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Do apoio ao reconhecimento: trajetória de excelência acompanhada pelo CNPq

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O que é ciência?

O que é ciência?

DESTAQUES DO PRÊMIO ALMIRANTE ÁLVARO ALBERTO PARA CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Walter Colli Graduado em medicina pela Universidade de São Paulo (USP), doutor em bioquímica pela Faculdade de Medicina e livre-docente pelo Instituto de Química da USP (IQUSP). Foi professor titular da USP (1980-2009) e hoje é colaborador sênior do IQUSP. Atua principalmente na área de interação entre Trypanosoma Cruzi e célula hospedeira, com particular enfoque em glicoconjugados, ligantes e receptores. Ensinou bioquímica e biologia molecular, durante 50 anos, para estudantes de graduação. Nos últimos 30 anos, manteve estreita colaboração com grupos de pesquisa argentinos, tendo recebido vários pós-doutores da Argentina em seu laboratório. É Doutor Honoris Causa pela Universidade de Buenos Aires. Desde 2003 é coordenador adjunto da Diretoria Científica da Fapesp. É membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia de Ciências do Mundo em Desenvolvimento (TWAS). É membro da Ordem do Mérito Científico do Brasil nas classes Comendador (1995) e Grã-Cruz (2000). Foi bolsista de Produtividade em Pesquisa 1A (1982-2009) do CNPq e é bolsista de Produtividade Sênior. Vencedor do Prêmio Almirante Álvaro Alberto em 2014 Tive uma infância pobre. Morávamos numa casa com um quarto único, fogão a lenha e fossa no quintal. Meu pai trabalhava como escriturário de uma indústria de fitilhos. Faleceu jovem, quando eu tinha apenas nove anos. Ficamos eu, minha irmã de quatro anos e minha mãe, sem condições de subsistência. Fomos morar com minha avó e um tio. Com eles morava um outro tio e sua família, que saiu da casa para podermos entrar.

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Este tio gerenciava um armazém de cereais próximo ao Mercado Municipal em São Paulo. Pagou-me um curso de datilografia e, aos 10 anos, eu já estava datilografando faturas e duplicatas no estabelecimento e pagando contas nos bancos do centro da cidade. Por isso, pude continuar a estudar. Ia à escola pela manhã, almoçava e depois frequentava o armazém. Nessa atividade, dentre outras coisas, aprendi a classificar os diferentes tipos de feijão e arroz. Sempre estudei em estabelecimentos públicos. Cursei os quatro anos do curso ginasial na Escola Estadual Professor Antônio Firmino de Proença, no bairro da Moóca, e os três anos do curso colegial na Escola Estadual Presidente Roosevelt, no bairro da Liberdade. No último ano do colégio resolvi fazer cursinho à noite e, assim, preenchia os meus dias: colégio, armazém e cursinho.

Escolhi a área de ciências da vida e estava em dúvida se deveria cursar biologia ou medicina. Em

Entrega Premio Almirante Alvaro Alberto ao Prof. Walter Coli, 2014

1957, com 17 anos de idade, passei nos dois vestibulares. Escolhi medicina pela simples razão de que meu futuro econômico seria menos duvidoso. Sempre tive predileção especial por genética e logo no primeiro ano da faculdade fui convidado pelo professor Isaias Raw para estagiar em seu laboratório. Tratava-se de bioquímica e não de genética, mas logo descobri que não era só de genética que eu gostava, mas de ciência. Terminado o curso de medicina em 1962, o professor Isaias convidou-me para ser assistente (como instrutor) na cadeira de Bioquímica. Disse-me ele à época: “O governador do Estado de São Paulo aprovou o regime de dedicação exclusiva à docência e à pesquisa. Você nunca ficará rico, mas conseguirá viver”.

No fim de 1963 recebemos a visita, por um ano, do Dr. Maynard E. Pullman, de Nova Iorque, que havia recentemente publicado o método de purificação da F1-ATPase. Comecei com ele a estudar a síntese proteica em mitocôndria, que foi o tema da minha tese de doutoramento, defendida em 1966, sob a orientação do professor Raw. Terminado o doutorado, casado com Anita e já tendo um filho, fui para Nova Iorque a convite de Pullman, onde fiquei dois anos estudando a ação do ATP na síntese de ácidos graxos da organela.

Durante minha estada, frequentemente almoçava com Michio Oishi, cientista japonês radicado nos Estados Unidos, e aí planejamos um pequeno projeto na área de biologia molecular de bactérias. Pedi autorização da USP para permanecer por mais um ano e meio e, nesse período, publicamos quatro trabalhos. Finalmente, eu havia chegado à genética, pois, fomos os primeiros a descrever a topologia dos genes de RNA ribossômico de Bacillus subtilis.

