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TUDO&mais Quinta-Feira, 14 de Junho de 2018

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Natal/RN

SOBREVIVENTES Em meio a indefinição, o futebol feminino resiste no Rio Grande do Norte. página 07

Coluna

MISTO? SÓ O QUENTE. página 7

//Política

Corrida eleitoral para Governo do RN

Pesquisa do instituto Certus aponta principais candidatos a ocuparem o cargo em 2019

páginas 2 e 3 //Sociedade

//Cultura

Pesquisa revela quem financia as violações no ‘Patrulha da Cidade’

A expressão da arte da periferia nas paredes da capital

páginas 4 e 5

página 8


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TUDO&mais

+Política

Corrida eleitoral para Governo do RN Pesquisa do instituto Certus aponta principais candidatos a ocuparem o cargo em 2019

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Natal - RN Quinta-feira, 14 de Junho de 2018

por Jullyendson

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quatro meses da eleição que decidirá quem governará o estado do Rio Grande do Norte nos próximos quatro anos, pelo menos 7 nomes estão na disputa. Dentre os concorrentes ao pleito, temos o ex-prefeito de Natal Carlos Eduardo (PDT), que renunciou ao cargo para lançar a candidatura e o atual governador do estado, Robinson Faria (PSD). Ambos, aparecem atrás da candidata e senadora Fátima Bezerra (PT) que lidera a intenção dos votos, na pesquisa realizada pelo Instituto Certus. O Instituto Certus contratado pela FIERN (Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte) realizou a pesquisa da corrida eleitoral no RN, ouvindo 1.410 eleitores entre os dias 27 a 30 de abril de 2018. O levantamento foi feito de forma estimulada e espontânea, e possui uma margem de erro de 3 pontos percentuais para mais ou para menos com um intervalo de confiança de 95%.

Pesquisa estimulada Na pesquisa estimulada, os entrevistados escolhiam o candidato a partir de uma lista com os nomes propostos, e a senadora Fátima Bezerra lidera a disputa entre os candidatos com 25.6%. Porém, quem sai mesmo a frente no ranking, é a opção “nenhum”, onde 31,49% dos entrevistados preferiram não escolher algum dos candidatos propostos.

Pesquisa espontânea Quando foi a vez dos entrevistados escolherem de forma espontânea seus candidatos, 62,84% não sabiam em quem votar e 22,34% optaram por nenhum. Ou seja, apenas menos de 15% escolheram um dos candidatos.


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TUDO&mais Imagem: Governo do Estado do RN

Melhor Desempenho

25,2% é o percentual

5,04% é o percentual de Robinson Faria(PSD)

de Fátima Bezerra(PT)

4º Desempenho Os 4 candidatos mais cotados pela pesquisa, já são veteranos nas disputas eleitorais norte rio-grandenses e já possuíram ou possuem algum cargo nos poderes executivo e legislativo. Fátima Bezerra (PT) A senadora Fátima Bezerra, formada em pedagogia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), é filiada ao Partido dos trabalhadores desde 1981, e em 1994 foi eleita pela primeira vez como deputada estadual do Rio Grande do Norte e foi reeleita em 1998, foi deputada federal por 2 mandatos e em 2014 foi eleita como senadora. Fátima, possui um histórico político marcado pela luta de pautas sociais e foi a mais cotada para assumir o cargo de governadora do estado, pela pesquisa do Instituto Certus.

Carlos Eduardo (PDT) Formado em direito pela Universidade Santa Úrsula, o ex prefeito potiguar iniciou sua carreira política como deputado estadual, em 1986 foi eleito vice-prefeito de Natal no ano 2000, assumiu a prefeitura em 2002 e reeleito em 2004. Em 2012 foi eleito novamente prefeito e Natal e reeleito em 2016, renunciando o cargo esse ano para disputar o cargo de governador. Carlos Eduardo, apresentou vários projetos que viraram leis, como a criação da defensoria pública e a obrigatoriedade de realização de testes ainda-AIDS em hospitais, maternidades e bancos de sangue tanto público, quantos privado.

