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CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, domingo, 20 de junho de 2010
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ARTISTA PLÁSTICO GABRIEL MARQUES SE BASEIA NO GRAFITE E NA EXPERIÊNCIA EM CIRCO PARA COMPOR ESTÉTICA PRÓPRIA E MODIFICAR O ESPAÇO URBANO
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&Arte
Diversão
Editor: José Carlos Vieira josecarlos.df@dabr.com.br
Carolina Campos/Divulgação
Fotos: Ricardo Rosa/Divulgação
FANTÁSTICODA
» MARINA SEVERINO urante anos, passei por locais em Brasília onde existiam objetos para os quais olhava e imaginava seres e personagens, coisas que tinham a boca aberta”, conta Gabriel Marques, 21 anos. Nesse mundo paralelo, bueiros se transformavam em seres humanoides prestes a engolir quem passasse à frente. Enquanto isso, placas de rua, antes destruídas, podiam saltitar como coelhos. O universo fantástico se tornou realidade no moderno espaço urbano candango. Gabriel é conhecido e cultuado entre outros artistas por intervir em elementos comuns do cotidiano, como placas, paredes e construções abandonadas com pincel, spray, caneta e tinta de parede. O trabalho começa a ser reconhecido pelos passantes em Brasília e acaba de ganhar a Europa. Convidado a uma turnê pelo continente com a companhia de teatro Circênicos, que mantém com o irmão, o artista pretende empregar o tempo disponível entre as apresentações em intervenções artísticas, e segue passos de ídolos da arte urbana como OsGêmeos, Alexandre Orion, Banksy e Blu. O projeto estético de Gabriel Marques, que assina como Plic, é resultado de diretrizes desenvolvidas por ele durante estudos no Instituto de Artes da Universidade de Brasília (UnB). “O objetivo é ressuscitar espaços mortos da cidade, muros cinzas, locais abandonados, coisas, qualquer estrutura em potencial, intervindo por meio de pinturas, colagens, grafites, esculturas, performance e festas. É transformar a paisagem branca e concreta de Brasília em um ambiente vivo e lúdico, de forma a levar alegria e beleza para o dia a dia das pessoas que transitam por esses locais”, explica. Inspirado pelo Site Specific, movimento promovido por artistas norte-americanos que se tornou famoso nos anos 1970, Plic prefere substituir o termo grafite por pintura urbana em virtude da visão muitas vezes marginalizada da arte, mas não nega as origens. “Pode-se chamar de pós-grafite. Estamos em uma transição de escolas e eu estou vivendo esse momento. De modo geral,
Não é pichação, não é depredação, e sim uma obra de arte em um local público, um local onde qualquer pessoa pode ver” Gabriel Marques, artista
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Arquivo Pessoal
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se enquadra no conceito de arte contemporânea”, define o artista, que também se sente à vontade com o termo em inglês new school para definir a linha em que se inspira. As pinturas são planejadas com dias de antecedência, e, cada elemento, projetado para se mesclar à paisagem e dialogar com o suporte em que é desenhado. Muitas vezes, o tema é o circo, com palhaços e acrobatas — arte à qual se conecta pelo trabalho no Circênicos. As ações duram, em média, uma hora e meia. Plic prioriza a execução durante o dia, momento em que dialoga com os passantes sobre a arte voltada ao ambiente coletivo. “Assumo a postura de combater a marginalização dessas ações, que só têm a contribuir com a cidade. Sempre recebo muitos elogios durante o processo, principalmente das pessoas mais humildes, e isso é gratificante. É um reconhecimento que vem da forma mais pura, de pessoas que passam pelo local todo dia e que são dignas de darem uma espécie de autorização para o meu trabalho”, acredita. Envolvido com a arte desde a juventude, ele começou a pintar aos 10 anos e, mais tarde, se ligou ao movimento hip-hop e conheceu grafite, rap e dançarinos de break. Não demorou para se inspirar na arte de rua e criar letras próprias. “Aos 15 anos, fiz meu primeiro grafite em uma parede do modo mais clichê possível, com letra coloridas, feitas com spray, em um local sem autorização e de madrugada. Uma ação completamente marginalizada, que meus pais eram contra e eu também não gostava”, recorda. Devido à dificuldade de conseguir autorização para continuar a pintar de forma tranquila, Gabriel parou de grafitar em paredes. Com a mudança de atitude evidenciada pelo projeto atual, acredita que conquistou a compreensão da sociedade, mas ainda há um caminho a ser percorrido. “Durante as intervenções, só tive contato com a polícia durante algumas pinturas em objetos abandonados e em construções em ruínas. Tive que conversar durante muito tempo para explicar o trabalho legítimo que estava fazendo. Não é pichação, não é depredação, e sim uma obra de arte em um local público, um local onde qualquer pessoa pode ver”, conclui.
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