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Opinião “Informal é normal!”, João Gomes, Partner JASON Moçambique, caracteriza o sector informal a fundo

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Finanças verdes

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OPINIÃO

Informal é Normal!

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João Gomes • Partner @ JASON Moçambique

Vem este artigo a propósito do tema da Economia Informal (adiante “EI”). Se a “EI” fosse globalmente consolidada, esta seria a segunda maior economia, logo seguida da economia dos EUA, e o seu PIB valeria 10 triliões de dólares Americanos. E empregaria 1,8 biliões de almas1 . E só na África Subsaariana empregaria, em média – e excluindo o sector da agricultura –, (79,5%) da sua força de trabalho, colocando-a no topo a nível mundial, logo seguida das regiões do Sudoeste asiático (63,7%), e da América Latina (54,7%)2 . Por sua vez, a distribuição da força de trabalho da “EI”, no interior da África Subsaariana, é a seguinte: África do Oeste (81,5%); África Central (78,7%); África do Este (71,2%); Sul de África (63,6%)3 . Em Moçambique, no período entre 1990-1994, a força de trabalho na “IE” era de (73,5%), tendo este valor aumentado, no período entre 2005-2018, para (87,2%), correspondendo a um aumento de 18,63%4. E tal como aqui escrevemos no nosso artigo “Escolas de Negócios e Economia da Bolada”, o PIB da “EI”, em Moçambique, estima-se em 72%. E estamos a falar em estatísticas pré-pandemia COVID19: com certeza que, entretanto, a “IE” reforçou o seu peso relativo. Espero que o meu leitor@ esteja surpreendido com esta introdução: afinal, em Moçambique, o ”informal é normal”, e possui uma escala arrebatadora. É a maior parte da

economia!

Neste artigo proponho uma reflexão em torno da “EI”. Outras expressões equivalentes a “EI”: economia-sombra; economia subterrânea; economia paralela; economia de bazar; economia da bolada5 . Será instrumental a seguinte definição de Economia Informal (a sublinhado), da autoria da Organização Internacional do Trabalho6: 1. Refere-se a todas as actividades económicas: i.e., sem limitação de sectores, com exclusão da agricultura. (Ambiente) Actividades essas exercidas sem as condições mínimas de higiene, e num ambiente de insegurança, medo e constante ameaça e interferência nos negócios, exercidos pelas autoridades estatais e municipais. Há, contudo, que distinguir as actividades da “EI” das actividades criminosas ou ilegais, como a produção e o tráfico de droga. 2 … de trabalhadores: i.e., trabalhadores assalariados e trabalhadores por conta própria. Por exemplo: vendedores de rua; mukheristas; chapeiros; recolhedores informais de lixo; trabalhadores domésticos. A “EI” absorve os trabalhadores que, de outra forma, não teriam trabalho nem rendimento. A maior parte daqueles que entram na economia informal não o fazem por escolha, mas por necessidade absoluta. Na “EI” predomina o género feminino e o trabalho intensivo. Vivem maioritariamente em meio urbano ou periurbano. 3 _ Muitos dos que trabalham na economia informal têm um sentido apurado do negócio, espírito criativo, dinamismo e capacidade de inovação: deixaremos para um próximo artigo a abordagem da relação entre “EI” e Inovação. A força de trabalho da “EI” pode agrupar-se em três níveis: i) Sobreviventes: que constituem a Base da Pirâmide Social⁷, marginalizados e excluídos, os mais pobres entre os pobres, iletrados, não pensam em expandir o negócio, e praticamente não usam ferramentas da economia digital. ii) Gazelas constrangidas8 :com reduzida capacidade de investir, com competências básicas de literacia e numeracia, pensam em expandir moderadamente, mas com muito baixa tolerância ao risco, e fazem uso limitado de ferramentas digitais (por exemplo: social media), não dispondo de activos, sem colaterais, dificilmente bancáveis, financiando-se por via de empréstimos familiares. iii) Top Performers: com capacidade de investir, com competências de literacia, numeracia e de negócio, pensam em expandir, com tolerância ao risco, e fazem uso alargado de ferramentas digitais (por exemplo: business websites; E-commerce; social media; mobile banking), dispondo de activos para servir de colaterais, bancáveis. 4 … e unidades económicas: i.e., unidades familiares e de pequena dimensão (até cinco trabalhadores).