Geraldo Melo (PSDB) Geraldo Melo foi vice-governador do Rio Grande do Norte de 1979 até 1983, vice-presidente do senado de 1995 até 1997, senador de 1995 até 2003, presidente estadual do PSDB, de 1993 até 2008. Também montou uma estação de rádio e teve a concessão de uma emissora de TV, em meados dos anos 1980, e há poucos dias iniciou o canal “tamborete”, no youtube.

Robinson Faria (PSD) Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, foi Deputado estadual de 1987 a 2010, Presidente da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte de 2003 a 2010, Secretário Estadual de Meio Ambiente em 2011, Vice-governador de 2011 atá 2015 e foi eleito governador do Rio Grande do Norte em 2014.

Imagens: Divulgação. A eleição deste ano acontecerá no dia 7 de outubro e se houver 2º turno, no dia 28 do mesmo mês. E terá algumas mudanças aprovada pelo Congresso Nacional. Como por exemplo, a propaganda eleitoral, onde o período das eleições terá duração de 45 dias e não 90 como era até antes. Mudanças no financiamento das campanhas e um limite máximo para os gastos dos candidatos, o que antes não existia.

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TUDO&mais +Sociedade

Pesquisa revela quem financia as violações no ‘Patrulha da Cidade’ Conhecido por expor cidadãos a situações degradantes, o programa é um exemplo de mídia que desrespeita os direitos humanos por Amanda Porfírio, Andressa Milanez e Diógenes Nóbrega

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Constituição de 1988 estabelece que a programação televisiva deve atender às finalidades artísticas, culturais, educativas e de respeito aos valores éticos da pessoa e da família. Na contramão disto, os programas policialescos se estruturam em narrativas que disseminam ódio e intolerância. O programa televisivo Patrulha da Cidade, exibido pela TV Ponta Negra, afiliada do SBT no Rio Grande do Norte, é um exemplo de uma mídia que viola direitos humanos. Seguindo a metodologia proposta pela pesquisa “Violações de direitos na mídia brasileira: guia de monitoramento”, desenvolvida pela ANDI Comunicação e Direitos, em parceria com outras organizações sociais, em outubro de 2017, estudantes da UFRN realizaram o monitoramento de doze edições do programa Patrulha da Cidade, somando mais de 17 horas de gravação. Além de constatar 737 violações de direitos humanos (média de 56,69 por dia), a pesquisa objetivou mapear quem, afinal, financia estes programas, pagando as propagandas nos intervalos comerciais e/ou merchandising durante a exibição. A pesquisa levantou 34 marcas financiadoras dos programas. Boa parte delas escolas, farmácias, supermercados e empresas de segurança. Vale destacar que a condução do programa privilegia a construção do cenário de medo. As matérias e notícias expostas, unidas às falas do apresentador e do repórter, criam no imaginário do espectador um ambiente inóspito e completamente inseguro. Logo em seguida, estrategicamente, o merchandising das empresas de segurança entra em ação, para então fortalecer a “necessidade” de segurança para a população telespectadora. Também chama a atenção o fato de existirem escolas que investem em comerciais nestes programas, visto que estas instituições deveriam promover a formação cidadã, além de garantir o cumprimento do Es-

tatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990). A partir do mapeamento realizado, será possível incidir sobre os anunciantes, mostrando a eles a associação direta entre a marca e as violações de direitos cometidas nos policialescos. É provável que parte destas empresas anunciantes não conheça a fundo o conteúdo veiculado por estes programas. Então, o objetivo é mostrar que esta é uma conta que, no final, pode sair cara. Tanto para a marca quanto para o cidadão, vítima de uma programação que desrespeita direitos. O primeiro monitoramento realizado pelos estudantes do curso de Comunicação Social da UFRN foi realizado em abril, quando eles mapearam exclusivamente as violações de direitos humanos cometidas no Patrulha da Cidade. Os doze programas monitorados, que somavam mais de 16 horas, apresentaram 399 violações – uma média 33,5 violações em cada exibição. Fazendo um comparativo entre os dois monitoramentos, é perceptível um aumento de 84% no número total de infrações detectadas, representando uma crescente quando o assunto é violação de direitos. Dentre as violações encontradas, vale citar o desrespeito à presunção de inocência; exposição indevida de pessoa(s); exposição indevida de família (s); e discurso de ódio e preconceito de raça, cor, etnia, religião, condição socioeconômica, orientação sexual ou procedência nacional; entre outras que compõem a metodologia da pesquisa. No desdobramento dos dados também foi possível detectar que as pessoas que mais possuem seus direitos violados são as acusadas de crimes e seus familiares, representando 80% no primeiro monitoramento e 49% no segundo. No âmbito da cor/raça, a maioria das pessoas que têm seus direitos violados são pretos e pardos. Em outras palavras, há uma naturalização da ideia de que os suspeitos não são sujeitos de direito algum, sobretudo, quando pretos e pobres. O monitoramento faz parte do projeto de pesquisa “Afinal, quem paga a conta?”, coordenado pelo professor Daniel Meirinho e realizado em parceria com a disciplina “Comunicação, Mídias e Direitos Humanos”, ministrada pela professora Aline Lucena, no Departamento de Comunicação Social da UFRN.

Patrulha da Cidade O Patrulha da Cidade é um programa policial líder em audiência, exibido de segunda à sexta-feira, com início ao meio dia e duração média de uma hora e quinze minutos. Esse conteúdo midiático visa televisionar através de reportagens a nível estadual: ações policiais, assassinatos, roubos e assaltos, mortes, estupros, drogas, rebeliões, sequestros e tragédias, bem como situações cotidianas em que está inserida essa população. Mas muitas das narrativas violam direitos. O apresentador, Cyro Robson (conhecido como Papinha), entra como uma figura importantíssima no reforço das violações, com falas que promovem o discurso de ódio e preconceito, incitam a desobediência às leis ou às decisões judiciárias e, muitas vezes, incitam o crime e a violência. Em um dos programas, ele disse: “Enquanto tão matando os bandidos, é um a menos pra prejudicar a gente, né?”, em outro, afirmou, “Era bom que essa grade fosse daquela que o cara solta assim, né? Pra fechar. Na hora que ele botasse a cabeça: pluf!”, numa alusão à guilhotina e, portanto, à pena de morte. Além de reforçar as violações, o apresentador assume um papel significativo perante o público, que o considera por muitas vezes um justiceiro ou algum tipo de herói, lutando incansavelmente para garantir a paz em uma cidade que apresenta altas estatísticas de violência. Com voz firme, sempre bem vestido, Papinha se destaca dos demais integrantes do programa, assumindo um protagonismo. É evidente o esforço em torná-lo um personagem “sério” da TV. Em cada fala, gesto ou na variação do tom de voz,

“ “Hoje em dia não dá pra falar nada, porque vêm os direitos humanos pra defender esses vagabundos.”

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TUDO&mais

Vitórias importantes N

deixa clara a sua opinião e seu total desdém aos indivíduos marginalizados, em sua maioria de classe baixa e oriundos das periferias da cidade. As falas proferidas pelo apresentador são carregadas de desinformação, preconceito e desumanidade. Por muitas vezes, induzindo o telespectador a reproduzir o mesmo discurso. Em alguns trechos, o apresentador chega a citar os direitos humanos como um recurso negativo, um verdadeiro vilão do “cidadão de bem”. Em uma situação específica, quando ele se vê encurralado em ter de omitir uma possível violação, profere: “Hoje em dia não dá pra falar nada, porque vêm os direitos humanos pra defender esses vagabundos.” E quantas vezes não se veem frases assim sendo repetidas na internet, em conversas de grupo ou no trabalho? O programa que se coloca como jornalístico, mistura opinião e entretenimento travestidos de informação, e é nessa opinião disfarçada de notícia que a sua influência conquista espaço. A expressão “quer papinha pro neguinho?” (bordão do apresentador), reforça o tratamento duro aos que estão em situação de marginalidade, ou seja, sem moleza para os criminosos. O seu bordão deixa bem claro que marginal é “neguinho”. Além de reforçar um preconceito racial e econômico, o programa passou a ter vinhetas com vídeos caseiros enviados por fãs, onde crianças com uma colher na mão dizem o bordão do apresentador. Vale ressaltar que Cyro Robson apresenta todo o programa com o mesmo objeto nas mãos, símbolo da justiça: a colher.

