REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO Orientador: Prof. Marcos Bandeira de Oliveira Msc. Curso de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Fortaleza
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R E I N V E N TA R O E S PA Ç O U R B A N O
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MERCADO PÚBLICO DO BENFICA Morganna Batista de Figueirêdo Barbosa
FORTALEZA JUNHO / 2016
B333m
Batista de Figueiredo Barbosa, Morganna. Reinventar o espaço urbano: Mercado Público do Benfica / Morganna Batista de Figueiredo Barbosa. – 2016. 96 f. : il. color. Trabalho Final de Graduação – Universidade de Fortaleza, Centro de Ciências Tecnológicas, Curso de Arquitetura e Urbanismo, Fortaleza, 2016. Orientação: Prof. Me. Marcos Bandeira de Oliveira. 1. Arquitetura e Urbanismo. 2. Urbanidade. 3. Mercado Público. 4. Espaço Público. 5. Tradição. I. Título.
Morganna Batista de Figueirêdo Barbosa
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R E I N V E N TA R O E S PA Ç O U R B A N O
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MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
Banca examinadora
Prof. Marcos Bandeira de Oliveira Msc, (Orientador) Universidade de Fortaleza
Prof. Marcus Venícius P. de Lima Universidade de Fortaleza
Ricardo Muratori Arquiteto e urbanista convidado
FORTALEZA JUNHO / 2016
Figura 1 - Barraca de feira Fonte: acervo da autora, 2015.
“Las ciudades son libros que se leen con los pies.” Quintín Cabrera
“As cidades, como os sonhos, são construídas por desejos e medos, ainda que o fio condutor de seu discurso seja secreto, que as suas regras sejam absurdas, as suas perspectivas enganosas, e que todas as coisas escondam uma outra coisa.” Ítalo Calvino, em Cidades Invisíveis
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AGRADECIMENTOS Este trabalho foi construído por muitos corações em luta. Direta e indiretamente várias pessoas ajudaram a dar forma e conteúdo a este projeto e eu não poderia deixar de agradecê-las neste momento. A Deus, que permitiu que tudo isso fosse possível. Aos meus pais, pelo amor incondicional, por me ensinarem bons princípios e por aceitarem a escolha da minha profissão. Obrigada por tudo, em todos os sentidos que a palavra “tudo” consegue alcançar. A toda minha família, especialmente minhas tias Anaysa, Dilza, Ilza e Izaldite, obrigada pelo amor infinito, pelos ensinamentos e por estarem presentes em todos os momentos mais importantes de minha vida. A minha irmã Hysabela, por todos os embates, por sempre me fazer ver os vários lados das situações, por me fazer crescer. E a João, por ser o melhor cunhado. Pitaia, Mercado São Sebastião. Fonte: acervo da autora, 2015. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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A Cleber, minha graça e minha sorte, por me amar com todos os meus defeitos, pela cumplicidade e pela paciência infindável em me ajudar a ver o mundo de uma perspectiva mais bonita, por todo o amor e por todos os caminhos já caminhados e voos já alçados. A Manu, minha segunda irmã, quem leva comigo as dores e alegrias dessa vida, por todo o amor que quinze anos de amizade podem permitir e por termos tido a sorte de reencontrarmos, finalmente, uma a outra. A Thicianne, por ter permanecido em minha vida, por compreender nossas diferenças e me deixar aprender com nossa amizade, pelo amor em forma de silêncios e, finalmente, por orientar meu pensamento no momento mais difícil, angustiante e ansioso do último mês. A Irlena, Amanda, Luana e Marianna, por, cada vez mais, afirmarem em minha vida a importância de ter boas pessoas me acompanhando. Obrigada por aguentarem minhas eternas dúvidas e aflições humanas e por todo o amor trocado em todos esses anos de amizade. Ao Luis Carlos, por ser o irmão que nunca tive, pela permanência nessa estrada junto comigo. A Diana Valentina, Raphael, Lucas, Renan e Júnior, pelas boas conversas, pela amizade e companheirismo . A Wynie e Manoella, por me mostrarem a alegria vinda dos lugares mais inesperados, por fazerem de Madrid a memória mais presente, por nossa amizade perdurar até hoje. Aos meus amigos de intercâmbio, que descobriram os sabores e dissabores de sermos nós mesmos em uma terra estrangeira. A Ludmylla e Mana, obrigada por contribuirem, mesmo de longe, com esse trabalho e por nossa amizade ter ido além das fronteiras “madrileñas”. A todos os amigos e colegas de curso que esses seis anos de graduação me trouxeram, especialmente a Larissa Pacheco, Talita, Camilli, Leonardo, Ingred, Dani, Aline, por fazerem dessa jornada mais leve e mais divertida. Obrigada por aguentarem meu riso frouxo e pela presença constante a cada semestre. As queridas Valesca, Lora, Karol, Ariane e Laíde, por surgirem em minha vida acadêmica quando mais precisava, pelos risos, conversas e horas de estudo, pelo incentivo e suporte constante nos últimos meses e por acreditarem que tudo isso seria possível se caminhássemos juntas. As lembranças são as melhores.
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A todos os professores que contribuíram de forma contundente no meu aprendizado, especialmente a Fernanda Rocha por me mostrar o universo encantador que é o paisagismo e a Camila Aldigueri e Mário Roque que me inspiraram e me ensinaram a ver a cidade com olhares mais profundos e a ver a arquitetura como um instrumento de mudança. Agradeço imensamente ao meu orientador Marcos Bandeira, eu não poderia ter tido melhor orientador. Obrigada pela compreensão e apoio, principalmente no semestre da pesquisa, e obrigada, ainda mais, pelo entusiasmo ao acreditar em mim e pelo incentivo a usar meus desenhos neste trabalho. Por fim, à banca examinadora, por aceitar o convite e se dispor a contribuir na discussão deste projeto. Muito obrigada!
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SUMÁRIO capítulo 1
Introdução
P. 15
Resumo / Escolha do tema / Justificativa / Objetivos / Metodologia
capítulo 2
Referencial Teórico
P. 21
Mercados Públicos / Espaços Públicos / O Benfica / Estudos de caso
capítulo 3
Projetos de Referência
P. 43
Mercado de Santa Caterina / Mercado Municipal de Ataranzas
capítulo 4
P. 43
Diagnóstico
O Terreno e suas condicionantes / Legislação Urbana
capítulo 5
O mercado
Programa de necessidades / Relação Atividades x Espaços / Conceito / Implantação e paisagismo / Diretrizes paisagísticas / Estudo de fachadas / Partido estrutural / Coberta de colmeias / Área de feira livre / Distribuição interna de espaços / Conforto Ambiental
capítulo 6
Considerações Finais
P. 57
P. 89
Considerações Finais / Referências Bibliográficas
Pimentões em cores, Mercado São Sebastião. Fonte: a autora, 2015. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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capítulo 1
Introdução
RESUMO
O trabalho final de graduação em questão consiste no desenvolvimento de um projeto arquitetônico de um Mercado Público localizado no Bairro do Benfica, em Fortaleza, Ceará. Fundamenta-se em estudos a respeito do equipamento público de Mercado atrelado ao bom funcionamento do espaço urbano. Busca-se a concepção arquitetônica do Mercado a partir do entorno existente, considerando fatores sociais, urbanísticos, paisagísticos, tecnológicos e projetuais. O produto final é um equipamento público que promova as relações urbanas e socioculturais do bairro, inserido a partir do comércio, cultura e tradições locais. Palavras chave: espaço público, mercado público, urbanidade, tradição.
Utilidades, Mercado São Sebastião. Fonte: a autora, 2015. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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ESCOLHA DO TEMA O mercado público assume um papel significativo no impulsionamento da urbanidade em cidades modernas. É um equipamento democrático, um cenário onde se misturam, em um mesmo espaço, tradição, comércio e relações humanas. Com a escassez de urbanidade nas cidades modernas, a escolha do tema contempla a necessidade de se buscar espaços públicos mais saudáveis através de um equipamento urbano que promova o convívio social. A partir daí, gerar espaços que possibilitem encontros, trocas de ideias, fortalecimento da tradição local e sensação de pertencimento, buscando, finalmente, alcançar o ideal de que cidades são feitas para pessoas.
