Revista Digital Nosso Clínico Nº 112 (Dedustação) - JUL/AGO 2016

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ISSN 1808-7191

A REVISTA DO MÉDICO VETERINÁRIO

Nosso Clínico - n.112- Ano 19 - Julho / Agosto 2016

ANO 19 - Nº 112 - JUL/AGO 2016

Indexação Qualis

em cães: revisão de literatura

• Uveíte secundária a hemoparasitose em cão: relato de caso ENCARTE: Clínica de Marketing • Leiomioma gástrico: relato de dois casos clínicos COLUNAS: Dicas do Laboratório • Paniculite em cão: relato de caso • Conhecimento Compartilhado • Deslocamento seroso da retina e erliquiose: • Bem-Estar Animal • Terapia Celular • Prevenção & Tendências • Leishmaniose revisão e relato de um caso suspeito em fêmea Lhasa Apso • Endocrinologia • Centro de Estética • Osteossíntese de tíbia em coelho utilizando pino intramedular combinado • Nutrição Animal • Medicina Felina a grampo confeccionado com pino de Steimann: relato de caso • Medicina Tradicional Chinesa • Eficácia anti-inflamatória do meloxicam comprimido em cães com sinovite • Comportamento Empresarial reversível induzida experimentalmente • Cardiologia • InfoPet • Fisioterapia

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Nosso Clínico • 1


EDIT ORIAL EDITORIAL

Efeitos da Pirâmide Etária O Brasil mudou muito desde o final do século passado. Envelhecemos. Isto é facilmente constato quando é observada a evolução da chamada pirâmide etária ao longo dos anos. A pirâmide etária nada mais é que um gráfico onde o no eixo das ordenadas (vertical ou "y") estão representadas faixas de idades e na abcissa (eixo horizontal ou "x") o número de habitantes, separados por gênero (homens e mulheres). Até meados do século XX esse gráfico tinha o formato bem triangular, com a base larga mostrando a grande quantidade de jovens, sendo que a população, por faixa etária, era cada vez menor à medida que eram observadas as faixas mais altas (pessoas mais velhas). Daí o nome de pirâmide. Atualmente o formato do gráfico apresenta um formato aproximando-se de um retângulo, distanciando-se do histórico triângulo. Reduziu a proporção de jovens na população e aumentou a quantidade de pessoas mais velhas, elevou-se a idade média do brasileiro. As explicações para esse fenômeno, comum à medida que países se desenvolvem, são várias. Melhor qualidade de vida (vive-se mais), maior participação de mulheres no mercado de trabalho (menos opção pela maternidade), planejamento familiar, entre outros. Mas o que deve chamar a atenção do clínico são as potenciais implicações para sua clientela. Menos pets para crianças, mais pets para companhia de pessoas mais idosas. São perfis bem diferentes. O clínico não pode ser surpreendido por mudanças de mercado, ao contrário, deve se antecipar a elas. Por exemplo, atualizando seus conhecimentos voltados para novas oportunidades e nichos do mercado. Roberto Arruda de Souza Lima Professor da ESALQ/USP raslima@usp.br www.arruda.pro.br

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MEDICINA VETERINÁRIA PARA ANIMAIS DE COMPANHIA

SUMÁRIO

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“NÓS APOIAMOS A CAUSA DOS ANIMAIS” Para mais informações visite:

ANO 19 - N° 112 - JULHO / AGOSTO 2016

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Cáries em cães: revisão de literatura

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Uveíte secundária a hemoparasitose em cão: relato de caso

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Paniculite em cão: relato de caso

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Leiomioma gástrico: relato de dois casos clínicos

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Deslocamento seroso da retina e erliquiose: revisão e relato de um caso suspeito em fêmea Lhasa Apso

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Osteossíntese de tíbia em coelho utilizando pino intramedular combinado a grampo confeccionado com pino de Steimann: relato de caso

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Colunas

Encarte: Clínica de Marketing

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Nosso Clínico. - - vol. 1, n.1 (1998) - . -- São Paulo : Editora Troféu, 1998 il. : 21 cm Bimestral. Resumos em inglês, espanhol e português. ISSN 1808-7191. 1998 - 2008, 1-11 2016, 19 (n.112 - jul/ago 2016) 1. Veterinária. 2. Clínica de pequenos animais. 3. Animais silvestres. 4. Animais selvagens.

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em cães: revisão de literatura “Caries in dogs: literature review” FONTE: LEON-ROMAN, 2013

“Caries en perros: revisión de la literatura”

Sabrina Fracascio* (samedvetf@yahoo.com) M.V., Pós-Graduada em Clínica e Cirurgia de Pequenos Animais - Equalis, Colaboradora do Laboratório de Odontologia Comparada (Loc - FMVZ/USP) Naiá Carvalho Souza (naiasouza@gmail.com) M.V., Pós-Graduada em Odontologia Veterinária - USP. Colaboradora do Laboratório de Odontologia Comparada (Loc - FMVZ/USP) Nicole Alves Nascimento (Nicole_vet_odonto@ig.com.br) M.V., Colaboradora o Laboratório de Odontologia Comparada (Loc - FMVZ/USP) Pós-Graduada em Odontologia Veterinária (FMVZ/USP) Marco Antonio Gioso (gioso@usp.br) M.V., Cirurgião Dentista, Professor Livre docente do Depto. de Cirurgia FMVZ/USP. Responsável pelo Laboratório de Odontologia Comparada - FMVZ/USP. Diplomado pelo American Vet. Dental College dos Estados Unidos * Autora para correspondência

