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A carreira de gestão em C&T e o desenvolvimento da C&T no Brasil
Roberto Muniz Barretto de Carvalho PhD em Estudos Comparados Sobre As Américas pela Universidade de Brasília. É diretor-presidente da Associação dos Servidores do CNPq No dia 28 de julho de 1993 foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei 8. 691, criando as carreiras de ciência e tecnologia.
A lei que instituiu o Plano de Carreiras para a área de Ciência e Tecnologia no âmbito da administração federal foi decorrente das mudanças previstas na Constituição Federal de 1988 e da Lei 8.112, aprovada em 1990, criando o Regime Jurídico Único.
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A referida lei de 1993 criou os planos de carreira de “pesquisa em ciência e tecnologia”, a de “desenvolvimento tecnológico” e a de “gestão, planejamento e infraestrutura em ciência e tecnologia” (de pesquisador, de tecnologista e de gestor em ciência e tecnologia).
Entretanto, estas atividades e quadros técnicos já existiam no Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia. A Lei 8.691/93 fez adaptações no quadro de carreiras já existente para atender e adequar-se à nova constituição e a Lei 8.112/90.
A constituição de quadros públicos qualificados e voltados especificamente para as atividades de ciência e tecnologia, particularmente as de gestão em C&T, é resultado da institucionalização da ciência e tecnologia no Brasil. Esta tem como marco inicial a criação do CNPq, em 1951, e o desenvolvimento e expansão das atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) no âmbito do Estado brasileiro.
A institucionalização da ciência e da tecnologia no Brasil coincide com o reconhecimento da importância da ciência nos rumos e desfecho da 2ª Guerra Mundial e da sua importância para o desenvolvimento econômico e social.
Ao tomar como sua responsabilidade a promoção da ciência e da tecnologia, o Estado brasileiro cria e começa a desenvolver um Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia.
As primeiras ações passam por preparar quadros capacitados e qualificados para desenvolver e implementar políticas públicas na área. Constituir este quadro de pessoal para fazer a gestão de suas atividades coube inicialmente ao CNPq, que era a cabeça do sistema. Em 1985 foi criado o Ministério da Ciência e Tecnologia, que absorveu esta função.
A promoção da ciência e tecnologia e seu desenvolvimento não é tarefa simples ou fácil. O ‘fazer’ ciência, tecnologia e inovação possui características próprias e complexas, que demanda ações diferentes das outras áreas de atuação do Estado. Não é como planejar e implementar uma estrada ou sistemas de circulação, ou a construção de habitações e prédios públicos. Fomentar, planejar e criar infraestrutura para a área de ciência e tecnologia requer ações diferenciadas.
Promover a C&T demanda uma gama de conhecimentos específicos, capaz de apreender e entender como se desenvolvem as atividades de pesquisa, de geração de tecnologia e inovações e como combiná-las com o sistema educacional, as demandas nacionais, socioeconômicas, para que a sua promoção possa ter sucesso. Há, também, a percepção de que o orçamento destinado para o segmento de C&T não é um gasto do Estado a fundo perdido, é um investimento que tem retornos diferenciados para a sociedade, retornos imediatos e também de longa duração.
O sucesso brasileiro na área de C&T está profundamente relacionado com a formação e atuação deste quadro de agentes de Estado – os gestores em C&T. Graças a ação das agências de fomento – CNPq e Capes -, aos institutos e unidades de pesquisa, a criação e atuação do MCTI, o Brasil ocupa, em 2020, a posição de primeiro país da América Latina na produção do conhecimento e o 14º lugar em produção científica em escala mundial1 .
Sem a ação constante e atuante deste quadro de servidores dificilmente teríamos a proposição, planejamento e execução de políticas públicas que apoiaram e levaram recursos para as universidades, para a formação de um sistema de pós-graduação, seus docentes e pesquisadores, gerando o notável crescimento das ciências, tecnologia e inovação no Brasil.
Infelizmente, nos últimos anos, particularmente a partir de 2016, o investimento nas carreiras de C&T vem decaindo fortemente. Chamamos de investimento a constante formação, qualificação, valorização e recomposição destes recursos humanos. Exemplo marcante desta triste situação é o CNPq. A principal agência de fomento do país conta hoje com cerca de 300 servidores para executar suas atividades, quando necessitaria de cerca de 800, segundo estimativas da ASCON [Associação dos Servidores do CNPq] e do autor.
A falta de concursos públicos para repor os quadros que vão se retirando do sistema (por aposentadorias, mortes, desligamentos), a ausência de uma carreira valorizada e atrativa e o empobrecimento das funções da carreira de gestão explicam em parte esta redução. Esta degradação dos recursos humanos, no entanto, também está fortemente relacionada à importância e o papel que os últimos governos têm atribuído ao Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia e a visão que estes governos têm sobre o papel do Estado na promoção da C&T no Brasil.
A desvalorização da ciência, chegando às vezes a sua negação, a visão mercantilista/utilitarista, a prioridade aos processos de inovação sem compreender sua gênese têm levado aos constantes cortes dos recursos públicos para a ciência e tecnologia, a obsolescência de suas intuições, a redução e enfraquecimento de seu quadro de pessoal.
Para reverter este cenário é urgente a recomposição dos recursos para a ciência e tecnologia. É urgente que se entenda que ciência, tecnologia e inovação são fatores de desenvolvimento, de autonomia e soberania do país.
As instituições só são bem-sucedidas se trabalharem para atender às demandas nacionais, e elas não podem fazer isto com isonomia, dentro da legalidade, com impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência sem seus quadros qualificados e capacitados para fazer a gestão, o planejamento e criação de infraestrutura para C&T.