Revista Akrópolis - História da Arquitetura e da Arte

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AKRÓPOLIS EDIÇÃO ÚNICA NOVEMBRO 2015 ARQUITETURA, ARTE E HISTÓRIA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA SKARA BRAE ALDEIA NEOLÍTICA É REFERÊNCIA DE ARQUITETURA VERNACULAR STONEHENGE CONSTRUÇÕES MEGALÍTICAS E A PAISAGEM COMO FORMA DE EXPRESSÃO

REVISTA AKRÓPOLIS

Dezembro de 2015 Edição Única

Departamento de Teoria e História em Arquitetura e Urbanismo Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Brasília

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CADA ÉPOCA É DEFINIDA PELO QUE APRESENTA DE NOVO, DE ESPECIFICAMENTE SEU. PODE NÃO SER UM ALTO PENSAMENTO FILOSÓFICO, UMA GRANDE REFORMA MORAL, UMA ARTE REQUINTADA, UMA CIÊNCIA GENEROSA. MAS HÁ-DE SER A DÁDIVA DE QUALQUER UMA DESSAS MANIFESTAÇÕES HUMANAS, OU TODAS, NUMA CONCEPÇÃO INTEIRAMENTE INÉDITA, ORIGINAL, INCONCEBÍVEL NOUTRO TEMPO DA HISTÓRIA. MIGUEL TORGA

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ARQUITETURA, ARTE E HISTÓRIA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
Alexandre Duarte Amanda Sousa Cleiton do Carmo Karolyne Godoy Larissa Ferreira Matheus Oliveira

EDITORIAL

A revista Akrópolis nesceu no cur so de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília/UnB como parte dos requisitos para a con clusão da disciplina de História da Arquitetura e da Arte I, sob a coor denação da professora Cecília Sá e da estagiária docente Sued Ferreira. As acrópoles da Antiga Grécia eram, como o próprio nome diz, “cidades altas”; construídas no pon to mais elevado das cidades, elas serviam originalmente como pro teção contra invasores de cidades inimigas, e quase sempre eram cer cadas por muralhas. Com o tempo, passaram a servir como sedes ad ministrativas civis ou religiosas. Da mesma forma, esta revista pretende ser uma sede, ou um repositório de relatos sobre a arte e arqui teura do mundo antigo, e no caso desta edição, abarcando do perío do neolítico até o período gótico. Divididos nas secões de Arte, Ar quitetura e Cidade, trazemos artigos que abordam esse período, cada qual com uma abordagem distinta. Alexandre Duarte e Cleiton do Carmo trazem à tona uma discussão sobre o feminino e a religião através da análise das esculturas de Vênus de Willendorf e Dolni Vestonice. Abrangendo o tema Arquitetura, a dupla discorre sobre as Stoas e

os edifícios públicos na arquitetu ra clássica, seguido por um artigo sobre a cidade de Jerusalém e as transformações urbanas mediante a influência de diferentes povos. Karolyne Godoy e Matheus Olivei ra escrevem sobre Stonehenge, trazendo a discussão sobre as con struções megalíticas e a paisagem como forma de expressão huma na. Na seção Arte, abrangeu-se o tema sobre pinturas cerâmicas em vasos gregos, seguido pelas cat acumbas cristãs e a simbologia litúrgica nos primeiros séculos do cristianismo na seção Arquitetura. Por fim, Amanda Souza e Larissa Ferreira desbravam os mistérios sobre a cidade Skara Brae e sua adaptação à natureza. Na seção cidade, a dupla compara os primei ros jogos em Olímpia com o grande evento de Jogos Olímpicos que temos atualmente, e discorre so bre a importância dos mosaicos bizantinos na igreja de Santa Sofia. Também contamos com a resenha crítica do documentário Con struindo um Império: Gré cia. do canal History Chan nel, abordando a linguagem clássica da Grécia Antiga como um exemplo de produção artística.

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Equipe Editorial
6 | AKRÓPOLIS SUMÁRIO STONEHENGE CONSTRUÇÕES MEGALÍTICAS E A PAISAGEM COMO FORMA DE EXPRESSÃO VÊNUS DE WILLENDORF E DOLNI VESNONICE 10-13 06-09 ARTE - Vênus de Willendorf e Donis Vestonice 6 CIDADE - Skara Brae 14 ARQUITETURA - Stonehenge 10 ARTE - Vasos Gregos 18 ENTENDENDO O FEMININO E A RELIGIÃO ATRAVÉS DAS ESCULTURAS E DA ARTE RESENHA - Construindo um império: Grécia 23

MOSAICOS BIZANTINOS CONSTRUINDO UM IMPÉRIO: GRÉCIA

ARQUITETURA - Stoas 24

ARTE - Mosaicos Bizantinos

ARQUITETURA - Catacumbas Cristãs 36 CIDADE - Jerusalém 39

Construindo um Império: Grécia, é um documentário publicado no canal History Channnel que fala sobre como era a organização dessa civilização antiga na arte da arquitetura e construção. O documentário também destaca sua política, religião, filosofia, sua cultura em geral que vai influenciar muitas civilizações e que por esse motivo é conhecida como o berço da civilização ocidental.

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CIDADE - Olímpia 29 Sua importância na Basílica de Santa Sofia.
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VÊNUS DE WILLENDORF E DONIS VESTONICE

ENTENDENDO O FEMININO E A RELIGIÃO ATRAVÉS DAS ESCULTURAS E DA ARTE

O artigo foi elaborado de modo a abordar a inserção da mulher na sociedade no perío do pré-histórico, de acordo com a análise de manifestações artísticas, no caso as escul turas das Vênus encontradas desse período. Como a figura da mulher era vista diante da sociedade, em contraponto à posição da representação feminina em diversos perío dos históricos. Ao propor o tema, abre-se um leque de informações que só se tornam possíveis ao analisar o contexto do qual as obras de arte pertenciam.

TEXTO POR: ALEXANDRE DUARTE & CLEITON DO CARMO ARQUITETURA, ARTE E HISTÓRIA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
ARTE

Além de serem arquétipos da representação da mulher da época, as Vênus não deixam de exercer um marcante contraponto ao que, nos dias atuais, temos como arquétipo de beleza, prosperidade e estética.

Desde os mais antigos vestígios da representação feminina, datada do período Paleolítico, por volta de 29.000 a.C. e 25.000 a.C o papel da mulher teve in úmeras alterações em relação ao nível de liderança que sua figura tinha em relação à sociedade. Devido a es tas alterações, a forma que a mesma é representada na arte foi mudando de igual modo, sendo que os primei ros exemplos destas representações correspondem ao período paleolítico da nossa história. Para análise, foram usadas duas pequenas estatuetas do período an teriormente citado, sendo elas a Vênus de Willendorf e a Vênus de Dolni Vestonice, dois dos objetos artísticos mais antigos encontrados. Na sociedade paleolítica, a mulher exercia um papel importante e não menos favorecido que o dos homens, suas funções inclusive religiosas e culturais eram super valorizados, pois os principais aspectos que eram res saltados na sua representação eram justamente os que davam a ideia delas serem a representante da mãe ter ra no meio humano. “os mitos primordiais contam que os humanos foram gerados pela terra, da analogia en tre as profundezas da terra e as cavernas, com o útero e o ventre feminino, como se a terra fosse a verdadeira geradora, nutry, e no caso a mulher sua representante.” (MOURA, 2010, PP.2).

Na Vênus de Willendorf, por exemplo, é possível no tar que ao ser esculpida, foram considerados como el ementos mais importantes, as partes exclusivamente

femininas, na tentativa de enaltecer a fertilidade e manutenção da vida. Ela foi esculpida em pedra cal cário oolítico e colorida com ocre vermelho há 30 ou 25 mil anos a.C. A pequena estatueta, também cham ada de Mulher de Willendorf com aproximadamente 11,1 centímetros de altura foi encontrada em um sítio arqueológico do paleolítico, perto de Willendorf, na Áustria. Foi desenterrada em 8 de Agosto de 1908 pelo arqueólogo Josef Szombathy. A estatueta possui grandes seios, ventre exagerado e a presença da vulva, sendo que o mais interessante é o fato dos demais el ementos corporais serem deixados em segundo plano. (WITCOMBE, Christopher, 2003, pp. 4,5)

A Vênus de Dolni de Vestonice, embora tenha pe quenas diferenças em relação à Vênus de Willendorf, acaba por manter as mesmas características, mesmo sendo feita de materiais diferentes e sendo encontrada em uma outra localidade. Datada de entre 29.000 a.C. e 25.000 a.C. possui também, cerca de 11,1 centímetros de altura, sendo conhecida como talvez a primeira obra feita de cerâmica. Essa vênus foi encontrada no sitio arqueológico de Dolni Vestonice paleolítico situado na aldeia homônima (a sul de Brno, na República Tcheca). (BRÉZILLON, Michel. 1969, pp 86)

As esculturas marcam um ponto fundamental na história, uma vez que abrem, na maioria das vezes um leque de descobertas sobre cultura, religião, relações sociais dentre outras vertentes antropológicas assim

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como as questões de cotidiano e hábitos de determi nada sociedade. Ao aprofundar-se nas escavações do sitio de Dolni Vestonice, foram descobertas inúmeras outras obras de arte que outrora estavam escondidas, dentre elas estão ursos, mamutes, cavalos, raposas, ri nocerontes, mesmo uma coruja; além de outras figuras femininas e mais de 2000 bolas de argila esperando serem moldadas.( RIPOLL PERELLÓ, Eduardo, 1989, p. 98). Ao analisar a descoberta da obra, Klima afirma:

seja, possivelmente, as vênus serviam como uma espé cie de amuleto, ou talismã que concediam fertilidade, e eram símbolos de prosperidade, sendo pelo taman ho, confortável para transportá-la na mão, e mantê-las consigo sempre que se quisesse.

Em Dolní Vestonice foi descoberta a moradia de um artista. Esta ficava isolada do acampamento principal, e era carac terizada por apresentar uma forma construtiva diferente. Nas cinzas do lar central - em parte abobadado a jeito de forno - encontraram-se mais de 2200 pequenas obras plásticas e fragmentos de obras de barro cozido. Por sua vez, a existên cia de fragmentos de flautas indica que também a própria cabana era o lugar de celebração de cerimônias mágicas e onde o criador dos objetos de arte, um sábio mago ou sacerdote xamã, tinha a sua morada. (KLÍMA, Bohuslav, 1963)

Ao analisar ambas as Vênus e sua composição estru tural, percebe-se, através do formato das pernas e dos minúsculos, ou até mesmo inexistentes pés, que essas pequenas esculturas não eram feitas para ficar em pé e serem observadas, ou adoradas em algum tipo de tem plo, mas possivelmente foram feitas para que houvesse uma interação dinâmica nas mãos do seu portador, ou

Entretanto estas análises acabam por mostrar, como a arte pode ser usada como instrumento de repre sentação do real e ao mesmo tempo inserir signos e características que façam com que o observador tenha uma visão diferente, do que seria esperado. Ao ser in serido o patriarcado, a mulher deixa de ser a “fonte” da vida e passa a exercer um “papel secundário” na sus citação de descendência, uma vez que os bens outrora adquiridos ou conquistados passam a estar sob o lega do do representante masculino e ao surgir a vigência e necessidade de continuidade, é este quem poderia confirmar a posse da herança, removendo a possibili dade de desconstrução do que houvera sido edificado pelo genitor, caso não se houvesse certeza de quem fosse. “Desta forma fica fácil entender, sobre o porquê das deusas femininas perderem prestígio, sendo que ao mesmo tempo a cultura patriarcal começa a tomar forma.” (PERUCCI, 2006, PP. 35). Aqui, pode ser visto também, que com o advento do patriarcado através da mudança dos padrões religiosos existentes, fomenta a reinterpretação da figura bondosa de mãe terra, para uma mais sombria, representada pela serpente. “E foi justamente a serpente a vítima de todas as grandes batalhas das novas divindades masculinas.” (PERUCCI, 2006, pp. 32).

