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CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, domingo, 6 de março de 2016 • 7
ENTREVISTA / DANIEL MANGABEIRA, diretor de Políticas Públicas da Uber no Brasil Fotos: Breno Fortes/CB/D.A Press
NO CENTRO DO DEBATE chegada do aplicativo da startup americana Uber ao Brasil causou embates que colocaram a empresa no foco de uma turbulência que exigirá dela a habilidade para dialogar. A indignação de taxistas inconformados com a concorrência e a falta de regulamentação do setor são alguns dos pontos críticos. A empresa, que oferece serviço de transporte individual particular a um clique, foi fundada oficialmente em junho de 2010 e já está presente em mais de 360 cidades, em 68 países. No Brasil, opera em oito capitais. Recentemente, em pesquisa encomendada ao Instituto Datafolha para compreender melhor como os brasileiros veem esse novo mercado em desenvolvimento, os resultados mostraram que 95% dos entrevistados gostariam que os serviços da Uber fossem regulados no Brasil. Em Brasília, o número é ainda maior: 97% dos entrevistados acreditam que deva existir alguma forma de regulação. Em entrevista ao Correio, o diretor de Políticas Públicas da Uber no Brasil, Daniel Mangabeira, explicou que canais a empresa usa para ouvir os usuários e falou sobre a importância da comunicação não só com o público externo, mas também no ambiente profissional interno.
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EM ENTREVISTA AO CORREIO, REPRESENTANTE DA STARTUP RESPONSÁVEL POR DEIXAR O TRANSPORTE INDIVIDUAL A UM CLIQUE FALA SOBRE A PROMOÇÃO DO DIÁLOGO EM DIVERSAS FRENTES, COM MOTORISTAS, USUÁRIOS E PODER PÚBLICO
Têm sido registradas diversas situações de conflito entre taxistas e motoristas da Uber que acabam em agressão verbal e até física. Como os motoristas são treinados para agir nesses casos? A Uber repudia qualquer tipo de violência e acredita que apenas o debate de ideias pode auxiliar no entendimento de divergências sobre um tema. Embora nossos parceiros sejam empreendedores e não exerçamos ingerência sobre eles, recomendamos que não haja conflito e que, em casos de violência, as autoridades competentes sejam acionadas. Como exercer o diálogo também com as autoridades e com a sociedade nas discussões sobre a legalidade do serviço prestado? Aqui no Brasil, a Uber segue dialogando com o poder público, com o mercado e com a sociedade civil para criar uma regulação que seja benéfica ao novo cenário que surgiu com a economia do compartilhamento. Ao longo de 2015, por exemplo, participamos de dezenas de audiências públicas, debates, palestras, prestamos informações ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), ao Judiciário, a grupos de estudos formados pelo poder público e até por instituições acadêmicas. Em 2016, continuaremos com a política de buscar ativamente o debate com a sociedade acerca dos benefícios que a tecnologia da empresa traz às cidades. No caso da Uber, que canais são usados para isso? Uma das formas pela qual incentivamos o diálogo são as campanhas para que a população envie e-mails aos seus representantes e participem das consultas públicas propostas por eles. Em Brasília, por exemplo, centenas
de milhares de e-mails foram enviados para o governo do GDF, e isso abriu caminho para uma discussão mais detalhada sobre como a tecnologia pode ajudar o DF. Outro recurso utilizado como forma de diálogo foi a carta aberta ao prefeito (Fernando) Haddad (de São Paulo), publicada nos jornais Folha de S.Paulo e Estado de S. Paulo. Uma mensagem respeitosa que propunha um olhar para algo novo, benéfico para a população e para a cidade. São desenvolvidas pesquisas para saber em que locais vale a pena ofertar o serviço e em que quantidade? Isso é importante para manter uma comunicação com o público? A Uber está sempre muito próxima das cidades e recebemos inputs diariamente de usuários e motoristas parceiros para entender as necessidades locais. Em São Paulo, por exemplo, identificamos o aumento de pessoas utilizando bicicleta para se deslocar pela cidade com o aumento das ciclofaixas. Com isso, percebemos que o uberBIKE seria ideal para facilitar a vida dos usuários na capital paulista. A chegada do uberX a Brasília também teve origem nessa constante interação entre a Uber e as cidades. Entregamos aos usuários um produto que eles desejavam — uma versão mais acessível para apertar um botão e conseguir se deslocar de forma segura por Brasília. Na virada do ano, aqui em Brasília, alguns usuários reclamaram do preço cobrado nas corridas... Tratamos com total transparência o Preço Dinâmico. Ele nos ajuda a atender à alta demanda como nenhuma outra plataforma permite, possibilitando que os usuários tenham um carro disponível sempre que precisarem. Quando a demanda por viagens aumenta, os preços variam para incentivar que mais motoristas se conectem ao aplicativo e assim você terá um carro sempre que precisar. Quando a oferta subir, os preços rapidamente voltam ao normal.Essemecanismoajudaaequilibrar a oferta e a demanda, pois incentiva os motoristas a estarem disponíveis, por exemplo, após o fechamento de bares no sábado à noite ou durante uma tarde chuvosa. Assim, nossos usuários podem confiar que não ficarão na mão. Quando o Preço Dinâmico é ativado, um pop-up aparecerá no aplicativo pedindo que confirme o
nas redes sociais. Vale destacar que é possível estimar o preço final antes de pedir um carro.