Imagens: Dilvugação.

a ausência de um órgão ou agência reguladora autônoma de caráter federal, que possa realizar o acompanhamento das violações e impor sanções aos casos mais graves, tem sido a sociedade civil e os pesquisadores nas universidades, os responsáveis por mapear as violações, produzir denúncias e encaminhá-las ao Ministério Público Federal (MPF). E este esforço tem trazido bons resultados – embora ainda lentos diante da gravidade do programa. Em novembro deste ano, a TV Jornal, afiliada do SBT em Pernambuco foi condenada a pagar multa por danos morais coletivos por expor e humilhar crianças durante o programa Bronca Pesada, que era apresentado pelo controverso Cardinot. O caso foi denunciado pela sociedade civil há cerca de 10 anos, mas só agora houve decisão da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Infelizmente, no entanto, a multa – irrisórios R$ 50 mil reais – está muito aquém do R$ 1 milhão pedido pelo MPF, o que acaba não cumprindo o papel de impedir novas violações. Outra vitória recente aconteceu na última sexta-feira, dia 1º de dezembro. Após a 3º audiência contra o jornal AquiPE, realizada pelo Ministério Público Estadual de Pernambuco (MPE-PE), ficou definido que o jornal terá que publicar nos dias 11, 12, 13, 14 e 15 de dezembro, matérias de uma página sobre temas relativos aos direitos humanos. Trata-se de uma tentativa de minimizar os danos causados pela publicação, em 01/09/2017, de imagem de capa que mostrava a genitália de uma mulher brutalmente espancada até a morte pelo ex-companheiro. Não por acaso, Diana, como se chamava, era mulher negra e pobre – o que no Brasil parece ser condição autorizativa para toda uma “sorte” de violações à dignidade na mídia. A ação foi resultado de uma articulação de entidades e organizações da sociedade civil que fazem parte do Fórum Pernambucano de Comunicação (Fopecom) e do Observatório de Mídia da UFPE (leia aqui a Nota de Repúdio assinada por dezenas de entidades). Os programas serão exibidos na proximidade do dia 10 de dezembro – Dia Internacional dos Direitos Humanos – e devem pautar temas

como “Igualdade Racial”, “Populações Socialmente Excluídas”, “Direitos das Mulheres”, “Feminicídio” e “Direitos Humanos e Liberdade de Expressão”.

Universidades são fundamentais Estas pequenas vitórias apontam para a necessidade de ampliar as parcerias para combater as violações de direitos humanos no rádio e na TV. Desde 2015, organizações da sociedade civil têm empreendido um esforço comum para mapear as violações de direitos humanos cometidas nestes programas. Naquele ano foi realizado monitoramento de 28 programas (9 de rádio e 19 de TV), exibidos em 10 capitais brasileiras, ao longo de 30 dias. Foram detectadas, à época, 1.936 narrativas com violações que ultrapassam 4.500 violações de direitos humanos. Os objetivos destes monitoramentos são, entre outros, mobilizar a sociedade para a importância da pauta e produzir subsídios para atuação do MPF nos estados. A Procuradora Federal dos Direitos dos Cidadãos (PFDC), bem como as filiais regionais do órgão, têm sido os principais parceiros institucionais na empreitada que visa acabar com as violações de direitos na mídia. A construção de parcerias para realizar monitoramentos tornase, portanto, uma tarefa essencial para que novos subsídios sejam produzidos. Este é o objetivo da Campanha Mídia Sem Violações de Direitos, lançada em 2016. Esta também tem sido a perspectiva de alguns observatórios de mídia que estão sendo criados no Brasil, entre os quais o Amaru – Observatório Latino Americano de Comunicação, Mídias e Direitos Humanos, lançado no dia 28 de novembro na UFRN, ao qual está integrado o projeto de pesquisa “Afinal, quem paga a conta?”. As iniciativas atuais, envolvendo a academia, também se inspiram na Campanha “Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania”, coordenada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, nos primeiros anos da década de 2000.

