Mobilidade urbana: cidade moderna X cidade tradicional, os casos de Brasília e Budapeste

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MOBILIDADE URBANA: CIDADE MODERNA VERSUS CIDADE TRADICIONAL, OS CASOS DE BRASร LIA E BUDAPESTE por Nรกgila Ramos



MOBILIDADE URBANA: CIDADE MODERNA VERSUS CIDADE TRADICIONAL, OS CASOS DE BRASÍLIA E BUDAPESTE

Ensaio em Teoria e História da Arquitetura e Urbanismo, 2º/2014

Nágila Monique Silva Ramos autora

Prof. Dr. Benny Schvarsberg orientador

Prof ª Monica Fiuza Gondim avaliadora

Prof ª Gabriela de Souza Tenório avaliadora

Universidade de Brasília - UnB l Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - FAU l +55 61 3107 7439 l fau@unb.br l www.fau.unb.br


Brasília e Budapeste tomaram parte em minha vida devido ao estudo da arquitetura e urbanismo. Ambas foram novas experiências, já que venho de uma pequena cidade do interior do país. Brasília, uma jovem cidade, monumental, projetada por Lúcio Costa na década de 1960, de acordo os princípios do modernismo para ser a nova capital do Brasil. É um lugar com um caráter simbólico muito forte para o país, no entanto, não me pareceu confortável para os pedestres e ciclistas e usuários de transporte público. Budapeste, cidade milenar, se desenvolveu ao longo do rio Danúbio, e possui em sua estrutura urbana desde ruas medievais até praças e edifícios modernos e contemporâneos. Aí, eu percebi que na maioria das vezes era realmente confortável o caminhar, o uso de bicicletas e de transporte público. A partir dessas impressões pessoais, decidi investigar sobre o assunto. O que distingue estas cidades? Qual delas oferece melhores condições de mobilidade e acessibilidade urbanas? Por quê?

O desenvolvimento deste trabalho iniciou-se ainda em Budapeste, em março deste ano sob a orientação do professor Vidor Ferenc, da Universidade de Tecnologia e Economia de Budapeste (BME - Budapesti Múszaki és Gazdaságtudományi Egyetem) na qual estudei por um ano pelo programa Ciência sem Fronteiras do Governo Federal do Brasil. Meus agradecimentos ao professor Vidor, bem como aos professores Zoltan Schrammel, Bálint Marosi e Szabó Árpád pela contribuição na obtenção dos dados sobre Budapeste. Agradeço também a colaboração do professor Valério Medeiros que me orientou quanto a produção e análise do mapa axial de Budapeste, bem como no estudo da Sintaxe Espacial. .


SUMÁRIO INTRODUÇÃO página 6

REFERENCIAL TEÓRICO: Como a configuração das cidades influencia ou condiciona a mobilidade urbana? página 8

BRASÍLIA página 12

BUDAPESTE página 14

BRASÍLIA VERSUS BUDAPESTE: Considerações para uma análise comparada página 16

- Desenho urbano - Densidades - Diversidade e distribuição de usos - Redes de transporte público - Estatísticas - Como as pessoas se locomovem nessas cidades?

CONCLUSÃO página 46

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS página 48



INTRODUÇÃO A maior parte da população mundial vive em cidades, estruturas espaciais complexas com alta concentração de atividades econômicas, acadêmicas, de lazer e outras, que são geradoras e atratoras de movimentos. As formas e as razões se modificaram ao longo dos tempos, principalmente devido à evoluções tecnológicas e de comunicação, mas as pessoas precisam se locomover. Assim, a mobilidade urbana é uma questão de grande importância, especialmente para as grandes cidades. Há muitas causas que podem afetar o modo como as pessoas se movem pelas cidades, aspectos físicos da cidade, aspectos econômicos, culturais e sociais da população, dentre outros. No entanto, a motivação pessoal para este estudo foi a inquietação, a dúvida de como a configuração urbana condiciona ou influencia a mobilidade e acessibilidade urbanas. São analisados dois estudos de caso, Brasília e Budapeste. Ambas são capitais nacionais, circundadas por áreas metropolitanas com populações de quase 3,5 milhões de pessoas. A parte essas semelhanças, importante ressaltar que são cidades com estruturas urbanas, contextos social, cultural, histórico e de meio ambiente natural completamente distintos. No entanto, a comparação entre a cidade moderna brasileira e a cidade milenar húngara pode ser interessante por exemplificar como diferentes configurações urbanas podem gerar diferentes padrões de mobilidade. Primeiramente foi realizada uma revisão bibliográfica sobre o tema, uma pesquisa sobre possíveis implicações da configuração urbana na mobilidade e após, foram levantadas informações para a análise comparada das cidades, aspectos da configuração urbana, (desenho urbano, densidades e distribuição e diversidade de usos), redes de transporte público (focando em sua distribuição e cobertura espacial) e dados estatísticos, que podem indicar como as pessoas se locomovem nessas cidades. O objetivo é comparar a cidade tradicional com a cidade modernista, verificando quais características de uma ou de outra proporcionam melhores condições de mobilidade para seus moradores.

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REFERENCIAL TEÓRICO Como a configuração das cidades influencia ou condiciona a mobilidade urbana?

Mobilidade urbana pode ser entendida como a “condição em que se realizam os deslocamentos de pessoas e cargas no espaço urbano” e acessibilidade como a “facilidade disponibilizada às pessoas que possibilite a todos autonomia nos deslocamentos desejados” (Política Nacional de Mobilidade Urbana, Lei nº12 587/2012). Ou seja, pensar em mobilidade e acessibilidade urbanas é pensar em como e com que grau de dificuldade ou facilidade as pessoas podem ir de um lugar a outro dentro das cidades. Existem vários motivos que influenciam o modo e a qualidade dos deslocamentos nas cidades, incluindo aspectos físicos, econômicos, sociais, culturais, dentre outros. Porém, dentre eles, a configuração física do espaço urbano tem papel fundamental, visto que existe uma forte relação entre a forma construída e as dinâmicas que ocorrem em seus espaços (Barros, 2014). Segundo Gehl (2010), “as estruturas urbanas e o planejamento influenciam o comportamento humano e as formas de funcionamento das cidades” e conforme Duarte (2008), “a necessidade de movimento dos cidadãos depende de como a cidade esta organizada territorialmente e vinculada funcionalmente com as atividades que se desenvolvem no espaço urbano.” Um desafio das metrópoles é atingir a sustentabilidade em suas três dimensões: econômica, ambiental e social. A melhoria da sustentabilidade em relação à mobilidade urbana significa reduzir os impactos sociais e ambientais, ou seja, limitar o uso excessivo de veículos particulares, incentivando o uso do transporte público e transporte não-motorizado. Também contribui para a mobilidade sustentável, a melhor distribuição de usos e centros de emprego e de educação através do território da cidade, de modo que as distâncias e facilidade de acesso sejam mais equitativas (Silva e Bowns, 2008). Considerando a importância da priorização dos meios de transporte não motorizados e do transporte público, faz-se importante compreender como a configuração das cidades pode facilitar e incentivar o uso desses modais. Gehl apresenta a noção de “convite”, as cidades terão tanto movimento de pedestres, ciclistas ou veículos motorizados quanto permitirem. O movimento de pedestres pelas ruas é extremamente importante, porque 8

