HORIZONTEÀVISTA
A conquista
DO TOPO
ESCALADORES BRASILEIROS ABREM UMA NOVA VIA NA PAREDE MAIS ÍNGREME DO MONTE RORAIMA TEXTO NATÁLIA MARTINO
E
m meio à Floresta Amazônica, na tríplice fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana, ergue-se o Monte Roraima. O extenso topo plano e as bordas escarpadas classificam o monte como tepui (tipo de montanha com forma de “mesa”) e os 2.734 metros de altitude fazem dele o sétimo ponto mais alto do Brasil. A medida é 5 metros menor do que se alardeava e está de acordo com a mais recente medição do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizada em 2005. Para alcançar o topo, o caminho mais fácil se inicia no lado venezuelano do Monte Roraima, que abriga a única trilha que chega ao topo do tepui. Os brasileiros Eliseu Frechou, Márcio Bruno de Almeida e Fernando Leal não escolheram o caminho mais fácil e se tornaram os primeiros brasileiros a escalar, entre 10 e 22 de janeiro de 2010, o Monte Roraima pelo seu lado mais íngreme, em território da Guiana. Em 2008, os brasileiros tentaram escalar o monte, mas não obtiveram sucesso por causa da dificuldade logística para atravessar a floresta e alcançar a montanha. Dessa vez, para evitar esse problema, o grupo chegou de helicóptero à base do monte e iniciou a escalada dos 650 metros que os levariam ao topo 12 dias depois. O grupo dormiu em barracas amarradas à rocha e se alimentou com comida liofilizada preparada com água da chuva durante toda a escalada. Uma das maiores dificuldades enfrentadas foi a elevada umidade, bem acima do que esperavam, segundo Eliseu Frechou.
FOTO ELISEU FRECHOU
A grande quantidade de insetos também dificultou a subida. “Nunca tinha visto escorpiões em paredes. No Monte Roraima, encontramos cinco”, lembra. O escalador afirma, ainda, que nos primeiros 200 metros a vegetação e a umidade deterioraram a parede e grandes blocos de pedra se soltavam durante a escalada, “alguns do tamanho de um carro”, explica Frechou. O isolamento, a umidade e as pedras soltas são os grandes desafios dos escaladores que pretendem chegar ao topo do Monte Roraima por qualquer de seus lados. Até mesmo em vias que não apresentam paredes tão íngremes ou negativas, os blocos soltos estão presentes, graças ao quartzito, que tende a “apodrecer” diante da umidade. A primeira via de escalada no monte foi aberta somente em 1884, pelo botânico inglês Everard Im Thurn. A rampa encontrada por ele é uma espécie de degrau formado por um desmoronamento das camadas de rocha. Essas dificuldades, aliadas aos desafios técnicos oferecidos pela grande inclinação negativa do paredão, fizeram da expedição realizada por Eliseu Frechou, Márcio Bruno de Almeida e Fernando Leal um marco para a escalada brasileira. Frechou ressalta a grande preparação necessária para enfrentar o desafio: só a lista de checagem de equipamentos e comida continha mais de mil itens. O material somava cerca de 200 quilos de bagagem – o que complicou ainda mais a expedição. “Foi uma vida inteira de preparação para que fosse possível fazer uma escalada com esse grau de dificuldade”, diz Frechou.
O Monte Roraima é o sétimo ponto mais alto do Brasil. A única trilha que leva a seu topo exige uma caminhada de cerca de seis dias 12 HORIZONTE GEOGRÁFICO
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O sétimo ponto mais alto do Brasil está situado no Parque Nacional do Monte Roraima, área de dupla afetação, ou seja, de administração compartilhada entre duas instituições. Desde a demarcação da Terra Indígena Raposa/ Serra do Sol, em 2005, o Parque do Monte Roraima está sob a jurisdição do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, autarquia do Ministério do Meio Ambiente, e da Fundação Nacional do Índio (Funai). O decreto que definiu a dupla afetação assegurou à comunidade indígena ingaricó a participação na gestão do parque. Sendo assim, começou a ser elaborado um plano de administração compartilhada, com previsão de participação efetiva de todos os povos indígenas da região, e não apenas da etnia predominante ingaricó. O plano está agora sendo apreciado pela Funai e pelo Instituto Chico Mendes. Se aprovado, será encaminhado para a apreciação dos ministérios do Meio Ambiente e da Justiça e, posteriormente, seguirá para a sanção do presidente. Os objetivos do novo plano de gestão são fortalecer a cultura indígena e proteger a biodiversidade do parque, mas ainda não existem dados concretos, já que será a primeira vez que tal modelo será utilizado no país. Além do Parque Nacional do Monte Roraima, apenas o Parque Nacional do Araguaia está sob o regime de dupla afetação.
MARCIO BRUNO OLIVEIRA
ELISEU FRECHOU
Parque sob novo modelo de gestão
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Os escaladores brasileiros levaram quase 200 quilos de bagagem e dormiram 12 noites em barracas presas ao paredão