Revolucao de 1932 em sao joao da boa vista

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1932

em São João da Boa Vista

Publicação sugerida pela Academia de Letras de São João da Boa Vista, em comemoração aos 80 anos do Movimento Constitucionalista. Coordenação: Francisco de Assis Carvalho Arten Capa, diagramação e iconografia: Neusa Maria Soares de Menezes Produção: Lucelena Maia Fotos: Acervo Tita Oliveira Acervo Museu Histórico Armando de Salles Oliveira Acervo Antônio Carlos Lorette Acervo Cidinha Dezena Acervo Herbert Levy Acervo Academia de Letras de São João da Boa Vista Revisão: Vedionil do Império

Academia de Letras de São João da Boa Vista 2012 www.alsjbv.com.br academiadeletras@alsjbv.com.br fdaca@uol.com.br nmsmenezes@alsjbv.com.br lucelena@netsite.com.br


Capa: No pátio da E.E. Joaquim José, o Comandante Romão Gomes posa ao lado de soldados e voluntários. A escola havia sido requisitada como quartel administrativo das tropas constitucionalistas. No dia 6 de setembro, após o recuo dos paulistas, a mesma escola serviu de quartel à tropa federal. Os paulistas reocuparam o prédio no dia 12 de setembro, quando da retomada da cidade.



Como diz Maria Sguassábia em mensagem deixada aos sanjoanenses: foi ontem. Os comícios atraem multidão para ouvir oradores indignados com a ditadura. As famílias, antes de lamentar, sentem orgulho do filho que parte para a guerra. As mulheres se organizam. As crianças se alvoroçam: querem participar. Os mais velhos tentam empolgar os mais novos. E quando alguém precisa de ajuda, todas as mãos se estendem. E na desventura, quando algum tomba, sem exceção, todos choram. Nunca São João da Boa Vista esteve tão unida e solidária como em 1932. Só tamanha união explica seu feito épico: ter sido a única a vencer nos campos de batalha a guerra que São Paulo só venceu no campo moral. Para Gilberto Freire, estudar a história “leva-nos perto, o mais perto possível dessa eterna fugitiva, sempre a esvair-se deixando apenas o perfume: a verdade”.

Eric Hobsbawn diz que “o historiador deve lembrar coisas que a sociedade insiste em esquecer”. Penso que a história é fundamental para entender a vida. O sanjoanense sonhou um só sonho, acreditou nele, lutou por ele e sofreu unida nas horas de angústia e derrota. Por todo canto exalava-se um amor desenfreado pelo ideal constitucionalista, pela liberdade e pelos direitos ultrajados. Escrever sobre este momento foi prazeroso. Dar voz aos heróis de 32, faz-nos sentir dotados do poder de ressuscitar os mortos, dando a eles a oportunidade de falar às novas gerações sobre seus ideais, angústias e crenças. E suas vozes continuam fortes e corajosas, 80 anos depois.

(Francisco Arten, professor e presidente da Academia de Letras de São João da Boa Vista)


São João da Boa Vista marcou importante presença no cenário do Estado de São Paulo na Revolução Constitucionalista de 1932, e dela se serve para reviver os acontecimentos - provavelmente sem a exaltação cívica da época e sem o mesmo entusiasmo pelas demonstrações de eficiência com que os civis aderiram ao movimento – buscando fortalecer a ideia de preservação da memória, por esta respeitável história que se abrirá nas próximas 80 páginas, em que a cidade se apresenta com personagens que fizeram e ficaram na biografia do País. Não tivéssemos história para contar, nada saberíamos do Brasil épico que passou a refletir sobre si próprio e seu destino, após a Revolução Constitucionalista. O povo é protagonista dos acontecimentos, mas tornar-se-á esquecido na história e a história no tempo se imagens e textos não

forem juntados como garantia da memória do fato. Por isso, mais uma vez engajei-me, juntamente com o Presidente Arten e a confreira Neusa Menezes, a realizar um projeto, de minha parte, buscando nos amigos da cultura protetores das letras, ciências e arte – o apoio para que nossa missão fosse cumprida. As logomarcas na contracapa deste livro são respostas de credibilidade à história, mas também de generosidade para conosco. Pensando assim, reforço o agradecimento, em nome da Academia de Letras: Patrocinadores, muito obrigada por acreditarem no livro que lhes foi apresentado antes mesmo de estar pronto!

(Lucelena Maia - Academia de Letras de São João da Boa Vista, romancista e poeta)


Ao pesquisar a história da Revolução Constitucionalista de 1932 na região de São João da Boa Vista, fiquei fascinada pela saga de uma mulher, chamada Stela Rosa e que na pia batismal teve acrescentado Maria em seu nome, viúva, com uma filha de 10 anos de idade, professora primária, destemida e corajosa. Lecionava na pacata fazenda Paulicéia, quando o local fora requisitado para tornar-se um quartel, em virtude da proximidade com a fronteira com Minas Gerais. Maria começou a interessar-se pelo movimento da guerra, pois seu irmão encontravase aquartelado nesta fazenda. Quando, ao perceber que os jovens soldados estavam apavorados diante da incerteza trazida pela guerra e começaram a desertar, vestiu a farda do irmão, soldado voluntário e entrou escondida no caminhão, quando este

passou rente à escola onde ela lecionava. Era um entardecer... Não sabia atirar e aprendeu tudo a duras penas, já dentro de uma trincheira. Esta mulher, filha de imigrantes italianos, conservadores, não mediu esforços para dar sua contribuição ao país naquele momento tão conturbado. Pagou um preço elevado por ser mulher e ter prendido um comandante das tropas inimigas. Perdeu seu emprego, mas nunca a dignidade. Desafiou os preconceitos de uma época em que a mulher não tinha nenhum direito, nem sequer ao voto e nos deixou um belíssimo legado: É nossa HEROÍNA!

(Neusa Menezes - Academia de Letras de São João da Boa Vista e pesquisadora)



JOVENS DE 32 Onde estais com vossos ponchos, os fuzis sem munição, os capacetes de aço, os trilhos do trem blindado, o leme de vossas vidas, a saga de vossos passos... Onde estão? Em que ossário vossa audácia fala aos que dormem por fuga, em que campo vossa morte clama aos que morrem em vida, em que luta vosso luto amortalha os tempos novos? Voltai daquelas trincheiras, voltai de vosso martírio, voltai com ou sem aqueles ideais,

voltai com o sangue que destes, voltai com os brios de julho, voltai ao chão ocupado, voltai à causa esquecida, voltai à terra traída, voltai , jovens soldados... Apenas ...voltai! Em boa hora São João da Boa Vista, através de sua Academia de Letras, com a iniciativa das acadêmicas Neusa Menezes e Lucelena Maia, assim como do Presidente Francisco de Assis Carvalho Arten, celebra os 80 anos da Revolução Constitucionalista de 1932. Farta documentação fotográfica e textos inéditos acompanham este resgate histórico de uma época injustamente esquecida. Que o exemplo da Academia de Letras de São João da Boa Vista seja seguido. Não podemos deixar morrer os nossos mortos. Paulo Bonfim


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O QUE FOI A REVOLUÇÃO DE 32

paulistas, promovendo cortes drásticos, procurando enfraquecer a Força Pública, com a retiO principal objetivo da Revolução Consti- rada de seus destacamentos, armas e veículos. tucionalista de 32 era derrubar a ditadura de O governo Federal temia uma possível reação Getúlio Vargas e a promulgação de uma nova de São Paulo ao golpe dado contra o Governo Constituição para o Brasil. Para os paulistas , do paulista Washington Luís. Na época, com desde então, representa a resistência em favor sua Infantaria e Aviação Militar, São Paulo era da democracia. Foram 87 dias de combates, de o segundo maior corpo armado da América La9 de julho a 4 de outubro de 1932, com um tina, perdendo apenas para o próprio Exército saldo oficial de 934 e estimativas não oficiais Brasileiro. A revolta dos militares de São Paulo se acentuou quando foi nomeado para code 2.200 pessoas. A Força Pública, atual Polícia Militar do Es- mandá-los o Major Miguel Costa, pois ele hatado de São Paulo, foi o sustentáculo do Exérci- via sido expulso de suas fileiras em 1924, por to Revolucionário Paulista durante os três me- tentar derrubar o governo Paulista. As intervenções do Governo Federal na ses de confronto. A diferença entre os dois exércitos era gri- Força Pública vinha surtindo efeito e a situatante. A Força Pública, ao entrar no conflito, ção era crítica quando do início do movimento estava com seu arsenal em estado precário, Constitucionalista. A tropa contava com cerca pois desde a Revolução de 1930 não era abas- de 10.200 homens, dispunha de 8.685 fuzis tecido, além de ter sofrido com a eliminação em péssimo estado de conservação. No total de sua Artilharia e Aviação. O Governo Fede- os paulistas contavam com pouco mais de trinral vinha, desde aquele ano, enfraquecendo os ta e cinco mil homens, a maioria, voluntários

