O Homem que Inventou o Natal

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Este livro Ê dedicado ao Sam Weller da vida real, que me ensinou sobre o mercado de livros em um templo mundano de Salt Lake City, e a Mitchell, Rona, Otto e Marshall, e a tantas pessoas do mundo dos livros de toda parte. Deus abençoe a todos.



Índice N ascimento 1

Parte Um

V acas M agras 7

N ão D eixai

Parte Dois que

N ada

vos

D esanime 67

Parte Três

Q ue D om

é

E ste 153

Parte Quatro

H á M uito T empo 183 Notas 213 Bibliografia 221 Agradecimentos 223



Atentem, não faço sermão ou distribuo esmola, Quando dou, me dou por inteiro.

– Walt Whitman



Nascimento


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N

a Londres de 1824, era praxe dispensar a um devedor quase o mesmo tratamento reservado a um homem que roubasse uma bolsa. Nesta história, o inadimplente era pai de sete filhos e,

embora tivesse um emprego lucrativo, não o considerava lucrativo o suficiente. A dívida fora feita com um banqueiro, um homem chamado Karr que morava na rua Camden, e o valor era de quarenta libras, soma nada desprezível naqueles dias em que uma ostra custava um centavo e um salmão inteiro saía por uma libra e seis centavos – um tempo em que um secretário que trabalhasse para um patrão sovina podia não ganhar essa quantia no ano inteiro. As contas foram apresentadas e a autoridade local, consultada, restando ao homem ser encaminhado para a devida punição. Este pai – John, era seu nome, e sua idade, trinta e sete anos – foi levado ao que era chamado na época uma “sponging house”, prisão temporária para devedores e espécie de purgatório que concedia aos que não haviam cumprido suas obrigações alguns dias para buscar auxílio – a intervenção de uma pessoa influente, um possível empréstimo de amigos ou da família – para se livrar das acusações de seus credores. A situação estava posta e a ajuda não chegou. Dois dias se passaram

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Nascimento sem uma boa notícia e, então, nosso John, oficialmente um devedor, foi encaminhado para a prisão Marshalsea e colocado atrás das grades junto a contrabandistas, amotinados e piratas. “O sol se pôs para sempre para mim”, disse à sua família. O filho de John, então com doze anos, tentou ajudar encontrando um emprego – a seis xelins por semana – em uma fábrica localizada num prédio decadente às margens do rio Tâmisa. Um dia, muito tempo depois, esse garoto diria sobre o local: “Os cômodos de paredes descascadas, chão e escada podres, velhos ratos cinzas infestando os telhados e o som deles martelando e arranhando, descendo pelas escadas todo o tempo, a sujeira e decadência do local se elevaram visivelmente diante de mim, era como se estivesse lá novamente”. A função do menino consistia em encher pequenos potes com graxa de sapatos, embrulhá-los com papel e, depois, colar um rótulo em cada um. O garoto trabalhava dez horas por dia e precisava se posicionar junto à janela para enxergar melhor – de modo que qualquer pessoa que passasse na rua podia vê-lo. Havia uma pausa para o almoço ao meio-dia e outra para o chá da tarde. Embora o local fosse lúgubre e a atividade, entorpecedora – e essas circunstâncias tivessem colocado fim à sua infância – o menino continuou a trabalhar. Porque seu pai estava na prisão. Por conta de uma dívida de quarenta libras. Pelo pão de sua família. “Toda minha natureza fora de tal forma penetrada pela tristeza e humilhação dessas circunstâncias”, o garoto escreveria um dia, “que mesmo agora... frequentemente esqueço em meus sonhos que tenho uma esposa querida e filhos; mesmo já sendo um homem, ainda vago

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desoladamente por esta época de minha vida.” Ainda que essas palavras comprovem a força do golpe sofrido na infância, ao mesmo tempo mostram que uma melhora geral da situação chegaria com o tempo. Que o garoto não passaria a eternidade nessa atividade desoladora e que seu pai não ficaria para sempre em Marshalsea – embora tenha amargado três longos meses por lá, recebendo visitas de seu jovem filho em um pequeno cômodo localizado atrás de paredes muito altas de onde, o garoto lembraria depois, “vinham muitos gritos”. E foi onde seu pai disse a ele para “aprender com Marshalsea que, se um homem ganha vinte libras por ano e gasta dezenove libras, noventa e nove xelins e noventa e nove centavos, ele é feliz; e que um único xelin gasto a mais o colocaria em desgraça”. Com essas palavras de lamento e precaução e com o sino avisando que eram dez horas da noite, nosso garoto de doze anos voltaria para casa caminhando uma distância de cerca de oito quilômetros pelo nevoeiro de Londres, com apenas algumas horas de distração antes que os ratos e os pequenos potes de graxa fossem novamente sua ocupação.

