12 minute read
Zona Jovem
by GRUPO ASÍS
Rúben Felizardo
Advertisement
AAssociação Nacional de Estudantes de Medicina Dentária (ANEMD) tem desde outubro passado
uma nova equipa diretiva, liderada por Rúben Felizardo, que pretende catapultar a federação de estudantes - que representa as sete faculdades nacionais com Mestrados Integrados em Medicina Dentária - para a “primeira liga” do movimento associativo estudantil nacional. Este aluno da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade de Lisboa (FMDUL) tem pela frente um mandato exigente, marcado pelo novos desafios associados à crise pandémica, cujo impacto no ensino superior “é considerável nas atividades letivas e não letivas”. A profissionalização da ANEMD é um dos principais desígnios da renovada direção, que também promete não descurar outras (velhas) causas da classe estudantil como a redução do numerus clausus, o reforço da oferta formativa pós-graduada ou a criação de novas especialidades de Medicina Dentária.
Quais são as principais reivindicações da renovada federação de estudantes de Medicina Dentária no atual contexto de pandemia?
As consequências da crise pandémica estão a manifestar-se em várias dimensões da vida social e a despoletar uma crise económica, a qual vem criar e agravar vários problemas. No que ao ensino superior diz respeito, a pandemia tem vindo a ter um impacto considerável nas suas atividades letivas e não letivas, que se torna mais evidente no caso específico da Medicina Dentária. Agora, as escolas médico-dentárias enfrentam novos desafios, nomeadamente sobre como simultaneamente salvaguardar o ensino clínico e garantir a segurança da comunidade académica. Do lado dos estudantes, permanece a preocupação sobre os riscos de desenvolverem problemas de saúde mental, tais como a ansiedade e a depressão, precipitados pelo isolamento social, pela retoma da atividade letiva, pelo desempenho académico e pela situação financeira do agregado familiar. Este último aspeto conheceu particular relevância no que diz respeito à falta de acesso à internet e à rede móvel, às limitações ao nível da posse dos meios exigidos para acompanhar a metodologia de ensino à distância, nomeadamente a frequência das aulas e a devida realização dos momentos de avaliação, e às dificuldades acrescidas para comportar os encargos inerentes à frequência do ensino superior, considerando questões como as prestações da propina em falta, rendas de alojamento ou mesmo a alimentação. É de lamentar que apenas no início de agosto tenham sido emitidas recomendações às instituições científicas e de ensino superior para preparação do novo ano letivo por parte da Direção-Geral da Saúde e pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, o que revela a falta de planeamento prévio e concertado que se tem vindo a refletir consideravelmente na qualidade e na segurança deste regresso. Por último, não só é revelado um descuido inaceitável no acompanhamento da resposta às necessidades dos estudantes que agora ingressam no ensino superior, como também a falta de mecanismos de controlo do abandono escolar, motivado por razões de ordem financeira. Compete à ANEMD assumir-se um agente ativo no apuramento dos factos, abordando os problemas numa perspetiva construtiva de diligenciar soluções a curto-prazo, em benefício dos estudantes.
Na tomada de posse dos órgãos sociais, que se assinalou em outubro passado (em formato virtual), foi evocado o mote “Envolver a Academia, elevar a Medicina Dentária”. Em que medida se traduzirá este desígnio da nova direção da ANEMD?
“Envolver a Academia, Elevar a Medicina Dentária” é a trave-mestra que irá orientar toda a nossa atuação, a partir das quais emanam os princípios orientadores da ação da direção e que respaldam e consubstanciam a execução de todas as atividades. É esse desígnio que nos comprometemos a cumprir e que espelha o paradigma que pretendemos alcançar. Sem esquecer nem desmerecer o prestigioso legado que devemos preservar, perspetivamos um futuro ambicioso e defendemos uma Academia enredada com o compromisso de defender um melhor ensino da Medicina Dentária. “Envolver a Academia” é a primeira prioridade e corresponde ao reforço da intervenção interna, de apoio incondicional aos associados, atendendo às suas necessidades e expetativas, complementando a sua atividade e envolvendo-os na contínua construção do propósito da ANEMD. Defendemos uma visão estratégica de trabalho conjunto, numa verdadeira política de proximidade, que se traduz na entreajuda, cooperação e solidariedade entre a ANEMD e os associados. “Elevar a Medi-
S
A renovada direção da ANEMD, presidida por Rúben Felizardo, tomou posse no passado dia 16 de outubro.