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RESUMO: A cárie pode ser definida como um processo mediado por bactérias e seus subprodutos que afetam diretamente as estruturas do dente produzindo desmineralização, tendo baixa prevalência em cães. Além disso, este processo é pouco diagnosticado nas fases iniciais. Geralmente é diagnosticada mediante os sinais clínicos, principalmente presença de orifícios amolecidos no esmalte, a avaliação com explorador dentário e radiografias. Estas últimas também são úteis para escolher o tratamento mais adequado dependendo do grau da lesão. Por outro lado, existem duas classificações principais das cáries, que ajudam também à escolha do melhor tratamento, baseando-se na susceptibilidade ou na anatomia dentária. Finalmente, há diversas opções de tratamentos que incluem extração ou restauração com amálgama, tratamento mais utilizado antigamente, e a resina que é atualmente o restaurador mais utilizado. Unitermos: cárie, canino, extração e restauração ABSTRACT: Tooth cavity may be defined as a process mediated by bacteria and its byproducts which affect directly the tooth structure producing demineralization, having low prevalence in cats and dogs. Therefore, this process is hardly ever diagnosed in its initial phase. It is generally diagnosed through its clinical signs, principally with the presence of soft orifices in the tooth enamel, evaluation with the tooth mirror, and x-rays. These late ones are also good to choose the best treatment according to the injury level. On the other hand, there are also two main classifications for the tooth cavity which help in choosing the treatment, based in susceptibility or dental anatomy. Finally, there are several options for treatment which include extraction or amalgam restoration, a type of treatment used more frequently in former years, and resin, which is the most used restorer nowadays. Keyword: carie, canine, extraction and restoration RESUMEN: La caries dental puede definirse como un proceso mediado por las bacterias y sus derivados que afectan directamente a las estructuras del diente produciendo desmineralización, tener baja prevalencia en perros y gatos. Además, este proceso es poco diagnosticados en estadios tempranos. Generalmente se diagnostica por signos clínicos, principalmente la presencia de orificios puntos suaves en el esmalte, la evaluación con explorer y radiografías dentales. Estas últimas también son consejos útiles para elegir el tratamiento más apropiado en función del grado de la lesión. Por otro lado, hay dos principales clasificaciones de la caries, que también ayuda a elegir el mejor tratamiento, basado en la sensibilidad o en la anatomía dental. Por último, existen varias opciones de tratamientos que incluyen la extracción o restaurar con amalgama, el tratamiento más utilizado anteriormente y la resina que es actualmente el más utilizado restaurador. Palabras clave: carie, canino, extracción y restablecimiento


Revisão Bibliográfica A cárie dental é provocada por bactérias e seus subprodutos que ocorre devido ao processo de desmineralização do esmalte, dentina ou cemento5. Este processo do esmalte, inicia-se quando a bactéria presente na placa gera a fermentação de carboidratos solúveis (ex: açúcares). Essa substância está presente no desenvolvimento de cáries dentárias e tem sido bem documentada em pessoas e roedores11. Quando ocorre a descalcificação do esmalte na superfície, é possível observar uma lesão de mancha branca. Devido os produtos comuns produzidos pela fermentação, as bactérias distribuem-se para a dentina, pois o produto da fermentação, que são os ácidos, irão desmineralizar e destruir o esmalte,

podendo alcançar a dentina. Uma vez que a dentina é lesionada, acelera-se o processo de destruição da cavidade orgânica podendo se disseminar e envolver a polpa do dente, ocasionando desta forma uma pulpite e consequentemente a necrose pulpar/lesão periapical. No momento em que a lesão acomete a dentina (figura 1), esta torna-se irreversível e progressiva, sendo o tratamento preconizado a restauração ou extração6,13.

u Figura 1: Seta indicando lesão de cárie em segundo molar inferior com comprometimento da dentina e cavidade pulpar

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Essa anormalidade dentária não é frequente nos cães e gatos, sendo descrita em menos de 5% dos casos clínicos. As cáries nos cães não são diagnosticadas no início do estágio de desmineralização do esmalte, pois o esmalte dos animais tende a ser mais fino que do humano, sendo assim, o processo acaba se estendendo mais rapidamente para a dentina que em pacientes humanos5,6,17. Um estudo científico demonstrou que os cães não desenvolvem lesões de cárie mesmo após longos períodos consumindo alimentos ricos em carboidratos. Os alimentos comerciais e caseiros para animais contêm tipicamente grandes quantidades de carboidratos solúveis, geralmente sob a forma de amido. Já um estudo realizado em humanos demonstrou que grandes quantidades de placa são formadas quando a sacarose é o açúcar primário consumido11. Os dentes mais acometidos pelas cáries são aqueles que apresentam a superfície oclusal central do 1º molar superior em seus sulcos, caninos na face vestibular em nível cervical e 1º molar inferior, fissuras dentárias ou nas superfícies de contato dos dentes2,5,6,13. As causas da cárie ocorrem por uma combinação de fatores, sendo o primeiro a susceptibilidade genética à presença de bactérias cariogênicas (geralmente Streptococcus mutans mas também outros como o Streptococcus spp e o Lactobacillus spp.), o segundo é visto à uma disposição a fontes de hidratos de carbono fermentáveis. O terceiro apresenta-se com o pH oral, que tornase abaixo de 5,5 durante e após a alimentação, o quarto é também visualizado quando ocorre baixa higienização bucal e desequilíbrio imunológico. Com o pH abaixo de 5,5 ocorre a dissolução da hidroxiapatita do esmalte e volta para o pH 7,5 a 9 devido ao efeito tampão da saliva que ocorre em um período de 40 minutos. Começa então a ocorrer a remineralização do esmalte5,6,13. Nosso Clínico • 7

FONTE: LEON-ROMAN, 2013

Introdução A cárie é um processo de desmineralização do esmalte, dentina ou cemento provocado por bactérias e seus subprodutos ácidos. Apresenta-se de forma pouco frequente nos cães e gatos sendo que, as análises estatísticas divergem quanto à prevalência; parece, no entanto, que se encontra abaixo de 5%. Quando ocorre, acomete em geral a fossa oclusal central do 1º molar superior e os caninos, na face vestibular, em nível cervical, além do 1º molar inferior5. No cão, a cárie é raramente diagnosticada no início do estágio de desmineralização do esmalte. Geralmente é diagnosticada somente quando a lesão já envolve a dentina, quando a polpa está exposta, bem como quando há lesão periapical. Clinicamente a cárie manifesta-se como orifícios amolecidos, frequentemente pigmentados (marrom-escuro ou preto) no esmalte. Com um explorador dentário realiza-se a avaliação, desta forma, este irá se “aderir” na superfície cariogênica amolecida se houver um pequeno defeito no esmalte recobrindo uma grande caverna de dentina cariada. Radiograficamente, lesões radiotransparentes são visualizadas na área afetada da coroa. As radiografias também fornecerão indicação do quão perto do canal pulpar a cárie encontra-se, permitindo a seleção do tratamento mais adequado.6Em cães, as radiografias são importantes para determinar se o sistema endodôntico foi infectado pela cárie13. Existem algumas classificações para a cárie. A classificação de Black, por exemplo, possui dois tipos – uma baseada nas áreas dos dentes que apresentam susceptibilidade à cárie, e a outra é a classificação “Artificial” que reúne as cavidades em classes que requerem a mesma técnica de instrumentação12. Já Harvey e Emily7, classificam de acordo com a anatomia dentária (coroa, raiz, canal radicular, câmara pulpar, dentina, esmalte, cemento e junção amelo-cementária). Cáries diagnosticadas necessitam de tratamento. As opções de tratamento são extração ou encaminhamento para um especialista para restauração, se a lesão envolver tecido pulpar, tratamento endodôntico prévio à restauração será necessário6. Para a restauração dentária podem ser utilizados amálgama de prata, resina composta e ionômero de vidro5,14. A restauração com amálgama de prata necessita que o dente seja preparado para receber as ligas de metais, faz-se necessário, no entanto, que ocorra um preparo retentivo na cavidade a ser restaurada. Mesmo para os outros materiais, como as resinas compostas que se “aderem” de modo mecânico à dentina ou esmalte após condicionamento ácido, pode-se recorrer a esse pequeno preparo retentivo da cavidade, para que haja maior segurança quanto à estabilidade da restauração. São exceções os ionômeros de vidro, que têm aderência à estrutura dentária5.