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contribui para a vitalidade e urbanidade dos espaços públicos, com mais trocas interpessoais (Jacobs, 2000, Gehl, 2010, Speck 2012), bem como para a saúde da população e para o meio ambiente. Dentre as características necessárias para que isso ocorra, está a necessidade de que existam ruas e outros espaços públicos vivos, ou seja é crucial a diversidade de usos que atraiam diferentes pessoas em vários horários (Jacobs, 2000, Speck, 2012). Duarte (2008) considera que “a natureza dos deslocamentos depende diretamente da forma como as funções se distribuem no território”. Jacobs (2000) afirma que a diversidade “exuberante” favorece seu uso, gera fluxos e segurança, ou seja essa forma de distribuição das atividades incentiva o caminhar. Gehl acrescenta a importância do tratamento do térreo dos edifícios, a variação de cores, texturas e a presença constante de portas e janelas, que favorecem a interação entre o público e o privado e aumenta a sensação de segurança. Somado a isso, é importante que haja uma densidade urbana (construída e populacional) significativa e uma estrutura urbana compacta, com predominância de cheios ao invés de vazios, que implique menores distâncias entre pontos de interesse (residência-trabalho, trabalho-serviços, residência-serviços), que de preferência possam ser percorridas a pé ou de bicicleta (Acioly e Davidson, 1998, Gehl, 2010, Barros, 2014). Em relação ao desenho viário, Jacobs (2000) argumenta sobre a necessidade de quadras curtas, que garantem maior conectividade e mais possibilidades de trajetos. Parte dessas características elencadas como importantes para gerar maior vida urbana e maior fluxo de pedestres foram confirmadas empiricamente por Barros (2014), em sua tese, cujo objetivo foi explorar “de que maneira a forma urbana influencia o deslocamento dos pedestres”, baseando-se no estudo de três bairros de Lisboa, Portugal. A autora confirmou a importância da “presença de diversidade de usos”, de “densidades relativamente altas”, e de “térreos mais acessíveis aos pedestres”. Além desses, Barros (2014) apresentou ao longo de sua tese outros aspectos da forma urbana importantes para a maior circulação de pedestres, anteriormente elencados por outros autores: (Alexander, 2006) “priorização de estruturas em 9


semi-tramas ou semi-retículas, evitando estruturas em árvore” e “união de fluxos (motorizados e não motorizados)”; (Salingaros, 2005) “grande número de conexões (caminhos) entre os nós (atividades/usos do solo) em um espaço urbano”, “a preferência pela linearidade dos caminhos”, “a organização dos sistemas urbanos em estruturas e subestruturas” e “delimitações dos edifícios coincidentes com os caminhos utilizados pelos pedestres”. Para melhor implantação, gestão e acesso ao transporte público, a compacidade, diversidade de usos e densidades relativamente altas é essencial, pois menores distâncias implicam menores custos de implantação dos sistemas e menor demanda de tempo e energia nos trajetos (Acioly e Davison, 1998). O desenho viário com hierarquias bem definidas, tendo curtas distâncias entre eixos principais e acumulação de atividades ao longo desses eixos favorece a distribuição e melhor cobertura da rede de transporte. Gehl (2010) acrescenta ainda que melhores condições para pedestres afetam diretamente o uso do transporte público, pois mais movimento de pessoas nos espaços transmite maior sensação de segurança e essa segurança sentida nos trajetos a partir e até as paradas de transporte público incrementam a atratividade do mesmo. Em relação aos veículos privados, tem-se que seu uso é incentivado quando há grandes distâncias para caminhar ou pedalar e quando os serviços de transporte público não são satisfatórios. Ademais, para Gehl (2010) cidades com mais espaço para os veículos motorizados particulares, mais vias e estacionamentos possuem mais tráfego que outras nas quais essas áreas são limitadas. O autor afirma: Cada cidade tinha exatamente tanto tráfego quanto o seu espaço permitiria. Em todos os casos, as tentativas de construir novas vias e áreas de estacionamento para aliviar a pressão do tráfego geraram mais trânsito e congestionamento. O volume de tráfego, em quase todo lugar, é mais ou menos arbitrário, dependendo da infraestrutura de transporte disponível, porque sempre encontraremos novas formas de aumentar o uso do carro; construir vias adicionais é um convite direto à aquisição e ao uso de mais automóveis.1

1 Gehl, 2010. 10

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Assim, com base literatura consultada, tem-se que a configuração urbana influencia a maneira como as pessoas se locomovem nas cidades, especialmente os aspectos ligados ao desenho urbano (malha viária), as densidades demográficas e diversidade de usos. Uma cidade que oferece melhores condições de mobilidade aos seus habitantes é aquela que propicia: diversidade de usos e densidades relativamente altas distribuídas em todo o seu território, conectados através de curtas distâncias e múltiplos eixos. Assim, haverá caminhos mais curtos e mais ativos a serem percorridos entre moradias, emprego e serviços, o que implica incentivos ao pedestre e ciclista, menor necessidade do uso de transporte motorizado e maior eficiência e menores custos de implantação e gestão das redes de transporte público.

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BRASÍLIA Brasília é a capital do Brasil, município único do Distrito Federal (DF), subdividida em 31 regiões administrativas. O DF possui 5 780 km² de área e sua população é de aproximadamente 2.563 milhões de habitantes (IBGE, 2010). Apesar de haver extensas discussões sobre essas definições, neste trabalho, Brasília e DF são utilizados como sinônimos. A área metropolitana de Brasília (AMB) é composta pelo DF mais 10 municípios, possui 3 477 254 habitantes (2010) e ocupa 23 862 km² de área. Brasília foi inaugurada em 1960 como a nova capital do Brasil. O desenvolvimento de Brasília no Planalto Central brasileiro era parte crucial de um extenso projeto de Juscelino Kubitschek (1956/1960) para a modernização do Brasil. Naquele período, o país estava mudando o foco do modelo agrícola de exportação para um processo de industrialização e era necessário desenvolver o interior do Brasil. Um concurso público foi realizado em 1956 para o projeto da nova capital brasileira, que deveria refletir como o país estava se tornando moderno, integrado na economia mundial e avançando tecnologicamente. Lúcio Costa foi o vencedor (figuras 1 e 2).

Figuras 1 e 2. Conceito de Brasília, por Lúcio Costa. Fonte: Relatório do Plano Piloto. Brasília, 1957 e <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/11.125/3629> .

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O Plano Piloto “foi concebido Segundo Parâmetros e Diretrizes sacramentadas Pelos CIAMs, especialmente a Carta de Atenas de 1933”, (Acioly e Davidson, 1998) tendo sua configuração urbana baseada na monumentalidade, no sistema viário focado nos automóveis e na segregação espacial de usos. Como uma cidade utópica, foi projetada para ter dimensões e população ótimas, sem possibilidades de extensão direta. A população estimada era de 500.000 pessoas, o que foi alcançado em 1970. Como ocorreu intensa migração desde outras regiões do país, foram sendo implementadas as cidades satélites nomeados hoje regiões administrativas. Estes bairros foram construídos muito longe do centro do Plano Piloto, a fim de manter o projeto original da cidade ideal. A figura 3 apresenta a evolução da ocupação urbana do Distrito Federal, desde sua inauguração da década de 1960 até a previsão para 2020.