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A metáfora do feminino passa a impregnar o campo da arte. Signos e subjetividades que permeiam o período arcaico, principalmente no que tange aos sentimentos passam a ser representados. Questões como fecun didade e gestação são atenuadas nos períodos clássico e renascentista (MOURA, 2010, PP. 04). Já com a so ciedade encaminhando para ser essencialmente patri arcal, começa a elaboração de símbolos e signos que ressaltam uma possível fragilidade do ser feminino ou em outros casos carregam a imagem de profano. “Na antiguidade grega e romana, a mulher vai ser associ ada à beleza e não tanto a fecundidade, a arte exalta o arquétipo venusiano, a forma física, principalmente a partir de Praxíteles e sua obra Afrodite, quando o cor po feminino tornasse um padrão da arte, na busca da beleza ideal.” (MOURA, 2010, PP. 04)

Na idade média, portanto, a representação da mulher passará a ser vista como instrumento de escárnio e per versão, principalmente se representada de forma natu ral ou, porque não dizer, nua, aludindo à sensualidade e ao pecado. Desse modo deixa de ser representada de tal modo seguindo um padrão imposto pela cultu ra vigente. “A arte medieval vai privilegiar os valores estéticos impostos pela religião católica, que repudia qualquer forma de representação da beleza feminina, considerada então encarnação do mal”; (MOURA, 2010, PP. 04).

É possível, por fim observar que as representações pré-históricas trazem consigo não apenas uma de notação artística, mas também social, ao representar

o momento da história em que tal sociedade sub sistia; religiosa, por serem os artefatos manufatura dos também símbolos religiosos e de deificações, que por vezes eram usados em rituais e celebrações.

E também culturalmente: Ao analisar o contexto de cada obra artística, é possível compreender melhor sobre os hábitos e costumes da época, tipos de ali mentação, vestimenta, e até mesmo, nas relações so ciais, revelando o matrimônio, matriarcado e outros ti pos de relações familiares. Além de serem arquétipos da representação da mulher da época, não deixam de exercer, no caso das vênus, um marcante contraponto ao que nos dias atuais é arquétipo de beleza, prosperi dade e estética.

Referências: MOURA, Regina. Iconografias do feminino: Mitos, arte e outras representações. No 10, abril/2010 PERUCCI, Raoni. Esporte e religião no imaginário da Grécia antiga. São Paulo, 2006

RIPOLL PERELLÓ, Eduardo. Historia del arte (n.º 3: El arte paleolítico), Madrid, 1989 WITCOMBE, Christopher L.C.E. Venus of Willendorf. 2003.

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STONEHENGE

Este artigo se propõe a compreender como as construções megalíticas foram de senvolvidas como a primeira forma de arquitetura dos homens no período Ne olítico. Tomando como exemplo o Stonehenge, analisamos como os povos antigos utilizavam de intervenções na paisagem para expressar e transmitir suas crenças e costumes para as gerações vindouras, ao mesmo tempo demarcando um novo estágio para o homem não mais subordinado à natureza.

CONSTRUÇÕES MEGALÍTICAS

E A PAISAGEM COMO FORMA DE EXPRESSÃO HUMANA

Durante o período Neolítico, há cerca de 10.000 anos, a ocupação humana pela Terra sofreu uma grande ex pansão graças ao desenvolvimento de novos métodos de adaptação. Diferente dos hominídeos do período Paleolítico que adaptavam sua vida ao ambiente, os homens do Neolítico promoveram uma mudança de contexto, e as modificações no meio em que viviam passaram a ser peça fundamental para o desenvolvi mento humano. O advento da agricultura, por exemplo, provocou consequências relevantes na relação homem – ambiente: “o homem determina um novo ambiente artificial – à sua medida e no seu interesse – onde pode fazer crescer e transformar as espécies vegetais e ani mais. É violentamente posta em crise uma visão que até aqui tinha caracterizado a história da humanidade: a in separabilidade do mundo natural e animal.” (BENEVO LO, ALBRECHT, 2002, pp. 42). A partir desse momento é dado ao homem a possib

ilidade de controlar o ambiente em que se encontra, colocando-o em posição de dominância. A delimitação dos espaços de uso torna o homem sedentário, incenti vando a construção de habitações de caráter mais fixo. Surge assim a “arquitetura em sentido próprio, como a capacidade de conhecer e modelar o território.” (Ibid., pp. 43).

As primeiras manifestações arquitetônicas do homem no período Neolítico podem ser vistas como uma forma de afirmar esse controle, modificando a paisagem com materiais da natureza, porém imprimindo um caráter intelectual que o distingue de seus ancestrais. As filei ras de pedras verticais retilíneas ou alinhadas em círcu lo são elementos que marcam a identidade de um ser

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TEXTO POR: KAROLYNE GODOY & MATHEUS OLIVEIRA ARQUITETURA ARQUITETURA, ARTE E HISTÓRIA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

superior, não mais subordinado à natureza. Nesse arti go iremos fazer uma breve análise de um desses mon umentos megalíticos: o Stonehenge, abordando como a sua implantação modifica a paisagem para transmitir significados e atua como demarcação de posse de lugar.

Sendo uma das primeiras expressões da vontade do homem de organizar os espaços e lugares não apenas fisicamente, como também de forma simbólica, a cul tura megalítica se desenvolveu ao mesmo tempo em diferentes sítios pela Europa Ocidental desde a Penín sula Ibérica até os países nórdicos, pelo norte da África até a África Central, na Bolívia e no Brasil. Um monu mento megalítico, do grego mega, megalo, grande, e lithos, pedra, caracteriza uma construção monumental baseada em grandes blocos de pedras.

Stonehenge é considerada a mais complexa e carac terística obra megalítica construída pelo homem, sendo formado por um agrupamento de menires e dólmens organizados em círculo. Essa formação, designada cromeleque, ou cromlech, costuma ser associada ao culto dos astros e da natureza, como um local de rituais religiosos e de encontro tribal.

Localizada no condado de Wiltshire, ao sul da Inglat erra, Stonehenge foi construída por volta de 2.500 a.C.

em três distintas fases: a primeira sendo uma estrutura de madeira em uma vala circular de 97m de diâmetro e dispondo de uma única entrada, a segunda composta por dois círculos de pedras azuis oriundas do País de Gales e um círculo externo formado por 35 pedras, e a terceira constituindo o atual formato do santuário, ten do os megálitos erguidos em um círculo interno e out ras dezenove pedras colocadas em forma de ferradura. Essa necessidade de troca de materiais ao longo das três fases citadas permite-nos perceber aqui o inter esse em transformar esse espaço projetado de forma que perdurasse ao longo do tempo, usando de materi ais não deterioráveis. Desta forma, a troca da estrutura de madeira para pedras faz os pesquisadores conjec turarem a importância que os povos que ergueram o Stonehenge buscavam em demonstrar a posse da terra para além de suas gerações como um monumento de significado a seus contemporâneos, e a partir daí nos ajuda a compreender os sentidos e necessidades dess es megálitos, para além de suposições de caráter mais místico.

De acordo com Benevolo e Albrecht, algumas possíveis respostas emergem a partir dessa abordagem:

Provavelmente, nas primeiras sociedades agrícolas era im portante estabelecer e reforçar a coesão social, relativamente aos comportamentos indivíduais. Talvez se deva ter em consideração as fases imutáveis do trabalho agrícola – a sementeira, a colheita, etc. –, que desde sempre foram mo tivo de ritos e comemorações sazonais, relacionadas com o estudo das fases dos astros, e por isso eram necessários os observatórios em pedra, não deterioráveis. Talvez que outra consequência da economia agrícola fosse um novo sentido da morte como uma continuação natural da vida, sendo pre visto deixar sinais permanentes para manifestar às gerações dos vivos a presença perpetua dos defuntos, sepultados nas proximidades e, em alguns casos, nas próprias habitações. (2002, pp.53-4)

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Stonehenge é considerada a mais complexa e característica obra megalítica construída pelo homem, sendo formado por um agrupamento de menires e dólmens organizados em círculo. Essa formação, designada cromeleque, costuma ser associada ao culto dos astros e da natureza, como um local de rituais religiosos e de encontro tribal.

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Portanto, os autores definem que com a sedenta rização humana, foi necessário uma forma de medir cronologicamente as temporadas e mudanças sazonais para demarcar as fases de sua produção agrícola e com isso fortalecer a coesão social dos grupos que também aproveitaram a tomada de posse da terra para consti tuir seus ritos de sepultamento para seus ancestrais.

Essa ideia é reforçada em A Cidade Antiga de Fustel de Coulanges, que se aprofundou na história da raça indo-européia e definiu a importância dos ritos de sep ultamento dos povos antigos e como essas crenças de ram lugar a regras de conduta (pp. 11). Para Coulanges, essa religião dos mortos é a mais antiga existente entre os homens e parece ter sido essa a origem do senti mento religioso e talvez da ideia de sobrenatural, cujos dogmas logo se reduziram a nada, mas cujos ritos dur aram até a prevalência do Cristianismo.

Francesco Careri também reforça essa função dos megálitos, dizendo que “as zonas em que se construíam as obras megalíticas eram, portanto, espécies de san tuários aonde a população dos arredores se desloca vam por ocasião das festividades, mas também lugares de pausa ao longo dos grandes caminhos de trânsito [...]”. (2013, pp.54).

Evidencia-se a importância de construções de forma e dimensões excepcionais para uma sociedade desprovi da de escrita e dependente da cultura oral e de mem orização, que tinham como objetivo materializar algu mas expressões perenes da sua permanência e duração naquele solo. Essas construções deveriam resistir ao longo dos tempos e expressar através da paisagem e da estabilidade solene dessa natureza – no caso através das pedras – um símbolo orgulhoso da presença e do legado humano.