cina Dentária” é a segunda prioridade, que descende da anterior, e traduz a projeção da ANEMD na comunidade estudantil e classe profissional médico-dentária, bem como na sociedade civil, pela via da profissionalização da sua dinâmica interna, que irá produzir credibilidade na ação externa. Essa é uma premissa fundamental para granjearmos acreditação das nossas tomadas de posição e para figurarmos o baluarte indivisível das vontades conjuntas dos estudantes. Para esse fim, ambicionamos uma ANEMD que se assuma, cada vez mais, como a maior referência nacional e internacional na representação e defesa do superior interesse dos estudantes de Medicina Dentária.
Um dos objetivos que traçou prende-se com a profissionalização e projeção (nacional e internacional) da estrutura estudantil que preside. Na sua opinião, qual é o melhor caminho para alcançar esse estatuto?
A profissionalização da ANEMD figura um dos principais desígnios do atual mandato. Através da adoção de práticas e procedimentos formais e institucionais, da implementação do código de conduta, de normas de execução orçamental, de um espírito de trabalho exigente, elevando o nível e a qualidade das nossas responsabilidades, bem como a constituição de departamentos, grupos de trabalho e comissões organizadoras, com a devida definição dos respetivos funcionamento, metas e prazos, pretendemos lançar a ANEMD para a “primeira liga” do associativismo académico e do movimento associativo estudantil nacional. A projeção da nossa estrutura será concretizada com a presença ativa e construtiva em fóruns de discussão de políticas de juventude, educativas e de saúde, com a edificação de uma rede de contactos com os decisores políticos e com a intervenção na política local, nacional e internacional, em articulação com os mais diversos agentes do sistema.
Que outras prioridades figuram na agenda, a curto ou médio prazo, da atual equipa diretiva da ANEMD?
A nova direção, instalada no passado dia 16 de outubro, tem trabalho persistentemente na execução do plano de atividades legitimado pela Assembleia Geral. Para além daquilo que já é público, como o Fórum Ensino e Profissão Médico-Dentário, o ciclo de conferências, a formação de dirigentes associativos, a celebração de datas comemorativas ligadas à saúde oral, a publicação de protocolos de emergência e a representação em fóruns nacionais e internacionais, entre outras atividades, temos vindo a preparar o programa de estágios observacionais, a revisão estatutária, a sistematização de posições políticas, o simpósio e o encontro nacional, a renovação da imagem institucional, a rubrica do “tempo de antena”, webinars sobre empregabilidade e os programas de intercâmbio internacionais. Apelo a que sigam a nossa atividade através das nossas páginas nas redes sociais (Facebook, Linkedin, Instagram e Youtube), onde poderão acompanhar a divulgação de todo o nosso trabalho.
Um dos problemas flagrantes da classe dos médicos dentistas continua a ser a pletora profissional. Partilha da opinião de que é urgente reduzir o numerus clausus no ensino superior?
A redução do numerus clausus não é matéria de opinião. A ANEMD, desde a sua constituição, defende a redução do numerus clausus como contingência anual de novas admissões, no âmbito do acesso e ingresso ao ensino superior, pela necessidade de promover a melhoria da
qualidade do ensino médico-dentário, regular a oferta de formação superior em relação à procura e às prioridades científicas, reforçar a humanização dos cuidados de saúde e garantir a sustentabilidade da formação médico-dentária integrada. No entanto, esta redução do número de ingressos anuais nas escolas médico-dentárias portuguesas não pode gerar uma redução do respetivo financiamento, que constitui um impedimento à legítima e necessária adequação das suas capacidades formativas em benefício da qualidade do ensino da Medicina Dentária, ou que condicione o investimento na investigação e no desenvolvimento do ensino, que são fundamentais para uma formação completa.