Década de 1970

Década de 1980

Década de 1990

Década de 2000

Década de 2010

Década de 2020

Figura 3. Distrito Federal, evolução da ocupação urbana. Fonte: PDTU 2009.

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BUDAPESTE Budapeste é a maior cidade da Hungria, é o centro politico, econômico e cultural do pais. A cidade ocupa uma área de 525km² e possui 1.729 milhões de habitantes (2011). A área da Grande Budapeste (figura 7) inclui a capital e pequenas aglomerações urbanas (81 cidades e vilas), sua população e de 2.525 milhões de pessoas e sua área, 2 538 km². A periferia real de Budapeste, a área metropolitana é composta pela capital mais 193 pequenas cidades e vilas, ocupa 7 626 km² e possui 3.4 milhões de habitantes (um terço da população do país). Importante destacar que o DF é o centro político do país, no entanto, Budapeste é além de capital nacional, o principal pólo cultural e econômico da Hungria. Budapeste surgiu em 1873 com a unificação de três cidades: Buda, Óbuda e Peste (figura 4). A história da cidade começou em tempos mais antigos com a ocupação de Aquincum, um assentamento celta que se tornou uma cidade romana. No entanto, os húngaros só chegaram à região no século IX. O principal período de prosperidade econômica e cultural foram os séculos XVIII e XIX. Teve início no final do século XVIII um movimento nacional de reforma, lançado para a transformação política e econômica do país, em defesa da língua e da cultura húngaras. A partir de então, Peste se expandiu muito e se consolidou

Figura 4. Buda, Obuda e Peste medievais. Fonte: Arpad, Szabo DLA, Fragments of the Urban History - Budapest.

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como o centro industrial e comercial do país, que estava em um período de rápido desenvolvimento político, social, cultural e econômico. Em Peste, a expansão urbana da cidade medieval, seguiu o modelo de Paris, com anéis e vias radiais e os novos edifícios basearam-se num estilo neoclássico, que surgiu a partir do Iluminismo. Estas características são predominantes na área central da cidade. No século 20, a cidade foi crescendo e foram estabelecidas uma série de áreas habitacionais com características modernistas e também novos edifícios públicos foram construídos em diferentes estilos. A expansão urbana em Budapeste ocorreu radial ao centro da cidade. Não há lacunas sem uso entre os bairros, mesmo em Buda, onde a topografia é bastante acidentada. Porém há áreas de baixa densidade ocupadas por ferrovias e indústrias. Com mais de mil anos, a cidade é uma colagem de várias camadas históricas, desde a medieval aos bairros contemporâneos. Na figura 5, tem-se a evolução da ocupação urbana da cidade, o limite e ocupação atuais em cinza e em cores, o avanço e os limites em cada período. O primeiro mapa mostra as três cidades que deram origem a capital.

Figura 5. Budapeste, evolução da ocupação urbana. Fonte: Plano Budapeste 2030.

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BRASÍLIA VERSUS BUDAPESTE Considerações para uma análise comparada Neste item são apresentados insumos para a comparação entre Brasília e Budapeste. Busca-se investigar que características da configuração urbana fomentam ou dificultam a mobilidade e a acessibilidade nessas cidades. A população do DF é semelhante à da Grande Budapeste, aproximadamente 2,5 milhões de pessoas, assim buscou-se comparar informações relativas a esses limites territoriais, no entanto, parte dos dados obtidos não contemplam esses limites, mas são ilustrativos dos padrões presentes nessas cidades.

Desenho urbano Para iniciar a comparação entre as cidades é importante a compreensão da escala das mesmas, do limite dos territórios e áreas de ocupação urbana (figuras 6 e 7), bem como sua evolução. Em ambas, há núcleos urbanos distantes dos centros, aqui considerados como os CBDs (Central Business District) indicados por Bertaud (1999,2003). No DF, o assentamento mais distante encontra-se a cerca de 50km e na Grande Budapeste, 35km. Importante observar que em relação ao DF a existência de núcleos isolados decorre do planejamento da cidade. Conforme Barros e Medeiros (2014), O interesse em distinguir o centro urbano dos demais bairros periféricos implantados no esteio da nova capital – com o distanciamento avalizado pela premissa dos vazios e dos grandes espaços abertos entre os núcleos urbanos, defendida pelo pensamento moderno – produziu uma cidade composta por um conjunto de ilhas de assentamentos (cidades-satélites ou Regiões Administrativas, que atuam como bairros de uma mesma entidade urbana), articulados por poucas vias expressas globais.²1

No caso da Grande Budapeste, os núcleos urbanos correspondem a distintas entidades urbanas, sendo que a capital é o núcleo mais antigo e que se expandiu de tal maneira que englobou outras entidades (figura 5) e hoje está conurbada a algumas outras. Os limites da Grande Budapeste incluem assentamentos que são fortemente ligados à capital, entre os quais ocorre forte movimento pendular, pelos empregos e serviços concentrados em Budapeste (KSH, 2007). 2 Barros e Medeiros, 2014, p. 281. 16

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Figura 6. Distrito Federal, limites das regiões administrativas e ocupação urbana. Fonte: Adaptação da autora (dados: PDTU, 2009).

Limites de entidades urbanas Limites entre bairros Ocupação urbana Hidrografia CBD

N

Figura 7. Grande Budapeste, limites e ocupação urbana. Fonte: Adaptação da autora (dados: Limites: KSH, 2007 e ocupação urbana: Google Earth).

0

5km

20km

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Lúcio Costa projetou Brasília com base em seu sistema de transporte rodoviário, uma cidade para o automóvel, como aspirado pelo presidente Kubitschek naquela época. O plano proposto tem dois eixos principais com tráfego rápido, sem cruzamentos, destinado ao transporte motorizado. Na área central, o Plano Piloto, tem seu sistema viário principal composto por eixos longitudinais norte-sul e uma importante ligação cruzando-os, o Eixo Monumental. As conexões nas áreas residenciais Asa Sul e Asa Norte são feitas através de vias mais lentas, onde estão localizados estabelecimentos de comércio local. Segundo Barros e Medeiros (2014) os polos de acessibilidade são as “vias do miolo das superquadras e Eixo Rodoviário.” A partir sistema viário principal do Plano Piloto, existem vias expressas que ligam as outras regiões administrativas, que percorrem longas distâncias e muitas vezes, têm parte de sua extensão, sem ambiente urbanizado. Dentro das outras regiões administrativas, o desenho da rede viária de tráfego segue os mesmos princípios do Plano Piloto. Vias principais que cruzam as áreas, onde está localizada a maior parte de comércio e serviços, e uma série de vias locais - normalmente não conectadas umas às outras - para acessar os blocos residenciais. Budapeste tem a rede viária principal sistematicamente distribuída, composta por anéis circundando o centro e eixos irradiando para fora dele. Os anéis são claros na área de Peste, no entanto, em Buda a topografia íngreme e irregular dificulta a continuação dos mesmos. Como a área de ocupação urbana é mais condensada do que no Distrito Federal, essas estradas principais percorrem distâncias menores conectando os diversos bairros. Por exemplo, ir do CBD aos limites da cidade significa não percorrer mais do que 21 quilômetros. Entretanto, considerando-se toda a Grande Budapeste, essas distâncias chegam a 32km. Dentre os distritos existem padrões diferentes de desenho urbano, sendo que a maioria deles possuem malhas reticuladas. O Rio Danúbio, bem como as diversas linhas de trem implicam barreiras à continuidade da manha urbana e ao deslocamento, as quais são transpostas em alguns pontos por pontes, normalmente integrantes das vias arteriais.