Portanto, podemos compreender como Stonehenge atua, no sentido de percebê-lo como uma paisagem com significado e expressão que foi criada para trans mitir uma mensagem, tal qual uma forma de linguagem entre os hominídeos do neolítico. E assim como existem incontáveis possibilidades de linguagem e expressão, na paisagem acontece o mesmo; existem muitas pos

sibilidades que se abrem quando considerados outros aspectos como a cultura, religião, mitos, ritos, super stições, politica, que logo se ampliam ainda mais ao se considerar o lugar e o tempo que eles foram ou são aplicados.

Referências:

BENEVOLO, L. ALBRECHT, B. As origens da arquitec tura. Lisboa, Edições 70: 2002.

CARERI, Francesco. Walkscapes: o caminhar como prática estética. Barcelona, Ed. Gustavo Gili: 2013.

COULANGES, Fustel. A Cidade Antiga. São Paulo, EDAMERIS: 1961, versão eBooksBrasil.

PEARSON, Mike P. Stonehenge: exploring the greatest Stone Age mystery. London, Simon & Schuster: 2011

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Este artigo se propõe a compreender sobre a descoberta da cidade neolítica, sua localização e possíveis formas das configurações de suas residências. Tomando como exemplo a Skara Brae, analisamos como seus habitantes utilizavam da natureza para se protegerem das intemperes além das habitações que se mimetiza na paisagem, seus utensílios e estudos da área.

A ADAPTAÇÃO À NATUREZA

SKARA BRAE

Skara Brae foi uma pequena aldeia neolítica que se desenvolveu durante os anos de 3200 a.C. a 2200 a.C. Sua localização se encontra ao lado da Baía de Skail. A descoberta da aldeia apenas ocorreu em 1850, por motivos acidentais.

Skara Brae está fixada mais precisamente no arquipéla go de Órcades, região formada por volta de 70 ilhas, que recobre aproximadamente uma área de 900 met ros quadrados na região ao norte da Escócia. O seu clima é temperado e bastante influenciado pelo mar, assim esse arquipélago recebe ventos úmidos vindos principalmente do córrego do Golfo, que dão lhe uma

agradável sensação de conforto, porém, a quantidade de ventos no local é excessiva, os ventos são fortes e chegam a altas velocidades. E com uma dessas fortes ventanias, unida a uma tempestade, acidentalmente houve a descoberta da aldeia neolítica.

A tempestade auxiliou de maneira indireta a revelação de uma área que até então estava coberta de terra e de peles de animais, materiais que protegeram a al deia. Nesta época, a região pertencia ao conde William Watt de Skail, que após a esse acontecimento obteve curiosidade do que havia em sua propriedade, assim se iniciaram as investigações na área misteriosa. As in

CIDADE

vestigações se prolongaram até meados de 1868, ela foi abandonada até outra forte tempestade de 1925 que encobriu mais casas. As escavações ocorrem no local permanece ainda aos atuais dias. Construída ao alto do monte Orkney de maneira neg ativa, ou seja, a pequena vila se adaptava à topografia. As investigações obtiveram o seu início em 1850, nela foram desenterradas quatro das habitações, apenas a metade das oito existentes. As edificações estavam in tactas, mesmo apesar de terem sido habitadas a quase 5000 anos atrás. Tal conservação se dá pelo material utilizado em sua montagem, a pedra. A pedra teve o seu uso em quase toda a formação de Skara Brae. Elas eram utilizadas para a construção de paredes (que eram montadas por sobreposição), de utensílios domésticos, de móveis - como, por exemplo, penteadeiras e cômodas, além das camas em que os habitantes posicionavam ao lado de lareiras, um fato in teressante que cria a hipótese de que o lado esquerdo que era menor poderia ser da mulher, já o lado direito era destinado a cama do homem, por ser maior (há out ras hipóteses) – , os artefatos eram ricos e esculpidos cuidadosamente, neles também se incluíam dados de jogos, ferramentas, cerâmicas e joias.

As casas eram interligadas entre si por corredores, sete delas apresentavam o mesmo desenho interno, ou seja, uma sala de formato quadrado com um grande espaço, na área central uma lareira e um amplo espaço de ar mazenamento que foi fornecido por armários construí dos nas paredes e as casas tinham apenas um quarto.

E uma curiosidade é que numa extremidade se encon trava o que se chama de coração da aldeia, a oitava casa, que era uma área sem camas e moveis que possui suposições de que era destinada para trabalhos manu ais.

Além de pedras, se repara que existe o uso de ossos de baleias na configuração das casas, os ossos serviam para a sustentação dos edifícios, eles eram colocados como pilares para suportarem os telhados, telhados im permeáveis que se constituíam de pele de animais.

Na aldeia não foi encontrado nenhuma evidência de ar mas, fato que se faz pensar que de era um povo pacif ico. Além disso, era um povo completamente ligado à natureza, que sabia usar e identificar as melhores ma neiras de se viver bem a ela. Esse povo viveu a era neolítica ou também chamada de Idade da Pedra Polida (de aproximadamente 10.000 a. C. a 5.000 a.C.), tempo em que as coletas e as caças se

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tornaram complicadas, o que levou ao sedentarismo. Com o sedentarismo o homem passou a aprender a li dar com os animais e principalmente com os recursos naturais que se encontravam ao redor.

Outro fato é que ao diminuir o nomadismo o ser hu mano empeçou a formar aglomerações, como Ska ra Brae; aldeia que avis tamos todas essas car acterísticas do homem neolítico. Ela gerava uma pequena comunidade que auxiliada com a técnica passaram a viver em um ponto específico, com preendendo a natureza e se protegendo dela e com ela. Os neolíticos avançaram nos seus conhecimentos, adaptando a um especifico espaço.

Os habitantes de Skara Brae souberam conservar e não abusaram de seus recursos, diferente da sociedade moderna que usufrui de uma maneira desenfreada, consequentemente causando efeitos negativos sem limite.

sequentemente causando efeitos negativos sem limite. Sabemos que são épocas distantes e que existe várias alterações do tempo neolítico aos presentes dias, mas se analisarmos a forma que encaixavam as suas hab itações e as ligações construídas entre elas e o detal he de que a natureza não deve ser excluída, todavia, deve ser incorporada aos nossos planos e devemos resgatar esse pensamento responsável.

Referências

A pequena vila é referência ao uso sábio da natureza para os dias de hoje. Atualmente o ser humano está causando um desequilíbrio ao meio ambiente. O homem evoluiu, porém, em muitos momentos agredin do os elementos naturais do seu habitat.

Os habitantes de Skara Brae souberam conservar e não abusaram de seus recursos, diferente da sociedade moderna que usufrui de uma maneira desenfreada, con

http://www.brasilescola. com/historiag/neolitico.htm 20:07hrs 24/9/2015 http:///pt.wikibooks.org/wiki/Civilizações_da_An tiguidade/O_homem_sedentário 20:25hrs 24/9/2015 http://www.historiazine.com/2011/07/a-revolucao-ne olitica-2-parte.html

http://www.webartigos.com/arti gos/o-homem-e-a-natureza-uma-relacao-desarmoni ca/12994/ http://www.domtotal.com/direito/pagina/detal he/23711/a-relacao-homem-meio-ambiente-desen volvimento-e-o-papel-do-direito-ambiental http://www.notapositiva.com/trab_professores/tex tos_apoio/historia/dopaleoaoneol.htm http://edukavita.blogspot.com.br/2013/09/ska ra-brae-aldeia-pre-historica-na.html#sthash. D4R09Zdt.dpuf http://edukavita.blogspot.com.br/2013/09/ska ra-brae-aldeia-pre-historica-na.html www.epochtimes.com.br/skara-brae-uma-al deia-pre-historica-na-escocia Simpson, R. Ian; Guttmann, Erika B.; Cluett, Jonathan; Shepherd, Alexandra Geoarqueologia de 2006, vol.21 (3), pp.221-235 [Periód ico revisado POR pares]

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VASOS GREGOS

O artigo se propõe a analisar como foram desenvolvidas as técnicas de pinturas feitas em vasos de cerâmi ca para ilustrar as representações cotidianas ou mitológicas na Gré cia Antiga. Os vasos tinham as mais variadas formas, destinando-se a usos específicos e, mais que um docu mento de extrema habilidade de seus artesãos, a cerâmica é hoje a maior fonte disponível acerca da pintura daquela época.

ARTE
TEXTO POR KAROLYNE GODOY & MATHEUS OLIVEIRA REPRESENTAÇÃO E TÉCNICAS DE PINTURA EM CERÂMICA NA GRÉCIA ANTIGA

“O homem é a medida de todas as coisas.” -Protágoras

Embora não se refira especificamente à arte, essa frase, atribuída ao filósofo Protágoras, pode muito bem ser aplicada à característica essencial de toda a produção artística da Grécia Antiga. Exaltando a perfeição física ou discorrendo sobre o vício e virtude, dever e prazer, amor e dor, os antigos gregos desenvolveram uma arte feita pelo homem e para o homem.

No estilo Geométrico se iniciou a formação de uma cultura original na Grécia Antiga, até o fim do período Helenístico, quando a tradição grega se disseminou por uma grande área entre a Europa, África e Ásia, surgiram manifestações artísticas como literatura, pintura, músi ca, teatro, arquitetura, escultura, dentre tantas outras. Nesse artigo pretendemos discorrer especificamente sobre pinturas em vasos cerâmicos, que são consid eradas uma das melhores referências pictóricas desse período devido a sua resistência à ação do tempo.

A cerâmica se caracterizou pela decoração de motivos geométricos em tinta preta sobre fundo terracota; mais tarde apareceram os vasos com motivos figurativos em vermelho sobre fundo negro demonstrando a con stante evolução das técnicas na representação e tridi mensionalidade de detalhes figurativos.

Inicialmente, os gregos conceberam a pintura sobre paredes e painéis, usados frequentemente como dec oração para obras arquitetônicas. As métopas, por exemplo, eram às vezes pintadas em lugar de esculpi das em relevo. Apesar de ter sido uma das mais pres tigiadas formas de arte da Grécia Antiga, a pintura é uma das menos conhecidas nos dias de hoje, graças ao reduzido número de exemplos restantes. Entretan to, ainda existe um grande acervo de vasos cerâmicos pintados, e mesmo tendo estilo e convenções próprios, ainda podemos utilizá-los como guia na compreensão do estilo pictórico grego como um todo.