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nome do garoto era Charles, claro, e seu sobrenome, Dickens. Muitos que comentaram sobre a vida do afamado autor observaram que suas tristes experiências da infância – descritas

em um rascunho de autobiografia nunca publicado em vida – tiveram significativa contribuição em seus anos de formação. Toda arte brota das perdas do artista, alguém já disse – e, dessa forma, as agruras do pequeno

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Nascimento Dickens se tornariam um imenso presente para o mundo. Dickens, considerado por muitos um dos mais talentosos escritores de língua inglesa, publicou vinte romances em vida – ele morreu em 1870 – e nenhum deixou de ser republicado ao longo dos anos. Sua experiência pessoal em duras condições de trabalho e a profunda empatia pelos pobres estão presentes em grande parte de sua obra, e muitos estudiosos do autor se dedicaram a traçar paralelos entre sua vida e seus textos. O número de livros acadêmicos, dissertações, monografias e artigos dedicados a Dickens – e a algumas de suas obras mais duradouras, como Oliver Twist, David Copperfield, Bleak House e Grandes Esperanças1 – é praticamente impossível de contar. Porém, talvez o mais conhecido, e certamente o mais amado dos trabalhos de Dickens, inspirou, paradoxalmente, poucos estudos. Embora Um Conto de Natal tenha muitos pontos de contato com a vida de Dickens e seja a apoteose dos seus temas preferidos – e embora o texto tenha sido burilado à exaustão pelo autor, e muitas vezes considerado sua obra mais “perfeita” – a atenção dedicada ao livro pelos críticos foi escassa. Talvez porque a obra seja curta, com menos de 30 mil palavras; talvez por conta de sua enorme popularidade – acredita-se que seu índice de leitores no final do século 20 perderia apenas para o da Bíblia; ou talvez haja simplesmente uma grande dificuldade ou até indiferença em analisar algo que é simplesmente bom demais. Contemporâneo de Dickens, William Makepeace Thackeray, um dos críticos mais severos a ter circulado pelas ruas de Londres em todos os tempos, certa vez 1. As obras de Dickens aparecem com os títulos traduzidos somente no caso de terem sido lançadas no mercado brasileiro. Quando havia mais de uma opção, optou-se pelo título em português da edição mais recente. (Todas as notas de rodapé desta edição são dos tradutores.)

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falou da obra: “Quem ouvirá objeções a um livro como esse? A obra me parece um bem à nação e um presente cheio de bondade para qualquer homem e mulher que a leia”. Porém, talvez o mais surpreendente sobre a história por trás desse conto tão conhecido seja o papel que desempenhou tanto na carreira de Dickens quanto na história cultural como um todo. Na época em que o escritor se sentou para trabalhar em seu “magro volume”, sua popularidade – que já fora inigualável – corria perigo, sua reputação entre os críticos era periclitante e sua conta bancária estava em má situação. Encarando uma possível falência financeira, Dickens considerou a hipótese de parar de escrever ficção para sempre. Mas, ao invés disso, juntou forças e, em seis semanas, produziu um livro que não apenas o levou novamente à glória como também iniciou uma transformação do que era, então, uma data menor, na celebração mais importante do calendário cristão. Entretanto, como se diz, estamos colocando o carro na frente dos bois.

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Parte Um Vacas Magras


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1.

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a tarde de 5 de outubro de 1843, Charles Dickens, então com 31 anos, aguardava sua vez num palco da poluída cidade de Manchester, certamente sem imaginar que aquela tarde inicia-

ria um processo que mudaria sua vida – e a da cultura ocidental – para sempre. No momento, sua atenção estava voltada ao colega escritor e membro júnior do Parlamento, Benjamin Disraeli, que concluía seu discurso, diante de uma plateia interessadíssima. Dickens e Disraeli, junto ao inflamado político Richard Codben, eram os palestrantes escalados para uma programação especial, que visava levantar fundos para o Manchester Athenaeum, farol das artes e ciências da capital industrial. Projetado por Charles Berg, arquiteto dos prédios do Parlamento, o quarteirão do Athenaeum (assim como sua missão) era destinado a trabalhadores de baixa renda famintos por um pouco de cultura, e aos líderes mais progressistas da cidade. Porém, uma persistente decadência da economia nacional – parte do incessante ciclo de ascensão e queda que a Revolução Industrial promovera – havia empurrado o Athenaeum a um buraco de grandes dívidas que colocava seu futuro em cheque.

