Anais 8° Bunkyo Rural2017 as palestras

Page 1

8ยบ Bunkyo Rural

1


8ยบ Bunkyo Rural

2


8º Bunkyo Rural

Mensagem A Comissão Bunkyo Rural, coerente com seus propósitos de promover o intercâmbio de ideias e conhecimentos relacionados à área rural, enfoca um dos pilares fundamentais voltados ao futuro da agricultura em nosso planeta - a sustentabilidade. Acredito que esse tema aponta para diferentes caminhos e alternativas e, certamente, a programação desta edição reflete essa diversidade. No entanto, fica evidente a preocupação dos organizadores em trazer aos participantes uma democrática seleção de temas, envolvendo seus aspectos técnicos e práticos, e enfocados por especialistas. Na presente edição, além de contar com o prestigio de autoridades como o exsecretário estadual da Agricultura e do Meio Ambiente, Dr. Francisco Graziano Neto, há também três opções para o Dia de Campo, bem como um workshop sobre os "Novos Rumos da Agroecologia" abrindo espaço para uma frutífera troca de ideias entre os participantes. A inovação fica por conta da Feira de Produtos Orgânicos, Gastronomia e Equipamentos que, certamente, será uma atração a mais nesta edição do Bunkyo Rural, destacando a qualidade e o sabor dos alimentos produzidos sustentavelmente. Aproveito esta oportunidade para agradecer a todos que tornaram possível esta realização: nossos parceiros, nossos patrocinadores e nossos apoiadores. Ao mesmo tempo, espero que possam aproveitar ao máximo o cenário bucólico do Centro Esportivo Kokushikan Daigaku, que em parte de sua área de 24 alqueires paulistas, preserva sua mata atlântica e nascentes. Agradeço ainda a presença do público que, efetivamente, é a razão motivadora para todo o esforço e dedicação dos integrantes desta Comissão. Sejam bem-vindos! E muito obrigada a todos.

Harumi Arashiro Goya Presidente Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social

3


8ยบ Bunkyo Rural

4


8º Bunkyo Rural

Mensagem São Roque tem sua história e economia ligadas a agricultura através dos tempos. Se nos primórdios seu fundador se instalou aqui com o objetivo de cultivar trigo e uva, no início do século XX, os imigrantes italianos e portugueses passaram a desenvolver a cultura da uva voltada para produção do vinho.

Com a decadência das lavouras de uva e do fabrico do vinho no final dos anos 70, a cidade teve que buscar alternativas para que voltasse a ter sua economia novamente atrelada ao agronegócio. Hoje, com algumas experiências desenvolvidas em parceria com a Embrapa e outros institutos de pesquisas, a uva já tem ocupado seu espaço novamente, mesmo que de maneira discreta, e, além disso, a alcachofra tem surgido com uma grande alternativa, aliada ao cultivo de produtos orgânicos e também da hidroponia. Assim, São Roque se sente privilegiada em sediar o 8º Bunkyo Rural de 2017, evento que potencializa a agroecologia, a sustentabilidade e o turismo rural. Desejamos a todos os participantes um excelente evento e quero dizer que nos sentimos lisonjeados com a escolha de São Roque para sediar esta feira, além de agradecer a Comissão Organizadora e a todos os envolvidos.

Cláudio Góes Prefeito Municipal de São Roque

5


8º Bunkyo Rural

ÍNDICE Palestrantes .................................................................. 8 Programação do 8° Bunkyo Rural ...................................... 14 Palestra Magna Pequeno Agricultor: Antenado no Futuro Dr. Francisco Graziano Neto .............................................. 15 Agroecologia e Sustentabilidade I Moderador: Ingrid Carvalho Karon Mecanismos de Garantia da Qualidade Orgânica Marcelo S. Laurino ......................................................... 31 Certificação por Auditoria da Qualidade Orgânica Ingrid Carvalho Caron ...................................................... 51 Nutrição Vegetal e Cultura Protegida Luiz Geraldo de Carvalho Santos ......................................... 55 Agroecologia e Sustentabilidade II Moderador: Pesquisador Dr. Sebastião Wilson Tivelli Controle Biológico Mario Sato ................................................................... 75 SAF Agroflorestal Michinori Konagano ........................................................ 95 A Logistica e Distribuição de Produtos Hortifruti Orgânicos Newton José Diniz ........................................................ 107 Instituto Chão Fábio Mendes .............................................................. 121 Cooperativismo para Pequenos Produtores Diógenes Kassaoka ........................................................ 125 Transformações na Agricultura Moderna Décio Zylberstajn ......................................................... 135 Turismo Rural e Sustentabilidade Moderador: Heloisa Bio - Instituto Auá Projeto Acolhida na Colônia e em Parelheiros 6


