Explorer - Edição nº 1

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CAPA



Editorial Por cima das fronteiras do imaginário O que você imagina quando pensa em ficção científica? Em marcianos verdes que invadem a terra? Em astronautas desbravando planetas distantes? Um futuro no qual a humanidade convive diariamente com robôs de altíssima inteligência? Sim, tudo isso é ficção científica, mas ela também se apresenta em histórias e imagens que você pode nunca ter imaginado. E aí está o nosso ponto de partida. A Explorer foi criada justamente para mostrar aos leitores o que eles não conheciam dentro desse universo. Queremos apresentar novas facetas da ficção científica para quem tem interesse em descobrir mais sobre o tema, por meio de análises, reportagens e dicas de leitura, de filmes e de jogos. Nesta primeira edição, decidimos abordar cinco estéticas: steampunk, dieselpunk, cyberpunk, póscyberpunk e filmes de ficção científica das décadas 1950 e 1960. Algumas dessas são clássicas e já bem conhecidas, outras nem tanto. Não vamos fingir que foi

fácil escolhê-las, afinal, há mais estéticas interessantes de serem analisadas, e não são poucas. Ficaram de fora a Space Opera, a Espada e Planeta, o Teslapunk, o Pós-Apocalíptico, o Pós-Humanismo, dentre muitos outros subgêneros. Mas eles terão o momento certo para serem tratados. Seria pretensão demais tentar reunir em uma só edição cada estética que a ficção científica tem. Por isso mesmo, os próximos números da Explorer continuarão guiando os leitores na descoberta de novos universos. Isso, inclusive, lembra um momento, durante a produção da revista, em que um de nossos colegas disse imaginar a Explorer como uma nave espacial, transitando entre diversos mundos e universos. E, no fim das contas, essa visão faz todo o sentido. Se cada leitor, ao terminar cada edição da Explorer, sentir que passou por diversas fronteiras e apreendeu o máximo que pôde sobre a ficção durante as explorações, com certeza, vamos nos sentir satisfeitos.

Max Valarezo

Editor-chefe, repórter

João Gabriel Amador

Ig Uractan

Repórter, ilustrador

Diretor de Arte, repórter

Luiz Felipe Alves Repórter


Steampunk e Dieselpunk Conheça as características de duas das principais estéticas do imaginário de ficção científica

Pág. 6

Dicas Recomendações de leituras, jogos e filmes para quem tem sede de mais aventuras pelos universos da ficção científica

Pág. 28

Cyberpunk O universo dominado pelas máquinas não trouxe o mesmo benefício para todos

Pág. 16


Índice Segurança Acompanhamos o trabalho da Divisão Pré-Crime do Distrito Federal e mostramos com exclusividade como é o cotidiano da equipe

Pág. 22

Aliens e Guerra Fria Nem tudo que você viu nos filmes era apenas diversão

Pág. 12


Do vapor à Combust Nem só de futuro vive a ficção científica. O steampunk e o dieselpunk, duas das principais subdivisões do gênero, fizeram enorme sucesso com um original retrofuturismo. Ao mesclar características estéticas dos séculos XIX e XX com robôs, aeronaves e submarinos, os dois propõem uma linha temporal alternativa, uma nova forma de se imaginar o passado. Entenda, a seguir, as principais semelhanças e diferenças dessas duas sub-estéticas tão importantes para os universos ficionais.


tão Texto por Luiz Felipe Alves Diagramação por Max Valarezo


I

magine computadores, robôs, dirigíveis, locomotivas voadoras passando por sobre cidades fervilhando de pessoas e de inventos. A vida acontecendo intensamente e tudo isso movido a vapor. Sim, a vida movida a vapor. Isso é o steampunk. O estilo ganhou seu nome quando os escritores estadunidenses Kevin Wayne Jeter e James Blaylock tentavam definir o movimento que identificava suas obras. Criado no final dos anos 70 do século passado, o steampunk retrata uma sociedade cujos valores e costumes foram inspirados na Belle Époque – para os ingleses, Era Vitoriana. Surge como uma derivação do cyberpunk, inicialmente projetando para um passado hipotético as mesmas ideias e intenções dessa estética. Mas, a partir do final dos anos 1980, ele ganhou força o suficiente para se desvencilhar do cyberpunk. Suas principais influências são, até hoje, a literatura de ficção científica de Júlio Verne, H.G.Wells e Mary Shelley, desenvolvida no final do século XIX. As obras desses autores não podem, entretanto, serem consideradas como pertencentes ao steampunk, visto que, embora sejam de ficção científica, eram obras escritas no próprio período vitoriano. Os contos Edisonade, de Edward S. Ellis e Luis Senarens, também continham veículos de tecnologia avançada movida a vapor através do mundo. Eles criaram também uma figura muito importante na construção da identidade do steampunk: o “boy inventor” (garoto inventor). Trata-se de um jovem cientista aventureiro que se envolve em uma complexa trama e a resolve com inventividade e coragem. Ray Steam, do filme animado japonês Steamboy, de Katsuhiro Otomo, é um grande exemplo desse arquétipo. Vale lembrar que o cinema também influenciou significativamente o desenvolvimento do gênero: Viagem à Lua (La Voyage Dans La Lune), de