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Vacas Magras Com a esperança de mudar o rumo dos acontecimentos, Cobden, membro do governo local, além de parlamentar, se juntou a outros cidadãos engajados para criar o plano de um bazar e de uma grand soirée no Free Trade Hall. Oponente popular e vociferante das Corn Laws – que impunham taxas enormes aos grãos importados com o objetivo de inflar os lucros dos proprietários de terra da Inglaterra às custas de cidadãos que muitas vezes não tinham dinheiro sequer para comprar pão – Cobden estava sempre disposto a reunir uma plateia. E com Disraeli e Dickens participando do evento, os promotores contavam com uma bonança de compras e novas subscrições que ajudassem a assegurar o futuro do Athenaeum de uma vez por todas. Disraeli – o homem que mais tarde participaria por quarenta anos do governo da nação, com duas passagens como primeiro-ministro, impulsionando seu país a conquistas épicas como a anexação do Chipre e a construção do canal de Suez – era, nessa época, um simples filho de judeus consciencioso e sociável, um político em início de carreira que deixara de estudar Direito para escrever uma série de romances populares. Mas o destaque do evento, sem dúvida, era Dickens, que tinha se tornado possivelmente a primeira verdadeira celebridade mundial das grandes artes. O autor de Crônicas de Boz , As Aventuras do Sr. Pickwick, Oliver Twist, Nicholas Nickelby e The Old Curiosity Shop era de longe o escritor que mais vendia livros no país, aclamado tanto por seus temas recorrentes – que retratavam apaixonadamente a miséria dos pobres e a presunção e arrogância dos ricos – quanto por seus poderes fascinantes como contador de histórias. Mas, mesmo com todas essas conquistas, o

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homem sentado naquele palco de Manchester estava perturbado. Era fato que ele partira de uma infância pobre para atingir um sucesso inimaginável e uma enorme influência. Mas o que o preocupava naquela tarde era quão rápida – e descontroladamente – sua boa fortuna tinha se dissipado.

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a verdade, a história da ascensão de Dickens, de seus dias miseráveis na fábrica de graxa de sapatos em Londres até sua aparição em

Manchester, é quase um melodrama: A educação do escritor foi interrompida pela primeira vez aos doze anos quando seu pai – um secretário da Marinha que sempre tivera dificuldades em cumprir obrigações financeiras – foi mandado para a cadeia por conta de uma dívida (com o tempo, todo o resto da família, incluindo a mãe de Dickens, Elizabeth, e seus três irmãos e irmãs mais novos, acabaria por se juntar ao pai em Marshalsea). Embora o garoto tenha conseguido voltar à escola logo após seu pai ser solto, a fortuna da família naufragou novamente quando ele completou quinze anos e teve de abandonar os estudos para se tornar secretário aprendiz de um escritório de Direito. Achava seu novo trabalho apenas parcialmente mais interessante que o da fábrica de graxa e, tendo rapidamente percebido a hipocrisia e os labirintos egoístas do sistema legal, formulou para toda vida uma distinção entre “justiça” e “the law”. Em 1829, aos dezessete anos, Dickens começou a trabalhar como

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Vacas Magras estenógrafo de tribunal e, cinco anos mais tarde, aos vinte e dois, passou a escrever para um jornal britânico, o Morning Chronicle, que o despachou pelo país para cobrir várias eleições. Nesse percurso, Dickens descobriu um interesse e uma facilidade em escrever sobre os costumes, as excentricidades e as tragédias nos quais as maquinações políticas e legais da nação estavam calcadas; seu olho arguto e seu humor cáustico abriram portas para que ele publicasse um grande número de textos em periódicos – prática que não apenas ajudou a aumentar sua renda como também gratificou seu ego. Sobre seu primeiro texto impresso, uma crônica intitulada “A

Dinner at Poplar Walk” publicada na edição de dezembro de 1833 da Monthly Magazine, Dickens escreveu: “Foi a primeira revista na qual minha veemência apareceu impressa em toda sua glória. Peguei o exemplar com cuidado, com medo e tremendo, de uma caixa de correio escura dentro de um escritório escuro, no tribunal da rua Fleet. Na ocasião – como me lembro bem! – caminhei em direção ao Westminster Hall e lá fiquei por meia hora com meus olhos tão tomados de orgulho e alegria que não poderiam suportar a rua”. Grande parte das publicações “extras” de Dickens tinha o formato de crônicas rudimentares. E foi com elas que o autor fez seu nome e iniciou seus trabalhos de não ficção no Chronicle – especialmente com a série “Crônicas de Rua”, na qual oferecia aos leitores pela primeira vez uma visão vívida e empática do cotidiano das pessoas comuns de Londres. Textos como “Brokers and Marine Store Shops”, “The Old Bailey” e “Shabby-Genteel People” não apenas fascinaram os leitores da época

