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Brincadeira de gente grande

O consumo de jogos pelo público já cresceu muito acima do cinema e da música. No YouTube, a modalidade já ultrapassou até o futebol em alguns casos e continua a se expandir

A indústria dos jogos eletrônicos é bem jovem. Se pensarmos que até a virada do milênio a mídia ainda era considerada um mero brinquedo infantil, é estranho em muitos aspectos ver que os games hoje são maiores que o mercado da música e do cinema combinados, segundo dados da MPA (Motion Picture Association, em 2021), mas isso já não é novidade. Na verdade, o segmento já detém esse patamar desde o começo da década de 2010. No ano seguinte, Call of Duty: Modern Warfare 3 (uma sequência muito aguardada na época) se tornou a peça de entretenimento com a maior arrecadação de 2011, superando Avatar de James Cameron quando comparados no período de seus respectivos lançamentos. “Jogos” já não são meras cópias eletrônicas. Ao longo de seu rápido crescimento, games se tornaram os próprios filmes e esportes que o público consome. Vimos o surgimento de títulos que flertaram com o gênero do cinema, verdadeiras produções multibilionárias que usam atores famosos e marketing caríssimo, entregando experiências com dezenas de horas de duração e cenas que fariam inveja a qualquer cineasta –tudo isso sem deixar a progressão que depende da ação do jogador, imergindo o público em uma narrativa mais palpável. No outro lado desse leque, existe o crescimento exponencial do que seria chamado de eSports, o esporte eletrônico de jogos. Com o advento da internet, embates entre equipes e jogadores se tornaram mais fáceis de organizar e assistir, algo que popularizou bastante o gênero e atraiu muito público desde a última década. Como exemplo, temos um caso já não tão recente: em 2019, a final de Free Fire (um jogo para celular) tomou para si o recorde de maior audiência do YouTube no Brasil, com mais de 1 milhão de expectadores simultâneos – o recorde anterior era de um jogo de futebol entre Corinthians e Racing, pela Copa Sul-Americana. Essa foi apenas uma partida nacional, de um único jogo, mas há pelo menos uma dezena deles por aí que, somente em 2021, arrecadaram mais de US$ 1 bilhão, segundo dados da pesquisa SkyQuest.

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Essa onda de esportes eletrônicos a coloca lado a lado com a NFL, a NBA e o próprio futebol. O avanço da categoria impulsiona os jovens a se aventurar na empreitada, seja ao perseguir o sonho de se tornar profissionais do ramo ou consumir os produtos de alto desempenho utilizados pelos times que admiram. Na última BGS (Brasil Game Show), maior evento de jogos do Brasil, tivemos uma presença forte de marcas de periféricos, como empresas de teclados e mouses, criando filas gigantescas de consumidores em busca de itens para aprimorar suas estações de jogos. A feira teve um acréscimo em sua duração e de público no período de 2022, atraindo fãs que querem sentir as novidades com as próprias mãos.

Jogos e cultura pop ainda são coisas diferentes?

Apesar de parecer que os jogos estão dominando o mercado, esse não parece ser o caso, já que, cada vez mais, as diferentes formas de entretenimento se entrelaçam. A cultura pop é, no geral, uma amálgama de conteúdo na atualidade, pois as barreiras entre as mídias já estão “borradas” há alguns anos. Filmes de games, adaptações para animes (animação japonesa), quadrinhos, mangás (quadrinhos japoneses) ou até séries de TV são comuns, algo que fortalece a marca do game e arrecada em outra frente.

Em 2022, o anime Cyberpunk Edgerunners conquistou um feito impressionante: alavancou o número de jogadores de Cyberpunk 2077, lançado em 2020, para um recorde de 1 milhão de pessoas jogando simultaneamente nos computadores, uma soma maior do que em seu lançamento – sem contabilizar usuários de videogames, como Xbox e PlayStation. No supracitado Free Fire vimos shows dos cantores Emicida, DJ Alok e diversos outros, expandindo a área de atuação dos artistas para outras mídias. Já em Fortnite, há anos talentos como o DJ Marshmello, Travis Scott, Ariana Grande e até o brasileiro Emicida (repetindo seu sucesso, mas agora em nível internacional) participaram de shows ao vivo dentro do jogo, reunindo audiências de milhões de pessoas.