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Georges Méliès, forneceu muito das características estéticas para o gênero. O steampunk ainda invadiu outras mídias além de literatura e do cinema. Nos quadrinhos, por exemplo, Alan Moore escreveu A Liga Extraordinária, que, inclusive, teve uma adaptação para o cinema. A editora DC Comics, por sua vez, tem o costume de criar histórias em eras e possibilidades hipotéticas, os chamados Elseworlds, e a temática steampunk é muito utilizada. Já no RPG (Role Playing Game), obras como Castelo Falkenstein e Reinos de Ferro, ambas steampunk, já são consideradas dentro do rol de grandes cenários dos jogos de interpretação. Com estética rebuscada, roupas elegantes e muita informação, não é difícil dizer que o steampunk é o estilo de ficção científica que mais cresceu nos últimos anos. Hoje, existem diversas convenções, encontros e feiras sobre o gênero, além de um número cada vez maior de contos inspirados na estética. Ou seja, mais pessoas que consomem produtos com a temática vitoriana e que também produzem conteúdos relacionados à Belle Époque. No entanto, existem alguns problemas conceituais no que diz respeito ao steampunk.


Steam...punk? Como se sabe, o punk foi um movimento de contracultura surgido nos anos 1970, que tinha por essência a agressividade e a contestação social. É um movimento de caráter naturalmente distópico e, por isso, impele-se à destruição do sistema vigente. O gênero cyberpunk se tornou a expressão da ficção científica do movimento punk e cumpre com as expectativas de distopia, caos social e contestação. E por que citar o cyberpunk aqui? Porque o steampunk perdeu essas características. Não se pode negar que existam obras de conteúdo político e contestador no steampunk. Mas, no decorrer dos anos 1990 e da primeira década do século XXI, o gênero parece passar por um processo de esvaziamento conceitual. Boa parte das obras de steampunk faz um resgate de valores da Belle Époque, que representa o auge da visão de mundo eurocêntrica e o momento de maior consolidação da cultura européia no mundo. Tal modelo, quando reproduzido, parece de fato bastante conservador, e, por isso, o aspecto político é prejudicado. Em suma, o gênero desenvolveu solidamente sua estética, mas acabou perdendo, no meio do caminho, as características que o tornavam contestador. Ou seja, há muito de steam e pouco de punk.

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Um mundo movido a óleo Se existe um gênero retrofuturista com base no século XIX, por que não deveria haver ficção científica inspirada na primeira metade do século XX? Um mundo de veículos enormes, como zepelins, atravessando o céu de metrópoles desvairadas ao som de muito jazz e ragtime. Um mundo com um forte cheiro de guerra. Um mundo de guerra movido a diesel. O dieselpunk surge como sucessor natural e cronológico do steampunk. Se esse gênero retratava de modo fantástico um passado hipotético da Era Vitoriana, o dieselpunk é um mergulho da ficção científica no período conhecido como o Entreguerras. A estética retrata toda a problemática advinda da época, com o fim da Primeira Guerra Mundial, a Grande Depressão, o nazi-fascismo, o comunismo e, claro, o pior momento que a humanidade, até agora, já enfrentou: a Segunda Guerra Mundial. Nesse gênero, trabalha-se com diversas hipóteses sobre esse período. “E se os nazistas tivessem vencido?”, é uma das possibilidades mais frequentes. Junta-se isso a uma aparelhagem com temática de anos 1940 , tecnologia avançada, experimentos biotecnológicos para criar soldados que lutem pelos Aliados e pelo Eixo e o temor da terceira guerra mundial pairando sobre o ambiente. Outra possibilidade é um cenário no qual se ignora o temor por uma terceira guerra mundial, pois ela já aconteceu e arrasou o mundo. Com enfoque pósapocalíptico, o cenário dieselpunk aí engloba a luta pela sobrevivência com todos os clichês necessários a esse tipo de narrativa. A principal influência do subgênero está em autores como Edgard Rice Borroughs e Hugo Gernsback. Podese dizer também que um dos pais do dieselpunk são os quadrinhos pulp dos anos 1930. Além disso, os contos detetivescos noir também forneceram muito conteúdo para a estética e a literatura dieselpunk.

