma agrária. Eles criticaram a posição do Governo Federal, que injetou bilhões de reais na economia para salvar os bancos privados e montadoras, enquanto que as demissões continuam aumentando. No vale do Rio São Francisco a campanha contra os altos preços da energia também se fortaleceu nesta jornada. Em Petrolina/PE, atingidos por barragens, movimentos sociais e entidades urbanas fizeram uma grande mobilização nos bairros e vilas esclarecendo sobre a Tarifa Social de Energia e recolhendo autodeclarações.
Resistência do povo
contra as barragens 20 anos de luta no Vale do Ribeira, em São Paulo Centenas de pessoas, integrantes de várias organizações, entre elas o MOAB e a Via Campesina, realizaram a manifestação num dos pedágios da Rodovia Régis Bittencourt. Eles protestaram contra a construção das barragens no rio Ribeira do Iguape, pleiteadas desde a década de 80 pela Companhia Brasileira de Alumínio, empresa do grupo Votorantim.
Vale do Ribeira
“Estamos lutando contra tudo aquilo que está destruindo o nosso rio, a nossa vegetação. 6
A Votorantim consome cerca de 4% de toda a energia elétrica produzida no país, o que corresponde ao consumo de energia de um estado como Pernambuco, com 8 milhões de habitantes. A energia consumida é utilizada na produção de minérios e celulose, em sua grande maioria voltado para a exportação e nós não deixaremos que nos roubem nossas terras, nossos bens, para o acúmulo de capital dessa empresa”, afirmam as lideranças.
No sul, técnicos das empresas são expulsos Em Santa Catarina, os atingidos pela usina de Itapiranga realizaram um encontro e um ato público contra a construção da barragem. Segundo a coordenação do MAB, os agricultores querem continuar com o direito de escolher sobre o seu futuro. “Nossa luta é pelo cancelamento definitivo da barragem, nós queremos que o governo realize investimentos para desenvolver nossa região sem essa obra”.
Marcha em Itapiranga
No dia anterior ao encontro, os atingidos expulsaram seis técnicos da barragem que faziam as medições. Há anos, os agricultores resistem à construção da usina de Itapiranga. Esta prática foi bastante usada contra a construção da barragem de Machadinho, também na região sul. Também em Santa Catarina aconteceu um ato no dia 14 em frente à empresa Sadia, que demitiu dezenas de trabalhadores no último período. Depois, os manifestantes marcharam rumo à sede do Consórcio Foz do Chapecó, construtor da Hidrelétrica de Foz de Chapecó. Jornal do MAB | Setembro de 2009
A construção de barragens aumenta a violência no campo
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ecentemente, a luta dos atingidos por barragens que reivindicam a terra teve mais um episódio de violência. Odilon Bernardo da Silva, atingido pela barragem de Acauã e integrante do MAB, foi assassinado com tiros de espingarda, em frente a sua casa, no município de Aroeiras, na Paraíba. Este caso não é isolado e as lideranças sofrem constantes ameaças de morte na região. Na Paraíba, os atingidos estiveram acampados na fazenda Mascadi, no município de Itatuba. Eles reivindicavam a revisão das indenizações pagas e terra para garantir o modo de vida que possuíam anteriormente à barragem. Exatamente dois meses depois do início do acampamento, as 120 famílias acampadas na Fazenda receberam da justiça a ordem de despejo e reintegração de posse. A ação de desocupação foi acompanhada por cerca de 100 policiais da Polícia de Choque. Outra região cujos militantes vêm sofrendo ameaças de morte é no Pará. Os atingidos pela barragem de Tucuruí alertam a sociedade para o fato: “Essas ameaças têm vindo de setores ligados aos grandes interesses econômicos da região, principalmente os da grilagem de terras, do agronegócio, da indústria do carvão e da indústria madeireira, que em sua maioria, desenvolvem atividades ilegais, causando a destruição da Amazônia”. Jornal do MAB | Setembro de 2009
Os atingidos estão preocupados com a situação de conflito instalada em Tucuruí e requerem dos órgãos competentes uma intervenção rápida, buscando evitar crimes e garantindo a integridade das lideranças que fazem a defesa dos direitos das famílias camponesas contra a ação ilegal de grupos econômicos. As ameaças de morte que as lideranças estão sofrendo nas duas regiões foram registradas e os atingidos aguardam a apuração dos fatos. Segundo lideranças do MAB, é preciso que os órgãos competentes façam uma investigação séria sobre esses crimes e que se tome uma postura para combatê-los. “Caso contrário, estaremos sempre convivendo com essa triste realidade de violência no campo”, afirmaram. Tanto na Paraíba, como em Tucuruí, entidades de defesa dos direitos humanos estão intervindo para apuração dos fatos e para impedir que novos casos aconteçam. A situação em Tucuruí se agravou depois que 18 atingidos foram presos, sendo que quatro deles ficaram presos por 44 dias, por motivos políticos.