Segundo Woodford, a cerâmica havia sido, por algum tempo, elevada ao status de arte destinada a monu mentos, mas desde o final do século VII a.C. passou a

ser usada como marcos funerários, voltando a ter fun cionalidade como fornecedora de utensílios. Os vasos com pinturas decorativas (Fig. 1) serviam a quatro fi nalidades principais: como recipientes e jarros de arma zenagem, nos quais se guardavam água, vinho, azeite e mantimentos secos (como exemplos, temos a vasilha de duas asas chamada ânfora, e a de três asas usada somente para água, chamada hídria); como equipa mento para refeições festivas (os gregos bebiam seu vinho diluído com água, portanto necessitavam de um recipiente de boca larga, que chamavam de cratera, no qual misturavam os dois líquidos, e de um jarro menor, a enócoa, que mergulhavam na cratera e usavam para servir cada convidado numa delicada taça chama da kúlix, ou em uma caneca mais modesta, chamada skúphos); como recipientes de uso relacionado com o adorno pessoal e como peças de toucador (o azeite de oliva era comumente utilizado na limpeza do corpo e como base para perfumes, o recipiente chamado lécito podia conter até um litro de azeite e seu gargalo est reito e longo servia para restringir o fluxo. O alabastro era um pequeno frasco elipsoidal alongado, de garga lo muito curto e boca com borda em forma de disco, com o qual uma mulher podia borrifar-se com algumas gotas de perfume. Ainda menor e mais arredondado era o aribalo, equipado com uma tira de couro para poder ser transportado pendente na cintura e usado pelos homens para se friccionarem com azeite de oli va depois dos exercícios físicos); como vasos especiais para uso em rituais (o lustróforo, por exemplo, era usa do para carregar a água do banho da noiva, antes do casamento. Por vezes, um modelo em pedra do vaso

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também podia ser colocado no túmulo de uma pessoa solteira).

Em um âmbito estilístico, a história da pintura dos va sos é dividida em períodos distintos. Durante a época Protogeométrica (aproximadamente entre 1100 a.C. e 800 a.C.), o estilo marcava a transição entre as dec orações lineares mais simples da idade do bronze e o uso de semicírculos e círculos concêntricos do período geométrico. (Fig. 2)

Caracterizado pela existência de motivos circundando toda a peça, o estilo Geométrico sucede o Protoge ométrico, e como o próprio nome sugere, os artistas usavam de pinturas em ziguezague, triângulos, quad rados, entre outras formas, para compor a decoração dos vasos. (Fig. 3)

Além de elementos abstratos, também foram introduz idas figuras estilizadas de humanos e animais, marcan do uma distinção significativa à do período anterior. Com isso, os artistas passaram a narrar histórias por meio de figuras, como a Ilíada e a Odisséia de Homero, aumentando assim a relevância da pintura em vasos. Consequentemente foram criadas técnicas específicas que decorassem a cerâmica com um padrão eficaz e claramente inteligível, impulsionando os pintores na busca de métodos que tornassem suas histórias mais palpitantes e convincentes.

A maioria das histórias requeria que as figuras interagissem e se superpusessem, mas a superposição de silhuetas só podia gerar confusão. Assim, alguns pintores realizaram experiências, por um breve período, com o delineamento das figuras. Lamentavelmente, porém, os contornos resultavam decepcionantes em sua superficialidade e inconsistência sobre a superfície abaulada e polida de um vaso.” (WOODFORD, 1982, pp. 43)

Segundo Woodford, podemos perceber o esforço dos pintores em aprimorar a pintura narrativa, levando-os a criar a técnica de Figuras Negras. Originada em Corin to durante o século VII a.C., o estilo consistia em figu ras negras desenhadas sobre um fundo vermelho, que posteriormente eram detalhadas por meio de incisões que removiam a tinta e deixavam os contornos nítidos. A partir dessa época também é possível identificar os autores de algumas pinturas, uma vez que os ceramis tas começaram a assinar suas obras. O pintor de vasos Clítias, um dos expoentes da técnica de figuras negras, tem atribuído a si a pintura do Vaso François (Fig. 4), uma cratera com mais de 200 figuras representando temas mitológicos e que contém a inscrição Ergotimos mepoiesen e Kleitias megraphsen, que significa “Ergo timos me fez” e “Clitias me pintou”. Outro artista que trabalhava com a técnica de figuras negras foi Exékias, pintor grego de vasos e cerâmicas que viveu aproximadamente entre 500 a.C. e 525 a.C. Reconhecido como o maior pintor de Atenas, Exékias

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aprimorou a técnica de pintura utilizando de com posições que conversavam com a curvatura dos vasos, certificando-se que as pessoas e objetos criassem um equilíbrio na composição. Um exemplo de seu primor oso trabalho se encontra em uma ânfora que retrata os personagens mitológicos Ajax e Aquiles jogando. (Fig. 5)

Conforme a figura, podemos ver o minucioso trabalho realizado no manto dos personagens, por meio de del icadas incisões. A composição serena capta a tranqui lidade da cena e a concentração dos heróis. As figu ras humanas inclinam-se sobre o tabuleiro de jogos, e a curva das suas costas reflete a curvatura da ânfora. O ceramista mostra estar perfeitamente consciente de que estava decorando um vaso. Não apenas faz os con tornos dos heróis acompanharem os contornos do re cipiente, como dispõe as lanças de maneira a conduzir os olhos para o topo das asas e os escudos, por trás dos heróis, de forma a dar continuidade à linha vertical formada pela parte inferior das asas.

Ao compararmos a obra de Exékias com uma outra, de mesmo tema, pintada por um artista menos talento so, (Fig. 6) a qualidade artística do primeiro se dest aca nitidamente, apresentando diferenças marcantes: apenas o escudo e as lanças do herói à esquerda se relacionam com o formato do vaso, os detalhes nos mantos são mais simples, nenhum dos dois persona gens usa elmo, fazendo com que a composição perca unidade, separando-a em duas metades simétricas. Entretanto, não se trata de um trabalho mal feito; ap enas falta à pintura a genialidade que torna a obra de Exékias tão notável. Uma mudança de estilo se deu quando um discípulo de Exékias tentou algo diferente, invertendo o esquema cromático tradicional e, em vez de pintar figuras negras sobre o fundo vermelho, deixou as figuras na cor nat ural do barro cozido e pintou o fundo de negro. Essa técnica ficou conhecida como Figuras Vermelhas,criada por volta de 530 a.C., e trazia muitas vantagens para os pintores, pois permitia manter inalterado o forte con traste entre as cores, ao mesmo tempo em que conferia maiores possibilidades ao desenho, uma vez que o ma cio pincel podia ser usado no lugar de uma ferramenta de incisão. Dessa forma, a representação de anatomia e vestiário ganhou mais expressão e as figuras humanas ficaram mais vibrantes. Eutímides, cuja obra data do final do século VI a.C., foi um pintor que se aprofundou na técnica de figu ras vermelhas e, semelhante aos artistas escultores de sua época, se preocupou com a representação tridi mensional, sugestão de volume e percepção espacial em suas obras. Segundo Woodford, para explorar ess es efeitos, Eutímides ilustrava cenas da vida cotidiana, como na ânfora dos três libertinos embriagados (Fig. 7). A figura central está posicionada de costas, um novo ponto de vista, e o pintor, satisfeito com seu trabalho, escreveu no vaso: “Eufrônio (um artista rival) nunca fez coisa tão boa.” Esse comentário nos dá a percepção da intensa competição entre pintores, que os instigava a enfrentar e superar as técnicas de pintura da época. No final do século VI a.C., outros artistas também se

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esforçaram em representar figuras tridimensionais, seja por meio de traços internos, sombreados, e também por meio da luz refletida no próprio vaso e o contraste entre claro e escuro. Porém, durante o período clássico, a produção de cerâmica decorada sofreu um declínio e consequentemente, a inovação de técnicas de pintura em cerâmica também foi interrompida. Assim, observam-se como as técnicas criadas a partir da pintura em vasos foram de grande importância para a cultura da Grécia Antiga, servindo como repositório de seu cotidiano. Um exemplo são suas danças e ri tos que são ilustrados frequentemente em um grande número de vasos (fig. 8). Enfim, exemplares como esse serviram para a divulgação de sua cultura que poste riormente contribuiu com inovações para outras ex pressões artísticas, não apenas em sua época como atualmente ainda vem inspirando muitos artistas a fazerem obras baseados nas mesmas.

Referências:

FITZWILLIAM MUSEUM HANDBOOKS. Greek and Ro man Art. Cambridge, Cambridge University Press: 1998. MOZZATTI, Luca. Museu Arqueológico de Atenas. Rio de Janeiro, Mediafashion: 2009.

WOODFORD, Suzan. História da Arte da Universidade de Cambridge: A arte de ver a arte. São Paulo, Círculo do Livro: 1983

WOODFORD, Suzan. História da Arte da Universidade de Cambridge: Grécia e Roma. São Paulo, Círculo do Livro: 1986

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RESENHA CRÍTICA

POR: MATHEUS OLIVEIRA

Construindo um império: Grécia

A LINGUAGEM CLÁSSICA DA GRÉCIA ANTIGA COMO UM EXEMPLO DE PRODUÇÃO ARTÍSTICA

Construindo um Império: Grécia, é um documentário publicado no canal History Channnel que fala sobre como era a organização dessa civilização antiga na arte da arquitetura e construção. O documentário também destaca sua política, religião, filosofia, sua cultura em geral que vai influenciar muitas civilizações e que por esse motivo é conhecida como o berço da civilização ocidental.

O documentário aborda grandes inovações conquista das por esta civilização que surpreende para a tecno logia da época. De alguma forma, sua história política estava sempre ligada com suas artes, arquitetura e ci dade, sendo que a organização da cidade era sempre discutida por com o objetivo de alcançar sua forma mais apreciada para os cidadãos, e principalmente para cultuar e agradar seus deuses.

“O homem é a medida de todas as coisass, das coisas que são, enquanto são, das coisas que não são, enquan to não são.” -Protágoras Esta frase se opunha à filosofia de Sócrates, que defen dia a verdade absoluta e as verdades de valor univer sal. Tudo começou quando Aristóteles (384-322 a.C.) escreveu os três livros que compõem a “Retórica” - do latim rhetorica, cujo significado literal quer dizer a arte ou técnica de usar uma linguagem para comunicar de forma eficaz e persuasiva. Assim, esses pensamentos

acabavam por influenciar como eram representados as mais diversas artes incluindo a pintura - em va sos gregos: representações e técnicas de pintura em cerâmica na Grécia Antiga, há exemplos evidentes des sa evolução na cerâmica grega -, a , e até mesmo na escultura. Sua obra se torna bastante notável durante o Renascimento, quando o ideal grego de beleza e a filosofia são retomados, havendo inúmeros exemplares desse conceito na arte como na escultura A Pietà, de michelangelo - É evidente a influência do “Pathos”, um dos três apelos mencionados na retórica.

Mais tarde, com o iluminismo e a revolução francesa, mais uma vez o padrão de beleza austero do período clássico é adotado não apenas na pintura, mas também na arquitetura chamada neoclássica. Assim, essa obra continua atual e útil para quem procura persuadir o seu público-alvo por meio da retórica, sendo um im portante método de persuasão por poder se manifestar por todo e qualquer meio de comunicação.

Há retórica na música (“Para não dizer que não falei da Flores”, de Geraldo Vandré: retórica musical contra a ditadura), na pintura (O quadro “Guernica”, de Picasso: retórica contra o fascismo e a guerra) e, atualmente, é amplamente utilizado na publicidade. Assim, a retórica é apenas um dos grandes exemplos que durante a civ ilização Grega contribuiu para a produção intelectual e cultural para a história da civilização Ocidental.

Referências:

COHEN, Jean, BREMOND, Claude, GRUPO µ, KUENTZ, Pierre, GENETTE, Gérard. Pesquisas de retórica. Petrópolis, Editora Vozes, 1975.