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Créditos da imagem: Anthony Lucas Em outras mídias, a estética vem progressivamente ocupando espaços. No cinema, filmes como Capitão Sky e o Mundo do Amanhã e Rocketeer são belos exemplos. A franquia de RPG GURPS, por sua vez, entrou no universo dieselpunk e criou o livro de jogo Cliffhangers. A música também tem seu espaço no gênero. Bandas como Royal Crown Revue e Big Bad Voodoo Daddy são exemplos peculiares de bandas dieselpunks, com forte influencia de jazz e swing. O dieselpunk é um gênero em franca ascensão na ficção científica. Ainda não tem o espaço consolidado que o steampunk e o cyberpunk conseguiram, mas dá fortes sinais de que se tornará popular. E, claro, dentro da sua temática de período entreguerras e temores da terceira guerra mundial, acaba por dar espaço a um gênero que já o sucede e trata de contextos históricos como a Guerra Fria e as hipóteses de uma grande guerra nuclear: é o Atompunk. Mas isso fica para uma próxima ocasião.

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Aliens, Robôs, Foices e Martelos Por trás de roupas de borracha, robôs e alienígenas, os temores do pós-guerra eram os principais personagens dos filmes de ficção científica dos anos 50


A

década de 50 é marcada, mundialmente, pela divisão política do mundo entre União Soviética e Estados Unidos, chamada Guerra Fria. Divisão essa resultante da ascensão das duas potências após a vitória na Segunda Guerra Mundial. Nesse contexto, avanços científicos e tecnológicos tornaram-se símbolos de poder. Tais avanços tornaram possível, por exemplo, o desenvolvimento da bomba atômica, que chocou o mundo após ser lançada em solo japonês durante o período final da Segunda Guerra. Assim, mesmo com aparente paz mundial, uma tensão global era evidente, uma vez que a produção bélica era crescente e os efeitos colaterais da radiação ainda eram pouco conhecidos. Entretanto, se, por um lado, a ciência mostrava seu lado destrutivo, por outro, contribuía para a realização de sonhos da humanidade até então considerados impossíveis. Em 1961 iniciava-se a conquista do espaço, com a viagem realizada em torno da Terra pelo russo Yuri Gagarin, a bordo da nave Vostok 1. Mas até mesmo esse feito contribuía para um novo medo. Pois se nós, seres humanos, com nossa tecnologia limitada, éramos capazes de explorar o espaço, por que seres de outros planetas não podiam o fazer? E se esses extraterrestres chegassem a Terra, poderiam subjugar, dominar ou extinguir a humanidade?

Texto, diagramação e ilustração por João Gabriel Amador


Pouco dinheiro, muita criatividade Para conseguirem convencer o público de forma realista, diversos truques criativos tiveram de ser usados. Um exemplo de drible nos gastos era considerar alienígenas semelhantes aos humanos ou capazes de dominá-los, o que evitava o uso de fantasias caras ou malfeitas. Outra alternativa era a utilização de robôs como personagens, pois estes podiam ser produzidos de forma mais convincente e barata, além de revelar as concepções tecnológicas do momento, como o computador.

Assim, a indústria cinematográfica da época, já concentrada no território norte-americano, passou a refletir esse contexto marcado pelo temor, seja do avanço comunista, da possível Guerra Nuclear ou de invasões de seres de outros planetas. E o meio escolhido foi um gênero até então pouco explorado: a ficção científica. Os roteiros dos filmes do gênero deixavam claras as apreensões citadas, como em Invasores de Marte (1953) ou Vampiros de Almas (1956), que retratam invasões alienígenas silenciosas, por meio de infiltração na sociedade. Assim, além de apresentarem referências à corrida armamentista, era retratada a preocupação com alienígenas, que ao mesmo tempo servia como metáfora para a possível infiltração comunista nos Estados Unidos. Mas, apesar de se desenvolver nessa época, a ficção ainda era vista como gênero menor, classificado como tipo . Portanto, os investimentos nessas produções também eram pequenos em relações a outros gêneros, o que acarretava em efeitos especiais, cenografia e vestuário limitados na maioria das produções (ver Box).