8º Bunkyo Rural

Thaise Costa Guzzatti .....................................................155 Valéria Maria Macoratti ................................................... 166 Turismo Rural, Instituições e Marco legal Maria Beatriz de Almeida Prado .........................................169 A Rota do Cambuci Gabriel Menezes ........................................................... 173 Turismo Agroecológico Fazenda Coruputuba Patrick A. Assumpção ....................................................179 Obaatian - Chá da Vovó Yuki Hamasaki .............................................................. 191 Cases Inovadores do Novo Rural Moderador: Izumi Honda Alho Negro do Sítio Fernando Kondo ........................................................... 201 Criação de Peixes Conjugado com Hidroponia Luciana Thie Seki Dias ....................................................209 Korin Alimentos Orgânicos Julio Baumgartner Bóbbo ................................................227 Rochagem e Remineralização na Agricultura João José Cardinali Ieda.................................................. 237 Uma Visão da Agricultura Japonesa - 6ª fase da Industrialização Agrícola Fábio Maeda ................................................................253 Dia de Campo Vinícola Góes - Roteiro dos vinhos de São Roque Sítio Orgânico Antonio Dias (Ibiúna) Preparação do Bokashi Kunio Nagao ................................................................261 Fertilidade no Sistema Orgânico, Onde Está e Como Manejar Carlos Armenio Kathounian .............................................. 267 Workshop Novos Rumos da Agroecologia: Trocas de Experiências Ondalva Serrano ........................................................... 299 São Roque, da alcachofra, do vinho e dos imigrantes ................303 O Centro Esportivo Kokushikan Daigaku ................................305 O que é Bunkyo Rural? ....................................................306 Registros fotográficos do 8° Bunkyo Rural em São Roque ............307 7


8º Bunkyo Rural

PALESTRANTES CAISP Cooperativa Agrícola de Ibiúna Fundada em 1995, a cooperativa é formada por 35 produtores cooperados e mais de 100 produtores parceiros, que contam com mais de 550 colaboradores ligados diretamente à produção das hortaliças em mais de 600 hectares de terra. Em sua sede própria, a Caisp atua nas áreas de produção interna no packing house e na agroindústria, além de atendimento aos clientes e comercialização. Diariamente, mais de 35 caminhões levam produtos da marca Caisp a mais de 230 clientes em diversos pontos do estado como: interior, capital e litoral paulista.

Carlos Armênio Kathounian Graduado em Engenharia Agronômica pela Universidade de São Paulo (1983), MSc em Ecological Agriculture pela Landbouwuniversiteit Wageningen (1992) e PhD em Sustainable Agriculture pela Iowa State University for Science and Technology (2004). Trabalhou de 1984 a 2007 no Instituto Agronômico do Paraná, Área de Fitotecnia, atuando em projetos de pesquisa, de pesquisa - extensão e de desenvolvimento, em temáticas associadas a plantas alimentícias não convencionais, sistemas de produção, agricultura de base ecológica, agricultura familiar e desenvolvimento rural. Em 2007 transferiu-se para a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, onde é professor doutor do Departamento de Produção Vegetal. Dedica-se atualmente à área de Agroecologia e Agricultura Orgânicos, atuando em projetos de pesquisa e de desenvolvimento orientados para o desenho e o manejo de sistemas de produção sustentáveis, e, sobretudo, ao ensino da Agroecologia.

Décio Zylberstajn Engenheiro Agrônomo pela ESALQ, Universidade de São Paulo (1975), mestrado em Economia - North Carolina State University (1981), mestrado em Economia Agrária pela Universidade de São Paulo (1979) e Ph.D. em Economia - North Carolina StateUniversity (1984). Professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade desde 1991. Atua na área de Economia das Organizações com ênfase no estudo das relações agroindustriais, agribusiness, agricultura. Trabalha com os temas da Nova Economia, Institucional, de modo particular Direitos de Propriedade e Custos de Transação.

Diógenes Kassaoka Graduado em Agronomia pelas Faculdades Integradas Cantareira e pós-graduado MBA em Gestão dos Agronegócios, pela Esalq/USP. É diretor geral do Instituto de Cooperativismo e Associativismo da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, conselheiro da CEDAF Conselho Estadual da Agricultura Familiar e presidente da comissão técnica 8


8º Bunkyo Rural

de olericultura do Estado. Foi coordenador técnico do Programa de Agricultura em Ambiente Protegido e responsável técnico pelo Projeto Horta Educativa.