SUMMERSON, John. A Linguagem Clássica da Ar quitetura - Col. Mundo da Arte. Wmf Martins Fontes, 1963.

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TEXTO ARQUITETURA, ARTE E HISTÓRIA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

STOAS

Neste artigo foi abordada a relação do cidadão grego com o espaço público, com foco nas stoas, edificação característica da ágora grega. Para construir esta análise foram utilizados como suporte a ágora, grande espaço centra na cidade grega, que era rodeado por templos, altares, prédios públicos e pela stoa. O estudo deste espaço tornou possível o desenvolvimento de um olhar mais aprofundado acerca do real significado delas nessa cultura. Com este estudo da ágora pode notar que assim como nos dias atuais, as cidades e o seus espaços sempre tiveram modificações acerca dos significados atribuídos a eles, onde pode nota-se que a partir do período helenístico ocorreram diversas mudanças dentro do espaço da ágora, mudanças essas que fizeram com que ela deixasse de ser um espaço plural, no aspecto de abrigar o comércio, religião e política em um mesmo espaço, passando a ter uma ágora para cada função. Esta ressignificação alterou de igual modo as stoas, que passaram a ser bem maiores e a ter dois andares, acumulando cada vez mais a função de abrigo ao comércio

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ARQUITETURA
OS EDIFÍCIOS PÚBLICOS NA ARQUITETURA CLÁSSICA

A arquitetura grega é carregada de elementos que ser viram de inspiração para a arquitetura atual. Entre as principais características que deram esta contribuição estão a grande importância dada para com o espaço público. O coração da cidade grega era a ágora, espaço que tinha a configuração de uma grande praça onde várias das principais edificações, templos e altares fica vam em sua volta.

Embora as ágoras fossem um elemento importante da cidade grega, a ágora ateniense é sem dúvidas a mais importante, pois apesar de que se tenha a ideia da im portância da referida cidade para a formação do pensa mento ocidental, é graças a este espaço que foi possív el o desenvolvimento dos elementos que a colocaram neste patamar. Elas ficavam localizadas no centro da cidade, possuía altares oferecidos para heróis da mit ologia grega, assim como várias edificações, onde se destacavam os templos, fontes, monumentos dedica dos aos deuses e as stoas que serão foco desta análise. As stoas nada mais eram do que pórticos cobertos, for mados por uma dupla fileira de colunas, este espaço servia de abrigo para comerciantes, assim como para abrigar os transeuntes do frio e da radiação solar. En tretanto para que possa entender a função dele neste contexto é importante que exista um aprofundamento sobre a forma com que o povo grego se relacionava com o espaço público da Ágora. Segundo o historiador Pierre Vidal-Naquet as ágoras não eram um espaço ex clusivamente definido para apenas uma atividade, sen do que servia para o comércio, discussões políticas e para o culto religioso. Por boa parte da existência da civilização grega ela manteve esta função mista, sendo que por volta do século IV a.C, começou a considerar a ideia de que as ágoras deveriam ser separadas de acor do com suas funções. É nesse aspecto que temos as stoas, que a partir desta ideia de reconfiguração das ágoras passa a se tornar principal elemento presente nela, passando a ser o prin cipal destino da população, sendo mais utilizadas do que os próprios templos. Assim as stoas passaram a possuir mais de um andar,

sendo que o primeiro era onde se encontravam os comerciantes, artistas, escritores, políticos entre outros que a frequentavam e no piso superior era onde se en contravam armazéns, escritórios entre outros elemen tos importantes para o funcionamento do comércio.

A sua função dentro da ágora era bastante ampla, sen do que servia tanto para o comércio e diversas outras atividades, como anteriormente citado, e também era um espaço de amplas discussões filosóficas e políti cas. Nestes locais eram realizadas diversas atividades como: assembleias, eleições, festivais, competições at léticas, desfiles, mercados e similares. Percebe-se que a arquitetura grega foi altamente influente, de tal forma que foi a principal responsável pelo desenvolvimento da arquitetura romana, sendo que a ágora foi o prin cipal elemento que deu forma ao Fórum Imperial Ro mano.

Sabe-se que grande parte dos edifícios públicos de praticamente todos os períodos históricos denotam al guma relação com stoas. Os gregos não distinguiam tão nitidamente entre um compartimento fechado e um abrigo com sua parte frontal aberta com cobertura de uma ou duas águas, tornando o conceito de stoas

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convencionalmente assim definido. Um exemplo claro disso era a edificação pública que abrigava as doações dos votos no santuário da Samotrácia, sendo poste riormente concebido como um salão fechado do final do século V. As suas proporções o levavam a parecer com um templo, medin do 10,70 por 22,60 m; a cornija das laterais contin uava para cima como a cornija inclinada de cada coruchéu, à medida que uma moldura menor de marcava a base de um frontão. Uma das suas lateais era deixada aber ta com uma colunata dórica de pedra calcária a qual perpassava por antas de madeira. Pedra, madeira e ter racota interligavam o entablamento e a calha. (LAW RENCE, A.W, 1996, pp. 191) Aparentemente, os salões públicos derivaram, a princí

AS STOAS DEMONSTRAM SEGUIR AS FORTES DIRETRIZES DAS ORDENS À MEDIDA QUE COMPÕEM OBRAS CLÁSSICAS E POR VEZES MONUMENTAIS, SEM PERDER ENTRETANTO A IDÉIA DE UTILIZAÇÃO PÚBLICA.

pio, de galerias externas, que eram ligadas ao palácio micênico, sendo influenciados pelo desenho e arquétipo do templo. Os primeiros exemplos de salões como ess es eram compostos por longas stoas, as quais, como já fora dito, possuíam sua frente aberta e cujo telhado se declinava de uma parede traseira até uma fileira de estacas ao longo da facha da principal. No século V, era comum o uso de col unas de pedra em vez de estacas de madeira. As stoas mais tardias passar am a alcançar um taman ho maior, chegando a dois andares, onde havia uma variação de ordens em cada um. Devido o tamanho, havia a necessidade de uma colunata interna para apoiar o telhado. Rente a essa colunata interna, havia uma fileira de lojas ou escritóri os alinhados ao longo da parede posterior. Assim, os

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mercados em todas as grandes cidades eram rodeados por stoas. Do mesmo modo, os ginásios adotaram a estrutura das stoas, porém em uma escala menor. Eram compostos por um pátio fechado pelos quatro lados por uma colunata com os quartos na parte posterior. Frequentemente, salões onde eram realizadas reuniões se tornavam em pequenas stoas onde sua frente era parcialmente vedada com uma parede. (LAWRENCE, A.W, 1996, pp. 60)

A partir do Século V, as stoas passam a ser compo nentes dissociáveis da ágora. A pequena Stoa Basilei os (gabinete do arconte-rei) em Atenas, é um exemplo datado de possivelmente c.500. sua parte frontal era apoiada em uma colunata dórica, sendo possível sentar nela aproximadamente cem pessoas. O arconte-rei ex ercia papeis religiosos e jurídico-religiosas, e foram ex postas, no século V cópias das leis de Atenas, para as quais forma acrescidas duas alas em frente às extremi dades da fachada. A stoa possuía a função principal de abrigar das intempéries, como os santuários, por exem

plo, mas não se limitava a isso. Servia também como um lugar de reuniões para fins de negociações, uma vez que, pelas dimensões da edificação, distintos agru pamentos de pessoas poderiam discutir seus assuntos com certa privacidade ainda que nem sempre havia di visórias. Não tardou pra que o interior começasse a ser dividido abrindo espaço a pontos de comércio, lojas e escritórios. Essas divisórias eram basicamente feitas de madeira limitando-se até a metade da distância entre a colunata e a parede traseira. Por conta do grande comprimento, as stoas necessitavam de um telhado de duas águas com apoio intermediário. (LAWRENCE, A.W, 1996, pp. 192)

Uma stoa que teve em Atenas relativa importância foi a Stoa Poikile, ou Stoa Pintada, localizada no lado norte da ágora. Ficou conhecida devido ao conjunto de pin turas nas paredes, representando, assim, a batalha de Maratona. Seu nome “oficial” possivelmente foi Stoa de Peisianax, um parente de Címon, que foi responsável por sua edificação. Geralmente a ordem dórica pre dominava na disposição das colunas externas, não sen do diferente na Stoa Poikile. Certamente, o mais antigo exemplar de colunata interna em uma stoa é datado da metade do Século VII nesse caso, o objetivo das stoas era garantir abrigo contra a chuva aos visitantes do santuário de Heras em Samos. Inúmeras stoas pos suíam compartimentos distribuídos em formas de salas de jantar, como é visto na stoa sul, da ágora de Atenas. Outro exemplo é Brauron. Nesta stoa ainda se encon tram preservados buracos revestidos de bronze onde eram fixados os pés dos divãs de jantar, assim como alguma mobília de mármore, entretanto, essa stoa não fora concluída. Uma multiplicidade de stoas irrompeu a fachada levando ao recuo do centro e a projeção de duas alas, no decorrer das quais a colunata era local izada. Ao analisar o plano diretor, percebe-se que o esquema se assimilava com o de um teatro com paras kenia. (LAWRENCE, A.W, 1996, pp. 193)

No Século IV houve um grande aumento na escala das stoas. A construção de divisões internas começou a crescer, tornando-se costume, e por fim, sendo levadas

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a um acima. Um exemplo de escala demasiado grande, possuindo 160 m de comprimento é a “Stoa Sul” de Corinto, composta por basicamente 71 colunas dóricas ao longo da fachada. Várias bicas com formato de ca beça de leão eram dispostas na calha, separadas por volutas de acanto com antefixas acima de cada inter valo. Uma colunata jônica ficava dentro da stoa, atrás dessa colunata, outras 33 , cada uma delas com uma porta aos fundos, sendo possível o acesso à uma série de depósitos. Dentro das lojas havia profundos poços que traziam água da fonte de Peirene, que brotava na extremidade leste da ágora. Aparentemente essa stoa supria todas as necessidades mercantis da época. Tem sua construção datada do século III, aproximadamente, onde stoas de perfil mais simples ainda eram procura das. (LAWRENCE , A.W, 1996, pp. 194) Com a Conquista do Império Persa por Alexandre, em 330, inicia o surgimento da nova identidade às cidades gregas da Ásia Menor, a fundação de Alexandria es timulou a difusão do helenismo dentre os povos orien tais, assim como várias cidades que adotaram o padrão grego. Ao aumentar a riqueza durante a Era Helenísti ca traz também o aumento do espaço da ágora, assim como difusão e aceitação maior das stoas sem haver, porém, profundas mudanças urbanísticas. Em vári as das pequenas cidades as stoas eram usadas como Casa de Conselho e um grande estima era concedido à acomodação ao ar livre. As ágoras nas cidade helenísti cas eram geralmente rodeadas por stoas de três lados, constantemente se juntavam construindo uma stoa única contornando os cantos em modificar o traçado. Às vezes, também, porém com menor frequência, os espaços eram compostos por stoas separadas por ruas. E às vezes também, era comum stoas em forma de “L”. Era comum em grandes cidades comerciais que ágoras secundárias e mercados fossem acrescidos, possuindo cada um stoas cujo uso era basicamente público. Ape sar de algumas destas serem reservadas a negócios privados. Compunham grandes áreas nas cidades e as sim como nas demais, ofereciam sempre divisões, col unatas internas e não obstante, lojas e escritórios, que

variavam até dois ou três fileiras. O uso de stoas so brepostas esteve nesses casos ligados também a con gestionamentos. (LAWRENCE , A.W, 1996, pp. 196-197)

Mediante a análise e o estudo do uso das stoas e sua integração na arquitetura grega, é possível notar o papel, não apenas estético, mas possuíam, como foi visto, desde a função de abrigar, transeuntes, pere grinos e outros devotos, que constantemente faziam delas abrigo , mesmo que por tempo determinado, as sim como exercer um papel de influência econômica e social na comunidade. Uma vez que a arquitetura de bruça-se a traçar dinamismo à ágora, e, por conseguin te, à cidade, a integração se torna nítida e há a possi bilidade de desenvolvimento em diversos setores. As stoas demonstram, por fim, seguir as fortes diretrizes das ordens à medida que compõem obras clássicas e por vezes monumentais, sem perder entretanto a ideia de utilização pública.