Classificação de Black De acordo com Mondelliet al. (1990), até o final do século XIX os preparos cavitários eram feitos de forma empírica, mas Black, no início do século XX, organizou uma sequência lógica de procedimentos para a realização dos preparos em dentes humanos, servindo como um guia geral e possibilitando sua racionalização. Black propôs dois tipos de classificação, uma baseada nas áreas dos dentes que apresentam susceptibilidade à cárie (dividido em dois grupos conforme a localização anatômica, cavi-

Mondelli et al. (1990)

dades de cicatrículas e fissuras, e cavidades de superfícies lisas), e outra famosa classificação “Artificial” que reúne as cavidades em classes que requerem a mesma técnica de instrumentação, sendo dividida em: 1) Classe I (oclusal de pré-molares e molares, 2/3 oclusais da face vestibular dos molares, palatina de incisivos e molares superiores) (Figura 2); 2) Classe II (faces proximais de pré-molares e molares) (Figura 2);

Wiggs e Lobprise (1997)

Holmstron, Fitch e Eisner (2004)

Classe I

Classe II

Classe IV

Classe V

Classe VI (Howard e Simon)

Figura 2: Comparação das cavidades de Black (I a V) e da cavidade classe VI de Howard e Simon, com as cavidades “modificadas” de Black para cães e gatos 8 • Nosso Clínico

FONTE: MONDELLI ET AL., 1990; WIGGS E LOBPRISE, 1997 &HOLMSTRON; FITCH E EISNER, 2004

Classe III


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6) Tipo F (envolvimento radicular generalizado, e inclui algumas lesões de reabsorção dos felinos, lesões de reabsorção idiopática em cães, cáries extensas) (Figura 3)7. Pode haver uma combinação destas lesões. A cárie é diagnosticada através de “buracos” ou orifícios amolecidos com coloração e aparência marrom acastanhado a escuro ou preto no esmalte6,17. As primeiras lesões parecem da cor de calcário, no entanto, as cáries podem variar do marrom ao preto mimetizando desgaste dentário. Desta forma, são melhor diferenciadas pela sensação tátil com um explorador afiado, se a lesão é pegajosa como cera, é provável que seja uma cárie. Lesões avançadas que destroem o dente apresentam quantidade grande de detritos e danificação do tecido dental que, eventualmente, estará em decomposição sobre toda a coroa do dente13. Estas lesões podem progredir para o sistema endodôntico, resultando em dor e infecção11. Em cães, as radiografias são importantes para determinar se o câmara pulpar foi infectado pela cárie13. Radiograficamente, a cárie apresenta-se como um defeito radioluscente secundário a desmineralização progressiva do esmalte e da dentina com margens difusas, conforme ilustra a figura 4. Desta forma, mais de 40% de um dente deve ser desmineralizado antes da lesão ser visível através do exame de imagem. A extensão da lesão cariosa pode ser mais grave que as radiografias sugerem2,18. O diagnóstico diferencial da cárie se faz com as superfícies dentárias escleróticas ou gastas por efeito da abrasão, atrito, ou trauma no dente, coloração intrínseca de superfícies oclusais e cúspides fraturadas13. O tratamento das lesões causadas pela cárie que não envolvem a polpa é realizado pela remoção do tecido dental infectado com uma ponta diamantada esférica ou de abrasão e a unidade de ar, posteriormente a colocação de uma restauração13. O preparo da cavidade para receber restaurações com amálgama de prata ou com resina composta pode ser esculpidas com um preparo retentivo, que tem a finalidade de prevenir o deslocamento da restauração, evitando com que o material se perca durante a mastigação. Esse preparo apresenta uma entrada, que é o local por onde se introduz o material. A cavidade deve apresentar um diâmetro menor que a base, após o material tomar presa ele não pode deslocar-se pela entrada da caixa preparada. Não se devem usar ângulos retos na base do preparo, pois eles diminuem as tensões provocadas pelas

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Figura 3: Classificação proposta por Harvey e Emily (1993): (1) Perda de estrutura coronal sem envolvimento endodôntico; (2) Perda de estrutura coronal com envolvimento endodôntico; (3) Perda de estrutura coronal e radicular sem envolvimento endodôntico; (4) Perda de estrutura coronal e radicular com envolvimento endodôntico; (5) Perda parcial de estrutura radicular sem envolvimento endodôntico; (6) Perda parcial ou total de estrutura radicular com envolvimento endodôntico

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FONTE: HARVEY E EMILY, 1993

3) Classe III (faces proximais dos incisivos e caninos, sem remoção do ângulo incisal) (Figura 2); 4) Classe IV (cavidades nas faces proximais dos incisivos e caninos, com remoção e restauração do ângulo incisal) (Figura 2); 5) Classe V (terço gengival, não de cicatrículas, das faces vestibular e lingual de todos os dentes) (Figura 2)12. Os preparos cavitários “modificados” de Black são classificados como: 1) Classe I (lesões em fóssulas, fissuras, ou ranhuras de desenvolvimento) (Figura 2); 2) Classe II (lesões de superfícies proximais de molares e prémolares) (Figura 2); 3) Classe III (lesões de superfícies proximais de incisivos ou caninos) (Figura 2); 4) Classe IV (lesões de superfícies proximais de incisivos ou caninos que envolvem a borda incisal) (Figura 2); 5) Classe V (lesões em superfície vestibular ou lingual de incisivo, canino, pré-molar ou molar) (Figura 2); 6) Classe VI (lesão de bordo incisal ou ponta de cúspide) (Figura 2)17,9. Harvey e Emily, 1993, não usam a classificação de Black e propuseram uma classificação diferente em cães e gatos: 1) Tipo A (lesão apenas de coroa, sem o envolvimento da junção cemento-esmalte, com exposição pulpar, e inclui lesões em esmalte por hipoplasia ou atrito, alguns tipos de trauma ou cáries) (Figura 3); 2) Tipo B (lesão confinada à coroa, sem o envolvimento da junção cemento-esmalte com exposição pulpar, e inclui alguns traumas coronários e cáries) (Figura 3); 3) Tipo C (lesão envolvendo a junção cemento-esmalte, esmalte, cemento e dentina, sem exposição pulpar, inclui cárie, traumas coronais que se estendem além da junção cemento-esmalte) (Figura 3); 4) Tipo D (lesão envolvendo a junção cemento-esmalte, esmalte, dentina e cemento, com exposição pulpar, e inclui lesões de reabsorção interna dos felinos, cáries, traumas coronais com fraturas radiculares) (Figura 3); 5) Tipo E (lesão confinada à raiz apenas, incluindo a furca, sem envolvimento radicular generalizado, e inclui algumas lesões de reabsorção dos felinos, lesões radiculares, fratura radicular idiopática) (Figura 3);


