Lynne graham noiva rebelde paixão 405

Page 1


– E quanto a nós? Para onde iremos? – perguntou Belle com veemência, cada vez mais furiosa. – Leva tempo para uma mudança. – Terão pelo menos um mês para encontrar outro lugar– explicou Cristo sem simpatia na voz, enquanto observava de modo disfarçado os mamilos rijos se sobressaírem sob a camiseta dela. – Não é um prazo longo. Bruno e Donetta voltarão da escola em breve para as férias de verão. Cinco crianças tomam muito espaço. São seus irmãos e irmãs também, portanto deveria se


importar com seu destino! – finalizou em tom de acusação. – E por isso estou aqui, para propor que se case comigo. Juntos daremos um lar para eles. – Casar? – repetiu Belle, imaginando se ouvira direito. – Do que está falando? – Disse que queria que seus irmãos desfrutassem do nome dos Ravelli e de seu estilo de vida. Só posso fazer que isso aconteça se me casar com você e os adotar. Confusa, ela franziu a testa e deu um passo atrás, chocada demais para responder. Por fim murmurou, quando recuperou a voz: – Isso é uma brincadeira? – Por que brincaria com algo tão


sério? Belle deu de ombros. – Como posso saber? Quando me conheceu pensou que estava falando com a mãe das crianças e sugeriu que eu as desse para adoção – lembrou. – Para mim pareceu uma brincadeira de mau gosto. – Bem, não estou brincando – garantiu ele, um raio de sol furando as nuvens e iluminando seu rosto severo. Belle voltou a analisá-lo porque tinha a beleza sombria de um anjo decaído. Os olhos negros eram maravilhosos, emoldurados pelos cílios espessos, e de repente ela tornou a ficar sem fôlego na sua presença.


Querida leitora,

O amor pode florescer nas ocasiões mais inusitadas, não é mesmo? Como no caso de Belle Brophy e Cristo Ravelli. Ela só queria proteger seus irmãos, ele, o nome da família – e para isso precisavam se casar. Belle detestava os Ravelli, principalmente o pai de Cristo. Ele gostaria de esquecer o dia em que ouviu o sobrenome Brophy. Mas, esse casamento de conveniência abriu caminho para uma união forte… e muito, muito quente!


Boa leitura! Equipe Editorial Harlequin Books



Capítulo 1

CRISTORAVELLI analisou

o advogado da família sem poder acreditar. – É alguma brincadeira de 1° de abril fora de época? – perguntou, franzindo as sobrancelhas. Robert Ludlow, sócio sênior da firma Ludlow & Ludlow, não achou graça. Cristo, importante banqueiro especializado em capital de investimentos e de risco, extremamente rico, não era homem de ser provocado


com brincadeiras. Aliás, Robert ainda não descobrira se ele tinha ou não senso de humor. Ao contrário do falecido pai, Gaetano Ravelli, Cristo levava a vida com muita seriedade. – Lamento, mas não é brincadeira – confirmou Robert. – Seu pai teve cinco filhos com uma mulher na Irlanda... Cristo estava estupefato. – Quer dizer, todos aqueles anos que saía em suas viagens para pescar nas propriedades irlandesas...? – Sim. Creio que o menino mais velho tem agora 15 anos... – Quinze? Mas isso quer dizer... – Cristo apertou a boca larga e sensual, os olhos escuros faiscando de raiva, antes de fazer um comentário pouco lisonjeiro


sobre tais crianças. Refletiu que, apesar de chocado, não estava muito surpreso com a revelação sobre o caráter conhecidamente mulherengo do pai. Afinal, durante sua vida irresponsável, Gaetano deixara uma trilha de desastres e ex-esposas furiosas, além de três filhos legítimos, portanto por que não deveria haver também um relacionamento irregular coroado com o nascimento de crianças? Cristo, é claro, não podia responder essa pergunta em termos pessoais, já que nunca se arriscaria a ter uma criança ilegítima. Seu pai, por sua vez, irresponsável como sempre fora, fizera isso não uma, mas cinco vezes. Em


particular quando jamais demonstrara o menor interesse nos filhos legítimos. Os irmãos adultos de Cristo, Nik e Zarif, também ficariam espantados e chocados, e se essa história escandalosa viesse a público haveria uma repercussão ainda maior. O fim do casamento de Nik ainda deixava Cristo insone. Quanto ao irmão caçula, Zarif, novo líder de um país no Oriente Médio, ele não merecia o enorme escândalo que o procedimento imoral de Gaetano detonaria na mídia. – Quinze anos – murmurou Cristo, refletindo que a mãe de Zarif sem dúvida fora traída durante todo o casamento com seu pai sem fazer a menor ideia disso. E era uma realidade


que Zarif não desejaria expor o fato ao público. – Desculpe pela minha reação, Robert. Essa notícia me chocou muito. – Fez uma pausa, pensativo, e perguntou: – A mãe das crianças... o que sabe a seu respeito? Robert arqueou as sobrancelhas grisalhas. – Contatei Daniel Petrie, o agente imobiliário da propriedade na Irlanda, e o interroguei. Ele é morador da região e disse que no vilarejo, a mulher, Mary Brophy, há muito é considerada um tipo de vergonha e desgraça para o lugar. Não era segredo para a família Ravelli que Gaetano sempre dera preferência para mulheres de vida


duvidosa em vez das decentes quando se tratava de aventuras. – Que segurança meu pai deu para essas crianças? – perguntou Cristo. – Foi por isso que, por fim, decidi trazer o assunto ao seu conhecimento. – Robert limpou a garganta. – Gaetano não fez menção sobre a mulher ou as crianças no testamento. – Está me dizendo que meu pai não providenciou um futuro para esses dependentes? – Cristo quis saber, sem conseguir acreditar. – Teve cinco filhos com essa... essa mulher no período de muitos anos e mesmo assim não providenciou uma renda para eles? – Nem um centavo para nenhum... jamais – confirmou Robert


constrangido. – Pensei que tivesse tomado alguma providência em particular, mas parece que não. Como você sabe, seu pai sempre pensou no presente, e não no futuro, e creio que imaginou viver até os 80 anos. – Entretanto, morreu aos 62, mais tolo do que nunca, e atirou essa bagunça no meu colo – resmungou Cristo, perdendo a paciência, à medida que descobria mais detalhes sobre a história. – Precisarei estudar esse assunto pessoalmente. Não quero que os jornais ponham as mãos nisso... – Claro que não – concordou Robert com um gesto de cabeça. – Os jornais adoram publicar matérias sobre homens


com muitas esposas e amantes. Ciente desse fato, Cristo rangeu os dentes. Seu pai já fora um grande constrangimento quando vivo. E parecia que se tornara ainda mais inconveniente depois de morto. – Espero que as crianças sejam encaminhadas para adoção e que esse assunto desagradável termine de modo discreto – confidenciou Cristo com voz suave, mas firme. Robert pareceu ficar um pouco sem graça diante dessa ideia, porém logo se recompôs, dizendo: – Acha que a mãe concordará com isso? – Se é o tipo de mulher que agradava ao meu pai, ficará contente por


receber... uma compensação adequada. – Cristo selecionou as palavras de maneira propositalmente fria. Robert compreendeu, entretanto não conseguiu visualizar uma mãe desejosa de dar os cinco filhos para adoção. Mas a criação de Cristo o deixara desacreditado. Tendo cuidado das finanças de Gaetano durante anos, Robert sabia que Cristo vinha de um lar desestruturado e desconhecia a profundidade do amor e da lealdade que muitos pais desfrutavam com suas proles. Cristo, por sua vez, cansado após a viagem de negócios que fizera na Suíça, endireitou os ombros largos e pegou o


celular para pedir a sua assistente particular, Emily, que o colocasse em um voo para Dublin. Queria resolver esse assunto desagradável para poder voltar ao trabalho.

– EU OS odeio! – desabafou Belle, o rosto adorável cheio de raiva e agressividade. – Odeio todos os Ravelli vivos! – Então precisa odiar também seus próprios irmãos e irmãs – lembrou a avó. – E sei que não é assim que se sente... Com dificuldade, Belle dominou o temperamento esquentado e fitou a avó com ar de desculpas. Isa era uma mulher


pequena e frágil com cabelos prateados e olhos verdes no mesmo tom dos de Belle. – Aquele maldito advogado nem mesmo respondeu a carta de mamãe sobre o pagamento escolar. Detesto todos eles por nos fazer implorar por algo que devia ser um direito para as crianças! – É desagradável – concordou Isa Kelly –, mas precisamos nos lembrar de que a pessoa responsável por toda essa horrível situação é Gaetano Ravelli... – Jamais esquecerei isso! – jurou a neta com veemência, erguendo-se depressa, frustrada, para começar a caminhar de um lado para o outro e


depois ir até a janela com vista para o minúsculo jardim dos fundos. E essa era, sem dúvida, a verdade. Belle fora provocada sem piedade na escola por causa do relacionamento de sua mãe com Gaetano Ravelli e os filhos que tivera com ele. Mary, sua mãe, fora taxada de prostituta e, quando adolescente, Belle tivera que suportar essa humilhação. – Ele se foi agora – lembrou Isa sem necessidade. – E o mais triste... sua mãe também. A dor voltou a dominar Belle pela perda da mãe que morrera há um mês de infarto; ainda não superara o choque. Mary fora uma mulher sorridente e bemhumorada de pouco mais de 40 anos e


que jamais adoecera. Porém, seu coração era fraco e o médico a alertara para não se arriscar com outra gravidez após o parto complicado dos gêmeos. Contudo, Mary Brophy nunca dera ouvidos ao bom senso. Escolhera a paixão em vez do juízo, e o nascimento da sexta criança, além de Belle, fora demais para sua saúde. Independentemente do que falassem dela, Mary era uma mulher trabalhadora, bondosa, que jamais tinha uma palavra má sobre ninguém e era sempre a primeira a estender a mão para um vizinho com problemas. Com o passar dos anos, até os mais críticos haviam se tornado seus amigos,


quando, por fim, descobriam sua natureza boa. Porém, Belle nunca fora como sua mãe. Ela amava Mary, mas odiava Gaetano Ravelli pelas suas mentiras, manipulações e egoísmo. Como se sentisse a tensão no ar, Tag se lamuriou aos seus pés e Belle acariciou o cão da família, um terrier pequeno, preto e branco, cujos enormes olhos amorosos estavam grudados nela. Belle afastou do rosto uma mecha de cabelos avermelhados, pensando sobre quando encontraria tempo para cortá-los e como pagaria por isso, já que seu dinheiro era gasto com coisas mais necessárias. Pelo menos a casa perto de Mayhill House era deles, dada por Gaetano anos


atrás a fim de enganar sua mãe com um falso senso de segurança. Mas de que adiantava um teto sobre suas cabeças se Belle ainda não conseguia pagar as dívidas? Porém, ficar sem teto seria bem pior. E se tudo desse errado poderia vender a casa e encontrar um lugar mais barato e pequeno para viverem. Teria que lutar muito para conseguir que as crianças recebessem o que lhes era de direito. Ilegítimos ou não, seus irmãos tinham direito legal a uma parte da fortuna do pai, e era dever dela, Belle, batalhar por isso. – Precisa me deixar tomar conta das crianças agora – disse Isa com firmeza para a neta mais velha. – Mary era


minha filha e cometeu erros. Não quero ficar parada vendo-a pagar por isso... – As crianças vão lhe dar muito trabalho – protestou Belle, pois a avó podia gozar de boa saúde, mas tinha 70 anos, e Belle não queria que assumisse tamanha carga. – Você cursou a universidade há milhares de quilômetros daqui para escapar da situação criada por sua mãe e pretendia ir para Londres assim que se formasse – lembrou a avó com teimosia. – A vida é assim... muda sem aviso – respondeu Belle com frieza. – As crianças perderam pai e mãe no espaço de dois meses e estão muito inseguras. A última coisa de que precisam agora é me ver desaparecer também.


– Bruno e Donetta estão no colégio interno e só vêm para cá na época das férias – replicou a senhora. – Os gêmeos estão no primário, apenas Franco fica em casa. É quase um bebê, mas o tempo passa depressa e em breve irá para o colégio também... Logo após a morte da mãe, Belle relutara em admitir que se via presa em uma armadilha por causa dos irmãos mais novos e carentes. A avó Isa fizera sua oferta generosa, porém achava muito egoísta de sua parte permitir que a senhora arcasse com a responsabilidade de cuidar de crianças. Até para Belle era difícil, e ela tinha apenas 23 anos. Alguém bateu com força na porta dos


fundos, assustando as duas. Franzindo a testa, Belle foi abri-la e relaxou ao ver um velho amigo na soleira. Era Mark Petrie, e os dois haviam frequentado a escola juntos. – Entre – ela disse para o rapaz magro de cabelos negros e jeans. – Sente-se. Quer café? – Obrigado. – Como vai, Mark? – Isa quis saber com um sorriso acolhedor. – Muito bem. Estou preocupado é com Belle – admitiu, lançando um olhar apreciativo para a amiga. – Vou falar de uma vez. Ouvi meu pai ao telefone esta manhã e devia estar falando com alguém da família Ravelli. Creio que era o filho mais velho, Cristo...


Ficando tensa diante do nome conhecido, Belle ofereceu uma caneca com café para Mark. – E daí? – Cristo é o testamenteiro dos bens de Gaetano e fez perguntas ao meu pai sobre sua mãe. É claro que meu pai nem sabia sobre a morte de Mary. Vocês todos levam uma vida tão discreta e reclusa... Ninguém lhe contou enquanto esteve com minha mãe na Austrália... – Bem, seu pai e minha mãe não eram grandes amigos – lembrou Belle sem hesitação. Houvera muitas rixas durante anos entre o corretor Daniel Petrie e a governanta de Mayhill, Mary Brophy. – Então, por que informaria sobre o


falecimento dela? Enquanto isso, pensava sem parar em Cristo Ravelli. O filho mais velho de Gaetano, engravatado, muito bonito e banqueiro, que jamais sorria. Durante os anos ela procurara saber sobre a tumultuada vida amorosa de Gaetano na internet, primeiro por mera curiosidade, mas depois para esclarecer dúvidas que sua pobre e confiante mãezinha nunca ousara questionar. Belle sabia sobre as esposas, os filhos e os casos escandalosos, logo percebendo que Gaetano era um sedutor sem caráter e destrutivo que só deixava mágoas e sofrimento por onde passava. Além disso, como só se casava com mulheres ricas, sua pobre mãe confusa jamais


tivera chance de levá-lo ao altar. – A questão é que a família Ravelli decidiu que os filhos de Gaetano e Mary sejam adotados... – Adotados? – interrompeu Belle atônita com o inesperado da notícia. – É óbvio que Cristo deseja abafar o caso – opinou Mark, fazendo uma careta. – E o que seria melhor para isso? As adoções manteriam a história fora dos jornais e colocariam uma pedra sobre os detalhes... – Meus irmãos não são detalhes... são crianças com família e um lar! – argumentou Belle. – Céus! Devem permanecer juntos! Constrangido com a emotividade de


Belle, Mark limpou garganta. – Você é a guardiã legal das crianças? – perguntou. – Bem, quem mais poderia ser? – redarguiu Belle. – Mas isso não está firmado em um documento, está? – perguntou ele, vendo Belle emudecer em seguida. – Foi isso que pensei. Deve procurar um advogado e perguntar a respeito da situação o mais depressa possível, para requerer a guarda das crianças. Do contrário poderá descobrir que a família Ravelli tem mais poder sobre elas do que você. – Isso é ridículo! – objetou Belle. – Gaetano nada tinha a ver com meus irmãos mesmo quando estava vivo. – A lei não pensa assim. Ele pagou a


escola dos mais velhos e deu a casa para sua mãe – lembrou Mark como bom estudante de direito que era. – Pode ter sido um péssimo pai, porém cuidou de algumas de suas necessidades, e agora que está morto seus filhos legítimos têm o poder sobre as crianças. – Mas Gaetano deixou os cinco fora de seu testamento – retrucou Belle. – Não importa. Lei é lei. Eram filhos dele. – Adoção... – Belle se deixou cair sobre uma poltrona. – Que ideia absurda. Não fariam isso se minha mãe ainda estivesse viva! – exclamou com amargura. – Quem sabe eu, como sua avó, possa


argumentar? – perguntou Isa. – Duvido – disse Mark. – Até que se mudasse para cá, após a morte de Mary, as crianças não tinham contato com a senhora. – Posso fingir ser a mãe... – murmurou Belle de modo abrupto. – Fingir? – Isa fitou a neta sem poder acreditar. – Não seja tola, Belle! – Por que tola? Cristo Ravelli não conheceu mamãe nem sabe que ela morreu. E se pensar que ela ainda vive provavelmente não tentará interferir na vida das crianças. – Você não pode se passar por uma mulher de 40 anos! – protestou Mark, deixando escapar uma risada. Belle pensava depressa.


– Não preciso aparentar ter 40 anos... apenas ser madura o suficiente para ter um filho de 15 anos. Posso muito bem fingir que estou com trinta e tantos anos – raciocinou ela. – Seria loucura tentar uma encenação dessas – disse a avó. – Cristo Ravelli descobriria a verdade. – Como? Quem lhe contaria? Ele é um Ravelli... não começará a andar por aqui de esquina em esquina fazendo perguntas. Não teria motivos para questionar minha identidade, e tenho certeza de que virá diretamente bater à nossa porta. Vou pentear os cabelos em um coque, usar maquiagem pesada... – Belle, pense bem no que está


dizendo – argumentou Mark. A porta da cozinha se abriu e um garotinho que começava a andar e sugava o polegar entrou balançando os cachos negros. Equilibrou-se junto à perna de Belle e, depois, sem cerimônia, se aboletou de maneira desajeitada no colo da irmã. – Com sono – murmurou para ela. – Abraça... Belle embalou com carinho seu meioirmão mais moço. Franco era muito carinhoso e se aninhou junto à irmã. – Vou levá-lo para tirar sua soneca – sussurrou ela, levantando-se com certa dificuldade porque o menino era pesado. Belle depositou Franco no berço junto a sua cama e por um instante ficou


olhando pela janela dos fundos que fornecia uma visão pitoresca de Mayhill House, uma linda mansão em estilo Georgiano cercada por um parque e bosques de carvalhos. Sua mãe fora viúva e Belle tinha apenas 8 anos quando Mary começara a trabalhar como governanta para Gaetano Ravelli. O pai de Belle fora um bêbedo violento, conhecido por sua “boca suja” e propenso a brigas. Certa noite fora atropelado por um carro quando perambulava pelas ruas muito embriagado, e pouca gente lamentou sua morte, principalmente Belle, que morria de medo do temperamento brutal e cruel do pai.


Mãe e filha pensavam iniciar uma vida melhor quando Mary assumiu o cargo de governanta em Mayhill. Entretanto, Mary se apaixonara perdidamente pelo patrão e sua reputação fora destruída assim que o primeiro meio-irmão de Belle, Bruno, nascera. Pessoas como Cristo Ravelli, Belle refletiu com amargura, não faziam a menor ideia de como era a vida dos menos favorecidos. Cristo era um homem bonito, brilhante e de muito sucesso. Crescera em uma redoma dourada e era filho de Gaetano Ravelli com uma princesa italiana muito rica e famosa anfitriã da alta sociedade.


Seu atual padrasto era um banqueiro húngaro, seu lar, um palácio veneziano e ele frequentara uma escola exclusiva de onde saíra cercado por honras acadêmicas e esportivas. Não era surpresa o fato de Cristo ter se tornado um sucesso em tudo. Afinal, não sabia o que era ser humilhado, ignorado e desdenhado, e Belle tinha certeza de que jamais precisara se desculpar pela sua linhagem. Por outro lado, Bruno tinha apenas 13 anos quando Gaetano o acusara pela primeira vez de ser gay, pois era assim que interpretava o fato de o menino ter tendências artísticas e desejar estudar arte.


Bruno ficara arrasado com a rudeza do pai, que tanto desejava impressionar. Sua infelicidade aumentou na escola, onde os colegas zombavam dele, e então ele tentara se suicidar. Belle ainda estremecia ao se lembrar disso. Bruno precisava da família para lhe dar apoio. Como seus outros irmãos, ele necessitava de amor e compreensão para se tornar um adulto bem ajustado. E Belle faria de tudo para garantir isso. Mark já estava para ir embora quando Belle desceu. – Vou preparar o jantar – avisou a avó. – Não estava falando sério sobre fingir ser Mary, estava? – perguntou ele.


Belle endireitou os ombros delicados. – Se for necessário para manter a família unida, farei isso sem pestanejar!

ERA QUASEnoite quando Cristo enveredou com o carro pela entrada de Mayhill. Jamais visitara Gaetano em sua propriedade da Irlanda porque o pai nunca convidara nenhum parente para ir até lá. Na verdade, nunca convidara para que o visitassem em nenhum lugar. O homem não se importara em manter os relacionamentos e, assim que se entediava, procurava novas pastagens, se esquecendo dos conhecimentos


passados. Uma mulher com um cãozinho correndo a sua volta caminhava pelo gramado da entrada. Cristo franziu a testa; não gostava de intrusos. Porém, logo observou a massa pesada de cabelos que emolduravam o rosto em formato de coração, notando o top que moldava seus seios e o short de brim que exibia as pernas longas e bem torneadas. Ficou sem fôlego e muito excitado. Cerrou os dentes, tentando lembrar quando fora a última vez que estivera com uma mulher. Na verdade, Cristo preferia o trabalho ao sexo, pois os desafios lhe davam energia, ao passo que, para ele, dormir com uma mulher era apenas um


exercício contra a tensão. Destrancou a porta da frente de madeira maciça e penetrou em um saguão com piso preto e branco de mármore. Sua equipe de segurança era composta por Rafe e John, que passaram na sua frente. – Vamos checar a casa – anunciaram. Uma grossa camada de poeira cobria os móveis ali, e Cristo se surpreendeu quando Rafe anunciou que não havia ninguém na casa. Mas, afinal, o que esperara? Que Mary Brophy e sua prole estivessem ocupando a propriedade? No íntimo, porém, fora isso exatamente que esperara e tratara de usar suas chaves para provar seu direito


de entrar ali. Percorreu os cômodos solitários, acabando na cozinha com seu freezer vazio, e se virando para ver um aparelho de telefone preso à parede. Uma das etiquetas sob os botões dizia: “Governanta”. Ele apertou o botão correspondente com força exagerada. – Sim? – respondeu uma voz feminina quando ele já desistia, após vários segundos de espera. – Aqui é Cristo Ravelli. Estou na casa e nada foi preparado para minha chegada? – perguntou em tom imperioso. Do outro lado da linha Belle ficou tensa. Seus olhos verdes brilharam de raiva enquanto respondia: – Será por que o salário da governanta foi interrompido no mesmo


dia que o sr. Ravelli sofreu um desastre de helicóptero? Cristo não estava acostumado com réplicas irônicas e cerrou a boca. – Não dei tal ordem – murmurou. – Bem, agora não importa, certo? Mas ninguém trabalha de graça – disse Belle com secura. Cristo engoliu um impropério. Estava cansado e faminto e a última coisa que desejava era uma batalha verbal. A imagem de seus irmãos em um orfanato à espera de adoção fez Belle sentir um tremor percorrer seu corpo, provocando náuseas. – Venha até a casa e faça seu trabalho – disse ele. – Garanto que será bem


paga por isso. Preciso de comida e uma cama... – Tenho certeza de que passou por muitas lojas ao vir para cá – interrompeu ela. – Poderia ter comprado seu jantar. – Pagarei com satisfação pelos seus serviços – insistiu Cristo, se arrependendo por se humilhar para uma governanta insolente. Porém, logo se esqueceu disso, pois a mulher seria uma boa fonte de informação local. Desligando o telefone com conexão direta, Belle ficou ainda mais nervosa. Era agora ou nunca. Ou fingia ser a mãe ou ia até Mayhill e dizia a Cristo Ravelli que a ex-governanta e ex-amante de seu pai morrera. Entretanto, ao


pensar na influência que exerceria se dissesse ser a mãe das crianças, sua decisão foi tomada, e subiu as escadas correndo, imaginando como aparentar mais idade. Primeiro retirou o short e o top. Remexendo no guarda-roupa de Mary, achou uma saia justa e uma camiseta de mangas compridas. Sua mãe jamais usara sapatos sem saltos ou jeans. Tratando de recordar os hábitos de Mary como se isso fosse trazer boa sorte, Belle pegou um par de sapatos de saltos altos e começou a se vestir bem depressa. Depois foi até o banheiro, ergueu os cabelos e fitou com desagrado a tez de porcelana que a fazia parecer


mais jovem do que era. Sem dúvida, se fizesse um coque e usasse maquiagem pesada, pareceria mais velha. Então começou a se maquiar. Passou sombra escura nas pálpebras e usou várias camadas de rímel. Bem, sem dúvida já parecia diferente, constatou no espelho, então aplicou blush e passou um batom forte. – Ia chamá-la para jantar... – Isa Kelly ficou imóvel ao ver a neta descer a escada. – Aonde pretende ir assim? Belle enrijeceu. – Por quê? Estou esquisita? – Bem, parece um espantalho – comentou Isa com desaprovação na voz. Fez-se um silêncio constrangedor, mas logo o som de vozes infantis encheu


o ar quando um menino e uma menina morenos de 8 anos entraram discutindo com vontade. – Se não pararem de brigar, irão para a cama mais cedo – ameaçou Belle para os gêmeos, Pietro e Lucia. Os dois fecharam a boca e subiram a escada em silêncio e de cabeça baixa. – Agora me diga por que está usando uma saia de sua mãe – disse Isa. – Cristo Ravelli telefonou... precisando da governanta – explicou Belle depressa. – Devo aparentar ter pelo menos mais dez anos. – Não pode pensar em fingir ser Mary... é loucura, jamais o enganará. – Preciso tentar, para fazer Cristo


ouvir o que tenho a dizer. – Belle ergueu o queixo. – Obviamente não sabe nada sobre mamãe... duvido até que saiba que ela era a governanta de seu pai. – E eu duvido que seja tão ignorante – retrucou Isa. – Pode ser uma estratégia esperta, mas não quero que você vá para lá cozinhar, fazer compras e arrumar a cama dele, principalmente vestida assim! – O que há de errado com minha roupa? – Se ele acreditar que é Mary, poderá fazer a ideia errada de você. Afinal, muitos a consideravam leviana. – Pelo que ouvi dizer, Cristo não é mulherengo como o pai. Isa cerrou os lábios para depois


dizer: – Gaetano era o pai das crianças. Pode não ter sido um bom pai, mas você não deve ser desrespeitosa. Ciente de que a avó tinha razão, Belle ficou vermelha. – Pode me emprestar seu carro, vovó? – Sim, é claro. Mas pense no que está para fazer, Belle. No instante em que decidir enganar esse homem, não poderá voltar atrás, e ele terá todo o direito de se zangar quando descobrir a verdade... coisa que acontecerá de qualquer maneira. – Cristo é um Ravelli, vovó, esperto, enganador e inescrupuloso. Preciso de uma vantagem para começar a lidar com


ele, e s贸 posso fazer isso se fingir ser a mam茫e.


Capítulo 2

BELLE

DIRIGIUo carro até o mercado

no vilarejo para comprar produtos de primeira necessidade para a cozinha de Mayhill. Cristo Ravelli esperava que ela cozinhasse, mas ela só poderia fazer pratos no aparelho de micro-ondas e usar o abridor de latas. Refletiu e se decidiu por uma omelete, salada e pão de alho. Por certo até ela poderia preparar uma refeição dessas, não?