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Uma característica marcante da época é a difusão de obras coloridas. Nota-se que as primeiras produções dessa década ainda eram em preto e branco, que significava um menor custo, porém com efeitos menos impressionantes. Mas, no decorrer do tempo, os filmes passam a ser produzidos em cores, o que possibilitou novos modos de representar toda a imaginação de roteiristas, diretores e produtores. Até mesmo a moda pode ser caracterizada na ficção cinquentista, pois as cores em voga (que podiam ser

agora vistas), tecidos brilhantes, borrachas, maiôs para as moças e trajes espaciais para os homens eram amplamente mostradas nos filmes, numa adaptação dos modelos e estilos da época para o espaço sideral. Desse modo, o que começou como uma tentativa de produção cinematográfica de baixo custo para um público que buscava somente entretenimento passou a ser um gênero cinematográfico capaz de transmitir, direta ou indiretamente, as preocupações, concepções e ideais predominantes de uma época.


Cyberpunk ME GA CO RPO RAÇ ÕES

Alta tecnologia, baixo nível de vida

Texto e diagramação por Ig Uractan


No mundo Cyberpunk, os seres humanos estão inertes em uma atmosfera onde as técnologias invadem o corpo. A fusão do orgânico com o cibernético procura uma evolução no potencial do homem. A vida tornase dominada por computadores e a população alienada é governada pela Corporatocracia e o Totalitarismo. No entanto, alguns marginalizados não se contentam em permanecer alheios ao desenvolvimento. Os Cyberpunks ou aqueles com um comportamento Cyberpunk fogem da opressão dos regimes políticos e econômicos de seu tempo.

Tendo apenas recursos tecnológicos improvisados ou provenientes da pirataria e sobrevivendo em condições degradantes e subumanas, esses personagens lutam pela revolução.


FAÇA S U A V I DA U M A OBRA DE ARTE AQUI E AGORA Desconfie das promessas da ciência e da técnica

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Uma das marcas do cyberpunk são os Phreaks (uma junção da palavra free com a palavra phone) e o Phreaking - manipulação de multi-frequências do sistema telefônico americano Bell, com instrumentos improvisados e caseiros conhecidos como Blue Box´s. Essa busca por uma democratização do uso dessa ferramenta de comunicação é


À margem da sociedade

Conhecimento acima da média

Ciborgue/Andróide

São semelhantes ao ser humano. Porém, mais rápidos e mais fortes, geralmente utilizados em tarefas mais pesadas. O tempo de vida dos ciborgues e andróides é limitado por conta de sua funcionalidade. Foram criados com o propósito de não ter o livre arbítrio e, desta forma, se tornarem trabalhadores ou soldados perfeitos. Sua formação é proveniente da mistura de componentes mecânicos para o melhor desempenho biológico.

Revolucionários transposta para a informática com os Hackers, conhecidos como mendigos da informática. Um dos possíveis reflexos do pensamento cyberpunk é a criação de um grupo que queria que a informação fosse livre e sem controle. Este grupo ficou conhecido como Chaos Computer Club. Muito além de uma estética visual, o Cyberpunk torna-se um pensamento consequente da nova sociedade cada vez mais dependente do ambiente virtual e dos meios de comunicação.

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O capitão Eduardo Giovenetti analisa o vídeo com a previsão do assassinato, em busca de indícios que apontem o local onde o crime ocorrerá


UM ANO À CAÇA DE

QUASE-CRIMES Em seu primeiro ano de existência, a Divisão Pré-Crime do Distrito Federal tem conseguido resultados positivos. As atividades da equipe, porém, têm gerado diferentes controvérsias. Como trabalham os agentes da DPC? Como os Pré-Cogs são utilizados? Como é o treinamento daqueles que almejam um posto na nova divisão? Acompanhamos durante três dias as atividades do grupo para responder essas e outras perguntas. Veja nas páginas a seguir os bastidores desse novo tipo de combate ao crime. Texto e diagramação por Max Valarezo