Fábio Maeda Engenheiro agrônomo pela Unesp Jaboticabal, advogado pela Unimep e mestre em Energia na Agricultura pela Unesp Botucatu. Estagiou no Japão como bolsista da JICA e da CKC. É proprietário da Fazenda Maeda, localizada no Noroeste Paulista, e é membro da Comissão Bunkyo Rural.

Fernando Kondo Técnico agrícola formado pela Fundação Nishimura de Pompéia/SP, agrônomo pela Universidade Agrícola de Tóquio (Tokyo Nodai), com estágios agrícolas nos EUA e na China, MBA em agronegócios pela Esalq e Gerenciamento de Projetos pela FGV. Trabalhou por 10 anos na área de informática na Fujitsu no Japão como engenheiro de sistemas (SE) e no Brasil como gerente de projetos do grupo Embraer. Desde 2012, trabalha com startups na área de sistemas, produtor e distribuidor de alho negro.

Francisco Graziano Neto, Xico Graziano Eng. Agrônomo pela Esalq/USP, mestre em Economia Agrária pela USP e Doutor em Administração pela FGV/SP, foi professor da Unesp/Jaboticabal, ocupou vários cargos públicos destacando-se os de Secretário Estadual do Meio Ambiente (2007-2010), Deputado Federal pelo PSDB/SP (1998 - 2006), Secretário Estadual de Agricultura (1996-1998), Presidente do Incra (1995) e Chefe do Gabinete Pessoal do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995). Conferencista e escritor, publicou dez livros sobre os temas da questão agrária, agricultura, sustentabilidade e democracia. Consultor em organização, marketing de agronegócios e sustentabilidade, é professor de MBA da FGV/SP, sócio-diretor da OIA Brasil/Certificação sócio ambiental e sócio-diretor da ePolitics Graziano, empresa de posicionamento digital.

Gabriel Menezes Há mais de 15 anos empreende nas frentes de economia solidária, comércio justo, ecomercado e desenvolvimento local, mobilizando comunidades e articulando parcerias para implementação de iniciativas socioambientais. No Instituto Auá é presidente e vem desenvolvendo, como empreendedor social, a Agência de Ecomercado e o Empório Mata Atlântica, além de coordenar a Rota do Cambuci, onde reforça a necessidade de trabalhar por práticas sustentáveis.

9


8º Bunkyo Rural

Heloisa Bio Formada em jornalismo pela Escola de Comunicação e Artes da USP, com especialização em comunicação ambiental pela Universidade de Kalmar (Suécia). Há 12 anos se dedica à comunicação no terceiro setor, em ONGs como SOS Mata Atlântica, Instituto 5 Elementos, Conservação Internacional ou WWF-Brasil, atuando com planejamento, divulgação em diferentes mídias e produção de conteúdo. No Instituto Auá, realiza a produção de conteúdos e assessoria de imprensa, acreditando na importância de traduzir para o público experiências que possam mudar nossa relação com a natureza e a vida de forma geral.

Ingrid Carvalho Caron Engenheira Agrônoma pela Esalq/USP, com intercâmbio na Inglaterra e Holanda na área de agricultura e impactos ambientais. É gerente de programas da OIA Brasil Certificações. Atua no desenvolvimento de atividades técnicas e de gestão do processo de certificação agropecuária nas normas: Orgânico Brasil, NOP, União Européia e Biosuisse; e nos protocolos Global GAP e Bonsucro. Coordena a análise documental e orientação de produtores rurais quanto à adequação aos protocolos de certificação.

Instituto Chão É uma associação sem fins lucrativos formada por sete amigos em 2015. A associação é um espaço de convivência e de economia social para a experimentação de novas formas de relação e que gera reflexão nas formas de consumo que estamos habituados. Localizado na Vila Madalena, o espaço tem um café, uma mercearia com produtos orgânicos e artesanais, plantas e cerâmicas (todos à venda). No Instituto Chão a ideia é que tudo servido ou vendido ali seja repassado ao consumidor pelo preço de custo. Todos os custos de operação ficam expostos em um quadro com acesso a todos e esse painel é atualizado diariamente. Esses são alguns dos princípios da economia solidária, ou o que alguns chamam de economia póscapitalismo. Na economia solidária não há exploração dos trabalhadores envolvidos nos processos, não há especulação de preços e a rede é horizontal, ou seja, não existe hierarquia, tudo é decidido junto, para o bem de todos. O consumo é consciente e todos cooperam entre si.