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TUDO&mais +Esportes Coluna do GLAUBS

Sobreviventes: Em meio a indefinição, o futebol feminino resiste no RN

MISTO? SÓ O QUENTE. Se você é nordestino e sua emoção transborda por um time que ultrapassa as divisas regionais, já deve ter ouvido alguém te chamar de misto. O apelido, para os que distribuem a alcunha, maldosa, diga-se de passagem, é aquela pessoa que torce para times que não pertecem à sua cidade ou seu estado. Exemplo: um natalense que torce para o Corinthians. Sempre que ouço a expressão me pergunto o porquê de querer menosprezar o amor do outro. Afinal, o amor e a paixão devem alguma coisa à geografia das fronteiras? Quanto? Em que caderninho de fiado anotaram isso? Quem anotou? É justamente nessa hora, o momento do acerto de contas, que aparece o oportunista para dizer que é mais torcedor porque vai ao estádio. Calma! Então alguém que reza todos os dias mas não vai à igreja tem menos fé do que o fiel que vai religiosamente (redundância necessária)? Nunca saberemos. Frequência não é garantia, presença não é garantia. É aí que está o x da questão. Até que algum barrista inveterado invente uma forma de dimensionar a paixão, as críticas aos corajosos (sim, corajosos) mistos não vão passar de gritos ao vale do Ir ao estádio é mágico, isso é um fato. Mas a garganta que grita gol entona a mesma alegria, o soco no ar após um desarme em cima da linha movimenta a mesma massa de ar e os xingamentos ao árbitro carregam o mesmo tapa-olhos da cegueira clubista. O amor nunca vai conseguir se explicar por si só, apenas existe. À beira do gramado ou a 5 passos... Da tv. O futebol transcende fronteiras físicas e, nesse caso, é melhor deixar de lado suas explicações terrenas para aquilo que não é apenas um esporte. Ah, no fim das contas, do estádio, escutando no radinho de pilha ou vendo na tv, quem paga o pato é sempre a coitada da mãe do juiz.

Imagem: Júlia Carvalho por Amanda Porfirio e Júlia Carvalho

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odo fanático por futebol conhece o Cruzeiro e suas duas libertadores, quatro Brasileirões e cinco Copas do Brasil. O time de Minas tem reconhecimento, respeito e o estádio Mineirão à disposição. O que o torcedor talvez não saiba, é que o amor pelas cinco estrelas do time celeste também se estende a mais de 2.427 quilômetros de Belo Horizonte, onde 22 garotas defendem a camisa do Cruzeiro em Macaíba, município da região metropolitana de Natal, capital do Rio Grande do Norte. As diferenças entre as duas equipes de mesmo nome, no entanto, transcendem a óbvia distância geográfica e a evidente diferença de gênero. Criado em 1937, o clube formou um time feminino em outubro de 2016. A equipe que tem Francisco Menguita da Costa, o “Gaita”, como presidente, é amadora, mas conta com uma estrutura profissional, que dispõe de equipe médica completa, além de uma comissão técnica que acompanha o desempenho das atletas. Não diferente de outros clubes amadores do Brasil, o Cruzeiro de Macaíba sofre com a falta de investimento e o atraso do calendário das competições estaduais. A ausência de um calendário fixo tem atrapalhado o planejamento anual da equipe. De acordo com Júlia Maria Alves, aqui acho que seria interessante especificar exatamente o cargo que ela ocupa na comissão técnica que faz parte da equipe técnica do Cruzeiro, além da falta do calendário, a dificuldade de encontrar patrocínio e investimentos externos também se tornaram mais uma algoz. Atualmente, o clube se sustenta com parte da verba recebida pelo time masculino, o que corresponde a três mil reais por mês para pagar materiais, deslocamento das atletas, água e frutas em dias de treino, e demais despesas. “É muito gasto sem uma finalidade específica”, desabafa Júlia. Segundo Gaita, as dificuldades de encontrar apoio fazem parte da rotina. “Se é difícil patrocinar o futebol profissional adulto, quem dirá o feminino. Quando fala em feminino, ó… Deus te acuda”, relata. Ainda assim, o clube conseguiu fechar parcerias importantes com entidades públicas e privadas. A prefeitura municipal de Macaíba, o Colégio CEI e a Academia Arena são os atuais patrocinadores do Cruzeiro de Macaíba. Além disso, a empresa ‘Ação Camisetas’ é a fabricante oficial do material esportivo do time, que pretende apresentar neste mês os novos uniformes. Os investimentos têm sido utilizados pelo clube para otimizar a preparação da equipe em busca do acesso à série A2 do Campeonato Brasileiro Feminino. O problema é que caminho para chegar até lá ainda é longo, e não depende só do clube. Todo o planejamento da equipe está sujeito à divulgação das datas do campeonato potiguar, competição que pode assinar o passaporte para