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como foram o embrião para o estilo dramático hoje chamado de novo jornalismo. Como observa o crítico Michael Slater: “Nessas crônicas Dickens já experimentava, de forma bastante efetiva, timbres do cômico e do intensamente patético que conquistariam e manteriam milhares de leitores devotos nos anos por vir.” Com o sucesso no Morning Chronicle, o editor do jornal, George Hogarth, convidou o escritor para criar séries similares para serem lançadas em uma nova publicação, o Evening Chronicle. Logo, Dickens estaria publicando regularmente no novo jornal e em outras publicações, assinando como “Boz” e gerando um rebuliço nos círculos literários de Londres. Em outubro de 1835, o editor John Macrone ofereceu a Dickens cem libras pelo direito de publicar uma coletânea das Crônicas de Boz, um pagamento impressionante para um jovem repórter que ganhava cerca de sete libras por semana. O uso de pseudônimos na publicação de itens literários era uma prática comum na época, e uma onda de suposições eclodiu entre “o pessoal do meio” sobre a verdadeira identidade do autor de figuras tão populares quanto Fitzboodle, Titmarsh e o Sr. C. J. Yellowplush. Dickens se divertiu ao mostrar aos amigos o conteúdo de um bilhete secreto que recebera informando com absoluta certeza que o escritor por trás do apelido “Boz” era ninguém menos do que seu amigo e companheiro ensaísta Leigh Hunt. Somente depois que as propagandas de Crônicas começaram a circular, a verdadeira identidade de “Boz” (tirada de um apelido de infância do irmão mais novo de Dickens, Augustus) foi revelada, e por muitos

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Vacas Magras anos Dickens manteve o nome falso que o tornara tão popular. Os amigos o chamavam de Boz e o próprio escritor, muitas vezes, se referia a si próprio na terceira pessoa. (Tempos depois, Dickens seria homenageado no “Baile de Boz” durante sua passagem pelos Estados Unidos, e, em 1843, seu romance Martin Chuzzlewit traria na página de créditos a anotação “editado por Boz”, embora apresentasse seu autor como Charles Dickens.) Crônicas foi publicado em fevereiro de 1836 e se tornou um grande sucesso. De repente, Dickens se viu aclamado como o porta-voz da classe baixa e inimigo das coisas supérfluas, privilégios injustos e falas pomposas e vazias. Um jornal o considerava “uma espécie de Boswell2 para a sociedade” e outro clamava que as crônicas do autor eram “uma perfeita representação da moral, dos costumes e dos hábitos de grande parte da população da sociedade inglesa”. John Forster, que se tornaria com o tempo um dos grandes amigos, conselheiros e o primeiro editor de Dickens, escreveu no Examiner que o escritor possuía talento especial para os retratos do patético e do ridículo, tudo com um “estilo agradável e atrativo”. O sucesso de Crônicas de Boz levou os editores Chapman and Hall a contatar Dickens para um projeto que já fora abandonado algumas vezes antes. Um artista chamado Robert Seymour propusera aos editores uma série de publicações sobre esportes, com suas xilogravuras acompanhadas por um texto vivo e atraente. Dado o que Dickens conseguira com Crônicas, o autor parecia ser o homem certo para adicionar tempero a 2. O escocês James Boswell (1740-1795) é considerado um dos maiores cronistas do século 18.

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essa empreitada, disseram os editores, que lhe ofereceram catorze libras por mês para tocar o projeto. Dickens, entretanto, inicialmente se mostrou evasivo. Argumentou que, “embora eu tenha nascido e sido parcialmente criado no campo, não sou um grande esportista, exceto no que se refere às formas de locomoção; a ideia não é uma novidade, e já foi bastante utilizada; será infinitamente melhor se os desenhos forem feitos baseados nos textos [e não ao contrário]; porque, de qualquer forma, acabo fazendo as coisas do meu modo, levando em conta uma variedade de pessoas e cenários ingleses, e temo acabar fazendo isso de qualquer forma”. Por conta de sua admiração por Boz, a Chapman and Hall concordou em tocar o projeto como queria Dickens – ele seria o cachorro e Seymour a cauda – e, com isso acertado, o escritor começou a trabalhar. Ele escreveria mais tarde: “Como minha visão do projeto fora acatada, logo pensei no Sr. Pickwick e escrevi o primeiro número”. O que Seymour concebera como uma espécie de série estendida de cartuns inspirados nos tipos esportivos Cockney3, se transformou em algo muito mais rico nas mãos de Dickens. Os dois se encontraram pessoalmente apenas uma vez, em 17 de abril de 1836, “para tomar uma taça de grogue”, nas palavras de Dickens, e discutir algumas mudanças que o escritor pensava serem necessárias para a segunda edição do que era agora chamado The Posthumous Papers of Pickwick Club, por Boz. Seymour, bastante à vontade em seus domínios, deve ter percebido em que direção os ventos começavam a soprar, mas ainda assim foi suficientemente ami3 Estilo dos moradores da zona leste de Londres.