JUSTIFICATIVA A proposta de um mercado público para o bairro do Benfica parte da escassez desse tipo de equipamento na cidade de Fortaleza e da escassez de espaços públicos que incentivem a vida urbana local. O Mercado Público surgiu com as primeiras civilizações e, ao longo da história, foi se consolidando como um espaço econômico, político e social dentro da cidade. Desde as primitivas trocas de excedentes, passando pelos bazares árabes e evoluindo sua forma até chegar aos dias atuais, o equipamento de mercado se mostra como um espaço democrático. Diferentemente de seu concorrente, o supermercado, que surge no século XX globalizando relações e distanciando o consumidor da tradição local. Independentemente de posições e classes sociais, o mercado público é acessível a toda a população e é nesse espaço onde acontecem diversas formas de interação sociocultural de uma sociedade. Quando inserido no tecido urbano respeitando os fatores urbanísticos e sociais existentes, o mercado pode agir além de suas características primárias e passar a ser um equipamento de articulação dentro do bairro. Diversas funções podem ser
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atribuídas a ele, inclusive a de potencializador de urbanidades e legitimador de coletividades. O bairro do Benfica, apesar de ser um dos poucos bairros em Fortaleza que ainda possui uma urbanidade em suas ruas, apresenta poucos espaços públicos que valorizem a vida urbana e as relações culturais e sociais ainda existentes. Dessa forma, o tema proposto vem da intenção de que Fortaleza valorize cada vez mais as pessoas que nela vivem, e que estas se sintam mais próximas a cidade que habitam, uma permanente troca de pertencimento e de valores urbanos e socioculturais. O Mercado Público vem catalisar todas essas intenções a partir da proposta de não ser apenas um equipamento pontual, inserindo-se no tecido urbano de forma que reconheça seu entorno, sua história e se consolide como um espaço público de excelência.
Figura 02 - Painel ilustrativo de supermercado x mercado. Fonte: a autora.
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OBJETIVOS OBJETIVO GERAL Propor um Projeto de Mercado Público para o Bairro do Benfica onde a arquitetura se harmonize com a história e tradição local.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS Compreender como os mercados podem se inserir como equipamento público e como instrumento de transformação do espaço urbano. Analisar as feiras-livres existentes na cidade de Fortaleza e no bairro do Benfica, em congruência com a história e dinâmica atual do local. Investigar o equipamento de Mercado: forma, funcionamento e abastecimento. Propor um projeto arquitetônico que se adeque às necessidades do bairro e de sua população, ao mesmo tempo que se interligue ao entorno e proporcione um espaço público democrático. Projetar um edifício com escala adequada à função proposta, atendendo a princípios de conforto ambiental e sendo esteticamente agradável. Criar espaços que proporcionem boas compras e fortaleçam a tradição local através do comércio e da vida cotidiana gerada nesses ambientes. Criar áreas verdes e sombreadas em seu entorno que deem mais qualidade de vida aos usuários e transeuntes, ao mesmo tempo que propiciem o comércio informal da feira-livre.
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METODOLOGIA A metodologia deste trabalho se divide em três partes: A primeira etapa é o Referencial Teórico, que consiste na revisão bibliográfica e coleta de dados primários de campo. São abordados os temas gerais deste trabalho: o mercado público, os espaços públicos e o bairro do Benfica. A segunda etapa é o Diagnóstico, onde, a partir da compreensão do que se busca alcançar, define-se o espaço a ser trabalhado e elabora-se um diagnóstico sobre o mesmo. Busca-se ter uma base de dados consistente dos problemas, potencialidades e características intrísecas do local, que possa auxiliar na elaboração do projeto. A terceira e última etapa é o Projeto Arquitetônico, quando se procura reunir aquilo que foi estudado no Referencial Teórico e analisado no Diagnóstico em uma proposta arquitetônica que alcance os objetivos pretendidos. O produto final é o Mercado Público do Benfica, exposto através de diagramas e desenhos.
Figura 03 - Diagrama de metodologia. Fonte: a autora.
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capítulo 2
Referencial Teórico
MERCADOS PÚBLICOS Origem e evolução Segundo Oliveira Júnior (2006), o surgimento da agricultura, no Período Neolítico, permitiu ao homem aprofundar conhecimentos e técnicas acerca do cultivo de plantas e criação de animais. No princípio, a produção era destinada apenas para subsistência. A partir da evolução de tecnologias, foi possível produzir com excedentes, que logo passaram a ser utilizados como moeda de troca para aquisição de diversos bens. Surgia, assim, o comércio em sua forma mais rudimentar. Ainda de acordo com o autor, a partir do surgimento e crescimento das cidades e, impulsionada pela facilidade de deslocamento entre elas, essa troca foi se intensificando. Essa atividade, abrigada no espaço urbano e caracterizada, entre outras coisas, pela troca de elementos vindos de diversos lugares, nesse momento, passou a ser denominada de mercado. O mercado surge como regulador das trocas locais.
Pai em compras, Mercado São Sebastião. Fonte: a autora, 2015. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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De uma forma ou de outra, muitas civilizações antigas tiveram essa atividade acontecendo em suas cidades. O mercado do Oriente Médio, por exemplo, privilegiado pela localização entre dois continentes, reproduzia-se em torno de Meca e Medina através de bazares, rotas marítimas e terrestres, configurando-se em um importante centro de comércio mundial. O Bazaar, que conforme Vargas (2001), significa “mercadoria” na língua árabe, passou a denominar o local onde essas mercadorias eram expostas à venda. Era o lugar onde diferentes classes sociais podiam conviver em harmonia e onde as opiniões eram difundidas, tornando-se parte fundamental da sociedade e cultura islâmica. Na Grécia Antiga, inicialmente, o mercado acontecia próximo à Acrópole. Com o crescimento da população, um novo lugar foi destinado para que o comércio pudesse ocorrer: a Ágora. A partir desse momento, a Acrópole adquire um caráter religioso e estratégico e a Ágora se estabelece como um lugar de encontros cívicos e de comércio varejista. Ainda segundo Vargas (2001), durante o Império Romano, o comércio não foi preponderante para sua expansão geográfica como ocorrera na Grécia Antiga. Logo, a civilização romana procurou se fortalecer militar e politicamente, através da ocupação de novos territórios e da fundação de cidades a fim de consolidar suas conquistas.
Figura 04 - Planta baixa do Fórum de Trajano. Fonte: Cuaderno de imágenes, História de La Arquitectura I, CEU San Pablo, 2013.
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O comércio nessas novas cidades era realizado dentro de Fóruns, edifícios monumentais, idealizados pelos imperadores romanos que combinavam atividades comerciais, religiosas e políticas. De acordo com Pintaudi (2006), a partir de 113 d.C. começou a funcionar o mercado do fórum de Trajano (Fig. 04) na cidade de Roma, centro do império com aproximadamente um milhão de habitantes. A partir do séc. IV d.C., gradativamente, acontece a queda do Império Romano do Ocidente, iniciando-se na Europa o período conhecido por Idade Média, caracterizado, entre outras coisas, por uma fraca vida comercial. Nessa época, segundo Vargas (2001), as grandes rotas marítimas internacionais no Mediterrâneo Europeu adquiririam características locais, os bens importados se tornaram cada vez mais raros e predominou o comércio de artigos comuns. Sobre o espaço ocupado por essa atividade, Oliveira Júnior (2006) nos informa que o mercado na Idade Média ocorria predominantemente em vias importantes, próximo às muralhas da cidade. Após sua consolidação, eles foram se estabelecendo cada vez mais em áreas centrais, mais acessíveis a seus habitantes. Dessa forma, cidade medieval e mercado acabaram por se tornar intrinsecamente ligados um ao outro. Ainda sobre isso, Vargas (2001) aponta que esse mercado também ocorria nas praças e em alguns espaços livres cercados por ruas desordenadas e uma vida caótica. A praça medieval (Fig. 05) além de abrigar o mercado, era o palco de espetáculos, festas e constante circulação de ideias e notícias. Coexistiam as funções cívica, religiosa e comercial em um único lugar. Pode-se notar pelas informações expostas até aqui que o mercado, desde seu início, marcou civilizações não apenas por abrigar atividades comerciais, mas por ser um espaço urbano com um elevado potencial sociocultural.
Figura 05 - Praça medieval. Fonte: Vargas, 2001.
Ainda conforme a autora supracitada, no período posterior, entre os séculos XI e XIII, as Cruzadas foram responsáveis pelo ressurgimento do comércio na Europa, abrindo o Mar Mediterrâneo aos mercadores europeus e reestabelecendo relações entre o Oriente e o Ocidente. Novas e intensas rotas surgiram e, nos pontos de confluência entre elas, aconteciam grandes feiras nas quais se podia comprar e vender mercadorias vindas de diferentes partes do mundo. Esse movimento viria a caracterizar o comércio durante o período do Renascimento, já no séc. XIV.
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A volta da expansão do comércio permitiu a formação de vilas e cidades, também chamadas de burgos, e o espaço de comercialização foi evoluindo ao longo do crescimento e necessidade da população. Como acontecia desde a Antiguidade, a atividade de troca nos burgos também ocorria em lugares não exclusivamente comerciais, mas que abrigavam diversas outras atividades sociais e urbanas. Surge o espaço público de Mercado propriamente dito. Vargas (2001) afirma que no final do século XVIII, o contexto socioeconômico promoveu diversas mudanças no comércio. Nessa época, as feiras e praças de mercado começam a perder a função de encontro e de compra na medida em que o mercado ao ar livre passa a concorrer com estabelecimentos privados, promovidos pela nova classe social emergente: a dos comerciantes. Consequentemente, os mercados passaram a se especializar em produtos básicos alimentícios, fundamentais para o abastecimento da população, além de ganharem novas formas, com grandes espaços cobertos e edificação própria. A partir do século XIX, o poder público passa a se preocupar com a higiene e melhoria desses espaços, pois eram os mercados os responsáveis pelo abastecimento alimentício da população. Em toda a Europa, principalmente na França, diversos mercados foram edificados. A mudança do tipo de espaço ocupado pelo mercado não foi um obstáculo para que em seu interior e no seu entorno as mesmas relações comerciais e sociais continuassem a se desenvolver. Desde o surgimento dos primeiros vilarejos até as cidades contemporâneas é possível perceber que o espaço público de mercado esteve presente nas civilizações como um ambiente relevante no espaço urbano. Mesmo quando o mercado se especializa em produtos alimentícios, ele continua a estabelecer uma relação de tradição com seu povo, incentivando, de diversas formas, as relações socioculturais e urbanas.
