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Hidrogénio Verde
Hidrogénio Verde. Fonte Versátil ou Ineficiente?
Cientistas estão divididos em relação à inclusão do hidrogénio verde nas prioridades da transição energética. O certo é que, devidamente argumentados, os pró e os contra causam sérias dúvidas sobre se esta componente deve ou não ser levada em conta nos investimentos futuros
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TEXTO Luís Ribeiro • FOTOGRAFIA Istock Photo
OHidrogénio verde vem ganhando espaço na matriz das fontes de energia do futuro. E a explicação é simples: ao queimar hidrogénio, gera-se energia na forma de calor, e o único subproduto é a água, o que o torna numa fonte limpa. No entanto, é necessária energia para fazer o hidrogénio em primeiro lugar. Paradoxalmente, este o hidrogénio faz parte das discussões climáticas para sectores difíceis de descarbonizar, como transporte rodoviário, aviões e como armazenamento de electricidade. Por isso, os críticos dizem que buscar o hidrogénio verde como fonte de combustível não é a melhor solução para combater as mudanças climáticas porque é ineficiente e costuma ser criado através de fontes que emitem car-
Hidrogénio é versátil, mas caro
O hidrogénio já é um componente-chave dos processos industriais químicos e da indústria siderúrgica. Portanto, fazer com que o hidrogénio limpo seja usado nesses processos industriais é fun-
damental para reduzir as emissões de carbono, diz Jake Stones, da empresa de pesquisa de mercado Independent Commodity Intelligence Services (ICIS). Mas como uma fonte de energia em si, a grande vantagem que apresenta é a versatilidade, de acordo com Sunita Satyapal, que supervisiona a tecnologia de célula de combustível de hidrogénio para o Departamento de Energia. “Muitas vezes é chamado de canivete suíço da energia”, considera a responsável.
O hidrogénio limpo seria útil também na descarbonização do transporte industrial pesado, como camiões, grandes barcos industriais e aviões, de acordo com Stones. E é menos interessante para veículos de consumos menores, já que
bono. Consideram que a indústria do hidrogénio é uma forma de os gigantes do petróleo e do gás impedirem a adoção de fontes de energia renováveis puras, como a solar e a eólica, dando-lhe uma cobertura “verde” e, ao mesmo tempo, mantendo a demanda pelos seus produtos.
Apesar do debate, as empresas e o governo dos Estados Unidos estão a promover o desenvolvimento contínuo da indústria de hidrogénio. “Nas minhas viagens ao redor do mundo, não consigo citar um país que não tenha expressado entusiasmo sobre o hidrogénio”, disse John Kerry, enviado presidencial especial dos EUA para o clima, no encontro que tratou o tema sobre hidrogénio ao nível do Departamento de Energia, em Agosto do ano passado. “Da Arábia Saudita à Índia, da Alemanha ao Japão, estamos a estabelecer parcerias de hidrogénio em todo o mundo para fazer avançar esta tecnologia crítica que todos os países entendem que tem o potencial de desempenhar um papel vital na transição para a energia limpa. O hidrogénio pode crescer e se tornar num mercado global de vários triliões de dólares”, defendeu Kerry.
os carros movidos a bateria estão a ser adoptados com muito mais facilidade do que os veículos maiores que requerem baterias maiores. Este componente também pode ser usado como uma forma de armazenar energia de fontes renováveis intermitentes, considerando que o sol nem sempre brilha e o vento nem sempre sopra. Em vez disso, as concessionárias podem converter o excesso de energia em hidrogénio e usá-lo para gerar energia mais tarde, como alternativa ao armazenamento em bateria.
Entretanto, a principal desvantagem do hidrogénio é o seu custo. Produzi-lo a partir do gás natural custa cerca de 1,50 dólares por quilo e o limpo cerca de cinco dólares. Reconhecendo este problema, em Junho passado, o Departamento de Energia dos EUA lançou um programa chamado Hydrogen Shot, que visa reduzir o custo do hidrogénio limpo para um dólar por quilo em uma década.
“Baixar o preço do hidrogénio limpo seria um grande passo para resolver o problema das mudanças climáticas”, disse o bilionário Bill Gates, fundador da Breakthrough Energy Ventures, no Hydrogen Shot Summit do Departamento de Energia. “A meta de cortar o prémio em 80% é fantástica e ambiciosa”, defendeu.
Assim, o Departamento de Energia vê três caminhos principais para reduzir o custo do hidrogénio limpo: melhorando a eficiência, durabilidade e volume de fabricação de electrolisadores; melhorar a pirólise, que gera carbono sólido e; eliminar o dióxido de carbono como subproduto.
Cépticos consideram-no ineficiente e impraticável
crítico para descarbonizar a indústria pesada, abastecer navios e aviões e talvez armazenar energia, não é eficiente para ser usado de forma mais ampla como fonte de energia, diz Robert W. Howarth, professor de ecologia e biologia ambiental da Universidade Cornell.
Howarth é um dos 22 membros do New York Climate Action Council, um grupo encarregado de desenvolver um plano de implementação para a lei que determina o plano de descarbonização de Nova York. No verão de 2020, as partes interessadas da indústria de gás natural sugeriram o uso de hidrogénio azul na infra-estrutura existente do gasoduto de gás natural para aquecer as casas. Mas Howarth e o professor de Stanford, Mark Jacobson, publicaram um artigo de pesquisa, em Agosto, mostrando que era uma má ideia. “O resultado final é que o hidrogénio azul tem enormes emissões
Este componente também pode ser usado para armazenar energia de fontes renováveis intermitentes, e gerar energia mais tarde, como alternativa ao armazenamento em bateria
e não pode ser usado excepto em baixas percentagens no sistema de gás actual”, disse Howarth. “É muito mais barato, em vez disso, mudar para bombas de calor accionadas electricamente para aquecimento”, sugeriu.
Outros críticos dizem que os problemas com o hidrogénio são mais profundos. Isto é, o processo de produzi-lo, comprimi-lo e depois transformá-lo em electricidade ou energia mecânica é grosseiramente ineficiente, de acordo com Paul Martin, especialista em desenvolvimento de processos químicos e membro da Hydrogen Science Coalition. “Vale a pena enfrentar muitos problemas com a bateria porque para cada joule que for colocado, recebe-se 90% dele de volta. Isso é muito bom”, defende Martin. Ao produzir e armazenar hidrogénio, obtém-se apenas 37% da energia de volta e perde-se 63%.
“As pessoas que realmente estão por detrás desse impulso do hidrogénio são a indústria de combustíveis fósseis, porque, sem ela, o que eles farão? A indústria de combustíveis fósseis sem combustíveis fósseis é basicamente o negócio de produtos químicos e materiais de petróleo, que representa cerca de 25% do negócio actual”, constatou.
Ainda assim, Martin acredita que a busca pelo hidrogénio verde é importante para outros usos, como processos industriais e o processo Haber-Bosch, que converte hidrogénio e nitrogénio em amônio para uso em fertilizantes. O processo Haber-Bosch tem o crédito de aumentar maciçamente a produção de alimentos e ajudar a alimentar a explosão demográfica no mundo nos últimos 100 anos.
“Não quero que as pessoas pensem que sou anti-hidrogénio. Acho que fazer hidrogénio verde é muito importante, mas também é muito importante usá-lo para as coisas certas e não erradas”, concluiu.