FONTE- LEON- ROMAN, 2013

Figura 4: Radiografia intraoral do primeiro molar inferior de cão com radiolucência em coroa de raiz distal

............................................................................................. forças de mastigação na interface da restauração5,17. Segundo Harvey e Emily (1993) os princípios do preparo da cavidade são: 1) Remoção de estrutura dentária anormal sem enfraquecer o dente; 2) Extensão do preparo cavitário para a remoção de lesão sem destruição dentária; 3) Desenho da cavidade a ser preparada de modo que facilite o preenchimento e a finalização do preparo fornecendo retenção do material a ser utilizado; 4) Preservação máxima de estrutura dentária. Para desenvolver um procedimento ordenado e satisfazer os requisitos das diferentes formas cavitárias possíveis, deve-se seguir princípios específicos para cada tipo de restauração e a ordem geral de procedimentos no preparo de uma cavidade, sendo assim, de acordo com Black, apresenta-se da seguinte forma: 1) Forma de contorno; 2) Forma de resistência; 3) Forma de retenção; 4) Forma de conveniência; 5) Remoção da dentina cariada remanescente; 6) Acabamento das paredes de esmalte; 7) Limpeza dos espaços12. O material restaurador deve “aderir-se” à cavidade e promover o vedamento marginal evitando assim a penetração de bactérias e fluidos bucais. O amálgama é um material restaurador que tem propriedades mecânicas favoráveis, sua técnica de manipulação é fácil, tem custo acessível e os produtos de corrosão depositam-se na interface do dente/restauração promovendo vedamento marginal, porém sem adesão ao dente. Esse material apresenta ser de alta resistência e forma duradoura, podendo ficar mais de 15 anos na cavidade oral do animal1,5. A resina composta tem um sistema adesivo que proporciona uma ligação mecânica ou química com a dentina1. Gioso (2007) relata que o amálgama é uma liga de metais (prata, cobre, estanho, zinco, paládio de formas esféricas ou em limalha) com mercúrio. Devido à sua toxicidade e pior estética quando comparado às resinas compostas, seu uso vem diminuindo, porém sua aplicação é importante por ser biocompatível e altamente resistente. Após a mistura entre limalha e mercúrio, há 10 • Nosso Clínico

uma reação química e posterior cristalização por meses, embora a resistência nas primeiras 24 horas seja suficiente para receber forças mastigatórias. As resinas compostas têm em sua estrutura resinas do tipo II ou compósitos, que são formadas pelo monômero de dimetacrilato (bisfenil A glicidil metacrilato, BIS-GMA) conferindo a este material propriedades físicas, mecânicas e químicas superiores às resinas acrílicas (tipo I), principalmente com relação à aderência após o condicionamento ácido, impedindo infiltrações marginais das restaurações5. Embora a técnica do condicionamento ácido do esmalte possibilite que cavidades mais conservativas sejam realizadas sem a extensão para prevenção do amálgama, é fundamental que as cavidades para resinas compostas sejam preparadas da forma mais esmerada possível, pois a forma cavitária incorreta pode gerar mais contração de polimerização da resina composta e consequentemente mais infiltração marginal. As cavidades para a resina composta podem ser preparadas com ponta diamantada esférica 1/2 ou em forma de pêra 329, devem ter os ângulos internos (vestíbulo-gengival e gengivo-lingual) arredondados, e a forma de contorno geralmente é determinada pela remoção da cárie2. As cavidades profundas, após a limpeza, devem ser protegidas com cimento de hidróxido de cálcio (0,5 mm) e depois uma base de cimento ionomérico. Já as cavidades rasas e médias recebem apenas cimento ionomérico, aguardando no mínimo cinco minutos. Após a proteção da dentina, deve-se realizar o condicionamento ácido (geralmente ácido fosfórico 36%) por 15 segundos2. No caso da resina composta que se adere ao dente, em muitas situações após o condicionamento ácido, podem-se realizar pequenas retenções para que haja maior segurança com relação a restauração5. Feito o condicionamento ácido, o dente é lavado com seringa tríplice por 60 segundos, a cavidade deve ser seca com ar2. Não contaminado por oleosidade ou impurezas que afetariam a polimerização das resinas5. As resinas, por serem viscosas, não penetram nos microporos, porém com a corrosão do esmalte, o agente de união prime e bond sem carga, irá penetrar e polimerizar nas micro-retenções, promovendo retenção mecânica entre o dente e a resina5. Após a polimerização do agente de união, aplica-se sobre ela a resina com carga para restauração definitiva, com a colocação da resina foto-ativada em camadas sucessivas intercaladas pela fotopolimerização que deve ser realizada por 40 segundos, pois o fotopolimerizador atinge no máximo 4 mm de profundidade da resina5, portanto, se usar uma resina fotopolimerizável não deve-se colocar incrementos maiores que 2 mm17. Por fim avaliar a oclusão e realizar o acabamento, que é a escultura geral da restauração com inúmeros instrumentos para que a anatomia típica seja atingida. Geralmente este processo deixa riscos macroscópicos na superfície da restauração e/ou superfície dental, sendo assim faz-se necessário o procedimento de polimento, que é a eliminação destes riscos da superfície de resina, por discos de papel, pontas diamantadas e pedras2. As resinas fotopolimerizadas devem ser polidas 24 horas após aplicação, procedimento este, inviável no caso dos animais, optando-se portanto, pelo polimento 5 minutos após a polimerização do material restaurador, criando uma superfície lisa e brilhante5. Conclusão A cárie é uma enfermidade pouco frequente na cavidade oral


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dos animais domésticos possuindo fatores desencadeantes diferentes dos humanos tais como anatomia dentária mais lisa, ph oral mais alto, diferentes bactérias, frequência alimentar e tipo alimentar. O tratamento envolve a obturação e restauração quando acomete a polpa, esmalte e dentina. Quando não acomete a polpa é realizada apenas a restauração dentária. Observamos que, em sua maioria, diagnosticamos os animais quando este já está com a polpa acometida. ®

da América: Mosby, 1993, 413p. 8. HOLMSTRON, S.E.; FITCH, P.F.; EISNER, E.R. Veterinary Dental Techniques for the Small Animal Practitioner. 3.ed., Pennsylvania: Saunders, 2004, 701p. 9. HOLMSTRON, E.S.: FITCH. F.P.; EINSNER, R.E. “Restorative Dentistry” in: Veterinary Dental Techniques for Small Animal Practitioner, 4º ed, Editora Moby, Filadelfia, 2007 , pag 415 a 417. 10. MINTO, P.M.A.; DINELLI, W.; NONAKA, T.; THOMÉ, C.H.L. “Estudo Comparativo da Resistência à Fratura de Pré-Molares Superiores Íntegros e Restaurados com Amálgama Aderido” Pesqui Odontol Bras, 2002; 16 (2):121126.