Forma e funcionamento O Mercado tomou forma edificada apenas no século XIX, porém, muito antes disso, a maneira como as relações mercantis se davam no espaço urbano conseguiu expressar os costumes, a arquitetura e o modo de vida de diversas sociedades em diferentes épocas. 24
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Figura 06 - Ágora de Priene. Fonte: Biblioteca da Universidade de Washington.
Figura 07 - Planta baixa e perspectiva do Mercado de Trajano, Roma. Fonte: Cuaderno de Imágenes, História de la Arquitectura I, 2013.
Segundo Vargas (2001), o bazaar, espaço público predominantemente comercial nas cidades islâmicas, tinha entre suas características uma atmosfera sensorial, em que os sentidos do corpo eram aguçados através de distintos odores, cores e sons. Conformava-se como ruas estreitas repletas de lojas abrindo-se para a via. No térreo se localizava a atividade de venda de produtos e nos pavimentos acima, instalavam-se os depósitos e escritórios. Os toldos de proteção compunham a arquitetura orgânica desses lugares. A Ágora, na Grécia Antiga, ainda de acordo com Vargas (2001), surge como um espaço plano com funções comerciais e de encontro público, adotando gradualmente a condição de espaço cercado por edifícios. Inicialmente com uma forma irregular, a Ágora muitas vezes era isolada do entorno urbano devido aos edifícios monumentais que a rodeavam. Foi apenas no século V a.C. que o espaço ganhou um traçado retangular, evoluindo mais tarde para a forma em U (Fig. 06) rodeada de colunatas e lojas em três de seus lados, tornando-se mais permeável ao entorno. No Império Romano, como dito anteriormente, o comércio acontecia em edifícios monumentais, os Fóruns. Segundo Romano (2004), é o
Fórum de Trajano (Fig. 04), projetado pelo arquiteto e engenheiro Apollodorus de Damasco, um dos mais conhecidos desses edifícios. O Mercado se instalava dentro do Fórum e possuía uma planta circular (Fig. 07) que se adaptava ao terreno inclinado através de seis níveis interligados por escadas laterais. Os três primeiros pavimentos eram usados para a venda de produtos alimentícios e os três pavimentos seguintes compunham o grande salão de lojas que dava acesso à rua. Ainda de acordo com a autora, o arquiteto fez uso do mármore branco na ornamentação, arcos, salas abobadadas e pela primeira vez utiliza o tijolo em larga escala de uma forma singular: dividiu-se o tijolo diagonalmente no meio e adicionou-se uma espécie de cimento entre eles. Já na Idade Média, como afirma Vargas (2001), as praças de mercado eram espaços abertos e essencialmente públicos. Desenvolviam-se próximo a edifícios que traziam fluxo de pessoas, como igrejas e edifícios municipais. Dessa forma, tinham seu acesso facilitado, servindo às necessidades diárias dos que ali habitavam. Quando no séc. XIX ocorreu o processo de industrialização e os mercados tornaram-se responsáveis majoritariamente pela venda de produtos alimentícios, começaram a surgir grandes mercados na França e na
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Inglaterra, como o St. Martin e o Convent Gaarden, respectivamente. No início do século XX, no ano de 1930, o ferro se tornou um dos principais materiais construtivos na arquitetura de mercados. Essa técnica construtiva, segundo Silva (1987), encontrou sua principal referência no Mercado Central de Paris a partir de sua construção em 1851. Les Halles, como também era conhecido, foi projetado por Vitor Baltard, o arquiteto fez uso do ferro e do vidro como elementos construtivos essenciais, evidenciando a força do uso desses elementos na época. O arquiteto conseguiu inserir leveza na estrutura que possibilitou vãos generosos e, através do vidro, permitiu espaços visualmente abertos e iluminados. A estrutura modulada viabilizava a difusão desse modelo em dimensões variáveis, adaptáveis às necessidades de cada cidade que desejasse ser tão moderna quanto Paris.
Figura 08 - Les Halles, por Victor Baltard, Paris, 1853. Fonte: Biblioteca do Congresso Americano.
Parece indiscutível que Les Halles (Fig.08 e 09) foi um marco na história arquitetônica dos mercados públicos, uma vez que, a partir de sua construção, muitos outros mercados (de ferro ou alvenaria) surgiram na Europa e na América Latina, inclusive no Brasil. Disseminaram-se, então, estudos e conceitos a respeito da forma, composição e funcionamento desses espaços comerciais. Pode-se afirmar, baseado nas informações obtidas até aqui, que o projeto arquitetônico de um mercado público precisa tanto incentivar a compra quanto possibilitar que as relações sociais aconteçam. Além disso, deve-se obedecer a alguns conceitos projetuais básicos para permitir seu pleno funcionamento.
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Figura 09 – Planta baixa de Les halles, por Victor Baltard, Paris, 1853. Fonte: Biblioteca do Congresso Americano.
De acordo com Oliveira Júnior (2006), a composição básica de um mercado inclui a área de comercialização e as áreas de apoio, contendo administração, carga e descarga, sanitários, etc. As dimensões de cada espaço convêm com a necessidade da população a que o equipamento pretende atender.
Figura 10 – Detalhes da estrutura metálica do Les Halles, por Victor Baltard, Paris, 1853. Fonte: Biblioteca do Congresso Americano.
Independentemente de sua tipologia, um elemento fundamental para o bom funcionamento do Mercado Público é a acessibilidade, fazendo com que as circulações alcancem todos os ambientes de forma fluida. Devem-se evitar, portanto, os cruzamentos entre o acesso de serviço e o de comércio. Ainda de acordo com o autor, os materiais a serem utilizados devem ter durabilidade e resistência à abrasão, além dos revestimentos que precisam ser de manutenção fácil. A estrutura necessita viabilizar grandes vãos e permitir aproveitamento da ventilação e luz natural. Dessa forma, pode-se observar que, ao longo da história, o mercado público evoluiu de uma forma improvisada e orgânica até se tornar um espaço coberto, planejado e mercadológico, pronto para atender às demandas de abastecimento, adaptando-se conforme as necessidades do comércio e da sociedade de cada tempo.
Mercados Públicos e feiras livres no Brasil Segundo Mott (2000, apud OLIVEIRA JÚNIOR, 2006), os mercados públicos foram introduzidos no Brasil pelos colonizadores portugueses, aos moldes dos que aconteciam na Europa. Eles eram implantados em grandes centros urbanos e geralmente cercados por feiras. No Rio de Janeiro, por exemplo, o abastecimento acontecia desde o período colonial, na informalidade, em ruas e praças públicas. Apenas no ano de 1904 o então prefeito do Rio de Janeiro, Pereira Passos, reconheceu oficialmente as feiras-livres. De acordo com Oliveira Júnior (2006), Pereira Passos promoveu ainda inúmeras ações remodeladoras no Rio de Janeiro que redefiniram a paisagem da cidade. Entre elas, a exclusão das quitandas populares que aconteciam no centro e, em seguida, a promoção de
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inúmeros mercados públicos que seriam explorados pela iniciativa privada. Essa reforma chegou a outras grandes cidades brasileiras, supostamente atendendo a parâmetros de ordem e higiene europeus. Conforme Romano (2004), o Mercado da Candelária foi o primeiro mercado instalado no Brasil. Inaugurado em 1841 no Rio de Janeiro, compreendia uma área de 5.187 m², construído em alvenaria de tijolos e composto por uma planta regular e um pátio central. Foi destruído pelo fogo em 1899. Após a construção de Les Halles, no séc. XIX, diversos países do mundo começaram a importar edifícios pré-fabricados de ferro. O Brasil teve seu primeiro exemplar no ano de 1875 na cidade do Recife, com o Mercado São José (Fig. 11).
Figura 11 – Cartão Postal do Mercado São José. Fonte: Blog Modulação.
Figura 12 – Mercado da Carne, Belém, Pará. Fonte: a autora, 2015.