Sempre observara a mãe e a avó preparando omeletes. Bruno era também muito prestativo na cozinha. Todos sempre comiam bem quando ele estava em casa nos fins de semana. Com os nervos à flor da pele, ela dirigiu até a parte de trás da mansão, notando que as luzes estavam apagadas. A porta dos fundos continuava trancada e com um resmungo ela levou as sacolas de compras para a frente, subiu os degraus e apertou a campainha. Cristo estava ao telefone quando a campainha soou através do saguão. Franzindo a testa, ele foi atender, dando um passo atrás de surpresa quando uma ruiva delgada com saltos muito altos passou por ele como um


furacão. A governanta? Não era assim que imaginava uma governanta, refletiu, logo terminando sua ligação e analisando um dos corpos mais bem feitos que já vira e, provavelmente, as mais belas pernas, que o fizeram se lembrar da garota no gramando. Ergueu o rosto para os olhos ansiosos e a maquiagem pesada. Ela não fazia seu tipo: óbvia demais, espalhafatosa demais, cabelos ruivos demais. Sentia-se mais atraído por louras miúdas e distantes, com olhos azuis. Tratou de apagar essa imagem proibida do cérebro e se concentrou nos belos seios da ruiva. Eram uma obra de arte, assim como suas pernas.


Infelizmente Belle estava acostumada com o efeito que seus seios provocavam nos homens e analisou Cristo com toda a calma. Ele era lindo. Tinha cabelos escuros e fartos, estrutura óssea esplêndida e olhos negros como carvão que pareciam maiores por causa dos cílios longos. Um começo de barba surgia no queixo moreno, aumentando seu ar viril. O coração de Belle acelerou. Eram os nervos, disse a si mesma. Mas também não ajudava o fato de Cristo ser extremamente alto a ponto de fazê-la se sentir baixa apesar de ter mais de 1,70m e ficar muito mais alta com os saltos da mãe.


Os ombros dele eram acentuados pelo caro paletó de executivo e a calça cobria pernas musculosas e longas. – Vou levar isto para a cozinha e começar a preparar a comida – anunciou ela. – Você é a governanta de meu pai? – perguntou ele, já que Belle não era o tipo que esperara. Belle colocou as sacolas no chão e ergueu a cabeça. – Sou Mary Brophy – disse. – E era a... amante de meu pai? – prosseguiu ele sem poder acreditar. A náusea quase a dominou, porém essa era a verdadeira situação de sua mãe. Amante.


– Sim – respondeu, corando até a raiz dos cabelos. Segundos atrás Cristo a despira mentalmente, mas tal ideia agora o revoltava. Essa era a mulher que ocupara a cama do seu pai por pelo menos 15 anos, conquistando o título de relacionamento mais longo na vida tumultuada e entediada de Gaetano. Contudo, Cristo não se surpreendia, pois ela era linda. Mesmo depois de ter dado à luz cinco crianças ainda mantinha uma cinturinha de vespa e por baixo da maquiagem pesada sua pele lembrava porcelana. Sua aparência era jovem demais e não correspondia à mulher que esperara encontrar.


– Omelete e salada estão bem para o senhor? – perguntou ela, interrompendo o fio de seus pensamentos. Cinco! Cristo ainda não conseguia acreditar que ela era mãe de cinco filhos. – Devia ser muito jovem quando conheceu meu pai – comentou, já na porta da cozinha. Belle enrijeceu enquanto colocava os produtos na geladeira. – Nem tanto – murmurou com vontade de mandá-lo tomar conta da sua vida, mas com medo de ofendê-lo. Afinal, precisava da ajuda desse homem para assegurar um futuro decente para os irmãos.


Porém, que chances tinha? Cristo poderia desprezar e se ressentir com as crianças ilegítimas de Gaetano. Na melhor das hipóteses, poderia ser indiferente a elas. Adoção?! Pelo amor de Deus! Quantas pessoas no mundo ousariam sugerir tal opção? – Pensei que morasse aqui – disse Cristo, sem parar de olhar para as pernas dela. – Só morei aqui enquanto Gaetano vivia – respondeu Belle sem jeito. – E agora? – insistiu Cristo, pois, até onde sabia, o pai só viajava para a Irlanda três ou quatro vezes por ano e jamais ficara ali por mais do que duas semanas.


– Vivo no chalé além dos portões – explicou Belle com má vontade, arrumando alface e ovos sobre o balcão de granito. Cristo não gostou da notícia porque ela e seus filhos teriam que sair do chalé antes que colocasse Mayhill à venda. É claro que pagaria pela inconveniência de procurar outra moradia. Os cabelos dela brilhavam como fogo líquido sob as luzes, em uma grande variedade de tons de ouro, castanho e cobre, enquanto pequenos cachos adornavam o pescoço longo e elegante. Seus cabelos eram muito ondulados, e Cristo se lembrou de uma boneca de trapos que vira um dia, o que o irritou


por se desviar tanto do assunto importante. Mas continuou a analisar a linha suave e firme do queixo e sua boca polpuda. Não conseguia acreditar. Devia ter muito mais idade do que aparentava para ser mãe de um adolescente, porém talvez ele estivesse sendo ingênuo. Era muito possível que Mary Brophy parecesse tão jovem porque seu pai pagara uma cirurgia plástica para ela. Belle desembrulhou o pão de alho e o colocou em uma assadeira. Gostaria que Cristo saísse da cozinha. Ali parado, tão alto, ele a deixava nervosa e desajeitada. Precisou procurar em vários armários para encontrar os


utensílios que queria, porque raramente vinha a Mayhill desde a infância. Na verdade, sempre evitara ir quando Gaetano estava ali. Lembrou que ela e os irmãos ficavam afastados de Mayhill mesmo antes da chegada de Gaetano, deixando a mãe livre para os preparativos. Mary sempre colocara Gaetano Ravelli em primeiro lugar. Belle recordou o entusiasmo da mãe quando Gaetano estava para chegar, os preparativos frenéticos, a hora marcada no cabeleireiro e as compras a fim de garantir que estaria em sua melhor forma para o amante. Naquela época Belle decidira que preferiria morrer a agradar tanto um homem. Por certo a lealdada e


cega devoção de Mary não haviam compensado. Retornando ao momento presente, Belle preparou a salada depressa, mexendo tudo em uma tigela grande, e fez o molho favorito da mãe da melhor maneira possível, pois não se lembrava das doses certas dos ingredientes. A seguir se concentrou na omelete. Cristo desaparecera e ela suspirou de alívio enquanto se dirigia à sala de jantar espaçosa para pôr a mesa. Ele acreditara que ela era Mary Brophy sem protestar. E por que não acreditaria? O pai de Mark, Daniel Petrie, corretor de terrenos, eventualmente poderia ouvir os mexericos locais e saberia que a mulher


que tanto desprezara estava morta e enterrada. Porém, era improvável que Daniel se desse ao trabalho de comunicar isso para Cristo Ravelli, pois não só se sentiria tolo por não ter sabido antes como também deveria supor que ele já estivesse ciente desse fato. Tratando de se acalmar com tais reflexões, Belle voltou a se concentrar no jantar.

CRISTO ANALISOUa refeição com um apetite que logo se dissipou. Mexeu na omelete com o garfo. Parecia de borracha. A salada estava afogada em azeite. Até o pão de alho estava


queimado, apesar dos evidentes esforços da mulher para tirar a crosta escura. Engoliu em seco e afastou o prato. Ela não sabia cozinhar, mas provavelmente jantava fora com seu pai sempre. O desprezo o dominou, fazendoo se levantar de repente. Não queria estar na Irlanda. Não queria lidar com essa mulher vulgar e com as consequências de seu sórdido e longo relacionamento com seu pai. Entretanto, não tinha escolha. Mary Brophy e seus filhos constituíam um problema que não conseguiria ignorar. Além disso, mais ninguém poderia lidar com esse assunto. Belle mexia em um armário, quando ouviu um barulho e se virou de supetão para dar de frente com um rapaz alto e


forte que mais parecia um muro sólido de tijolos. – Quem é você ? – perguntou ela nervosa. – Rafe é um de meus guarda-costas – explicou Cristo, surgindo atrás dele. – Rafe e John ficarão aqui comigo. – John e eu precisamos de um lugar para dormir, mas podemos nos arranjar sozinhos – disse Rafe, examinando as prateleiras de roupa de cama que Belle remexia e de onde retirara os lençóis para o quarto principal. Consciente do olhar importuno de Cristo, ela se dirigiu muito rígida para o corredor. Raio de homem! Por que a fitava assim? Será que brotara mais uma cabeça em seu


pescoço? E por que não lhe contara que viera com mais dois homens? Não comprara provisões suficientes, e isso a fez lembrar que precisava apresentar as notas fiscais para que ele a ressarcisse. Colocando a roupa sobre a cama, enfiou a mão no bolso para pegar os papéis, que entregou a Cristo. – O que me deve – explicou. Cristo retirou a carteira do bolso do paletó de modo distraído e apresentou o dinheiro, sempre franzindo a testa diante da mobília dourada, dos espelhos e da cama enorme com acolchoado vermelho. – Este era o quarto de meu pai? – Sim. – Vou dormir em outro lugar. Esse estilo de bordel da época vitoriana não


me agrada – informou secamente. Belle concordava que a decoração era pesada, cheia de detalhes e horrorosa, mas nada disse. Retirou a pilha da cama e rumou até um dos poucos quartos de hóspedes com banheiro. Mayhill precisava muito de uma reforma. – Não quis ofendê-la quando critiquei a decoração – explicou Cristo, pensando que era muito cedo para arrumar uma briga com ela. Prometeu a si mesmo não fazer comentários irônicos sobre o relacionamento de Mary com seu pai, mesmo porque cada vez ficava mais evidente que ela não lucrara muito por


ser sua amante. Gaetano fora famoso por sua sovinice. De cada um dos três divórcios que enfrentara, ele saíra lucrando. Portanto, não era surpresa para Cristo que sua amante secreta ainda trabalhasse como governanta e usasse roupas velhas e baratas. Por isso mesmo Cristo achava estranho que Gaetano tivesse pagado uma cirurgia plástica para deixar a amante mais jovem. Provavelmente Mary não fizera cirurgia e era uma das raras mulheres que pareciam muito mais moça do que na verdade eram. – Não me ofendi. Não participei da escolha da mobília aqui. Dez anos atrás Gaetano contratou um decorador de interiores – explicou Belle, recordando


como sua mãe ficara magoada por ele não lhe ter confiado tal incumbência. Porém, era preciso reconhecer, bom gosto nunca fora uma das qualidades de Mary. O chalé era todo em tons de corde-rosa, sua cor preferida. Estofados, cortinas, colchas... um pesadelo! Cristo observou Belle colocar as fronhas nos travesseiros, seu corpo delgado se contorcendo para todos os lados, fazendo os quadris menearem e os seios se sobressaírem. Ele cerrou a boca sensual, subindo o olhar para o rosto delicado, o nariz pequeno e a boca polpuda. E seu próprio corpo reagia a cada gesto dela, cheio de interesse sexual, até


que deu as costas para não julgar a examante do pai um objeto de desejo. Contudo, não passava de um homem sujeito a esse tipo de tentação. Belle lançou um olhar de esguelha para Cristo. Seus ares de comando e de superioridade a faziam se lembrar de Gaetano, que nunca lhe dava muita atenção nas raras ocasiões em que a via. De repente se arrependeu de estar fingindo ser a governanta, pois isso a fazia se sentir inferior. Tendo terminado de fazer a cama, rumou para o banheiro, levando as toalhas. Não conseguia parar de pensar em Cristo Ravelli com seus olhos penetrantes e a sensualidade à flor da


pele. Não havia como negar: ele a atraía de uma maneira irracional. Será que no íntimo era tão tola como a mãe fora com Gaetano? – Gostaria de poder trocar umas palavras com você amanhã pela manhã aqui – murmurou ele, quando Belle ressurgiu do banheiro. – Digamos, às dez horas? Belle aquiesceu com um gesto de cabeça. – Quando deseja conhecer as crianças? – perguntou. Cristo enrijeceu. – Não desejo... conhecê-las – disse sem acrescentar desculpas.


Belle empalideceu, sem saber como decifrar esse comentário. Sua falta de interesse seria uma boa ou má notícia? Seria infundado o boato sobre adoção? O que ele pensava sobre os laços de família? A maioria das pessoas concordaria em conhecer as crianças mesmo que não tivesse muito interesse nisso, porém Cristo Ravelli desdenhara essa cortesia. De repente Belle sentiu um forte antagonismo. Será que Cristo se recuava a aceitar as crianças como parte da família Ravelli? Obviamente. Sem dúvida os filhos de Mary Brophy não eram bons o suficiente, assim como a própria Mary


nunca estivera à altura de se casar com Gaetano. Belle sentiu a bílis na boca enquanto corria para baixo a fim de limpar a cozinha e ir embora. Depois do desprezo de Cristo pela comida que preparara esperava que ele não pensasse que viria preparar seu café da manhã. Ora! Uma omelete queimada era o que ele merecera! Gaetano chegara a confidenciar para Mary que não era feliz no casamento, e as esperanças dela em se tornar sua esposa haviam aumentado, porém, na ocasião, Gaetano não pedira o divórcio para sua esposa árabe, nem mesmo a separação. Durante anos a mídia publicara varias histórias sobre seus casos


extraconjugais. A mãe de Belle se recusava a acreditar nelas, mesmo depois que a filha lhe mostrara fotos reveladoras na internet. Mary sempre arranjava desculpas para o comportamento de Gaetano e se mantinha à sombra. – Ele se sente preso e solitário no casamento. Foi só um acordo de negócios. Ela era sua amiga de anos antes que se casassem e ele não a ama. Gaetano precisava de uma anfitriã para receber seus parceiros comerciais, e ela vem de um país onde a mulher precisa de um marido para ter um pouco de liberdade. Eram essas as desculpas de Mary, que


sempre acrescentava: – Não sou uma mulher educada. Jamais poderia agir como uma dama. Mary Brophy fora loucamente apaixonada por Gaetano Ravelli desde que o conhecera e jamais deixara que algo empanasse seu sonho cor-de-rosa. Sua dor quando soubera do desastre de helicóptero fora arrasadora. – Sei que você não entende – dissera para Belle –, mas Gaetano foi o amor de minha vida. Não queria se casar comigo, mas não tinha importância, eu não era concorrência para as outras com dinheiro e posição, e não o culpo. Quando se ama alguém, Belle, se aceita os defeitos da pessoa, e Gaetano era muito esnobe para se casar com uma


mulher como eu. Uma mulher como eu, lembrou Belle com tristeza. Não era de admirar que Mary tivesse baixa estima por si mesma. Ela pulara de um casamento tumultuado aos 17 anos para outro em que o marido a maltratava, terminando como amante de Gaetano. A vida sempre fora dura com Mary, porém, como Isa dizia, ela sempre fazia as escolhas erradas quando se tratava dos homens que levava para sua cama. Isa esperava por Belle quando a neta voltou ao chalé. – Bem? – quis saber. – Ele engoliu a história de que você é uma mulher de 40 anos?


– Não, presumiu que me envolvi com seu pai quando ainda era muito jovem – retrucou Belle com um gesto displicente de mão. – Porém, me analisou o tempo todo. Pediu que fosse até lá amanhã às dez horas para conversarmos, e creio que iremos discutir o futuro das crianças. A senhora deixou escapar um suspiro. – Não estou gostando do modo como você está lidando com isso, Belle. A honestidade é sempre a melhor política. – Mas não estou lidando com um sujeito bom e honesto, vovó. – Você odiava Gaetano. Não desconte no filho dele. Belle cerrou os punhos diante do


conselho indesejado. – Ele nem quer conhecer os garotos, vovó. Isa balançou a cabeça grisalha, claramente infeliz com a notícia. – Se pelo menos sua mãe tivesse pensado no que estava fazendo e o quanto as crianças ficariam ressentidas com a família de Gaetano... – murmurou.

CRISTO NÃOdormiu bem nessa noite. Sonhou que perseguia uma mulher com as pernas mais longas do mundo por um cenário nevoento. Sempre que chegava perto ela se afastava, ria, e sua resistência o fazia desejá-la cada vez mais. Quando por fim a alcançou, era


uma mulher diferente com cabelos muito claros que caíam pelos ombros e seus olhos eram grandes e azuis, fazendo com que recuasse. Despertara suando frio, muito frustrado, e se sentindo culpado por desejar a única mulher que não podia ter nem mesmo em sonhos... Betsy, a ex-esposa de seu irmão Nik. Com os maxilares apertados, Cristo saltou da cama e foi tomar um banho. Fechou os olhos sob o jorro forte de água. Não pretendera acabar com o casamento do irmão. Jamais quisera causar estragos. Betsy o procurara pedindo apoio, devastada pelo que ouvira da boca de Zarif. Porém, infelizmente, fora Cristo quem contara


em primeira mão para Zarif. Toda essa confusão arruinara o relacionamento de Nik com a esposa. Cristo burlara a confiança do irmão e falara demais, criando um antagonismo, mas nunca pensara em magoar Nik ou roubar Betsy do marido. Contudo, precisava confessar que pensara que Nik não merecia uma mulher como Betsy. Ficara de braços cruzados olhando seu irmão tratar a esposa com displicência e não o avisara sobre o erro que estava cometendo. Depois, de maneira desleal, nutrira sentimentos a respeito de Betsy. Por isso a bagunça de Gaetano na Irlanda era sua bagunça também, e só ele poderia arrumar a situação.


Também fora um bagunceiro que arruinara o casamento de Nik. Zarif estava muito afastado, e desde então os três mal se falavam.

– PARECE UMAmamãezinha – declarou Isa na manhã seguinte, arqueando as sobrancelhas ao ver o que Belle vestia. – Essa saia era da sua mãe? Belle empalideceu. – Sim, guardei algumas coisas só para me lembrar dela. É um pouco larga para mim, mas o cinto segura. – Porém, com esse casaco largo, o colar de contas e a blusa enfeitada... É uma garota tentando parecer mais velha


– resmungou Isa com desaprovação. – Só porque você conhece a verdade. Agora é dia e preciso ser mais convincente do que fui ontem à noite – argumentou Belle. – À luz do dia essa crosta de maquiagem parece uma máscara – comentou a avó com secura. – Mas tem razão... deixa você mais velha, e é esse o plano. – Posso aceitar que Cristo acabe descobrindo a verdade, mas antes quero que a ideia da adoção seja discutida – disse Belle. – E se isso o deixar furioso? – perguntou Isa. – Gaetano não costumava tolerar provocações. – Lidarei com o que acontecer.


– Não sei como – retrucou Isa sem delongas. – Não tem poder nenhum contra a esperteza e a fortuna dele. Belle subiu o atalho com seus saltos altos, lutando para não parecer uma pessoa fantasiada. Não era indefesa. Tinha um diploma importante em administração de empresas e economia e tinha também a seu favor o fato de Cristo acreditar que ela era Mary. E mesmo que nessa situação a verdadeira Mary provavelmente estivesse disposta a se ajoelhar diante de um Ravelli, ela, Belle, lutaria com todas as armas. Pela janela da sala de estar Cristo a viu se aproximar. As roupas eram ainda mais deselegantes nesse dia, porém os


saltos altos continuavam a embelezar suas longas pernas. Muito bem, ela era uma mulher atraente. Afinal, as amantes de seu pai sempre haviam sido bonitas, embora as esposas fizessem o gênero mais desbotado. Gaetano sempre valorizara riqueza e classe acima da aparência física. Cristo refletiu quanto dinheiro teria que gastar para persuadir essa amante. Era um hábil negociador e antecipava alguns problemas, pois Mary Brophy não enriquecera com seu relacionamento com Gaetano e, sem dúvida, era muito pobre. Entretanto, não devia ser muito inteligente, por ter tido cinco filho com ele e continuado a trabalhar como sua


governanta. Uma surpreendente onda de piedade o dominou ao pensar nisso. Não pretendia ser cruel com Mary Brophy. Não queria ameaçá-la nem intimidá-la. Desejava apenas uma solução clara para um problema muito complicado e que beneficiasse a todos os envolvidos.


Capítulo 3

– O SR. RAVELLIestá na sala de visitas – informou Rave. Respirando fundo e devagar para manter a aparência tranquila, Belle entrou na sala exageradamente decorada onde as cortinas pesadas e venezianas impediam a entrada da luz do dia. Cristo se voltou para fitá-la, e de imediato Belle ficou alerta e rígida. Ele a fitou de cima a baixo com impaciência. A governanta usava uma


saia sem graça e um casaco mais barato e sem graça ainda; a maquiagem era espalhafatosa como de uma prostituta de esquina. Nesse instante percebeu que havia alguma coisa nessa mulher que não conseguira captar ainda. Fosse lá o que se dissessem sobre Gaetano, fora um conhecedor de mulheres e muito sofisticado. Não conseguia acreditar que o pai tivesse retornado tantas vezes para a Irlanda a fim de desfrutar dos encantos da criatura que no momento estava parada à sua frente. – Sr. Ravelli... – murmurou ela, girando a cabeça para fitar o cenário da janela, os cabelos brilhando em vários tons de dourado e cobre, o perfil


delicado acentuando a boca polpuda e os cílios longos que emolduravam olhos verdes como a grama irlandesa. E nesse momento Cristo percebeu, muito excitado, que ela possuía a qualidade inefável de reduzir o raciocínio de um homem a nada. Por uma fração de segundo desejou agarrála, esmagar seu lindo corpo de encontro ao peito e provar seus lábios carnudos. Cerrou os punhos enquanto lutava contra a excitação sexual, tentando pensar em qualquer coisa que afastasse seus pensamentos de sua boca, seios e pernas. Não entendia como Mary podia afetá-lo tanto. Por sua vez, tratando de evitar os


olhos escuros de Cristo, Belle sentia as faces pegando fogo. Por fim conseguiu encará-lo, tensa e sem fôlego, notando várias coisas a seu respeito: as sobrancelhas que delineavam seus olhos, os malares altos, a boca sensual. Já sabia que ele era muito bonito, porém não precisava continuar notando isso, precisava? A atmosfera ia se tornando pesada, e Belle lutou para não se sentir tão excitada. – Srta. Brophy – começou ele. – Na verdade, sou a sra. Brophy. Cristo franziu a testa. – É casada? – Fui viúva por muitos anos – respondeu Belle com constrangimento, quase de costas para ele e fingindo olhar


pela janela outra vez. Começara com essa farsa e precisava ir até o fim. Era Mary Brophy, examante de Gaetano e mãe de cinco filhos dele, tratou de se lembrar. – Pedi que viesse aqui hoje para discutirmos seu futuro e de suas crianças – comunicou Cristo com suavidade. Belle se sentiu melhor com essas palavras. – Sim... Gaetano nos deixou em uma situação difícil. – Sem dúvida está se referindo à sua situação financeira – interrompeu ele. – Meu pai foi muito inconsequente por não ter garantido sua vida no caso de morrer.


– Sim... mas me deu a casa – enfatizou Belle desejando defender Gaetano, pois, diante de seu filho, não queria deixar transparecer nada do ódio que nutria. Cristo não se importou ao vê-la analisar com atenção seu terno escuro e a camisa branca com a gravata de seda azul. Perguntou em voz baixa: – Pode ser mais específica? – O chalé que fica dentro da propriedade... ele assinou e me deu a escritura há anos para garantir que sempre tivéssemos um lar. Porém, com a carestia e os gastos atuais com as crianças, provavelmente terei que vendê-lo em breve. – Dê-me licença um momento – pediu


Cristo, saindo da sala e pegando o celular para ligar para o advogado do pai, Robert Ludlow. Se ela possuía parte da propriedade, ele deveria ter sido informado. Robert vasculhou os papéis de Gaetano e encontrou um acordo legal de 15 anos atrás, do qual seu irmão, advogado da firma na época, cuidara. Robert se desculpou por não ter visto isso antes. Entretanto, segundo a escritura, sob nenhuma circunstância Mary poderia vender o chalé, e explicou por quê. Belle começou a andar de um lado para o outro. Cristo voltou para a sala de estar com seu andar confiante, dizendo:


– Lamento, mas o chalé não é seu – murmurou com seu sotaque italiano, enfatizando cada sílaba. – Não é possível. Seu pai me disse que era meu... – Apenas enquanto a senhora viver. Depois voltará a pertencer às terras de Mayhill – explicou Cristo. Belle sentiu que o chão faltava sob seus pés. – Não foi nisso que Gaetano me fez acreditar – sussurrou. – Meu pai sabia engabelar e talvez quisesse fazê-la acreditar que possuía o chalé quando, na realidade, só podia usá-lo. Uma onda de raiva a dominou com se


fosse atingida por um raio. Aquele homem detestável e manipulador que sua pobre mãe adorara! Como pudera enganá-la tanto sobre algo tão importante? Suas faces ficaram vermelhas e seus lábios, secos. Conseguiu perguntar: – E esse direito de viver lá enquanto... for viva, será estendido para meus filhos após minha... morte? – Não, lamento. – Cristo sorriu com simpatia, mas isso não a enganou. – Porém, no momento, o chalé lhe pertence. É claro que não pode vendê-lo nem usá-lo para conseguir um empréstimo e tampouco fazer grandes reformas, mas tem o direito de ocupá-lo pelo tempo que quiser.


A notícia era terrível. Sua mãe estava morta e o direito de viver no chalé terminara. Isso significava que Belle e seus irmãos estavam ocupando o local indevidamente. – Meu pai era muito... astuto quando se tratava de dinheiro e propriedades – murmurou Cristo, vendo-a ali de pé, agora pálida, enquanto a verdade começava a fazer sentido. – Porém, estou disposto a encontrar outra casa e colocar no seu nome. Belle lutou para se concentrar no que ele dizia. – E por que faria isso, sr. Ravelli? – Será mais fácil vender o chalé sem... pessoas morando lá – admitiu ele.


Belle engoliu em seco, tentando não dizer o que pensava, porém a fúria foi maior, e exclamou: – Aquele... bastardo! Como pôde fazer isso com seus próprios filhos? – Meu pai não era sentimental – replicou Cristo com secura. – Mas tenho uma proposta a lhe fazer que poderá resolver todos os seus problemas... Belle agora estava furiosa consigo mesma por ter verbalizado seu ódio. Cristo, por sua vez, era tão calmo e seguro, e ela o odiou também. Cristo a analisou; era uma mulher muito emotiva que não sabia controlar a raiva. Porém, a emoção a deixava ainda mais bonita.