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Em relação a ocupação de área destinada ao tráfego e estacionamento de veículos, observa-se que Brasília tem grande quantidade de terra para carros: vias largas, com até seis faixas de rolamento em cada sentido (Eixo Monumental) e extensos estacionamentos gratuitos, principalmente no centro da cidade (Plano Piloto). Por exemplo, a maior parte da plataforma superior na Rodoviária do Plano Piloto e grande porção da área da Esplanada dos Ministérios, regiões centrais da cidade, são dedicadas a estacionamentos (figuras 10 e 11). Budapeste oferece menos espaço para os veículos, vias mais estreitas (máximo de três faixas em cada sentido) e, no centro, as pessoas devem pagar pelo estacionamento e há menos oferta do que em Brasília.

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Figura 8. Distrito Federal, principais vias. Fonte: Adaptação da autora (dados: PDTU 2009). 0

5km

20km

Via expressa Via arterial Via coletora Hidrografia Ocupação urbana

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Figura 9. Budapeste, principais vias. Fonte: Adaptação da autora (dados: Plano Budapeste 2030).

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Figuras 10 e 11. Rodoviária do Plano Piloto e estacionamentos na Esplanada nos Ministérios. Fonte: <http:// pt.wikipedia.org/wiki/Rodovi%C3%A1ria_do_Plano_Piloto> e <http://brasiledesenvolvimento.wordpress. com/2013/02/20/10-mil-vagas-ideias-de-como-governar/>.

Figura 12. Via Teréz Körútt (anel do sistema viário principal). Fonte: <http://www.netkeptar.hu/index.nof?egy= 1&kepid=484#budapest,_terez_korut> 21


Uma maneira de avaliar o desenho urbano é a Teoria da Lógica Social do Espaço ou Sintaxe Espacial, cujo objetivo é investigar a relação entre o espaço construído e a sociedade, enquanto um sistema de possibilidades de encontros (Holanda, 2002). Conforme Barros e Medeiros (2014), através da análise do desenho urbano, considerando sua malha viária, é possível avaliar se o mesmo favorece ou não a acessibilidade urbana. Segundo Medeiros (2006), dentre as maneiras de representação possíveis para análises configuracionais, a “linear é útil para a investigação do movimento e dos vários aspectos urbanos ligados a ele. É a que melhor se aplica a grandes sistemas e estruturas, como a cidade.” Para este estudo, considera-se os mapas axiais e mapas de segmentos, que são representações lineares do sistema viário, nos quais retas representam os caminhos diretos possíveis dentro da malha urbana. O processamento desses dados é feito por softwares específicos. Os pesquisadores do grupo DIMPU (Dimensões Morfológicas do Processo de Urbanização) da Universidade de Brasília (UnB) utilizam o software DepthMap, que foi desenvolvido pela University College of London. Do processamento dos mapas, é possível extrair uma série de informações, das quais algumas são aqui consideradas para a comparação dos desenhos urbanos de Brasília e Budapeste e suas possíveis implicações na mobilidade urbana. São explorados dois grupos de variáveis: geométricas e topológicas. Estas referem-se a características configuracionais, decorrentes das relações entre os elementos e aquelas, à ordem de grandeza dos sistemas. O mapa axial de Brasília foi produzido e disponibilizado pelo grupo de pesquisas DIMPU e o mapa axial de Budapeste foi modelado pela autora deste estudo, com base em imagens de satélite do Google Earth, cujas datas variam entre 2013 e 2014. A seguir, apresenta-se os mapas axiais, com a representação da variável Integração global e quadro com os valores encontrados para as duas cidades incluindo todas as variáveis consideradas.

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Figura 13. Mapa axial do DF, variável integração global. N

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5km

10km

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Figura 14. Mapa axial de Budapeste, variåvel integração global. N

mais segregado

mais integrado

0

1km

5km

25


O número total de eixos em cada sistema sugere o porte de cada cidade e ainda, é “produto do desenho da malha e articula-se a uma maior ou menor irregularidade da trama” (Barros e Medeiros, 2014). A partir do mapa axial pode-se gerar o mapa de segmentos, os segmentos representam trechos de vias entre cruzamentos. Quanto mais próximo de zero for a relação entre número total de segmentos e de eixos, mais labiríntico é o sistema, ou seja, há menos cruzamentos em forma de X entre as vias. Budapeste apresenta maior valor, possivelmente devido ao desenho em grelha encontrado na maioria das cidades. Brasília possui, devido a setorização de funções e segregação de fluxos de veículos e pedestres, muitas vias sem saída, ou áreas com um acesso único, como as superquadras. Dois valores são indicativos da compacidade ou densidade dos sistemas: as relações entre número total de eixos e área (compacidade A) e entre comprimento total de vias e área (compacidade B), estes valores são indicativos da relação entre cheios e vazios (Barros e Medeiros, 2014) e a proporção de espaço disponível para circulação em relação à área total dessas cidades. Importante observar que a área considerada é a área ocupada pelos sistemas de vias e não a área dentre os limites territoriais das entidades urbanas. Os valores de Brasília, inferiores aos de Budapeste, são reflexos do planejamento global da cidade que promoveu a separação de funções e instalação de bairros isolados do Plano Piloto, com extensos vazios e poucas vias de conexão entre eles, ou seja maiores distâncias que dificultam o acesso a pedestres e favorece o uso do transporte individual (Barros e Medeiros, 2014). A variável conectividade média revela a “quantidade média de conexões existentes em um mapa axial. Sabe-se que há uma vigorosa associação entre a forma de articulação das malhas viárias e os potenciais de acessibilidade encontrados para os eixos em um mapa axial” (Holanda e Medeiros, 2008). O valor mais alto de Budapeste pode indicar que as possibilidades de movimento são menos restritas em Budapeste do que em Brasília. A profundidade média indica o número médio de alterações de direção que são necessárias para se ir de um ponto qualquer a outro dentro do sistema. Medeiros (2006) explica que esta variável representa o “o grau médio de facilidade ou dificuldade de se alcançar um eixo” e que a comparação deste entre distintos sistemas, indica maior ou menor “efeito labiríntico” das cidades. O valor maior 26