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12. MONDELLI, J. et al. Dentística operatória. 4.ed., São Paulo: Sarvier, 1990, 255 p.

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13. NIEMIEC, A.B. “Caries (cavity, tooh, decay) A color handbook small animal dental, oral e maxillofacial diase”, 1.ed., editor Mason Publishing, San Diego, C.A., 2010, p.133-134. 14. ROZA, M.R. Dentística Restauratória. Odontologia em Pequenos Animais. 1ª edição, L. F. Livros de Veterinária, Rio de Janeiro, 2004. 15. REIS, A.F.; GIANNINI, M.; LOVADINO, J.R.; AMBROSANO, G.M. Effects of various finishing systems on the surface roughness and staining susceptibility of packable composite resins. Dent Mater, v.19, n.1, p.12-8, Jan. 2003. 16. TUTT, C. “Restauration”, In. Small Animal Dentistry a Manual of Techiques, 1.ed., editora Blackwell publlishig, Oxford, 2006, p.203-212. 17. WIGGS, B.R.; LOBPRISE, B.H. “Operative and Restorative Dentistry”, em Veterinary Dentistry Principles and Practice, Philadelphia, 1997, p.369-85. 18. WOODWARD, M.T. “Interpretation of Dental Radiographs” In: Companion Animal Medicine, v.24, n.1, February 2009, p.37-43.


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Secundária a Hemoparasitose em cão: relato de caso M.V. RICARDO A. PECORA

“Secondary uveitis in the hemoparasitosis dog: case report” “Hemoparasitosis uveítis secundaria en el perro: reporte de un caso”

RESUMO: Um paciente canino da raça Yorkshire Terrier foi encaminhado à Clínica Veterinária Pet Fanáticos com diagnóstico já comprovado de Ehrlichia canis (E. canis) apresentando sinais oftálmicos. Ao exame oftalmológico observou-se em ambos os olhos hiperemia conjuntival, flare, lacrimejamento, pressão intraocular (PIO) diminuída e opacificação de córnea, dificultando a visibilização das estruturas intra-oculares, caracterizando como uveíte, doença essa que gera um grande processo inflamatório da túnica vascular do bulbo do ocular. A sorologia para identificação do agente etiológico confirmou E. canis e baseado no histórico clínico, nos exames complementares e no exame oftalmológico o animal foi diagnosticado com uveíte secundária a hemoparasitose. Como a doença de causa base já estava sendo tratada, foi instituído o tratamento tópico ocular com Acetato de Predinisona 1% em ambos os olhos pelo período de um mês, sendo que no retorno os sinais oculares haviam regredido completamente e o animal não apresentava mais nenhum sinal oftálmico. Unitermos: canino, Ehrlichia canis, uveíte, hemoparasitose

Bárbara Pereira de Carvalho* (carvalhopbarbara@bol.com.br) Graduanda do Curso de Medicina Veterinária da Univ. Metodista de São Paulo M.V. Profa. Ms. Tânia Parra Fernandes (tania.fernandes@metodista.br) Docente na Univ. Metodista de São Paulo nos módulos de Semioloigia e Clínica Médica Veterinária Aplicada, Reprodução e Obstetricia M.V. Ms. Ricardo Augusto Pecora (pecoravet@uol.com.br) Médico Veterinário e Especialista em Oftalmologia Veterinária do Centro Médico Pet Fanáticos * Autora para correspondência

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ABSTRACT: A canine patient Yorkshire Terrier breed was referred to the Veterinary Clinic Pet Fanatics with proven diagnosis of Ehrlichia canis (E. canis) presenting ophthalmic signs. On examination we observed in both eyes conjunctival hyperemia, flare, tearing, intraocular pressure (IOP) and corneal opacification reduced, making the visualization of intraocular structures, featuring as uveitis, this disease that it generates a large process inflammatory vascular tunic of the eyeball. Serology for identification of the etiologic agent has confirmed E. canis and based on clinical history, the exams and eye examination the animal was diagnosed with uveitis secondary to hemoparasitosis. As the underlying cause of disease was being treated, the topical ocular treatment with prednisone acetate 1% in both eyes for a period of one month was set, and in return the ocular signs had completely regressed and the animal does not present any more ophthalmic signal. Keywords: canine, Ehrlichia canis, uveitis, hemoparasitosis RESUMEN: Un paciente canino casta Yorkshire Terrier fue remitido a la Clínica Veterinaria Pet Fanatics con diagnóstico comprobado de Ehrlichia canis (E. canis) presentando signos oftálmicos. En el examen se observó en ambos ojos hiperemia conjuntival, llamarada, lagrimeo, la presión intraocular (IOP) y opacificación corneal reduce, haciendo que la visualización de las estructuras intraoculares, que ofrece como uveítis, esta enfermedad que genera un proceso de gran túnica vascular inflamatoria del globo ocular. Serología para la identificación del agente etiológico ha confirmado E. canis y en base a la historia clínica, el examen y examen de los ojos del animal se le diagnosticó uveítis secundaria a hemoparasitosis. Como estaba siendo tratado la causa subyacente de la enfermedad , el tratamiento tópico ocular con acetato de prednisona 1 % en ambos ojos , por un período de un mes, se estableció, ya cambio los signos oculares había retrocedido por completo y el animal no presenta más señal oftálmica. Palabras clave: canino, Ehrlichia canis, uveítis, hemoparasitosis