N

a sala, todos estavam quietos, até que se ouviu alguém dizer: “Senhor, faltam vinte minutos para a ocorrência do crime!” O aviso vem do sargento Túlio Campana, preocupado em informar ao capitão Eduardo Giovenetti que o tempo está acabando. Giovenetti, o líder da Divisão Pré-Crime da Polícia Militar do Distrito Federal (DPC-DF), não responde. Apenas segue concentrado na tarefa de destrinchar cada detalhe do vídeo que é exibido à sua frente. Movimentando freneticamente as mãos envoltas nas luvas-controle, o militar rebobina, avança e aproxima a imagem, na tentativa de identificar o local do crime que está prestes a acontecer. Mais precisamente, dentro de 20 minutos. Não leva muito tempo para que Giovenetti, quase 10 minutos depois, consiga identificar a cena do crime: o campo de grama localizado entre a W2 e a Paróquia Nossa Senhora da Esperança (307/308 Norte). “O que estava dificultando a identificação era a pouca luz nas imagens. A essa hora da noite, já está bem escuro e muitos postes próximos da cena do crime estão quebrados”, explica o capitão. “Mas o que entregou a resposta foi a paróquia. Acabei reconhecendo-a no vídeo por já ter morado ao lado dela por três anos”. 4 minutos. Enquanto sobrevoam a Rodoviária, Campana e Giovenetti repassam para sua equipe as instruções de ação para quando chegarem ao local. O crime em questão seria cometido por Antônio Nataniel Carvalho Filho, desempregado com passagem pela polícia por assalto. A vítima em potencial é Breno Duarte Quadros, também com registro criminal por invasão de privacidade e roubo. No momento, porém, não há espaço para curiosidade. Nada de questionar qual a ligação entre os dois ou o que levaria Antônio

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a matar Breno. Tudo isso será resolvido mais tarde, quando o crime tiver sido impedido. 1 minuto e 56 segundos. Para não afugentar o assassino em potencial com o som da nave se aproximando, a equipe desce a duas quadras de distância e percorre o resto do caminho a pé. 48 segundos. A equipe localiza Antônio e Breno, discutindo fortemente, aos gritos. Antônio puxa então uma faca e se prepara para avançar sobre Breno, quando é subitamente atingido por uma arma de choque nas costas, disparada pelo cabo Aurélio Dantas. O resto da equipe se aproxima para imobilizar o agressor, enquanto Campana e Giovenetti correm atrás de Breno, que fugira ao ver a chegada dos militares. Não leva nem dez segundos para que ele também seja mobilizado.


Giovenetti e sua equipe descem da nave a alguns metros de distância da cena do futuro crime

“Eu não ia fazer nada! Me solta!”, braveja Antônio. “É o que eles mais falam quando a gente pega eles, parece até que é roteirizado”, comenta o cabo Dantas. Dentro de 15 minutos, toda a equipe já está de volta ao quartel, com os dois apreendidos. “Olha que legal, hoje evitamos que alguém morresse nos fundos da casa de Deus”, brinca Dantas.

Indivíduos especiais

Aprovado pelo Congresso em 2103, o programa Pré-Crime, , levou cinco anos para ser totalmente instaurado, devido à construção do quartel da DPC e ao treinamento dos agentes. Tendo começado a atuar em janeiro deste ano, o DPC tem se mostrado, até

agora, uma alternativa eficiente no combate ao crime. O caso de Antônio foi o 312º solucionado apenas este ano. “Não houve um homicídio sequer no Distrito Federal nesse primeiro ano de atividades”, aponta o capitão Giovenetti. O programa surgiu após a descoberta dos PréCognitivos, primeiros seres humanos com capacidades de previsão do futuro cientificamente comprovadas. Apelidados de Pré-Cogs, os trigêmeos Alana, Rodrigo e Gustavo, nascidos em Sobradinho, aparentam estar em estado vegetativo, para quem os vê pela primeira vez. “É como se fosse o preço que tiveram de pagar por terem nascido com esse dom nunca antes visto”, comenta o Dr. Arnaldo Pontes, responsável médico pelos Pré-Cogs. “Eles não podem interagir com o ambiente que os cercam, apenas enxergam o futuro.