Seguindo a tendência mundial, depois do Mercado São José outros mercados de ferro foram instalados em diversas cidades brasileiras ,como o Mercado São João em São Paulo (1890), o Mercado da Carne em Belém do Pará (1867-1908), Mercado Municipal de Manaus (1883-1910), Mercado Municipal de Fortaleza (1897), entre outros. De acordo com Silva (1987 apud Romano, 2004), tais mercados procederam de lugares distintos, sendo seu tipo de vedação a única característica que sugere uma classificação: alguns mercados são fechados e outros são abertos. Ainda segundo Romano (2004), mercados em alvenaria também foram construídos no Brasil, como o Mercado Modelo em Salvador e
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o Mercado Municipal de São Paulo. Este último, recentemente reformado, tornou-se um ponto turístico importante da cidade. Silva (1987 apud OLIVEIRA JÚNIOR, 2001), afirma que o apogeu dos Mercados Públicos no Brasil aconteceu no séc. XX. No entanto, a partir do momento em que o sistema varejista toma novas formas com o surgimento do autosserviço, através dos supermercados, os mercados entram em decadência e estes equipamentos, passando a sofrer com a falta de interesse público desde então. Segundo Pintaudi (2006), quando ocorre essa ruptura na forma de comprar, o mercado, ainda presente na paisagem urbana, busca se apegar à imagem de tradição. Desse modo, o ato de comprar coisas originárias de onde se habita aproxima o comprador e impulsiona o sentimento de pertencimento e identificação com o local onde que se vive. A partir das informações expostas até aqui, constata-se que as feiras-livres e mercados brasileiros, assim como na Europa, também foram importantes, pois conseguiram gerar espaços urbanos que agregavam funções de compra e venda às do encontro e da troca de ideias. Nesse sentido, pode-se dizer que os mercados viabilizaram, entre outras coisas, a existência de núcleos de urbanidade, agregando valores comerciais, culturais e sociais em um único lugar.
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ESPAÇOS PÚBLICOS Como o espaço público dialoga com a cidade Definir o que é espaço público é algo complexo. Para efeito desse estudo adotaremos duas definições, de distintos autores, escolhidos por estudarem o espaço público como um elemento intrínseco a formação da cidade e da cidadania. Para Carrión (2005), espaço público é o cenário do conflito social, podendo ter diferentes funções, variáveis conforme a conjuntura e a cidade em que se encontra. Já para Borja (2000), o espaço público pode ter uma dimensão jurídica, separando aquilo que é privado do que é público ,e uma dimensão sociocultural, onde ocorrem distintas relações humanas e onde a comunidade se expressa. Diante disso pode-se dizer que o espaço público é, antes de tudo, inesgotável, pois é nele que se podem presenciar e sentir as transformações urbanas, sociais e culturais que acontecem em determinada cidade. Conforme Borja (2000), o espaço público não é o espaço residual entre os edifícios e o sistema viário, e sim um espaço que é capaz de ordenar a cidaOlhares, Mercado do Ver-o-peso, Belém do Pará Fonte: a autora, abril de 2015. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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de, independentemente da escala do projeto urbano. Pode abrigar, inclusive, diversos usos e funções e, ainda, ordenar um bairro, articular uma cidade ou estruturar uma região. De acordo com A Fundação “Project for Public Spaces” , para reconhecer um bom espaço público é necessário analisar quatro características fundamentais: a sociabilidade, a acessibilidade, o conforto e seus usos. Tais características irão gerar aspectos qualitativos ou intuitivos e, em seguida, aspectos quantitativos. Para isso, a Fundação gerou um diagrama (Fig. 13) o qual permite que qualquer pessoa possa identificar se um lugar é bem-sucedido ou não. Segundo Borja (2000), tudo aquilo que é construído na cidade, como centros comerciais, escolas, vias ou equipamentos culturais, é suscetível a tratamento urbanístico que priorize os espaços de uso coletivo. Nesse sentido, cabe ao poder público respeitar, incentivar e fortalecer o uso desses espaços como direito intrínseco de seus habitantes. atributo s chave intangíveis calculável
Figura 13 – Diagrama “O que faz um bom lugar?” Fonte: Project for Public Spaces, tradução livre da autora.
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A partir das reflexões expostas, observa-se que o espaço público dialoga com a cidade e permeia as contínuas transformações políticas e sociais do meio urbano. Este fator permite entendê-lo como um potencializador de urbanidade e um instrumento de mudanças sociais e urbanas dentro da cidade.
O mercado como catalizador do espaço público Equipamentos urbanos, segundo a Lei Federal nº 6.766/79, são bens públicos ou privados destinados ao uso público para prestação de serviços necessários ao funcionamento da cidade. Nesse contexto, observamos que o mercado apresenta características de equipamento urbano, pois atende à demanda de abastecimento de produtos de um bairro, de uma cidade ou de uma região. Além dessa destinação fundamental, quando bem inserido no meio urbano, o mercado pode vir a ofertar outras funções, levando em consideração todas as características intrínsecas a ele estudadas até aqui, como o convívio social, o fortalecimento de tradições e a legitimação de coletividades. Como já mencionado neste trabalho, o mercado público no Brasil teve seu apogeu no início do século XX, entrando em decadência em seguida. Diversos fatores colaboraram para seu declínio, entre eles, como nos recorda Torres (2011), a implantação do sistema de autosserviço, surgido no país na década de 1950, na esteira do processo de industrialização. Para Rennó (2003, apud TORRES 2011), as novas formas de consumo introduziram uma inversão de valores: o comércio deixou de acontecer como encontro e passou a ocorrer com finalidade exclusiva de aquisição de produtos, tornando o varejo uma indústria do consumo. Contra essa tendência, Bassols e Bañales (2013), citam como exemplo as intervenções ocorridas nos mercados espanhóis na década de 1980. As principais cidades da Espanha apostaram na construção de novos mercados para revitalizar o “urbanismo comercial”. Em Madrid, por exemplo, foi elaborado um plano de mercados, que objetivava aumentar o número de mercados da capital de 10 para 26 edifícios em distintos bairros. Em Barcelona, em 1986, foi aprovado
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um plano que combinava o resgate dos mercados como ferramenta de abastecimento e como equipamento urbano, evidenciando o comércio local. Para os autores, essas ações permitiram olhar a cidade a partir do bairro antes do plano geral e de reivindicar o espaço público. Nesse âmbito, seria importante reconhecer os sinais de identidade coletiva e atuar de acordo com as morfologias urbanas existentes e seus respectivos usos. Afirmam ainda, que o comércio “cara a cara” do mercado pode oferecer experiências mais autênticas, propiciar um vínculo com o passado, oferecer novos hábitos e novas formas de multiculturalidade urbana. A Fundação “Project for Public Spaces” afirma que os Mercados Públicos podem trazer inúmeros benefícios, entre eles, a conexão das economias rural e urbana, melhorar a saúde pública e reunir diversos tipos de pessoas (Fig. 14). Obviamente, o mercado precisa estar inserido em um espaço urbano adequado as suas necessidades. Segundo Silva (2012), os espaços urbanos mais reconhecidos e apropriados pela população são aqueles que fazem parte do consciente coletivo, consolidando a identidade de determinado núcleo de pessoas. Eles ainda podem trazer consequências diretas na competitividade econômica da zona, na cidadania e qualidade de vida da comunidade em que se insere. Nesse contexto, fica clara a relação entre cidade e mercado, tanto ao longo da historia, como já visto, quanto na contemporaneidade, como veremos posteriormente nos projetos de referência. Do exposto, é possível observar que o mercado e o espaço público podem e devem se complementar. Ambos, quando bem inseridos no tecido urbano conseguem influenciar positivamente o bairro ou a cidade em que se encontra, combinando comércio, tradição e cultura. Dessa forma, acredita-se que o mercado é um equipamento público com potencialidades suficientes para estimular e intensificar as relações sociais, econômicas e urbanísticas em espaços abertos de uso coletivo na cidade contemporânea.
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Figura 14 – Benefícios do Mercado Público, 2015. Fonte: Project for Public Spaces, tradução livre da autora.
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O BAIRRO BENFICA O Benfica é um dos bairros mais icônicos de Fortaleza. De acordo com matéria publicada na Revista Universitária da Universidade Federal do Ceará (2008), historicamente a origem do Benfica está relacionada à expansão da cidade a partir do centro, constituindo-se como bairro por volta dos anos 1930. Ao logo das décadas, o bairro sofreu inúmeras transformações, passando de bucólico e rural até chegar aos dias atuais, com vida agitada, trânsito intenso e perfil boêmio. Ainda de acordo com a Revista Universitária (2008), o processo de urbanização do bairro teve grande crescimento no século XX quando o banqueiro José Gentil, recém-chegado de Sobral, comprou a chácara da família Garcia, com a intenção de fixar-se “fora” da cidade – até então basicamente a região do Centro. Renomeando a propriedade como Chácara Gentil, construiu imóveis imponentes, como seu Palacete (antiga sede da chácara, atualmente Reitoria da Universidade Federal do Ceará), além de casas erguidas para familiares e para aluguel. Com a prosperidade de Gentil, logo sua Chácara se destacou entre as diversas propriedades que havia na reBenfica sobreposta, Fortaleza. Fonte: a autora, 2015. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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gião, então pacata e de ruas de terra. João Gentil loteou terrenos, abriu caminhos e incentivou a formação de todo um bairro em torno de sua residência. Configurou-se assim a região conhecida como Gentilândia, um reduto da família Gentil dentro do Benfica. Em 1955, com o bairro já razoavelmente organizado, a recém-criada Universidade Federal do Ceará comprou os imóveis da Família Gentil para sediar seu Campus universitário, fator que colaborou para a preservação de alguns casarões antigos. Pereira (2009) afirma que a chegada da Universidade consolidou o bairro como referência cultural em Fortaleza. Ao longo do tempo o Benfica foi se transformando radicalmente. Com o surgimento de novas ruas e vilas, as zonas residenciais foram crescendo e trazendo novos moradores. Hoje, o Benfica ainda preserva algumas características fortalecidas ao longo dos anos, como a boemia, o esporte (sediando o Estádio Presidente Vargas), as folias dos pré-carnavais e os movimentos culturais e de resistência.