Introdução A Erliquiose canina causada por Erhlichia canis tem sido relatada mundialmente, sendo que sua maior incidência ocorre em áreas tropicais e subtropicais, gerando alto índice de morbidade e mortalidade entre os animais infectados. No Brasil, ela

tem ocorrência em aproximadamente 20% dos cães que dão entrada nos atendimentos dos diversos hospitais e clínicas veterinárias espalhados pelas regiões do país12. E. canis induz a uma infecção aguda sistêmica, levando a diversos processos inflamatórios, incluindo


a uveíte (inflamação da câmara anterior). É uma oftalmopatia que pode ser considerada uma das mais frequentes na clínica médica de pequenos animais, sendo necessário um conhecimento mais profundo desta doença perante os médicos veterinários de clínica geral. O estudo teve como enfoque a importância que esta oftalmopatia tem dentro da rotina veterinária e a dificuldade de diagnóstico da mesma, pois esta apresenta sinais e sintomas não muito específicos. Neste caso, de acordo com a observação da rotina da clínica em questão, há um consenso de que o melhor e mais correto diagnóstico é através de um especialista na área de oftalmologia veterinária, em associação aos resultados laboratoriais. A importância deste estudo é justificada pela disseminação do carrapato, reservatório natural da E. canis, no Brasil, que se difunde com facilidade perante as condições climáticas dos Estados e através da grande população canina errante em nosso país1. Este relato de caso clínico baseado em revisão de literatura vem elucidar a importância do conhecimento básico oftálmico perante a clínica de pequenos animais, tanto para graduandos da Medicina Veterinária, quanto profissionais da área. Revisão de Literatura O bulbo ocular é composto por três camadas: camada fibrosa (externa) onde estão localizadas a esclera e a córnea; camada vascular (intermediária), onde estão presentes a úvea e a camada neuroectodérmica (interna), onde se localizam a retina e o nervo óptico10. A úvea, túnica intermediária do olho é uma membrana altamente vascularizada, pigmentada e inervada10. É composta por íris e corpo ciliar (úvea anterior) e coroide, que corresponde ao trato uveal posterior20. A maioria das doenças intraoculares tem como componente a inflamação uveal (uveíte) devido à úvea ser altamente vascularizada e de sua proximidade às outras estruturas intraoculares8. Raramente inflamações atingem apenas uma parte isolada. Por serem adjacentes, não havendo barreira entre elas, a retina e a coroide quase sempre se inflamam juntas18. Quando ocorre uma inflamação na úvea anterior, ela é denominada de uveíte anterior ou iridociclite; já quando há inflamação da úvea posterior, esta é denominada como uveíte posterior ou coroidite8. A úvea é considerada um tecido imunologicamente competente, portanto, quando antígenos no olho escapam e são processados em locais distantes, os linfócitos B e T são sensibilizados e migram até o local onde o antígeno se encontra, penetram na úvea e formam anticorpos ou tomam parte nas reações imunomediadas por células. Inflamações recorrentes no olho são prontamente visíveis e causam sintomas como dor, congestão e aumente da permeabilidade vascular. A úvea chega atuar como um linfonodo acessório, porque o olho não possuí drenagem linfática. Os processos inflamatórios geram um fenômeno autoimune da úvea. Quando a úvea passa por um dano tecidual prévio (inflamação prévia), ela libera antígenos uveais tecido-específicos, geralmente localizados fora do trajeto dos linfócitos circulantes (por exemplo, intracelularmente). Esses antígenos se envolvem em uma resposta imune na úvea18. As uveítes podem ser classificadas por sua localização anatômica: anteriores, posteriores, intermediárias e panuveítes8. Em alguns casos, as uveítes são classificadas quanto à gravidade dos sinais apresentados pelo paciente, quanto à forma de aparição,

seja ela de forma abrupta ou insidiosa ou quando a evolução da doença é aguda ou crônica10. As uveítes também podem ser classificadas conforme sua origem: as exógenas estão relativamente ligadas a traumas como contusão, perfuração ocular, ceratite ulcerativa ou cirurgia intraocular. As causas endógenas que são a maioria dos casos, em geral, têm início no olho ou podem atingilo por disseminação hematógena e linfática, através de bactérias (Mycobacterium tiberculosis, Brucella canis), fungos (Coccidioides immitis, Cryptococcus neoformans), vírus (Adenovirus, Coronavírus, Herpesvirus), parasitas e protozoários (Ehrlichia canis, Rickettsia rickettsii, Toxocara sp ), processos metabólicos (Diabetes melito, Hiperlipidemia, Hipertensão sistêmica), imunomediados (Síndrome uveodermatológica, Trombicitopenia imunomediada), neoplásicos (Melanoma, Linfoma, Hemangiossarcoma), tóxicos, infecciosos e idiopáticos11. Os principais sintomas de um paciente com uveíte são dor, fotofobia e lacrimejamento (este podendo ser intenso ou discreto após uma afecção aguda ou não)10. Laus11 (2009), cita outros sintomas principais para caracterização de uma uveíte, como, blefaroespasmos, hiperemia conjuntival e sendo estes sintomas mais ou menos evidentes dependendo do grau em que a doença se encontra. Gelatt8 (2003) descreve que alguns proprietários chegam a relatar diminuição da visão, sendo esta por conta da opacificação de meios. Laus11 (2009) refere que uveítes agudas que geram processos inflamatórios iniciais, podem levar a um retardo pupilar e que este retardo pode ser o único sinal observado ao exame clínico. Em alguns animais, pode ocorrer miose (constrição pupilar), sendo esta uma resposta que afeta diretamente o músculo esfíncter da íris por conta da ação direta de prostaglandinas e outros mediadores inflamatórios. Uma uveíte crônica pode levar a adesão da íris na superfície anterior da lente ou sinéquia posterior, que resulta por sua vez em uma pupila distorcida e móvel. Neste caso a pupila pode permanecer “fixa” na posição de miose ou de midríase média por conta da sinéquia posterior8. Gelatt8 (2003) refere que após a quebra da barreira hematoaquosa, o humor aquoso pode gerar aumento da turbidez (“flare”) devido ao acúmulo de componentes celulares e de proteínas plasmáticas dentro da câmara anterior, que segundo Herrera10 (2008), se depositam no epitélio corneano lesionado, levando à presença de precipitados ceráticos. O nível aumentado de proteínas no aquoso é chamado de aquoso fibrinoso (ou plasmoide). Pode ocorrer a formação de coágulos de fibrina na câmara anterior, devido a uma exsudação fibrinosa. A quebra de barreira hemato-uveal pode ser visualizada pela presença de células sanguíneas vermelhas e brancas na câmara anterior, denominando-se de hifema8. Já o hipópio se caracteriza pela produção de exsudato abundante formado de leucócitos e fibrina sedmentados10. Animais com uveíte podem apresentar PIO (Pressão Intra Ocular) diminuída oriunda da redução na produção do humor aquoso, esta sendo associado à quebra da barreira hemato-aquosa e aumento do fluxo uveoescleral intercedido pelas prostaglandinas8. Herrera10 (2008) menciona que pode haver inflamação dos corpos ciliares, e que esta inflamação advém da diminuição do humor aquoso. Quando houver sinéquia posterior, pode ocorrer o fechamento do ângulo iridocorneal (AIC), danificando a fenda eslerociliar e levando consequentemente a um aumento da PIO e um glaucoma secundário. Aumento da PIO causa dor, blefaroespasmo, edema Nosso Clínico • 15


