zo Ferreira Gullar
o
logia bizarra
zo
o bizarra logia Ferreira Gullar
bichos cabeรงudos | revoada [dir.]
Às crianças da casa e à criança que trazemos em nós.
Foi meu gato que fez Ferreira Gullar
Foi o meu gato, que se chamava Gatinho, que me revelou a importância do acaso na expressão artística. É que estava fazendo uma colagem, quando ele bateu com a patinha na folha de cartolina e desarrumou os recortes de papel colorido que me preparava para colar sobre o desenho geométrico de bules e garrafas. Ao desarrumar os recortes coloridos, mostrou-me uma nova composição em que dialogavam a ordem e a desordem, o estabelecido conscientemente por mim (o desenho) e o que ele, o gato, involuntariamente (?) provocara. A partir de então, passei a usar a desarrumação casual e a ordem deliberada como um modo de criar minhas colagens. Mais tarde, abandonei o desenho e passei a valer-me apenas do acaso, despejando sobre a cartolina recortes de papéis coloridos. Numa dessas vezes, os recortes sugeriam a figura de uma ave estranha: uma ave do lixo! Descobri, então, uma nova e divertida maneira de inventar as colagens. E assim surgiram estas, que compõem o presente livro, que não foi ideia minha e, sim, da Ana Cecilia: ao ver, pela primeira vez, estes bichos nascidos do acaso, riu tanto que não se conteve e me propôs fazermos com eles um livro. Na verdade, me divirto muito fazendo estas colagens e, sobretudo, pondo-lhes nomes. Aliás, pôr os nomes é uma segunda etapa da brincadeira e quase tão importante quanto inventá-las, porque são os nomes que lhes emprestam sentido e humor. Espero, leitor, que também se divirta com nossa bizarra zoologia. Este livro, aliás, poderia se chamar “os bichos do lixo”, porque as colagens que o compõem são feitas de restos de envelopes, convites, catálogos dia, quem sabe, utilizá-los nesta minha brincadeira com o acaso.
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que me chegam pelo correio. Em vez de jogá-los fora, guardo-os para um
cachorro,
eu?
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Este cachorro tem toda razĂŁo: nunca vi cachorro desse feitio.
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conversa fiada
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Cuidado: não é só peixe que morre pela boca.
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dragão bonzinho
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Dragão que, na visão ocidental, é bicho malvado…
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…no Oriente é páreo para nossos anjinhos.
cobra engolindo cobra
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Cobra engolir cobra é fácil; até boi elas engolem.
combate aéreo a guerra, não.
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A paz é uma invenção humana;
o voo do pรกssaro
โ ข 44
A รกrvore voa no pรกssaro que a deixa.
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bicho furioso
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Quando a fúria é tamanha, o próprio corpo e
xp
d
lo
e.
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caranguejeira
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Negra em seu veneno, espera
p a c i e n t e m e n t e
pela vĂtima.
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lagartixa
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N
in g
uĂŠ m
sa be
on
de
ela
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seu
so
vo s
azu
is.
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lhama bailarina
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Os bichos tambĂŠm se inventam, de acordo com seus sonhos mais caros.
touros
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SĂŁo os chifres que definem os touros.
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cavalo de troia
Este cavalo feito de recortes de papel nasceu tão extravagante
e inesperado que eu,
obedecendo a essa lógica,
pus nele o nome de um cavalo mitológico, pois cavalo real ele não é.
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© 2010 desta edição Casa da Palavra © 2010 Ferreira Gullar Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610, de 19.2.1998 É proibida a reprodução total ou parcial sem a expressa anuência da editora. Coordenação editorial Ana Cecilia Impellizieri Martins e Martha Ribas Coordenação gráfica Thais Marques Projeto gráfico e direção de arte Mayumi Okuyama Produção gráfica Cristiane de Andrade Reis Produção editorial Leonardo Alves Consultoria Renata Nakano Reproduções fotográficas Jaime Acioli Tratamento de imagens Trio Studio Impressão e acabamento Pancrom Papel de miolo Offset Alta Alvura 150g/m2 | Suzano Papel de capa Cartão Supremo 300g/m2 | Suzano Tipografia Scala A editora agradece Adriana Calcanhotto e Antônio Carlos Secchin
cip brasil. catalogação-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, rj G983z Gullar, Ferreira, 1930Zoologia bizarra / Ferreira Gullar. – Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2010. il.
isbn 978-85-7734-163-4
1. Animais na arte – Literatura infantojuvenil. 2. Poesia infantojuvenil brasileira. i. Título. 10-3931
cdd 028.5
casa da palavra produção editorial Av. Calógeras, 6, sala 1.001 | Rio de Janeiro | 20030-070 Tel.: 21 2222-3167 | Fax: 21 2224-7461 www.casadapalavra.com.br | divulga@casadapalavra.com.br
cdu 087.5
avis rara
Este livro foi revisado seguindo o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa
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o intruso
ado.
Há sempre aquele que mete o bedelho onde não é cham
dois bicudos
este livro foi composto durante o mĂŞs de agosto de 2010 e ĂŠ uma divertida homenagem aos 80 anos de ferreira gullar.
bicho de muitas cabeças
8162 recortar
ferreira gullar é um “bicho de muitas cabeças”. Poeta, crítico de arte, tradutor e ensaísta, nasceu em 10 de setembro de 1930, em São Luís do Maranhão, e foi batizado José Ribamar Ferreira. Publicou seu primeiro livro de poesia, Um pouco acima do chão, aos 19 anos. Dois anos depois, mudou-se para o Rio de Janeiro, cidade em que mora até hoje. Colaborou em jornais e revistas e foi um dos criadores do movimento Neoconcreto, lançado no fim da década de 1950. Nos anos 1960 dedicou-se também à dramaturgia. Entre 1971 e 1977, durante a ditadura militar, viveu no exílio. Nessa temporada fora do país, escreveu o Poema sujo, considerado um dos pontos mais altos da literatura brasileira. Também publicou outros títulos importantes de poesia, como A luta corporal, Dentro da noite veloz, Barulhos e Muitas vozes. Entre seus ensaios mais conhecidos estão Vanguarda e subdesenvolvimento e Argumentação contra a morte da arte. Recebeu em 2010 o Prêmio Camões pelo conjunto de sua obra. Em casa, no bairro de Copacabana, está sempre acompanhado de novos bichos, criados com papel, tesoura, cola e colorida imaginação.
dentaduras postiças são bichos surgidos do acaso
que nasceram sem dentes, também por acaso; fui então obrigado a provê-los de dentaduras postiças, pois, sem dentes, não poderiam morder
ninguém. Ferreira Gullar
ISBN 978-85-7734-163-4
isbn 978-85-7734-163-4
9 788577 341634