Há mais de três anos, é muito comum ver artistas, filmes e séries realizando cross-media com games. Todo título de sucesso tem colaborações com outras mídias ou realiza ações especiais para levar a marca do jogo para dentro da Netflix, Spotify e outros grandes serviços

Todas as big techs estão de olho no mercado e não é para menos: a estimativa de crescimento da indústria para os próximos cinco anos é de até 35%

“A música transcende qualquer linguagem, e é uma parte querida da jornada do Fortnite desde o primeiro show realizado dentro do jogo, em 2019”, diz Nate Nanzer, vice-presidente de parcerias globais da Epic Games, detentora de Fortnite. Antes mesmo da discussão de metaverso, esses títulos eletrônicos já estavam na vanguarda de reunir pessoas para e dividir espaços virtuais em atividade de entretenimento – e que não é para jogar.

League of Legends, um dos jogos mais populares do mundo, conquistou dois feitos inesperados: um Emmy por melhor série animada e emplacar uma música no Top 1 da Billboard. Desde 2014, a desenvolvedora aposta em bandas virtuais fictícias, como a Pentakill de heavy metal e o grupo de k-pop K/DA, que emplacou o hit POP/STARTS em 2018. Já a série Arcane foi um dos maiores lançamentos da Netflix em 2021 e trouxe alguns prêmios para casa. Contudo, a empresa não para de investir na cultura pop, já que recentemente o rapper Lil Nas X foi a estrela da música criada para a competição mundial do game em 2022.

Futuro promissor

O mercado dedicado a games jamais esteve tão aquecido. Colossos como Amazon e Google já deram seus primeiros passos para entrar no segmento, além de a Apple já ensaiar há anos uma aproximação com a indústria. Até a gigante Netflix abocanhou uma fatia do mercado. Desde 2021, a empresa vem adquirindo estúdios de produção de jogos e, neste ano, lançou games mobile para assinantes do serviço: basta ter uma conta para assistir as suas séries e filmes, além de jogar pelo celular. Recentemente, o Xbox, divisão de games da Microsoft, anunciou a maior aquisição da história do mercado de tecnologia: a compra da Activision-Blizzard, um conglomerado que administra diversos jogos importantes da área, incluindo Call of Duty, citado no começo do texto, por US$ 69 bilhões – a transação ainda passa por trâmites legais no mundo inteiro sob a ótica de ser um possível monopólio.

É interessante que uma das maiores empresas de tecnologia do mundo optou pela aquisição histórica no ramo de games com o objetivo de impulsionar um serviço criado pelo Xbox, o Game Pass, que oferece centenas de títulos ao consumidor por uma assinatura mensal, que também tem inclusa uma opção para jogar em nuvem, sem precisar de um aparelho de videogame. O setor de jogos da Microsoft já trabalha no Projeto Keystone, um dispositivo que executa os títulos apenas com a internet.

O cenário atual progride rapidamente: diversos jogos blockbusters estão à beira do lançamento até 2023, a nova geração de videogames está a todo vapor mesmo com a crise dos microchips, a realidade virtual caminha a passos largos com os investimentos do Meta (antigo Facebook) e o segmento de celulares está cada vez mais aquecido. As previsões do futuro são promissoras, mas ainda incertas para onde vão caminhar. Neste momento, sequer sabemos se os PCs e consoles tradicionais, que estão por aí desde a década de 80, continuarão existindo nos próximos dez anos, com muitos analistas apostando que serviços de assinatura e jogatina em nuvem vão substituir as máquinas caras que precisamos adquirir. E quem sabe? Talvez tudo continue a coexistir, da mesma forma que as outras mídias e os games encontraram um meio de se alavancar juntos.