disputar a tão sonhada vaga na elite do futebol nacional. Única equipe a manter as atividades desde o final do campeonato no ano passado, o Cruzeiro aguarda a divulgação da data do início do estadual de 2018, que até o início dessa semana, ainda não tinha uma definição. De acordo com o técnico Bernardes Filho, este é mais um ponto que atrapalha o time. “Nós estamos treinando sem perspectiva, né? Sem saber de data. Sofremos com o calendário sim, porque só tem um campeonato no ano. Depois disso, acabou. As equipes param de treinar. Graças á Deus nós continuamos,” avalia. A Federação Norte-rio-grandense de Futebol só anunciou os preparativos para o Estadual feminino 2018 na última segunda-feira 30/04. As equipes tiveram apenas três dias - até o dia 2 de maio - para realizar inscrição no campeonato. Com a definição dos clubes, a promessa é de que a competição seja realizada ainda este mês. Além da data similar ao ano passado, a possibilidade da competição não contar com as torcidas durante os jogos pode se repetir. Segundo o representante do futebol feminino da FNF, José Marques da Costa Neto, os jogos estão previstos para acontecer no Estádio Juvenal Lamartine, espaço que pertence atualmente à Federação, mas que é alvo na Justiça de uma tentativa de reintegração de posse por parte do Governo do Estado do RN. O JL, como é conhecido, apresenta uma estrutura precária e deteriorada, além de estar com as arquibancadas interditadas pelo Corpo de Bombeiros, o que impede a presença de torcida nas disputas. Quando questionado sobre o local dos jogos, o representante da Federação diz que o campo é adequado. “A grama é de primeira qualidade, é excelente. O problema lá são as arquibancadas que nós não temos como recuperar para receber torcida”. Segundo Costinha, a FNF já está em contato com o ABC Futebol Clube, time local, para transferência dos jogos ao CT de treinamento do Alvinegro, mas até o momento, a expectativa é de que permaneça no Juvenal. Este ano, as atletas do Cruzeiro de Macaíba também aguardavam um calendário de jogos para a Copa Nordeste. A promessa era de que a competição iria acontecer em fevereiro, mas o torneio foi transferido para abril e, em seguida adiado, novamente. Dessa vez, sem data definida. A expectativa é de que a organização da competição regional seja retomada após o encerramento do Campeonato Brasileiro Feminino. O Cruzeiro terminou o último estadual com retrospecto positivo. Dos oito jogos disputados, o clube perdeu somente um, para o União, que terminou em primeiro lugar no Campeonato. E é justamente pelo bom desempenho que o time urge por atenção. O celeste reinventa sua validade apesar do incentivo absorto. “Vir pra cá pro Cruzeiro é justamente isso... ter aquele 1% de chance. Se um dia der certo, é porque pelo menos

eu tentei”, diz Fernanda Gabrielle, de 17 anos, e jogadora do clube. “O que me motiva é gostar mesmo de futebol”, completa. Assim como ela, a maior parte das atletas também sonham com o futebol profissional. Esse sonho ganhou força com a exigência da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), que determinou o prazo de 2019 para que todas as equipes da série A do futebol masculino tenham também uma equipe feminina. O cruzeiro de Macaíba é uma prova de que se o termo Futebol Feminino já sustentou um paradoxo, hoje é sinônimo de resistência. E para Júlia Alves, o empenho é pela modalidade: “A gente está trabalhando pelo Cruzeiro? Tá! Mas a gente luta é pelo futebol feminino no estado”.