Poesia escrita em homenagem a Odilon Bernardo da Silva
Os rios correrão
Atingiram-te. Atingiram-te covardemente Arrancaram-te do lugar onde sempre viveste De lá guardavas lindas lembranças, a infância livre em meios a roçados e banhos de rio, os primeiro namoros, o casamento e nascimento de teus filhos. Atingiram-te. Atingiram-te covardemente Inundaram teu passado Afogaram tua existência Barraram tua felicidade e a dos teus pequenos e velhos. Atingiram-te. Atingiram-te covardemente Atingiram-te com as águas de Acauã Atingiram-te com a pobreza que te deixaram Atingira-te sumariamente cinco vezes pelas costas Atingiram-te companheiro Mas teu sangue derramado ainda corre em nossas veias E para aqueles que tantas vezes te atingiram As lutas do teu povo os renderão Aos teus inimigos libertaremos Como nossa libertação E só assim tuas crianças correrão, juntas com as demais, livres e puras como rios sem represas nem barragens. Paula Adissi, Militante da Consulta Popular da Paraíba
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A soberania da Colômbia e de Honduras está em risco
á se passaram mais de dois meses e a situação em Honduras, na América Central, continua instável. A conspiração da direita naquele país, com o apoio do governo dos Estados Unidos, levou ao seqüestro do presidente Manuel Zelaya no final de junho. A maioria dos países repudiou o golpe de estado e nenhum reconheceu o governo golpista de direita. A população deflagrou greve geral, saiu em defesa da soberania nacional e foi duramente punida pela repressão, principalmente
os camponeses, que somavam grande força no país.
políticos e geoeconômicos em nosso território.
O que aconteceu em Honduras recebeu uma roupagem diferente na Colômbia. Se lá a tomada do poder pela direita foi à força, na Colômbia a instalação de sete bases militares dos Estados Unidos teve o consentimento do governo daquele país, que faz divisa com a Amazônia Brasileira. Portanto, a guerra às drogas pode estar sendo utilizada para esconder e camuflar interesses geoestratégicos, geo-
“Estes fatos não são pontuais nem isolados”, dizem os especialistas. A América Latina vive momentos de intensa mobilização social e eleição de presidentes de esquerda como Lugo, no Paraguai; Evo Morales, na Bolívia; Chaves na Venezuela. Vale lembrar que golpes de estado e a ofensiva estadunidense também aconteceram na América Latina depois de 1960, quando vivíamos um forte processo de organização popular.
7 de setembro: Grito dos Excluídos Vida em primeiro lugar: A força da transformação está na organização popular. Com este lema, O Grito dos Excluídos, em sua 15.ª edição, traz para as ruas a indignação dos trabalhadores contra a crise econômica, o desemprego e as ameaças aos direitos trabalhistas e sociais, contra a corrupção e a impunidade, e denuncia a criminalização dos movimentos sociais. Participe!
Excluídos? Sabe aquele mendigo: cego, trêmulo, em farrapos, aos gritos, na Rodoviária de Manhuaçu? Somado a milhares de outros, em qualquer lugar do Mundo [“Desafortunados da vida, fazer o quê”!?], descarregam a consciência de muita gente que crê: Na assistência de uma cesta, menos que básica; Na caridade de uma fé, mais que falsa; Na vulgaridade da vida, que anda parca; Numa miséria doída, para quem a morte é descaso, no completo anonimato. Mesmo no túmulo, o defunto pobre vira pesquisa, número, projeto, que aquece os negócios, por certo, e se torna discurso inflamado na boca do político safado, que fala bem – e muito! - do coitado. E a morte de mais um mendigo [feito ferida antiga: se curada, perde o seu sentido!] alimenta a vida pobre de outro e mais outro – centenas - que vivem carentes e morrerão como indigentes. Sabe aquele menino: pobre, pançudo, magro, de olhos esbugalhados, lá de Santa Efigênia? Aquele fiozinho de vida, quase um fazer de conta, faz pose, vira retrato, fica bem na ‘bela’ foto: Sem nome Cara de fome Em pele e osso [Quanto pior, melhor!]. Sua sombra gira mundo, arrecada milhões, 8
talvez, engorda ONGs: Que montam projetos Que aninham algumas centenas de técnicos Parasitas: bem alimentados com a imagem faminta do menino pobre. Sabe aquele trabalhador que, após as férias-prêmio, foi demitido da Vale e virou desempregado? Aquele operário que alimentou com pranto e dor a gula do Capital, agora se junta às vítimas do desemprego estrutural [Ou circunstancial] e continua movendo a acumulação desmedida. Em nome do desemprego: Pressiona-se o operário Reduzem-se os direitos Mingua o salário. O mendigo em trapos A criança barriguda O operário no olho da rua Supostamente excluídos Funcionam como excedentes: ‘Exército de reserva’ De um sistema inconseqüente. Antonio Claret Fernandes Militante do MAB Minas Gerais
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