Neste momento, o futuro dos jogos é tão incerto quanto a tecnologia no boom da internet. Há dezenas de possibilidades, incluindo o avanço do metaverso e a popularização dos serviços de nuvem

Lennon dos Santos Barbosa Frassetti, também conhecido como L7NNON, alcançou a fama com Freio da Blazer, lançada no começo de 2021. Mas, quem pensou que o sucesso do rapper seria passageiro, como acontece com muitos artistas que viralizam no TikTok, se enganou. Este ano tem sido ainda mais especial para L7. Ele já bombou com dois grandes hits – Desenrola, Bate, Joga de Ladin e Ai Preto , emplacou sete músicas simultaneamente no top 200 do Spotify, subiu em um dos palcos do Rock in Rio e ainda tem planos de lançar seu primeiro álbum.

Nascido em Realengo, zona Oeste do Rio de Janeiro, L7NNON não imaginava que chegaria tão longe na carreira artística, até porque sua trajetória vinha sendo construída no skateboarding . Mas o talento para as rimas não passou despercebido. Incentivado pelos amigos, acabou lançando sua primeira música em 2017. Nomes importantes na cena do rap nacional, como BK e Matuê, foram essenciais nesse caminho, convidando o novato para suas apresentações e deixando com que o artista mostrasse suas próprias composições. Outra grande incentivadora – e aluna de rima – é Anitta, conhecida por abrir espaço e apoiar artistas com potencial. Nesta entrevista, ele conta um pouquinho da sua história, fala sobre a cena do rap no Brasil, projetos e sonhos.

Você tem uma história curiosa, começou a carreira antes no skate e depois começou a produzir música. Pode nos contar como foi? Rap e skate são coisas que andam muito juntas. Eu já gostava de rap, já gostava de rimar. Os moleques começaram a colocar pilha para eu fazer música e foi assim que eu lancei a minha primeira. Minha ideia não era viver da música, era viver de skate e lançar música quando eu achasse legal.

Quando você percebeu que estava dando certo na música?

Eu soltei a minha primeira música no dia 16 de agosto de 2017. Em 2018, minha vida já estava mais voltada para a música, tudo estava fluindo e eu comecei a bombar mais.

Como foi a sensação de ter chegado ao topo do Spotify?

Eu acho que no topo a gente nunca chega, porque depois do topo só tem descida e eu acredito em uma constante subida. Eu nunca imaginei que alguém fosse cantar minha música. E hoje em dia, estar em primeiro lugar no meu país e fazer uma turnê na Europa com shows lotados, são coisas que nem nos meus melhores sonhos eu imaginava.

Quais são as suas referências na música? Pessoas que eu acompanho, pessoas que eu admiro desde o início, pessoas que vieram antes de mim. No rap, Racionais.

Como você vê a cena do rap no Brasil atualmente?

Hoje em dia, no Rio de Janeiro, todo mundo é muito unido, todos os rappers se juntam, se dão bem, trocam ideias, curtem o trabalho uns dos outros. Sem dúvida, o rap, e a música em geral, une as pessoas. A minha música não é para facção, é para pessoas, é para unir mentes. O rap é uma ferramenta de protesto das periferias, sempre teve o poder de dominar a massa não privilegiada. Mas pessoas de classe alta também consomem. Eu posso cantar na favela e também na balada mais cara de São Paulo.

Quanto tempo demora para se tornar um artista de sucesso?

Para mim, fazer música é fácil, porque eu gosto de escrever. Tem pessoas que já faziam música muito antes de eu começar e até hoje não fazem sucesso. Isso não quer dizer que a pessoa não é boa. Às vezes, é só uma questão de tempo mesmo. Mas eu acredito que se a pessoa é verdadeira, honesta, sincera e faz aquilo com amor e com o coração, em algum momento vai “dar bom”.

Tudo o que você escreve vira rima?

As minhas vivências, o que eu faço, o que eu vejo, transformo em frases terminadas em palavras que rimam. Mas o que eu vivo não é rimado, a minha vida não é rimada. Tem músicas que são mais simples, tem músicas que são mais demoradas. Tem músicas que quero passar mais algo do meu interior, quero que as pessoas entendam de uma forma muito genuína. Então, não quero fazer qualquer tipo de rima. Eu quero fazer um jogo de palavras legal, que as pessoas escutem e digam “caramba, olha as palavras que ele rima” e, ao mesmo tempo, quero que as pessoas entendam o que eu quero falar. Não basta fazer um bando de rima com palavras difíceis, mas ninguém entender o que eu realmente quero passar com a letra.