“A gente está trabalhando pelo Cruzeiro? Tá! Mas a gente luta é pelo futebol feminino no estado” Fernanda Gabrielle, de 17 anos, e jogadora do Cruzeiro.

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TUDO&mais

Os muros também contam histórias A expressão da arte da periferia nas paredes da capital

por Danielle Lima

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ugusto Furtado, 32 anos, é formado em Publicidade e trabalha com direção de arte e ilustração digital. Já o seu alter-ego, Arbus, é grafiteiro há 6 anos e possui mais de cem obras espalhadas por Natal e outras cidades do Nordeste. Buscando o sonho de ser artista, encontrou no grafite a fonte para expelir a sua criatividade. Ao observar os muros do bairro onde mora, o interesse pela arte urbana nasceu. Nesse espaço ele viu a oportunidade de se expandir profissionalmente e estabelecer um contato com a comunidade; “Acho mais empolgante desenhar coisas grandes, ir para o além da arte em tela. Pintar na rua faz com que a gente estabeleça um diálogo com a cidade, o grafite é comunicação”. Arbus conta que entre as suas referências estão os artistas Crânio e a dupla paulista Os Gêmeos. No início, a internet foi uma ferramenta importante para o aprendizado, além de ajudar a se enturmar com os veteranos já estabelecidos em Natal. Ele diz que os grafiteiros locais são bastante receptivos e não há preconceito com os novatos. “Eles são acolhedores como uma igreja, metaforicamente dizem ‘sejam bemvindos’ aos novos interessados” diz em tom de piada. Essa facilidade em se inserir no ambiente faz com que o movimento ganhe mais força e contribua com a cena artística da cidade. “Sempre presto atenção nos muros e rola uma surpresa quando vejo um desenho novo. A gente sente ‘esse cara passou por aqui’, daí eu vou lá e coloco um persona meu do lado e o mesmo sentimento que eu tive, ele terá também”. Ao contrário do que pensam, o grafite não tem como objetivo ornamentar a cidade e poucos artistas trabalham com esse fim: “É algo territorialista, você tá ali pra deixar a sua marca”. Os desenhos de Arbus são marcados por personagens geralmente amarelos, com o nariz laranja e olhos expressivos. É esse personagem que transita entre o mundo o real e o lúdico e dialoga conosco por meio dos muros.“Gosto de pintar em lugares degradados, abandonados, lugares onde geralmente andam usuários de drogas. Eles sempre fazem uma leitura específica, que transforma o ambiente e isso é muito interessante.” O grafite recebeu grande notoriedade nas últimas décadas, o que contribuiu para quebrar o estigma negativo que a arte possuia. Entretanto, hoje, a comunidade artística lida com outro tipo de problema: “Ninguém quer pagar por arte, não há valorização do nosso trabalho.” Durante os trabalhos na rua, já foi parado pela polícia, levou sermão e foi chamado de vagabundo. Casos em que a prefeitura dá calotes em artistas contratados para eventos também são recorrentes. “O que eu gostaria que a Prefeitura fizesse é apoiar os mutirões de grafite, dar incentivo financeiro maior para as artes ou um suporte de material e ceder alguns espaços públicos pra nós.” Além de espalhar a sua arte, Arbus também se destina de modo frequente a estabelecer um vínculo com a população,

por Danielle Lima

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fato comprovado diante inúmeras participações em eventos sociais, “Me esforço para conhecer a comunidade onde estou grafitando, quero me aproximar da galera. Tento criar algo que dialogue com o cotidiano local”. Nesse sentido, ele defende que a arte deve interagir com a sociedade, principalmente em regiões mais carentes, onde o acesso a esse tipo de informação tende a ser mais escasso. “Na periferia, a gente vira

por Danielle Lima

o professor. Juntam-se vários garotos diante nós, as pessoas oferecem até almoço, diferentemente de um bairro elitista por exemplo, onde geralmente chamam a polícia” Para aqueles que buscam se aventurar no mundo do grafite, Arbus dá a dica: “Crie algo autêntico, que tenha a ver com você e não ligue para o que as pessoas pensam”.