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corresponde ao sistema possivelmente mais labiríntico, no caso, Brasília possui maior valor que Budapeste. Os valores de Integração global (Rn HH) do sistema indicam importantes características do traçado urbano, aspectos de dispersão e compacidade, ortogonalidade e organicidade, além de possuírem influência do tamanho e contexto topográfico da cidade. Os valores de integração atribuídos a cada linha são expressos graficamente num mapa cromático, nos quais as cores variam entre azul e vermelho, sendo que cores mais quentes representam as áreas mais acessíveis. Os valores contemplam: “o cálculo de todos os trajetos possíveis dentro de um sistema e avaliam a gradação de acessibilidade potencial. (…) Esta acessibilidade indica a distância topológica de cada uma das vias para todas as outras do sistema – em termos de mudança de direção, com medidas posteriormente normalizadas. Dessa forma, emergem vias que são mais rasas, isto é, mais próximas de todas as outras. (…) significa que são mais facilmente alcançáveis.”³1

Barros e Medeiros (2014) consideram importante verificar a “disposição do conjunto de eixos mais integrados”, considerados pelos autores como a banda cromática vermelha no mapa de integração global, que conformam o chamado “núcleo de integração”. Os autores explicam que essas áreas mais acessíveis, tendem a concentrar mais usos, como comércio e serviços, caracterizando potenciais centralidades urbanas. Considerando o mapa de integração global e os núcleos de integração de cada sistema, pode-se analisar visualmente a correspondência entre as vias potencialmente mais acessíveis e entre o as vias que são realmente as de circulação mais usual, e ainda com os mapas de hierarquia viária, nas quais as principais vias representam aquelas cuja utilização prioritária é a desejada ou projetada pelos respectivos órgãos de gestão das vias. O núcleo de integração de Brasília corresponde à via EPIA e o conjunto de eixos que se distribuem ao longo dela. “Este eixo, que margeia o Plano Piloto, assume o papel de articulador de todos os fragmentos urbanos que compõem 3 Barros e Medeiros, 2014, p.289. 27


o Distrito Federal.” (Barros e Medeiros, 2014). Conforme Holanda e Medeiros (2008), os setores centrais – incluindo o Plano piloto, que concentra a maior parte dos empregos – nunca corresponderam ao centro morfológico do sistema urbano, o ponto mais acessível desde todo o conjunto viário. Assim, apresentam Brasília, como excêntrica, por possuir três centros distintos, um CBD, um centro demográfico e um centro morfológico, assim há em média longas distâncias entre áreas residenciais e entre locais de moradia e empregos. No entanto, apesar de o Plano Piloto concentrar empregos e serviços, Barros e Medeiros (2014) observam que “grandes equipamentos urbanos associados a centralidades contemporâneas dispõem-se ao longo da EPIA”, como a nova rodoviária, uma estação de metrô, shopping centers e hipermercados. Em Budapeste, os eixos mais integrados, em cores mais avermelhadas, correspondem aos anéis e eixos radiais que estruturam a cidade, no lado de Peste. O rio Danúbio que divide a cidade dificulta a existência de mais conexões na região mais central da cidade, além disso, Buda possui traçado mais irregular, dada sua topografia, o que implica eixos em geral menos integrados que aqueles situados em Peste. Budapeste possui um centro ativo principal (Bertaud, 1999) e este centro está numa área bastante acessível da cidade, grosso modo compreendido no núcleo de integração potencial da cidade. Considerando o ponto mais acessível dos sistemas como o ponto médio do eixo com maior valor de integração global, pode-se comparar a distância entre este ponto (como representativo do centro morfológico) e os CBDs das cidades. Em Budapeste, a distância entre esses dois pontos é de 3,8 km, menor do que a observada entre os mesmos pontos em Brasília, 10,3 km (Holanda e Medeiros, 2008). Ou seja, Budapeste tem seu centro ativo, numa situação de acessibilidade potencial mais favorável do que o centro de Brasília. As figuras 15 e 16, são ampliações dos mapas axiais, nas áreas centrais das cidades, com indicação dos respectivos CBDs e centros ativos em cada caso.

28

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10,3

km Figura 15. Mapa axial do DF, variável integração global.

3,8 k

m

Figura 16. Mapa axial de Budapeste, variável integração global.

N

CBD Centro morfológico (ponto central do eixo mais integrado)

0

1km

5km

29


Densidades O DF possui em geral baixas densidades, sendo que as densidades mais altas estão fora do centro da cidade. O Plano Piloto, que é o centro político e econômico da cidade, onde a maioria dos empregos estão localizados possui baixas densidades, entre 50 e 100 habitantes por hectare (figura 17). Esse padrão pode ser explicado pela segregação espacial de usos e também pelas extensas áreas livres ou destinadas à circulação, além das extensas áreas sem ocupação entre diferentes regiões administrativas. Holanda e Medeiros (2008), apontam características de Brasília que são obstáculos à mobilidade urbana: a distribuição das densidades demográficas, a dispersão de áreas ocupadas entremeadas com áreas sem uso urbano e a perversa relação entre a localização de postos de trabalho e residências (82% dos empregos formais e 44% do total de empregos concentrados no Plano Piloto, área em que vive apenas 10% da população metropolitana). Para os autores, com esse panorama, a infra-estrutura de transportes é subutilizada e há intensa mobilidade pendular entre áreas periféricas e central. Em Budapeste, as densidades demográficas são em geral maiores do que em Brasília, e como em Brasília há um centro forte, onde está a CBD da cidade, porém aí as densidades são as mais altas. Bertaud (1999) aponta que: “A estrutura urbana atual é extremamente monocêntrica. A densa área central da cidade abriga cerca de 500 000 pessoas, 26% da população da cidade. A densidade cai para um nível suburbano a apenas 4 km do centro do CBD. Esta queda de densidade é causada pelas grandes áreas de uso não-residencial e pela baixa densidade de parte da zona habitacional localizada nesta área.”4 (1(li

Estas grandes áreas citadas são parques, áreas industriais e áreas ferroviárias. As densidades diminuem progressivamente a partir do centro para a periferia, no entanto, há alguns focos distantes de alta densidade (figura 18), geralmente localizados ao longo das principais vias radiais, que ligam estas áreas ao centro. 4 “The current city structure is strongly monocentric. The high-density core of Budapest includes about 500 000 people or 26% of the city population. (...) The density drops suddenly at a suburban level at only 4 kilometers from the center of the CBD. This density drop is caused by the large areas of non-residential use and by the low density of part of the housing stock located in this area.” Bertaud, 1999, p. 2 30