O mais importante de tudo isso deve ser um diálogo entre as regulações do passado e as regras que queremos ter para a nossa sociedade do futuro. Deve ser um diálogo com o futuro, do país que somos hoje e do país que queremos ser"
Liderança é uma função do diálogo. Liderar significa inspirar e buscar instilar nos liderados o desejo de afirmação e de progresso"
conhecimento sobre a variação de preço antes de solicitar uma viagem. O multiplicador é aplicado ao valor final da sua viagem e, se você não quiser aceitar, você pode optar por ser avisado quando o preço voltar ao normal. Se esse multiplicador é 2.0x ou maior, o usuário precisa digitar o número no celular para confirmar que aceita o preço mais alto. Qual a melhor maneira de lidar com esse tipo de situação? Em épocas como o ano-novo, Natal ou carnaval, quando a de-
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Como vocês promovem o diálogo dentro da empresa? A Uber é uma empresa de tecnologia que nasceu no Vale do Silício. Em geral, empresas assim são vistas como mais abertas ao diálogo e à participação dos funcionários em processos decisórios. Temos um ambiente descontraído, o que não é o oposto de um ambiente profissional. Somos criteriosos e sérios, acreditamos muito no que estamos fazendo e agimos com total profissionalismo no momento em que nos é exigido. Preservamos uma cultura de excelência e diálogo sempre aberto e franco.
manda por um Uber aumenta bastante, uma vez que mais pessoas querem se movimentar com segurança pelas cidades, mas, ao mesmo tempo, motoristas parceiros querem passar tempo com seus familiares. Por isso, desenvolvemos comunicações específicas para falar sobre o assunto com nossos usuários. Enviamos previamente um e-mail para todos os usuários, publicamos em nossas redes sociais informações sobre como funciona o Preço Dinâmico e criamos um FAQ com questões que percebemos nas respostas
Hoje, mesmo as empresas menos conectadas estão sujeitas a avalanches de críticas ou de elogios pela internet. No caso da Uber, o serviço já é oferecido on-line e com todas as facilidades e possibilidades que a era digital permite. Isso faz com que a empresa tenha um comprometimento ainda maior com os feedbacks que recebe pelas redes sociais? Não só por redes sociais, mas pelo próprio aplicativo. O feedback entre motoristas parceiros e usuários é o que mantém a plataforma da Uber saudável para toda a comunidade. Após cada viagem, o motorista parceiro avalia o usuário e o usuário avalia o motorista parceiro. Os motoristas precisam ter média de 4,6 (em uma escala de 1 a 5 estrelas) para continuar na plataforma. O usuário também pode ser desconectado da plataforma se tiver uma média baixa de avaliações, preservando assim a satisfação de todos os envolvidos. Temos uma equipe dedicada a responder todas as sugestões e demandas que surgem pelo próprio aplicativo. Assim, elas podem apertar um botão e conseguir um carro para se deslocar com facilidade, da mesma forma que com um clique podem buscar itens perdidos no carro ou pedir algum ajuste de preço, por exemplo. A interação que o aplicativo promove entre empresa, motorista e cliente já representa uma plataforma de diálogo em si? Sim, claro. Ao propor a avaliação mútua, entre motoristas parceiros e usuários, a Uber zela pelo equilíbrio entre as partes. Isso é uma forma de diálogo que mantém a plataforma saudável para todos os envolvidos. Mas, mais do que isso, a plataforma é também uma forma de expressão política e social. É um mecanismo que permite a milhares de empreendedores — já são mais de 10 mil no Brasil — e centenas de milhares de usuários manifestarem a sua opinião sobre os direitos que eles querem ver garantidos pelas instituições, e sobre a cidade que eles querem ter no futuro. Na sua opinião, qual o papel do diálogo para desenvolver a liderança? Liderança é uma função do diálogo. Liderar significa inspirar
e buscar instilar nos liderados o desejo de afirmação e de progresso. O diálogo é papel fundamental no processo de desenvolvimento de lideranças. Na Uber zelamos muito pelo diálogo aberto e franco sobre os mais diversos temas. E, mais, acreditamos que tecnologias como a nossa podem provocar o surgimento de novas formas de liderança política e social. Uma liderança mais moderna e conectada, uma liderança que olhe para o futuro e que aproveite a realidade mais aproximada, tornada possível pelo advento das redes sociais, para agir, de forma corajosa e instantânea, no sentido de assegurar as vontades manifestadas pelos cidadãos. Como a empresa vê o cenário de negócios no Brasil hoje? No caso da Uber, há a necessidade de regulamentação para que o serviço seja ofertado em algumas unidades da Federação, mas muitos empresários de outros setores reclamam também do excesso de burocracia, de impostos e de leis trabalhistas ultrapassadas que dificultam a atividade empreendedora. Tudo isso exige habilidade para o diálogo? É importante esclarecer que não há entrave legal para que serviços como os facilitados pela plataforma da Uber sejam ofertados. A Constituição Federal e a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), Lei Federal nº 12.587, de 2012, permitem claramente a prestação do serviço de transporte individual privado. A regulação dessas leis é importante para dar certeza jurídica a esse sistema e permitir que todos esses empreendedores adquiram legitimidade para trabalhar com dignidade. Defendemos que essas regulações sejam modernas, estabelecendo regras para o acesso às novas plataformas, e não impondo restrições ao exercício e à prestação dos serviços. O diálogo aqui, portanto, é muito importante. Deve ser o diálogo com a sociedade, tanto os usuários que pedem mais uma maneira de se movimentar, quanto os motoristas parceiros, que desejam uma oportunidade digna de gerar renda pra si e para as suas famílias. Mas, o mais importante de tudo isso, deve ser um diálogo entre as regulações do passado e as regras que queremos ter para a nossa sociedade do futuro. Deve ser um diálogo com o futuro, do país que somos hoje e do país que queremos ser.