A economia informal absorve os trabalhadores que, de outra forma, não teriam trabalho nem rendimento. A maior parte daqueles que entram na economia informal não o fazem por escolha, mas por necessidade absoluta... predomina o género feminino e o trabalho intensivo

Na economia informal não há barreiras à entrada de novos operadores. Mas, em contrapartida, há problemas como a insegurança e a incapacidade de acumular capital

Estas unidades i) apresentam baixíssimos níveis de eficiência e produtividade; ii) (Matérias-primas) utilizam como inputs desperdícios ou subprodutos da economia formal e informal; iii) (Infra-estruturas) operam em instalações inseguras, não dotadas ou com acesso a energia instável; iv) (Recursos) com limitado acesso a bens de capital e financiamento; v) (Qualidade) e produzem produtos de baixa qualidade; vi) (Links) operam em redes de baixa intensidade de informação e relação Fornecedor>Produtor>Cliente. Não obstante, vi) (Resiliência) apresentam grande flexibilidade e adaptação às alterações das condições de mercado: por exemplo, é proverbial a velocidade de recuperação da “EI” em situações de catástrofe. (Skills) Não possuem (são iletrados), ou são detentores de qualificações muito baixas, e os conhecimentos são obtidos informalmente, no posto de trabalho, preferencialmente num enquadramento do tipo mestre/aprendiz, ou por transmissão de segredos familiares, ou em agremiações e/ ou associações. Em termos dos (Mercados), estas unidades operam i) (Procura) com procuras baixas; ii) (Proximidade dos consumidores) em mercados locais/de grande proximidade física; iii) (Preço) vendendo a preços baixos; iv) (Negociação) num regime de barganha do preço; v) (Margens) com lucros baixos; vi) (Meios de pagamento) com as transacções a serem feitas em dinheiro vivo, ainda que nas classes “Gazelas Constrangidas” e “Top Performers” se assista ao pagamento através de meios digitais. 5 … que não são abrangidos, em virtude da legislação ou da prática, por disposições formais: i.e., não licenciados, não registados, não tributados, sem protecção social. Sofrendo de falta de protecção, de direitos e de representação, estes trabalhadores são frequentemente atingidos pela pobreza, explorados e assediados pelas autoridades. (Corrupção) Em consequência, pagam subornos para i) acelerarem o acesso a recursos e infra-estruturas públicas (por exemplo, no caso das vendedoras: o acesso a mercados municipais); ii) evitarem penalizações (por exemplo, no caso dos chapistas: as excepções ao direito estradal).

Em conclusão

A “EI” caracteriza-se por não apresentar barreiras à entrada, acolher quem não tem lugar na economia formal, e permitir que as operações decorram “fora do radar” dos Estados. A contrapartida, principalmente para a categoria dos “Sobreviventes”, é a permanente insegurança, a impossibilidade de acumulação de capital humano, tecnológico, financeiro e de mercado. O “novo normal” será criar as condições para i) estimular uma postura menos repressiva do Estado, ii) fugindo igualmente da tentação da formalização da “EI”, iii) promover massivamente a inovação (oportunamente escreveremos sobre este tema), iv) e aproveitar o enorme potencial empreendedor, as oportunidades e os recursos existentes na “EI” de modo a promover as condições e o trabalho decente, aumentar a eficiência e produtividade, acelerar a acumulação de capital e permitir progressão na pirâmide social: que ninguém fique para trás.

1NEUWIRTH, Robert “The Power of the Informal Economy” (TED-X video). 2CHARMES (2020), referido por KRAMER, Erika “Innovation in the Informal Economy”, (video). 3Idem, nota 2. 4DE BEER, Jeremy “The Informal Economy, Innovation and Intellectual Property”. 5Expressão da nossa autoria. 6Organização Internacional do Trabalho (2005), “O Trabalho Digno e a Economia Informal”. 7PRAHALAD, C.K. et al (2002), “The Fortune at the Bottom of the Pyramid”. 8GRIMM, Michael et al (2012), “Constrained Gazelles: High Potentials in West Africa’s Informal Economy”.9“The Firm in the Informal Economy”.

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