Izumi Honda Engenheira Agrônoma pela Universidade Estadual de Santa Catarina, trabalha na CKC Brasil, é coordenadora do Projeto de Intercâmbio e Cooperação dos Agricultores Nikkeis da América do Sul, vinculado ao Ministério da Agricultura, Floresta e Pesca do Japão.

10


8º Bunkyo Rural

João José Cardinali Ieda Engenheiro Mecânico com ênfase em Fabricação e Energia pela Unicamp, possui especialização em Gestão Estratégica de Inovação Tecnológica pelo Instituto de Geociências da Unicamp, e em Gestão de Projetos pelo Instituto de Química da Unicamp. Foi bolsista da Finep Gestor de Projetos e da CNPQ DTI Inovação Tecnológica. É consultor e pesquisador da Escola Superior de Agricultura Luis de Queirós/USP, atuando principalmente no tema: inovação.

Kunio Nagai Formado em agronomia na ESALQ-USP-Piracicaba, em 1961 e em Administração de Empresas na Universidade Mackenzie, em 1974. Iniciou suas atividades profissionais na Cooperativa Agrícola de Cotia-CAC, onde ajudou a criar a empresa de sementes de hortaliças Agroflora. Criou também a empresa de sementes de hortaliças Tanebras. Foi professor de Agricultura Natural no Colégio Agrícola Cooper Rural, em Jacareí, da OISCA, pesquisador de agricultura orgânica no Instituto de Pesquisas e Difusões Agropecuárias da JATAK e é autor do livro: Manejo de Solo e Adubação, e co-autor do Curso de Agricultura Natural -Manual e vídeo. Atualmente é consultor em Agricultura Sustentável.

Luciana Thie Seki Dias Formado em Zootecnia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho/ Jaboticabal (1996), mestrado em Zootecnia (1999) e doutorado em Zootecnia (2004) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Atualmente é professor associado II do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de São Carlos. Tem experiência na área de Zootecnia, com ênfase em Produção Animal, atuando principalmente nos seguintes temas: sorgo, tilápias, frangos de corte, galinhas de postura, leveduras, prébioticos e lipídios plasmáticos.

Luiz Geraldo Carvalho Santos Engenheiro Agrônomo pela Universidade Estadual de Londrina, com formação em entomologia, inseticidas naturais e nutrição de plantas. É proprietário da Expert Farm, voltada para produção de tomates de alta qualidade em sistema sustentável, com controle biológico, com uso de alta tecnologia, e da Ensitec, que oferece consultoria técnica na produção de hortaliças orgânicas e convencionais, planejamento, manejo fitossanitário, nutrição e irrigação. É especialista em Produção de Tomate Orgânico, desde 1989 e é consultor da Fazenda Maluga e da Sakata Seed no desenvolvimento do cultivo orgânico do tomate Sweet Grape.

11


8º Bunkyo Rural

Marcelo Silvestre Laurino Engenheiro agrônomo pela Esalq/USP, tem pós-graduação em Agricultura Biológico Dinâmica pela Universidade de Uberaba & Instituto Elo de Economia Associativa Botucatu. Trabalhou na Assistência Técnica e Fiscalização de Crédito Rural no Banespa e no Banco do Brasil. Atua na Articulação Institucional, Fomento e Fiscalização Federal Agropecuária voltada à Agroecologia e à Produção Orgânica junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento desde abril de 1983.

Maria Beatriz de Almeida Prado Engenheira Agrônoma com dedicação ao Turismo Rural desde 1995, é gerente operacional de três Hotéis Roteiros de Charme: Fazenda Capoava, Confraria Colonial; Hospedaria Águas Claras e também o SP Aventura Ecolodge. Consultora para Pequenos Meios de Hospedagem e Turismo Rural, Monitora Ambiental da Associação de Hotéis Roteiros de Charme, e é diretora da Associação Paulista de Turismo Rural desde 2011 e sócia fundadora da Associação das Fazendas Históricas de São Paulo.

Mário Sato Formado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz USP, fez mestrado em Entomologia pela Universidade de São Paulo (1989), doutorado em Entomologia pela Universidade de São Paulo (1999), Pós-doutorado pela Universidade de Nagoya no Japão (2004). Atualmente é pesquisador científico (PqC VI) e docente do Programa de Pós-Graduação em Sanidade, Segurança Alimentar e Ambiental no Agronegócio do Instituto Biológico, órgão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Publicou mais de cem artigos em periódicos nacionais e internacionais. Atua em trabalhos na área de agronomia, com ênfase em acarologia, manejo integrado de pragas e resistência de artrópodes a pesticidas.