– Pro... proposta? – repetiu ela, lutando para controlar o temperamento explosivo. Precisava lidar com essa notícia ruim da melhor maneira possível. No silêncio que se seguiu Belle sentiu a garganta seca. – Desejo que pense na ideia de adoção para seus filhos – sugeriu Cristo. – Sem dúvida seria melhor para eles deixar para trás o passado e ter a oportunidade de viver normalmente. – Não acredito que tenha me dito isso – murmurou Belle com os dentes cerrados. – Faria esse sacrifício valer a pena – continuou Cristo, como se essa sugestão fosse muito normal e aceitável. – Meu


pai deveria ter providenciado um lar e uma renda, mas, já que não fez isso, tomarei conta da situação. – Nenhuma mãe decente entregaria os filhos por lucros financeiros – declarou Belle sem emoção na voz. – Com que tipo de mulher está acostumado a lidar? – Isso não é problema seu. Não sou como meu pai e não tenho filhos – replicou Cristo com fria dignidade. – E também não merece ter filhos! – acusou Belle. – Pelo amor de Deus! Essas crianças das quais está falando são seus irmãos e irmãs! – Não os reconheço como tal e jamais reconhecerei – retrucou Cristo com fúria. – Por quê? Não são importantes o


suficiente para fazer parte da família Ravelli? – Belle retribuiu com ressentimento. – Os filhos da governanta... não é um título muito pomposo, certo? Não é a estirpe correta, tenho razão? Bem, deixe-me lhe dizer uma coisa... – Recuso-me a ouvi-la enquanto estiver descontrolada – cortou Cristo, sempre friamente. – E se orgulha de ser um iceberg, não é verdade? – agrediu ela sem medo. – Bem, não tenho vergonha de ser uma pessoa emotiva e pronta a fazer o que é certo apesar das dificuldades! – E seu descontrole permite que tome decisões sensatas? – perguntou ele com


falsa inocência. Belle cerrou os punhos. Jamais antes desejara bater em alguém, e estava chocada nesse momento por querer tanto dar um tapa em Cristo Ravelli. Como ele ousava ficar ali parado, olhando para ela com ar de superioridade e tratando seus irmãos como se fossem nada? Como ousava sugerir que as crianças fossem arrancadas dos braços das pessoas que amavam e colocadas em outros lares? Será que não aceitava que Mary Brophy, apesar de seus defeitos, fora uma mãe amorosa e boa sempre? – A questão é... – Belle respirou fundo, esquecendo-se de tudo a não ser do amor por Mary. – Minha mãe pode


ter sido apenas uma governanta e amante de seu pai durante muitos anos, porém era também uma pessoa repleta de bondade e carinho, e agora que a perderam, seus filhos merecem o melhor. – Sua... mãe? – repetiu Cristo confuso. – Mary Brophy era sua mãe? Belle ficou paralisada. Por um instante, mergulhada na própria emoção, se esquecera completamente de que estava fingindo. – Então, se não é Mary Brophy, onde ela está? E quem é você? – Cristo franziu a testa, furioso por ter feito papel de bobo. – Sou Belle Brophy. Minha mãe


morreu um mês após seu pai. Sofreu um ataque cardíaco – admitiu, com os olhos repletos de dor. A frieza e a insensibilidade de Cristo Ravelli eram como vinagre sobre uma ferida aberta. – Você não tinha intenção de me contar que sua mãe falecera. Mentiu para conservar o chalé – condenou Cristo sem hesitação. Belle ficou pasma com a rapidez da conclusão dele e o modo como falara. Parecia que era uma criminosa. – A farsa nada teve a ver com o chalé. Até vir aqui hoje pensava que minha mãe era a dona do chalé, portanto seríamos os herdeiros após a morte dela – lembrou ela. – Porém, imaginei que não me ouviria se eu lhe desse minha


verdadeira identidade. Cristo não tolerava mentirosos e pessoas que tentavam enganá-lo. Lembrou-se da ruiva de longas pernas a atravessar o gramado no dia anterior e percebeu que fora Belle Brophy o tempo todo. A fúria o dominou. Que paspalho! – Fingiu ser sua mãe... está doida? Ou é apenas muito idiota? O coração dela acelerou. Belle passou por ele e correu para a porta. Não gostava de ficar perto de homens raivosos; sua infância com o pai lhe ensinara que tais homens costumavam descambar para a agressão física. Mas Cristo a segurou pelo braço enquanto ela abria a porta.


– Não vai sair daqui ainda. – Largue meu braço! – resmungou Belle, intimidada com a altura e o vigor dele. – Cometi um erro, mas isso não lhe dá o direito de usar força física comigo! – Não estou usando força física! Porém, você me deve uma explicação pelo seu comportamento estranho! Os olhos dela faiscaram. – Você é um Ravelli! O dia em que dever alguma coisa para vocês o mundo irá acabar! Por um segundo Cristo a viu correr pelo vestíbulo com seus saltos altos, as mechas ruivas começando a se desprender do coque severo. – Volte aqui! – berrou sem paciência.


Belle girou com raiva, vendo-o avançar na sua direção, e agarrou um vaso pesado sobre uma mesinha como se fosse uma arma. – Não ouse se aproximar mais! – avisou. – Costuma agir como louca sempre? – perguntou Cristo dessa vez com suavidade, dominando a fúria. – Vou levá-lo ao tribunal e forçá-lo a reconhecer as crianças! – replicou Belle com paixão. – Elas têm direitos legais a uma parte dos bens de seu pai, e você nada poderá fazer. E não sou louca. Cristo sentiu uma garra de gelo percorrer sua espinha dorsal diante da ameaça de um caso nos tribunais. A


roupa suja de Gaetano seria lavada em público, fornecendo manchetes escandalosas para os jornais. – Acalme-se – pediu. – Vamos conversar. – Não confio em você ! – replicou Belle. – Deixe-me ir embora ou jogo esse vaso na sua cabeça! Cristo não compreendeu a própria reação, porque continuou avançando sem prestar atenção na ameaça. Belle atirou o vaso na sua direção e se encolheu ante o som de porcelana quebrada sobre o chão de mármore. A seguir abriu a porta e desceu correndo os poucos degraus da entrada. – Tecnicamente, foi uma tentativa de assassinato – disse o guarda-costas


Rafe, surgindo na escadaria enquanto Cristo retirava cacos de porcelana do terno, a boca cerrada no rosto que parecia uma máscara sombria. – Ela não acertaria em um elefante que estivesse parado na sua frente – replicou com desdém. – Da próxima vez não sairei do caminho – murmurou, enquanto via Belle descer o atalho de cabeça erguida como uma rainha ofendida. Era louca, completa e profundamente louca. Faltava um parafuso na sua cabeça. Como poderia negociar com uma mulher assim? Mas precisava fazer isso ou enfrentar uma ação judicial que levaria ao escândalo.


– Haverá uma próxima vez? – perguntou Rafe muito surpreso. O sorriso de Cristo foi frio e ameaçador. – Oh, sem dúvida que sim – murmurou.


Capítulo 4

– ESTÁ TUDOàs

claras agora, o que é bem melhor – disse Isa para Belle com satisfação. – Todos nós sabemos onde estamos pisando. Belle afastou uma mecha de cabelos da face e enxugou as mãos. Entregara-se a uma orgia de faxina desde que voltara para o chalé. Precisara de um trabalho físico para gastar o excesso de energia. Sua avó sempre reagia às situações de estresse com calma e aceitação. Dessa


vez, quando a neta pintara um cenário da família desabrigada, ela lembrara que em poucas semanas Bruno e Donetta voltariam para casa para as férias de verão e teriam tempo de procurar um lugar para alugar. Belle engolira a pergunta de como iria pagar o aluguel. Tag começou a latir um segundo antes de a campainha da porta soar. Cristo Ravelli estava parado na soleira, e, como Belle não usava saltos altos, parecia uma torre de tão alto. O rosto magro e sombrio a fitou. – Srta. Brophy? – Belle – corrigiu ela depressa. Cristo examinou a massa de cabelos ruivos que caíam até os ombros emoldurando o rosto delicado com os


olhos verdes. Sem o disfarce da maquiagem pesada ela era absolutamente linda. Nesse instante Tag saiu correndo para atacar o visitante e Belle não teve tempo de perguntar o que ele queria. Cristo se afastou depressa antes que o cãozinho mordesse seu calcanhar. Belle se abaixou para dizer sem grande convicção: – Não, Tag, não! Cristo teve a impressão de que, na verdade, ela estava dando permissão ao cachorro para estraçalhá-lo. – Segure Tag! – gritou Isa da sala. Belle obedeceu, tomando o cãozinho furioso nos braços.


– Desculpe. Ele suspeita de todos os homens. – Entre, sr. Ravelli – convidou Isa Kelly com educação, surgindo por trás da figura agachada da neta. Belle se ergueu de supetão, murmurando: – Não ia convidá-lo para... – O sr. Ravelli é nosso convidado – decretou a avó. – Ele vai entrar e você conversará como uma pessoa civilizada. Tag rosnou para Cristo. – Seu pai costumava chutá-lo... – disse Belle. – E era o único homem que entrava nesta casa. Por isso Tag detesta homens adultos. E já está muito velho para mudar os hábitos.


A avó analisou Cristo, a hostilidade evidente em sua voz, apesar das palavras educadas: – Entre, por favor. Cristo penetrou em uma sala pavorosa com paredes cor-de-rosa, sofá e poltronas rosa-choque e rendas e laços por todos os lados junto a arranjos de flores artificiais. Um pesadelo, refletiu. – Jamais gostei de cães... – confessou ele. Um garotinho que começava a dar os primeiros passos se segurou na sua perna antes que pudesse se sentar. – Não, Franco – ralhou Belle. – ...ou de criancinhas – acrescentou ele sem remorso.


Franco ergueu o rostinho para o visitante. Tinha os olhos de Gaetano, e Cristo achou isso tão enervante que se sentou depressa com o guri ainda agarrado na sua perna. – Homem – disse Franco, com um ar de descoberta e satisfação. – Ele sente falta de companhia e atenção masculina – explicou Belle, largando o cão para pegar a criança e levá-la para a cozinha. – Cristo disse que toma café preto – avisou a avó da porta. Belle rangeu os dentes, mas sabia que Isa estava sendo sensata; precisava conversar com Cristo, que agora já conhecia seus planos.


Cristo ignorou Tag, que rosnava para ele debaixo da mesinha de café, pensando que o animal deveria ser cauteloso antes de arrumar briga com alguém mais forte, e que ele próprio deveria tomar cuidado. A ameaça de Belle o deixara alerta. Assim que a bandeja com café e biscoitos chegou, ele se levantou, sufocando-se em meio ao pesadelo em cor-de-rosa, e disse sem preâmbulos: – Não quero que leve o problema das crianças para o tribunal. – Meus irmãos e irmãs foram preteridos muitas vezes. Quero que tenham o que lhes é de direito – retrucou Belle com firmeza.


– Alguns anos atrás, Gaetano vendeu a maioria de seus bens. Com exceção da venda de Mayhill, há pouco dinheiro vivo para você pleitear para seus irmãos – avisou Cristo. – Não pretendo obter uma fortuna para eles. – Tenho uma ideia melhor – sugeriu ele. – Imagino que sempre tenha uma ideia melhor – ironizou Belle, se encostando ao batente da porta da cozinha e cruzando os braços sobre o peito de maneira defensiva, refletindo sobre como ele podia estar tão à vontade ali usando um terno de reunião de executivos.


O jeans desbotado de Belle acentuava seu corpo delgado, assim como a camiseta que deixava um ombro à mostra. Não era uma roupa provocante, porém mesmo assim ele se sentiu terrivelmente excitado, tratando de se controlar. – Farei um acordo a respeito de seus irmãos. Irei compensá-los caso não procurem seus direito nos tribunais – explicou, virando-se um pouco para olhar pela janela. – Não queremos a caridade dos Ravelli – replicou Belle, erguendo o queixo. – Mas não seria caridade. Como você disse, são filhos de meu pai e vou tratá-


los com justiça. Minha família ficaria constrangida se essa história tivesse uma publicidade escandalosa – admitiu ele de má vontade. Belle nem se mexeu, comentando: – E por que devo me incomodar com isso? – A publicidade é uma faca de dois gumes – avisou Cristo. – Certo tipo de mídia adora sordidez e vulgaridade. A memória de sua mãe não será respeitada. Pelo menos três das crianças nasceram quando Gaetano ainda era casado. Diante desse lembrete cruel, Belle ficou com o rosto vermelho como um camarão. – Isso não pode ser evitado e mamãe


não será magoada agora. Preciso pensar no futuro das crianças. Desejo que tenham o direito de usar o nome dos Ravelli. – Nenhum tribunal que conheço pode conceder esse direito quando não houve casamento formal entre os pais – argumentou Cristo, exasperado com a teimosia dela. – Gaetano nem mesmo vivia com Mary, apenas a visitava ocasionalmente. Você não está sendo razoável. Um processo judicial só trará escândalo para os Ravelli e nada para vocês. Nenhum de nós sairá lucrando. Se mantiver essa história fora dos tribunais e me deixar tomar conta discretamente, serei generoso. É a


melhor oferta que obterá. – Desculpe por não confiar em você. Seu pai me fez ficar uma pessoa desconfiada. – Não permitirei que torne pública essa confusão sórdida – exclamou ele. – Se fizer isso, lutarei contra você o tempo todo e aviso... não vai gostar de me ter como inimigo. – Lute o quanto quiser... vou aos tribunais – replicou Belle. – Nada mais temos a perder. – O que quer para abandonar essa ideia? – resmungou Cristo, quase estremecendo diante da ameaça e dos danos que seriam causados pela mídia, especialmente para seu irmão Zarif. A situação de Zarif em Vashir era


delicada, tendo subido ao trono recentemente. A última coisa de que precisava era de um grande escândalo que daria a todos a impressão de que provinha de uma família devassa e de que não era o governante ideal para um país conservador. Belle o fez retornar ao momento presente dizendo: – Provavelmente não peço o impossível e gostaria que meus irmãos tivessem o estilo de vida que teriam se Gaetano fosse o marido de minha mãe. É muito injusto que paguem o preço por Gaetano não ter se casado com ela. – Está sendo irracional – insistiu ele com impaciência. – Não pode mudar o


passado. – E não quero mudar. Simplesmente desejo corrigir os erros que foram cometidos contra meus irmãos. – Deixe o passado para trás e continue em frente – aconselhou-a. – É fácil para você dizer isso. Mas na prática não é assim. E não sou irracional... Cristo saiu para o vestíbulo, deu meia-volta com uma rapidez incrível para um homem tão grande e disse: – É a mulher mais irracional que já encontrei. Belle foi em seu encalço e seus olhares se encontraram. Por um breve momento que pareceu uma eternidade, o mundo parou e ela deixou de respirar.


– Mas não sei por que acho isso muito sexy – admitiu Cristo em um sussurro, o sotaque italiano ainda mais acentuado, enquanto erguia a manga da camiseta de Belle para ocultar seu ombro. – Não vai me amolecer. Não sou ingênua como minha mãe – replicou Belle com frieza. – Acorde, cara. É uma criança tentando brincar com os adultos – disse Cristo em tom ameaçador. Belle continuou sem fôlego enquanto o fitava com um olhar irônico. – Uma criança? É esse o melhor insulto que pode me fazer? – Não estava tentando insultá-la. Sem aviso ele inclinou a cabeça e a


beijou nos lábios. Era um beijo cheio de fogo como Belle nunca experimentara. Suas mãos subiram para os ombros dele e se entrelaçaram aos cabelos negros. Ele a abraçou com força, fazendo-a sentir sua ereção. A intensidade das próprias emoções deixou Belle apavorada. Com um gemido, ela o afastou. – Não! Cristo deu um passo atrás e respirou fund o . Maledizione! Estava excitado demais e furioso com a mulher que o deixara nessas condições. – Estava tentando persuadi-la a não levar para os tribunais uma questão de família – murmurou sem emoção. Belle o fitou chocada e incrédula ao


vê-lo reagir com tanta frieza após um beijo tão quente. Parecia que a paixão não era uma emoção que controlava Cristo Ravelli. No período de um segundo ela se ressentiu com sua segurança, foi insultada pela sua fria indiferença e ficou furiosa por ter permitido o beijo. Mas que beijo! Esse pensamento vergonhoso não a largava por mais que desejasse odiá-lo. Belle beijara muito quando estudante, tentando vivenciar uma experiência maravilhosa, mas tal experiência nunca acontecera. Agora o destino ria, pois lhe concedera esse desejo na pessoa de um Ravelli. O homem errado. Ela não tinha dúvidas de que Cristo Ravelli


representava tudo de errado. Era convencido, frio e insensível. E ela era carinhosa, emotiva e impulsiva. – Desculpe, farei o que é melhor para meus irmãos levando esse assunto para os tribunais – declarou com brevidade. – Não pode – retrucou Cristo. – Irá prejudicar outras pessoas. Você e seus irmãos não são os únicos a ser afetados por isso. – Não me importo com mais ninguém – admitiu Belle com rudeza. – Quero que meus irmãos e irmãs possam manter as cabeças erguidas e saber quem são sem sentir vergonha. – Quer o impossível – declarou Cristo, dando as costas. – Não. Quero apenas justiça.


Justiça! A frustração o dominou, pois nunca recuava nem deixava de encontrar soluções para os problemas. Limitar os danos era sua especialidade. Como poderia ser justo se o trono de Zarif fosse ameaçado pelas infidelidades de Gaetano e a revelação de sua família secreta na Irlanda? “Tal pai, tal filho”, diriam os opositores de Zafir se o escândalo surgisse. Mary Brophy fizera uma péssima escolha quando optara por se envolver com um homem casado e ter filhos com ele. Sua filha do relacionamento anterior, Belle, era orgulhosa demais e ressentida demais com a família Ravelli ou, mas especificamente, com Gaetano,


e estava certa de que poderia reescrever a história. Mas lavar a roupa suja da família em público não faria com que as crianças erguessem as cabeças. Não. Era mais provável que ficassem envergonhadas com a relação sórdida de seus pais para o resto de suas vidas. E nenhum filho legítimo de Gaetano jamais sentira orgulho dele ou do seu nome. Gaetano fora um pai terrivelmente egoísta e desinteressado. Por ironia, Cristo sempre pensara que se tornaria um homem diferente do pai. Agora pensava no que acontecera com esse sonho e em que ponto o cinismo matara sua meta. Sabia que jamais considerara a história de Mary Brophy por outro ângulo a não ser o seu. Era um


homem prático e egoísta também. Mas mesmo ele reconhecia que Belle Brophy era jovem demais e a avó, idosa demais, para assumir total responsabilidade pelos filhos de Gaetano. De repente Cristo se conscientizou de que essas crianças, do mais velho ao pequenino muito parecido com Gaetano, eram sua carne e sangue também, embora não desejasse reconhecer tal fato indesejável. E então a resposta para o problema o atingiu como um raio. O romance de Gaetano e Mary poderia ser enterrado de maneira decente e as crianças, poupadas na mídia. Quanto à Belle, não tinha escolha, embora não acreditasse


nele. Era pouco provável que ele se apaixonasse de novo. Na verdade, nem sabia como se apaixonara uma vez por Betsy, já que era uma pessoa tão racional. Imerso nos pensamentos, Cristo retornou a Mayhill. Uma hora mais tarde, Belle, nervosa com a conversa e o beijo, levou os gêmeos para a escola e depois avisou a avó que iria à praia com Franco.

QUANDO CHEGOUà praia, Cristo teve a satisfação de ver Belle relaxada pela primeira vez. Sua cabeleira rebelde dançava ao vento, que moldava os seios


sob a camiseta. Atirava uma pedra no mar enquanto Franco se balançava de um lado para o outro, muito contente, e o cão circulava em volta dos dois latindo sem parar. Sendo o primeiro a ver Cristo, Tag saiu correndo na areia para atacá-lo. – Não! – gritou Cristo enquanto avançava. Tag estacou fincando as quatro patas na areia e com os olhos cheios de terror. – Não precisava gritar com ele – ralhou Belle, correndo para pegar o animalzinho. – Veja como ficou assustado! É muito sensível. – E eu sou sensível quanto a mordidas – resmungou Cristo.


– Homem! – exclamou Franco, correndo para agarrar a perna de Cristo, que ficou imóvel, imaginando se daria conta ao se encarregar daquela turma, sobrevivendo com a dignidade e o raciocínio intactos. Não era um homem de família e não fazia ideia de como funcionava uma família normal. Aliás, até pouco tempo nem quisera descobrir. Belle o fitava, e enrubesceu ao perceber que ele notara sua insistência. Sua beleza fez Cristo se esquecer de tudo o mais. Só conseguia pensar em sexo, muito sexo, o que o deixava muito excitado. Belle se aprumou com Tag apavorado grudado nos seus braços.


– Isa lhe disse onde eu estava? – perguntou ela. – Posso ter vindo passear na praia, não posso? Belle arqueou as sobrancelhas. Estava admirada por ver um homem que passava tanto tempo preso aos negócios com um físico tão delineado: ombros largos, delgado e sem barriguinha. Sem dúvida mantinha a forma. E, apesar de ter sempre considerado os ternos de executivo algo maçante, ela admitia que a roupa de Cristo Ravelli apenas aumentava sua beleza máscula. Fitou-o de cima a baixo de maneira deliberada e declarou: – Não veio passear na areia usando


um terno. – Posso limpar a areia com facilidade – retrucou ele, enquanto a via largar o cão. Ela se sentia constrangida diante dele como uma menina de escola na presença de seu ídolo. Jamais olhara tanto para um homem. Mortificada, sentiu raiva de si mesma por não conseguir se controlar diante do carisma dele. Cristo se inclinou para se livrar do aperto de Franco. Sente falta de atenção masculina, dissera Belle, e Cristo entendia. Nem durante sua infância e muito menos na fase adulta recebera a atenção ou o carinho de Gaetano, que nunca demonstrara interesse pelo bem-estar do filho.


– Precisamos conversar – disse de súbito. – Nada mais há para conversarmos. Dissemos tudo ontem – discordou Belle, dando de ombros e se voltando para o menino. – Franco, venha cá! – Não! – respondeu o garotinho com teimosia. E tendo Cristo livrado a perna, ele o agarrou pela calça, dificultando seu caminhar. Cristo respirou fundo tentando manter a paciência. – Vim lhe dizer que coloquei as propriedades de Mayhill à venda esta manhã – anunciou sem olhar para Belle. Ela parou de caminhar e ficou rígida de pânico diante da perspectiva de


perder o teto sobre suas cabeças. Por certo não havia espaço para todos se comprimirem no apartamento de quarto e sala da avó. Fitou o mar, porém, o rumor suave das ondas não a acalmou, assim como a areia macia que costumava fazer mágicas com seu humor. Girou o rosto para Cristo com os olhos brilhando. – Não poderia ter esperado algumas semanas? Cristo voltou para parar na frente dela, mancando com o irmãozinho de Belle sempre preso à sua calça. – Quero vender a propriedade o mais depressa possível. E desejo que a vida de Gaetano aqui permaneça um segredo. – E quanto a nós? Para onde iremos?


– perguntou Belle com veemência, cada vez mais furiosa. – Leva tempo para uma mudança. – Terão pelo menos um mês para encontrar outro lugar – explicou Cristo sem simpatia na voz, enquanto observava de modo disfarçado os mamilos rijos se sobressaírem sob a camiseta dela. – Não é um prazo longo. Bruno e Donetta voltarão da escola em breve para as férias de verão. Cinco crianças tomam muito espaço. São seus irmãos e irmãs também, portanto deveria se importar com seu destino! – finalizou em tom de acusação. – E por isso estou aqui, para propor


que se case comigo. Juntos daremos um lar para eles. – Casar? – repetiu Belle, imaginando se ouvira direito. – Do que está falando? – Disse que queria que seus irmãos desfrutassem do nome dos Ravelli e de seu estilo de vida. Só posso fazer que isso aconteça se me casar com você e os adotar. Confusa, ela franziu a testa e deu um passo atrás, chocada demais para responder. Por fim murmurou, quando recuperou a voz: – Isso é uma brincadeira? – Por que brincaria com algo tão sério? Belle deu de ombros. – Como posso saber? Quando me


conheceu pensou que estava falando com a mãe das crianças e sugeriu que eu as desse para adoção – lembrou. – Para mim pareceu uma brincadeira de mau gosto. – Bem, não estou brincando – garantiu ele, um raio de sol furando as nuvens e iluminando seu rosto severo. Belle voltou a analisá-lo porque tinha a beleza sombria de um anjo decaído. Os olhos negros eram maravilhosos, emoldurados pelos cílios espessos, e de repente ela tornou a ficar sem fôlego na sua presença. – Sou um homem prático e estou sugerindo um casamento prático que p r e e n c h e r i a todas as nossas


necessidades – continuou ele de maneira persuasiva. – Sabe que não quero levar o caso aos tribunais. Também quero evitar que a história escandalosa de Gaetano e de sua governanta atravesse os oceanos. Se houver um casamento entre nós dois, tudo ficará legalizado. Belle respirou devagar, mas seu cérebro continuava confuso. – Não acredito que esteja propondo tal coisa – sussurrou por fim. – Não me deu escolha, deu? A ameaça de um caso nos tribunais me assustou. Está preparada para resolver a questão fora da corte? – Cristo a estudava intensamente. Belle respondeu sem hesitar: – Não.


Ele arqueou as sobrancelhas. – Então, qual é sua resposta? – Não é tão simples – protestou Belle. – Não? Estou oferecendo tudo que você queria. Ela piscou diversas vezes. Sentia-se encurralada. – Bem, sim. Mas... casamento? Jamais esperaria por isso! Cristo ficou aborrecido. Era a primeira vez que fazia uma proposta de casamento, pois nunca antes pensara em pedir para uma mulher ser sua esposa. Entretanto, apesar de não ser vaidoso, sabia que era rico, bonito e um grande partido. Mesmo assim Belle hesitava, e ele estava surpreso.


– Olhe, vou pensar até hoje à noite – disse ela constrangida. – Sem problemas – retrucou Cristo, apertando os lábios sensuais. – E, por falar nisso, estou propondo um casamento de verdade. – De verdade...? – Ela voltou a ficar muito vermelha e finalizou: – Espera que eu durma com você? – É claro que sim – murmurou Cristo com uma certeza indolente e como se isso fosse absolutamente normal e aceitável. – Não pretendo manter amantes como fazia meu pai durante a vida de casado. E não quero uma esposa que me traia pelas costas. Esse tipo de vida não promoveria um lar estável para


as crianças. Belle concordava com seu ponto de vista, porém ficava sem graça ao pensar em compartilhar a mesma cama com ele. De repente estava muito consciente da própria inexperiência sexual. Ao crescer precisara combater as expectativas dos rapazes locais, que viam sua mãe como uma mulher livre e fácil. Belle precisara provar muitas e muitas vezes que era uma garota séria. Dizer “não” se tornara uma questão de orgulho pessoal e preservação, mas à medida que se tornava adulta esse condicionamento junto a outras inseguranças e necessidades a fizeram duvidar de todos os homens. Cristo colocou um cartão de visitas


em sua mão, para o qual ela olhou sem interesse. – Meu número particular de celular. Por favor, conte-me o que decidiu às sete horas hoje, bellezza mia – informou com frieza. – Assim poderei começar a tomar providências.