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Vacas Magras gável. Ele fez as mudanças que Dickens pediu e... ... e, então, em 20 de abril, depois de rabiscar um bilhete para sua esposa – e “seus melhores e mais queridos” conhecidos – Seymour se matou. Seymour não fez qualquer menção no bilhete à decadência de sua trajetória de trabalho, nem havia ali qualquer lamento amargo sobre o fato de que, de mestre do projeto, ele se tornara seu escravo. É uma das inegáveis ironias da história, de qualquer forma, que a derrocada artística de uma carreira tenha marcado a ascensão meteórica de outra. Sem Seymour, Dickens foi forçado a encontrar um outro artista, Halbot Browne, para desenhar as tiras de Pickwick. Um homem casado agora (ele e Catherine Hogarth tinham celebrado seus votos em 2 de abril), Dickens também negociaria um aumento com Chapman and Hall para vinte libras por mês, com a condição de que expandisse cada número de Pickwick de vinte e seis para trinta e duas páginas. Para Chapman and Hall, a aposta na continuação do projeto foi uma espécie de voto de confiança, já que as vendas do primeiro número não chegaram a quinhentas cópias – e a segunda e a terceira edições tiveram resultados apenas um pouco melhores. No quarto número, porém, Dickens gozava do controle completo da publicação. A partir dessa edição, ele iniciou a transformação do Sr. Pickwick de um tolo em um protagonista benevolente e incomparavelmente cômico, servido e aconselhado pelo fiel Sam Weller, cujas pungentes observações sobre seu honesto, porém confuso mestre servem de inspiração para quadrinhos mordazes e cômicos até hoje: “Agora parecemos mais confortáveis e com-

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pactos, disse o pai enquanto cortava a cabeça de seu filho para curá-lo do estrabismo”. Com a tolice ingênua da revista original substituída por um humor tão negro e afiado, o Pickwick Club cresceu aos olhos do público. As vendas do quarto número saltaram para 4 mil exemplares. No número onze, 14 mil cópias foram vendidas. E ao fim do projeto, em novembro de 1837, mais de 40 mil leitores fizeram fila para comprar as histórias. A era de Dickens como uma verdadeira celebridade começara.

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ivros inteiros se debruçam sobre o impacto que a imensa popularidade de Dickens teve no mundo das publicações, e geralmente o

autor é considerado responsável por, sozinho, ter transformado toda uma indústria. Por várias vias, Dickens influenciaria o universo editorial tão profundamente quanto as máquinas a vapor e o alto-forno fizeram pela indústria de manufaturas. A indústria das publicações evoluiu marcadamente no último século, a partir do momento em que a interessante nova forma chamada romance fez sua estreia. Os críticos modernos ainda debatem qual teria sido a publicação a marcar o ponto de virada do gênero, mas todos são unânimes em afirmar que nenhum trabalho comparável aos de Defoe (Robinson Crusoé, 1719), Fielding (Tom Jones, 1729) e Richardson (Clarissa, 1740) surgiu desde então. Essa forma de escrever, com um grupo de personagens imaginários envolvidos numa narrativa atraente que acontece em um mundo que parece quase real – sempre

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Vacas Magras buscando em primeiro lugar entreter o leitor, e não ser intelectualmente edificante – se provou extremamente popular entre o público leitor britânico. Em contraste com os modelos anteriores de publicações – a Bíblia, livros escolares, livros de hinos, manuais de instruções e semelhantes – os romances eram efêmeros, feitos para serem consumidos e descartados. Por isso, criaram uma demanda constante por novos trabalhos não apenas de qualidade literária, mas também de um ramo duradouro de estórias de aventura, contos góticos e ficções de todo tipo. O romance “talher de prata”, que acontecia no cenário da alta sociedade britânica, era uma das muitas subcategorias populares na década que precedeu a da produção de Dickens – sendo Vivian Grey (1827), de Disraeli, um dos livros mais notáveis do gênero. Há uma estimativa de que, entre 1815 e 1850, cerca de 3500 romances tenham sido publicados para tentar prover a constante demanda. Esses romances eram geralmente publicados em pequenas tiragens de mil ou dois mil exemplares, apenas alguns atingiam patamares mais altos. Sir Walter Scott, que publicou sua primeira obra, Waverly, em 1814, e que publicaria um novo livro praticamente a cada ano até sua morte, em 1832, foi o primeiro escritor cujo sucesso provou que uma pessoa poderia, de verdade, fazer de sua produção literária uma carreira. Seu Ivanhoé vendeu toda a tiragem inicial de 10 mil exemplares, uma situação sem precedentes, e poucas semanas após a publicação, em 1819. Na época de Dickens, nenhum livro chegara a tal patamar, mas isso não impedia os editores de sonhar, claro.