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sem nenhum preparo militar. Já do outro lado, o Governo Federal contava com cem mil homens, todos treinados e equipados com farto e moderno equipamento bélico, adquirido no exterior. Portanto, os soldados paulistas enfrentaram com imensa desigualdade as tropas da Ditadura de Vargas, buscando com imenso patriotismo o restabelecimento da democracia. A GUERRA PAULISTA A “guerra paulista” tem uma característica curiosa. A voz amplamente dominante é dos vencidos e não dos vencedores. Enquanto para os primeiros não passou de um ato de rebeldia, para os vencidos foi um exemplo de participação dos cidadãos em defesa dos mais altos ideais. O poeta Paulo Bonfim resume o ideal paulista no poema intitulado “É sempre 9 de julho” quando diz:

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Enquanto houver injustiça; enquanto houver sofrimento; enquanto a terra chorar; enquanto houver pensamentos; enquanto a história falar; enquanto existir beleza; enquanto florir paixão; enquanto o sonho só for sonho; enquanto existir saudade; enquanto houver esperanças; enquanto os mortos valerem; É sempre 9 de julho.”

Na foto, oficiais e voluntários da Coluna Romão Gomes. Entre eles Luiz Quinzani, José Paschoal, Tenentes Adrião e Falcão, Francisco de Bernardis, - sem farda, encarregado da alimentação dos soldados. Ao lado de Francisco de Bernardis, está Roque Fiori.


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O 9 DE JULHO NA REGIÃO

revolução na região de São João da Boa Vista. Sua coluna foi a única invicta em todo Estado. E Na região de São João da Boa Vista a re- o próprio Romão Gomes é quem faz um balanvolução de 1932 teve características diferentes ço da atuação da coluna que comandou: das demais regiões do Estado. A começar pelo “O destacamento em questão, se teve, folíder que aqui comandou os revolucionários: ram vinte mortos e algumas dezenas de feriRomão Gomes. Sobre ele o capitão Herbert dos, não perdeu material e conquistou muito: Levy assim se referiu: deixou apenas sete prisioneiros e fez várias centenas: não abandonou cidades sem ser por “Somente os que tiveram a ventura de ordem superior e conquistou várias. À nossa estar com ele em contato, a princípio, no Pri- tropa, jamais se poderá apontar uma derrota, meiro Batalhão Paulista da Milícia Civil e mais uma retirada imposta pelo adversário.” tarde, sob a bandeira da coluna que tomou o Mas como isso foi possível, se no restante seu nome, serão capazes de avaliar a grande do Estado, São Paulo perdeu? Teria, na região, soma de qualidade com que a providência o maior concentração de homens e de armas? distinguiu”. Ainda é Romão Gomes quem esclarece: “Começamos a luta com 400 fuzis, modelo Herbert Levy era um dos jovens voluntá- espanhol, que é a pior arma do sistema Maurios vindos da capital para combater na região. ser. Só conseguimos obter as duas primeiras Eficiente e disciplinado, chegou ao posto de ca- metralhadoras depois do primeiro contato em pitão. Anos depois, escreveu o livro: ‘A Coluna Guaxupé, pois como se tratava de uma tropa Invicta”, onde relata os feitos da Coluna Romão irregular, composta a princípio exclusivamente Gomes. Herbert Levy foi posteriormente depu- de voluntários, não pareceu prudente, e com tado federal por vários mandatos. razão, à administração da Força Pública, conAo eficiente comando de Romão Gomes fiar-lhe armas automáticas”. também se atribui outra característica única da

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Os adversários na região contavam com renomadas tropas e com uma grande quantidade de armas sofisticadas, segundo Romão Gomes: “A tropa que nos atacou em Guaxupé era composta exclusivamente de policiais mineiros, soldados velhos, tropa aguerrida, o que pudemos verificar pelos prisioneiros que fizemos: um sargento e dois soldados. O seu comandante era o major Lemos, oficial dos mais brilhantes da Força Pública mineira. Mais tarde, em Águas da Prata, eram já outras tropas, além da mineira, que nos atacavam.“ Nessa cidade, os paulistas enfrentaram a brigada Amaral, uma das mais temidas e respeitada tropa federal. Anos depois, quando perguntaram a Romão Gomes como é possível conseguir de uma tropa tal eficiência, ele respondeu: Muito fácil. Apenas três coisas deve fazer o chefe: alimentar os homens, fazer-lhes justiça, conduzi-los. E foi pensando assim que Romão Gomes

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conseguiu fazer com que seus homens conseguissem vencer a Brigada Amaral. “Na zona de Caldas as forças mineiras ocuparam posições na estação da Cascata antes da nossa chegada. O bravo tenente Izidoro Rodrigues de Moura, da milícia do Estado, para ali foi mandado e não trepidou em aceitar o combate, apesar de contar com 30 praças apenas e alguns destemidos voluntários de São João da Boa Vista. Quando ali chegamos, como tínhamos instruções para não atacar a Força Pública Mineira e, ao mesmo tempo, nosso efetivo era muito reduzido, resolvemos tirar do terreno todo o partido que era possível. Mais tarde quando a polícia mineira nos atacou canalizamos esse ataque pela disposição que tomamos no terreno, para o ponto exato que desejávamos. Ali tínhamos apenas 300 homens em 1ª linha e uma reserva de 100. Com esse efetivo conseguimos desbaratar e desmoralizar a Brigada Amaral. A brigada era formada por mais de 1000 homens.”


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A batalha em Águas da Prata durou seis dias e seis noites ininterruptas. E o revés sofrido pelos mineiros foi de tal ordem, que a Brigada Amaral nunca mais atacou com o ardor e eficiência daqueles primeiros dias da Revolução de 9 de julho. O Coronel Homero da Silveira, da Força Pública do Estado, em depoimento que deixou sobre a revolução de 1932 na região, aponta Romão Gomes como o principal responsável pelos feitos heroicos dos paulistas na região: “Relembramos com altivez as vitórias de nossa tropa e, à frente dela, o vulto do seu grande comandante, cujo espírito continuará pelos séculos, tenho certeza, a alertar os nossos corações de patriotas a proteger o nosso amor pela terra Bandeirante e a fazer reflorir, pelo entusiasmo dos moços, o nosso Brasil esplendoroso.” Já com relação aos civis, o Coronel cita como heróis da Revolução, os professores: Maria Sguassábia e Mário dos Santos Meira.

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A REVOLUÇÃO EM SÃO JOÃO DA BOA VISTA Em São João da Boa Vista, entusiasmados comícios, artigos em jornais e discursos na rádio local, precederam o movimento constitucionalista. No livro “Memórias de um Bancário”, Gilberto Nóbrega descreveu os primeiros dias da revolução na cidade: “As tensões políticas existentes desde o dia 23 de maio, quando houve o sacrifício de Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, prepararam, de certo modo, o espírito das populações interioranas para os acontecimentos. Por isso, a população de São João, ao deparar nos jornais com a eclosão do movimento de 9 de julho, apenas se convenceu de que a fibra bandeirante não se estiolara com o correr dos séculos. As apreensões eram evidentes, pois ficamos, desde logo, isolados da Capital e as poucas notícias nos chegavam via Campinas. Salvo uma natural retração dos negócios e uma justa preocupação, a vida não sofreu, inicialmente, nenhuma modificação.”

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Um dos fundadores da Academia de Letras de São João da Boa Vista, o advogado Emílio Lansac Thôa, teve papel decisivo na movimentação Constitucionalista na cidade e região. Cabia a ele empolgar a população. E o fazia através de pronunciamentos na Rádio Piratininga, ou em artigos nos jornais e ainda nos concorridos comícios em praças públicas: “São Paulo vencerá, não haja dúvida, na gloriosa cruzada que esposou. E vencerá brilhantemente, nobremente, em toda a linha... E vencerá, não haja dúvida, pelo seu espírito de entusiasmo na luta, pela sua coesão, pela unidade de pensamento e, sobretudo, pela legitimidade da causa que defende nesta revolução inabalável, nesse movimento de civismo extraordinário, inesperado, de que jamais deram notícia de igual as páginas da história brasileira.”