Capítulo 5

NÃO FAÇA isso... Não faça isso... O constante refrão de Isa ainda soava nos ouvidos de Belle enquanto descia do carro que Cristo enviara para buscá-la e subia os degraus que levavam à igreja de São Judas Tadeu. Usava um vestido vintage, elegante, mas simples com um decote canoa. Fora o vestido de casamento de sua falecida mãe. Belle gostara do simbolismo disso e desde que vira Cristo pela última vez,


três semanas atrás, encompridara a saia para combinar com sua altura e fizera alguns arranjos. Mary podia não ter levado seu Ravelli para o altar, porém sua filha estava tendo sucesso onde ela falhara, refletiu Belle com um misto de satisfação e culpa. Sabia que era errado se sentir assim, pois Cristo não era Gaetano e não cometera os pecados do pai, porém era difícil evitar. Ela estava na boca de toda a vizinhança, porque ninguém tinha certeza de como conseguira tão depressa conquistar um marido que acabara de chegar à Irlanda pela primeira vez. E havia uma pequena multidão de fora da igreja querendo, de alguma forma, participar da cerimônia muito discreta e


particular. É claro que Cristo conseguira o respeito e o apoio de todos no lugar, pensou Belle. Decidira não vender Mayhill e doara a mansão histórica como um centro comunitário para o lugar. Sem dúvida o dinheiro falava alto, muito alto, em uma área onde havia poucos empregos disponíveis e as rendas eram pequenas. Mayhill poria o vilarejo no mapa, tornando-se uma atração turística e oferecendo muitas oportunidades de trabalho. Cristo acertara em cheio. É claro que assim ficava subentendido que o relacionamento de Gaetano Ravelli com Mary e seus cinco


filhos era um assunto a ficar enterrado no passado para sempre, diante da generosidade de Cristo. E, agora, com o casamento dele e Belle, tal assunto nunca mais viria à tona. As irmãs de Belle, Donetta, de 13 anos, e Lucia, de 8, sorriam radiantes na primeira fileira da igreja. Os irmãos Bruno, Pietro e o pequeno Franco estavam ao lado. Bruno franziu a testa, pois era inteligente demais para ser enganado com esse espetáculo e ainda tinha dúvida sobre o que aconteceria com sua família. – Quer mesmo se casar com o filho de Gaetano? – perguntara ele na véspera, quando voltara da escola com Donetta, os dois tendo recebido permissão para


ir assistir ao casamento da irmã mais velha. – Foi amor à primeiro vista – mentira Belle, determinada a afastar as linhas de preocupação na testa do menino. – Como pode me perguntar tal coisa? – Não estou dizendo que não acredito em você... mas parece tudo muito conveniente. Quero dizer, aqui estamos, sem um tostão, praticamente sem teto, e então chega Cristo Ravelli montado em seu cavalo branco de salvador, e de repente nossos sonhos se tornam realidade – murmurara Bruno em tom de zombaria. – Não parece real para mim... é bom demais para ser verdade. Como foi que você, por fim, estendeu a


bandeira da paz? – Que bandeira? – Cresceu odiando os Ravelli e, agora, de súbito, vai se casar com um deles? – Ele é seu irmão – lembrara Belle ao adolescente teimoso. – É um banqueiro bilionário e muito esperto. É com você que estou preocupado, mana. Como será ser casada com um sujeito desses? – A voz de Bruno soava tensa. – Ele vive em outro mundo. Entretanto, no momento, Cristo estava no mundo de Belle, pensou ela, avançando pela igreja e se permitindo olhar para o homem alto e forte no altar. Não havia nenhum traço do costumeiro


nervosismo dos noivos em seu rosto. Poderia muito bem ser um simples convidado no casamento de outra pessoa pela displicência que demonstrava. Automaticamente Belle ergueu o queixo como se estivesse sendo desafiada; seu coração batia forte e parecia que todo o nervosismo se concentrara nela. Afinal, mal dormira desde que lhe dissera apenas uma palavra, “sim”, no dia em que ele a pedira em casamento na praia. Precisara reunir muita coragem para aceitar e se basear apenas nas vantagens que teria com o casamento, minimizando todas as desvantagens. Sua família seria salva, totalmente salva e segura, e isso


era o que importava e no que devia se concentrar. O que iria lhe custar pessoalmente não tinha importância. Afinal, nunca se apaixonara e tinha certeza de que não desejava amar ninguém. As lembranças da infelicidade da mãe durante as longas ausências de Gaetano ainda estavam frescas em sua mente. Na verdade, Mary só vivia quando Gaetano estava perto dela. Todas as vezes que ele ia embora o coração dela se partia de novo, deixando-a apática enquanto contava os dias e as semanas à espera de seu regresso. Belle mantinha um calendário apenas para marcar as datas das visitas de Gaetano e provar que o amor e a


extrema lealdade de uma mulher a levavam à ruína. Mary vivera para Gaetano. Belle queria viver apenas para sua família e garantir que todos tivessem uma infância e adolescência muito mais feliz e segura que a dela. Isa ficara no chalé para passar o verão e insistira para que Bruno, Donetta e os gêmeos ficassem lá com ela, deixando apenas Franco com Belle porque o pequenino era muito ligado à irmã. – Estabilize seu casamento antes de mandar as crianças para Londres e para as novas escolas – dissera a avó com brusquidão. – Sabe que não aprovo o que está fazendo, e se existe o risco de


esse casamento durar apenas o tempo necessário para você recuperar o bom senso, não deve arrastar as crianças consigo. Belle discutira, mas sabia que a avó tinha razão. Era evidente que havia a chance de o casamento “prático” não dar certo. Precisava fazer com que desse certo antes de reorganizar a vida dos irmãos e trazê-los para morar definitivamente em Londres. E isso era uma tarefa difícil, já que concordara em casar com um completo estranho. Assim pensando, Belle concluiu que estivera louca. Aceitara muito depressa. Pensara nos benefícios, mas ignorara as desvantagens completamente. Ir para a cama com Cristo era um dos grandes


problemas e viver com ele – aliás, com qualquer homem – era o máximo do desafio. Retornando ao momento presente, notou o sol que se filtrava pelos vitrais da igreja, enquanto Cristo observava sua noiva se aproximar. Estava linda de branco, mechas ruivas caindo sobre os ombros e uma tiara de pérolas no alto da cabeça. Maledizione! Sabia que jamais desejara tanto uma mulher, porém tinha certeza de que, como as outras, acabaria por decepcioná-lo. Cristo não era um otimista ingênuo nem fã de contos de fadas. Contudo, pelo menos já conhecia o lado negativo de Belle: era praticamente


uma chantagista, cavadora de ouro e alpinista social. Muito melhor conhecer o inimigo do que o desconhecer, e ele sabia tudo sobre mulheres interesseiras. A mão dela tremia quando ele colocou a aliança em seu dedo. Bela manobra, pensou com cinismo, o papel da noiva modesta e pura, mas ele não iria cair nessa armadilha. Estava conseguindo uma esposa muito bonita e desejável, e colocara um fim à ameaça de um terrível escândalo. Nem mesmo seus irmãos Nik e Zafir sabiam ainda sobre esse casamento, porque a última coisa que faria seria arrastá-los para o local onde Gaetano mantivera um vergonhoso ninho de amor.


Cristo ignorou Belle de volta ao chalé, onde uma pequena comemoração com comida e bebida fora preparada para a família dela e os poucos amigos convidados. Belle percebera que, de sua parte, Cristo não convidara ninguém, e isso a incomodava, fazendo-a pensar se tinha vergonha dela, de seu lar modesto e de sua falta de sofisticação. Bruno se dirigiu a Cristo no saguão. – Podemos trocar umas palavras? – perguntou com o rosto de adolescente muito pálido. Bruno era a imagem viva de Zarif quando adolescente, e tal semelhança espantara Cristo quando o conhecera rapidamente na noite anterior. Gaetano


estampara firmemente os genes dos Ravelli em todos os seus filhos. – Algum problema? – perguntou Cristo, arqueando as sobrancelhas. Bruno parou ao pé da escada e respondeu de mau humor: – Se magoar minha irmã como seu pai magoou minha mãe, juro que o matarei. Cristo quase caiu na gargalhada, porém uma onda de compaixão o invadiu quando recordou a própria adolescência turbulenta. De qualquer modo, Bruno já dissera o que queria e agora dava um passo atrás como se esperasse um ataque físico. Antes que fosse embora, Cristo disse: – Agora somos da mesma família e não pareço em nada com meu pai, pode


ter certeza. Não gosto de magoar as mulheres. A uma distância razoável, Belle analisava a conversa dos dois. Embora não ouvisse o que diziam, supunha que Bruno tivesse sido muito agressivo na sua necessidade de protegê-la, e reconheceu que Cristo lidava muito bem com a situação, usando de muita simpatia com seu irmão. Irmão dos dois, corrigiu mentalmente, porém... Cristo talvez ainda não estivesse pronto a aceitar esse vínculo de sangue. Mas fora gentil e se contivera ao falar com Bruno, e Belle ficara agradecida. Enquanto Bruno se afastava depressa


tendo falado o que pretendia, Cristo estudou o rosto do homem moreno que fitava Belle sem parar enquanto ela conversava com amigos da avó. Cristo se retesou ao reconhecer o filho do corretor. Era Mark, o filho de Petrie. E gostava de sua esposa. Sua esposa. O choque desse reconhecimento o atingiu em cheio. Então se concentrou em fitar Belle, que, quando percebeu isso, ficou tensa e insegura. A força do olhar de Cristo a dominava, e ela engoliu depressa o resto do vinho no copo que segurava. – Coma alguma coisa – aconselhou Isa. – Você não tomou o café da manhã. Belle aceitou um sanduíche só para manter a paz; pois, embora sentisse o


estômago vazio, isso nada tinha a ver com fome. – Vou trocar de roupa – disse com constrangimento, acariciando os cabelos de Franco ao seu lado. Cristo continuava no saguão, afastado de todos por uma barreira que a deixava insegura. – Ele não é muito amigável, não? – murmurou Donetta ao seu ouvido. Belle se forçou a sorrir, maldizendo a atitude distante do marido e sua clara intenção de não aproveitar a oportunidade para conhecer melhor os irmãos. – É apenas tímido – murmurou. – Tímido? – repetiu Donetta muito


surpresa. – Muito tímido – mentiu Belle, desejando sossegar a adolescente. – Tudo será diferente quando conhecer vocês melhor. E a carga de garantir que seria diferente estava nas suas costas, refletiu, ciente do desafio que a aguardava. Cristo era filho único, e uma família do tamanho da dela devia ser um choque para ele. No momento Franco puxava a aba do paletó de Cristo, erguendo o rosto e fitando-o com adoração. Pelo menos Cristo estava tolerando a criança, Belle pensou, imaginando se isso seria o máximo que obteria. E quanto a ela? Iria apenas tolerá-la também? Estremeceu ao pensar assim.


– Aonde vai? – perguntou Cristo, quando ela se dirigia para a escada. – Vou me trocar... para o voo que você mencionou – respondeu ela constrangida. Ele agora era seu marido, e resolvera que deixariam a Irlanda algumas horas após o casamento. Ela pensara em discutir, mas não vira motivo para adiar o inevitável. Abrira mão da própria vida para fazer parte do mundo dele, e deixar seu lar era o primeiro passo do processo. – Não – murmurou ele. – Gosto desse vestido. Não tire. Surpresa, Belle arregalou os olhos. – Não posso ir para o aeroporto


vestida assim. – Tenho um jato particular e não passaremos pelo saguão do aeroporto. Fique com esse vestido, bellezza mia – insistiu Cristo. – Que seja eu a tirá-lo mais tarde. Com o rosto em fogo e a respiração difícil, Belle correu escada acima, sem poder acreditar que ele lhe dissera tal coisa. Cristo já estava fantasiando sobre tirar o vestido dela. Enquanto ela se preocupava sobre como Cristo iria se dar com seus irmãos, ele pensava em sexo. Seria só nisso que se basearia seu casamento? Sexo e a ameaça de um escândalo afastada? E, se assim fosse, o que ela podia fazer a respeito? Todos os avisos da avó


voltaram-lhe à mente. E se Cristo fosse cruel? Infiel? Belle engoliu em seco tentando se dominar. “Você fez sua cama, agora deite nela... literalmente”, disse a si mesma com severidade enquanto checava a pequena bagagem que preparara para si e Franco.

FRANCO CHOROUe pediu para sair do carro durante todo o trajeto para o aeroporto. Vendo que Cristo não conseguia disfarçar a irritação e triste por estar deixando seu lar e tudo que conhecia e amava, Belle tentou distrair a criança. – Por que sua mãe teve tantos filhos


com meu pai? – perguntou ele de repente. – Ela sempre quis uma grande família e creio que as crianças foram uma compensação por não passar muito tempo com Gaetano – respondeu Belle –, mas Gaetano não se importava com eles. Quando vinha para a Irlanda os filhos ficavam com Isa e o viam apenas por dez minutos. Ele não tinha o menor interesse neles. – Era assim também comigo e meus irmãos. – Eu o odiava! – declarou Belle em um rompante. – E me senti culpada por isso quando ele sofreu o acidente. – Não deveria, cara – consolou Cristo. – Era um homem muito egoísta


que vivia apenas para seu próprio prazer e lucro, e nada mais importava para ele. Belle se ajeitou no assento do sofisticado jato particular. Franco adormecera e, assim que acomodara o irmãozinho, Cristo informara que contratara uma babá para a criança, e que estaria esperando quando chegassem ao seu destino. – E esse destino... é? – Itália. Vou levá-la para minha casa lá. – Veneza... estamos indo para Veneza? – murmurou Belle, de repente muito amimada. – Não, Veneza é onde minha mãe e


meu padrasto moram. Herdei uma propriedade na Úmbria que pertencia há gerações à minha família materna. Desculpe, mas não vamos para Veneza. – Sua mãe não vai se aborrecer por não ter ido ao seu casamento? – Ela o fitou com curiosidade. – Duvido. Tudo que faz Giulia, minha mãe, se lembrar de Gaetano a deixa de muito mau humor – admitiu Cristo. – Ela jamais se recuperou do sofrimento que meu pai lhe causou. Você não ficará cinco minutos na companhia dela sem que lhe conte que Gaetano lhe roubou seus melhores anos de vida e que dormiu com todas as mulheres que encontrou... entre elas sua melhor amiga e sua criada particular.


– Céus! – murmurou Belle chocada com a revelação. Durante o voo, mesmo com o laptop aberto na sua frente, Cristo não deixou de observar Belle. Estava fascinado com sua vulnerabilidade. Mas não deveria pensar assim; afinal, a filha de Mary Brophy devia ser tão esperta quanto a mãe, pois não hesitara em usar os filhos de Gaetano, seus irmãos, como uma arma, e agora se tornara sua esposa. Entretanto, Belle parecia sempre tão natural e sem artifícios como nesse momento, lendo uma revista. Com um suspiro ele retornou ao relatório financeiro no seu laptop. Teresa, a babá, uma mulher de meia-


idade com um sorriso caloroso, os cumprimentou no aeroporto e logo tomou nos braços o menino adormecido. Belle não entendia o que Cristo esperava que fizesse com seu tempo enquanto outra pessoa se ocupava do irmãozinho. Após percorrerem de carro quilômetros de terras cultivadas, o sol já se punha, quando a limusine começou a subir um atalho na montanha. – Parece que vamos para o fim de mundo – comentou ela. – Na opinião de minha mãe, o Palazzo Maddalena, nome de uma ancestral sua, é isso mesmo. Um lugar no fim do mundo. Nunca foi do seu gosto. E enquanto o carro rumava para a


construção de pedras no alto da montanha, Belle pensou que também não fazia seu estilo, e sentiu o coração apertado. Pela primeira vez a realidade a atingiu, e percebeu como o casamento com Cristo mudara sua vida. De menina simples que morava em uma casa modesta para a grandiosidade desse palácio, tudo a deixava zonza. O palácio era uma construção de três andares com alas espalhadas. Jardins bem cuidados desciam a colina enquanto picos nevados serviam de pano de fundo. Pálida como um fantasma, Belle desceu da limusine, o lindo rosto sem expressão, o vestido de noiva dançando


ao vento à luz do crepúsculo. Sua esposa, seu lar onde ele era livre. A tensão de Belle não era surpresa, e Cristo sabia muito bem por que ela preferia ter ido para Veneza. De que adiantava se casar com um bilionário se não usufruísse das vantagens que vinham com esse enlace? Em Veneza ela poderia conviver com os amigos famosos e ricos de sua mãe, fazer compras nas butiques de luxo e adquirir joias. Um palácio ancestral no alto de uma montanha não era uma troca justa. – É um ótimo lugar para uma lua de mel – informou Cristo com um ligeiro ar de troça. Uma lua de mel? Bem, estava casada. Mas por que Cristo ria dela? Será que


achava engraçada a união de um rapaz criado na opulência com a filha da governanta? Ora! E por que não acharia graça nisso? Belle corou ao entrarem no palácio. Sabia que a hora se aproximava. Já haviam jantado no avião, portanto nem mesmo essa desculpa ainda teria para atrasar o momento de ir para o quarto com o marido. Esse fora o acordo que garantiria um bom futuro para seus irmãos, que cresceriam em segurança como membros da família Ravelli, e ninguém poderia rir deles outra vez. Nunca mais precisariam se preocupar com o que comer, e enquanto pensava em todas as vantagens de ter se casado


com Cristo, Belle sossegou. Franco se agarrava ao seu vestido enquanto subiam as escadarias e o empregado que os fizera entrar mostrou primeiramente um quarto de criança onde a babá tentou pegar o garotinho de Belle. Mas Franco não gostava de lugares estranhos e começou a soluçar se agarrando à irmã, até que Cristo precisou separá-los. A babá então o segurou com cuidado enquanto ele estendia os bracinhos para Belle. Cristo a impediu de se aproximar. – É nossa noite de núpcias – lembrou com frieza, deixando-a ainda mais perturbada. Na opinião de Belle, apenas pessoas


que se amavam tinham uma noite de núpcias, porém não fora esse o acordo, tratou de se lembrar enquanto Cristo a guiava pelo longo corredor e abria a porta de um quarto enorme. A primeira coisa que Belle viu foi a cama gigantesca com quatro colunas. De repente lamentou nunca ter tido experiências sexuais com outros homens, pois isso a deixaria mais segura agora. Cristo a abraçou por trás e seu perfume a deixou tonta. Era uma mistura cítrica e amadeirada que mexia com seus sentidos. Ele afastou seus cabelos e a beijou na nuca. – Adoro você com esse vestido,


gattina mia – murmurou ele com a voz rouca e os lábios de encontro a sua pele. A excitação dominava Belle. Jamais imaginara que Cristo Ravelli pudesse ser tão sensual. Ele a fez se voltar, e em seguida retirou o vestido, que caiu aos seus pés. Belle ficou imóvel, apenas de calcinha e sutiã de renda e as meias com ligas. – Valeu a pena esperar por você – disse ele. – É linda, cara. Então ele a beijou na boca, fazendo-a perder o fôlego. Quando se separaram, ele tirou a própria roupa, imaginando por que ela ficava corada com isso. Abrindo seu sutiã, comentou: – Você está muito quieta. Tive três semanas para pensar neste momento... e


a desejei no instante em que a vi pela primeira vez. – Quando pensou que eu era minha mãe? – Antes disso a vi, quando cruzava o gramado com o cão. – Percebeu que Belle estremecia e perguntou: – Está com frio? – Um pouco nervosa – sussurrou ela. – Por quê? – Nunca fiz isso antes. – Quer dizer... comigo – completou ele. – Com ninguém – revelou ela de maneira simples. Cristo ficou paralisado. – Está me dizendo que é virgem? Não


é uma farsa para fantasiar a noite de núpcias? Ela o encarou surpresa, imaginando por que ele pensaria em tal coisa. Fitando seus olhos verdes, Cristo descartou a ideia de uma noite de muito sexo. Ela não suportaria. Uma virgem. Mas ainda estava convencido de que Belle mentia. Não esperara que fosse virgem e não sabia se tal fato o agradava ou não. – Está desapontado? – perguntou Belle. – Não. Você é minha esposa – respondeu ele, de certa forma satisfeito por ela não poder compará-lo com outros homens. – Não sei que diferença isso faz. Não


sou quem você esperava. Cristo estava cansado de falar. Beijou-a de novo, deslizando os lábios para seus seios. – Não... não – implorou ela tentando se afastar, quando se viu deitada na cama. – Confie em mim, Belle. Tomarei conta de você. Ela repousou a cabeça nos travesseiros e fechou os olhos, tremendo de vergonha e excitação sexual. Cristo continuou a beijá-la, deixando-a louca de desejo ao entreabrir suas pernas e provar da parte mais íntima de sua feminilidade. Depois se posicionou sobre seu


corpo. – Poderá doer um pouco – avisou com delicadeza. – Sei disso... Não sou uma criança. Pela primeira vez na vida ele estava mais preocupado com sua parceira do que consigo mesmo, o que era uma sensação estranha. Por fim, após mais algumas carícias, ele a penetrou com uma estocada firme. Belle gritou mais de susto do que de dor, murmurando: – Não foi tão ruim... continue. Continue? Cristo riu, mas logo as sensações foram se sucedendo, e ele já não ria com a respiração apressada, os movimentos cada vez mais ritmados, até que Belle estremeceu da cabeça aos pés


em um clímax poderoso que a deixou exausta. – Bem, valeu a pena casar para isso, bellezza mia – resmungou ele ao seu ouvido. – Pode ser uma chantagista, cavadora de ouro e alpinista social, mas é fabulosa na cama. Belle arregalou os olhos em choque e o empurrou para trás. Saiu da cama e rumou para o banheiro, desejando que ele não tivesse sido tão rude e cínico ao se expressar a seu respeito. Não havia nada ali que pudesse atirar na cabeça dele, então encheu um copo com água, deixou o banheiro, e atirou a água no rosto dele. Espantado, ele se sentou na cama


muito viril e belo, com a pele morena e os cabelos negros em desalinho. – Que diabo foi isso? – perguntou, enxugando a água do rosto. – Não ouse nunca mais falar comigo assim, seu cafajeste! – gritou Belle furiosa. – Falar com você...? – Ele pareceu compreender. – Não gostou de minha sinceridade? – Não sou chantagista, cavadora de ouro ou alpinista social! – berrou ela. – Como ousa me acusar dessas coisas? Cristo respirou fundo. – Detesto mulheres dramáticas. – E acha que me importo com o que detesta ou não? – retrucou ela. – Se pensa que voltarei a compartilhar essa


cama com você depois do que me chamou, está muito enganado! – Penso sim, porque se não fizer isso pedirei o divórcio – retrucou ele com calma. – Muito bem! Sou eu quem deseja um divórcio agora! – replicou Belle, antes de voltar para o banheiro e trancar a porta com raiva. Cristo percebeu que não soubera manejar muito bem a situação que se criara. Aliás, não costumava ser tão franco, externando suas ideias e opiniões com facilidade, contudo algo no ato sexual que acabara de ter virara sua cabeça. Será que desejava que Belle soubesse o que pensava a seu respeito?


Deu de ombros furioso. Falara o que pensava e n達o iria se desculpar.


Capítulo 6

QUASE

DUAShoras mais tarde, Cristo

olhou para todos os lados da cama como se sua concentração fosse materializar Belle sob os lençóis desfeitos. Ele fora tomar banho em outro quarto, dando tempo para ela se acalmar, porém Belle, sempre cabeça-dura, saíra do banheiro e deixara o quarto de casal. Mas para onde fora? Eram 11 horas e o palácio distava vários quilômetros da estrada principal.


Cristo deixou escapar o ar dos pulmões com raiva. Tivera a melhor noite de sexo de sua vida e isso o deixava louco. Por que precisara contar a ela o que pensava a seu respeito de maneira tão rude? Não conseguindo responder sua própria pergunta, ficou ainda mais furioso. Era sua noite de núpcias e a noiva fugira. Não podia ser considerado um bom começo para Cristo, um perfeccionista. Era uma bofetada no rosto e um lembrete desagradável de que não passava de um ser humano com defeitos e falhas. Nos jardins cercados por terraços, Belle balançou as pernas enquanto se sentava em um banco de pedra, tentado


se acalmar. Infelizmente não sabia para onde ir, mas sem dúvida não voltaria para dentro do enorme palácio, onde se sentira uma ajudante de cozinha procurando pelo seu lugar. Oh, vovó! Por que não a ouvira? Estava cheia de remorso e nojo de si mesma. Casara-se com um homem que sem dúvida a desprezava. E, pior ainda, dormira com ele, o que no momento parecia o maior de seus erros. Lágrimas escorriam silenciosamente por suas faces, pois jamais se sentira tão sozinha e deslocada na vida, pelo menos depois da adolescência e das humilhações que os colegas de escola lhe impunham. No momento se sentia presa em uma armadilha, um casamento que a prendia


porque esperava uma vida maravilhosa para seus irmãos. Não podia apenas ir embora; não era tão simples assim. Dizer que queria o divórcio era o mesmo que contar uma piada. Cristo Ravelli. Ele a dominava como ninguém mais conseguira, despertando sentimentos, pensamentos e reações que ela não podia controlar. Estava enfeitiçada, e por isso se comportara tão tolamente como sua mãe fizera com Gaetano, incapaz de manter distância e ignorando o quanto tal relacionamento iria lhe custar. Como iria lidar com Cristo? Ele estava a anos-luz de distância em matéria de sofisticação. Era um Ravelli


que aprendera desde o berço a ser uma pessoa superior. Belle passou os braços pelos joelhos, balançando os quadris sobre o duro banco de pedra de maneira inconsciente, os dedos apertados enquanto tentava afastar as lágrimas. Bem, o feitiço terminara. Ele o destruíra. Belle o detestava pelo que lhe dissera no quarto, logo após possuir seu corpo para o próprio prazer. Muito bem, refletiu de má vontade, ela sentira prazer também. Não podia fingir que não participara e gostara, mas não estivera preparada para tanta paixão. Sempre imaginara algo muito menos excitante na noite de núpcias. Por sorte era uma noite de luar, resmungou Cristo consigo mesmo,


descendo os vários degraus que conduziam aos jardins. Estava de péssimo humor. Confessar a Umberto, o mordomo do palácio, que sua noiva desaparecera fora muito embaraçoso. Porém, se não a encontrasse, seria ainda mais constrangedor chamar a polícia. E também não sabia o que iria lhe dizer se a encontrasse. Deveria mentir e declarar que não tivera a intenção de dizer o que dissera? Pedir desculpas por falar a verdade? Pois sim que se desculparia agora que precisava procurá-la pela propriedade inteira no meio da noite! Dio mio! Estava preocupado com Belle. E se tivesse perdido o equilíbrio no escuro e


caído? Enveredado por um atalho e sido pega por um pervertido ou estuprador? Seu temperamento fogoso poderia colocá-la em maus lençóis, refletiu ele preocupado, e de repente sua imaginação o fez pensar em coisas nas quais nunca pensara antes. E então ouviu um rumor de passos sobre as pedrinhas do caminho. – Belle? – chamou. Assustada ao ouvir a voz dele, Belle retornou para o banco de pedra, apertando os lábios, mas ele continuou a chamá-la e seu silêncio começou a parecer infantil e egoísta. Por fim gritou: – Vá embora! O alívio dominou Cristo. Ela estava bem e sem dúvida viveria muitos outros


dias ao seu lado. Tal pensamento o encheu de uma estranha satisfação. Seguiu o som de sua voz até o pavilhão do jardim, ao fundo da propriedade, onde havia um riacho e uma cachoeira. Fazendo a curva em um dos vários atalhos, ele a viu sentada no escuro, as longas pernas estendidas, os olhos refletindo o luar. – Estava preocupado com você – declarou, parando perto dela, sua altura o deixando imponente e seguro de si. – Não ateneu seu celular. – Não o trouxe comigo e tenho certeza de que sua preocupação não era tão grande assim – retrucou Belle com frieza, reparando que Cristo ficava


ainda mais bonito de jeans desbotado e camiseta, os pés enfiados em sandálias de couro. – Sei disso pelo modo como falou comigo. – Foram o lugar e a hora errados – admitiu ele, subindo um degrau para acender a vela de um lampião pendurado no muro e colocando-o no centro da mesa de pedra em frente ao banco. A luz tremulante iluminou os rostos dos dois. – Mas o que pensa de mim ficou muito claro... chantagem? – Disse a você que outras pessoas poderiam ficar muito mal se você levasse sua história sobre seus irmãos para os tribunais – lembrou Cristo. –


Você me respondeu que não se importava. Seus irmãos, não dele, Belle notou com irritação, já que Cristo continuava a negar os laços de sangue. – E por que me importaria? Nem você nem seus irmãos legítimos se preocupam com as minhas crianças. – Nik e Zarif nem sabem da existência dessas crianças ainda – lembrou Cristo. – Para Nik não será uma revelação muito traumática, mas para Zarif tomar conhecimento que seu pai teve uma amante durante anos e vários filhos com ela será devastador. Ele é o novo rei de Vashir. Belle ergueu os olhos com


impaciência, tentando não ficar impressionada. – Já sabia disso. – A sociedade de Vashir é muito devota e conservadora. O comportamento de Gaetano provocará um grande escândalo lá, o que afetará a imagem de Zarif. Todo governante tem opositores, que, nesse caso, usarão a história contra Zarif para lembrar ao povo de que seu pai era um estrangeiro com um estilo de vida dissoluto e sem religião. Zarif não merece isso. Como todos nós, pagou o preço por ter um pai como Gaetano quando ainda era criança – informou Cristo com voz sombria. – Propus me casar com você e adotar as crianças justamente para prevenir esse


escândalo. Nosso enlace legítimo e sacramentado por Deus e os homens calará a boca dos maledicentes, pois a situação estará remediada. – Não apenas é tarde para me chamar de chantagista como é injusto! – exclamou Belle, com os olhos fuzilando de raiva. Cristo rangeu os dentes, e ela prosseguiu: – Não fiz chantagem com você! – disse, se levantando do banco e o enfrentando cara a cara. – É claro que meu plano de ir aos tribunais deixou você entre a cruz e a espada, mas a decisão de se casar comigo foi sua! Não sabe o que diz!