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Inicialmente, comercializavam seus livros diretamente junto ao público, trabalhando principalmente com a venda via postal. As propagandas eram colocadas em revistas e jornais, entregues pelo correio ou por jornaleiros em Londres e em todo o país, e os leitores encomendavam o que fosse de interesse. Foi nessa época que jornais e revistas começaram a fazer listas de lançamentos e falar das obras recomendadas e, em meados de 1700, as resenhas críticas passaram a aparecer regularmente para orientar os leitores em suas escolhas. No século 18, as editoras, em sua maioria, eram empresas pequenas e familiares que, para evitar a ameaça de ter exemplares não vendidos lotando casas ou escritórios, abriam lojinhas com a ideia de atrair o público que caminhava pelas ruas. Outras, como fez a Chapman and Hall em 1830, começavam seus negócios como vendedoras de livros, mas tinham a intenção de se lançar a uma produção própria. Essas empresas verticalmente integradas – nas quais as atividades de editar, imprimir, fazer o marketing e vender aconteciam sob o mesmo teto – persistiram até meados do século 19, embora houvesse algumas livrarias que vendessem itens de papelaria, revistas, jornais e afins. No início dos anos 1800, uma mudança significativa aconteceu no mercado editorial. A Revolução Industrial encorajara não apenas a especialização na manufatura, como também nas práticas de negócio como um todo. As metas e os métodos para projetar, produzir e vender no atacado e no varejo eram muitos distintas, e a situação não era diferente no mercado de livros. Por isso, essas empresas verticalizadas de publicações começaram a se fragmentar, de acordo com seus pontos fortes e os inte-

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Vacas Magras resses dos envolvidos. Por volta de 1800, por exemplo, a família Longman começou a se retirar do varejo para se concentrar exclusivamente no trabalho editorial; em 1820, a empresa limitaria ainda mais seu escopo, fixando-se no tema educação, um foco que mantém até nossos dias. Em 1840, William Henry Smith, filho do dono de uma papelaria de West End e ex-atacadista, colocou a pedra fundamental para o que hoje chamamos de franchising, ao abrir sua primeira rede de livrarias em estações de trem espalhadas por todo o país – sua empresa era conhecida na época e continua sendo até hoje como W.H.Smith. O epicentro do varejo de livros em Londres também se deslocou. Enquanto a edição e a impressão continuavam acontecendo no centro da capital, os varejistas seguiram a migração das classes média e alta em direção a afluentes regiões a oeste, como Covent Garden, St. James e Chelsea. Na época de Dickens, havia duas dúzias ou mais de lojas fornecendo itens aos subúrbios do oeste, como a de John Hatchard, cuja livraria em Piccadilly, aberta desde 1782 e ainda em funcionamento, se tornou a maior de Londres em seu ramo de atividade. Outra prática moderna também apareceu em Londres mais ou menos na mesma época. O vendedor de livros James Lackington, declarando agir no interesse do público leitor, percebeu de forma sagaz que vender muitos livros com uma margem pequena era mais lucrativo que vender uns poucos com uma margem alta. Então, começou a comprar grandes quantidades de livros encalhados dos editores, baixando enormemente os preços, o que fazia os exemplares voarem porta afora de sua

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loja, chamada Templo das Musas. Foi assim que o lucrativo negócio dos “encalhes” começou. Embora Lackington tenha despertado a fúria de muitos colegas varejistas antes de morrer, em 1815, os editores intimamente o adoravam por oferecer uma possibilidade de recuperar parte das perdas com as quais teriam de arcar por apostar tão alto no cavalo literário errado. Enquanto o varejo de livros se apoiava largamente em acordos mútuos de não dar descontos nos preços de capa dos livros, Dickens era um defensor do sistema de livre mercado e um oponente de qualquer estratégia de preço fixo. Mas, é claro, tinha razões para fazer vista grossa no que se refere à guerra de preços, já que o dinheiro recebido por seus escritos no começo da carreira não vinha das vendas dos livros, mas de contratos que pagavam por uma produção rotineira de palavras. A maior parte de seus trabalhos era feita e publicada em formato de capítulos, a cada vinte dias ou mensalmente, e vendida como parte integrante de uma publicação famosa por um xelin. O pagamento pelos trabalhos de Dickens saltara de 14 libras por capítulo em Pickwick para 150 libras em Nicholas Nickelby e 200 libras em Martin Chuzzlewit, por exemplo (com bônus que variavam conforme a circulação e as republicações). Quando um romance estava completo, os editores juntavam tudo numa caixa de três volumes para em seguida oferecê-la aos leitores por 31 xelins e 6 centavos, um preço alto para o leitor acostumado a pagar um xelin por capítulo para ter em mãos sua leitura preferida. Na verdade, o público foco para as caixas era a grande rede de bibliotecas comerciais do país, um mercado que se beneficiaria da enorme po-

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Vacas Magras pularidade de Dickens. O maior desses sindicatos chegaria a encomendar até 2500 cópias da mais recente dessas caixas do autor – e, na verdade, as bibliotecas comerciais preferiam o formato de três volumes porque podiam cobrar três vezes a taxa de empréstimo. Conforme Dickens foi ficando mais velho e mais esperto, passou a fechar contratos que repassavam a ele uma porcentagem por esse tipo de republicação de seu trabalho.