Michinori Konagano É produtor agrícola, cultivando 230 ha em sistemas agroflorestais. Foi Secretário de Agricultura de Tomé-Açu de 2004 a 2015. Diretor Presidente da Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu CAMTA, foi Diretor da Assistência Técnica Educacional Social (1993 a 2014). Consultor em empresas governamentais e não governamentais, capacitando extencionistas, estudantes, produtores e extrativistas.

Ondalva Serrano Doutora em agronomia, pela ESALQ/USP, possui pós-graduação pelo Institut Agronomique Mediterraneen, du Centre International de Hautes Études Agronomiques de 12


8º Bunkyo Rural

Montpellier, França; além de ter prestado serviços ao governo Chinês, com equipe multidisciplinar internacional em Agricultura para o Desenvolvimento Local em 1976; foi Diretora de Agricultura e Abastecimento da prefeitura de São Roque, entre 1986 e 1992; Consultora de Educação das Escolas Rurais do Estado do Mato Grosso, também atuou na Rede das Escolas Famílias Agrícolas em vários estados do país; através de contrato com a UNESCO. Sócia-fundadora e Conselheira do Instituto Auá de empreendedorismo socioambiental; é sócia fundadora da AAO Associação de Agricultura Orgânica.

Patrick Assumpção Empresário, produtor rural, membro do Conselho Regional do Parque Municipal do Trabiju (Mata Atlântica). Membro fundador e secretário da Rede Agroflorestal do Vale do Paraíba. Fundador do Projeto Caminhos do Rio Paraíba.

Sebastião Wilson Tivelli Graduado em Engenharia Agronômica pela Esalq/USP com mestrado em Fitotecnia pela mesma universidade, mestrado MBA - Butler University e doutorado em Horticultura pela Faculdade de Ciências Agronômicas É Pesquisador Científico VI no Instituto Agronômico - IAC e no Departamento de Descentralização do Desenvolvimento - DDD da Agência Paulista de Tecnologias dos Agronegócios (APTA) da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo. Desde 2008 é Chefe da Seção Técnica da Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento em Agricultura Ecológica de São Roque (UPD AE - APTA Regional).

Swan Yuki Hamasaki Formado pela Escola de Comunicações da USP, músico pianista e responsável pelo marketing e divulgação da empresa Chá da Vovó - Obaatian.

Thaise Costa Guzzatti Formada em Agronomia pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, tem Licenciatura em Geografia pela Univali, mestrado em Engenharia de Produção e doutorado em Geografia na UFSC. Tem pós-doutorado na FURB com o tema Circuitos Curtos de Comercialização de Alimentos . Professora do Centro de Educação, curso de Licenciatura em Educação do Campo da UFSC. Co-fundadora da Associação de Agroturismo Acolhida na Colônia, primeira entidade catarinense a ser reconhecida pelas Nações Unidas por sua contribuição em relação as Metas do Milênio (Prêmio ODM2005).

13


8º Bunkyo Rural

PROGRAMAÇÃO

DIA 15/09/2017 (sexta-feira) 08:00

Recepção e café da manhã

08:30

Seção Solene de Abertura Oficial

09:30

Palestra Magna - Pequeno Agricultor: Antenado no Futuro Dr. Francisco Graziano Neto - "Xico Graziano". Secretário Estadual da Agricultura (1996-98) e Secretário Estadual do Meio Ambiente (2007-2010)

10:30

Agroecologia e Sustentabilidade I Moderador: Ingrid Carvalho Karon Mecanismos de Garantia de Qualidade Orgânica - Auditor Fiscal Federal Agropecuário do MAPA - Secretário Executivo da CPOrg/SP - Marcelo S. Laurino e Ingrid Carvalho Caron Nutrição Vegetal e Cultura Protegida - Luiz Geraldo de Carvalho Santos (Ensistec - Agricultura Orgânica)

12:30

Almoço

14:00

Agroecologia e Sustentabilidade II Moderador: Pesquisador Dr. Sebastião Wilson Tivelli ( APTA Regional) Controle Biológico - Pesquisador Mario Sato, Instituto Biologico/APTA/SAA SAF Agroflorestal - Michinori Konagano - Presidente da Cooperativa Mista Tomé Açu A Logistica e Distribuição de Produtos Hortifruti Orgânicos - Newton José Diniz - Cooperativa Agricola de Ibiúna Instituto Chão - Fábio Mendes Cooperativismo para Pequenos Produtores - Eng. Agr. Diógenes Kassaoka - Codeagro/ SAA- Coordenadoria de Desenvolvimento dos Agronegócios