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Benedito Fernandes Oliveira, o Cajuca, no livro “Revolução Paulista”, lembra a agitação da cidade nos primeiros dias do Movimento Constitucionalista. “Fileiras intermináveis de soldados e de caminhões sumindo na sinuosidade das estradas. Marcha frenética dos batalhões pelas ruas, de permeio com o povo a vibrar de patriotismo. Os adeuses sentidos das mães e das noivas que iam ficando para trás, com lágrimas nos olhos. Nas primeiras horas do memorável dia 9 de julho de 1932 tudo estourou, como uma potente bomba... São João da Boa Vista não podia ficar à margem do movimento revolucionário, entrando decididamente na luta, foi além das expectativas. Já de início a massa popular ficou completamente empolgada e, nos comícios que se sucediam nas praças públicas, os eventuais oradores eram delirantemente ovacionados porque as suas palavras e orações iam ao encontro do sentimento de todos...”

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“Vista farda ou vista saia”. Essa expressão corria solta nas ruas das cidades que fazem divisa com Minas Gerais, conclamando os jovens a se alistarem como voluntários, segundo a historiadora e fundadora da Academia de Letras de São João da Boa Vista, Maria Leonor Alvarez Silva: “ Tempo de sobressalto e de preocupações de toda espécie. As atividades normais de uma comunidade estavam suspensas. Fechadas as escolas. O quartel general que fora organizado às pressas no antigo fórum foi transferido para o prédio do Grupo Escolar Joaquim José. Tensão. Medo. Caminhões carregados de víveres e de soldados atravessando as ruas, boatos desencontrados. Famílias abandonando a cidade.”

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A região estava insegura. Em Pinhal, um grupo de voluntários se formou para defender a cidade. Os primeiros voluntários de São João da Boa Vista foram enviados para São Paulo e outros pontos de concentração, nos primeiros dias da revolução. Um destes voluntários, Benedito Araújo, acabou perdendo a vida na cidade de Guapiara. Foi sepultado por seus companheiros no campo de batalha. Mais tarde seu corpo foi transladado para o cemitério de São João da Boa Vista, com imponentes homenagens. É celebrado em São João como herói, homenageado no poema de Paulo Emílio Oliveira Azevedo: No setor sul tiveste heroicamente, Atravessado o peito varonil, Porque quiseste, só, unicamente, O regime da lei para o Brasil. O sanjoanense, com gran devoção, Com grande ardor, venera tua memória. Do sanjoanense estás no coração. E em São João, na Praça principal, Há de brilhar um dia – para tua glória, Para tua honra teu nome imortal!

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Paulo Emílio Oliveira Azevedo ao lado de Ademar de Barros e Professor Cyro Rezende.


A notícia de que as tropas ditatoriais estavam concentrando-se em Poços de Caldas, dias após deflagrada a revolução, provocou muito medo e preocupação em todas as cidades que fazem limite com Minas Gerais. As atividades na zona rural praticamente foram paralisadas. Os lavradores, além de não poderem trabalhar sossegados, eram obrigados a fornecer alimentos para as tropas. Mesmo assim, o entusiasmo dos primeiros dias prevalecia. No dia 14 de julho, cinco dias depois de haver sido deflagrada a revolução em São Paulo, os sanjoanenses organizam um grandioso comício em prol do movimento. Panfletos são distribuídos pela cidade, conclamando o povo a participar: “SÃO JOÃO COM SÃO PAULO PELA ORDEM, PELA LIBERDADE, PELA CONSTITUINTE, POR SÃO PAULO E PELO BRASIL.”

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O Tenente Mário dos Santos Meira, de Casa Branca, foi um dos voluntários que se destacou na Revolução na região de São João da Boa Vista. Participou do primeiro combate na Cascata e logo depois assumiu o comando da Companhia “Benedito Araújo”. Foi injustamente acusado pela fracassada manobra dos paulistas no combate da Cascata. Esclarecido o episódio, recebeu ordens para assumir o comando da tropa paulista aquartelada na Fazenda Paulicéia, divisa de São João da Boa Vista com Andradas. O coronel Homero da Silveira, da Força Pública do Estado, assim se referiu sobre Mário Meira, o Tenente Comandante da 4ª. Companhia do 1º Batalhão Paulista da Milícia: “Eis aí um homem a quem devemos render nossa sincera admiração pela bravura, brio e honradez de que é dotado. De simples civil transformou-se em um perfeito militar, com quase todos os conhecimentos e predicados para realizar um bom comando.’

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A convocação dos civis começou às 18 horas do dia 8 de julho de 1932 em São Paulo. O número de voluntários, a grande maioria estudantes, era impressionante. Os jovens que combateram na região de São João da Boa Vista vieram do setor do Largo das Perdizes, muitos deles estudantes da Faculdade de Direito, do largo de São Francisco. Alguns dias depois já estavam nas trincheiras da região: São João recebeu contingentes dos batalhões: Rio Grande do Norte, Legião Negra, Batalhão Esportivo e mais soldados da Força Pública de São Paulo. “Quem examinasse, nesse instante, os nossos homens, veria nas trincheiras, maltratados, sujos, mal dormidos, exaustos, os filhos das melhores famílias de São Paulo... A fina flor da mocidade paulista desabrochava na poeira das trincheiras a sua reserva de civismo... Lá estão todos. Esgotados de cansaço, mas risonhos e confiantes, prontos para o primeiro sinal de alarme.” (Herbert Levy)

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Soldados voluntários na trincheira em Águas da Prata. De óculos escuros e mãos sobre os joelhos, o Capitão Herbert Levy 33


Segundo Benedito Fernandes Oliveira, a movimentação de soldados ditatoriais na divisa da cidade provoca reação dos sanjoanenses. Um grupo de paulistas vai até a divisa de Minas, no bairro da Cascata e tenta negociar com os inimigos. Três sanjoanenses acabam sendo presos: Joaquim Cândido de Oliveira Filho, Chico Pianista e Emílio Esteves. “Agora tínhamos a dupla responsabilidade de defender não só a causa da revolução, mas, também, a nossa própria cidade, as nossas famílias e haveres. Alistaram-se rapazes de todas as classes sociais, insuficientemente preparados para a lide da guerra. Um grupo, com reduzida quantidade de armas e munições, lá se foi postar nas serranias da Cascata, ao lado de quarenta soldados da Força Pública. O primeiro embate, no bairro da Cascata, faz crescer a tensão em São João da Boa Vista, relata Maria Leonor:

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“Cascata fora tomada pelos mineiros e até Águas da Prata fora atingida pelas forças ditatoriais. Romão Gomes, disciplinado e intrépido Capitão que deixou tanta saudade em nossa região, dirigiu as forças para as zonas tomadas. Houve luta, muitos mortos e inúmeros feridos. A população sabia agora que a situação era perigosa. Ali demonstraram o seu valor, não apenas Romão Gomes, como também o Capitão Homero da Silveira, Tenentes Hugo Bradaschia, Cardoso, Brandãozinho, Capitão Rui, Elpídio, Haldo Ribeiro da Luz e outros”.

Na foto, voluntários que lutaram na primeira batalha no bairro da Cascata. Entre eles: José Noronha, Dr. Guarita, Mílton Nogueira, Zezé Coelho. Em pé: Durval Nogueira, Juca Jacinto, Zininho Azevedo, Joel Cortês, Joaquim Cândido de Oliveira Filho, Hugo Andrade e Chico Pianista.


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Romão Gomes gozava de grande prestígio quando chegou a São João da Boa Vista. Uma grande manifestação foi preparada a ele no Theatro Municipal. Ele vinha da cidade de Guaxupé, onde havia comandado, com sucesso, a ocupação da cidade mineira. A popularidade de Romão Gomes em São João da Boa Vista é lembrada pelo escritor Gilberto Nóbrega: “O Capitão Romão Gomes era uma das glórias da então Força Pública e uma das estrelas de primeira grandeza na constelação de oficiais combatentes. Sua vinda à região de São João da Boa Vista incentivou muitos jovens a se alistarem como voluntários, muitos com curso superior: médicos, advogados, engenheiros, dentistas, professores etc.”