corneano, congestão episcleral, podendo levar a danos importantes na retina e no nervo óptico e consequentemente perda da visão15. Sinais clínicos oculares iniciais podem variar de uveíte posterior, anterior, até pan-uveíte, sendo que as complicações mais comuns incluem deslocamento da retina, glaucoma secundário, neurite óptica e despigmentação coroideana11. Para o possível diagnóstico da uveíte é necessária uma anamnese bem detalhada, exame físico completo e identificação dos sintomas e sinais oculares que o paciente apresente11. A observação de sinais como olhos vermelhos com injeção ciliar, miose e diminuição da PIO podem auxiliar no diagnóstico de uveítes anteriores. Pode-se ter como diagnóstico diferencial uma conjuntivite e as ceratoconjuntivites, sendo que essas oftalmopatias causam mudanças na íris como alterações na textura e mobilidade da mesma, mantendo a PIO e o humor aquoso sem nenhuma alteração. O diagnóstico etiológico se torna de extrema importância tendo em vista que a repercussão de determinada enfermidade, possa levar a recidivas oculares ou até um comprometimento irreversível da visão11. Exames complementares como hemograma, perfil bioquímico sérico, radiografias torácicas, urinálise, prova para identificação direta ou indireta de agentes infecciosos podem auxiliar no diagnóstico de enfermidades que induzem a uveíte15. A eliminação da causa base da uveíte é fator fundamental para o tratamento desta etiologia, sendo de suma importância a diminuição da dor e do controle da inflamação10. Como terapia tópica, os colírios que contém na sua formulação anti-inflamatórios não esteroidais (AINES) como acetato de predinisolona 1% ou acetato de dexametasona 0,1%, se tornam os de primeira escolha por penetrarem através da córnea intacta e chegar até a câmara anterior. A terapia preconizada é de uso tópico em torno de três a seis vezes ao dia19. Os AINES são bastante indicados para prevenir a inflamação, sendo os mais indicados para uso tópico flurbiprofeno, diclofenaco sódico e cetorolaco de trometamina, instituídos na freqüência de quatro vezes ao dia11. O uso parenteral do anti-inflamatório flunixina meglumina, pode ser utilizado como colírio para tratamento de uveítes anteriores quando houver contraindicação de anti-inflamatórios não esteroidais. Este anti-inflamatório pode ser utilizado como melhor agente anti-inflamatório se comparado com a dexametasona2. Se for necessária a associação de terapia tópica com a terapia sistêmica, normalmente se institui o uso de predinisolona na dose de 0,5 a 2 mg/kg/dia, sendo este reduzido gradativamente, evitando possíveis efeito colaterais futuros11. Os antibióticos tópicos em geral são impermeáveis a barreira hematoaquosa, mas quando há uveítes, a quebra desta barreira permite a passagem destes fármacos. Alguns antibióticos como as cefalosporinas, amoxicilinas, tetraciclinas, trimetropim-sulfadiazina e o cloranfenicol, penetram no interior do bulbo ocular com a barreira hematoaquosa intacta11. No caso de micoses sistêmicas que geram sinais clínicos nos olhos, os antifúngicos sistêmicos podem ser usados na terapia de controle dessas micoses. Os protocolos mais utilizados são com o uso de fármacos a base de anfoterecina B, itraconazol, cetoconazol e fluconazol11. Midriáticos tem efeitos anti-inflamatórios inespecíficos de estabilização da barreira hematoaquosa, auxiliando assim no controle das uveítes. Não se deve utilizá-los quando houver aumento 16 • Nosso Clínico

da PIO, salvo em casos de glaucomas por presença de íris bombé, em que se pode tentar rescindir as sinéquias através do uso deste fármaco11. O agente mais utilizado é a atropina 1%. Este fármaco diminui o ângulo de drenagem do humor aquoso e o limiar de dor no caso de uveítes (espamos do músculo ciliar) e previne a formação de sinéquias. Outros fármacos que pode ser associados ao tratamento são a felinefrina 5 ou 10% que é considerado um aditivo nos casos que se queira causar midríase e a tropicamida 1%, sendo um midriático de curta duração com ação cicloplégica fraca3. O uso contínuo da atropina pode acarretar em alguns sintomas indesejáveis, como diminuição da produção da lágrima, taquicardia e predispor ao aparecimento de glaucoma agudo11. Uveítes associadas a aumento da PIO, o uso de hipotensores oculares se faz necessário, pois visa à minimização dos efeitos deletérios que o aumento da pressão no nervo óptico e das células glanglionares da retina causam para o comprometimento da visão11. O uso da base de inibidores de anídrase carbônica como o colírio cloridrato de dorzolamida ou a acetazolamida por via oral, são ótimas opções e podem ser indicados em doses convencionais11. Os colírios a base de pilocarpina e derivados de prostaglandinas como o lanatoprost, travoprost ou bimatoprost, devem ser evitados por agravarem a inflamação ocular11. A azatioprina é comumente empregado nos casos em que se tem uma doença imunomediada ou que os pacientes não respondem à terapia convencional. Coleta de sangue frequente e contagem de plaquetas são recomendadas quando utillizado esse medicamento, bem como determinar as funções de enzimas hepáticas, pois esta terapêutica tem alto potencial hepatotóxicos e mielosupressores. A dose inicial recomendada é de 2 mg/kg por dia durante 3 a 5 dias, seguido por redução até 1 mg/kg/dia durante 10 dias, e precedido se necessário, de 0,5 mg/kg/dia como dose de manutenção9. Entre as causas de uveítes em cães, uma das principais é a Ehrlichia canis que é um parasita intracelular e obrigatório16. A Ehrlichia canis é uma bactéria pequena e gram negativa pertencente a família das Rickettsia rickettsii, este é um grupo de micro-organismos que parasitam as células brancas circulantes de diversas espécies13,12. É transmitida através do carrapato Rhipicephalus sanguineus, tendo sua maior prevalência em períodos que correspondem a altas temperaturas16, condição climática comum em vários estados do Brasil e mais disseminada pela grande população canina errante1. Na fase aguda da erliquiose foram relatados como sintomas depressão, anorexia, febre, perda de peso, corrimento nasal e ocular, dispneia e linfadenomegali, uveíte e até sintomas neurológicos como convulsões6. E sintomas mais específicos, como vasculite, trombicitopenia imunomediada, disfunção plaquetária que levam a sinais como petéquias e epistaxe, leucopenia e anemia em graus variáveis. Se o sistema imunológico não der conta de combater a infecção, instala-se a ehrlichiose crônica, podendo levar a lesão de medula óssea e a infecções simultâneas por Babesia spp e até Leishmania infantum16. Os mecanismos imunogênicos têm influência no papel de diagnóstico da doença, pois encontram-se achados histológicos com infiltração de células plasmáticas em vários órgãos como rins, baço meninges e até tecidos oculares13. Porém as rickettsias conseguiram desenvolver através de um mecanismo uma forma de se esquivar da resposta imune do hospedeiro, esse processo ainda