– Sei exatamente o que digo... ninguém sabe melhor que eu! – replicou Cristo com uma raiva inesperada, os olhos negros brilhando. – Gaetano levou minha mãe ao tribunal na tentativa de ficar com a minha custódia quando eu era menino. É claro que sua intenção era apenas ganhar mais dinheiro com o divórcio. Não queria a mim; jamais me quis. Entretanto, todos os segredos sujos do casamento de meus pais foram divulgados no julgamento e se transformaram em manchetes por toda a Europa. Ainda pode ler sobre isso online se souber onde procurar. – Fez uma pausa e suspirou. – Acha que seus irmãos iriam agradecer a você daqui a


alguns anos se vissem o mesmo acontecer conosco? Belle não pensara por esse ângulo e engoliu em seco. – Mas também não quero sua caridade – replicou ela. – Não estou fazendo caridade, Belle. Ela riu. – Vi o que fez com Mayhill... calou a boca de todos sobre Gaetano, Mary e seus filhos, doando a propriedade para o vilarejo e deixando o chalé para nós. – E você não fez o mesmo colocando uma aliança no dedo?– replicou ele. – Também calou a boca de todos. – Não! Seja lá o que pense a meu respeito, não sou uma cavadora de ouro ou alpinista social! Casei com você por


causa de meus irmãos e irmãs, para que não sofressem o que sofri! – E que sofrimento foi esse? – perguntou Cristo com impaciência. – Quando mamãe começou seu relacionamento com Gaetano e depois, quando teve Bruno, creio que as pessoas se sentiram inclinadas a fechar os olhos porque todos sabiam que ela passara maus bocados com meu pai. – Belle respirou fundo e continuou: – Na época, os moradores do vilarejo tinham pena dela... meu pai fora um bêbado violento. – E depois? – quis saber Cristo, sem deixar de fitar o rosto lindo de Belle. – Depois tudo ficou ruim para nós, porque mamãe continuou o


relacionamento com Gaetano sem a bênção do casamento e continuou a ter filhos com ele. Todos sabiam que Gaetano tinha uma esposa no exterior. Então concluíram que mamãe era uma desavergonhada e pararam de falar com ela. Chegaram ao ponto de não atendê-la nas lojas do vilarejo – contou Belle com voz triste. – Como o chalé ficava fora dos arredores, ela fazia compras em outro lugar, de modo que a hostilidade não a atingia muito, porém precisei frequentar a escola com os filhos das pessoas que a julgavam... Parou de falar de repente como se tivesse voltado milhares de anos no passado. De repente foi como se entrasse de novo em uma sala de aula


como adolescente vulnerável. Fora chamada de vagabunda pelas outras meninas porque todo mundo aceitava que Mary Brophy era uma mulher má que criava os filhos em um lar dissoluto onde não havia as regras mais básicas de moralidade e decência. – Exceto por Mark, nunca tive muitos amigos – admitiu ela. – As outras mães não deixavam as filha se misturarem comigo ou visitarem minha casa. Ficou pior quando me tornei mais velha porque então foram os rapazes que começaram a me xingar e a se aproximar de mim. Bem, você pode imaginar com que intenção. Cristo estava chocado com a narrativa


de Belle. Jamais pensara nas pessoas que ousavam desafiar os costumes nas cidades pequenas. – Não queria que meus irmãos e irmãs menores passassem por isso – concluiu ela. – Claro que não, cara – murmurou ele, de repente percebendo que Belle não tivera experiências sexuais anteriores porque não desejara ser rotulada como a mãe. – E Bruno? – perguntou. – Também sofreu humilhações. Por isso ele e Donetta foram enviados para o colégio interno. – Vai voltar para o palácio? – perguntou Cristo, após o silêncio que se seguiu. – São duas horas da manhã.


– Você me ofendeu muito e foi desrespeitoso também. – Sí, bellezza mia, porém a total honestidade é o melhor caminho em um casamento como o nosso – respondeu Cristo – e eu não sabia dos problemas que teve. Belle pensou nesse cenário enquanto subia os intermináveis degraus para entrar no palácio de novo, e de repente toda a emoção e atividade do dia a encheram de fadiga. – Mesmo assim não perdoei você – disse depressa. – Tudo bem – respondeu ele. Rumaram de volta para o quarto. Sob a luz forte Cristo pôde ver os riscos das


lágrimas no rosto de Belle. Ela era tão emotiva, e isso o irritava. Jamais esqueceria sua expressão magoada ao falar das humilhações na escola. Pensando assim, sua mãe, Mary, fora tão egoísta a sua maneira quanto seu pai, ele refletiu de mau humor, mas nada disse. Por outro lado não parava de se admirar com o carinho dela pelos irmãos e irmãs. Jamais conhecera tal afeto familiar, e pensou como seria diferente se seu lar tivesse sido assim também. Apesar do infortúnio que Gaetano causara, as crianças de Mary Brophy continuavam unidas. – Não vou voltar para aquela cama – anunciou ela quando entrou no quarto. Era hora do troco, refletiu Cristo. Ele


disse: – Não sou tão insensível. E não pretendia encostar um dedo sequer em você. – Sei disso, mas preciso de meu próprio espaço por uns tempos – respondeu ela constrangida. – Gostaria que ficasse comigo – murmurou Cristo sem saber por que, mas consciente de que não desejava ficar longe dela. Minutos mais tarde, tendo vencido essa batalha, Belle caiu como uma pedra sobre a cama confortável no quarto anexo e fechou os olhos. Desejara ficar com Cristo, mas se negara a fazer isso, pois a razão lhe dizia que seria errado.


Seria um erro deixar que Cristo pensasse que podia fazer e dizer o quisesse sem consequências. Chantagista, cavadora de ouro e alpinista social? Será que ela poderia provar que essas suspeitas eram infundadas? E será que desejava fazer isso? Importava tanto assim? Afinal, seu casamento era de conveniência, e ela precisava aprender a dominar as emoções e parar de procurar por respostas que provavelmente não teria. Não podia se importar com alguém que pouco se importava com ela, mas pelo menos queria o respeito de Cristo Ravelli. Enquanto isso ele estava na cama sem


conseguir dormir e resmungando. Sabia que Belle o tratara como tratava Franco, dizendo que “não é não”. No escuro surpreendeu a si mesmo dando uma gargalhada. Ela o desafiara. Nenhuma mulher jamais ousara, e ele a admirava por isso.

NA MANHÃseguinte, Cristo acordou com algo pulando sobre a cama, e abriu os olhos enfrentando os raios de sol. – Beijo! – gritou Franco, olhando para ele. – Belle? – Está dormindo – respondeu Cristo, se cobrindo melhor com o lençol. – Café? – perguntou Franco cheio de esperança, se debruçando sobre ele com


os olhos arregalados. Imaginando onde estaria a babá, Cristo prometeu lhe dar o café da manhã e Franco sorriu de alegria. E o bilionário ficou surpreso quando a criança passou os braços pelo seu pescoço e lhe deu um beijo estalado no rosto. Depois acompanhou Cristo, tagarelando sem parar em uma língua que só ele conhecia. Cristo tomou banho e fez a barba enquanto Franco brincava com os conteúdos de gavetas e armários, fazendo uma grande bagunça. Enquanto se vestia, o menino brincava debaixo da cama repetindo sem parar: – Café. Beijo.


Franco deu a mão para Cristo ao deixarem o quarto e a babá afobada surgiu adiante no corredor. – Lamento tanto, sr. Ravelli. Estava procurando por ele em todos os lugares. Desapareceu enquanto eu tomava banho – balbuciou Teresa. – Tudo bem, vou providenciar o café da manhã dele – respondeu Cristo de bom humor. – Café – repetiu Franco com ansiedade, sacudindo a mão de Cristo. Era encantador observar a afeição sincera e a vivacidade do garotinho, ele refletiu. Na sala de jantar, Umberto providenciou um antigo cadeirão de


criança, e Cristo pediu que o mordomo comprasse outro mais moderno e seguro, pois já sabia que Franco era fujão e gostava de escalar e descer do berço sozinho. Tudo que Cristo comia Franco comia também, fazendo uma grande bagunça em volta do prato. Quando tentou atirar um pedaço de tomate para longe, Cristo o repreendeu, e Franco desatou em lágrimas no instante em que Belle entrava na sala. – Céus! Não sabia que ele estava com você! – murmurou ela. – É um mocinho muito determinado – comentou Cristo, tentando se fazer ouvir acima dos gritos de Franco. – Dei uma bronca nele por jogar comida fora do


prato. Franco logo percebeu que seus soluços não comoviam ninguém e voltou a comer muito contente. Belle sorriu. – Obrigada por tomar conta dele. A beleza de seu sorriso o deixou sem fôlego e seus olhos escuros se estreitaram de modo apreciativo. Era de manhã e não notava nenhum traço de maquiagem no rosto de Belle, mas mesmo assim estava linda, com a pele de porcelana rosada, os olhos reluzentes e os cabelos caindo como fios de cobre sobre os ombros. – Ele também é meu irmão – murmurou Cristo – e dá muito trabalho.


– Sim, é verdade. Demais para a idade de Isa. Satisfeita pela admissão de que Franco também era irmão dele, Belle não conseguiu parar de fitá-lo. Voltou a pensar que possuía a beleza sombria de um anjo caído. Uma enorme excitação a invadiu porque o julgava irresistível. O rumor de um helicóptero interrompeu a conversa. Belle, que já se sentara e mordiscava uma torrada, perguntou: – O que é isso? – Creio que vai conhecer um de meus irmãos – respondeu Cristo. – Nik. Faça vista grossa se não for muito simpático com você. Está passando por um


doloroso processo de divórcio. – Vou desaparecer agora mesmo para que vocês dois possam conversar à vontade – tranquilizou Belle, erguendo depressa o menino do cadeirão. – Não – interrompeu Cristo. – Nik deve conhecê-la agora, gioia mia. É minha esposa, não tenho vergonha de você nem pretendo escondê-la.


Capítulo 7

CRISTO

SAIUpara

cumprimentar o irmão, Nik. Os dois se detiveram no terraço para conversar. Belle ouviu as vozes animadas em uma língua entranha. Não parecia italiano e imaginou se seria grego. Quando ouviu Nik falar mais alto e nervoso, pressentiu que Cristo lhe contara sobre sua mãe e seus irmãos, e fez uma careta, constrangida e preocupada. Nik Christakis era um homem grande,


mais alto que Cristo, porém ambos eram muito parecidos. Nik franziu a testa ao vê-la do outro lado da sala e ficou ainda mais sombrio ao se deparar com a criancinha ao seu lado. – Minha esposa, Belle, e nosso irmão caçula, Franco – apresentou Cristo com calma diante do olhar de interrogação de Nik. – E este é meu irmão Nik. – Nosso irmão caçula? – repetiu Nik sem prestar atenção à apresentação. – Essa criança nada tem a ver comigo. E são cinco ao todo? Deve estar louco para assumir isso, Cristo! Gaetano está morto e enterrado. Por que se importar em revolver sua lama agora? – Importará para Zarif – lembrou Cristo com secura.


– Não me interessa! – retrucou Nik, enfiando a mão no bolso e retirando um documento que estendeu para o irmão. – Leia e chore. Aprenda o que acontece quando as pessoas se casam sem fazer um acordo pré-nupcial. – Nós não fizemos – comentou Belle, sem jeito com a tensão em volta e a teimosia de Nik em ignorá-la com rudeza. – Estou surpreso – comentou Cristo enquanto lia. – Verdade? Ainda é tão ingênuo? Sem dúvida Betsy se casou comigo por interesse e agora tenta tirar metade do que tenho! – declarou Nik sem esconder a amargura na voz.


– Ela não se casou por dinheiro – contradisse Cristo com segurança. – Ela se apaixonou por você. – Não seja tolo. Dou no máximo dois anos para sua esposa e o bando de Ravelli ilegítimos partirem e tentarem tirar até sua camisa! – declarou Nik. Belle corou e ergueu o queixo. – Não apostaria nisso. Vou deixar os dois conversando em particular – concluiu, pegando a mão de Franco. Ao partir, ouviu Nik Christakis praguejando algo reconhecível em qualquer idioma. Belle agradeceu por não estar casada com um homem como ele. As feições duras de Nik, seus olhos frios e a amargura com que se referia à


esposa faziam Belle estremecer. Sem dúvida era um homem duro, obstinado e muito hostil, do tipo que se transformaria em inimigo implacável e que via apenas o pior nas pessoas. Cristo, por outro lado, refletiu Belle, era mais razoável. Civilizado... não era? Respeitava-o por ter falado em favor da cunhada e gostara do que sugerira na noite anterior sobre serem absolutamente honestos um com o outro para fazer o casamento funcionar. Era uma atitude racional e madura, e ela adorava a honestidade e odiava as mentiras. Gaetano agira sempre com mentiras desavergonhadas para manter sua mãe contente e facilitar sua própria vida.


Duas horas mais tarde, quando por fim Nik partiu, Cristo foi à procura de Belle e a encontrou à sombra de uma árvore com um livro nas mãos. – Você possui uma biblioteca e tanto – comentou ela –, mas só encontrei dois ou três romances em inglês. Com delicadeza, Cristo tomou o livro de suas mãos e leu o título. Era um volume pesado sobre a história da família de sua mãe, escrito por um de seus ancestrais e traduzido mais recentemente por outro. – Encomendarei livros em inglês para você. Gostaria de sugerir que começasse a aprender italiano, mas não sei se valerá a pena.


Ela ficou tensa enquanto absorvia o lembrete: seu relacionamento não a obrigava a se mostrar muito em sociedade. Imagens da paixão que haviam compartilhado na noite anterior povoavam sua mente, sufocando qualquer pensamento sensato. Com o rosto pegando fogo, examinou o livro enquanto Cristo lhe devolvia, fazendo um gesto de mão elegante. Na noite anterior aquelas mãos a haviam acariciado com grande prática, provocando mais prazer do que ela julgara ser possível. Entretanto, a calma e quase indiferença dele depois disso a deixavam furiosa. Era evidente que para Cristo a noite


de núpcias fora algo irrelevante, mas para Belle fora uma experiência inesquecível. – Estava procurando por mim? – perguntou ela com curiosidade. – Sim, cara. É hora de receber seu presente de casamento. – Presente de casamento? – repetiu Belle, levantando-se devagar com constrangimento. – Do que está falando? – Um enlace matrimonial pede um presente – murmurou Cristo, fazendo-a se voltar para o palácio. – Mas não no nosso tipo de casamento – disse ela. – Prometi tratá-la como minha digna esposa e é isso que tentarei fazer. – Então... esse presente...? –


perguntou Belle, enquanto caminhavam pelo saguão. – Espera por você no salão de baile – ele informou, acenando para Umberto abrir as portas duplas. Belle avançou devagar, fitando dentro do enorme salão para se concentrar com espanto na passarela que fora montada ali. – Meu Deus, o que...? – começou confusa. – Toda mulher deseja um guardaroupa novo. Organizei um desfile com modelos só para você. Tudo que precisa fazer é escolher o que quiser. Toda mulher deseja um guardaroupa novo? Sim, a maioria das


alpinistas sociais e cavadoras de outro desejariam isso, refletiu Belle, começando a sentir um grande desdém por ele ter presumido que era de fato desse tipo. Porém, Cristo não lhe dera escolha. Era isso que pensava ser seu grande desejo, estava contente por poder satisfazê-la, e sem dúvida seria inútil ela discutir e se negar a ver o desfile. Assim que entrou no salão foi apresentada à Olívia, vendedora de uma célebre butique. Em vez de estender a mão para cumprimentar Belle, a mulher elegante empunhou uma fita métrica, tomando suas medidas com enorme velocidade e eficiência e anunciando que as roupas que escolhesse seriam providenciadas na sua numeração e


entregues à hora do almoço do dia seguinte. Música funk começou a soar enquanto Olívia ocupava uma das poltronas confortáveis pedindo para Belle definir “seu estilo pessoal.” Belle não fazia a menor ideia do que responder. Mas, de qualquer modo, Olívia já comentava sobre o primeiro traje que surgia no corpo de uma modelo morena. Era algo esvoaçante, púrpura e que delineava as curvas da moça muito bem. A seguir foi a vez de uma loura de cabelos quase brancos surgir desfilando em um maiô. Belle refletiu que nunca tivera recursos para ter um “estilo pessoal” tão luxuoso de se vestir. Quando estudante,


usara jeans no inverno e shorts no verão, tendo apenas uma saia e um vestido barato para usar em ocasiões especiais. Até hoje só fizera compras em lojas populares de departamentos. – Não gosta de nenhum? – perguntou Cristo ao vê-la tão calada. Ela o fitou, sentindo o coração acelerar. – É demais... tudo isso – admitiu sem fôlego. – Então escolherei por você. E o que Cristo escolheu quase fez Belle explodir em risadas, pois tudo o que ele preferia eram saias curtas, trajes sem costas e decotes profundos. Nesse ponto era muito previsível e masculino. Divertida por ele se revelar um sujeito


tão normal por trás da fachada de sofisticação, recuperou a confiança e começou a dar sua opinião timidamente, rejeitando os trajes mais espetaculares em favor dos mais simples e insistindo que rosa-choque não combinava com a cor de seus cabelos. – Gosto de cor-de-rosa – argumentou Cristo sem hesitação, embora de repente se lembrasse do espanto que sentira na pequena casa da Irlanda totalmente decorada em cor-de-rosa. Porém, sua esposa usando essa cor... era bem diferente. – Deve evitar apenas alguns tons de rosa – garantiu Olívia, a vendedora perfeita.


Nesse momento a modelo loura ressurgiu usando uma espetacular lingerie azul-turquesa. Cristo se levantou de supetão, se aproximando da passarela. – Levaremos essa – anunciou sem hesitação. Belle refletiu se pretendia levar apenas a lingerie ou a loura também. Suas faces ardiam de desconforto ao ver como a modelo fazia pose para ele, exibindo as lindas pernas e se voltando para mostrar o fio-dental. Cristo parecia fascinado e com dificuldades para controlar os maus pensamentos. Sentia-se atraído pela loura, concluiu Belle, com uma sensação de aperto no


estômago. Ele não conseguia disfarçar. – Obrigada, Sofia – disse Olívia em voz alta para a modelo no instante em que a música parava, deixando uma sensação de constrangimento no ar. A vendedora se despediu e desapareceu na porta lateral do salão de baile. – Então, não foi bom? – comentou Belle com voz seca quando, por fim, Cristo retornou até a poltrona ao seu lado. Ele arqueou as sobrancelhas. – Como assim? – Você gostou da loura – acusou Belle sem hesitação. Cristo franziu a testa, e ela prosseguiu: – Oh, não se importe em fingir. Não


conseguiu tirar os olhos dela! Ele se ergueu com um gesto sensual, e para Belle pareceu que todo o oxigênio desaparecia da sala. – Só posso dizer uma coisa: não era a loura que estava vendo... era você usando aquela lingerie. Mas Belle não quis saber e lhe lançou um olhar irônico. – Sim, como se eu fosse acreditar nisso quando uma beleza de mulher desfilava na sua frente! – Acredite... se tenho uma mulher de verdade como você, por que desejaria um cabide de passarela? Belle arregalou os olhos. – E a loura não faz seu tipo?


– Você é o meu tipo – confidenciou Cristo. – Fantasiei você usando aquelas tirinhas de tecido e quase enlouqueci. Uma mulher de verdade? Belle quase riu. Afinal, a dieta rigorosa que fizera quando era adolescente não reduzira muito suas curvas, os quadris arredondados e os seios fartos. Naquela época daria tudo para ser igual às “magrelas” da escola e, já adulta, sempre acreditara que os homens modernos preferissem uma garota magra e elegante a alguém cheia de curvas. Não entrava na sua cabeça que Cristo fosse diferente. Ele afastou uma mecha de cabelos do seu rosto, colocando-a atrás da orelha


com um gesto de intimidade que a constrangeu. Era um gesto que dizia que Cristo tinha o direito de tocá-la, e ali estava, tão próximo e tentador com sua fisionomia máscula que a inebriava. Ele a tocou no rosto com os dedos morenos e longos desenhando a curva de seu queixo e o arco de cupido dos lábios. Belle estremeceu, sentindo uma inesperada excitação física. Seu coração batia forte. Ele era tão belo, tão sedutor que não podia culpar as modelos por terem feito questão de se exibir na sua presença... até demais. Cristo não era apenas o comprador, mas um homem lindo que magnetizava as mulheres. Belle já sabia por experiência própria, pois sempre que deixava de fitá-lo


necessitava olhar de novo para ele. Era uma compulsão contra a qual não podia lutar. – Poderá usar a lingerie azul só para mim – murmurou ele com desejo na voz. – Vá sonhando – retrucou Belle sem hesitar, pensando que Cristo teria que esperar muito para que ela desejasse usar roupas sensuais apenas para atraílo. O joguinho de sereia tentadora não era seu estilo e, em sua opinião, Cristo não precisava ser encorajado. Assim pensando, se dirigiu para o provador, onde, pelo menos, a conversa não seria ouvida pelas demais pessoas. – Não me diga que não tem a mesma fantasia – teimou ele, ficando na frente


de Belle e segurando-a pelos quadris. Belle desejou esbofeteá-lo, afastá-lo, pisar no seu pé protestando abertamente contra qualquer contato físico, e ia mesmo fazer uma dessas coisas, porém a boca de Cristo se comprimiu contra a sua, e ela deslizou as mãos pelo seu peito forte enquanto lutava contra o próprio desejo. Nos dois segundos entre pensar e agir, a língua de Cristo penetrou entre seus lábios e ela se viu perdida. Belle queria mais do que um beijo. Podia sentir o membro rijo e ereto de encontro às coxas e estremeceu. Por fim ele ergueu a cabeça e perguntou com malícia: – Podemos continuar lá em cima?


Belle queria dizer “não”. Entretanto, seu corpo ansiava pelo dele como jamais ansiara por nada na vida. Respirou fundo e devagar, lutando para clarear a mente. – Quero você e você me quer, cara – disse Cristo sem emoção. – Qual o problema? Ainda está com dúvida a respeito daquela modelo loura? Acha que eu seria tão canalha? – Não – concedeu Belle com relutância. Agora sabia que era verdade. Contudo, o vínculo que existia entre os dois era apenas atração física e muito pouco para construir um relacionamento sólido. Cristo arqueou as sobrancelhas.


– Então? Continua me julgando como se eu fosse meu falecido pai? – perguntou com impaciência. – Ou há alguma coisa no seu passado que a deixa tão desconfiada sobre os homens? Belle enrijeceu diante dessas palavras e murmurou: – Não sei do que está falando... – Creio que sabe. Observou Gaetano tecer uma teia de mentiras e ilusões em torno de sua mãe e o odiou por isso, mas eu não sou Gaetano. Belle rangeu os dentes. – Sei disso e não o acusei de nada. – Sim, me acusou de tentar flertar com aquela modelo na sua frente. Por quê? – retrucou Cristo muito tenso. – Que tipo


de homem procederia assim? – Reagi mal. Desculpe. – Belle virou o rosto para longe, mortificada. Havia certa verdade nas palavras dele. Ela desconfiava dos homens, mas de todos. Durante os anos na faculdade fora magoada por namorados que se ofendiam por ela não querer ir para a cama antes de conhecê-los melhor. Esses mesmos rapazes a haviam traído com outras garotas. Até com suas amigas. – Se quer que nosso casamento dê certo, não é essa a maneira certa de agir – disse Cristo em voz baixa. – Você disse que a honestidade era a melhor política – lembrou Belle, dando alguns passos para longe e depois se


virando para encará-lo com o rosto corado e tenso. – Então serei honesta. Para que o casamento dê certo quero mais do que apenas sexo. Quero que nos conheçamos melhor. Não se pode construir uma relação com base apenas na atração física. – Nunca soube que existisse outra coisa – resmungou ele. – Tem amigas? – perguntou Belle de supetão. Quando ele aquiesceu com um gesto de cabeça, ela sorriu. – Bem, então já sabe que existe outra coisa além de sexo. – Por que não fez essas exigências antes de se casar comigo? – reclamou


ele. – Só pensei nisso agora – declarou Belle com sinceridade. – Estava desesperada para dar segurança às crianças, e casar com você seria o preço a pagar. Não pensei em mais nada. Não pensei em como iria me sentir... Casar com você seria o preço a pagar. Não era uma declaração que Cristo esperara ouvir de Belle e também não acreditava muito nisso. Ela queria mais porque as mulheres sempre queriam mais do que lhes era oferecido. Já eram programadas no berço. Por outro lado, refletiu, será que pensara também no que iria acontecer? Cinco crianças para tomar conta... Belle o viu pensativo e resolveu


continuar, sempre com sinceridade: – Tive outros pensamentos que não deveria ter tido quando aceitei me casar com você. – Assim dizendo, riu de má vontade. – Porém, nada que dissesse respeito a ficar rica ou ingressar na alta sociedade. – Constrangida, prosseguiu: – Embora não pensasse realmente em me vingar de Gaetano, fiquei satisfeita com seu pedido de casamento e prometi a mim mesma ter sucesso. Só para desafiar o destino e provar que comigo dará certo. Além disso, não era justo que você pagasse pelos pecados de seu pai – terminou. Cristo ficou surpreso com tanta sinceridade nas palavras dela. Não


esperara por isso nem estivera preparado para vê-la admitir que seus motivos para casar fossem além da vontade de proteger os irmãos. Tanta franqueza era algo que Cristo não conhecia nas outras mulheres. – La via dell´inferno è lastricata dizendo buone intenzione... O inferno está cheio de boas intenções – traduziu ele em tom de troça. – Bem, na verdade nós dois não merecemos o inferno – enfatizou ela ainda constrangida. – Podemos transformar o limão em uma limonada. Disse que desejava me tratar como uma esposa de verdade e demonstrar respeito... Cristo percebeu que a história da


lingerie azul-turquesa a ofendera. Na noite anterior se transformara em seu primeiro amante e Belle fora espetacular, lembrou, ficando excitado apenas por recordar. Estava esperando demais em pouco tempo, concluiu, e murmurou: – Vou tentar. – Também tentarei – retrucou Belle, ensaiando um sorriso. Porém era tarde, porque Cristo já dera as costas e não a vira sorrir. Ela tentara externar nesse sorriso sua incapacidade de ser apenas um objeto sexual para ele e sua esperança de um entendimento melhor entre os dois no futuro.