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O Comandante Rom達o Gomes 辿 homenageado no Theatro Municipal de S達o Jo達o da Boa Vista

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Romão Gomes é considerado um dos principais heróis da Revolução de 32 em todo Estado de São Paulo. Era Tenente Coronel da Força Pública do Estado de São Paulo e tinha uma liderança nata. Ao término da Revolução, foi exilado. Ao retornar voltou a servir a Força Pública como Juiz do Tribunal de Justiça Militar. O Presídio Policial Militar de São Paulo leva seu nome. É admirado pelos militares como afirma o Tenente Coronel Homero da Silveira: “Figura homérica, cujo valor militar, heroísmo e bondade há de atrair, pelos anos em fora, o culto da nossa mais reverente recordação, porque a sua memória, sempre envolta num crepe de respeito e admiração, passou a viver na saudade de cada um daqueles que fizeram parte de sua invicta Coluna, a que atuou em São João da Boa Vista. Relembremos, pois, com altivez, as vitórias de nossa tropa e, à frente dela, o vulto de seu grande comandante. Na foto, Romão Gomes na Estação Ferroviária de Aguai logo no início da Revolução.

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Comandante Romão Gomes à direita e seus oficiais em foto em frente à Escola Estadual Joaquim José

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Os soldados e os voluntários que chegam a São João da Boa Vista, para reforçar a divisa com Minas Gerais, são calorosamente recebidos pelos sanjoanenses, segundo Herbert Levy: “O povo de São João nos cobre de gentilezas. Se vamos aos barbeiros, os profissionais não nos querem cobrar. Se adquirimos algo das casas de comércio, não querem receber. As moças nos proporcionam uma risonha e agradável estada, à qual não faltou mesmo uma pequena festa dançante. Recebemos numerosos convites para tomarmos refeições nas casas particulares.” Jovens e até crianças participaram da movimentação constitucionalista. As crianças formaram um batalhão infantil, que servia de estímulo aos combatentes. A causa constitucionalista empolgava os jovens.

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Batalhão Infantil na Praça Joaquim José em foto tirada em 24 de agosto de 1932

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Cristhiano Osório de Oliveira, fazendeiro e proprietário de uma casa bancária, fez fortuna em São João da Boa Vista, principalmente após a crise de 1929. A família participou ativamente do movimento Constitucionalista na cidade. Seu nome figurava em todas as listas de doações, como na campanha para adquirir capacetes aos soldados paulistas. Fez a doação de trezentas unidades. Sua filha, Gabriela Oliveira Costa, a Beloca, que mais tarde se elegeu a primeira mulher vereadora de São João da Boa Vista, era das mais engajadas no movimento. “Dona Beloca, virtuosa esposa do Dr. João Batista Costa, demonstrou grande amor à sua terra, prestando inestimáveis serviços à causa. Trabalhou na Casa do Soldado, instituição organizada em São João, indo até às trincheiras, para que nada faltasse aos combatentes.” (Cel. Homero da Silveira)

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Elias - de terno branco - filho do Coronel Joaquim José Oliveira, ao lado do Capitão Homero, Tenentes: Herbert Levy, Antônio Azevedo e Paulo Carvalho 43


Em Águas da Prata, que até 1935 pertenceu ao município de São João da Boa Vista, no antigo Hotel São Paulo, quase na divisa com Minas Gerais, ficava o quartel general da Coluna Romão Gomes. Perto dali, aconteceu uma das mais dramáticas batalhas. Do dia 24 de agosto até 1º de setembro, as tropas paulistas resistiram ao avanço das tropas federais, a Brigada Amaral. Segundo Romão Gomes: “Calcula-se que esta brigada tinha mais de 1.000 soldados.Os paulistas contavam com 300 homens em primeira linha e uma reserva de 150 homens. Embora fosse considerada temida, depois dos combates em Águas da Prata, a Brigada Amaral nunca mais atacou com o ardor e eficiência daqueles seis dias e seis noites memoráveis. Nosso efetivo era muito reduzido e resolvemos tirar do terreno todo o partido possível”.

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Dali, do Hotel São Paulo, os paulistas se organizaram na região: “O batalhão está distribuído numa extensão de 122 quilômetros. À nossa direita, quase à retaguarda, está colocada Espírito Santo do Pinhal, guarnecida por tropa regular da Força Pública e alguns voluntários. À esquerda, está São Roque da Fartura, guarnecida por tropa voluntária comandada pelo capitão Maluf. Uma das nossas metralhadoras está colocada na trincheira do tenente Camilo e a outra está conosco. As demais possuem apenas fuzis. Ao todo, na frente do Prata, somos 450 homens, todos componentes do 1º Batalhão’... Em Cascata havia, de fato, forte concentração de forças inimigas e, em Jacutinga, próximo a Pinhal, notava-se igualmente movimento de tropas.” (Herbert Levy)


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O tenente Homero da Silveira envia telegrama a Romão Gomes, descrevendo o início da batalha em Águas da Prata: “ – Neste momento, a uma e trinta da tarde, iniciamos combate tropas ditatoriais setor do Prata. Entusiasmo da rapaziada no auge.’ Herbert Levy descreve a primeira noite de combate: “Alguns tiros se ouvem do nosso lado esquerdo. A tropa inimiga desembarcou em caminhões e está iniciando um ataque. Os nossos respondem. Funcionam as metralhadoras inimigas e a metralhadora da trincheira do tenente Camilo responde repetidamente. No crepúsculo o tiroteio do inimigo tornouse cerrado. A quantidade de armas automáticas era enorme. A munição existia em abundância, porque não tínhamos um minuto de intervalo. Cada tiro de fuzil que disparávamos, era

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respondido por rajadas de metralhadora, que não cessavam. Protegidos pela noite, o inimigo parece ter-se aproximado bastante. Os seus tiros vêm agora de todas as direções e acertam frequentemente no parapeito da trincheira. De vez em quando, a nossa metralhadora funciona para evitar qualquer investida mais séria. A noite está escura e para prever um avanço de surpresa descem as sentinelas para a estrada que conduz ao morro em que estamos e na qual existe uma trincheira. A quantidade de balas que caem na nossa retaguarda impede que nos tragam comida, pois as latas são muito pesadas para arrastar. Arranjam-nos, entretanto, uns pacotes com sanduíches, duas bananas, um doce de amendoim e um bolinho de fubá. Jantar, como se vê bastante bom, oferecido pelas senhoras de São João da Boa Vista”.


Soldados na Fazenda Retiro em Ă guas da Prata 47


– Paulista! ... Nós vamos almoçar amanhã Paulistas e mineiros que combatem em Águas da Prata estão tão próximos que nos na Prata e jantar em São João.” “Atravessamos o dia e entramos na nossa momentos de trégua é possível ouvir os insultos e provocações dos inimigos, como descre- segunda noite de combate. Poder-se-iam contar, pelos dedos, os minutos de trégua que os ve Herbert Levy: adversários haviam proporcionado. A noite “A cada momento se intensifica mais o pouco esmorecia o seu ataque.” fogo do inimigo. .. Cada tiro de fuzil que dispa“ O tempo tende a mudar e ameaça chover. rávamos era respondido por rajadas de metralhadoras que não cessavam. As horas da noite Vamos buscar alguns agasalhos nas barracas, o vão passando e o tiroteio do inimigo não ces- que não é tarefa fácil, pois uma quantidade de sa. Às vezes, intensifica-se extraordinariamen- balas cai sobre o acampamento.” te, parecendo que apoiam uma ofensiva e, às “Começa a chover. Encostamo-nos uns vezes decai ligeiramente, para reanimar-se em seguida. Não podemos, evidentemente, dor- aos outros para conservar melhor o calor e mir e não sentimos sono. A primeira noite de tirar maior proveito das barracas de lona que combate contém sensações demasiado novas servem para abrigo. O inimigo parece ser insensível a chuva, pois continua infatigável. O para permitir um repouso. Durante as ligeiras tréguas, que às vezes se temporal aperta. Está encharcando-se a terra faziam, ouvíamos os gritos selvagens dos ad- da trincheira sobre a qual estamos deitados. A umidade começa a penetrar o corpo.’ versários.

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Próximo da área de combate em Águas da Prata, na Fazenda Paulicéia em São João da Boa Vista, outra divisa preocupava os paulistas: a divisa com a cidade de Andradas. E ali, naquela fazenda, é formada a 4ª. Companhia, batizada de Benedito Araújo, em homenagem ao primeiro sanjoanense morto na revolução. Benedito Fernandes Oliveira, o autor de Revolução Paulista, estava entre os soldados desta Companhia: “E foi ali que começamos a experimentar a rigidez da disciplina militar e a responsabilidade da guerra em curso. Assumiu o comando o Tenente Mário Meira. Logo à sua chegada, com energia digna de um grande chefe, distribuiu os voluntários a vários sargentos, a fim de irem receber pelos passos instruções de campanha e de manejo de armas. Mandou os mais calejados abrirem trincheiras pelos altos dos morros e escorraçou para a cidade os rebeldes e moleirões que não se submetiam às ordens.”