Referências:

LAWRENCE , A.W. Arquitetura Grega. São Paulo, Cosac e Naify Edições: 1996.

ROBERTSON, D.S. Arquitetura Grega e Romana. São Paulo, Martins Fontes: 1997.

LONIS, R. La cité dans le monde grec. Structures, fonc tionnement, contradictions. Paris, Nathan Université: 1994.

CAMP, J. The Athenian Agora. Excavations in the heart of Classical Athens. Introduction. Londres, Thames & Hudson: 1986.

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OLÍMPIA

Este artigo fala sobre o santuário de Olímpia, Grécia. Mostrando a forma da cidade, a importância de Zeus na sua formação e um destaque as realizações dos Jogos Olímpicos. Produzindo uma comparação entre os primeiros jogos em Olímpia à importância das realizações desse evento atualmente.

Para se começar a explicar de Olímpia é importante entender quais são as suas origens, por isso, abordare mos um pouco sobre a Grécia. Os gregos julgavam-se autóctones, descendentes de Heleno, filho de Deucal ião e Pirra que povoavam o mundo após o dilúvio. Di ziam ser Heleno, pai de Doro e Eolo e avô de Aqueu e Jônio, os filhos e os netos de Heleno deram origem aos quatro ramos do povo grego. Provavelmente, os gregos pertenciam aos grupos nórdicos e alpinos da raça branca, que chegaram à Grécia por volta de 2000 a. C. e mesclaram-se com os primitivos mediterrâneos. Ocuparam toda a península grega a partir de 1200 a. C., distribuindo-se nos seguintes grupos: aqueus, eólos, jônios e dórios.

A Grécia está situada na Europa Ocidental, entre os mares Jônico, Egeu e Mediterrâneo. O mundo grego antigo ocupava uma área maior do que o território gre go atual. Hoje a Grécia é um país e seu nome oficial é República Helênica, já a Grécia antiga não era um país de governo único e sim um conjunto de cidades inde

INÍCIO DE UM GRANDE EVENTO

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CIDADE
TEXTO POR AMANDA SOUZA & LARISSA FERREIRA

pendentes. Cada uma tinha seu governo, leis e carac terísticas sociais próprias. Olímpia começa a se destacar após a realização dos primeiros jogos olímpicos que ocorreram em 776 a. C., esses jogos eram realizados de quatro em quatro anos, geralmente ocorriam no verão do hemisfério norte, ger almente no mês de junho, julho e agosto assim como nos dias atuais. As cerimonias religiosas e esportivas tinham como objetivos reverenciar o deus grego mais importante, Zeus. Diante dos diversos templos na Gré cia, o de Zeus foi o maior, sua edificação é assinada pelo reino de Bastos IV (515-465 a. C.). O templo de Zeus é um períptero dórico de 8x17 col unas de 32x70 metros de dimensões. A cela, cujas fundações não possuem qualquer ligação com as da persistais, mede 18,32 x 53,19 metros, é longa, três vez es a largura de sua frente e ocupa dois terços do com primento do tempo. Ele permaneceu em pé ao longo de um milênio, durante o qual sofreu perdas reposições e reparos. Estas mudanças, no planejamento original do início do século V a.C., foram organizadas por cinco fas es por Ashmole e Yalouris em 1967. (LAKY, 2011, p. 168). Atualmente, toda a cidade de Olímpia está sendo revi talizada, com a reconstituição e conservação dos mon umentos.

Jogos Olímpicos Olímpia foi reconhecida por sediar os primeiros jogos olímpicos do planeta. Jogos que se iniciaram por volta do século VIII a.C., que reuni várias póleis.

“Esses jogos sempre ocorriam no verão do hemisfério norte, geralmente nos meses de junho, julho e agosto, assim como acontece com os jogos olimpícos ou as olimpíadas atuais. Os jogos eram cerimônias religiosas e esportivas ao mesmo tempo, realizavam-se em honra a Zeus (o deus grego mais importante) e incluiam sacrificios de animais em homenagem aos deus es. O evento era também uma boa oportunidade para os comerciantes venderem seus produtos.” (RODRIGUES; COUTRIM .pp. 116).

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Mas, por que os jogos se iniciaram em Olímpia? Essa é dúvida persistente que possui diversas respostas. Uma delas é de Hesíodo:

“De acordo com a versão do poema,[...] de Hesíodo, [...] os jogos foram uns dados por Pélope- um príncipe da Frigia - que teria derrotado e assassinado o rei Enam au de Élis numa ocorrida de carros. Pélope casou-se com Hipodâmia, a filha de Enomau, e tornou-se o rei de toda a região, dando o seu nome ao Pelopenose. O heroí mítico teria fundado os jogos em agradecimento a Zeus por sua vitória, ou, segundo outra versão , em expiação pelo assassinato de Enomau.” (VALAVANIS in LAKY, 20l1, pp. 39)

Porém, o documento que melhor relata esse fato é do “Catálogo dos vencedores olímpicos”, que relata o começo dos jogos no século VIII, escrito por Hípias de Élis. Durante o início dos jogos (776 a. C. a 729 a.C.), havia apenas uma modalidade, corridas no estádio e o evento era extremamente pequeno, diferente do que temos atualmente. Com o tempo os jogos ganharam mais repercussão, no início do século V, quase 102 póleis já haviam participado das competições, Olímpia se tornava um centro bastante reconhecido. Para os jogos, Olímpia construiu três importantes lugares:

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Hipodrommo: Era um espaço simples, plano, amplo e aberto. Utilizado para as competições. Gimnasium e Palestra: que possivelmente era utilizado para treinamentos.

“As competições em Olímpia foram concebidas não meramente como jogos entre atletas individuais, mas como competição entre póleis que exploraram ativa mente a oportunidade para aumentar seu prestígio. Em outras palavras, Olímpia gerou uma interação extrema maente intensa e extensiva entre as póleis helênicas, que foram autorizadas a enfatizar a individualidade. Assim, Olímpia foi um palco bem adaptado para essa interação uma vez que era, ao menos durante os festi vais, o santuário mais visitado em todo o mundo grego, onde se reuniram números enormes de delegações, at letas e espectadores.” (NIELSER in LAKY, 2011, pp. 54)

Nesse último trecho se percebe como foi importante para Olímpia, caso que também conseguimos notar nas cidades que sediam as olimpíadas neste século, pois são consideradas um dos eventos de grande re

percussão e dimensão na era contemporânea. Elas pos suem essa grandeza “tanto por seu caráter simbólico, pela representação m escala planetária de uma prática que mobiliza representações arquetípicas, como pela dimensão material que envolve milhões de pessoas di reta e indiretamente em sua preparação e realização”. (RUBIO, 2005)

Diferentemente de Altis (nome que também era dado ao santuário na antiguidade), não se tem apenas uma cidade para realizar todos os jogos. Uma cidade é es colhida a cada quadrienal, se pensando na melhor ma neira do evento acontecer, para que o impacto desse evento não seja prejudicial ao lugar, mas sim algo que traga benefício a todos. Com os jogos, as cidades pas saram a ser um espaço que se usa para morar ou para lucrar.

“ ela é, no entender de Constantino (1997: 120), um espaço de uso desportivo, com diferentes espaços no tecido urbano, a serem objecto de novas apropriações e diferentes usos. No entender do autor lugares antes ocupados para atividades comerciais ou patrimoniais (feiras, mercados ou espetáculos) podem hoje ser ocu pados por práticas lúdico-esportivas. ” (RUBIO, 2005).

As Olimpíadas também podem causar uma regener ação de um espaço, levando não somente jogos, mas trabalhos, infraestrutura, reconhecimento, entre outros benefícios.

Referências

RODRIGO DE SOUZA, Oswaldo. História Antiga e Me dieval. Editora Ática S.A, Edições 1992.

COTRIM, Gilberto e RODRIGUES, Jaime. Saber e fazer história. Primeiras sociedades, antigas e idade média. SP., Saraiva2009

LAKY, Lilian de Agnelo. ART. Espaço, sociedade e Pro cessos de Formação do Registro Arqueológico- São Paulo – 2011.

GIAMBIAGI, Fabio; FERREIRA, Sergio; VIANNA, Ser gio; SOUTO, Luis. O Papel do Estado, o Projeto Olímpi co e a Importância do Legado. Rio de Janeiro. 2010.

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MOSAICOS BIZANTINOS

Este artigo se propõe ao conhecimento dos mosaicos bizantinos. Inicialmente descrevendo o que são os mosaicos, com o objetivo de dar destaque à técnica de criação, depois contamos brevemente sobre o surgimento do império bizantino e o início da sua arte. O artigo dá ênfase aos mosaicos bizantinos, mostrando o detalhamento e o realismo presente neles. E finalmente fechamos o trabalho falando sobre a importância e a beleza dos mosaicos bizantinos na Catedral de Santa Sofia.

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ARTE ARQUITETURA, ARTE E HISTÓRIA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

Os mosaicos consistem na colocação de pequenos pedaços de pedras de tonalidades diversas, sobre uma superfície tanto lisa ou ondulada de gesso ou argamassa. Esse tipo de trabalho possui uma grande durabilidade, por causa dos materiais utilizados para produzi-la. Após as junções das pedras coloridas de acordo com o desenho determinada, a superfície re cebe uma solução de cal, areia e óleo, com o objetivo de preencher os vazios que se formam entre as pedras.

“ Para criar mosaicos bizantinos como A cabeça de São Pedro (abaixo), os artistas aplicaram milhares de pe drinhas ou pedaços de vidro chamados tesselas numa superfície emassada, na qual havia um desenho inicial da imagem. No que diz respeito aos temas sacros, us avam-se tesselas feitas de um vidro especial chamado smalti, fabricado no norte da Itália e feito com folhas grossas de vidro, além de mármore, pedra preciosas e revestimentos com folhas de ouro e prata. ” (FAR THING, Stephen, 2010, pp.79).