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orém, ninguém poderia antecipar a variedade de oportunidades que apareceriam na esteira de Pickwick. Uma verdadeira indústria

floresceu impulsionada pelo sucesso do livro, incluindo uma produção de porcelanas com figuras que representavam os personagens, chapéus, livros de piadas, livros de letras, de músicas e cigarros. Houve até mesmo uma adaptação não autorizada para o teatro, representada no Strand (Sam Weller ou Os Pickwickans) – uma espécie de assalto autoral que

resultou em uma das explosões intempestivas de Dickens contra aqueles que tentavam lucrar em cima do sucesso de sua obra. Como o próprio Dickens escreveu a Forster, em setembro de 1837, várias semanas depois da estreia da peça, “se Pickwick foi o meio encontrado para jogar alguns xelins no bolso carcomido dessa criatura tão miserável [o ator de teatro William George Thomas Mocrieff], e o salvou da cadeia ou de trabalhos forçados, deixe-o ficar com suas migalhas e que as use bem. Fico satisfeito de ter sido o meio para que ele se livrasse de sua miséria”.

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Parte dessa proclamada benevolência de Dickens se calcava no fato de ele ter muitos outros assuntos lhe roubando a atenção naquele momento. Além de produzir capítulos de As Aventuras do Sr. Pickwick, concordara, em novembro de 1836, em ser editor de uma nova revista, publicada por Richard Bentley, que se chamou Bentley’s Miscellany. O contrato lucrativo assinado com Bentley permitiu que o escritor se livrasse do que se tornara uma obrigação que tomava tempo: o Morning Chronicle. E ele se demitiu imediatamente. Junto com o novo trabalho de editor e a produção de As Aventuras do Sr. Pickwick, Dickens se comprometera também a escrever material novo para uma segunda edição das Crônicas de Boz. E, como se não fosse suficiente, assinara um contrato em maio de 1836 com John Macrone – editor das Crônicas – para produzir um romance em três volumes intitulado Gabriel Vardon, o Chaveiro de Londres, que deveria ser entregue em 30 de novembro. (E ainda havia a produção de uma opereta cômica para o St. James Theatre, As Coquetes da Vila, para a qual ele escrevera o libreto.)

Dickens assinaria mais um contrato com Bentley, em agosto de 1836, para publicar dois romances em três volumes. E, como Bentley estava oferecendo – após o sucesso meteórico de Pickwick ter incrementado a reputação de Dickens – 500 libras por livro, e Macrone, apenas 200 libras, o escritor desistiu do primeiro contrato, o que diminuiu o peso sobre seus ombros. Escreveu um conto para a edição de estreia da Bentley’s, que saiu na virada de ano de 1837, e, cinco dias depois, seu primeiro filho, Charley, nasceu. Logo em seguida, Dickens informou a Bentley

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Vacas Magras que manteria seu compromisso com a revista, publicando capítulos das aventuras de um jovem herói chamado Oliver Twist. Bentley topou, mas quando percebeu que Dickens por vezes escrevia menos do que as dezesseis páginas prometidas para cada número, começou a pagar o autor proporcionalmente. Na época, Dickens andava infeliz por conta da súbita morte de sua cunhada, Mary Hogarth, em 1837 (alguns críticos suspeitam que o autor sentia maior atração pela moça do que por sua própria esposa), e pelo subsequente aborto do que seria seu segundo filho, sofrido por Catherine. Quando o escritor descobriu o que Bentley estava fazendo, contra-atacou insistindo que aceitasse Oliver Twist como um dos romances que havia concordado em escrever. Bentley argumentou que Dickens estava propondo, essencialmente, receber duas vezes pelo mesmo trabalho, ao que o escritor respondeu que seu valor de mercado aumentara imensamente desde que ambos tinham feito o contrato para a produção dos romances. Foi apenas quando Dickens ameaçou deixar o posto de editor da Miscellany que Bentley cedeu. Então, o autor pôde rapidamente finalizar o último capítulo d’As Aventuras do Sr. Pickwick em novembro de 1837, para, todo satisfeito, voltar sua atenção a Oliver Twist. Embora tenha havido questionamentos sobre a originalidade do projeto (George Cruickshank, o ilustrador do livro, diria mais tarde que ele levara ao autor a ideia de uma história sobre as aventuras de uma criança pobre em meio a ladrões), Dickens trabalharia no livro até a publicação do último capítulo, em abril de 1839. Era seu segundo romance e – com a cena memorável de Oliver, com sua parca tigela de comida,