Do seu ponto de vista, que medidas poderiam facilitar o ingresso dos recém-licenciados na atividade profissional, nomeadamente no sentido de minimizar as condições de precaridade contratual e as situações de subemprego?
No âmbito da inserção profissional dos estudantes em fase final de formação, o Governo e a Direção-Geral do Ensino Superior, em articulação com a OCDE, apresentaram a iniciativa “Skills 4 pós-COVID – competências para o futuro” que versa sobre o acesso ao mercado de trabalho e cujas conclusões apontaram para a inexistência de indicadores fiáveis e transversais sobre a empregabilidade em Portugal ao nível dos recém-diplomados. Estas informações revelaram a falta de mecanismos de apoio e de acompanhamento dos jovens no momento de ingresso no mercado de trabalho, algo que é especialmente agravante para o cenário precário e altamente fragilizado da Medicina Dentária. Por essa razão, e com vista a aumentar e promover a informação relativa à empregabilidade nos primeiros anos de vida ativa, afigura-se necessário construir inquéritos aos
S
“Envolver a Academia, Elevar a Medicina Dentária” é a trave-mestra que irá orientar a atuação da equipa liderada pelo estudante da FMDUL, natural de Viseu.
recém-diplomados com o objetivo de produzir um retrato rigoroso da situação laboral dos jovens médicos-dentistas. Por outro lado, e no sentido de combater as condições precárias e de subemprego, deve ser criada a carreira especial de Medicina Dentária nos cuidados de saúde primários e nos hospitais, revisto o atual sistema de contratação por parte dos serviços públicos, impedidos todos os atos médicos gratuitos nas tabelas e divulgados os custos referentes aos respetivos gastos.
Que opinião tem da oferta existente em termos de formação contínua/ pós-graduada?
O tempo de semivida do conhecimento técnico e científico diminuiu drasticamente nos últimos anos, sendo fundamental manter o acesso à evidência mais atual para possibilitar a prestação de cuidados de saúde oral com a maior qualidade possível. Por essa razão, a formação pós-graduada, cuja oferta formativa é, aos dias de hoje, manifestamente insuficiente, constitui uma via de investimento profissional para a constante aquisição de conhecimentos e incremento da capacidade de trabalho e das competências técnicas, de forma a melhor responder às exigências da profissão. No entanto, o aumento da oferta formativa pós-graduada e a criação de novas especialidades de Medicina Dentária devem ser encaradas como medidas que, a par da abertura à internacionalização do ensino pré-graduado, a integração dos médicos dentistas no serviço nacional de saúde, a inclusão de matérias ligadas à investigação, gestão e empreendedorismo no plano de estudos e a redução do numerus clausus, individualmente não resolvem o problema da empregabilidade, mas que em conjunto e perante a tutela convergem para o objetivo principal de melhorar as condições de trabalho e as saídas profis-
sionais. Deve, por isso, ser promovida pelas escolas, em articulação com a Ordem, a aposta na formação pós-graduada e formação conducente à obtenção do título de especialista, bem como a divulgação de informação atualizada sobre as áreas com mais carências na profissão.
Perante a nova realidade pós-Covid-19, as soluções digitais estão a assumir particular preponderância no universo da Medicina Dentária. Como encara a ANEMD o crescente esvaziamento do “fator presencial”?