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Soldados protegem a Fazenda Fartura, entre São João e Águas da Prata

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À tarde, felizmente, um acontecimento novo devia tirar-nos o pensamento do desastre. Chegara a Águas da Prata nova arma fabricada em São Paulo e cuja experiência inicial “O bravo Moysés, soldado valente e habi- em campanha seria feita em nossa trincheira, tuado à campanha, caminhando de um lado a mais atacada na ocasião. De fato, logo em seguida chegava-nos a para o outro, alegre e jovial, vai dando a todos peça acompanhada por quinze homens do Coruma palavra de incentivo: -- Aí, rapaziada. É assim que eu gosto! Ne- po de Bombeiros. Aguardávamos o primeiro nhuma bala fica sem troco. Vem uma, vai ou- tiro com muita ansiedade, antegozando a impressão que a novidade havia de proporcionar tra. Pede um fuzil e dispara. Vai fazer a mira e aos adversários, que havia mais de 24 horas repentinamente estremece como que ofusca- não nos davam sossego. Preparada a peça, é do. Um jorro de sangue nos salpica a farda, e lançada a primeira bomba, infelizmente a uma ele se arremessa redondamente ao solo. Uma distância não superior a 300 metros... Da Prata nos informaram, afinal, da vinbala certeira o atingira no meio da testa, partída do nosso avião para desalojar a artilharia culas de sangue e massa craniana salpicam os inimiga. Foram-nos enviados painéis para esnossos uniformes. A realidade da campanha se nos desenha tendermos no solo, a fim de que não nos concom toda a plenitude ao contemplarmos aque- fundissem com os adversários. A cada passo olhamos para o céu à procura do avião amigo le corpo, há dois minutos tão cheio de vida. que está para chegar. Mas as horas passam e o Mal balbuciamos: avião não vem. Não virá jamais.” --‘Morre com Deus, Moysés.’ Os paulistas têm a primeira baixa em Águas da Prata. A morte é assim descrita pelo soldado Herbert Levy:

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Estação Ferroviária de Águas da Prata, onde desembarcaram os soldados a caminho das trincheiras 53


Pelo relato de Herbert Levy é possível perceber que, embora estejam em número bem superior aos paulistas assim como também em armamentos, o ânimo dos mineiros vai-se arrefecendo aos poucos. Contra todas as previsões, as tropas federais caminham para a derrota:

No sexto dia de combate em Águas da Prata, os paulistas comemoram a vitória:

“A certa altura, a dois passos das trincheiras, no meio da escuridão, os nossos prendem cinco adversários, entre os quais um sargento. A luta, pouco antes, afrouxara. Os prisioneiros são conduzidos ao posto de comando e aí ‘As horas passam, entretanto, sem ne- interrogados. Acabavam de sofrer a perda de nhuma novidade. Os adversários continuam um capitão e dois tenentes. A vanguarda das a consumir abundantemente a sua munição, suas forças havia sido totalmente desmantelada e os seus elementos, tomados de pânico, embora se perceba que não têm, já, o mesmo haviam debandado. Estava revelando-nos, asímpeto. sim, a impressionante e completa derrota. Mais tarde, um oficial pormenorizou-nos O combate assume proporções extraor- que, durante os dias de fogo, haviam tido cerca dinárias. O inimigo demonstra uma ousadia de 160 mortos, muitos feridos e deserções. O a toda prova. As granadas são lançadas con- efetivo, superior a 1.000 homens, reduzira-se secutivamente, tão próxima se acha o adver- à quase metade. Nessa altura, apenas poucos sário. A luta torna-se tremenda e decisiva. Da tiros eram disparados pelo inimigo e de longa nossa parte, estamos conseguindo atrapalhar distância, indicando uma retirada em grande o flanco direito dos atacantes e não cessamos escala.’ de molestá-los. O resultado é muito incerto.”

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A notícia nos atordoa. Devemos abandonar Águas da Prata, quando acabávamos de bater em toda a linha o adversário? E devemos deixar São João, tão boa e tão hospitaleira, sem a nossa proteção, entregue à sanha do adversário? Não haverá um meio de evitar? Não se pode tentar alguma coisa. Infelizmente, não. A realidade é dura. Estávamos no dia 1º de setembro e combatíamos em Águas da Prata desde 24 de agosto, sem descanso.... Nessa altura, sem que houvesse havido combate, as nossas forças haviam recebido ordens de evacuar Mococa, Caconde, Itaiquara, Vargem Grande e algumas Embora tenha vencido as tropas federais, estações que caíram, assim, em poder do iniem Águas da Prata, a tropa paulista é obrigada migo. Chegamos a Casa Branca num estado físico lastimável. O desgosto não se manifestava a deixar a região: “Rapidamente o comandante Romão Go- apenas na tropa. Todas as populações lamentavam. Pedidos de políticos e chefes influentes mes nos explica: --Pinhal caiu. Estamos, dessa forma, com são feitos pelo telégrafo. Querem destituir os a nossa retaguarda ameaçada e temos ordem comandantes que deram a ordem para a tropa de retirada imediatamente. Nem em São João recuar... A irritação atinge, então, o auge. Há um verdadeiro início de rebelião”. poderemos deter-nos.”

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A ordem para abandonar as trincheiras ras varrendo as ruas como foguetes. Populares chega até a Fazenda Paulicéia e é descrita por iam e vinham, desnorteados, e famílias inteiras Benedito Fernandes Oliveira: fugiam, desesperadas, em busca da zona rural. Muitas portas escancaradas, iluminadas, onde “Não havia mais nenhuma alternativa: ur- se vislumbravam rostos apreensivos e indecigia uma retirada estratégica, a fim de por as sos. Nunca vimos tanta gente e igual movimentropas em salvaguarda. Imenso foi o desalento to nas ruas a horas avançadas como aquelas. E que se refletiu nos semblantes de todos. Preci- criaturas que corriam apesar do frio reinante, samente à meia noite começaram os prepara- no maior desespero. tivos para a grande retirada. Ainda lembramos A cidade era um verdadeiro formigueiro bem que fomos acordados na trincheira, na humano e, tamanha era a confusão reinante, frente da Paulicéia, aos pontapés, e que, cor- que tivemos a desoladora impressão de que rendo desabaladamente na escuridão da noite, tudo ia ficar deserto, abandonado, perdido nos penduramos nos caminhões e abalamos para sempre, nas mãos de inimigos sanguinápara a cidade agitada”. rios. Caminhões, com soldados e viveres, desaA notícia de que os soldados paulistas vão pareciam roncando em direção às estradas, e deixar Águas da Prata e São João da Boa Vista trens apitavam na Estação da Mogiana, em baprovoca pânico na população: rulhentas manobras, aumentando a confusão. Oficiais davam ordens ríspidas, gritavam, ame“São João estava em reboliço. Encontramos açavam e soldados subiam e desciam correndo soldados correndo para todos os lados e viatu- pelas ruas.”.