Triste, Belle subiu para encontrar o irmãozinho e dar uma folga para Teresa. A afeição de Franco e sua total confiança nela eram um bálsamo para suas preocupações. Brincou de cabracega com o menino e a casa vibrou com as risadas e os pezinhos que corriam de um lado para o outro. Umberto parou à porta do escritório de Cristo para dizer com satisfação: – É uma alegria ouvir uma criança brincando aqui de novo. – Há mais quatro... um menino e uma menina de 8 anos e um par de adolescentes – confidenciou Cristo, que conhecia o bondoso criado desde criança.


– Os filhos de seu falecido pai? – perguntou Umberto. Cristo arqueou as sobrancelhas. – Como sabia? – Tenho ouvido rumores ao longo dos anos, senhor. Meu primo foi o piloto do helicóptero do sr. Gaetano até se aposentar – lembrou o velho com delicadeza. – Esperemos que os rumores permaneçam abafados – comentou Cristo com secura. – Ninguém da minha família já comentou ou irá comentar nada – garantiu Umberto com orgulho –, porém alguém o fará. O sr. Gaetano tinha outros empregados que poderão não ser tão


discretos. Uma onda de desconforto tomou conta de Cristo, que garantira um bom pagamento para os antigos empregados de seu pai já aposentados. Será que se casara por nada? Sem explicação pensou em Franco, que demonstrava uma necessidade tão grande da atenção de um homem adulto. Sem dúvida o menino precisava de um pai... ou de um irmão muito mais velho, refletiu, apertando os lábios enquanto ouvia as risadas do garotinho no andar de cima. – Não... não... não, Franco! – exclamou Belle, quando descobriu o irmãozinho examinando com grande atenção os objetos sobre uma mesa no quarto de Cristo. – Não toque em nada.


Sacudindo um molho de chaves na mão, Franco deixou cair a carteira que segurava. Belle se ajoelhou para recolher as cédulas que o menino amassara nas mãos, alisando-as antes de repô-las na carteira junto com os cartões de crédito, alguns cartões de visita e... uma minúscula fotografia. Belle a fitou surpresa, reconhecendo a esposa de Nik Christakis, Betsy. Era delicadamente bonita, loura com grandes olhos azuis que já vira nos jornais. Belle franziu a testa. Teria a foto caído da carteira ou simplesmente estivera por ali no chão? Mas o tapete sob seus pés parecia ter sido limpo com o aspirador de pó recentemente. Então, presumindo que a


fotografi a estivesse na carteira de Cristo, por que razão seu marido levaria consigo a imagem da esposa do irmão? Teria coragem de lhe perguntar por quê? Sentiu um suor frio na nuca só em pensar em uma conversa tão constrangedora. Depois de ter demonstrado ciúmes com o comportamento dele frente à modelo, Cristo jamais acreditaria que ela vira a fotografia por acaso. Pensaria que ela andara vasculhando suas coisas, e sem dúvida assumiria que era uma dessas mulheres neuroticamente ciumentas e desconfiadas, sempre dando um jeito de checar as mensagens em seu celular e mexer em seus bolsos à procura de evidências de infidelidade.


Estremecendo ao pensar nisso, Belle enfiou a foto dentro da carteira e a recolocou sobre a mesa. Não voltaria a fazer perguntas constrangedoras para ele. A situação entre os dois já estava tensa, e tanta coisa importante dependia do sucesso de seu casamento, refletiu. Se ela e Cristo não dessem certo juntos, o que aconteceria com seus irmãos? Ela fizera promessas no altar e pelo menos precisava tentar mantê-las. A menos que estivesse disposta a deixar Cristo livre, precisava se esforçar. Entretanto, rezou para que esse sucesso não dependesse de usar lingerie


sexy...


Capítulo 8

BELLE SE sentou sozinha à mesa do café da manhã no terraço que descortinava os maravilhosos jardins. Além deles surgia o lindo panorama da Úmbria, e nesse momento decidiu que não exibiria para ninguém sua insegurança e tristeza. Ali estava, muito bem vestida em meio a um cenário lindo, casada com um homem ainda mais lindo e conseguira estragar tudo! Mas, para ser justa, a expectativa dele de que ela usasse de


boa vontade uma lingerie provocante fora demais. Será que alguma vez você se descontrai e faz algo só por diversão?, perguntara Cristo. E a resposta sincera seria “não, nunca”. Então, como ela pudera mergulhar em um casamento com Cristo sem pensar profundamente no que estava fazendo? Ainda não conseguia responder essa pergunta para si mesma. Teria a traiçoeira atração que sentia por ele derretido todas as células de seu cérebro? Por que não ouvira os conselhos da avó? Afinal, ninguém melhor do que Belle para saber que relacionamentos entre homens e mulheres em geral eram difíceis e fadados à infelicidade.


O casamento apressado de sua mãe, ainda muito jovem, com o pai bêbado de Belle, seguido pelo longo caso com Gaetano Ravelli, ensinara que devia ser muito cautelosa e sensata para julgar cada atitude masculina. Exceto que quando chegara a oportunidade de se casar com Cristo ela... inexplicavelmente... mergulhara de cabeça. E sua atual atitude reservada em relação à intimidade conjugal estava criando um problema com Cristo, mas ela não podia culpá-lo por se aborrecer, podia? Afinal, o que mais tinham em comum além da atração física? E o que ele lucrara com esse


casamento? O silêncio dela, nada de ação judicial e cinco crianças carentes que prometera inserir na família Ravelli. Belle suspeitava de que Cristo sacrificara muito mais do que ela e que pouca gente sentiria pena de uma moça pobre que se casara e que agora vivia no meio do luxo com um guarda-roupa de grife. Tal pensamento fez seus olhos arderem de lágrimas porque tinha pouco interesse no luxo e na enorme coleção de roupas novas que recebera em sacolas coloridas no seu quarto. Na verdade, até o momento, só vestira uma das roupas, um conjunto de top e saia de seda, porque não quisera que Cristo a julgasse ingrata com o gesto generoso


que tivera. Contudo, infelizmente, Cristo nem estivera por perto para ver o que Belle usava. Esse era o problema de ter quartos separados em uma casa enorme, e duas pessoas casadas que mal conheciam os próprios hábitos uma da outra, refletiu Belle com desânimo. Na noite anterior Cristo não comparecera ao jantar e agora estava ausente também. Será que a estava evitando? Estava farto de sua imaturidade? Parecia muito óbvio para ela que tudo estava saindo errado nesse casamento. Iludira-se muito sobre como seria ser casada com Cristo Ravelli. Ele a julgara uma cavadora de ouro e,


após pensar muito sobre tal acusação, Belle não tinha certeza se podia julgá-lo por isso. Afinal, Cristo não a conhecia com profundidade e talvez só soubesse se relacionar com no plano físico. E ela permanecia toda ofendida e pudica porque ele magoara seus sentimentos. Isso não ajudava a situação... E, pior ainda, Belle sabia que nem mesmo podia ligar para a avó. Os conselhos ajuizados de Isa Kelly seriam muito bem-vindos. Na verdade, só em ouvir a voz da avó ficaria reconfortada, pois sentia muitas saudades de casa e do cão da família, Tag. Contudo, sabia que, se ligasse para casa dias após o casamento, Isa, muito astuta, suspeitaria de que alguma coisa


não ia bem, e seria muito egoísta lançar mais um problema nas costas da pobre senhora. Desgostosa por sentir pena de si mesma, de repente Belle empurrou a cadeira e se levantou. Ficar ali sentada sentindo sofrendo e com remorso pelos possíveis erros não adiantava nada, certo? Era hora de procurar por Cristo. Ao ser questionado, Umberto sorriu e indicou uma porta no final de um curto corredor fora da ala principal. – O sr. Cristo está trabalhando sem parar em seu escritório desde que se soube da crise bancária... Que crise bancária? Belle não assistia aos noticiários nem lia jornais


desde a manhã de seu casamento. Com a testa úmida de suor, bateu à porta do escritório de Cristo e em seguida a abriu. Erguendo os olhos escuros da tela do computador, ele girou na cadeira. O surgimento de Belle o surpreendia de duas maneiras. Dio mio, tinha uma esposa e se esquecera dela. Então seu próximo pensamento foi que se esquecer dela seria impossível, pois era tão linda, parada ali na porta, uma figura delgada de longas pernas em um conjunto de seda cor de pêssego que combinava muito bem com os cabelos revoltos. Os olhos verdes o fitaram. – Estava pensando onde poderia encontrá-lo – murmurou sem jeito,


hipnotizada como sempre ficava ao vêlo surgir de repente com seus cabelos negros que estavam despenteados, os olhos brilhantes e a pele morena. E o fato de estar com a barba por fazer apenas acrescentava mais charme à sua masculinidade e carisma. – Então Umberto me informou sobre uma crise bancária. Não leio os jornais desde que cheguei aqui e de nada sabia. Precisa de ajuda? – Ajuda? – Cristo arqueou as sobrancelhas muito surpreso. – Como você poderia ajudar? – Sou formada com louvor em administração de empresas e economia e trabalhei em um banco em Dublin


durante um ano como estagiária – explicou Belle hesitante. Um leve rubor tomou conta do rosto de Cristo ao refletir que deveria saber desses fatos elementares sobre a mulher com quem se casara. – Não fazia ideia – resmungou. Os olhos de Belle brilharam com ar divertido e ela sorriu sem querer. – Então apenas assumiu que estava se casando com uma camponesa irlandesa sem educação, não foi? – Se está disposta a ajudar, fico agradecido, bella mia – admitiu Cristo com suavidade. – Estou tentando trabalhar a distância com minha equipe de Londres e é complicado. Mas, afinal, nós dois devíamos estar em nossa lua de


mel. – Não tenho nada para fazer – enfatizou Belle com gentileza, ciente de que não faziam o gênero de casal em lua de mel. Cristo logo percebeu outra falha que estava cometendo como recém-casado e tratou de oferecer o laptop ao lado do seu, apressando-se a pedir para Umberto providenciar mais uma cadeira. Dolorosamente começava a aprender que o casamento iria exigir muito mais dele do que imaginara. Isso significaria respeitar as necessidades de Belle tanto quanto as suas. Pela primeira vez percebeu que não tinha direito de criticar seu irmão Nik


pela bagunça que fizera com seu casamento com Betsy. Afinal, conhecera apenas um lado da história, e a pequena e fraca Betsy chorado no seu ombro o fizera tomar seu partido. Lançou um olhar de esguelha para Belle e sorriu aliviado. Não havia nada de fraco nela e, pelo menos, não estava chorando como uma histérica, se lamentando e condenando...

– SIM, ELAé extraordinária – concordou Cristo em italiano com seu diretor financeiro do banco de investimentos na filial de Londres. – E, se não fosse casado com Belle, trataria de contratála!


Cristo fitou a esposa sem esconder seu orgulho. Belle estava sentada em uma cadeira com seu laptop, as longas pernas surgindo do short, os cabelos com reflexos vermelhos caindo pelos ombros e emoldurando o rosto de pele de porcelana com sardas. Seus dedos delicados corriam pelo teclado. Foi nesse momento que ele compreendeu que ganhara na loteria e que andara menosprezando uma mulher de valor. Além de bonita, Belle era inteligente, criativa e trabalhadora. Não se queixara de nada nos últimos três dias sobre as longas horas de trabalho e o acompanhava o tempo todo. Cristo fez uma careta ao se lembrar do episódio da


lingerie no desfile. Belle se levantou da cadeira para flexionar os ombros. A crise bancária terminara e ela estava quase decepcionada, pois tudo aquilo servira para deixar o casal convivendo em paz. Agora podiam trabalhar juntos, conversar. Cristo parara de tratá-la como um objeto sexual do qual esperava apenas diversão, e Belle descobrira, para sua satisfação, que ele era inteligente e muito astuto, além de teimoso e impaciente como ela mesma. Belle lançou um olhar enviesado para o marido que usava uma camisa verdelimão e também esticava os braços nesse momento. Fitou seus lábios sensuais e se lembrou dos beijos


apaixonados, sentindo-se tonta. Seu corpo ardia de desejo. Daria tudo para que Cristo fizesse um movimento em sua direção, tocasse seu braço, a beijasse... qualquer coisa! – Vista algo bonito. Vou levá-la para jantar fora, bella mia – anunciou ele, fitando-a com seus olhos negros e penetrantes. Belle corou até a raiz dos cabelos, envergonhada com os pensamentos eróticos que povoavam sua mente, e murmurou: – Como você quiser. – Dio mio! É claro que quero – exclamou Cristo, franzindo a testa. – Não precisa me agradecer por tê-lo


ajudado – murmurou Belle com teimosia. Cristo deixou escapar o ar dos pulmões muito devagar. – É tão difícil para você aceitar que desejo de coração levar minha linda esposa para jantar e exibi-la para todos? Belle achou graça na ideia. – Você é um bajulador! – exclamou de bom humor. Cristo fez uma careta. – Não me chame disso... me faz pensar em Gaetano. Belle balançou a cabeça. – Nada em você me faz lembrar dele – afirmou. – Grazie a Dio... graças a Deus – retrucou Cristo com visível alívio.


Belle colidiu com Franco a caminho do escritório. O menino passou por ela e se atirou nos braço de Cristo com gritos de alegria. Apesar de terem estado muito ocupados nos últimos dias, Cristo nunca repelia Franco, e Belle gostava disso. Fitou os dois enquanto o marido fazia cócegas no menino em meio às brincadeiras barulhentas e desajeitadas típicas dos homens, e que Franco adorava. Cristo precisou parar para atender o celular. Muito depressa Belle percebeu que algo estava errado, pois a expressão de Cristo se tornara sombria e seus olhos pareciam ainda mais escuros. Largou Franco, que correu para o saguão, já


buscando uma nova diversão. Então Cristo fitou Belle com um olhar de acusação e perguntou: – Você andou falando com a imprensa? O espanto a dominou e ela respondeu na defensiva: – Não, claro que não! Do que está falando? – Um amigo jornalista em Londres acabou de me avisar que a história de Gaetano, sua mãe e as crianças será publicada em breve em um tabloide britânico! – murmurou Cristo com raiva. Belle empalideceu diante da notícia, porém logo se recompôs, já que sua consciência estava tranquila. – Bem, é muito desagradável.


Cristo se ergueu de supetão, fazendo valer sua altura e masculinidade para bradar: – Desagradável? É tudo que tem a dizer? Enfurecida com sua atitude e magoada com a rapidez com que ele se voltava contra ela, Belle encostou os ombros à parede e corou. – Mantenha as devidas proporções, Cristo, e tente ser razoável. – Razoável? – resmungou ele com raiva. – Casei com você para manter essa história fora dos jornais! Belle agradeceria se não fosse lembrada disso. – Sempre achei improvável que


pudesse evitar que a história um dia fosse parar na imprensa – ela admitiu com relutância. – Minha mãe ficou com seu pai por quase 20 anos e todos no vilarejo sabiam desse relacionamento e das crianças. Bastaria que uma pessoa comentasse com alguém de fora que vislumbrasse algum lucro nessa informação e o segredo seria desvendado. Cristo cerrou os punhos e balançou a cabeça morena concordando com essa possibilidade, porque o que Belle dizia fazia sentido. Belle se aproximou com o andar de uma tigresa e o segurou pelo braço. – Mas como ousa pensar que fui eu quem deixou vazar a história para a


mídia? Acha que seria uma traidora? – Seus olhos brilhavam de indignação. – Jamais magoaria meus irmãos e irmãs, que já pagaram caro pelos pecados dos pais. A última coisa que eu faria seria aborrecê-los ainda mais! – Não acusei você. – Perguntou se eu falei com a imprensa. Que tipo de pergunta é essa para fazer a sua esposa? Que motivo eu teria para expor todos nós à desagradável atenção pública? – insistiu Belle. – Vingança? – sugeriu ele. – Gaetano pode estar morto, mas você nunca teve a oportunidade de dizer como o odiava cara a cara. Na verdade, creio que


desconfia e antipatiza com qualquer um que se chame Ravelli! – acusou Cristo. – Mudei – retrucou Belle, desejando muito esbofeteá-lo. E não conseguia deixar de se lembrar como o estilo de vida egoísta de Gaetano prejudicara tantas outras vidas, principalmente de seus filhos. Ela continuou: – E se acha que o traí devo ter um problema de identidade, não? – prosseguiu ela com desdém. – Considerando que agora sou uma Ravelli também. – Sì, e minha esposa, cara mia. De repente Cristo se viu saboreando essa realidade enquanto a fitava, notando o arfar de seus seios.


– Mas neste momento não estou muito feliz por ser sua esposa! – exclamou Belle um segundo antes de Cristo encurralá-la de encontro à parede onde se apoiava, acariciando as mechas soltas de seus cabelos e a silenciando com um beijo. Belle o empurrou com os punhos fechados em seu peito, mas foi um protesto débil, pois com o desejo que a invadia não podia lutar contra a fome dos sentidos que a assaltava sempre que Cristo a tocava. Seus beijos eram violentos, as mãos acariciando seus cabelos, o corpo magro, porém forte, comprimindo-a de encontro à parede enquanto sua língua


explorava o interior da boca. Ela deixou escapar um gemido enquanto Cristo acariciava um mamilo rijo sobre a roupa, e a sensação foi maravilhosa. Belle estava frenética, possuída, seus desejos mais fortes do que tudo. Lutou com os botões da camisa dele até que alguns saltaram para longe e a camisa se abriu. Ele se afastou por um instante. Belle estava chocada com sua própria atitude, o rosto corado, entretanto sucumbiu à paixão avassaladora enquanto espalmava seu corpo e sentia a rigidez dos músculos. – Jamais desejei uma mulher como desejo você – murmurou Cristo, afastando-se para fechar a porta, passar o ferrolho e voltar para ela com um


brilho muito claro no olhar. E Belle nunca soubera o que era a fome do desejo até encontrá-lo, trêmula. – Tire a camisa – ordenou para Cristo. – Está ficando mandona? – brincou ele, mas obedecendo imediatamente. A camisa caiu no chão. – Oh, não faz ideia do quanto – murmurou Belle, deliciando-se com a visão do tórax musculoso e dos bíceps, imaginando os braços fortes enlaçando seu corpo enquanto desafivelava o cinto da calça. Nesse momento Cristo lançou a cabeça morena para trás e riu. Depois, tornou a baixar o rosto para beijar Belle


enquanto retirava seu top de seda com gestos um pouco desajeitados para alguém tão sofisticado. Ela não usava sutiã, e ele acariciou os seios belos com reverência, apertando os mamilos com os polegares. – Adoro suas curvas – confidenciou com a voz rouca, deslizando as mãos para os quadris arredondados e erguendo a saia para tocá-la entre as coxas. Cheia de desejo, Belle se afastou da parede, convidando Cristo a tocá-la e precisando de seu toque. Fechou os olhos quando ele a provocou tocando-a na parte mais íntima de seu corpo e, a seguir, se ajoelhando com impaciência para tirar a calcinha e provar sua pele com a língua.


– Oh! – exclamou Belle. – Nas últimas três noites, quando você foi para sua cama e eu para a minha, sonhei com isto – confessou ele sem pudor, a voz cada vez mais rouca de desejo. Saboreou Belle como se ela fosse uma iguaria rara até que ela estremeceu e apenas a parede e seu braço a impediram de cair por terra. E quando ela não conseguiu aguentar mais, Cristo a tomou nos braços e a fez sentar na ponta da escrivaninha. Depois se postou entre suas pernas abertas e a beijou de novo na boca. – Nunca sonhei em fazer isso... aqui – murmurou ela com a voz tremida.


– Não sei como consegui manter as mãos longe de você nos últimos dias, bellezza mia – confidenciou Cristo, encostando o nariz em seu pescoço com um rugido muito masculino de aprovação. – Não queria me precipitar. – Então se precipite! – pressionou Belle, enquanto ele se arremessava dentro de seu corpo e ela se adaptava à invasão com uma deliciosa sensação de plenitude que a fez gemer também. Com as mãos bem firmes em seus quadris, Cristo a penetrou com força em movimentos de “vai e vem”. O coração de Belle batia descompassadamente, o corpo tenso e clamando por mais enquanto ele intensificava os


movimentos e, por fim o clímax eclodiu, fazendo-a estremecer e gritar em êxtase. Cristo também atingiu o auge do prazer, injetando sua semente em Belle. Quando a sensação foi apaziguada, conseguiu raciocinar melhor. – Che diavolo! – berrou consternado, de súbito imaginado o pior cenário. – Não usei camisinha! Espantada com a declaração súbita, Belle piscou diversas vezes enquanto ele a abraçava de novo. – Oh... – murmurou de encontro ao peito dele, seu perfume másculo a dominando. – Jamais deixei de usar camisinha na minha vida – garantiu Cristo com veemência. – Você me distraiu muito.


– Tudo bem – murmurou ela, escondendo a satisfação de ver que por ela Cristo se esquecera das práticas mais elementares. – Comecei a tomar a pílula antes do casamento, portanto não haverá consequências. De repente Cristo imaginou Franco como uma simples “consequência” e ficou surpreso ao perceber o próprio desapontamento quando Belle garantiu que não haveria surpresas. Balançou a bela cabeça morena como se quisesse pôr as ideias no lugar. Jamais desejara ter um filho, porém havia algo em Franco que despertava seu instinto paternal. – Você é incrível, bellezza mia –


sussurrou, afastando as reflexões perturbadoras e beijando-a na testa e na boca. – Tem uma sensualidade e uma capacidade de me excitar que a maioria dos homens apenas sonha em encontrar em uma mulher. Devagar, com cuidado, ele a fez deitar-se de costas no chão, enquanto Belle continuava muito emocionada com a experiência que acabava de vivenciar. Duas horas mais tarde, as emoções tumultuadas que de novo haviam sido despertadas começaram a se acalmar, e Belle olhou seu reflexo no espelho com ar de crítica. Já se vestira e usava um traje que, segundo diria sua irmã mais nova, parecia de uma princesa, pois Lucia


tinha em comum com a mãe a paixão por roupas muito femininas. Cor-de-rosa e longo, o vestido exibia os ombros e moldava seus seios e quadris. Belle fez uma careta para os seios, que julgava grandes demais. Porém, teve certeza de que Cristo aprovaria sua escolha. Betsy ligou para Cristo quando ele emergia do chuveiro no quarto ao lado. Ele ouviu com atenção, sentindo-se estranhamente distante da cunhada e de seus problemas. Ocorreu-lhe que jamais a desejara como desejava a própria esposa e se surpreendeu com essa constatação, imaginando se de fato alguma vez sentira uma profunda atração por Betsy.


Ainda ouvia a cunhada contar as últimas medidas tomadas pelo seu irmão no processo de divórcio, quando Belle surgiu e sua mente ficou totalmente enevoada porque ela estava linda e ele não podia se concentrar em outra coisa. Terminou a conversa ao telefonema murmurando uma desculpa. – Com quem estava falando? – perguntou Belle, analisando as feições tensas do marido. – Betsy. – A esposa de Nik? Cristo lutou para não parecer defensivo ao responder: – Somos amigos. – Deve ser esquisito – comentou ela.


– Eram amigos antes de os dois se casarem? Cristo ficou ainda mais tenso e um músculo pulou no canto de sua boca. – Não. Aconteceu depois que os dois romperam. Parecendo um cão farejador seguindo a pista, Belle não estava disposta a mudar se assunto antes de saber o que queria. – E por que Nik e Betsy romperam? – Por razões muito particulares. Por algo que deixei escapar e que deveria manter em silêncio, cuidando da minha própria vida – confessou Cristo, admitindo sua culpa. – Lamento não poder lhe contar mais, porém posso dizer que criei muitos problemas por ter


revelado sem pensar um segredo que Nik me confidenciara e... até hoje me arrependo muito. Belle desejava arrancar toda a verdade dele ali mesmo porque suas suspeitas estavam muito aguçadas. O que exatamente significara sua “amizade” com Betsy Ravelli? A limusine os aguardava do lado de fora. – Aonde vamos? – perguntou Belle para acabar com o silêncio constrangedor, o que confirmava, a seu ver, que havia uma excelente razão para Cristo ficar tão desconfortável quando se discutia a respeito da ex-esposa do irmão. Estaria imaginando coisas? Seria


a reação dele apenas mais um resultado do sentimento de culpa que o fazia crer que contribuíra para o fim do casamento de Nik e Betsy? E por que carregava uma foto de Betsy na carteira? Isso trazia uma dimensão muito grande para o relacionamento entre cunhados, o que deixava Belle preocupada. – Vamos para Assis. Há um restaurante muito especial lá – informou Cristo, aliviado por Belle ter desistido do assunto delicado sobre o fim do casamento de Nik. – Assis... não é a cidade natal de São Francisco? Cristo a fitou com ar zombeteiro. – Claro que sim. Só existe uma.


– É estanho ir para lá. Sempre foi o grande sonho de minha mãe visitar Assis. Era muito devota de São Francisco – explicou Belle. Sua mãe fora uma mulher simples e a lembrança dela lhe trazia muitas saudade. – E Gaetano nunca trouxe Mary para a Itália? – perguntou Cristo muito surpreso. – Está brincando? Jamais levou mamãe a lugar algum – criticou Belle com os lábios apertados. – Seu relacionamento só existia por trás de portas fechadas. – E sua mãe não fazia objeção a isso? – Não, e o que é pior, mesmo assim pensava que o sol girava em torno de


Gaetano. Ele não lhe tirava dinheiro, não a surrava nem se embebedava; portanto, em sua opinião, era um homem perfeito. Mamãe nunca foi muito esperta nem educada – reconheceu Belle, falando baixo como se fosse desleal falar assim da própria mãe que tanto amara. – Por outro lado, era uma pessoa muito amorosa, sincera e bondosa. – Deve ter sido também muito tolerante e disposta a perdoar. Talvez por isso o relacionamento dela com meu pai tenha durado tanto – comentou Cristo, torcendo a boca com raiva do pai. Belle sentiu um nó na garganta e vontade de chorar e tratou de engolir as lágrimas ainda que com dificuldade.


– Às vezes sinto tanta falta de mamãe que chega doer – admitiu em voz baixa. Cristo ficou tenso ao ver sua emoção. Respirou fundo, aprumou os ombros largos e colocou a mão sobre seus dedos crispados. – Não poso dizer que sei como se sente, pois seria mentira – admitiu com brusquidão. – Não sou muito ligado à minha mãe e nunca me relacionei com Gaetano para conseguir chorar por ele quando morreu. Tem sorte por pertencer a uma família tão unida. Em silêncio, Belle ajeitou os dedos sob a pressão da mão grande e quente de Cristo, reconhecendo o gesto delicado e o conforto que ele desejava lhe dar.