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Quadro 1: Achados alterados em Leucograma Leucograma 17/1/2015 Plaquetas

70.000

24/1/2015

2/5/2015

Valor de Referência

210.000

150.000

200.000 a 500.000 mm³

* Valor de referência de acordo com o laboratório de análises clínicas do Hospital Veterinário Modelo

No exame oftalmológico realizado no dia 04/05/2015 foram observadas alterações importantes como PIO diminuída, medindo 09 mmHg olho direito (valor de referência 15 a 30 mmHg8), lacrimejamento com presença de secreção serosa em AO, flare em câmara anterior, diminuição da visibilização do fundo de olho pela presença de muita celularidade em vítreo, hiperemia conjuntival (Figura 1) e visibilização de nervo óptico e vasos retinianos preservados.

M.V. RICARDO A. PECORA

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Relato de Caso Veio para atendimento no dia 04/05/2015 no Centro Médico Veterinário Pet Fanáticos, localizado na região do Rudge Ramos, em São Bernardo do Campo, um animal da espécie canina, raça Yorkshire Terrier, de coloração chumbo e canela, com 14 anos de idade e macho. O animal em questão foi encaminhado por colega com diagnóstico de hemoparasitose “doença do carrapato”, para consulta com oftalmologista veterinário, apresentando sintomas oftálmicos. O proprietário citou que no dia 17/01/2015 o animal foi diag-

nosticado pelo colega com “doença do carrapato” através de hemograma que evidenciou uma importante trombocitopenia (quadro 1), sendo instituído tratamento com Doxiciclina 25 mg BID por 28 dias sem haver distinção prévia do agente etiológico. Foi indicado retorno em 5 dias (24/01/2015) para acompanhar a evolução do tratamento através de hemograma controle (quadro 1) que indicou melhora no caso clínico e normalização da série plaquetária. Após alguns meses dia 02/05/2015, o proprietário retornou ao colega para realizar exame controle (quadro 1) e citou que o animal apresentava novos sinais clínicos, como baixa acuidade visual (BAV) e opacidade em ambos os olhos (AO), indicando ao clínico que a doença poderia ter progredido, levando sinais oculares. O clínico em questão encaminhou o proprietário para o oftalmologista veterinário.

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não está muito evidente, mas acredita-se que estes parasitas têm múltiplos genes, com regiões variáveis e constantes, permitindo que se recombinem e induzam uma variação dos determinantes antigênicos17. Animais que tenham o sistema imunológico efetivo, podem desenvolver uma forma crônica assintomática da doença, tornando-se um portador são. Caso contrário, se o sistema imunológico do animal estiver imunocomprometido, este pode ter uma reagudização do quadro sintomatológico, levando o animal a óbito21. Pode-se chegar a um diagnóstico através da pesquisa do parasita ou de anticorpos contra ehrliquia na circulação do paciente. Esfregaços sanguíneos corados têm baixa sensibilidade, resultando negativo em quase todos os casos4. O teste de dot-blot ELISA que detecta anticorpos para E. canis possui mais sensibilidade e especificidade que a imunofluorescência indireta5. É um teste rápido que pode ser realizados na clínica de forma prática e com baixo custo, tornando assim um exame rotineiro e efetivo no diagnóstico da ehrliquiose, já que a sensibilidade deste teste varia de 80 a 100%4. O tratamento se baseia em fluidoterapia de suporte e/ou transfusão de sangue quando necessária, glicocorticoides quando há trombocitopenia, meningite e vasculite, dipropinato de imidocarb 5 mg/kg subcutâneo com intervalo de no mínimo 15 dias e/ou doxiciciclina ou oxitetraciclina, 5 a 10 mg/kg via oral a cada 12 horas por 21 dias, sendo este o fármaco de escolha para o tratamento da ehrlichiose16. A resposta do paciente ao tratamento é positiva mesmo em casos que os sinais clínicos são graves. Cães com a forma aguda da doença, geralmente apresentam melhora clínica em um período de 24 a 72 horas e a recuperação de cães que desenvolveram a forma crônica, levam um período de até quatro meses7. Os sinais oculares na erliquiose podem se apresentar em qualquer fase da doença e tem a capacidade de envolver quase toda a estrutura do olho. Sinais clínicos oftálmicos como hemorragia conjuntival, congestionamento episcleral, flare de câmara anterior, rubeose iridis, miose, edema de córnea, precipitados ceráticos, hipópio, redução da PIO, neurite óptica e engurgitamento e tortuosidade de vasos sanguíneos da retina e lesões coriorretinianas são observados no exame físico. Perfuração, prolapso do trato uveal e lesões esclerais bilaterais são consideradas lesões oculares incomuns e raras16. Pode ocorrer obstrução da malha trabecular por conta de detritos inflamatórios que ficaram depositados no local levando o paciente a desenvolver um glaucoma secundário e sinéquia posterior induzindo a formação de íris bombé. Se houver o envolvimento do segmento posterior, podem ser observados no exame, papiledema e coriorretinite13. A hemorraria subretiniana, pode levar ao deslocamento da retina e cegueira14.

Figura 1: Yorkshire com presença de flare em câmara anterior (seta vermelha), hiperemia conjuntival (seta amarela) e lacrimejamento aparente em olho esquerdo .......................................................................................................................

Ao final do exame constatou-se uma uveíte, levando o oftalmologista veterinário a crer que este processo foi estabelecido secundariamente a hemoparasitose já instalada. Institui-se o tratamento com acetato de predinisolona 1% três vezes ao dia AO durante um mês, sendo solicitado ao proprietário um novo exame sorológico (quadro 2) que pesquisa anticorpos de diversas enfermidades como a Erlichia canis, para auxiliar na elucidação do agente etiológico e confirmação do diagnóstico.


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