A arte de produzir mosaicos é bastante questionável. Os historiadores não definem com certeza a sua origem, pois há controversas de opiniões. Alguns afirmam que seu nascimento esteja em aproximadamente 3500 a.C., na região da Mesopotâmia. Porém, as imagens não eram constituídas de muitos detalhes, eles utilizavam a técnica de maneira simplificada. Com o passar do tem po os mosaicos se enriqueceram e se espalharam de tal forma que eles se tornaram presentes em várias áreas, principalmente nas províncias mediterrâneas, como na Síria e na Palestina. Eles também se expandiram para regiões com o Norte da África, a Grécia, a Itália, entre outras.

A técnica era aplicada de maneiras variadas, como por exemplo:

“Os gregos usavam os mosaicos principalmente nos pisos. Já os romanos utilizavam-nos na decoração, demonstrando grande habilidade na composição de figuras e no uso da cor. Na América os povos pré-co lombianos, principalmente os mais e os astecas, chega ram a criar belíssimos murais com pedacinhos de quart zo, jade e outros materiais. ” (PROENÇA, 2011, pp.55).

Mas, essa arte eterna atingiu a realização perfeita quan do os bizantinos passaram a produzi-la. O império bi zantino, que também eram nomeados Império Romano do Oriente, possuíam o termo bizantino, pela derivação de Bizâncio. Tal império adquiriu o seu apogeu cultural e político aos comandos de Justiniano, durante 527 a 565.

A arte que se manifestava ao longo do Império Bizan tino era a junção da arte cristã oriental com os esti los ocidentais, dando origem à arte bizantina. Arte que seguia voltada para a religião, a partir da oficialização do cristianismo e às correntes artísticas encontraram outros rumos. A arte bizantina surgia como algo forte, vivo e que trazia luz na composição. Assim, determi nando o grande esplendor das artes no cristianismo. Ela transmitir uma autoridade absoluta do imperador, por esse motivo a sua imagem era unida com person alidades sagradas, pois o imperador era considerado o representante de Deus na época. Nesse mosaico a cima “é possível observar uma pro cissão de santos e apóstolos aproximando-se de Cris to com a mesma solenidade dedicada, na vida real, ao imperador nas cerimônias da corte. ” (PROENÇA, 2011, pp.55).

O Império Bizantino a cada dia que passava espalhava as suas influencias para diversas áreas, tanto distantes e próxima, ao mesmo tempo em que o império romano do ocidente caia. O império bizantino produzia e se es pecializava em murais afrescos, joias, tapetes, tecidos e mosaicos. “Nunca, como nesse período, o mosaico teve

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tanto esplendor e foi tão largamente usado no mundo. ” (MUCCI, 1962, pp. 54).

Os mosaicos bizantinos se caracterizavam por serem compostos por personagens de formas rígidas, ou seja, que não demonstravam a presença de movimen to. As imagens eram feitas em posição frontal, com os olhos grandes, com olhares fincados e penetrantes, e com as mãos posicionadas de forma ritmada. As cores predominantes eram fortes e vivas, com combinações cromáticas ligadas ao gosto oriental, segundo Murri. Outro detalhe significativo e importante, era que nos mosaicos não existia profundidade, nem perspectiva, porém isso não retirava a harmonia dos trabalhos.

Os painéis serviam como decoração, deixando as pare des coloridas com composições lineares ritmadas, de maneira em que os artistas desejavam transmitir algo animado para o espaço. Os artistas optavam em não polir as pedras, com o objetivo de deixar a obra mais forte, consequentemente o não polimento causava um interessante jogo de luz e sombra.

A Basílica de Santa Sofia foi construída no período do imperador Constantino, sofreu dois períodos críticos para a arquitetura, onde em 404 passou por um incên dio. Após ser reconstituída, ela foi novamente destruída em 532 e por fim restaurada por Justiniano (537-562). Ela é um dos monumentos orientais com uma dec oração interna bastante rica, conservando grande par te dessa decoração em mosaico bizantino.

Os mosaicos foram utilizados para a decoração da igre ja como forma meramente decorativa com padrões ge ométricos. Foram utilizados materiais luxuosos como ouro e pedras preciosas, as paredes são revestidas de finos mosaicos onde são representados ídolos, como o salvador, a virgem, os apóstolos e os anjos. A narrativa impressiona no mosaico, no local que se representa São João Batista (final do XII° século), na tribuna sul da Igreja, a expressão trabalhada no rosto, mostra um complexidade única, representando uma expressão musiva, tais efeitos se dão: por meio de delicadas esfumaturas, com tesselas colocadas quase à maneira do ‘vermiculatum’ acompanhado as feições do rosto com perícia técnica e pectoria do mais alto nível. O cabelo e a barba são fios vivos, compostos com um sentido artístico con sciente e tecnicamente perfeito. O planejamento, de um cinzento azulado com gradações escuras e linhas pretas, compõe-se em volta do ombro esquerdo e do braço, com uma delicadeza e uma harmonia cromático dignas da melhor forma de expressão plástica. O fundo é de tesselas-ouro. (MUCCI, Alfredo, pp.56 e 57 Sedegra, 1962 ).

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Outros ícones que se destacam nos mosaicos bizanti nos de Santa Sofia são: a Virgem Maria e a Imperatriz Irene (XII° século) com destaque na magnitude do col orido, com o fundo em tesselas-ouro. Entende-se que os mosaicos bizantinos tiveram um marco na arte bizantina que se expandiu para diversas partes do mundo. A arte era rica e detalhada, os materi ais utilizavam eram de alta durabilidade, o que possibili tou a conservação das obras até os diais atuais. As rep resentações dos mosaicos são de figuras divinas, com imperadores, fortalecendo o poder do cristianismo e dos imperadores. Formadas de maneira que o respeito seja representado nas imagens. Respeito que era pre sente nas obras que compõem os mosaicos bizantinos que se encontram na Basílica de Santa Sofia.

Referências:

PROENÇA, Graça. História da arte. Editora Ática. Edição 2011.

MUCCI, Alfredo. Arte do mosaico, Compêndio histórico-tecnico da arte musiva. Rio de Janeiro. Edição 1962.

ARESSE, Miguel Cortes. O melhor da Arte Bizantina. G&Z Edições. Lisboa.

UNESC. Grecia, Mosaicos Bizantinos. New York Graph Soc. Nova Iorque. http://www.escolakids.com/imperio-bizanti no-e-seu-legado.html http://lealuciaarte.blogspot.com.br/2013/01/a-arte-bi zantina_9226.html. Acesso: 16 de novembro de 2015, ás 18:45.

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CATACUMBAS CRISTÃS

O artigo se propõe a analisar o período que compreende os primeiros séculos do cristianismo, e a forma que os adeptos da nova religião sepultavam seus mortos. Com uma análise da forma estrutural das catacumbas romanas e das pinturas encontradas em suas criptas, remetemos até suas origens na doutrina helenística e hebraica a fim de compreender suas representações e simbologias.

CEMITÉRIOS SUBTERRÂNEOS E A SIMBOLOGIA LITÚRGICA NOS PRIMEIROS SÉCULOS DO CRISTIANISMO

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TEXTO POR: KAROLYNE GODOY & MATHEUS OLIVEIRA
ARQUITETURA

As primeiras manifestações das catacumbas funerárias se deram por necrópoles criadas por egípcios e judeus. A partir do século II d.C., em várias cidades da penín sula italiana e da África setentrional, esses cemitérios subterrâneos foram mais difundidos entre os recém adeptos do cristianismo. Antes de tudo eles recusavam o uso pagão da cremação dos corpos preferindo a in umação, por um senso de respeito para com o corpo destinado um dia à ressurreição.

As catacumbas são formadas por uma espessa e com plicada rede de galerias escavadas diretamente no tufo calcário e apenas em algumas partes são completadas por obras de muramento, tendo, na maioria das vezes, apenas caráter de sustentação.

Particularmente extenso em Roma, o desenvolvimento das catacumbas supera os cem quilômetros, em me didas lineares. As catacumbas jamais serviram como lugar de reunião ou de refúgio dos cristãos durante as

perseguições, como se acreditava. Serviam, entretanto, como cemitérios que se estendiam ao longo das vias que conduziam para fora da cidade, uma vez que a lei proibia o enterro dentro das muralhas da cidade. Segundo Constantini, as catacumbas eram estrutural mente formadas por passagens subterrâneas, cujas paredes possuíam fileiras de lóculos para as sepulturas comuns: depois da inumação do cadáver, o lóculo era fechado com uma laje de pedra ou de barro, reunin do inscrições, símbolos figurados, representações gra vadas ou pintadas sobre uma fina camada de reboco. Podemos perceber que não se tem uma intenção es tética nas formas construtivas, uma vez que a relação da planta ou da distribuição dos sustentáculos com as soluções arquitetônicas correntes é determinada por questões técnicas.

As galerias tinham muitas ramificações, podendo também haver mais redes em diversos níveis. Além das galerias, existiam câmaras (cubículos) isoladas ou em grupos, quase sempre sustentadas por estruturas murais que lhe dão certo caráter arquitetônico de crip ta ou até mesmo de pequena basílica. Nos cubículos, os cadáveres eram, geralmente, depositados em vãos revestidos por lajes de pedra ou barro cozido (sòlia) e encimados por um arco (arcossólio) também escavado no tufo e ornado com pinturas.

As pinturas das catacumbas constituem um vasto ma terial para o estudo da história do cristianismo primitivo e do significado por ele atribuído à imagem, podendo

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ser classificadas segundo o seu conteúdo iconográfico. O tema dominante é a concepção escatológica cristã, que se refere às crenças sobre o destino do homem depois da morte. Entretanto, as primeiras comunidades cristãs pareciam pouco interessadas na expressão figurativa dos temas religiosos, tanto que se serviam livremente de figurações pagãs, fosse investindo-as de significados alegóricos, alusivos à nova fé religiosa, fosse recorrendo a símbolos figurativos com valor de criptogramas.

as almas do limbo (Fig. 6), a figura do Orfeu é somente um símbolo e o artista não a considera em si, fazendo alusão a algo que o transcenda. Não se podia admitir que, antes da revelação cristã, a humanidade tivesse vivido sem a orientação de Deus; tinha-o, pois, “conhe cido indiretamente através da profunda inteligência da criação, que a arte clássica, não menos do que a filo sofia natural e a sabedoria política e jurídica, revelava.” (ARGAN, GIULIO CARLO, 2003, pp. 242).

Quanto à representação não-icônica hebraica, per manecia válida como princípio, não se podendo aceitar que Deus, infinito, se manifestasse completamente sob formas finitas. Entretanto, sobre a natureza divina ou conjuntamente humana de Cristo, não se podia negar que, uma vez assumido a forma humana, o Cristo fosse “representável”.