Jantaram em uma mesa para dois em um enorme terraço cercado pela visão maravilhosa da cidade ao lado das colinas. As ruas que haviam percorrido exalavam o aroma de gerânios, e Belle viu de relance construções medievais e praças adornadas por antigas fontes. – Onde estão os outros clientes do restaurante? – perguntou, olhando em volta para as mesas vazias. – Hoje à noite somos os únicos fregueses e um dos mais famosos cozinheiros italianos vai nos preparar um jantar especial, bella mia. – E foi você quem encomendou isso? – perguntou Belle sem necessidade, pois


era óbvio que sim. – É a primeira vez que a levo a algum lugar – enfatizou Cristo. – E já estamos casados há uma semana, o que me diz que eu lhe devo uma noite decente. E também lhe devo por todo o trabalho que teve comigo sem se queixar, me auxiliando na crise dos bancos. – Gosto de trabalhar. Fico feliz por ser útil – murmurou Belle com simplicidade, e seus olhos verdes brilharam, a boca generosa sorrindo feliz apenas por estar sentada ali com seu lindo vestido e seu marido ainda mais lindo em frente. Sentia-se ridiculamente mimada e contente. Por sua vez, Cristo fervia de desejo, e observou a esposa, maravilhado com as


emoções que ela lhe provocava. Apesar de não se considerar um homem emotivo ou sentimental, achava muito atraentes o calor humano e a vivacidade de Belle. O garçom trouxe o cardápio e o chef surgiu para cumprimentá-los e fazer sua sugestão. A noite já caía e as velas foram acesas. Belle provou do vinho, satisfeita por poder relaxar um pouco na companhia de Cristo. – Ainda não me explicou direito por que Bruno e Donetta foram mandados para o colégio interno – perguntou ele sem pressa. Belle apertou o copo antes de responder: – Bruno nunca foi um menino atlético


e admitiu para Gaetano que só se interessava por arte. Seu pai lhe perguntou se era gay... Bruno tinha apenas 13 anos na época – completou com ar de desprezo. Cristo praguejou em voz baixa, e Belle prosseguiu: – Então Gaetano decidiu tornar essa conversa entre pai e filho uma piada e sempre que via Bruno o chamava de “garoto gay”. Por fim mais alguém acabou ouvindo e Bruno começou a sofrer assédio na escola, porém não contou à mamãe ou a mim o que estava acontecendo – explicou Belle com a voz carregada de tristeza, precisando parar entre as frases para tomar fôlego antes de prosseguir com o relato doloroso. –


Bruno tentou se matar, mas por sorte foi encontrado a tempo e se recuperou. Cristo estava muito chocado com a confidência, enquanto recordava o garoto magricela com olhos ansiosos que o havia procurado no dia do casamento. – Creio que tive uma grande sorte por ter escapado do conceito de Gaetano sobre ser um bom pai – comentou com azedume. – Bem, depois disso, Donetta nos contou o que estava acontecendo na escola, e os dois foram para o internato a fim de ter paz – prosseguiu Belle. – A experiência de Bruno com Gaetano é o principal motivo para eu odiar seu pai,


e, por falar nisso, meu irmão não é gay. – Não faria nenhuma diferença para mim se fosse – retrucou Cristo, enquanto o primeiro prato era trazido. – Pobre menino. – É um artista muito talentoso e a mudança de ambiente era exatamente do que precisava. Donetta fez questão de acompanhá-lo. – Quando mudarem para Londres poderão frequentar a escola que quiserem, mas irão para casa nos fins de semana... ou o que preferirem. Eles decidirão – lembrou Cristo. – Sei disso. Mas queria que todos nós ficássemos juntos – confiou Belle de repente. – Você pode achar que é muita gente junta...


Cristo lançou um olhar malicioso e zombeteiro para Belle, tentando ocultar o desejo que sentia, e respondeu: – Acho que vou gostar da aglomeração.


Capítulo 9

COM

UMAcrescente

sensação de ansiedade, Belle analisou as fotos no laptop das mais recentes sugestões que o corretor enviara de Londres. Cristo lhe dissera apenas para escolher uma casa, já que seu apartamento de cobertura era pequeno demais para abrigar sua família. Dissera para ela escolher o que quisesse, e apenas pedira um cômodo para ser seu escritório, além de espaço


suficiente para receber e dar festas. Belle estava espantada não apenas com os preços astronômicos das propriedades de elite, mas também pelo grau de responsabilidade que Cristo jogara sobre suas costas. Ao mesmo tempo, era a primeira a admitir que na última semana de lua de mel na Itália o relacionamento dos dois mudara muito. Durante as manhãs ela ajudava Cristo no escritório. Depois passavam o resto do dia explorando as belezas da região, comendo fora, nadando e relaxando sempre com Franco a tiracolo. Também com a mesma frequência ficavam sentados conversando até altas horas à luz de velas após o jantar. Uma


expressão sonhadora turvou os olhos de Belle, que pensou na crescente sensação de segurança que a invadia com a sua nova vida. Nada parecia ruim com Cristo ao seu lado. Nem mesmo sua mãe, a princesa Giulia que chegara com seu padrasto, Henri Montaldo, no dia anterior e sem aviso prévio. A sogra de Belle quase tivera um ataque de nervos ao tomar conhecimento de quem era a moça com quem seu filho se casara. – O que os filhos dessa irlandesa inescrupulosa têm a ver com você? – exigira saber a princesa, uma senhora mandona com idade imprecisa, morena e vestida com grande elegância.


– São minha família também – respondeu Cristo com calma, e Belle se enchera de orgulho por vê-lo reconhecer assim seus irmãos e irmãs. E a batalha verbal em italiano entre mãe e filho cresceu intensamente enquanto Belle oferecia café para Henri, um homem de modos suaves, que fingia não perceber os ataques da esposa contra a mãe de Belle pelas escolhas desajuizadas que fizera na vida. – Gaetano sempre foi o ponto fraco de Giulia – confidenciara Henri. – O amor de sua vida. – Entretanto, vocês dois estão juntos...? – incentivara Belle sem jeito. – Desde que Cristo engatinhava –


confirmou Henri com sinceridade. – Não se preocupe com a briga dos dois. Cristo dará um jeito. Sabe manejar a mãe. Quando o café foi servido, a discussão amainara com os comentários gentis de Henri, e Belle percebeu que Cristo gostava e respeitava o padrasto. E quando a injuriada princesa partiu, já recuperara o bom senso e até acariciara os cabelos de Franco, dizendo que menino bonito ele era, e beijara Belle no rosto, lhe dando as boas-vindas à família. O constrangimento desaparecera entre Belle e a sogra. – Então, como testemunhou esta tarde, todos ficam constrangidos quando se trata de família – enfatizara Cristo na


cama à noite, quando ela se enrodilhava feliz em seus braços após fazerem amor. – Minha mãe tem pavio curto. Perde a cabeça e faz cenas terríveis. – Mas depois se acalma e não guarda rancor – comentou Belle com displicência. – Isso é um ponto a seu favor. – Não quero que ela a aborreça, bellezza mia – confessou Cristo. – Faz muito tempo desde que se divorciou de Gaetano, e, vamos ser francos, o que ele fez e com quem fez depois disso foi assunto dele. – Mas ela deve tê-lo amado muito – murmurou Belle, encostando a cabeça no ombro do marido com ar sonolento. – E


suas infidelidades e mentiras devem têla magoado muito. Teria que ser dura como uma rocha ou cega como minha mãe para lidar com Gaetano sem sofrer. – Sempre serei honesto com você – declarou Cristo, afastando com os dedos longos e morenos uma mecha do rosto dela, e com os olhos escuros brilhantes. – Isso eu prometo. Era uma grande promessa, ela refletiu, cada vez mais sonolenta. Sabia que devia lhe perguntar sobre a foto da cunhada na sua carteira, porém esse não era o momento certo, quando estava tão feliz e confortável entre seus braços. Reconheceu que nenhum homem jamais a fizera se sentir tão segura como Cristo. Perguntaria em breve e tinha certeza de


que a resposta a faria perceber que sofrera por nada. Talvez Cristo tivesse colocado a foto na carteira por algum motivo banal e se esquecera dela... Isso acontecera dias atrás e, no momento presente, retornando à realidade, Belle se viu sentada à beira da piscina enquanto Cristo se dirigia para o terraço. – Você estava a milhares de quilômetros de distância – brincou ele. – Às vezes sonho acordada – respondeu Belle, admirando seu físico bonito dentro do jeans preto e da camiseta branca, e percebendo, feliz, que ele também a admirava, percorrendo os olhos por seu biquíni.


– Estava procurando por mim? – Belle quis saber. – Sim. Trarei de avião o resto de sua família para cá hoje à tarde. Belle ficou surpresa. – Do que está falando? – Fui avisado de que a história de sua mãe com Gaetano e os filhos será publicada amanhã, então trarei sua avó e as crianças para cá, onde ninguém possa aborrecê-las. Chocada com a revelação, Belle exclamou: – Quando decidiu isso? E minha avó? Ela não vai querer viajar tão de repente. – Bruno está se entediando em casa nas férias de verão e contando as horas


para vir. Falei com ele pelo computador e está ansioso para conhecer a Úmbria – explicou Cristo. – Você falou com ele? – murmurou Belle sem fôlego. – Alertei sua avó sobre a situação na semana passada. Ela aguarda apenas seu telefonema para saber se será bem-vinda – completou Cristo. – Mas não me disse nada na última vez que conversamos... – Belle parou de falar, pois mal se lembrava do que haviam conversado, já que sua mente divagava muito nos últimos dias. Cada vez mais seu mundo se resumia à vida com o marido, e nada parecia ter muita importância além disso. – Isa não quis preocupá-la, então


ligue para sua avó e garanta que será bem-vinda e que temos muito espaço aqui para todos – sugeriu Cristo. – A experiência de ter paparazzi à porta de casa seria traumatizante para as crianças. Pálida diante da perspectiva de expor a família a tal humilhação e atenção indesejada, Belle se ergueu da espreguiçadeira e entrou. Quando ligou para a avó, Isa estava calma e prática como sempre. – Não precisa nos trazer para a Itália – declarou a senhora. – Estou louca para rever todos, vovó. Sei que se passaram apenas algumas semanas, porém parecem meses –


confidenciou Belle com sinceridade. – E Franco fica perguntando por vocês. – Recém-casados precisam de privacidade e cinco crianças e uma avó darão um fim a essa paz – declarou Isa sem fazer rodeios. – Vocês são minha família... é diferente – protestou Belle. – E sinto tanta saudade. E era verdade, apesar de estar feliz com Cristo, refletiu. Na verdade, o tempo que estava longe da família a fizera perceber como todos eram importantes e o quanto sentia falta do burburinho dos irmãos e do apoio da avó. Com a visita da família confirmada, Belle foi se consultar com Umberto para


saber onde todos dormiriam e descobriu que Cristo já falara com ele a esse respeito na semana anterior. Isa tinha problemas de artrite nos joelhos e às vezes não suportava subir escadas, mas Belle descobrira, admirada, que a avó ficaria em um quarto no térreo com vista para uma área do terraço repleta de cadeiras. – Quando foi que organizou as acomodações para Isa? – perguntou a Cristo com curiosidade, parando à porta de seu escritório. – Assim que soube que ela viria, bellezza mia. Tinha certeza de que você resolveria tudo com ela. Minha avó também preferia acomodações no térreo


por causa de sua saúde – respondeu Cristo com tranquilidade. Belle fitou seus olhos escuros e seu coração acelerou como sempre acontecia. – Sua avó ainda vive? – quis saber. – Não. Faleceu no verão após minha formatura, mas teve um papel muito importante na minha vida quando era mais jovem – admitiu Cristo. – Como seu irmão Zarif se sente em relação à matéria que será publicada? – perguntou Belle temerosa. – Sei como você se preocupa com o efeito disso sobre ele. – Zarif nunca entra em pânico e sempre acreditou que essa história escandalosa seria de domínio público


mais cedo ou mais tarde. – Sorriu. – Garantiu que sobreviverá. Diante de tal garantia, Belle se sentiu mais aliviada. Queria perguntar ao marido se ainda pensava que se casara para nada, pois o casamento visara enterrar a história de sua mãe. Sua situação legalizada pelas leis e pela Igreja calaria a boca de todos, mas parecia que a mídia não pensava assim. – Está bem – acabou por murmurar. Cristo se aprumou, observando a expressão pensativa de Belle. – Está feliz com a vinda de sua família, não está? Belle escondeu as inseguranças e sorriu.


– Sim. Estou com muita saudade de todos. – De início não soube apreciar nem entendi tamanha união entre vocês – confessou ele. – Sou fruto de uma família desestruturada. Conheci meus meio-irmãos quando já era adolescente e só porque meu padrasto, Henri, insistiu nisso. Uma hora mais tarde Cristo recebeu uma cópia por e-mail do artigo que seria publicado em um importante tabloide no dia seguinte. – Você foi imortalizada na imprensa! – resmungou na soleira da porta do quarto dela, onde Belle arrumava uma pilha de revistas de moda para sua irmã


Lucia. Ergueu o rosto para fitar o marido. Cristo estava corado e seus olhos brilhavam de raiva. Depois olhou para os jornais que ele apertava nas mãos. – Como disse? Com o coração na boca, ela viu o email que ele atirou sobre uma mesa ao seu lado. O titulo “Família Irlandesa Secreta de Ravelli” pareceu dançar diante de seus olhos e o choque a dominou ao ver uma série de fotos dela mesma vestida de noiva do lado de fora da igreja. Entretanto, a principal foto era de sua mãe grávida com seus irmãos em volta em uma feira local um pouco antes do nascimento de Franco. Havia até um instantâneo de sua avó também.


– Vão mesmo publicar a história... Lamento, sei como se sente a respeito – murmurou quase sem fôlego. – Mas como ousam publicar uma foto sua? – retrucou Cristo em tom ameaçador, apontando com o dedo para o e-mail. – Expondo você por causa dos pecados de Gaetano como se você tivesse alguma coisa a ver com as escolhas de sua mãe! Surpresa com o foco da raiva de Cristo, Belle engoliu em seco. – Quem falou com a imprensa? – O ex-motorista de Gaetano – revelou Cristo com a voz tensa. Belle tratou de ler o artigo depressa, descobrindo com alívio que se referiam


a sua avó como “muito respeitada” e que ela mesma era apenas mencionada como a filha de Mary “recentemente casada”. – Por sorte parece que ninguém se importou com o fato de ter me casado com um Ravelli – comentou atônita. – Aliás, não há nenhuma referência a você... – Não? Não cheguei a ler tudo. – Cristo franziu a testa e tratou de ler de novo, dessa vez com mais calma. – Bem, pelo menos temos isso de bom. – E também a matéria não diz nenhuma mentira. Quero dizer, Gaetano foi casado com outra durante grande parte de seu relacionamento com minha mãe e Mary também não foi a única amante que teve. – Belle respirou fundo,


encarando o marido. – Quer saber de uma coisa? Creio que essa matéria poderia ter sido muito mais maliciosa e destrutiva. – Só não gosto de ver você vinculada às patifarias de Gaetano – admitiu Cristo em um tom áspero. – Mas creio que tem razão, e, se Zarif pode suportar o tranco, nós também podemos. Ele passou um dedo pelos lábios de Belle, que, sem querer, entreabriu a boca. Tomou-a nos braços e a beijou com fúria. – Quero você – murmurou ele, fazendo-a sentir a ereção em seu corpo. – Bem, não estava fazendo nada de importante... – brincou ela com malícia.


Cristo a ergueu no colo e a levou para o quarto. Fizeram amor de maneira rápida e violenta e depois ele permaneceu imóvel por um longo tempo, até sua respiração se acalmar. – Já lhe disse como é fantástica na c a m a , bella mia? – murmurou, apertando-a de novo com força e aspirando o perfume de seus cabelos. – Uma ou duas... centenas de vezes. – Belle sorriu com malícia feminina. – Não consigo manter as mãos longe... Você me deixa louco. Belle riu. Sentia-se feliz, tão feliz pelo fato de a temida matéria não ter abalado seu relacionamento com o


marido, porém ainda estava preocupada. A dúvida a respeito de Betsy e Cristo continuava a atormentá-la. Queria... Não. Precisava saber a verdade. Tinha certeza de que depois se sentiria tranquila e riria do próprio medo. Armou-se de coragem e perguntou: – Por que, afinal, carrega uma foto da esposa de seu irmão na carteira?


Capítulo 10

CRISTO

SEretesou tão depressa que

Belle percebeu ter se enganado ao assumir que nada tinha a temer. Ele voltou a corar sobre a tez morena. Sua expressão era tensa e ele encobriu os olhos escuros com os longos cílios ao perguntar: – Do que está falando? Belle já não se sentia aconchegada e contente entre seus braços. Rolou para o lado e se sentou encostada aos


travesseiros. Ergueu o lençol para encobrir os seios com as mãos trêmulas. – Franco pegou sua carteira certo dia e a foto caiu no chão. Eu não estava xeretando, juro que não, mas é claro que fiquei imaginando por que você guardava a fotografia de Betsy. – Franco – resmungou Cristo, passando os dedos pelos cabelos negros e se sentando ereto enquanto ganhava tempo e analisava suas opções. Aquela maldita foto! Esquecera que ainda a tinha. Poderia mentir, é claro, mentir para Belle, mas a lembrança de Gaetano e sua vida de mentiras e enganações o deixaram com a obsessão pela verdade e o desejo de não seguir os passos do pai.


Além disso, mentir não era apenas uma fraqueza, mas um ato de deslealdade. Belle era sua mulher e merecia saber a verdade, refletiu, mesmo que fosse uma verdade que não tinha pressa em compartilhar ou recordar. Contudo, se agisse com honestidade, estaria evitando malentendidos futuros e constrangimentos. Respirou fundo e devagar, procurando as palavras certas para dizer: – Betsy procurou por minha ajuda após o fim de seu casamento com Nik... Durante certo tempo, pensei estar apaixonado por ela... Belle ficou ainda mais perturbada. Desde que fizera a pergunta notara a


reação imediata de Cristo e percebera que tocara em um nervo sensível. Sua cabeça doía muito com a tensão. Seus pensamentos conflitantes, além do pânico, a deixavam desatenta para qualquer explicação. Apaixonado por e l a era tudo que Belle entendia. A confissão tivera o mesmo impacto como se anunciasse o falecimento de alguém querido. Apaixonado por ela. Sua boca ficou seca, o coração acelerou e sentiu um aperto no estômago. Apaixonado por ela. Sentiu o sangue deixar seu rosto, seus dedos se crisparam sobre o lençol e uma dor aguda trespassou seu peito. Por um momento terrível pensou que iria vomitar ali na cama, mas


misericordiosamente a onda de enjoo desapareceu enquanto voltava a raciocinar de modo febril. Cristo se apaixonara pela pequena e frágil Betsy, que lembrava uma fada. Belle pensou que perto dela pareceria uma caricatura de histórias em quadrinhos. Era mais alta, mais curvilínea e maior em todos os sentidos. Seus cabelos eram avermelhados, enquanto os de Betsy pareciam feitos de milho dourado. Duas mulheres não poderiam ser mais diferentes uma da outra do ponto de vista físico. De repente uma ideia cruel a dominou. Será que Cristo fantasiava que ela era Betsy na cama?


A suspeita terrível foi como um punhal cravado em seu corpo. Ainda estava chocada com a revelação do marido e sua mente se debatia em meio a pensamentos tenebrosos. Cristo ousara se casar com ela enquanto estava apaixonado por outra! Destruída por essa noção que sugava cada átomo da antiga felicidade, Belle deixou a cama e se enrolou no lençol com gestos nervosos, pois parecia que seus membros estavam separados do corpo. – Por que, em nome de Deus, se casou comigo? – A raiva a consumia como se fosse uma onda gigantesca que afogava qualquer pensamento racional,


controlando cada gesto e palavra. – Quero dizer, se estava apaixonado por outra, então por que me pediu em casamento? Espantado com seu comportamento e ciente de que não cometera pecado algum, Cristo franziu a testa. – E por que isso deve incomodar você? – Não me incomoda. Não estou nem um pouco incomodada! – declarou Belle com uma veemência furiosa gerada pelo amor-próprio. – Mas é obvio que não gosto de sua atitude. Que tipo de homem se envolve com a mulher do irmão? A compreensão cruzou o rosto sombrio de Cristo, seguida de imediato pela costumeira expressão de desdém.


– Não estive sexualmente envolvido com Betsy. Jamais cruzei a linha da amizade com ela. – Está tentando me dizer que não teve um caso com Betsy? – perguntou Belle sem poder acreditar. – Acha que sou assim tão boba? De repente ocorreu a Cristo que a sinceridade podia ser uma arma de dois gumes. Sua prova de honestidade oferecida com a melhor das intenções simplesmente aguçara a desconfiança de Belle. Deixou a cama e procurou o jeans, se vestindo com extrema rapidez. Seus olhos encontraram o olhar acusador da esposa.


– Para começar, nunca houve nenhum caso. Jamais contei a Betsy sobre minhas emoções e é claro que não houve intimidade física. Dio mio, ela é a esposa de meu irmão. Não poderia cruzar a linha da honradez. – Mas eles vão se divorciar! – cortou Belle muito zangada. – Nik será sempre meu irmão. Aceitei que não havia futuro para minhas emoções. – Mesmo assim se casou comigo, embora a amasse! – lembrou Belle com a voz carregada de dor, quase sem conseguir pronunciar as palavras, pois seus dentes rangiam. Sentia frio e náuseas. Nunca fora tão rejeitada e


magoada em toda a sua vida. Parecia que um enorme poço de angústia e amargura em seu íntimo tentava arrastá-la para o fundo e engolila em vida. De súbito o mundo ficou escuro e seu futuro, vazio e ameaçador. – E por que não deveria ter me casado com você? – retrucou Cristo. – O que pensei sentir por Betsy, e repito: pensei, agora é irrelevante. Jamais teria nada com ela além da amizade, e não esqueça que eu e você combinamos ter um casamento baseado na praticidade. Esse lembrete brutal foi mal recebido. Belle machucou a pele das mãos com as unhas. Um casamento prático. Por que resolvera esquecer as expectativas dele e o modo como ela própria concordara


com esse acordo? Quando desenvolvera expectativas de algo maior e mais emocional esquecendo que estava casada por conveniência? E fossem quais fossem as repostas para essas perguntas, no momento não importavam porque ela estava sofrendo tanto que mal conseguia olhar para Cristo. Estava desesperada para fugir de sua presença e evitar dizer alguma coisa de que viesse a se arrepender depois. – Com licença – balbuciou Belle, correndo para o banheiro antes que ele tivesse a mesma ideia. A porta se fechou e o ferrolho fez um rumor seco.


Frustrado, Cristo praguejou entre os dentes cerrados. Por que ela estava tão zangada? E por que, em nome de Deus, estava zangada com ele? Malditos relacionamentos, refletiu com ressentimento. Não era bom em se relacionar e jamais fora. Sempre resumira tudo a sexo e se afastava antes que algo mais sério surgisse. Entretanto, não podia se afastar de Belle e de seu casamento. Lembrou-se da expressão dela quando respondera sua pergunta com honestidade. Ela ficara pálida como a neve, os olhos, escuros, e logo seu corpo enrijecera. Um minuto antes estivera em seus braços, sorridente, feliz e carinhosa, para logo


em seguida se mostrar furiosa, distante e... magoada. A boca sensual de Cristo se comprimiu ao perceber isso. Todos os seus instintos disseram que deveria ter mentido e dado uma desculpa qualquer por manter a foto de Betsy na carteira. Sem dúvida não fora o momento de contar toda a história porque Belle jamais acreditaria em suas palavras. No banheiro, tremendo, Belle jogou água fria no rosto. Lágrimas rolavam de seus olhos e ela as enxugou atirando mais água nas faces e depois se enxugando com uma toalha felpuda. Cristo amava Betsy e nada jamais ferira tanto Belle quanto essa revelação. Por que era assim? Por que recebera a


notícia tão mal, de maneira tão... pessoal? Essas perguntas fervilhavam em sua mente. Havia se casado por conveniência e sua principal motivação fora o bemestar dos irmãos e irmãs. Essa meta fora alcançada com grande sucesso, pois Cristo já aceitava as crianças como suas irmãs também. Não iria de repente dar as costas e desistir; era honrado demais para fazer tal coisa, refletiu Belle com seriedade. E até o momento cumprira sua promessa com ela e pelo menos a tratava com carinho e respeito. Será que esperava mais do que o marido estava lhe oferecendo? Belle mordeu o lábio, com medo de encarar os


próprios olhos no espelho do banheiro, porque, no que lhe dizia respeito, o relacionamento passara rapidamente para um nível mais pessoal na cama e fora dela. Os limites práticos haviam sido superados e esquecidos por ela logo após o casamento. Aprendera a gostar de Cristo, apreciar sua companhia, seu senso de humor, sua bondade com Franco, sua preocupação com tudo que a fazia feliz. Em resumo, viajara da admiração inicial até se apaixonar perdidamente por ele. E por isso ouvi-lo dizer que amava outra a deixara tão triste. Homem estúpido... Por que tivera que lhe contar? E, pior ainda, por que a


fitara como se fosse maluca quando ela reagira com tanta violência? Será que não entendia nada sobre as mulheres? Sobre ela? Talvez devesse ter sido mais esclarecedora... – Cristo! – gritou ao voltar para o quarto e batendo a porta do banheiro com toda a força. Ele surgiu do closet, abotoando a camisa, e a olhou com seus olhos sombrios e questionadores, respondendo com exagerada polidez: – Chamou, bella mia? Belle corou até a raiz dos cabelos. – Tudo bem, eu gritei. Desculpe. Mas você parece não entender como me sinto, então pensei que deveria lhe dar


um exemplo. Ele arqueou as sobrancelhas repetindo: – Um exemplo? – Sim. Tente imaginar como se sentiria se eu lhe dissesse agora que amo Mark Petrie. Cristo pareceu se transformar em uma estátua de pedra. Perguntou: – E ama? – Vê? Você também se aborreceu – retrucou ela. – Não, é claro que não amo Mark, porém você não gostou da ideia, certo? – Claro que não gostei... você é minha esposa. Mal ela pronunciou essas palavras, Cristo compreendeu. Porém,


permaneceu em um silêncio teimoso com medo de aborrecê-la de novo. – Nenhuma esposa quer ouvir que o marido amou outra mulher – explicou Belle com dignidade. – Não é nada pessoal, apenas uma questão do que é... é... aceitável. Você é meu marido. Sinto que, de certa forma, sou sua dona. Não consigo evitar. – Somos ambos possessivos por natureza, bella mia – murmurou Cristo, aliviado por ver que a tempestade passara e ela estava mais calma. Contudo, Belle estava apenas fingindo. Tinha seu orgulho. Não queria que soubesse como se sentia com a revelação e, determinada a agir


normalmente, acendeu um sorriso no rosto, antes de retornar ao próprio quarto onde ainda guardava suas roupas. Enquanto se vestia para o almoço, Belle tratou de se concentrar na chegada da família dentro de algumas horas. Família. Isso era tudo que importava de verdade. Não fazia sentido se matar para descobrir o que se passava na cabeça misteriosa de Cristo, porque nada mudaria. Entretanto, não havia a menor dúvida de que ele mantinha Betsy em um pedestal. Betsy seria sempre a mulher perfeita e inatingível a seus olhos, enquanto a esposa, Belle, seria a mulher comum, conveniente, acessível, que o ajudaria a criar os irmãos órfãos.