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Gustavo, um dos trigêmeos conhecidos como PréCognitivos (Pré-Cogs). Ele e seus irmão, Alana e Rodrigo, foram os primeiros humanos da História com capacidades de previsão do futuro comprovadas cientificamente

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E o que eles veem, infelizmente, não é nada bonito”, explica Pontes, referindo-se ao fato de que os irmãos podem apenas prever assassinatos, e mais nenhum outro tipo de visão. Hoje, com 23 anos de idade, os Pré-Cogs de Sobradinho estamparam as capas de jornais no mundo todo quando suas capacidades de previsão foram descobertas. Hoje passados 17 anos, conhece-se bem todos os mecanismos biológicos dos trigêmeos, e já se sabe o porquê deles terem nascido assim. “Por mais que pareça uma história de X-Men, o que os cientistas descobriram é eles são os primeiros seres humanos verdadeiramente mutantes da História”, explica Pontes. Quando se percebeu que a capacidade dos PréCogs poderia ser útil no combate ao crime, logo se elaborou o projeto de criação da DPC/DF. O que foi determinado, porém, é que a divisão seria a única existente no Brasil por um período de cinco anos, como forma de experimentação. “Uma vez que passarmos por esse ‘período probatório’, o programa Pré-Crime poderá existir em outros locais do país”, explica o sargento Campana. Isso seria possível por conta do número de nascimentos de outros Pré-Cogs em outras partes do Brasil registrado nos últimos anos.

Tempo e espaço

No quartel da DPC, o local que abriga os trigêmeos foi apelidado de “Templo”. Lá, os irmãos permanecem mergulhados numa rasa piscina preenchida com leite fotônico, que atua como nutrição e condutor ao mesmo tempo. “O leite intensifica as imagens que recebemos deles, através do escaneamento por tomografia ótica”, explica o doutor Pontes. “Basicamente, nós vemos o que eles veem”. Cada vez que os Pré-Cogs preveem um homicídio (a previsão só funciona caso os três estejam juntos), os aparelhos ligados a eles determinam os nomes do assassino e da vítima, além de produzirem o vídeo

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com a visão que os Pré-Cogs tiveram. Por último, as máquinas apontam quanto tempo falta para que o assassinato ocorra. “É importante ressaltar que os Pré-Cogs não veem o que você quer fazer, apenas o que você vai fazer”, explica o sargento Campana sobre o funcionamento das visões dos trigêmeos. “Por isso, não se preocupe. Não vamos aparecer cada vez que você pensar em matar seu chefe”, brinca o agente. O vídeo com a visão do crime é encaminhado para a Sala de Inspeção, onde é manipulado por meio de G-Speak, a famosa linguagem gestual de controle computadorizado, criada em 2009 pelo estadunidense

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John Underkoffler (foto ao lado). Apesar de todos agentes serem treinados para trabalhar com as luvascontrole, Giovenetti é o responsável por fazer a análise das imagens para determinar o local do crime. por meio de rápidos movimentos com as mãos. “É muito estressante, já que faço isso com o tempo correndo contra mim. Mas sempre chegamos a tempo”. Segundo ele, muitas vezes a dificuldade para determinar o lugar é imensa, já que Brasília, por ser padronizada, apresenta muitos locais praticamente idênticos entre si. “Uma coisa é uma visão que tome lugar na Esplanada dos Ministérios, outra é uma que aconteça em uma tesourinha. Afinal, temos várias


Liberdade x Segurança

John Underkoffler, criador da G-Speak, exibe, em foto do 2010, como sua invenção pode ser utilizada para diferentes propósitos. A tecnologia foi aproveitada pela DPC para a análise dos vídeos com as visões dos futuros crimes

delas pela cidade, e todas são iguais, não fossem detalhes como pichações nas paredes, por exemplo”. Por conta desses desafios, todos os futuros agentes da DPC recebem um treinamento intensivo de arquitetura urbana e de reconhecimento da cidade. “Por meses, rodamos Brasília e as cidades satélites, para conhecermos tudo muito bem”, conta o cabo Dantas. “Lógico que não tem como uma pessoa só conhecer todos os locais. Por isso, ao início do treinamento, cada um já é designado para conhecer muito bem um pedaço do DF. É como se cada um de nós fosse especialista em uma área específica.”