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Embora tenham vencido os combates em Águas da Prata e São João, os soldados paulistas recebem ordem de recuar até Casa Branca

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Com o recuo dos soldados paulistas, dia 06 de setembro de 1932, as tropas federais entram em São João da Boa Vista. O Prefeito Joaquim Pinto Noronha (Dico) é destituído e assume a Prefeitura da cidade o capitão Mário de Souza Vieira. Os que ficaram na cidade reagem com absoluta frieza. As ruas estão desertas e os poucos transeuntes se negam a falar ou cumprimentar os invasores, embora, relata Maria Leonor, a ocupação tenha sido bem menos drástica do que se previa: “Ao contrário do que todos esperavam, as tropas invasoras deram provas, desde logo, de muita disciplina e educação militar. O comandante ditatorial fez distribuir vários boletins concitando as famílias a regressarem a seus lares, ao trabalho normal. “ O capitão Mário de Souza Vieira tenta ga-

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nhar a confiança dos sanjoanenses, informando ao povo: “Conforme é do conhecimento do povo desta terra, este município, bem como muitos outros deste Estado, já se acham sob o controle do Governo da República, pela ocupação natural, lógica e necessária feita pelas tropas federais. Muitas coisas disseram os desocupados sobre os nossos hábitos de selvageria. Os fatos, porém, patenteiam o contrário. Podem, a população urbana, bem como a rural do município, estar absolutamente tranqüilas, que nenhuma medida será por nós tomada que não seja única e exclusivamente dentro da ordem, da disciplina e do bem público... Animados destes propósitos, concitamos a população civil desta cidade a voltar para suas casas e retornarem ao seu labor habitual... Tenhamos fé no governo da República”.


dos a inquéritos os chefes suspeitos e assumisse todo o comando do setor, o major Romão Gomes, com a primeira missão de recuperar as cidades tomadas “Nessa ocasião, a situação era das mais precárias. Mas a mudança do comando, entregue a Romão Gomes, provoca profunda modificação no ânimo dos paulistas recuados em Casa Branca: “Como que por encanto, com a mudança do comando se transforma o ânimo da tropa. De irritada que se achava, passa a entusiasta, decidida e confiante. O comandante Romão age imediatamente. O 1º Batalhão é enviado para Lagoa, para deter o avanço das tropas mineiras. Em terreno plano e completamente desEnquanto as cidades da região são ocupacampado é que se deverá travar a luta em Ladas, um grupo de paulistas, que não aceita o goa. Estamos sendo atacados por diversos larecuo, reage. Suspeitam de que esteja ocorrendo traição. Ameaçam rebelião e exigem pro- dos, sendo Casa Branca o objetivo evidente do vidências imediatas. O apelo é ouvido. Logo inimigo, como importante chave da Mojiana e a situação se inverte e chegam novas ordens: ponto estratégico de valor. No dia 3 tem início para que fossem recolhidos presos e submeti- o combate em Lagoa. (Herbert Levy)

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Sob o comando de Romão Gomes, os paulistas iniciam a retomada das cidades e lugarejos ocupados pelas tropas federais. A 4ª. Companhia, com vários voluntários sanjoanenses e que estava na Fazenda Paulicéia em São João da Boa Vista está agora em Lagoa, vilarejo próximo a Casa Branca, onde também concentram-se as tropas federais que tentam entrar naquela cidade. É o primeiro combate: “Nas imediações de Lagoa nos preparamos eficazmente para o entrevero. Abrimos diversas trincheiras, em vários pontos estratégicos, agora com auxilio do Batalhão de Sapadores, vindo de São Paulo... E a luta, sempre renhida e intensa, durou vários dias. Vários foram os feridos, leve e gravemente... Começaram as deserções em massa e o tiroteio na linha inimiga começou a enfraquecer-se cada vez mais. Os nossos comandantes, prevalecendo-se da situ-

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ação, ordenaram um ataque geral... Em poucos minutos ficamos senhores de toda a frente de Lagoa.” (Benedito Oliveira) As forças paulistas conseguem uma importante vitória no vilarejo de Lagoa Branca. Chegam a derrubar um avião do governo federal. Os feitos nesta batalha dão novo ânimo à tropa que parte em direção às cidades ocupadas pelos federais. A primeira a ser recuperada é Vargem Grande, considerada por Maria Sguassábia como uma das mais difíceis destas batalhas: “Depois de deixarmos Lagoa Branca, fomos convocados para combate em Vargem Grande do Sul, sem que pudéssemos descansar. Caminhamos por cerca de 11 horas e enfrentamos ali um duro combate. Recuperamos a cidade enfrentando o inimigo que estava espalhado pela cidade. Combatemos de casa em casa.”


Soldados paulistas exibem os destroรงos do aviรฃo federal derrubado no vilarejo de Lagoa, prรณximo da cidade de Casa Branca 61


Após recuperar a cidade de Vargem Grande do Sul, a coluna Romão Gomes retoma o bairro do Pedregulho, onde havia vários soldados mineiros e, depois, finalmente, São João da Boa Vista, entrando na cidade no dia 12 de setembro. “A notícia da aproximação da tropa paulista correu de boca em boca. O povo, pelas ruas, mesmo às barbas do inimigo, dava expansão ao seu contentamento. ... Diante da crescente e temerária manifestação de hostilidade do povo, e diante dos visíveis sinais de aproximação da grande coluna Romão Gomes, com o fim de evitar um choque de conseqüências catastróficas, os ditatoriais deliberaram retirar-se da cidade. Os primeiros contingentes foram saindo furtivamente, tomando vulto pela tardinha a retirada do grosso dos soldados, tendo, antes, sido feita a entrega das repartições públicas... Populares mais exaltados davam vaias estridentes aos componentes dos caminhões que partiam repletos em direção a

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Poços de Caldas. Nessa mesma hora, um outro grupo, tendo à frente João Luhmann, secretário da Prefeitura, soltava os presos políticos da cidade, os quais eram carregados pelas ruas sob delirantes vivas.” A retomada de São João da Boa Vista pelos paulistas foi um acontecimento épico para a cidade, segundo Benedito de Oliveira. “A coluna tinha conhecimento da retirada do inimigo. Os soldados estavam impacientes para entrar na cidade e, isso, com a luz do dia. ... às oito horas da noite começou a desfilar pela cidade a 1ª Companhia do Batalhão Romão Gomes. Que triunfo! Que delírio!. É indescritível o entusiasmo do povo! Muita gente chorava, reconhecendo e abraçando pessoas da família. Nas primeiras ruas a tropa marchou regularmente. Ao atingir as ruas centrais não foi mais possível manter-se a ordem, e a soldadesca ficou misturada com o povo que estava como que alucinado.”


Soldados paulistas retomam São João da Boa Vista. Sobem a rua Saldanha Marinho em direção ao centro e são aclamados pelo povo

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Após reconquistar Vargem Grande do Sul, o bairro Pedregulho e São João da Boa Vista, os soldados da coluna Romão Gomes marcharam em direção a São Sebastião da Grama, último reduto dos soldados ditatoriais, que resistiam aos ataques das forças paulistas de São José do Rio Pardo e Divinolândia. A batalha ali travada foi considerada por Maria Sguassábia como a mais violenta de todas as de que havia participado.

mes na região, o movimento Constitucionalista perdia força em todo o Estado. As tropas locais mais uma vez foram deslocadas, desta feita para combater em Campinas. Era o recuo final dos paulistas: “Em Fazendinha, concentraram-se aproximadamente vinte mil homens, vigiados por aviões da ditadura que os metralhavam e atiravam bombas. Como feras, os soldados paulistas passaram a ser perseguidos e caçados. A epopeia se encerrara. Foi num triste dia “Foi em São Sebastião da Grama que tive- 1º de outubro, depois de três meses de entumos os combates mais violentos. E sentimos a siasmo, angústia, terror, dúvidas, luto, mutiverdadeira noção de uma guerra. A resistên- lações e estagnação do labor paulista inteiracia foi intensa e durou dias. Os soldados da mente devotado à conquista da vitória. ditadura pareciam que endiabrados. Vi muitos Derrota? Não! Um povo que pode contar homens desertando, outros chorando, outros em sua história páginas de arrojo, altivez, luta, amaldiçoando. Vi o diabo.’ sacrifício e coragem para prosseguir e continuar a ser o líder de uma grande nação, não pode Embora as vitórias da Coluna Romão Go- considerar-se derrotado. (Maria Leonor)

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Soldados paulistas na última batalha na região de São da Boa Vista, no município de São Sebatião da Grama 65


MARIA, MULHER SOLDADO Maria Sguassábia foi uma das personagens mais interessantes da revolução em São João da Boa Vista e em São Paulo. Professora, viúva com uma filha de seis anos, não hesitou em passar por homem, vestir farda e ir para as trincheiras lutar. Lecionava na Fazenda Paulicéia, onde havia uma tropa paulista concentrada. Entre os soldados estava seu irmão Antônio. “Da janela eu vi um soldado desertar, jogando o fuzil. Corri. Se alcançasse o patife lhe daria uns bons tapas. Foi quando tomei a decisão. Apanhei a arma, vesti uma farda que meu irmão havia dado para lavar, levei minha filha

Antonio foi o único a notar a presença da irmã entre os soldados. Tentou, desesperadamente, convencê-la a desistir. Inútil. O caminhão levava os soldados para a trincheira e, já naquela noite, iriam combater. “Dentro da trincheira eu percebi que não sabia manejar o fuzil e, no primeiro tiro, quase caí de costas com o recuo da arma e tive de recorrer a meu irmão. Felizmente tudo correu bem e o combate terminou sem baixas para os nossos. Pela manhã, cessou o fogo e o tenente Meira procedeu a revista dos seus homens, um por um. Quando chegou perto de mim tentei engrossar a voz, porém meus cabelos se soltaram ao vento. Meu irmão, que estava perto, foi

para o administrador da fazenda. Meu irmão havia dito que a tropa ia avançar. Avistei o caminhão dos soldados e subi.”

logo dizendo: -É minha irmã. O Tenente ficou furioso.