Imagens: Virgínia Froes.

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Natal - RN Quinta-feira, 14 de Junho de 2018

Som & representatividade anda potiguar inova o cenário cultural da cidade e mostra a força da mulher na música. Sob um clima muito descontraído com direito a rede, riso e improviso, a banda potiguar de pagode conversou sobre a sua trajetória, visibilidade feminina, cena local e seus planos futuros. A banda é composta oficialmente por sete mulheres: Paula Laurentino, 26 (vocal), Yasmin Pires, 21 (pandeiro), Mariana Praxedes, 26 (percussão), Priscilla Azevedo, 27 (percussão), Amanda Medeiros, 32 (percussão), Pipa Dantas, 27 (violão) e Lorena Azevedo, 30 (cavaquinho). “A ideia da banda começou com um tweet meu” conta a atual percussionista Mariana. A jovem brincou no Twitter dizendo que gostaria de ter uma banda de pagode composta apenas por mulheres e que se chamaria “Sapagode”. A partir disso, algumas meninas se interessaram pela ideia e após algumas semanas iniciaram os ensaios. Com a maioria das bandas de pagode sendo compostas por homens, a existência da SPGD representa uma resistência. Os desafios são constantes, assim como os preconceitos. E é nesse espaço tão difícil de entrar e se destacar que a SPGD faz questão de valorizar a mulher. Na hora de falar sobre a mulher no meio artístico, as opiniões das integrantes são semelhantes: as mulheres precisam e merecem ocupar o espaço que é delas por direito. Infelizmente, muitas ainda acreditam que são incapazes de realizarem os seus objetivos, o que é resultado de uma socialização machista que martela incessantemente durante toda a nossa vida.“Existe um patriarcado que nos força a acreditar que somos incapazes, que a gente nasce e cresce somente para ser bonita e pra mostrar os nossos atributos físicos, temos sempre que reafirmar a nossa capacidade.” comenta Yasmin. O que a SPGD busca é por meio da música, inspirar e incentivar as mulheres a se mostrarem para o mundo, sem ter medo de ser quem realmente são.É importante que elas se sintam representadas, principalmente no meio musical onde os homens ainda são a maioria esmagadora.Quando questionada sobre a cena musical da cidade, Paula afirma que é muito importante valorizar os artistas potiguares. “Temos muita coisa boa na música, no audiovisual, no teatro e nas artes. É importante que esses artistas tenham mais visibilidade.” Segundo ela, há uma certa síndrome de ‘vira-lata’ que consiste em valorizar apenas a cultura vinda de fora, enfraquecendo os produtores locais.“Temos ótimos artistas e é triste que muitos tenham que se deslocar para outros estados para conseguir mais visibilidade” completa Priscilla.A falta de apoio do governo e o insuficiente reconhecimento público, desestimula os artistas que por vezes optam por migrar para centros urbanos maiores com o objetivo de ganhar mais notoriedade com o que fazem. “Seria maravilhoso para todos os potiguares se passássemos a valorizar mais e cobrar de nossos governantes incentivos básicos à cultura. Permitir que a Ribeira, berço de grande parte das bandas natalenses, seja um local mais habitável, por exemplo, com segurança e estrutura adequada para eventos”. Agora elas querem ir mais além, já possuem três músicas autorais e pretendem continuar nesse ritmo de composição. As duas primeiras, “Samba de Mergulho” e “Sereia” contam histórias românticas, enquanto a mais nova música “Só Se Ela Quiser”, fala sobre respeitar a mulher e o seu espaço. A existência da SPGD na música simboliza resistência. Em um mundo dominado por homens, as integrantes deixam um recado para as mulheres que pensam em se aventurar nesse universo: “Acreditem no seu potencial e se joguem! Não existe nada que as mulheres não possam fazer. E procurem apoio nas suas amigas porque juntas somos mais fortes.”


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