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Bertaud e Malpezzi estudaram em 2003, o perfil de densidades relacionadas com as distantes desde o centro da cidade (CBD). Conforme o estudo, os autores constataram que Budapeste apresenta um comportamento comum à maioria das cidades, porém Brasília é uma exceção. Os gráficos da figura 19 mostram que a maioria das pessoas que vivem em Budapeste estão numa áreas mais central, enquanto que em Brasília, ocorre o oposto. As figuras 20 e 21 ilustram a ocupação dos centros das cidades. Em 2010, Bertaud estuda novamente o caso de Brasília. Ele explica o padrão natural e o padrão de densidades incomum encontrado na cidade, que é um ponto negativo para o seu desenvolvimento: “Este perfil é encontrado em cidades fortemente monocêntricas, bem como em cidades policêntricas. Esta convergência na estrutura espacial urbana em todo continente não é criado pelo desenho dos planejadores urbanos, mas através das forças de auto-organização criada pela oferta e pela demanda por terra. Em algumas cidades, redes de infraestrutura e topografia podem perturbar a simetria de gradientes de densidade, mas a diminuição da densidade com a distância em relação ao centro é encontrado em toda parte. O perfil da densidade populacional nas áreas urbanizadas de Brasília, medido a partir do centro do Plano Piloto em direção à periferia explica o problema estrutural enfrentado hoje pelos habitantes de Brasília e pelos gestores da cidade que têm de entregar um transporte e serviços urbanos de forma eficiente. Este padrão espacial peculiar aumenta distâncias de transporte e viagens pendulares e o comprimento das redes de infraestrutura. Por causa da baixa densidade dispersa que caracteriza Brasília, carros serão sempre uma parte importante do sistema de transporte”.52

5 “This profile is found in strongly monocentric cities as well as in polycentric cities. This convergence in urban spatial structure across continent is not created by urban planners’ design but through the selforganizing forces created by supply and demand for land and floor space. In some cities, infrastructure and topography may disturb the symmetry of density gradients but the decrease of densities with distance is encountered everywhere. The profile of population densities in the built-up areas of Brasilia, measured from the city center of the Plano Piloto toward the periphery explain the structural problem faced today by the inhabitants of Brasilia and by the cities managers who have to deliver efficient transport and urban services . This peculiar spatial pattern lengthens transport distance and commuting trips and the length of infrastructure networks. Because of the dispersed low density that characterizes Brasilia, cars will always be an important part of the transport system.” Bertaud, 2010, p.7 31


0

5km

20km

Figura 17. Distrito Federal, densidades demográficas. Fonte: Adaptação da autora (dados: PDTU 2009).

Habitantes/hectare 0 a 50 50 a 100 100 a 250 250 a 700

N

0

32

1km

5km

Figura 18. Budapeste, densidades demográficas. Fonte: Adaptação da autora (dados: Plano Budapeste 2030).

MOBILIDADE URBANA:CIDADE MODERNA VERSUS CIDADE TRADICIONAL, OS CASOS DE BRASÍLIA E BUDAPESTE


Budapeste

Densidades (habitanes/ha)

Brasília

Distância desde o CBD (km) Figura 19. Perfil de densidades demográficas em relação ao centro das cidades. Fonte: BERTAUD e MALPEZZI (2003).

Figura 20. Extensas áreas verdes e baixa densidade no centro de Brasília. Fonte: <http://www.skyscraperlife. com/city-versus-city/89356-brasile%D1-3%BA-6%BA-vs-hispanics-2014-a-26.html>

Figura 21. Alta densidade construída no centro de Budapeste. Fonte: <http://hu.wikipedia.org/wiki/Budapest>.

33


Diversidade e distribuição de usos Numa visão mais ampla, tem-se todo DF e Grande Bupapeste (figuras 22 e 23). Observa-se que no DF a maior parte da área agrícola e maiores reservas ambientais estão localizadas perimetralmente à maior mancha de ocupação urbana. Já no caso da Grande Budapeste, tem-se o uso agrícola e áreas de bosques e reservas entremeados aos núcleos urbanos. Não há como no DF, grande extensão de área urbana ainda não ocupada. Sobre o Plano Piloto, Costa não mencionou que o uso misto não é permitido, mas o resultado de seu plano é que são definidos os usos para cada setor. Os órgãos e entidades do governo, bancos, hospitais, universidades, estabelecimentos comerciais de médio e grande porte e indústrias estão localizadas em áreas específicas, em geral sem uso residencial concomitante. Nas demais regiões administrativas, o padrão é o mesmo, a setorização de funções, no entanto a proporção de áreas dedicadas ao uso misto, comercial e institucional é menor que no Plano Piloto e os estabelecimentos são majoritariamente de caráter local. Este cenário pode explicar a realidade da distribuição dos empregos no DF, tem-se que cerca de 70% dos empregos estão concentrados no Plano Piloto, enquanto que mais de 80% da população vive fora dele (Alves, Santos e Kneib, 2009). Em Budapeste há o predomínio de uso misto no centro da cidade, como na maioria das cidades europeias. Há na mesma região áreas residenciais de alta densidade, comércio e edifícios institucionais. O uso industrial, ferroviário e agrícola são segregados espacialmente, estes estão entremeados à malha urbana na cidade e se configuram como barreiras aos caminhos de pedestres e ciclistas. Não há na cidade muitos espaços verdes como em Brasília. Predominam nos demais núcleos urbanos, comércio e serviços de abrangência local. Como ocorre com o Plano Piloto, Budapeste concentra a maior parte dos empregos dentro da Grande Budapeste, porém, concentra 70% da população (KSH).

34

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Figura 22. Distrito Federal, usos do solo Fonte: Adapatação da autora (dados: PDOT, 2009).

Usos predominantes ocupação urbana atual zona urbana não ocupada bosques e áreas de proteção ambiental agricultura Limites territoriais Principais vias Hidrografia

N

Figura 23. Grande Budapeste, usos do solo. Fonte: Adaptação da autora (dados: http://www.terport.hu/kiemelt-tersegek/budapesti-agglomeracio).

0

5km

20km

35


0

0,5km

2km

Sobradinho

Plano Piloto

Ceilândia 0

0,5km

2km

Figuras 24, 25 e 26. Plano Piloto, Ceilândia e Sobradinho, usos do solo predominantes. Fonte: Adaptação da autora (dados: LUOS DF). 36

2km

Usos predominantes residências comércio e serviços misto instituições indústrias cultura áreas verdes, parques, praças, esportes bosques e áreas de proteção ambiental agricultura Limites territoriais Hidrografia

N

0

0,5km

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Não foram encontrados mapas detalhados sobre o uso do solo em todo o DF e grande Budapeste. Contudo, os mapas parciais apresentam os padrões existentes. Quanto ao DF, tem-se como exemplos o Plano Piloto, centro econômico e outras duas regiões administrativas, Ceilândia (bairro mais populoso) e Sobradinho (figuras 24, 25 e 26) . É possível observar que há grande concentração de áreas institucionais no Plano Piloto, que abrigam o aparato administrativo distrital e federal, além de universidades, hospitais e outros serviços de abrangência regional. Tem-se o mapa de Budapeste (figura 27), onde se observa que é permitido uso misto em todo o centro da cidade. No detalhe da região central (figura 28), tem-se vários usos concomitantes, sem um ordenamento e separação claras como nos bairros do DF.