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Maria e seu irmão Antônio Sguassábia 67


Maria insistiu com o Tenente Meira para ficar entre os soldados. Sem saber o que fazer, o tenente leva o caso para o comandante Romão Gomes: “Ao contrário do que se esperava, Romão Gomes consentiu que eu continuasse, dizendo: --Pode deixar a tropa no momento em que quiser. Porém, se resistir, será um exemplo para muitos homens barbados que fogem ao ouvir os primeiros tiros. Alistei-me com o nome de soldado Mário. Neste mesmo dia, debaixo de um tremendo aguaceiro, ainda pela madrugada, iniciamos o deslocamento da nossa tropa para o lugarejo conhecido por Lagoa Branca,

abrir trincheiras. Pela manhã, verifica que se encontram numa colina, dominando vasta planície, cortada ao centro pelos trilhos da Mojiana. Juntam-se ao grupo outros soldados. Casa Branca é estratégica e, por isso, ali próximo, em Lagoa Branca, acontece um renhido combate: “O inimigo é impiedoso. Despeja em cima das trincheiras um dilúvio de chumbo. Meu capacete é riscado por um projétil. Alguns dos nossos morrem e a soldadesca inimiga cresce diante de nós. Percebemos que estão em maior número. De súbito, surge na planície o trem blindado, arma de guerra improvisada pela indústria paulista. Vem solene e vagaroso. As balas do inimigo se chocam agora contra um pouco antes de Casa Branca, onde havia a blindagem, produzindo um ruído igual uma um foco de resistência”. máquina de costura picando aço. Nossos hoA noite toda, Maria Sguassábia ajudou mens assistem ao duelo de camarote.”

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Maria Sguassรกbia e soldados na trincheira

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Romão Gomes assume o comando de toda a região e isso dá novo ânimo aos soldados. O inimigo é derrotado em Lagoa, onde a tropa de Maria Sguassábia derruba um dos seis aviões do Governo Federal, aumentando a moral dos paulistas. Após a vitória, Romão Gomes decide recuperar as cidades ocupadas após o recuo paulista. A primeira delas será Vargem Grande do Sul, onde estão 250 soldados mineiros: “Mal refeitos do combate em Lagoa Branca recebemos ordens para marchar em direção a Vargem Grande. Foram 11 horas de caminhada. Chegamos às imediações da cidade às 4 horas da manhã. Assim exige o plano de Romão Gomes. Devemos penetrar na cidade no escuro da noite, atacar de surpresa. As 6 horas da manhã estava tudo liquidado. Setenta prisioneiros, vários mortos e feridos, o resto debandado. Quando os vargem-grandenses acordaram já eram paulistas de novo. Entre Vargem Grande do Sul e São João da

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Boa Vista está o bairro do Pedregulho. Ali os soldados federais instalaram um posto avançado e é preciso recuperar o bairro. Romão Gomes confia esta missão à 4ª. Companhia, formada na maioria por voluntários de São João da Boa Vista e da região, entre eles Maria Sguassábia, que irá sair dali efetivamente como uma heroína paulista: “Em Pedregulho, encontramos as tropas federais. O combate teve início às 6 horas da manhã. Meu irmão e eu e mais dois soldados resolvemos cercar o inimigo acampado atrás da igreja local. Eu me aproximei de alguns deles que estavam deitados e de arma em punho gritei: --Rendam-se. Quando me viram, os soldados federais quase não acreditaram. Nenhum deles esboçou qualquer reação, nem procuraram suas armas. Limitaram-se a comentar, surpresos: -- É uma moça!!! “


Maria e soldados na trincheira

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Maria Sguassábia, como havia previsto Romão Gomes, torna-se exemplo para os paulistas e uma das líderes da tropa. Benedito Fernandes de Oliveira diz que era ela a primeira a se levantar nas trincheiras e ir de encontro ao inimigo levando consigo os demais paulistas. E foi ela quem prendeu, no bairro do Pedregulho, Artur Noce, comandante da tropa mineira. O fato é relatado pelo Tenente Mário Meira: “O comandante mineiro tentou fugir e Maria Sguassábia foi atrás dele, apontando-lhe o fuzil e dando voz de prisão. Depois de preso, ele se recusou a entregar-lhe as armas. Não se conformava ter sido preso por Maria Sugassábia. Considerava uma desonra e estava disposto a morrer mas não se render a uma mulher. Foi quando cheguei e percebendo a situação lhe disse. –Não se envergonhe por isso, pois você acaba de ser preso pelo mais valente dos soldados paulistas.”

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Após a batalha do Pedregulho, Maria Sguassábia e seus companheiros retomam São João da Boa Vista. Não houve combate, pois os soldados que ocupavam a cidade, sabendo dos feitos heroicos da Coluna Romão Gomes, ao perceber a aproximação da tropa, fogem em direção a Poços de Caldas. A coragem e os feitos no Pedregulho renderam a Maria Sguassabia a promoção a cabo e logo depois a sargento. Porém, o comandante mineiro preso por ela jamais esqueceu o fato. Após a revolução, o tenente Artur Noce voltou a São João e exigiu do Prefeito sua exoneração como professora. Jamais ela voltou a lecionar: “Durante seis meses eu consegui sobreviver costurando para um alfaiate. Depois, com o governador Armando Salles Oliveira, consegui ser nomeada inspetora de alunos numa escola estadual.”


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Após retomar São João da Boa Vista, Maria Sguassábia e a 4ª Companhia ainda participaram de outro combate: o de São Sebastião da Grama, considerado por ela como o mais feroz de todos. Em seguida, a tropa é chamada a recuar, mais uma vez. Desta feita todos são deslocados para Campinas. Naquela cidade é que recebem a notícia de que São Paulo havia capitulado. Era o fim da revolução. Maria também fica sabendo que o Tenente Artur Noce estava no seu encalço e coloca sua cabeça a prêmio. Por precaução ela e o irmão decidem retornar a pé. “Enterrei minha arma. Deixei minha farda numa casa onde consegui novas roupas e retornamos a São João da Boa Vista. Caminhamos cerca de 250 quilômetros. Passamos muita fome e sede e após vários e intermináveis dias é que consegui rever minha cidade, meu velho pai e minha filhinha.” Maria Sguassabia faleceu no dia 14 de mar-

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ço de 1973, aos 74 anos de idade, sem nunca ter sido devidamente reconhecida como uma heroína da revolução constitucionalista. Porém, jamais se arrependeu de ter lutado, o que deixou expresso numa última mensagem: “Recordar é viver. E vive-se cada dia relembrando o que guardamos no coração. Nas horas de incerteza, os momentos que passamos empolgados num ideal, são revividos na lápide da memória. Foi ontem. Tenho bem presente a audácia da investida, o sacrifício e a grandeza da vitória.... E eu, mulher soldado, tive a glória venturosa de participar da vitória. Fiz da minha fraqueza uma força, de meu peito um escudo e do meu coração uma trincheira.“


Maria, junto com soldados e a popula巽達o, sobem a rua Saldanha Marinho rumo ao centro, depois da retomada de S達o Jo達o 75


RELAÇÃO DOS SOLDADOS SANJOANENSES QUE LUTARAM NAS LINHAS DE FRENTE Abílio Ferreira Guarita, Alcebíades Teixeira, Alfredo Geremias, Albertino dos Santos, André Loiola, Américo Moreti, Antenor Prézia, Antero de Azevedo Coelho, Armando Lamberti, Antônio Inácio dos Santos, Antônio de Nardo, Antônio Ribeiro Segundo, Antônio Sguassábia, Antônio Nunes, Antônio Vitorino, Antônio Alves Moreira, Antônio Rossi, Antônio Aleixo, Antônio Cândido de Oliveira Filho, Benedito Fernandes de Oliveira (Cajuca), Benedito Oliveira (Bauru), Benedito Fernandes (Dito Foca),