Figura 15 – Reitora da Universidade Federal do Ceará, 2015. Fonte: acervo da autora. Figura 16 – Estádio Presidente Vargas, 2015. Fonte: acervo da autora.
Oficialmente, Benfica e Gentilândia são considerados dois bairros distintos, ainda que, na prática, ambos se complementem. Por conta disso, nesta análise foi considerada a junção dos dois bairros, já que não existem diferenças históricas, políticas ou sociais que os separem. Para a Prefeitura de Fortaleza, administrativamente o Benfica está inserido na Regional IV e faz limites com os seguintes bairros: Centro, José Bonifácio, Fátima, Jardim América, Damas, Rodolfo Teófilo e Farias Brito. As vias que delimitam o bairro são a Av. Eduardo Girão, Av. dos Expedicionários, Rua Senador Pompeu, Rua Antônio Pompeu, Av. Carapinima, Rua Senador Catunda, Rua dos Pracinhas, Rua José Jatahy e Av. José Bastos. Possui, ainda, dois eixos importantes: a Avenida da Universidade e a Avenida 13 de Maio, cortando o bairro no sentido norte-sul e leste-oeste, respectivamente. 38
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Figura 17 – Mapa do Bairro Benfica. Fonte: autora.
O Benfica foi afetado pelos mesmos problemas que a cidade de Fortaleza historicamente enfrentou, como o crescimento desordenado e a violência. De acordo com Soares (2014), atualmente o bairro apresenta inúmeros problemas, principalmente aqueles causados pelo aumento do fluxo de carros que, entre outras coisas, vem causando congestionamentos, inclusive em vias locais. Outro problema é a substituição de moradias por comércios e serviços, fator que acaba, muitas vezes, descaracterizando alguns edifícios historicamente importantes, mesmo que tombados ou em processo de tombamento. Abastecido por vários modais de transporte, como o ônibus, o metrô e recentemente a bicicleta, o Benfica conta com uma urbanidade pouco presente em outros bairros de Fortaleza. Seus espaços públicos, ainda que escassos, são palco de manifestações e de encontro. Suas praças, seu comércio de rua e a interação de diferentes tipos sociais reforçam as relações urbanas existentes no bairro.
A feira livre da Gentilândia O autosserviço, descrito por Torres (2011), atingiu o Brasil de forma consistente no século XX e em Fortaleza, não foi diferente. As
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grandes redes de supermercados instalaram suas filiais em muitos bairros da capital, oferecendo diversidade de produtos, preços baixos e conforto ao cliente. Os mercados e feiras-livres, por sua vez, entraram em declínio. Atualmente, apenas três mercados resistem em Fortaleza: Mercado São Sebastião, Mercado dos Pinhões e Mercado da Aerolândia, recentemente reformado. As feiras-livres (Fig.18), ao contrário dos mercados, conseguem atingir um território maior na capital. Observa-se que elas estão mais presentes em bairros periféricos, tais como Passaré, Pirambu e Conjunto Ceará. Nota-se também que quanto mais o sistema de autosserviço adentra em um bairro, maior a tendência das feiras-livres desaparecerem.
Figura 18 – Mapa das feiras livres de Fortaleza. Fonte: Google Earth adaptado pela autora.
Uma das feiras-livres mais tradicionais é a Feira da Gentilândia, que acontece na Praça João Gentil (Fig.19), aos sábados pela manhã durando até meio dia do domingo. De acordo com Barroso (2004), a feira ocorre desde os anos 1950 e conta com a organização da Prefeitura. Antigamente, a organização espacial da feira se dava da seguinte forma: no centro do terreno ficavam os vendedores de carnes, ao lado da Vila Santo Antônio ficavam as barracas de aves, os de frutas e os de verduras e, por fim, mais próximas ao Estádio Presidente Vargas, ficavam as cozinhas que comercializavam comidas típicas, como o baião de dois e a panelada. Hoje em dia, poucas barracas compõem as feiras e, espacialmente, alinham-se em filas. Ainda segundo Barroso (2004), a feira livre da Gentilândia não representa “nem um décimo do que era naqueles saudosos tempos”. Além disso, é importante frisar que durante as reformas na Praça
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Figura 19 – Praças José Gentil e João Gentil no bairro Benfica, 2015.Fonte: Google Earth adaptado pela autora.
João Gentil, realizadas pela Prefeitura ao longo dos anos, a feira se deslocava provisoriamente para o terreno próximo à CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento), entre a Rua Marechal Deodoro e a Rua Jorge Dumar. Após estas reformas, a feira voltou a funcionar com regras de conservação e limpeza da praça, conforme exigências da Associação Beneficente, Cultural e Esportiva dos Amigos e Moradores da Gentilândia, responsável pela administração da praça até então. Há alguns anos, a Praça José Gentil abriga ainda barracas de comidas típicas que funcionam diariamente, no período da noite. Estudantes e moradores frequentam o local assiduamente, o que faz com que a vida noturna do Benfica se fortaleça e seu perfil boêmio se mantenha. A feira livre da Gentilândia abastece, até os dias atuais, os moradores do Benfica e de bairros adjacentes, atendendo a uma demanda mais tradicional de pessoas que preferem comprar perto de casa a ir ao supermercado. Esse público consegue, entre outras coisas, manter o comércio local e de seu entorno aquecido. Uma prova disso é a permanência de bares e restaurantes ao redor da praça, onde se pode observar considerável movimento de clientes diariamente. Dentro das características urbanas do Bairro Benfica, a feira livre da Gentilândia sobrevive aos tempos modernos em sua forma mais tradicional, no compasso de sua heterogeneidade característica, que se manifesta de várias formas dentro do bairro. Em suas feiras-livres, ruas ou praças, o Benfica consegue reunir distintas gerações em torno de seus espaços públicos e de sua história.
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capítulo 3
Projetos de Referência
MERCADO DE SANTA CATERINA O Mercado de Santa Caterina está localizado em Barcelona e encontra-se sob as ruínas do antigo Convento de Santa Caterina. Um concurso realizado pela Prefeitura de Barcelona em 1997 propôs a remodelação do espaço. O concurso foi vencido pelos arquitetos Enric Miralles e Benedetta Tagliabue do escritório de arquitetura EMBT Associados. A renovação do mercado teve como uma de suas diretrizes a redistribuição do espaço público como um espaço coletivo, onde o espaço do pedestre fosse priorizado. Na parte posterior do mercado são geradas duas praças, uma mais conectada ao tecido urbano existente e a outra mais próxima às casas, conectando o edifício à região predominantemente de habitação da área. O edifício abriga 70 boxes de venda e inúmeros espaços de serviço. No centro do mercado existe uma zona de autoserviço, onde se pode comprar tudo que não se pode encontrar dentro do Mercado. As ruínas encontra-
Cores, Mercado Municipal de São Paulo. Fonte: a autora, 2016. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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das no processo de remodelação podem ser vistas tanto do interior como do exterior do edifício. O elemento que mais chama a atenção é a coberta em cores. Emblemática, a coberta é ondulada e suas cores procuram reproduzir as cores que podem ser encontradas em seu interior. A composição hexagonal de mais ou menos 1m² se espalha na estrutura de diferentes arcos de madeira com vigas metálicas, em um total de 325 peças com 67 cores distintas.
Figura 20 – Perspectiva do Mercado Santa Caterina. Fonte: Archdaily, 2016.
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Figura 21 – Esquema volumétrico do mercado Santa caterina. Fonte: archdaily, 2016.
MERCADO MUNICIPAL DE ATARANZAS O Mercado Municipal de Atarazanas, localizado na cidade de Málaga na Espanha foi restaurado pelo escritório Aranguren & Gallegos Arquitectos no ano de 2010. A estrutura de ferro datada do final do século XX foi recuperada. O espaço comercial do edifício fica localizado no térreo, no mesmo nível da rua. A nova remodelação busca respeito integral a concepção espacial e arquitetônica existente anteriormente. A organização formal dos postos de trabalho foi desenhada de acordo com as necessidades analisadas e foram eliminadas quaisquer barreiras arquitetônicas que impedissem o livre fluxo de pessoas no salão. Os boxes, como podem ser visto nas imagens abaixo foram organizados de forma assimétricas, no entanto concebem um espaço que permite a limpeza e manutenção.