Ao voltar, no final de 1969, encontrei o antigo departamento da Faculdade de Medicina integrado, com outros departamentos equivalentes, no recém-fundado Departamento de Bioquímica do Instituto de Química da USP, após efetivação da reforma universitária. Comecei a montar meu grupo de pesquisa, procurando explorar três linhas de trabalho. Todas renderam publicações, mas a que predominou foi o estudo das propriedades da membrana plasmática do Trypanosoma cruzi, agente da doença de Chagas. Considerando que o protozoário invade células, havia interesse em investigar as moléculas específicas de sua membrana que permitem reconhecer a célula hospedeira. Isso nos levou a estudar as glicoproteínas da membrana do parasita e descobrir moléculas ainda não descritas.

Nosso trabalho abriu caminhos para a investigação de outros pesquisadores e para a obtenção de dados importantes nessa área. É claro que, no início, o que nos movia era a esperança de eventualmente desenvolver uma vacina ou algo que inibisse a reprodução desse parasita. Nunca chegamos a isso. No entanto, a importância do trabalho não se mede somente pelo resultado,

mas pelo processo. No processo, muitos estudantes passaram pelo laboratório e muitos se beneficiaram do nosso trabalho, direta ou indiretamente. É um truísmo dizer que o desenvolvimento científico de um país está na raiz de sua capacidade de inovação. Portanto, a importância do que fazemos, os cientistas, é manter a roda girando, formando pessoal qualificado, produzindo conhecimento e servindo como antenas captadoras do que é feito no exterior.

Há muitos investigadores, nunca em número suficiente, que se dedicam à pesquisa e ao ensino. Quando fui informado, em 2014, de que o prêmio Almirante Álvaro Alberto me havia sido outorgado, perguntei-me porque teria sido eu o escolhido. Na minha cabeça, fiz uma lista imediata de nomes de colegas com igual ou maior merecimento. Eu teria indicado qualquer um deles, se estivesse na posição de escolher. No entanto, fui eu o escolhido, talvez pelo trabalho de pesquisa desenvolvido até então. Além do prêmio em pecúnia, apoiado pela Fundação Conrado Wessel, fomos amavelmente recebidos pela Marinha do Brasil, que nos proporcionou uma viagem de navio ao longo do rio Amazonas, por uma semana, permitindo conhecer a realidade das populações ribeirinhas.

Finalmente, quero ressaltar a importância fundamental do CNPq para o progresso do Brasil. No período de 1986 a 2009, quando me aposentei compulsoriamente, fui bolsista 1A do CNPq e, desde então, pesquisador sênior, até 2022. A bolsa pessoal e o auxílio que a acompanhava sempre ajudaram muito, não só como incentivo pessoal, mas por permitir o pagamento de pequenas despesas do laboratório. Digno de nota foi o Programa Integrado de Doenças Endêmicas (PIDE), iniciado em 1973-1974 e gerenciado pelo CNPq com verbas do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Cientifico e Tecnologico (PADCT). O CNPq foi fundamental, com verbas substanciais, no apoio à pesquisa através do PADCT no período de 1991 a 1997. Lembro-me do auxílio que me foi concedido para a organização do Congresso da Associação Panamericana de Sociedades Bioquímicas (PAABS, agora PABMB, siglas em inglês) em fevereiro de 1990, ocorrido em São Paulo, no Maksoud Plaza Hotel.

Finalmente, uma das ações mais nobres do CNPq é o papel que desempenha como catalisador e mantenedor de uma rede de cientistas brasileiros, ao apoiar congressos e reuniões anuais das diferentes especialidades, permitindo a integração científica no território nacional, além do contato fundamental dos estudantes com pesquisadores mais experientes.

Bioluminescência de fungos: prospecção e ensaios toxicológicos – Cassius Vinicius Stevani, Universidade de São Paulo - USP.

Bolas de Tênis - Nanopartículas de prata – Ricardo Luis Tranquilin, Universidade Estadual Paulista.

seção quem faz o CNPq

Grânulos de amido – Camila Moura Santos, Instituto Florestal do Estado de São Paulo.

Segundo lugar no I Prêmio de Fotografia, Ciência & Arte, edição 2011. A imagem é uma foto polarizada de grânulos de amido, aumentada 40 vezes, presente em fibras septadas da madeira de Ocotea corymbos.

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