O Rock in Rio foi o seu primeiro grande festival ou você já teve experiência em outros?

Eu fui convidado pelo Jack Hello para tocar uma música durante o show dele no Lollapalooza. Foi legal para caramba.

Quais outros projetos você já tem encaminhado?

Eu quero lançar o meu disco, não sei se esse ano ou ano que vem, mas estou trabalhando bastante nisso. Tenho também muitas músicas fora do disco que quero lançar.

Quando você vai gravar uma música, precisa de mais quantas pessoas? Nenhuma, tudo o que eu canto é feito só por mim. As pessoas fazem o beat . Por exemplo, o Papatinho que fez meus dois discos, faz as batidas. Tem músicas que são produzidas por outras pessoas também. Normalmente, escrevo música em casa, vou para o estúdio e gravo a voz. Em seguida, tem a mixagem, que demora um ou dois dias. Depois, é só subir nas plataformas, como Spotify. Para liberar, demora uns 20 dias.

“As minhas vivências, o que eu faço, o que eu vejo, transformo em frases terminadas em palavras que rimam”

Como você faz os clipes?

Eu não faço clipes sempre com as mesmas pessoas, mas eu tenho pessoas da minha confiança, que confio na direção. Eu sempre dou um toque e passo o que eu quero e imagino para o clipe.

Existe uma linha ou uma palavra que une todos os seus clipes e músicas? Que representa você?

Gratidão. Para mim, é isso. Desde a pessoa que trabalha comigo diretamente até as pessoas que trabalham indiretamente. É um sentimento que eu mantenho vivo dentro de mim todos os dias. Estamos aqui conversando, trocando uma ideia e eu agradeço por isso. Acho muito importante manter o coração grato e íntegro.

Qual foi a música mais difícil que você já fez?

Acho que não tem tanta dificuldade. Mas talvez tenha sido a música sobre quando fui sequestrado, porque tive que ficar lembrando da situação ruim para escrever. Inclusive, nem lancei essa música ainda. Tudo o que eu escrevo fica no meu bloco de notas no celular, mas a maioria das músicas eu tenho na minha mente.

Qual é o seu grande sonho?

Meu grande sonho é acordar e estar vivendo esse sonho que eu sonhei. E todos os dias ter a certeza de que é isso que eu quero para a minha vida. Acho que o mais importante é poder me olhar no espelho e pensar: “eu consegui”. A minha vida é um sonho.

Em algum momento, você chegou a se incomodar com o seu nome? Não. Na época, meu pai via a novela Top Model e gostava do personagem Lennon, que era em homenagem ao John Lennon, mas era um menino que surfava e tal. Aí ele disse que quando tivesse um filho, chamaria Lennon. Mas foi só nessa época, porque meu pai odeia novela.

De onde veio a escrita do seu nome com o 7? Meu sobrenome é Frassetti. E eu queria simplificar meu nome no Instagram, não queria que ficasse poluído.

Como surgiu a música Desenrola ? Na verdade, quem fez o refrão dessa música foi o Tonzão e o Yuri. E eu fiz o verso. No dia do clipe, a gente fez a dança e eu postei no Instagram.

“Acho que o mais importante é poder me olhar no espelho e pensar: ‘eu consegui’”

REVELAÇÃO DO FUNK NACIONAL, MC DANIEL FALCÃO CONQUISTOU O PÚBLICO COM HUMOR, MÚSICAS QUE FALAM DE SUPERAÇÃO E VÍDEOS DIVERTIDOS AO LADO DA FAMÍLIA E AMIGOS

Daniel Falcão nasceu em uma família simples, passou por muitas dificuldades na infância, perdeu uma pessoa muito próxima e atravessou uma depressão profunda. Uma história de vida dessas poderia enveredar por vários caminhos, a maioria bem trágicos. Mas superação é a palavra de ordem desse MC nascido em Taboão da Serra, em São Paulo, que vem conquistando fãs em um ritmo impressionante. O segredo? Ser ele mesmo, nunca perder a piada e tratar o público com muito carinho. Aliás, essa é uma marca registrada do artista: cuidar de todos à sua volta. Daniel é aquele cara que tira o tênis do pé para dar para um moleque na rua, emprega os amigos, distribui dinheiro e sempre tem uma palavra de incentivo para os seguidores. Faz de tudo para realizar os sonhos das pessoas que ama. Daniel Falcão não é só uma promessa do funk, é também referência para todos que querem mudar de vida através da arte.