Figura 22 – Planta baixa do Mercado Municipal de Ataranzas. Fonte: Archidaily, 2016.
Figura 23 – Perspectiva interna do Mercado Municipal de Ataranzas. Fonte: Archdaily, 2016.
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capítulo 4
Diagnóstico
O TERRENO E SUAS CONDICIONANTES O bairro Benfica é bastante adensado quando comparado aos bairros adjacentes. A oferta de terrenos vazios é escassa, portanto a escolha do terreno foi realizada a partir de alguns parâmetros definidos previamente. O primeiro deles é que a área escolhida deveria estar dentro do perímetro do bairro. Logo em seguida, nessa ordem, deveria estar próxima ao núcleo universitário e às praças José Gentil e João Gentil, acessível através de transporte público e por fim, próxima a residências. Após análises de todo o bairro, a melhor área observada para o projeto do Mercado foi o terreno localizado na Avenida Eduardo Girão x Rua Marechal Deodoro, próximo à futura CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento). Além de cumprir todos os parâmetros estabelecidos, o terreno está próximo à centralidade econômica do Montese, nas Ruas Gomes de Matos e Rua Alberto Magno, formando uma ponte direta entre os dois bairros. Visto de cima, Mercado São Sebastião, Fortaleza, Ceará. Fonte: a autora, 2016. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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O terreno é poligonal com seis lados, totalizando 10.214 m². Atualmente está ocupado por galpões onde se instalaram empresas de venda de peças automotivas e uma Igreja. Para compreender melhor a dinâmica da área em que o terreno se insere, foram diagramados dois mapas a fim de facilitar a compreensão. Como já falado anteriormente, o terreno está inserido entre uma Via Expressa, Avenida Eduardo Girão e uma via local, Rua Marechal Deodoro (Fig. 24). Além delas, outras vias facilitam o acesso, como a Avenida 13 de Maio e Avenida dos Expedicionários, via arterial II e arterial I, respectivamente. Todas as vias citadas recebem transporte público que conecta o Benfica a diferentes bairros e distintos terminais de ônibus como o do Papicu, Bezerra de Menezes, Siqueira e Parangaba. Abastecido recentemente por estações do Programa Bicicletar e ciclo faixas, o bairro tem experimentado formas alternativas de locomoção. Acessível por transporte público a partir do Aeroporto e da Rodoviária, essenciais ao turismo, o bairro possui ainda uma estação do Metrô. Apesar disso, o pedestre ainda possui inúmeras dificuldades para transitar pelas ruas, seja por conta das calçadas estreitas ou pelos constantes conflitos entre eles e os automóveis. O terreno escolhido está situado entre os bairros do Centro e do Montese e a 500 metros de onde hoje acontece a feira da Gentilândia e do núcleo universitário composto pelos campi da Universidade Federal do Ceará e Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Ceará. O mapa da Figura 49 mostra o bairro e o entorno do terreno do ponto de vista dos usos e da urbanidade. Foi possível perceber que o bairro é prioritariamente residencial e institucional, com alguns pontos de serviço, comércio e raro uso misto. As feiras estão presentes apenas nas duas praças. Na Praça João Gentil a feira livre é semanal e diariamente são montadas barracas de comidas típicas. Na Praça José Gentil acontecem eventos, como Carnaval, exposição de bicicletas antigas e a feira livre de produtos orgânicos.
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Foram assinalados também os pontos que atraem mais pessoas. A Universidade Federal do Ceará é a instituição que mais atrai público diariamente, seguido do Instituto Federal do Ceará. Periodicamente, o Estádio Presidente Vargas atrai um grande público para o bairro, seguido, com menos intensidade, dos eventos que acontecem na Praça José Gentil. A área analisada possui uma escassa oferta de espaços de lazer, que estão concentrados próximos à Avenida 13 de Maio e às áreas públicas internas da Universidade Federal do Ceará. A presença de vegetação se limita às praças e alguns pontos isolados em calçadas e quintais. O terreno onde se localiza a Emlurb e a área do 23º Batalhão do Exército também possuem áreas de vegetação preservadas, porém não podem ser utilizadas para lazer pelo público.
Figura 24 - Mapa de localização do terreno Fonte: a autora, 2015.
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LEGISLAÇÃO URBANA A fim de que o projeto proposto atenda às normas urbanísticas exigidas, foram consultados, a nível municipal, o Plano Diretor Participativo de Fortaleza-(PDPFor-2009) e a Lei Nº7987, de 23 de Dezembro de 1996, que dispõe sobre o Uso e Ocupação do Solo (LUOS) na cidade de Fortaleza. Segundo o PDP-For, o terreno está inserido na Zona de ocupação Preferencial 1 – ZOP1, parte integrante do macrozoneamento de Fortaleza. Os parâmetros que convêm a essa zona são:
Figura 25 - Tabela de indicadores urbanísticos. Fonte: a autora, 2015.
De acordo com a LUOS, o equipamento de Mercado está inserido no grupo Institucional, no subgrupo de Equipamento para a venda de artigos diversificados em caráter permanente-EPV e classe EPV 2-PE, na atividade de Mercado. Para tal atividade o número mínimo de vagas para estacionamento e o seu porte não estão definidos. Para carga e descarga, devido a área do terreno de 10214 m², sabe-se que serão necessárias acima de 5 vagas, no entanto também não há um número definido. A Lei de uso e Ocupação do Solo classifica as vias como: Av. Eduardo Girão – Expressa, Rua Marechal Deodoro – Local, Rua Antenor Frota Wanderlei – Local, Rua Major Laurindo – Local. Diante disso, a Luos afirma que os recuros serão objeto de estudo por parte do poder público. Adotou-se, portanto, recuo mínimo de 10 metros para recuos laterais e frontal e 5 metros de recuo de fundo.
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Figura 26 - Mapa de mobilidade urbana e conexões. Fonte: a autora, 2015.
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Figura 27 - Mapa de análise de usos, presença e permanência de pessoas. Fonte: a autora, 2015.
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capítulo 5
Um mercado público para a cidade
PROGRAMA DE NECESSIDADES A partir do entendimento de como o mercado pode vir a ser um catalisador do espaço público, o programa de necessidades foi elaborado baseado no edifício de mercado e nas áreas livres de seu entorno. Procurou-se observar, antes de tudo, a dinâmica do local e, a partir disso, estimular os usos já existentes e fortalecer os sinais coletivos de cultura e de identidade do bairro. O objetivo é gerar ambientes que possam vir a estimular a economia local e o espaço urbano do Benfica. O programa está composto em cinco zonas distintas: A zona pública evidencia o entorno do Mercado, focando em áreas livres, espaços de convívio e estacionamento adequados para bicicleta, carros e motos. A zona cultural pretende estimular atividades que envolvam o público através da cultura, com sala de jogos, sala de oficinas e uma galeria para exposições temporárias. Estudo de textura. Fonte: a autora, 2016. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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A zona de serviços é onde estão localizados os ambientes destinados a prestar serviços ao público em geral, como enfermaria, posto de segurança, posto de informações turísticas, administração do mercado, área para caixas eletrônicos, chaveiro e uma área para a instalação dos Correios. A zona de infraestrutura é destinada a áreas de organização fundamentais para o bom funcionamento do mercado, como a área de abastecimento com carga e descarga, banheiros, vestiários, depósito de lixo, centrais de água, gás e energia elétrica. A zona de comércio está subdivida em três zonas: úmida, semiúmida e seca. A úmida é a zona destinada a áreas molhadas, como a de venda de carnes, peixes e mariscos, necessitando de um tratamento especial para a higiene e escoamento da água. A zona semiúmida é destinada a venda de frutas, verduras, legumes, leite, ovos, flores e plantas e a áreas de consumo e venda de alimentos como restaurantes, cafés e bares. A zona seca é destinada a venda de grãos, artesanato, especiarias, livros de gastronomia e utilidades do lar. Na tabela 01 do anexo estão listados todos os espaços pertinentes ao projeto, bem como sua descrição, número de usuários permanentes e provisórios, quantidade e seus respectivos pré-dimensionamentos.
RELAÇÃO ATIVIDADES X ESPAÇOS O diagrama a seguir compila diversas intenções de projeto. Primeiramente, o mercado e a praça funcionam como protagonistas desse espaço, são eles que vão gerar diferentes níveis de interações sociais e urbanas. As interações foram separadas em “espacial primária”, que são aquelas que acontecem diretamente e com mais frequência. Em seguida vem as interações “espaciais secundárias “ que são as interações que complementam as primárias, podendo ou não ocorrer com a mesma frequência das primárias. Por último, as relações intangíveis, que são as que acontecem e são perceptíveis na sociedade, no entanto, não é algo quantificado.
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Figura 28 - Mapa de mobilidade urbana e conexões. Fonte: a autora, 2015.