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Cristóvão de Rezende, Cirano de Andrade, Divino Rosa, Esdras de Rezende, Eugênio Moreti, Emílio Esteves, Eugênio Gambá, Eurípedes França, Chico Pianista, Felício Valente, Faustino Alves, Francisco de Bemardis, Guilherme Buzon, Henrique Lemos, Heitor Macedo, Jorge Cabral de Vasconcelos, Justiniano Alves de Sousa, João Carvalho de Oliveira, João Batista Pinto, João Cirelo, João Aparecido, João Tristão de Azevedo Coelho, João Ferreira Varzim, João Fernandes de Oliveira (João Cunha), João Consentino, João Rodrigues Santana,


José Diniz, José Noronha de Andrade, José de Freitas, José Amorim, José Lobo, José Mendes, José Ferraz, José Amando Diniz, José de Oliveira Azevedo, José de Oliveira Fontão, José Ananias Ramiro, José Teixeira de Aguiar, Joaquim José de Oliveira Azevedo, Joaquim Fernandes de Oliveira, Leopoldo de Abreu, Lázaro Guimarães, Lázaro Fernandes de Oliveira, Luiz Ferrari, Luiz dos Santos, Luiz Guimarães, Mário Santos Meira, Milton Azevedo Nogueira, Maria Sguassábia, Manoel Assunção Ribeiro, Napoleão de Castro, Nildes Fontão de Souza, Noé Marcondes, Otávio de Oliveira,

Pedro Laurentino da Silva, Paulo Maciel de Godói, Paulo Lúcio (Baião), Pedro Lúcio, Roque Teixeira Fiori, Rogério de Oliveira Fontão, Saturnino Alves, Sebastião Domiciano, Sérgio de Oliveira Coutinho, Sebastião Pomeranzi, Vidal Fontão SOLDADOS MORTOS: Benedito Araújo, Moisés Justino, Vicente de Oliveira, Manoel Martins, Américo Brisa, José Lobo OFICIAIS: Comandante Gal. Romão Gomes, Tenente Cel. Homero Silveira, Tenente Mário dos Santos Meira, Tenente Esdras Rezende, Tenente Cristóvão Rezende

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VOLUNTÁRIAS DA CRUZ VERMELHA SANJOANENSE

Tita Teixeira — Presidente Adazir Carvalho Aída Pomeranzi, Alice A. Andrade, Amália Varzim Fiori, Ana Ferreira Brandão, Ana Mota, Anesia Silveira, Angelina A. Aguiar, Angelina Abrantes de Aguiar, Anita Andrade, Anita Hansin, Antonia Andrade Ferreira, Antônia Teixeira Mourão, Aparecida Flecri Castelano, Aureolinda Batista, Aurora Bruno, Guiomar Rezende, Basilisa Peres Paschoal, Belinha Ansin de Andrade, Beloca de Oliveira Costa, Benedita Guimarães, Bepa Deltregio, Carlota de Siqueira Ricci, Celeste Stefani, Benedita Soares, Celina Ferreira Brandão, Cotinha Vasconcelos, Criseida de Oliveira, Ditinha Santamaria, Elza Batista, Elza de Andrade Sarmento, Ema S. Barbosa,

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Ernestina Westin Murr, Eudoxia Santos Cruz, Eunice Andrade, Filhinha de Magalhães, Filoca Nogueira de Azevedo, Francisca V. Pirajá, Gabriela Dias, Gabriela Oliveira Azevedo, Geni Mota, Georgina Batista Parreira, Georgina de Oliveira Deltrégio, Guiomar Machado, Haydée Mancini, Herdi Fabris Risoto, Herminia Ferrante, Idalina Batista, Iraci Oliveira, Izabel Carvalho Bastos. Izolina Westin, Joana Parreira Costa, Joaquina Fajardo, Jordelina Maria Delgado, Judit Braga Ferreira, Julieta Silva Barreto, Leonirda Mota, Lourdes Godói, Lourdes Rezende Nogueira, Lucina Raposo Vasconcelos, Lucinda Peres Fontão, Magdalena de Oliveira Azevedo, Maninha A. França, Marcemira Carvalho, Marciana Guimarães,


Voluntárias no Centro Recreativo Sanjoanense - CRS

Margarida de Azevedo Coelho, Margarida Noronha, Maria Aparecida Fontão de Sousa, Maria Braga, Araci Silveira, Maria Conceição Amorim, Maria Conceição de Oliveira Andrade, Maria Conrado Donadi, Maria das Dores França, Maria de Lourdes Aguiar, Maria de Lourdes Nogueira, Maria do Carmo Fleuri,

Maria Fontes de Rezende, Maria J. Azevedo Andrade, Maria José Barbosa, Maria José Ferreira Andrade, Maria José Loiola, Maria Luiza Andrade, Maria Luiza de Azevedo Costa, Maria Rosa R. de Azevedo, Maria V. Ferreira, Maria Vasconcelos Westin, Máxima Alvanira de Andrade, Miréia Mendes Teixeira Noronha, Mota Rocha, Nadir de Castro, Nair dos Santos, Conceição Magalhães, Nair Almeida, Neguinha Guglioti, Nina Oliveira Nogueira, Noêmia Quaresma, Normantina de Castro, Odete Loiola, Odilia Andrade, Olímpia de Oliveira Andrade, Ondina Ferreira de Andrade, Osvaldina Carvalho, Placidina Mota, Rita de Cássia de Azevedo Costa, Rita Valentim Ferraz, Tereza Pasquino, Titã Ferreira Kielander, Tomazina Aceturi, Zinha de Almeida Carvalho, Zulmira Costa, Zulmira Lima

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SOLDADOS SANJOANENSES QUE LUTARAM EM OUTRAS FRENTES Américo Brisa, Arlindo Mendes Artuzio Gianelli, Benedito Araújo, Calimério Ferreira, Euclydes Carvalho Silva, Francisco Lino, Francisco Salomão, José Lobo, Lulu, Moacir Alvarez, Paulo Emílio Oliveira Azevedo, Primo Sguassábia, Ruy Alvarenga, Sérgio Loiola, Vicente Andrigueto, Xandico

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Eucydes de Carvalho Silva teve papel importante na vida social de São João da Boa Vista. Foi vereador, diretor do jornal “A Cidade de São João” entre outras funções. Em 1932 foi soldado voluntário em Jaú.


REFERÊNCIAS:

Matildes Rezende. História de São João da Boa Vista. Sem editora. 1976. DEL PICCHIA, Menotti. A revolução paulista: MONTENEGRO, Benedicto e Weissohn, Aberto através de um testemunho do gabinete do Go- Aguiar (org.) Cruzes Paulista. Revista dos Tribunais. 1936. vernador. São Paulo. 1932. Sem editora PAULA, Jeziel. 1932: Imagens construindo uma NOBREGA, Gilberto. Memórias de um Bancáhistória. Campinas/Piracicaba. Editora da Uni- rio.São Paulo. 1973. O GLOBO, Revista. (Edição do dia 9 de julho de camp. Editora Unimep. 1997. SILVA, Hélio. 1932: A guerra Paulista. Rio de Ja- 1952) MANCHETE, Revista (Edição 13 de julho de neiro. Civilização Brasileira. 1967. DONATO, Hernani. História da Revolução Cons- 1957) titucionalista de 1932: comemorando os 70 O GLOBO, Revista. (Edição de 9 de julho de 1972) anos do evento. São Paulo. Ibrasa. 2002. LEVY, Herbert V. A Coluna Invicta. Romão Go- MEIRA, Tenente Mário. Histórico da Revolução de 1932. 1935 mes. Ed. Saraiva & Cia. São Paulo. 1933 VILLA, Marco Antonio. Imagens de uma revo- O MUNICÍPIO, Jornal. A heroína paulista da relução. Imprensa Oficial do Estado de S.Paulo. volução de 32. Artigo de Maria Leonor Alvarez Silva. Edição de 24 de março de 1973. 2009. AZEVEDO, José Osório de Oliveira. História Ad- Internet: ministrativa e política de São João da Boa Vis- MULHERES DE SÃO JOÃO. <http://www.mulheresdesaojoao.com.br> ta. Editora Sarandi. 2009. OLIVEIRA, Benedito Fernandes. Revolução Pau- NÚCLEO DE CORRESPONDÊNCIA SOLDADO MARIA SGUASSÁBIA. <http://mmdcsjbv.blogslista de 1932. Ed. Revista dos Tribunais. 1950. SILVA, Maria Leonor Alvarez e Lopes Salomão, pot.com.br>

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