O que você fez para ganhar 1,7 milhão de seguidores em 30 dias? Basicamente foi com muito trabalho, muito esforço meu e do meu empresário. Fui eu sendo eu, do meu jeito. Foi estourando vídeos virais meus brincando com a minha mãe, com o meu cachorro. Quando fui para o Paraguai, fiz um vídeo antes falando que iria aprontar, fingir que falo espanhol e ver se alguém iria me reconhecer. Cheguei lá zoando todo mundo, brincando. As pessoas começaram a me reconhecer e pedir para tirar foto. Postei no stories e foi parar em todas as páginas, começou a viralizar. Bati 200 mil seguidores, fui com uns 90 mil e bati 200 mil. Gostaram de mim, do meu jeito de brincar.

Antes disso você já tinha viralizado com outro vídeo, não? Sim, antes da viagem para o Paraguai fui na loja Burberry com um amigo meu, o Ian. Chegando lá, a mulher falou: “vocês querem café ou champanhe enquanto escolhem a roupa?” Falei: “o quê? Me vê o champanhe!” Achei que ela não iria trazer, estou acostumado com a Renner, a Riachuelo. Quando ela trouxe, eu estava provando as roupas e meu amigo gravou. Falei brincando: “estou bebendo ‘chamcham’, irmão”. Quando fiz isso, ele postou. A mulher falou: “você quer mais alguma coisa?” e respondi: “agora traz o ‘fefé’” (café). Ela trouxe, coloquei outra roupa engraçada e meu amigo gravou de novo. Já era. Esse vídeo teve mais de 30 milhões de visualizações. Saiu em muitas páginas do Instagram, YouTube, Facebook.

O que vocês pensavam enquanto viam esse crescimento?

Eram 50 mil seguidores por dia! A gente tinha que lançar uma música para aproveitar o que estava acontecendo. A gente falava que se batesse 100 mil, já seria uma vitória absurda. Em um dia bateu um milhão de visualizações no YouTube, em um canal de 60 mil inscritos. A gente falava que não era possível que isso estivesse acontecendo, isso é número de Gusttavo Lima. Ficávamos olhando um para a cara do outro e se perguntando o que estava acontecendo. No ano passado inteiro fiz 8 shows e, só nesse mês, vou fazer 47.

Como faz para controlar toda aquela multidão?

Não tem como controlar. As “minas” são loucas e os caras são loucos. Ontem o cara tatuou a minha cara na perna dele. O fato de eu ser engraçado gera outra relação. Esses dias fomos na Burberry gravar um clipe. Quando a gente entrou, o gerente falou: “vai ter a nova coleção e a gente quer convidar você e seu amigo para verem os desfiles na matriz”. É uma vitória muito grande. Somos do funk, da periferia, fomos pobres a vida inteira. É um salto muito grande ir em um evento desses. É uma quebra de tabu. Não falo Burberry, falo “Bubu”. Louis Vuitton é “Lulu”. Tem que brincar, “tirar barato”.

Por que você decidiu ser artista?

Jogava bola, só que tive uma tendinite. Não tinha como treinar dois períodos por dia. Gosto de sair, de beber. Comecei a ir para a balada e, com 17, 18 anos, comecei a pensar no que iria ser. Na minha cabeça, ia ser jogador de futebol, não tinha plano B. Tentei estudar e fazer Educação Física. Não consegui porque sou hiperativo, não consigo ficar quieto. Sou igual à minha avó, ela faz amizade com todo mundo. Na fila do mercado ela faz amizade e já leva o pessoal para casa, faz strogonoff, feijoada.