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RELAÇÃO INTANGÍVEL
RELAÇÃO ESPACIAL SECUDÁRIA
RELAÇÃO ESPACIAL PRIMÁRIA
CONCEITO A intenção do projeto é que o equipamento de mercado funcione como um catalisador do espaço público, proporcionando diversas atividades tanto em seu interior como no seu entorno. Portanto, o Mercado, obrigatoriamente, deve se abrir para a cidade, tornar-se permeável e permitir diferentes tipos de fluxos. A praça, antes interna ao mercado, ponto de encontro de todos os cidadãos, agora se doa à cidade. Expande-se até a rua, sendo a responsável por receber o comércio informal da feira livre, complementando as atividades comerciais do equipamento. Busca-se aqui a aproximação das pessoas com a cidade e vice-versa. Em seguida, procurou-se analisar o tecido urbano do bairro Benfica e foram observados os eixos do topo das casas que havia nas ruas adjacentes ao terreno escolhido (Fig. 30). Eixos verticais e horizontais foram considerados para iniciar o estudo de volumetria do edifício. Na praça, esses eixos foram desconstruídos, tornando-se mais fluidos e que em conjunto com os eixos verticais e horizontais da volumetria, permitem a permeabilidade e fluidez desejada.
Figura 29 - Modelo de caixa usado em supermercados que não se buscou usar, e a Ágora de Priene em formato de U e praça no centro. Figura 30 - Estudo de eixos do Bairro Benfica.
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A praça se doa a cidade.
Eixos vertical e horizontal fluindo por dentro da volumetria
Eixos internos vertical e horizontal e eixos desconstruídos no exterior no entorno do edifício.
Fluidez dentro do mercado a partir de seus acessos.
Volumetria final
Figura 31 - Sequência de conceitos.
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IMPLANTAÇÃO E PAISAGISMO A implantação foi decidida juntamente com o paisagismo, a fim de gerar espaços externos que favoreçam a permanência de pessoas e o convívio social. Primeiramente foi considerado o desnível do terreno, optou-se por aproveitar seu caimento e fazer grandes patamares desde a parte mais alta na Rua Antenor Frota Wanderley até a parte baixa na Av. Eduardo Girão. A acessibilidade urniversal foi respeitada de acordo com a NBR 9050 e todos os acessos podem receber fluxo de pessoas com mobilidade reduzida. Em seguida, foram observados os fluxos, tanto de pedestres como de bicicletas e de automóveis. A partir deles, geraram-se diversos espaços, entre eles, a área de feira livre no centro da grande praça, que se situou abaixo da coberta de colmeias (detalhada nas próximas páginas), a área de playground e por fim, as área de carga e descarga e estacionamento, que foram colocadas na rua local Major Laurindo. Entre essas áreas, foram destacadas, através da vegetação escolhida, os acessos ao edifício, procurou-se ainda tratar cada espaço externo com uma vegetação adequada, considerando cores, portes e características botânicas.
Foi gerado um plano de massas para auxiliar na ordem de espaços que se pretendia produzir. A Carnaúba, palmeira símbolo do Ceará, foi posta no principal acesso de pedestres como uma forma de dar destaque a ele e permitir que seja um ponto vísivel a distância. O oiti é uma árvore de grande porte e que oferece bastante sombra, portanto, foi colocada em pontos estratégicos, que necessitavam de sombreamento, como a grande área verde ao lado da coberta. O flamboyant, planta exótica mas que é adaptada ao clima quente e úmido de nossa região, foi colocado no centro do playground. Por sua cor laranja, raízes fractais externas e aspecto lúdico, ela foi a árvore mais adequada para a área infantil. Na área de feira livre e no entorno da coberta de colmeias, as canafístulas (de médio porte) deram cor ao espaço e criam a possibilidade de reconhecer o local pelo amarelo intenso da canafístula. O jambo tomou destaque na área de estacionamento e de carga e descarga. Com sua copa densa, protege-se a fachada oeste e através de sua cor, destaca-se o acesso oeste. O juazeiro foi utilizado para a transição da praça para a parte oeste do mercado. E o jacarandá mimoso destaca os dois acessos a partir da Avenida Eduardo Girão. O pau-branco aparece no projeto como uma das principais árvores. Ainda que seja de pequeno porte, ela se destaca na fachada principal do edifício e em áreas como estacionamento e na calçada da Rua Antenor Frota Wanderley.
Figura 32 - Plano de massas.
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01 Copernicia prunifera Carnaúba Altura: 10-15m
02 Licania tomentosa Oiti Altura: 8-15m
03 Delomix regia Flamboyant Altura: 10-12m
04 Cassia fistula Canafístula Altura: 10-15m
Figura 33 Implantação.
05 Syzygium jambos Jambo Altura: 10-12m
06 Jacaranda mimosifolia Jacarandá mimoso Altura: 8-15m
07 Zizyphus joazeiro Juazeiro Altura: 5-10m
08 Auxemma oncocalyx Pau branco Altura: 6-8m
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DIRETRIZES PAISAGÍSTICAS Algumas diretrizes paisagísticas foram pensadas para proteger a área do terreno em época de chuvas intensas, já que se trata de uma área propensa a alagamentos. Primeiramente, muitas áreas verdes foram propostas com a intenção de permitir novas formas de lazer ao usuário e, é claro, de contribuir positivamente com o cenário paisagístico e urbanístico do bairro. Para tanto, áreas onde ficam as carnaúbas foram pensadas com um pequeno declive onde a água se acumularia e partir daí poderia ser armazenada. A água cinza será reutilizada em outras ocasiões em diversos outros usos. Entre o mercado e a avenida já existia um pequeno declive de um metro que foi aproveitado no projeto. Um jardim inclinado foi proposto a fim de direcionar a água da chuva ao canal existente. Áreas verdes foram propostas nessa transição da avenida para que a infiltração da água ocorresse com maior facilidade, contribuindo para ao tardiamento de alagamentos. Além disso, foi pensada como diretriz urbanística a ciclofaixa, essencial para o deslocamento no bairro e mobilidade urbana de modo geral. No estacionamento, o concregrama foi proposto a fim de facilitar o escoamento da água e diminuir as áreas impermeáveis da praça do Mercado.
Figura 34 - Concregrama utilizado no estacionamento.
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Figura 35 - Esquema de retenção de água.
Figura 36 - Esquema de direcionamento de água e de paisagismo na transição entre omercado e o bairro Jardim América. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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ESTUDO DE FACHADAS Para a fachada, foi proposta uma malha que funcionaria como brise, protegendo-a de insolação e permitindo iluminação e ventilação natural. Estética e formalmente, dará ao edifício uma unidade necessária para o reconhecimento de sua volumetria. Para tanto, foi pensado em algo característico do mercado e das frutas, a fim de transmitir identidade ao edifício. A rede EPE para proteger frutas, encontradas em feiras e supermercados, foi escolhida por conter um desenho harmonioso e por dar inúmeras opções de texturas. No caso, duas formas de textura foram estudadas antecipadamente através de desenhos, concluindo que ambas proporcionariam as características desejadas.
Figura 40 - Estudo 1 de placa metálica. Fonte: a autora, 2016.
O desenho escolhido foi o número 2, que passou-se a chamar de colmeias. Para dar a transparência e cor desejada, propõe-se o uso do vidro colorido, permitindo assim que a cor se destacasse tanto para quem está vendo o edifício de fora, formando uma grande malha colorida, quanto para o usuário interno através da sombra colorida proprocionada a partir da luz do sol refletida para dentro do edifício. As cores escolhidas para compor a colmeia metálica procuram reproduzir as cores que podem ser encontradas dentro do mercado, a partir de frutas, verduras e carnes. Figura 37, 38, 39 - Estudos de textura através de fotografias da rede EPE. Fonte: a autora, 2016.
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Figura 41 - Estudo 2 de placa metálica.
Figura 42 - Fachada sul com o estudo 1 para placa metálica.
Figura 43 - Fachada sul com o estudo 2 para placa metálica.
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As fachadas finais estão de acordo com as imagens a seguir. Foi utilizado o vidro transparente, com a intenção de deixar passar luz, e a placa metálica faz o contorno de todo o bloco principal, protegendo tais fachadas. O bloco de ser-
viços, em destaque de vermelho, está na sombra durante a maior parte do dia e para proporcionar uma fachada mais lúdica, de acordo com as intenções do projeto, janelas de vidro de vários tamanhos foram propostas, criando uma dinâmica de cheios e vazios.
Fachada Sul
Fachada Norte
Fachada Oeste
Fachada Leste
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Figura 44 - Perspectiva isométrica com composição formal da volumetria e indicação de perspectivas.
Figura 45 - Perspectiva 01, acesso principal pelo corredor das carnaúas pela Rua Marechal Deodoro.
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Figura 46 - Perspectiva 02 a partir da Avenida Eduardo Girão, com paisagismo. Fonte: a autora, 2016.
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Figura 47 - Perspectiva 03 a partir da Rua Major Laurindo, com paisagismo. Fonte: a autora, 2016.