O cristianismo tem ligações profundas com duas grandes doutrinas, a helenística e a hebraica, cujas teses relacionadas à representação do divino em formas sensíveis são nitidamente antitéticas: a helenística, pela própria ascendência clássica, apenas concebe o divino na evi dência de formas naturalistas e antropomórficas; a hebraica exclui e condena como idólatra a representação figurativa de Deus. O cristianismo, pondo-se como síntese e superação dessas duas doutrinas, deve resolver também a antítese entre a representação icônica e a representação não icônica; e a solução inicial consiste, exatamente, em recorrer a figurações indiretas, isto é, a figurações que signi fiquem algo além de si mesmas. (2003, pp.241)

Nas figurações mais antigas são frequentes os temas clássicos alegoricamente interpretados no sentido cris tão (Orfeu, Psique; gênios e cupidos; a palma e a videira) e as transcrições simbólicas, como o peixe-acróstico (a palavra grega ICQUS que significa “Jesus Cristo Salva dor, filho de Deus”).Pouco mais tarde também passam a ser retratadas figuras bíblicas, como Moisés, Noé com a arca, Jmas sempre com significado metafórico e com referência à ressurreição e à salvação da alma. De acordo com Giulio Argan, a ausência de figuras pro priamente cristãs e o recurso frequente a temáticas fig urativas clássicas nos primeiros séculos do cristianismo explicam-se pela complexidade da situação cultural: Dessa forma, podemos entender o motivo do cristianis mo ter apressado o processo de dissolução das formas clássicas. Se, por exemplo, representa-se Orfeu com a intenção de ocultar na sua figura o Cristo que liberta

Deste modo o processo da arte cristã pode, em seu conjunto, ser considerado como um processo que vai da representação simbólica à representação histórica. Tendo como berço doutrinas tão distintas quanto a helenística e a hebraica, podemos distinguir e relacio nar as características que o cristianismo adotou para si. A forma como os cristãos sepultam seus mortos elu cidam um dos seus principais dogmas: o da espera pela salvação e da vida eterna, e as representações artísti cas de pinturas encontradas em catacumbas também servem como material de estudo e compreensão desse importante período histórico.

Referências:

ARGAN, Giulio Carlo. História da arte italiana: Da An tiguidade a Duccio. São Paulo, Cosac & Naify: 2003.

CONSTANTINI, Vincenzo. Storia dell’arte italiana: Dalle Catacombe al Gotico. Milano, Casa Editrice Ceschina: 1946.

DELUMEAU, Jean. De religiões e de homens. São Paulo, Edições Loyola: 2000.

MANCINELLI, Fabrizio. Guide des catacombes de Rome. Florence: Scala Group, 2012

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CIDADE

JERUSALÉM

Neste artigo foi feita uma abordagem sobre Jerusalém, cidade histórica que des de seu nascimento vem tendo papel importante no cenário político-religioso no mundo ocidental. Portanto, para o estudo foi priorizada a forma com que os difer ente povos com suas religiões interferiram na arquitetura da cidade, assim como a arquitetura e o desenho urbano de Jerusalém foi importante para a concepção da cidade ideal da Idade Média. Desta forma, foram considerados os períodos que de marcaram essas mudanças,, tendo enfoque na mitologia judaico-cristã, que ajuda a esclarecer as transformações das características arquitetônicas e urbanas que a cidade sofreu com o decorrer do tempo.

TRANSFORMAÇÕES URBANAS E ARQUITETÔNICAS MEDIANTE INFLUÊNCIA DE DIFERENTES POVOS

Jerusalém, cidade conhecida pela humanidade como Cidade Sagrada, é cenário das três maiores religiões monoteístas. Para os mulçumanos é a Cidade Santa; aos judeus, é a Cidade da Paz, e aos Cristãos, é a Cidade da Via Dolorosa, do Calvário de Cisto. Entretanto, essa cidade foi palco de inúmeras transformações geradas pela posse de diferentes povos, assim como destru ições, edificações, invasões que interferiam na configu ração da cidade e, por conseguinte no desenho urbano e nos seus elementos arquitetônicos. (MAGI, 1988, pp. 03) Jerusalém é uma cidade cujos nomes são diversos e possui um significado distinto para cada nação que teve algum contato, direto ou não com ela.

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TEXTO POR CLEITON DO CARMO & ALEXANDRE DUARTE ARQUITETURA, ARTE E HISTÓRIA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

A cidade se localiza sobre as montanhas da Judeia en tre as montanhas de Betel ao norte de Hebrom, que fica ao sul. Ao oeste da cidade estão às ladeiras das Mon tanhas da Judeia e ao leste, está o deserto da Judeia, que descende do Mar Morto. A posição geográfica de Jerusalém está ligada à estruturação morfológica das montanhas da Judeia, as quais aparecem em uma mas sa sólida interrompida por vales e desfiladeiros, apesar de esses serem encontrados nas descidas leste e oeste. Essa extensão contínua de montanhas leva a cidade a ser uma área considerável de domínio fortificado. Sua posição no cruzamento principal do norte ao sul e do oeste a leste realça sua importância: ao ascend er seu platô é possível cruzar a montanha. A estrada pela extensão das montanhas acompanha o platô, e qualquer desvio para o leste ou oeste encontra com os íngremes desfiladeiros de um lado e do outro. Essa estrada conecta Hebrom, Belém, Jerusalém, Ramallah e Nablus (Schechem). Jerusalém fica localizada nesse

eixo, no ponto exato onde a estrada cruza desde a cos ta até o Vale do Jordão. Jerusalém possuía cerca de 15 a 17 quilômetros, desde a fronteira ocidental das mon tanhas da Judeia, até a sua fronteira leste. (Israel Pock et Library, 1973, pp. 03)

A história de Jerusalém é dividida em alguns períodos os quais irão definir também o seu traçado urbano, à medida que ocorrem mudanças e intervenções nas so ciedades que habitavam a cidade. Um dos primeiros períodos é o período cananeu. Na idade do Bronze, Jerusalém surge juntamente com várias outras cidades cananeias antigas. É uma das cidades estabelecidas ao caminho da bacia hidrográfica de norte a sul. Mas suas vantagens naturais eram limitadas; Ela era conhecida como uma cidade-estado Cananeia. Segundo a Bíblia, esse período também é conhecido como o período dos Patriarcas. Estudiosos acreditam que a cidade estava situada nas ladeiras leste de duas colinas. A única nas cente na área, que saía do sul das duas colinas era, cer tamente fator determinante na localização da antiga ci dade. O estreito desfiladeiro na parte sul da montanha deu à ela uma boa posição de defesa. O único ponto fraco era a parte do norte, onde os muros tinham que ser mais fortificados. Mesmo em um estágio antecipa do, providências eram tomadas para certificar o supri mento de água em épocas de seca. Um canal era feito na ladeira, curvo e descendo na direção da fonte, para levar água à cidade. Evidentemente essa transição pela cidade tornou-se

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possível pela localização geográfica da cidade. O es tabelecimento de mercados reais na cidade também foram fatores importantes ao desenvolvimento. O caráter cosmopolita da cidade começou a surgir com a construção de santuários a deuses estrangeiros, em uma colina do lado de fora da cidade. Ao construir o primeiro templo e o palácio real, Salomão deu a Je rusalém uma característica única, uma combinação de uma cidade sagrada com uma cidade real. O templo foi construído no topo da colina onde ficava também o palácio. O templo era pequeno, mas era reconhecido por seu valor e refinamento técnico. O palácio real era a maior edificação da cidade, ocupando uma grande área entre os dois vales ao norte da Cidade de Davi. (Israel Pocket Library, 1973, pp. 09-13). Após a queda da Ba bilônia, em 536 a.C. Ciro, rei da Pérsia passou a dominar Judá. Inicia-se o desejo da reconstrução do templo. O templo era um edifício que agregava os habitantes em volta do mesmo, ao ser destruído, a cidade empobrecia sua composição urbana que era concêntrica radial. En tretanto, apenas no reinado do rei Dario que o segun do templo é completamente edificado. Não bastasse o templo, havia brechas nos muros e os portões estavam queimados, surge então Neemias, que decide deixar a corte e ir para Jerusalém, com o afã de reconstruir seus muros. Os muros são enfim reconstruídos e foram pos tos guardas nos portões. Desse modo, a cidade volta a retratar um espaço fechado e de certa forma privado. Até durante o período de Alexandre, o Grande (332 a.C.) Jerusalém foi uma cidade pacífica. Depois de sua morte, a cidade sofreu com várias guerras de sucessão. Esse era o período Helenístico. Nesse período, os sacerdotes começaram a definir uma importante classe social, as sim como vários segmentos da nobreza começaram a ter proeminência, possuindo grandes campos e terras. (Israel Pocket Library, 1973, pp. 19)

Esta característica que surgiu devido ao seu crescimen to espontâneo, passou a ser copiada na idade média como forma de edificar a cidade ideal, pois acredita va-se que a cidade se assemelhava à Nova Jerusalém, cidade utópica descrita na Bíblia. Boa parte da docu

mentação acerca do seu traçado urbano é referente à idade média, onde a cidade teve significativa importân cia histórica devido às grandes disputas territoriais en tre os cristãos e mulçumanos. Nesta época segundo o especialista em história da arte medieval, Carlos Ema nuel Sousa Santos a cidade tinha a configuração de um paralelepípedo, circundado por torres e muralhas, pos suía duas vias principais que a dividia formando quar teirões. Entretanto, embora a Cidade Santa se trate de uma das cidades mais importantes da arquitetura me dieval, esta, os recorrentes cercamentos e guerras tra vadas em seu território, fizeram com que ela perdesse rico material arquitetônico. Logo que Saladino recuper ou a cidade de Jerusalém em 1187, ordenou que fossem destruídos todos os edifícios anexos construídos pelos Templários junto a al-Aqsa e restaurou o seu estado original, bem como os outros espaços até aí converti dos ao culto cristão. (EMANUEL Sousa Santos. Carlos, 2007, pp. 46).

Através desta análise, nota-se que embora a arquitetu ra seja importante para a construção de cidades, assim como para a criação de significados e características que serão atribuídas às mesmas, ela acaba por ser um fator que por si só não garante que elas tenham uma sobrevivência longeva, fato que pode ser possível ap enas pela combinação de outras características como cultura e religião. Tendo a análise atida ao estudo da in fluência cultural e religiosa, no caso de Jerusalém, devi do ao fato de ser importante para três grandes credos, acabou por protegê-las do tempo e do próprio homem.

Referências:

Israel Pocket Library, Jerusalem, Jerusalém, Israel, Ket er Publishing House, 1973, Magi, Giovana, Jerusalén: 115 ilustraciones, Via Cairoli CASA EDITRICE BONECHI, 1988. Bíblia de estudo Plenitude, Baruerí, SP, Sociedade Bí blica do Brasil, 2001 Sítio: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/ar quitextos/08.085/235

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AKRÓPOLIS - FAU UNB

Sketch - Eliel Américo Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Dezembro de 2015

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