A implementação das novas tecnologias no seio do ensino superior surgiu como uma oportunidade para estimular a inovação e modernização pedagógica, contribuindo para a experimentação e disseminação de práticas de ensino e aprendizagem apoiadas por tecnologias digitais. No entanto, é necessário elencar alguns problemas decorrentes do recurso súbito a novas práticas pedagógicas: o aumento generalizado da carga de trabalho atribuída aos estudantes, as grandes disparidades e irregularidades dos métodos de avaliação, a exclusão de componentes de avaliação prática presencial e as exigências apresentadas para combater fenómenos como o plágio e a fraude e que ameaçaram a justiça das avaliações e a privacidade dos estudantes. Percebe-se, assim, que os maiores constrangimentos advêm essencialmente da desatualização das metodologias de ensino, dos conteúdos programáticos e das práticas pedagógicas, tendo em conta que a falta de formação e a intransigência de alguns docentes comprometem a implementação destas novas técnicas. Quando as dificuldades sentidas na implementação do ensino a distância se prendem com os fatores referidos, importa parar para refletir sobre o rumo atual do sistema educativo e a necessidade de o reformar, à luz da realidade dos nossos dias e das deficiências que podem comprometer o futuro. Para já, o objetivo deve ser garantir o ensino e a avaliação presencial, porque promove a equidade entre estudantes em termos de participação e avaliação, proporciona a sua educação integral, estimula a diversidade de percursos académicos, contribui para a coesão territorial e proporciona o contacto humano e as relações interpessoais, reforçando o vínculo dos estudantes aos cursos e às instituições, fundamental para alimentar o ambiente académico próprio da passagem pelo ensino superior.
Está prevista a realização de algum congresso ou simpósio (virtual ou presencial) sob a égide da ANEMD a curto ou médio prazo?
O Simpósio Anual de Estudantes de Medicina Dentária (SAEMD) coloca-se como um momento formativo extracurricular ímpar para complementar a formação do estudante de Medicina Dentária, tendo como objetivo fornecer uma experiência enriquecedora através de palestras, cursos e workshops de excelência. Para a quarta edição, prevista para março próximo, temos como ponto de partida o sucesso das edições anteriores, ao qual somamos algumas novidades que pretendem aperfeiçoar o evento e fortalecer a sua posição no panorama nacional. A comissão organizadora, que integra estudantes de todas as escolas, está constituída e comprometida em apresentar um simpósio de qualidade superlativa, que garante superar todas as expetativas.
De um modo geral, como perspetiva o futuro da classe dos médicos dentistas?
A Medicina Dentária no presente está marcada por vários desafios ao nível das necessidades do país quanto ao número de médicos-dentistas e da acessibilidade dos portugueses aos cuidados de saúde oral. Os dados indicam-nos que a tendência estatística é de agravamento, tendo presente o crescimento exponencial de médicos-dentistas com inscrição ativa previsto para os próximos anos e a incapacidade dos decisores políticos de integrar devidamente a Medicina Dentária no serviço nacional de saúde. Face a esta realidade, e apesar de tudo, encaro o futuro de forma otimista. Faço-o porque há, efetivamente, uma vontade generalizada de rejeitar conformismos e fatalismos e de alterar o status quo. Prova disso foi a assinatura, no passado mês de dezembro, de um protocolo de cooperação entre a Ordem dos Médicos Dentistas e a Associação Nacional de Estudantes de Medicina Dentária para a defesa da qualidade do ensino da Medicina Dentária, que origina o Fórum Ensino e Profissão Médico-Dentário. Esta plataforma pretende debater, de forma séria e construtiva, o ensino da Medicina Dentária em Portugal, para concretizar a defesa e promoção das condições e da qualidade da educação médico-dentária, definindo as condições técnicas para a adequada formação dos estudantes, condizentes com a realidade e circunstância da profissão no presente e no futuro. A par das duas organizações fundadoras, pretende-se que estejam presentes todas as escolas médico-dentárias, bem como entidades relevantes do setor e personalidades de reconhecido mérito, que deverão convergir no objetivo comum de resolver os problemas do ensino e da profissão.