Bem, refletiu Belle, podia viver com essa realidade sem romantismo, não podia? Claro que sim, disse a si mesma, enquanto no fundo de sua mente fazia objeções furiosas. Não era uma questão de ficar em segundo lugar. Não estava participando de uma corrida nem de um concurso e acabaria louca se adotasse o papel de mártir. Mantenha o bom senso, comandou a si própria com severidade. Amava o marido, porém como isso fora acontecer? Sempre tivera muito medo de se apaixonar e ser magoada; entretanto, por milagre, esses receios haviam sido superados pelas fortes emoções que Cristo lhe provocava. Ele era muito


generoso, atencioso e absolutamente incrível na cama. O que havia para não gostar? Era essa a pergunta que Belle se fazia. Querer ou esperar mais do que já possuía seria ganancioso. Cristo não podia evitar os próprios sentimentos. Ela devia respeitar sua privacidade e não devia se preocupar com as emoções dele. E dizer-lhe que nunca mais deveria ver ou falar com Betsy seria um gesto errado... não seria? Cristo observou Belle sentada do outro lado da mesa e não acreditou em sua postura serena enquanto alimentava Franco com colheradas de seu próprio prato. Ela estava usando a criança para não se concentrar no marido cada vez que ele falava. Franco, é claro, estava


radiante por ser o centro das atenções e receber a comida do prato da irmã mais velha. Percebendo tudo isso, Cristo se viu desejando sacudi-la pelos ombros e levá-la de volta para a cama, onde lhe mostraria quem era possessivo, porém tratou de se conter. Estava irritado com o procedimento dela, apesar de saber que seria temporário. Puxou a cadeira com força e se levantou. – Tenho alguns telefonemas para fazer. Vejo você mais tarde – anunciou com frieza. Sentindo a alma perfurada pelos olhos sombrios do marido, Belle ficou


vermelha. – Pretendo dormir em meu próprio quarto esta note – disse. – Se a matéria for publicada amanhã, quero estar bem descansada para ficar ao lado de minha família – terminou com constrangimento. Cristo cerrou os dentes. Afinal, não a mantinha acordada a noite toda todas as noites! Será que era exigente demais na cama? E, se assim fosse, ela não deveria já ter se queixado? Além do mais, ela mesma gostava de excitá-lo e tinha um vasto repertório de tentações a oferecer. Mas Cristo nada disse e foi embora. – Agora Cristo está zangado comigo – murmurou ela de encontro aos cabelos negros de Franco, que se sentara no seu colo. – Ele não diz nada. Só me lança


seu olhar irônico, e eu fico aborrecida, triste, e quero correr atrás dele e pedir perdão. – Beijo – balbuciou Franco diante da confusa enxurrada de palavras que sua irmã dizia, e começando a se agitar para que ela o pusesse no chão. Belle o viu correr atrás de Cristo e sua boca se curvou em uma careta de dor; a tarde prometia ser longa e solitária.

NO SAGUÃOdo palácio Tag saiu de sua caixa de viagem e se lançou de modo apaixonado sobre Belle, a língua corde-rosa lambendo seu rosto e a cauda


abanando furiosamente. Quando a manifestação de amor e boas-vindas terminou, voltou o corpinho preto e branco e peludo para Cristo, rosnando. – Não, Tag! – Bruno se adiantou, lançando um olhar de censura para a irmã mais velha, erguendo o cãozinho e saindo. Pietro e Lucia, de 8 anos, saíram atrás do cão e de Bruno, ansiosos por se movimentar após longas horas de viagem. – Você precisa ser muito firme com ele, Belle – gritou Bruno da porta. – Só assim ele obedece. – E ela precisa ser firme com Franco também – retrucou Cristo. – Bem, obrigada aos dois pelo voto de confiança – comentou Belle, enquanto


Isa ria e a enlaçava em um forte abraço. – Como vai, vovó? – Senti sua falta – confidenciou Isa, seu olhar aguçado e inteligente perscrutando o rosto da neta e vendo sua palidez e as olheiras. – Ouvi dizer que não há lojas por aqui – suspirou Donetta com ar de desânimo. – E não tenho nada para usar nesse calor. – Faremos compras – prometeu Cristo. – Bem, não esperem que vá junto. – Bruno fez uma careta, fitando Cristo. – Lucia e Donetta gostam de tudo que é cor-de-rosa e tem laços. Enfiá-las dentro de um uniforme escolar vai ser


um inferno. – É apenas uma fase – acalmou Belle. – Mamãe nunca saiu da mesma fase – lembrou Bruno com frieza, o rosto encoberto por uma súbita dor que não podia evitar e que o fez baixar os olhos para o chão. Belle ficou tensa e tentou dizer algo que o confortasse, mas foi em vão. A avó sugeriu: – Podemos começar a visita oficial com você me escoltando até meu quarto. E uma xícara de chá será bem-vinda. Isa não se cansava de fazer perguntas sobre o Palazzo Maddalena. Ficou atônita ao saber que a aristocrática mãe de Cristo pouco ligava para o antigo lar de sua família.


– A princesa cresceu aqui e prefere a vida na cidade grande – explicou Belle. – Cristo só vem para cá durante as férias, de modo que o lugar necessita de reformas, mas não quero começar a falar disso quando acabamos de nos casar. – Parecia tão feliz quando me telefonou – lembrou Isa pensativa, enquanto se sentava com um suspiro agradecido em uma confortável poltrona de vime no terraço e pegava a xícara de chá que Umberto trouxera. – O que aconteceu desde então? Belle se forçou a sorrir. – Nada – disse com determinação. – Estou muito feliz com Cristo. – No início do casamento, um homem


e uma mulher enfrentam desafios – comentou Isa com delicadeza. – Ser um casal requer comprometimento. – Cristo é realmente muito bom para mim – murmurou Belle depressa, ansiosa para afastar qualquer preocupação que a avó pudesse ter. – De verdade. Não tenho queixas. – Então por que não está feliz agora? – replicou Isa sem rodeios. – Percebo que algo não está bem. – Mas não é algo que posso discutir... trata-se de uma coisa que preciso conversar com Cristo – declarou Belle, ciente de que falava a verdade. Por mais que desejasse, não poderia evitar o assunto sobre Betsy. Era preciso discutir a respeito. Precisava ter


respostas positivas, refletiu com tristeza. A primeira coisa que deveria evitar era culpar Cristo por seus sentimentos e, assim, envenenar o casamento com sua amargura. Mas era tão difícil sufocar o ressentimento, o ciúme e a dor que a invadiam cada vez que o fitava agora. – Parece sensato – comentou a avó com aprovação, mudando de assunto para atualizar Belle sobre o que acontecera na família desde seu casamento. O jantar foi servido no terraço em uma mesa enorme que Umberto pegara no sótão. A refeição transcorreu muito barulhenta e animada com todas as crianças falando ao mesmo tempo,


provocando umas as outras, criticando os modos de Franco à mesa. Belle podia ver que Cristo estava sem graça com tanta exuberância dos irmãos agitados. Pietro e Lucia mal viam a hora de acabar o jantar e sair correndo atrás de Tag para explorar os jardins de novo. Quando isso aconteceu, Franco tentou desesperadamente segui-los e se debulhou em lágrimas ao ficar para trás. Cristo foi pegar o garotinho no alto dos degraus que conduziam aos jardins. – Acho que é hora de ir dormir – murmurou com calma. – Vou chamar Teresa. – Não, eu o levarei para cima – disse Belle, estendendo os braços para carregar o irmãozinho. – Um banho irá


acalmá-lo. – Deixe que eu o carrego – interpôs Cristo com firmeza, enquanto a fitava com expressão dura. – Descerei em poucos... – Oh, não se preocupe conosco – interrompeu Isa depressa, relanceando um olhar para Bruno e Donetta. – Nós três vamos assistir à televisão. Umberto foi muito gentil e providenciou um aparelho. Então Belle seguiu Cristo escadas acima, imaginando o que haveria de errado com ele para tê-la olhado de maneira tão dura. Teresa os aguardava e estendeu os braços para segurar Franco.


– Coitadinho... está exausto. Vou dar o banho agora mesmo – anunciou. Belle então deu meia-volta, mas uma mão forte e morena a segurou pelo braço, impedindo-a de correr para baixo de novo. – Gostaria de trocar umas palavras em particular com você – murmurou ele. Belle se voltou com os olhos brilhantes de raiva e perguntou com os dentes cerrados: – O que está acontecendo com você? – Andou me evitando e me ignorando desde hoje de manhã – replicou Cristo. Belle ficou vermelha como um camarão. – Só estou tentando ser educada na


frente da família. – Então está fazendo um péssimo trabalho – criticou ele sem preâmbulos, a mão em seu braço deslizando para seus dedos e empurrando-a pelo corredor. – Precisamos desanuviar o ambiente. – Não quero conversar... ainda. Não estou pronta – explicou Belle com mais sinceridade do que pretendera. Ainda não chegara ao estágio desejável de encarar os sentimentos dele por Betsy sem sentir o gosto amargo do ressentimento e do ciúme. – Que pena. Eu estou pronto – retrucou Cristo, escancarando a porta de seu quarto e a fazendo entrar na frente com um empurrão.


– É por isso que está agindo como um homem das cavernas? – perguntou Belle furiosa. – Não. A culpa por isso é toda sua – retrucou Cristo sem hesitação. – Se quer brigar comigo, brigue. Não faça isso passando de agressiva para passiva o tempo todo e com sorrisos falsos. – Não agi assim! – protestou Belle, cada vez mais zangada. – É exatamente assim que está agindo e estou farto. Cometi o erro de admitir que em determinado momento pensei estar apaixonado por Betsy... – Não. Você afirmou que se apaixonara por ela! – contradisse Belle. – E você não ouviu direito – disse


Cristo com severidade. – Durante certo tempo, antes de conhecer você, acreditei que amava Betsy, mas quando a conheci logo percebi que interpretara mal meus sentimentos por ela. Belle parou de andar de um lado para o outro no quarto e ficou imóvel. – Interpretara mal? – repetiu com voz áspera, girando o rosto para fitá-lo. Com expressão intensa, Cristo deixou escapar o ar dos pulmões. – Precisa entender como estava na época em que o casamento de Nik e Betsy desmoronou. Sentia-me terrivelmente culpado porque... – Contou um segredo de Nik para Zarif que, por sua vez, deixou escapar também quando não devia, e o circo foi


montado – interrompeu Belle com impaciência. – Sim, você já me disse e eu me lembro... – E Betsy estava arrasada. Procuroume porque eu era irmão de Nik, acreditando que eu poderia saber ou compreender os motivos que levaram Nik a fazer o que fez. – Suspirou e fitou Belle nos olhos. – Foi por isso que ela me procurou, mas infelizmente eu não sabia responder a sua pergunta e não pude ajudar, porém senti muita pena dela. Qualquer que fosse a razão, Nik a tratara muito mal. Senti que devia protegê-la, estava aborrecido com Nik e, sinceramente, pensei que essas emoções fossem amor.


Enquanto Belle ia ouvindo o que Cristo tinha a lhe dizer, começou a respirar com alívio, pois por fim reconhecia que, nervosa e zangada, deixara de perceber a verdade e não entendera bem as palavras dele. Cristo interpretara mal seus sentimentos por Betsy e reconhecera seu erro. Belle podia entender como devia ter se sentido confuso, dividido entre a culpa e a responsabilidade pelo fim do casamento do irmão. Sentira-se desleal e ao mesmo tempo sensibilizado com a situação de Betsy. – Compreendo – murmurou afinal. – Sentiu-se responsável e tentou ajudar oferecendo um ombro amigo para ela.


– Ainda pensava que amava Betsy quando pedi você em casamento, embora nunca tivesse sentido tanta atração por ela como sentia por você – admitiu Cristo, que não desejava deixar nenhum ângulo mal explicado. – Parece ridículo e ingênuo, não? Belle franziu a testa, surpresa. – Não sentia atração por ela? – Não. Pensei que isso acontecia porque ainda a via como a mulher de meu irmão; porém, na verdade, ela não fazia meu tipo e por isso não me atraía. – Mas... vi fotos de Betsy em revistas e ela é lindíssima! – replicou Belle em um desafio infantil. – Descobri que ruivas altas e


curvilíneas são mais o meu estilo, amata mia – brincou Cristo. – Em particular uma que me deixa louco na cama e me ajuda no trabalho com sua capacidade e inteligência. Belle respirou fundo antes de perguntar com voz titubeante: – Está falando de mim? – E de quem mais seria? Afinal, foi só porque me apaixonei por você que concluí jamais ter amado Betsy. Com a boca e os olhos secos, Belle de repente sentiu falta de ar e tontura como se o chão faltasse sob seus pés. Sem dúvida suas suspeitas haviam sido muito infundadas. – Você se apaixonou por mim, Cristo? – Quase à primeira vista – provocou


ele com seu sorriso carismático. – Antes que decidisse tentar me convencer de que era sua mãe com 40 anos, eu a vi cruzar o gramado usando short, e suas curvas e pernas me deixaram louco – confessou com uma piscadela maliciosa. – Você é tão superficial – balbuciou Belle, tentado fazer graça também. Podia ser superficial, mas era seu marido, pensou cheia de amor. – Nada disso – objetou ele. – Adoro suas pernas, porém admiro seu cérebro também e sua língua ferina – confessou sem hesitação. – Aliás, há uma lista enorme de coisas que amo em você e que nada têm a ver com sua aparência sensual.


– Como o quê...? – pressionou Belle sem se envergonhar. – Sua lealdade e amor pela família, sua bondade e desprendimento – enumerou Cristo, se aproximando dela passo a passo enquanto Belle continuava a fitá-lo em estado de graça. Ele a amava, não a Betsy, e seu cérebro lutava para processar essa realidade maravilhosa. Ela não estava em segundo lugar. Era a primeira escolha dele, que a amava de verdade. Então o lampejo de felicidade inicial a envolveu como se fosse um bálsamo. – Também amo muitas coisas em você – tratou de dizer. – Porém, me apaixonei sem saber que isso estava acontecendo.


Foi só quando pensei que você amava Betsy que finalmente me dei conta do meu amor. – Grandes mentes pensam igual – brincou Cristo, acariciando seu rosto com os dedos. – Você me ama, eu amo você. Fazemos um par perfeito. – Não, somos imperfeitos, mas tudo bem... continuamos apenas humanos – sussurrou Belle, o coração batendo forte enquanto Cristo a tomava nos braços, logo a acalmando com sua força. – Oh, mal posso acreditar nisso... estava tão infeliz hoje! – Poderia ter-lhe dito antes que amava, mas você estava tão tensa e zangada que não me ouviria – confessou Cristo. – Sejamos sinceros, nenhum de


nós dois procurava ou esperava amor nesse casamento. Porém, você acabou se revelando a melhor coisa que aconteceu na minha vida, e tenho certeza de que nossa família unida completará essa felicidade. Belle ergueu os olhos para fitá-lo com ansiedade, temendo que Cristo estivesse sendo otimista demais, e acrescentou: – Mas também poderá ter muitos probleminhas com a família. – Lidaremos com isso juntos – murmurou Cristo, encostando os lábios aos dela e depois levantando o rosto para mostrar o amor e a ternura que abrandavam suas feições. – Você é minha, querida, minha


esposa, meu futuro... – Estou gostando muito de ouvir isso – admitiu Belle, esfregando o rosto no peito amplo do marido e suspirando de contentamento. – Porém, pensava que só me via como um relacionamento de curto prazo, porque me disse que não valia a pena que aprendesse italiano. – Ma no... claro que não – protestou Cristo. – Só quis dizer que, atualmente, não passo muito tempo na Itália. – De qualquer modo, gostaria de aprender. – Amo você – disse Cristo em italiano, e ela repetiu as palavras com uma risadinha enquanto ele a fazia se deitar na cama.


BELLE SAUDOUsua família com um sorriso radiante na manhã seguinte. Isa sorriu também, mas nada disse. Ralharam com Franco por tentar tirar o prato de Cristo e Tag por mordiscar os tornozelos dele. Pietro e Lucia discutiram como sempre. Donetta queria saber o tempo todo quando iriam fazer compras e Bruno tecia elogios rasgados para a beleza da paisagem local. Por baixo da mesa Cristo segurou a mão de Belle e murmurou: – A família é tudo na vida, amata mia. Meu pai perdeu tanta coisa.


Epílogo

QUATRO ANOSmais

tarde, Belle parou em frete ao espelho alto giratório e fitou a leve protuberância em seu ventre que era enfatizada pelo vestido justo. Suspirou. – Você está grávida. Supõe-se que fique sem cintura – disse a avó com ar de reprovação. – Mas estou engordando muito – gemeu Belle, analisando os seios fartos e os quadris mais arredondados.


– Nem tanto – contradisse Isa. – É muito ativa e naturalmente precisa se alimentar. Pelo menos não sentiu tantas náuseas, como sua mãe sempre sentia quando esperava um filho. – Então está tudo certo – concordou Belle, voltando-se para fitar a senhora. – Tem certeza de que ficará bem enquanto estivemos fora? – Belle, você e Cristo só se ausentarão por cinco dias. É claro que todos ficaremos bem – disse a avó em tom displicente. – Pare de se preocupar. Cristo e Belle iriam celebrar quatro anos de casados em Veneza, onde visitariam a princesa e Henri em seu palácio no Grande Canal, mas se


hospedariam em um pequeno e aconchegante hotel que Cristo escolhera com muito cuidado. Belle mal acreditava que tanto tempo já se passara desde o casamento e que em breve seria mãe. Cristo comprara para eles uma casa fabulosa em Holland Park. Bruno, no momento, estudava arte na faculdade e Donetta pretendia ser estilista de moda. Pietro e Lucia estavam juntos na escola e brigavam menos do que antes, pois eram quase adolescentes. Franco era um garotão forte de 6 anos no primário e insistia em cortar os vastos cabelos assim que começavam a crescer demais. Copiava tudo que podia em Cristo, a quem, como os gêmeos, chamava de


“papai.” O casal começara sua vida a dois com uma família já pronta e eram oficialmente os tutores das crianças. Cristo adorava essa situação e tomava conta pessoalmente dos estudos de todos. Por insistência dele, se casaram também em uma igreja italiana logo após o primeiro Natal juntos. Ambos haviam sentido a necessidade de fazer seus votos matrimoniais com mais emoção do que na cerimônia na Irlanda. De vez em quando também costumavam passar fins de semana e feriados sozinhos para incrementar a “eterna lua de mel”, como dizia Cristo.


Fora na última escapada romântica que Cristo confessara desejar um filho de Belle. E isso se concretizara mais cedo do que imaginavam, pois logo ela engravidara. Retornando ao momento presente, ela sorriu espalmando as mãos sobre o ventre ao pensar na garotinha que estava a caminho para se unir à família Ravelli. Mal podia esperar, e seus irmãos também estavam muito animados com a nova adição. Na verdade, Belle jamais se sentira tão feliz com Cristo, a avó e as crianças. E jamais estivera tão ocupada. O palácio onde costumavam passar as férias de verão fora modernizado. Todo


o círculo familiar se tornara mais unido. O irmão de Cristo, Nik Christakis, ainda intimidava Belle, porém sua vida fizera surpreendentes reviravoltas desde que haviam se visto pela primeira vez e definitivamente Nik deixara de beber. A vida de Zarif ainda era uma história em desenvolvimento, e Belle adorava visitar Vashir com sua cultura vibrante e colorida e seu passado fabuloso. O irmão mais novo de Cristo vencera a tempestade causada pelo escândalo a respeito da vida secreta e dupla do pai. Afinal, os boatos sobre o comportamento errado de Gaetano durante anos haviam sido tantos que a verdade sobre sua segunda família já não chocara tanto. O povo de Vashir se


surpreendia ao ver como Zarif, em comparação com o pai, era conservador e tradicional. Belle subiu na limusine que a levaria ao aeroporto para se encontrar com Cristo e sorriu, ansiosa pela promessa de receber total atenção do marido por alguns dias. Uma hora e meia mais tarde embarcou no jato particular, seus olhos logo pousando na figura alta e elegante de Cristo, que afastou o laptop e se levantou para cumprimentá-la. – Está linda, amata mia – disse com a voz rouca. Belle deslizou as mãos sobre o busto e os quadris em um gesto zombeteiro.


– Bem, a cada mês engordo mais para seu deleite... – E eu adoro vê-la grávida – replicou Cristo, curvando-se para beijar seus lábios com ansiedade. – Acho que está extremamente sexy. – Continue falando – pediu ela, enquanto ele a acomodava no assento confortável ao seu lado e ajeitava seu cinto de segurança para a decolagem. – Mais tarde. Agora é momento para isto... – Com gesto lento, Cristo enfiou um anel de esmeralda no dedo da esposa. – É da mesma cor dos seus olhos e significa minha gratidão e alegria por quatro anos felizes de casamento.


– Obrigada, é lindíssimo – disse Belle, fitando a joia. – Infelizmente não posso dar meu presente no momento, então terá que esperar um pouco... até decolarmos. – O que é? – perguntou Cristo curioso. Belle fingiu inocência ao responder: – Bem, pode ser uma coisa transparente com rendas e azul-turquesa como você gosta, mas terá que esperar até estarmos no ar – explicou ela com uma risada irreverente. – Amo você, querido. Demais. – E eu a adoro – murmurou Cristo, apertando sua mão. – E se está falando sobre o que penso que está, mal posso


esperar. Belle ergueu os olhos verdes, corando de antecipação. Olhou pela janela do avião. – Já estamos decolando. E estou usando a lingerie azul. Que tal fazermos amor voando? Essa é a minha surpresa. Não é um ótimo presente?


DESAFIADO PELO DESEJO Carol Marinelli

No momento em que foi tocar a campainha da suíte, sua mão parou quando a porta se abriu, e Alina engoliu em seco enquanto se preparava para ficar cara a cara com a lenda Demyan Zukov. Em vez disso, foi uma linda ruiva que entrou em sua linha de visão,


sem mal olhar para ela. Alina estava muito acostumada a ser ignorada. Discreta... ela havia ouvido Elizabeth descrevê-la assim ao telefone uma vez. Era um benefício, às vezes, assegurara Elizabeth enquanto Alina estava sentada lá com as bochechas em chamas. Alguns de seus clientes, inclusive, pediam as mulheres mais discretas, explicara Elizabeth, para não provocar esposas ciumentas. Perfeito! – Olá! – Alina bateu à porta e esperou. Quando não houve resposta, ela se perguntou se deveria entrar ou esperar ser convidada a entrar. Haviam


lhe dito para chegar às oito. Alina olhou para o telefone. Faltavam dois minutos. – Olá! – Alina bateu à porta e gritou de novo. – É Alina Ritchie, da agência... Mais uma vez não houve resposta. Talvez, dada a sua noite movimentada, Demyan tivesse dormido demais, pensou Alina, entrando hesitante. O lugar estava um caos total. Havia roupas espalhadas por toda parte, assim como pratos e copos sujos. – Olá! – disse Alina novamente, mas, em seguida, em pânico, ela se perguntou se estava prestes a encontrá-lo morto na


cama por seus excessos. Pare com isso! Ela amaldiçoou sua imaginação fértil, mas, realmente, com todas as evidências e com tudo o que havia lido sobre Demyan, era uma possibilidade. Ela parou, tentando descobrir o que deveria fazer. Virou-se com um sobressalto quando uma voz profunda e com sotaque acentuado veio de trás dela. – Bem, você está aqui. Ela não esperava ver o que viu. Demyan poderia muito bem ter passado a noite sendo arrumado no spa do hotel para se preparar para aquele momento. Como uma bela Fênix emergindo das cinzas, lá estava ele, absolutamente


elegante em meio ao caos. O que mais chamou a atenção de Alina foi que o cinza-escuro da gravata combinava perfeitamente com os olhos de Demyan. Não, não perfeitamente, pensou Alina, porque cores e matizes eram, talvez, suas coisas favoritas. Nada se comparava àqueles olhos, eles faziam até mesmo o céu noturno parecer sem graça. Se Demyan não fosse tão imponente, Alina poderia ficar olhando para eles para sempre. – Sou Demyan. Como se fosse preciso dizer. Alina pegou a mão estendida e sentiu os dedos longos e secos se fecharem em


torno dos dela. Ela sentiu uma lufada da colônia de aroma ousado, limpo e fresco, mas com um quê almiscarado. Ela nunca havia cheirado nada tão delicioso antes. – Sou Alina. – Alina? – Demyan franziu o cenho. – É um nome eslavo, não? – Não – resmungou ela. – É celta... – Ela mal conseguia falar. Ele era tão deslumbrante. Onde estava a ressaca? Seu cabelo negro estava lavado e penteado para trás e Demyan estava barbeado. A pele dele estava lisa e pálida. Em um segundo, Alina viu que seus olhos escuros estavam talvez com um toque avermelhado, mas, fora isso, não havia nenhuma evidência de uma


noite selvagem. Este era o seu costume, era assim que vivia, percebeu Alina enquanto tentava falar. – Na verdade, pode ser ambos. – Ambos? Ele já havia perdido o fio da conversa e precisava desesperadamente de um café muito forte. Normalmente, ele não deixava a cama sem um, porém, lembrando-se de que havia pedido que a secretária temporária estivesse ali às oito, em vez de pedir o café, Demyan tinha primeiro tomado banho e se vestido para o trabalho. Trabalho sempre vinha primeiro para ele.


Ele nunca havia estado atrasado para uma reunião nem perdido um compromisso. Ele controlava cada aspecto de sua vida. Demyan não estava no topo por acaso. – Eu acho que é tanto eslavo quanto celta. Significa... – Alina parou depois que sentiu sua distração. Por que Demyan iria querer saber o significado de seu nome? – O que posso fazer pelo senhor? – perguntou.


402 – DONA DE SEU DESTINO – MELANIE MILBURNE 403 – CORAÇÃO KATE HARDY

SECRETO

404 – ACORRENTADO AO TRONO – CAROL MARINELLI

Próximos lançamentos:


409 – DIAMANTE PURO? – SUSAN STEPHENS

410 – POR UM ANO APENAS… – LYNNE GRAHAM

411 – TOQUE DE OUSADIA – CAITLIN CREWS

412 – DIAMANTE PROIBIDO – SUSAN STEPPHENS


406 – DESAFIADO PELO DESEJO CAROL MARINELLI Alina Ritchi precisa enfrentar seu medo e ir de encontro ao destino: tornar-se assistente do lendário playboy Demyan Zukov e provar a ele que é capaz de dizer “não”. Mas por quanto tempo?

407 – NOITE NO PARAÍSO – MAISEY YATES Clara Davis aceitou fingir ser a noiva de seu chefe, o belo Zack Parsons. Agora,


os dois terão uma noite de paixão para satisfazer todos os seus mais secretos desejos.

408 – ESPOSA DECIDIDA – LYNNE GRAHAM Antes de assinar os papeis do divórcio, Betsy tem mais uma noite de amor com seu marido Nik Christakis. Esse encontro acaba tendo consequências inesperadas, que irão uni-los para sempre.


CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ G769n Graham, Lynne Noiva rebelde [recurso eletrônico] / Lynne Graham; tradução Angela Monteverde. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Harlequin, 2014. recurso digital Tradução de: Ravelli’s defiant bride Formato: ePub Requisitos do sistema: Adobe Digital Editions Modo de acesso: World Wide Web


ISBN 978-85-398-1544-9 (recurso eletrônico) 1. Romance irlandesa. I. Monteverde, Angela. II. Título. 14-14709 05/08/2014

CDD: 828.99153 CDU: 821.111(41) 08/08/2014

PUBLICADO MEDIANTE ACORDO COM HARLEQUIN BOOKS S.A. Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a transmissão, no todo ou em parte. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência.


Título original: Ravelli’s Defiant Bride Copyright © 2014 by Lynne Graham Originalmente publicado em 2014 por Mills & Boon Modern Romance Arte-final de capa: Isabelle Paiva Editoração Eletrônica: ABREU’S SYSTEM Editora HR Ltda. Rua Argentina, 171, 4º andar São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ — 20921380 Contato: virginia.rivera@harlequinbooks.com.br


Sumário geral

Capa Teaser Querida leitora Rosto Capítulo 1 Capítulo 2 Capítulo 3 Capítulo 4 Capítulo 5 Capítulo 6 Capítulo 7 Capítulo 8


Capítulo 9 Capítulo 10 Epílogo Próximos lançamentos Créditos Sumário geral


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.