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inocentemente pedindo ao Sr. Bumble, da casa de auxílio aos pobres, por “mais” – a história do menino que escapara do abrigo para cair nas garras do mestre do crime Fagin se tornou um de seus trabalhos mais conhecidos. Peter Ackroyd, autor de uma moderna e definitiva biografia de Dickens, sustenta que Oliver Twist foi o primeiro romance na história a colocar uma criança no papel de protagonista. Se esse foi um gesto inconsciente de um escritor acertando as contas com suas tristes memórias de infância ou uma resposta a uma sugestão dada por um ilustrador, o resultado final é igualmente poderoso. Twist foi também rotulado de o primeiro romance Vitoriano (dado que a rainha chegara ao trono em junho de 1837) e Dickens usou a voz de Oliver para reforçar a forte crítica social que seria marca do escritor por toda sua vida. A inclinação natural para dramatizar a injustiça está no cerne da longevidade dos trabalhos de Dickens. Havia estilistas mais elegantes e talvez pensadores mais sutis no mercado de autores da época, e Dickens evoluiria na elegância e na sutileza em suas obras posteriores. Certamente, suas primeiras tramas são algumas vezes forçadas, alguns de seus personagens, unidimensionais, e pode-se com justiça acusá-lo de ter uma tendência ao melodrama. Mas, ainda assim, a inata sensibilidade de Dickens aos problemas essenciais da sociedade, junto com sua habilidade em retratar o conflito entre as forças elementares do bem e do mal de forma a deixar seus leitores grudados no livro, são pontos fortes inegáveis, mesmo em seus primeiros trabalhos. Já em Oliver Twist essas são características proeminentes.

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Vacas Magras Não há dúvida de que Dickens se inspirou em suas próprias experiências como um garoto de doze anos de idade trabalhando numa fábrica de graxa e morando sozinho numa pensão, enquanto seu pai e o resto da família se encontravam trancafiados em Marshalsea. Sua descrição do esconderijo de Fagin, o mestre do crime, guarda paralelos evidentes com suas memórias da fábrica infestada de ratos, e mesmo o nome do bandido foi tirado de Bob Fagin, um dos jovens colegas de trabalho do autor na fábrica Warren. Dickens guardava uma profunda vergonha da pobreza de sua infância e mantinha em segredo os detalhes dos problemas de sua família e de sua experiência na fábrica. Os únicos que sabiam a respeito eram sua esposa e Forster – que manteve total discrição até a publicação do livro A Vida de Charles Dickens, lançado após a morte do escritor. Algumas passagens de David Cooperfield e Little Dorrit fazem referência ainda mais evidente às memórias de Dickens, mas em Oliver Twist os leitores puderam entrar em contato, pela primeira vez, com o poder do que muitos críticos consideram a mais profunda influência na arte e na vida adulta do escritor. Interpretar uma obra de arte baseando-se no conhecimento da vida do autor tem limitações. Um caminho como esse pode levar, na pior das hipóteses, a um blá-blá-blá psicologizante ou, na melhor das hipóteses, acabar dando mais peso à biografia em si do que à força e ao prazer que o trabalho encerra. Quanto mais os observadores debatem as razões do sorriso da Monalisa, tanto mais a beleza do sorriso em si perde espaço. Mas, ao ler um livro como Oliver Twist, é absolutamente impossível assistir à humilhação do menino segurando sua tigela e pedindo “um pouco

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mais” sem pensar na experiência de Dickens amarrando caixas de graxa de sapatos na Warren, enquanto os pedestres olhavam apalermados: “Sei que todas essas coisas foram somadas para fazer de mim o que sou, mas nunca esqueci, nunca deverei esquecer, nunca poderei esquecer”. Graças a Deus, poderiam responder os leitores – se ele tivesse esquecido, Oliver Twist não existiria. O romance foi lido por uma vasta parcela da população e todos tinham uma opinião sobre a crítica social contida na obra – do homem humilde da rua ao mais proeminente cidadão da Inglaterra. A rainha Vitória achou Oliver Twist “muito interessante”, mesmo sem ter qualquer conhecimento sobre a vida de Dickens. O primeiro-ministro Lord Melbourne reclamou, entretanto, que “tudo se passa em abrigos, com bandidos e ladrões... Não gosto dessas coisas; desejo evitá-las; não gosto delas na realidade e, portanto, não as quero ver representadas”. Thackeray chegou a acusar Dickens de dar ares românticos ao crime e bateu firme ao classificar o livro como a ficção barata da moda. Mas, provavelmente, a maior evidência da vasta atração exercida pelo segundo romance de Dickens sejam as seis peças baseadas no livro que foram encenadas separadamente durante o ano de 1838. A maior parte delas era uma pálida tentativa de alcançar a linguagem das páginas do escritor, infelizmente, e embora Dickens muitas vezes se irritasse com as performances não autorizadas, elas lhe eram úteis. Durante uma das encenações, Dickens confessou mais tarde, ele se viu obrigado a se esconder, deitando no chão de seu camarote, do meio do primeiro ato até a peça terminar.

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