N

0

0

1km

0,5km

2km

5km

Figuras 27 e 28. Budapeste, usos do solo permitidos e área central, uso efetivo. Fonte: Adaptação da autora (dados: Plano Budapeste 2030). 37


Redes de transporte público O sistema de transporte público no Distrito Federal é composto por 982 linhas de ônibus (2009), um eixo de BRT (Bus Rapid Transit - Veículo rápido sobre rodas) e duas linhas de metrô. O número médio de passageiros foi de 1.267 milhão de passageiros por dia em 2009 (PDTU 2009). O serviço de ônibus (figura 29) cobre toda a área do DF com ocupação urbana e serviu 1.103 milhões de passageiros por dia em 2009, o que significa 87% do total de passageiros. No entanto, a capacidade total dos ônibus era 1,760 milhões de passageiros por dia, de acordo com o DFTRANS (Transporte Urbano do Distrito Federal). As linhas de metrô (figura 30) foram inauguradas em 2001. Elas conectam a área central com as regiões sul e sudoeste do Distrito Federal, áreas que abrigam a maioria da população. As linhas começam na Estação Terminal Plano Piloto e uma termina em Ceilândia e a outra em Samambaia. Hoje, o sistema de metrô tem 42,38 km de extensão e atende cerca de 151 mil passageiros por dia (dias úteis). A linha de BRT (figura 31), chamada BRT Sul, é um eixo com 43 km (35 km de faixa exclusiva para ônibus), terá capacidade para 20.000 passageiros por hora nos horários de pico e 87 mil passageiros por dia (DFTrans). Foi inaugurado em abril de 2014 e ainda não está em plena operação. Estão previstas a construção das infraestruturas para mais três eixos de BRT, uma linha de bonde (VLT-Veículo leve sobre trilhos) e da extensão da linha de metro em direção ao norte, até o final da Asa Norte. O principal nó do sistema de transporte público é a Rodoviária do Plano Piloto, a partir dessa estação há linhas para todas as outras regiões administrativas e para os municípios vizinhos. A maioria dos ônibus vai do Plano Piloto para algum extremo da área urbanizada. De modo que, as pessoas geralmente têm que trocar de ônibus na estação central. Há também terminais em outras regiões administrativas. A gestão do transporte público em Brasília tem dificuldades decorrentes da configuração da cidade, da dispersão dos núcleos e da concentração de atividades

38

MOBILIDADE URBANA:CIDADE MODERNA VERSUS CIDADE TRADICIONAL, OS CASOS DE BRASÍLIA E BUDAPESTE


no Plano Piloto. Alves, Santos e Kneib (2009) explicam essas dificuldades: “(...) entre o início e o fim de um trajeto, constatam-se duas realidades distintas: de um lado, o Plano Piloto, que concentra 70% da oferta de empregos no DF e apresenta altos índices de qualidade de vida; no outro extremo, as Regiões Administrativas, que concentram mais de 80% da população do DF. As distâncias que os trabalhadores percorrem, diariamente, de casa para o trabalho, a falta de renovação de passageiros ao longo dos itinerários e a concentração das viagens nos horários de pico são características do transporte no DF. Cerca de 60% das viagens estão concentradas nos horários de pico, para uma distância média de 49 km entre o Plano Piloto e as Regiões Administrativas. (....) Isso representa uma necessidade muito grande de equipamentos no período de pico, trabalhadores e veículos ociosos nos demais períodos, disfunções no sistema, o alto custo das passagens e dificuldades na racionalização dos serviços e na viabilização de novas linhas.”61

Em Budapeste, o sistema é composto por metrô, ônibus, ônibus elétricos e bondes (VLT), linhas ferroviárias suburbanas e serviço de transporte por barcos, além de alguns modos especiais: a ferrovia de cremalheira, um funicular, e um teleférico. A rede de transportes públicos de Budapeste, como as de outras grandes cidades, é estruturado hierarquicamente, com a rede ferroviária de alta velocidade no topo. Em 2008, o número médio de usuários foi de cerca de 3,5 milhões por dia. A rede de ônibus é composta por 237 linhas e mais 15 linhas de ônibus elétricos, que cobrem toda a área de Budapeste (figura 32). A rede é composta principalmente por linhas de ligação entre as linhas da rede ferroviária de alta velocidade e de bondes e destas, aos bairros mais distantes. A rede ferroviária de alta velocidade (figura 33) é composta por quatro linhas de metro dispostos a partir da área central e oito linhas ferroviárias suburbanas, que conectam Budapeste a outras pequenas cidades e vilas que compõem a região metropolitana. As linhas de bondes (figura 33) complementam a rede ferroviária de alta velocidade. A rede é extensa, 32 linhas, estas ocupam principalmente o sistema viário principal, seus anéis e eixos transversais. 6 Alves, Santos e Kneib, 2009, p. 213 39


A tabela a seguir resume valores referentes às duas cidades. Em Brasília, há aproximadamente três vezes mais linhas de transporte público, porém a média de passageiros por dia é cerca de três vezes menor. nº de linhas de ônibus

982

252

nº de eixos de BRT

1

-

nº de linhas de metrô nº de linhas de trem nº de linhas de bonde nº total de linhas média de passageiros por dia

2 985 1.267.000 (2009)

4 8 32 296 3.500.000 (2008)

Figura 29. Rede básica de ônibus no DF. Fonte: PDTU 2009.

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metrô linha Ceilândia metrô linha Samambaia metrô futura extensão

Figura 30. Rede de Metrô no DF. Fonte: <http://www.metro.df.gov.br/>.

Corredor com via exclusiva

Estações intermediárias

Marginais com paradas à direita

Terminais de integração ônibus-ônibus

Corredor com tráfego compartilhado

Terminal de integração ônibus-metrô

Linha de metrô

Figura 31. Linha BRT Sul no DF. Fonte: <http://www.brtsul.com.br/galeria/page/3/>

41


ônibus

metrô bonde trem

Figuras 32 e 33. Redes de transporte público em Budapeste. Rede básica de ônibus (acima) e redes de metrô, metrô, VLT e trens (abaixo) incluindo tempo médio de viagem. Fonte: Plano Budapeste 2030.

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Estatísticas - Como as pessoas se locomovem nessas cidades? Uma fonte de informações sobre como as pessoas se movem dentro das cidades são dados estatísticos. Dois dados importantes são a repartição modal (modal split) e a taxa de motorização. A repartição modal representa as proporções variáveis ​​de diferentes modos de transporte que podem ser utilizados a qualquer momento. Modos de transporte podem ser vistos como concorrentes, particularmente na rivalidade entre automóveis privados e sistemas de transporte público. A escolha por um modal pode decorrer de vários motivos, tais como distâncias, conforto, segurança, custos, destinos, capacidades e frequências dos modos. Em Brasília, em 2009, 43% das viagens foram feitas por veículos particulares, 36% por transporte público e 23% por transporte não motorizado (PDTU 2009). O relatório final do Plano Diretor de Transporte Urbano e Mobilidade de 2010, mostra que dentro do DF, as viagens de veículos privados corresponderam a 77% dentre as realizadas por veículos motorizados e a 53% entre a capital e seus arredores. Esta discrepância pode representar que as classes de menor renda vivem nos locais mais remotos do centro e tem sido os maiores usuários de transporte público. Segundo o EPOMM (European Platform on Mobility Management) em Budapeste, em 2011, 20% das viagens foram feitas por carros particulares, 47% por transporte público e 33% por meios não motorizados. Entre as viagens motorizadas, dentro dos limites de Budapeste, 40% das viagens foram feitas por transporte privado e entre Budapeste e seus arredores, esse número aumenta para 67% (BKK). As longas distâncias entre Budapeste e demais núcleos urbanos pode ser a justificativa do maior uso de tranporte privado. Os gráficos a seguir resumem a comparação entre Budapeste e Brasília. Em Budapeste, tanto o uso de meios não motorizados como o de transporte público é maior do que em Brasília (figura 34). No entanto, em ambas as cidades o percentual de uso de carros particulares ampliou-se nos últimos anos, sendo a taxa de aumento maior em Brasília do que em Budapeste (figura 35).