Apesar dos resultados positivos que tem obtido neste ano, o programa Pré-Crime tem causado polêmica desde que foi elaborado. Inicialmente, houve quem se opôs ao uso dos Pré-Cogs como ferramentas da PM. Segundo diversas ONGs de direitos humanos, não seria correto se aproveitar do sofrimento que as visões dos Pré-Cogs lhes causam. Contudo, a grande maioria da população apoiou o uso dos irmãos no combate ao crime. “O fato de não utilizarmos a ajuda dos PréCogs não os impediriam de ter essas visões. O que estamos fazendo é aproveitar que isso já acontece, invariavelmente. E usamos isso a favor da sociedade”, defende o Dr. Arnaldo Pontes. Porém, há outra polêmica, de caráter mais jurídico. Nela, um lado defende que o Pré-Crime é uma afronta à liberdade, pois se estariam prendendo pessoas que não cometeram crimes. O outro argumenta que as visões dos Pré-Cogs jamais estão erradas e, por isso, as prisões feitas são corretas. Tal argumento foi sustendado pelas centenas de visões dos gêmeos que se tornaram realidade. Após tais episódios, foi aprovada a criação da Divisão Pré-Crime, “Mas não vencemos de cara, na verdade. É por conta dessa discussão que estamos em período probatório. Se demonstrarmos que os Pré-Cogs não erram em suas previsões e que nosso trabalho tem 100% de eficiência, seremos aprovados para funcionar de forma permanente”, explica o capitão Giovenetti. Resta agora, portanto, esperar e ver se os gêmeos e seus colegas militares conseguem manter a estatística sem falhas na prevenção de crimes. Caso sim, quem sabe o país possa então se ver finalmente livre de um dos piores tipos de crime.

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S

p u m n k a e t

Castelo Falkenstein (1994) Castelo Falkenstein é um clássico RPG (Role Playing Game) de mesa, criado por Mike Pondsmith e publicado pela primeira vez em 1994. O jogo se enquadra dentro do steampunk justamente por ser ambientado em um Século XIX futuristicamente tecnológico, no qual praticamente tudo pode ser resolvido por máquinas a vapor. Nesse mundo de anacronismos, aristocratas convivem com criaturas míticas como dragões, fadas e anões. Um dos principais diferenciais de Castelo Falkenstein em relação aos outros RPGs era o uso de cartas em vez de dados para guiar as ações dos jogadores. Outro elemento muito comum em diversos jogos que foi dispensado no sistema desse RPG foi o uso de fichas de personagens. Por esses e diversos motivos a mais, Castelo Falkenstein é até hoje considerado inovador e inventivo, tendo aberto grande espaço para a interpretação por parte dos jogadores.

Expl Livros, quadrinhos, entender melhor do Texto e diagrama ção

Steamboy (2004) A animação de Katsuhiro Otomo é uma das melhores expressões em desenho animado da estética steampunk. A trama acompanha Ray Steam, um jovem inventor que recebe, certo dia, um pacote com uma estranha bola metálica. Chamada steamball, o objeto se revela revolucionário: ele contém uma nova forma de energia, capaz de abastecer uma nação inteira e todas suas máquinas a vapor, principal instrumento cotidiano da sociedade. A bola, fruto de pesquisas científicas de seu avô, Lloyd Steam, logo se torna alvo da Fundação O’Hara, uma poderosa companhia, que tenta roubar a steamball de Ray. Porém, ao tentar proteger o objeto, o protagonista acaba por descobrir, aos poucos, quais são os verdadeiros poderes que a bola possui.

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ore!

Dirigido pelo então estreante Kerry Conran, Capitão Sky e o Mundo de Amanhã é ambientado em uma retrofuturista Nova York de 1930. Os cientistas mais famosos do mundo tem desaparecido e a repórter Polly Perkins (Gwyneth Paltrow) investiga o caso. Após ver a cidade ser atacada por robôs gigantes, a jornalista pede a ajuda de Joseph “Capitão Sky” Sullivan (Jude Law), seu ex-namorado, para descobrir o que está acontecentdo. Em meio a aeronaves, submarinos e zepelins, os protagonistas vão tentar impedir os planos de destruição mundial do maligno Dr. Totenkopf.

filmes e jogos para que estamos falando por Max Valarezo

Dieselpunk

Capitão Sky e o Mundo de Amanhã (2004)

Bioshock (2004) Nesse bem-sucedido game da desenvolvedora 2k Boston, o jogador controla Jack, um sobrevivente de uma queda de avião que encontra, na década de 1940, Rapture, uma cidade submarina repleta de mutantes e robôs armados. À medida que a história avança, mais o jogador descobre a verdade sobre o passado de Rapture e sobre como seus habitantes se tornaram as criaturas que assombram o protagonista. Bioshock fez sucesso por conta da jogabilidade que mistura elementos de RPG e de survival horror e da trama de suspense, bem elaborada e cheia de referências estéticas ao estilo de vida estadunidense da época.