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PARTIDO ESTRUTURAL A estrutura metálica foi proposta a fim de remeter aos mercados do século XIX, quando o ferro era utilizado em larga escala em todo o mundo para dar origem a esse tipo de edifício. Na proposta atual, o ferro foi inserido com intenções de possibilitar grandes vãos e dar leveza. Internamente, a estrutura discreta, evidenciaria os boxes de venda, protagonistas desse tipo de comércio. A grande parede de concreto permitiu quebrar a monotonia da fachada 01, ao mesmo tempo que possibilitou, estruturalmente, a suportar a coberta vazada de colmeias. As placa metálicas das fachadas receberam suportes que se interligavam aos pilares. Figura 48 - Estudo do partido estrutural. Fonte: a autora, 2016.
Figura 49 - Composição formal da placa metálica na volumetria do edifício.
Figura 50 - Esquema de corte estrutural.
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COBERTA DE COLMEIAS A coberta de colmeias foi montada seguindo o partido estrutural e usando estrutura metálica. A treliça calculada em 1 metro forma uma grande malha estrutural, esta se apoia no paredão de concreto e segue até a praça, em um total de 90 metros, com pilares estruturais de apoio a cada 10 metros. Os pilares em I foram escolhidos por dar mais estabilidade à estrutura, e a amarração deles foi feita através de cabos de aço, como mostrado na figura 51. A placa metálica se apoia em cima da treliça e no contorno recebe painel ACM para dar um volume único à peça.
15m
Figura 51 - Detalhe construtivo da estrutura metálica da coberta de colmeia.
Figura 52 - Perspectiva 04, coberta de colméias, com paisagismo. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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Figura 53 - Perspectiva 05, Praça da feira livre. Fonte: a autora, 2016.
ÁREA DE FEIRA LIVRE A grande praça foi proposta como uma extensão do edifício de mercado. Um espaço público que se conecta ao entorno e recebe, através da coberta de colméias, uma extensa área de sombra, proporcionando que a feira livre ocorra e que, quando esta não esteja em funcionamento, funcione como um complemento das áreas de Figura 54 - Estudo de barracada para feira livre.
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convívio adjacentes e um espaço cultural para apresentações, manifestações e mostras culturais. As barracas de feira receberam um estudo de composição, como mostrado na figura 54. Algo que fosse prático para ser montado e desmontado e que carregasse, ao mesmo tempo, as cores que compõem a fachada.
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DISTRIBUIÇÃO INTERNA DE AMBIENTES Os espaços internos foram configurados para dar conforto ao usuário. A intenção aqui é que os ambientes sejam amplos, acessíveis e confortáveis. A circulação vertical é feita por um elevador social e a escada. A circulação vertical de produtos é feita pelo elevador de carga, que se interliga a sala de recebimento e preparo de produtos. Na Figura 55, ao lado, é possível ver a composição por pavimento até a coberta. O térreo foi destinado ao grande salão do mercado, onde estão posicionados os boxes de venda, a padaria, o mercadinho, que se conecta à praça, e os demais ambientes, como a área de reciclagem, de recebimento e preparo de produtos, banheiros e fraldário. O 1º pavimento foi destinado a serviços em geral, a praça de alimentação e tipos distintos dos comércios existentes no térreo. Portanto, estão situados a loja de discos, o sebo, o chaveiro e sapateiro, correios e caixas eletrônicos. Compondo a parte de alimentação, estão o restaurante, o bar, o café e a lanchonete, além do salão de jogos e o salão de mesas. Além disso, no primeiro pavimento situa-se a parte cultural do edifício, como as duas oficinas e o salão de exposição. Ainda nesse pavimento estão o depósito de material de limpeza, o acesso privativo para o pavimento técnico, a sala de administração, reunião, segurança, banheiros, copa e vestiário para funcionários. No pavimento técnico estão situadas duas áreas para possível expansão, a área técnica com sala de gás, água e eletricidade e, por fim, na parte externa do pavimento, estão a área de contemplação, acessada pelo público pela escada principal e o teto verde. Figura 55 - Composição por pavimento.
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Figura 56 - Primeiros estudos de plantas baixas.
x10
x15
x2
x5
x1
x2
x1
x1
x1
x2
Figura 58 - Tabela de quantidade de boxes de acordo com o produto.
Os boxes internos receberão diversos tipos de vendas de produtos. Acima está listada a quantidade de boxes de acordo com cada produto.
Figura 57 - Primeiros estudos de boxes
Serão no total 40 boxes de diversos tamanhos, buscando atender à demanda de comerciantes de todos os tipos, de acordo com suas necessidades específicas.
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Figura 59 - Perspectiva isométrica e planta baixa do térreo.
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Figura 60 - Perspectiva e planta baixa do 1º pavimento
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Figura 61 - Perspectiva interna do térreo.
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Figura 62 - Perspectiva interna do 1ยบ pavimento.
CONFORTO AMBIENTAL
O conforto ambiental foi pensado em todos os aspectos do projeto. Destacam-se a escolha de que o mercado tenha ventilação e iluminação naturais, necessitando o mínimo possível de outras alternativas. A placa metálica que forma a colmeia que envolve todo o edifício protege as fachadas, impedindo que a luz do sol chegue diretamente até elas. No entanto, deixa entrar luz indireta e, além disso, permite que a ventilação natural ocorra em todo o edifício através da ventilação cruzada, ocorrendo intensamente no salão principal. O esquema ao lado mostra um estudo solar durante o dia 15 de junho, com o intuito de estudar a sombra da coberta da praça. Observam-se, a partir disso, alguns horários estratégicos. No começo da manhã, que é quando a feira está no seu auge, até às 8 horas, a sombra de localiza quase no centro da praça, principal ponto de encontro. Às 10 horas, quando a feira começar a terminar, a sombra está inteiramente na praça, proporcionando conforto aos seus usuários. Nos horários seguintes a sombra vai se afastando para outros pontos da praça. Durante todo o dia a vegetação faz um papel fundamental, pois em várias horas cria diversos tipos de sombra que podem ser aproveitadas como áreas de permanência. Pode-se perceber ainda que as fachadas mais direcionadas para oeste e sudoeste, prejudicadas com a alta incidência solar, recebem vegetação abundante de pau branco e jambos, além, é claro da placa de colmeia que ajuda a proteger ambas as fachadas.
Figura 63 - Esquema de estudo solar no dia 15 de junho.
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Figura 64 - Esquema de ventilação cruzada.
A ventilação cruzada se mostra presente em todo o salão principal, com a intercalação de cheios e vazios das cortinas de vidro permitindo que controle a quantidade de ventilação recebida. Além disso, o teto verde favorece a manutenção do clima ameno no interior do edifício e o painel de colmeias impede que a insolação atinja as fachadas.
Figura 65 - Esquema de exaustão.
A figura 65 mostra a exaustão do ar quente a partir da circulação interna do vento. O vento é direcionado para fora a partir do vazado existente.
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capítulo 6
CONSIDERAÇÕES FINAIS O Mercado Público faz parte do cotidiano de diferentes sociedades desde muito tempo. Quando ainda nem se sabia exatamente o que ocorria numa praça pública ou quando ainda não existia edifício para abrigar atividades comerciais, o mercado acontecia espontaneamente dentro do meio urbano. Em vários momentos, o Mercado colaborou para o desenvolvimento das cidades, desenvolveu o comércio local, fortaleceu tradições e foi ponto importante de socialização de diferentes civilizações. Com a globalização, o homem se distanciou do lugar em que vivia. O processo de industrialização e a urbanização desordenada de nossas cidades impactaram negativamente na urbanidade, com os espaços públicos e as relações sociais se tornando cada vez mais escassas. Perde-se a sensação de pertencer a um local e, aos poucos, se esquece a história e a tradição de nosso povo.
Mercado de la Boquería, Barcelona. Fonte: Morganna Batista, Nov. 2013. REINVENTAR O ESPAÇO URBANO _ MERCADO PÚBLICO DO BENFICA
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O Mercado Público proposto aqui consiste em um equipamento estratégico para a recuperação do espaço urbano. Ao mesmo tempo em que pretende oferecer áreas de convívio e socialização, o Mercado Público do Benfica busca ser um espaço que incentive a economia local, que valorize a cultura e as memórias da cidade perpetuada entre gerações e se consolide, enfim, como um local de reunião de seu povo, de troca de ideias e como legitimador de coletividades. O desenho buscou respeitar o entorno e recuperar o espaço do pedestre. A ideia foi a de reinterpretar e reinventar o edifício e o espaço urbano para, assim, permitir que o indivíduo se aproxime, novamente, do lugar onde vive e que cada vez mais tenhamos espaços públicos mais democráticos. Por fim, espera-se ter contribuindo para a discussão desse equipamento como um catalizador do espaço público e de ter proposto uma arquitetura que contribua positivamente no espaço urbano do Bairro Benfica.
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ANEXO
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Fontes utilizadas: Avenir Book Avenir Book Oblique Avenir Heavy Coves Light Coves Bold
Revisão: Cleber Cordeiro csccleber@gmail.com Diagramação e desenhos de capa e contracapa feitos pela autora. morgannabatista@gmail.com