E como foi o início? Quando jogava futebol, tinha três amigos. Um deles é meu DJ e os outros dois são meus produtores. A mãe do DJ faleceu e o pai já tinha morrido. Ele não tinha mais ninguém para se apoiar. Um dia, estávamos nós quatro, e fomos jantar. Abri a porta da geladeira e só tinha um pote de manteiga. Achei aquilo um absurdo. “Não é possível, Deus, que a gente vá viver essa vida miserável.” Tinha que fazer alguma coisa para ajudar esses moleques. Antes da mãe do meu amigo falecer, ela falou: “filho, fica próximo do Daniel. A amizade de vocês é verdadeira e isso vai render bons frutos para vocês”. Isso ficou na minha cabeça. A gente foi jantar, compramos pão e comemos pão com molho de tomate. Estava sentado, fiquei olhando e falei que ia cantar, que ia virar artista. “Vou aprender a cantar, vocês dois vão ser meus produtores e você vai ser meu DJ. Se vocês acreditarem em mim, vai dar certo. Todo mundo vai zoar, humilhar a gente, falar que a gente não vai conseguir. Vai ser nós contra o mundo até a gente provar que consegue. Vou estudar e correr atrás, vocês vão estudar e correr atrás de serem bons também.” Tem dias que a gente chora todo mundo, coloca louvor, música gospel. Faz quatro shows lotados, cheios de gente, ganha dinheiro e quando vai ver, na van, está todo mun -

“Para mim, é importante o processo, a luta, levantar do sofá e correr atrás, pedir oportunidade, tentar” do chorando. Para mim, é importante o processo, a luta, levantar do sofá e correr atrás, pedir oportunidade, tentar. Uma frase que eu tenho para mim: “vontade supera talento”. Pelo talento você pode ser melhor que eu, mas se não tiver vontade, um dia vou te passar.

Você recebe muitas mensagens?

As pessoas me mandam mensagens todos os dias: “deixei de me suicidar porque vi um vídeo seu”; “sai da depressão, da ansiedade, por causa de você”. Ontem mesmo, veio na van uma menina com o pulso cheio de cicatrizes. Ela começou a chorar. Sempre dou um abraço e falo: “calma, o que está acontecendo?”

Já começo a brincar e a pessoa vai se acalmando. Ela contou que deixou de se matar por minha causa. Nem conheço a pessoa e ela deixou de se matar, saiu da depressão, porque viu um vídeo engraçado meu. Isso é muito louco. Tem dia que eu acordo e não estou bem para fazer vídeo, mas já vejo as mensagens perguntando onde eu estou. Em um story, às vezes, tem 1500 respostas, posto 50 por dia.

Quais são seus sonhos hoje? Gosto de ajudar as pessoas. Não quero ter dez carros, dez casas. Se tiver uma e os caras que trabalham comigo, minha vó, meu irmão tiverem uma também, já tá bom. Não quero ter porque quando eu morrer, não vou levar nada. Agora imagina se eu der 100 carros para 100 pessoas? Quando eu morrer, vão falar: “esse cara era gente boa”. Os caras brigam comigo todo dia porque saio dando as coisas para todo mundo. Tênis, roupa. Os caras falam: ‘“você tá achando que é o Silvio Santos? Você ainda não tá rico”. Eles ficam doidos, mas eu falo: “Deus está vendo que estou fazendo de coração, ajudando os outros, e vai me dar mais dinheiro para eu ajudar mais ainda”. Quero ajudar as pessoas, isso preenche meu ego. Ontem ganhei uma pulseirinha de ouro no show. Estava no camarim, entrou a mãe de um menino e falou: “meu filho é autista, ele vai entrar aqui e tirar uma foto com você, ele é muito seu fã”. O moleque tirou a foto, olhei para ele e dei a pulseira de ouro. Sei que não tenho que ficar dando dinheiro para todo mundo, tenho que ser pé no chão, mas o tanto de gente que estou ajudando desde que estourei, ninguém pode falar um “A” de mim. Esses dias meu pai me “pegou no pulo” pagando conta de água e de luz dos outros. Se eu for merecedor e estiver fazendo certo, Deus vai me ajudar mais ainda. Pra mim o poder da fé é isso, ajudar as pessoas. Confio nisso. Modestamente, sei que um dia vou ser muito grande, porque estudo muito.

“Pra mim o poder da fé é isso, ajudar as pessoas. Confio nisso. Modestamente, sei que um dia vou ser muito grande, porque estudo muito”

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