43


60% Brasília Budapeste 45%

30%

15%

0 Veículos motorizados particulares

Transporte público

Pedestres

Cicilistas

Figura 34. Repartição modal, Brasília (2009) e Budapeste (2011). Fonte: Org. da autora (dados: PDTU 2009 e EPOMM)

80%

60%

Brasília - 25 a 77% 40%

Budapeste - 20 a 40% 20%

0 1990

1995

2000

2005

2010

Figura 35. Brasília e Budapeste, evolução do uso de veículos privados dentre as viagens motorizadas. Fonte: Org. da autora (dados: Rocha Neto, 2012 e BKK)

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A taxa de motorização é definida como o número de veículos automotores a cada 1.000 habitantes. É um indicador comum nas comparações internacionais de desenvolvimento econômico e para as questões ambientais. Em Budapeste, em 2012 havia 330 veículos particulares para cada 1000 habitantes (KSH, 2012). O DF, em julho de 2012, possuía uma frota 1.385.229 veículos, o que significa que a taxa de motorização é 523 veículos por 1000 habitantes, de acordo com um relatório do Observatório das Metrópoles. O gráfico da figura 36 mostra uma comparação entre os valores das duas cidades entre 2001 e 2012. Brasília tem cerca de 67% mais carros proporcionalmente à população que Budapeste. Deve-se realçar novamente que o uso de transporte público e modos não motorizados podem ser reflexos da configuração espacial das cidades, como cobertura e acessibilidade ao transporte público e incentivos ao pedestrianismo. Porém, há vários outros aspectos que influenciam estes números de repartição modal e taxa de motorização, características ligadas aos contextos econômico, histórico e cultural de cada cidade.

nº de veículos/1000 habitantes

600

450

300

150 Brasília Budapeste

0 2002

2004

2006

2008

2010

Figura 36. Brasília e Budapeste, evolução da taxa de motorização entre 2001 e 2012. Fonte: Org. da autora (dados: Rocha Neto, 2012, IBGE e KSH)

45


CONCLUSÃO Sobre a configuração das cidades, tem-se que ambas vêm sofrendo um processo de suburbanização, com áreas residenciais cada vez mais distantes do centro. Tanto o DF como a Grande Budapeste são compostos por núcleos urbanos dispersos no território, que podem estar a longas distâncias dos centros das metrópoles, conectados por caminhos que atravessam vazios, ora sem utilização humana ora áreas de cultivo agrícola ou de proteção ambiental. No entanto, no caso da Grande Budapeste, o núcleo de aglomeração urbana central, a capital, é mais compacto e apresenta maiores densidades do que o Plano Piloto, o centro de Brasília. Ou seja, mais pessoas moram próximas a região de maior concentração de comércios, serviços e instituições públicas. Em Budapeste, conforme análise baseada na Sintaxe Especial, a região potencialmente mais acessível corresponde ao centro da cidade, enquanto que em Brasília, o centro morfológico está distante do CBD, a mais de 10km. Além disto, os índices gerais de integração, compacidade e conectividade são melhores para Budapeste. A distribuição dos usos pela cidade é mais flexível em Budapeste, o centro da cidade é uma zona de uso misto. Brasília, por sua vez, não possui uso misto na área central, ao contrário, as atividades são estritamente reguladas. Em ambas as cidades, a distribuição dos usos provoca dificuldades à circulação de pedestres e ciclistas. Em Brasília, há extensos vazios, áreas verdes entre os diversos setores, que provocam longas distâncias e em Budapeste, a presença de áreas industriais e ferrovias comprometem a mobilidade na cidade, sendo barreiras. No entanto, essas mesmas áreas, apresentam aspectos positivos, pois contribuem para a geração de empregos fora do centro e as ferrovias conectam boa parte dos subúrbios diretamente ao centro. A malha urbana é mais integrada e favorece a cobertura e distribuição das redes de transporte público em Budapeste, há distâncias menores a serem percorridas, bem como menores distâncias entre os principais corredores. As estatísticas apresentadas mostram que em ambas as cidades o uso de veículos particulares vem aumentando, no entanto o caso de Brasília parece mais grave. O uso de transporte público e meios não motorizados é maior em Budapeste do que em Brasília, onde o uso de veículos particulares é a predominante e a proporção de carros em relação à população é maior. 46

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Importante salientar que os dados considerados para a comparação entre as configurações urbanas e suas implicações sobre a mobilidade nessas cidades são limitados e que estudos ampliados e mais aprofundados são essenciais para uma maior compreensão do tema. A parte essa consideração, é possível observar, a partir das informações apresentadas, que há indícios de que configuração de Budapeste (maior compacidade, diversidade de usos, centro mais acessível e mais denso, menores distancias para a maioria das pessoas), propicia melhores condições de mobilidade e acessibilidade urbana do que a configuração de Brasília, que possui características decorrentes direta ou indiretamente do seu desenho moderno (separação de usos/funções, baixas densidades, malha viária muito ramificada, muito espaço para veículos, longas distâncias entre diversos núcleos de ocupação urbana e entre funções diversas). Confirma-se então com os estudos de caso apresentados o que a literatura consultada propõe: apesar de haver outros fatores que condicionem a mobilidade urbanas, a configuração da cidade é fator essencial. Mais uso misto, densidades urbanas mais altas e menores distâncias entre os locais de trabalho e áreas residenciais implicam em menor necessidade do uso de transporte motorizado, incentivo ao pedestrianismo e aos ciclistas, bem como menor comprimento da infraestrutura de transportes, o transporte público pode ser melhor distribuído e mais rápido, com menos custos. Pode-se constatar que em ambos os casos, tem-se pontos positivos e negativos para a mobilidade urbana, conforme o refencial teórico e informações analisadas, e que essas, como talvez várias outras metrópoles têm um desafio: o planejamento permanente e integrado entre os sistemas de mobilidade/transporte e de uso e ocupação do solo. Planejamento este que busque costurar os diversos tecidos que compõem a malha urbana, promovendo melhor distribuição da ocupação urbana e seus usos no território, com menores distâncias entre as diversas atividades e variedade de possibilidades de trajetos entre elas, com prioridade à escala dos meios de locomoção não motorizados. Assim, é possível atingir níveis mais altos de sustentabilidade em relação à mobilidade urbana.

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