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p u r n e k b y C

Blade Runner (1982) Este clássico do cinema, dirigido por Ridley Scott, é um dos melhores exemplos da estética do cyberpunk. A história é ambientada em uma distópica Los Angeles em 2019 e acompanha Dick Deckard (Harrison Ford), caçador de andróides aposentado. Após a revolta de um grupo de andróides (também chamados de replicantes) que fogem de uma colônia espacial para Los Angeles, Deckard é procurado para realizar seu trabalho mais uma vez. Sua missão é encontrar esses replicantes rebeldes e destruí-los, para evitar que causem problemas. A direção de arte de Blade Runner é, até hoje, aclamada e traduz muito bem a ideia do cyberpunk de um futuro com alta tecnologia e baixo nível de vida. No filme, ruas sujas e entupidas de pessoas contrastam com os edifícios gigantes e com as placas de neon que permeiam a Los Angeles em 2019.

Akira (1982)

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Akira, obra-prima de Katsuhiro Otomo, mesmo criador do já citado Steamboy, é considerado, até hoje, um dos mangás mais importantes da história, publicado originalmente entre 1982 e 1990. A trama se passa em 2019 e conta a história de dois jovens amigos, Tetsuo e Kaneda, que vivem em Neo-Tóquio, metrópole reconstruída após uma misteriosa explosão que devastou a Tóquio original. As vidas dos personagens, porém, mudam completamente quando Tetsuo começa a ganhar poderes paranormais e se torna alvo de uma operação do governo, que busca, a todo custo, controlar pessoas com tais tipos de habilidades, para evitar uma nova catástrofe.


Minority Report (1982)

Eu, Robô (1950)

Eu, Robô é uma das obras mais importantes de Isaac Asimov, importante escritor de ficção científica. Trata-se de uma coletânea de contos, nos quais o autor apresentou, pela primeira vez, as suas famosas Três Leis da Robótica, que ditavam a forma como robôs deveriam se portar. Todas as tramas reunidas no livro acontecem no mesmo futuro utópico, onde os seres cibernéticos convivem diariamente com os humanos em harmonia. São narrativas que giram em torno do mesmo questionamento: podem os robôs ter consciência? Por isso, seus contos apresentam autômatos com dúvidas existenciais e sentimentos de orgulho. São, portanto, tramas simples e curtas, mas que possuem uma profunda reflexão.

ber Pós-cy punk

Na ficção futurista de Steven Spielberg, Tom Cruise interpreta John Anderton, chefe da polícia pré-crime, unidade criada para evitar assassinatos antes que eles aconteçam. Os problemas começam quando Anderton descobre que o próximo assassino que deverá ser detido é ele mesmo. A partir daí, o personagem se torna um fugitivo, enquanto tenta descobrir o motivo que, supostamente, o levará a matar. O filme é baseado em um conto de Phillip K. Dick, célebre escritor de ficção científica e retrata bem o conceito do pós-cyberpunk: o futuro utópico, no qual a sociedade funciona muito bem e vive em cidades organizadas, com prédios e máquinas de design arrojado.

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a n s o o d s s 5 e 0 m l i F

Invasores de Marte (1953) O primeiro filme de ficção científica filmado em cores, Invasores de Marte é um marco na história do gênero. A trama conta a história de David, um garoto que, no meio de uma tempestade, vê uma espaçonave aterrissar perto de sua casa e se afundar debaixo da terra. Começa então uma trama de tensão, na qual habitantes da cidade são raptados pelos marcianos invasores, para em seguida serem mentalmente controlados por eles.

A Guerra dos Mundos (1953) Esta foi a primeira adaptação filmada da clássica obra de H.G. Wells. A Guerra dos Mundos nos apresenta a Clayton Forrester (Gene Barry), cientista designado para analisar um meteorito que caiu na sua cidade. Porém, o que ele descobre é que, na verdade, trata-se de uma nave marciana e, a partir daí, começa uma invasão dos extraterrestres, que iniciam uma verdadeira guerra com os humanos pela dominação da Terra.

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Arte de capa por Robin de Blanche


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