DIA 16/09/2017 (sábado) 08:30

Recepção e café da manhã

09:00

Transformações na Agricultura Moderna - Professor Dr. Décio Zylberstajn - USP/Pensa -Centro de Conhecimentos em Agronegócio

Painéis Paralelos 10:00 Turismo Rural e Sustentabilidade - Salão Central Moderador: Heloisa Bio - Instituto Auá Projeto Acolhida na Colônia - Profa. Thaise Costa Guzzatti - Universidade Federal Santa Catarina. Turismo Rural, Instituições e Marco legal - Maria Beatriz de Almeida Prado - Abraturrsp A Rota do Cambuci - Gabriel Menezes - Presidente do Instituto Auá Turismo Agroecológico Fazenda Coruputuba - Patrick A. Assumpção Obaatian - Chá da Vovó - Yuki Hamasaki 10:00

Cases Inovadores do Novo Rural - Sala 1 Moderador: Izumi Honda Alho Negro do Sítio - Fernando Kondo Criação de Peixes Conjugado com Hidroponia - Profa.Dra, Luciana Thie Seki Dias Korin Alimentos Orgânicos - Julio Baumgartner Bóbbo Rochagem e Remineralização na Agricultura - Professor João José Cardinali Ieda (GPEMSO - Esalq/USP) Uma Visão da Agricultura Japonesa - 6ª fase da Industrialização Agrícola - Fábio Maeda, Fazenda Maeda, ex-bolsista da JICA e CKC

12:30

Sorteio de um pulverizador JACTO e Almoço

14:30

Dia de Campo Opção 1 - Vinícola Góes - Roteiro dos vinhos de São Roque Opção 2 - Sítio Orgânico Antonio Dias (Ibiúna) - Preparação de bokashi - Kunio Nagai Opção 3 - Demonstração Dinâmica da Yanmar (Kokushikan)

DIA 17/09/2017 (domingo)

09:00 10:00

Fertilidade no Sistema Orgânico, Onde Está e Como Manejar - Professor Carlos Armenio Kathounian, ESALQ-USP Workshop Novos Rumos da Agroecologia: Trocas de Experiências Coordenação - Ondalva Serrano, Sócia Fundadora e Conselheira do Instituto Auá

ESPAÇO FEIRA (ABERTO AO PÚBLICO) 16 e 17 setembro (Sábado e Domingo - 9:00 - 17:00) - Feira de Produtos Orgânicos - Mostra de Equipamentos para Pequena Produção - Gastronomia

14


8º Bunkyo Rural

PALESTRA MAGNA: PEQUENO AGRICULTOR: ANTENADO NO FUTURO Palestrante: Francisco Graziano Neto Secretário Estadual da Agricutura (1996~1998) Secretário Estadual do Meio Ambiente (2007~2010) Bom dia, tenho que me acostumar aqui com o microfone que é poderoso, eu inicialmente vou pedir licença a todas as autoridades para cumprimentá-los e agradecer por esse convite, em nome de duas pessoas que são da organização desse evento e são meus colegas da ESALQ de Piracicaba , Nelson Kamitsuji e o Celso Mizumoto. Em nome deles eu cumprimento a todos. Quando me procuraram falando da ideia do Novo Rural, que foi a preocupação de centralizar nesse tema, lembrei que esse é o título do meu penúltimo livro: "O Novo Mundo Rural", e eu fiquei muito curioso, gostei do convite e me sinto privilegiado de estar com vocês discutindo. Que novo é esse? E como nós podemos participar deste novo? E quais são os desafios que o novo mundo rural está trazendo para nós? Eles existem e não são fáceis, então vou lhes pedir um pouco de paciência para apresentar a configuração sobre o tema que a sociedade de cultura japonesa está buscando. Esse tema faz parte da história da minha vida, eu me sinto capaz, não de ensinar coisas para vocês, mas de colocar umas questões que talvez ajudem a encontrar os novos caminhos. O que é o novo e o que é o antigo muitas vezes nós sabemos, mas ficamos em dúvida entre qual o melhor. O Fusca era bom não era? E esse Fusca novo? O que é o novo? É a inovação, mas tem a tradição, então é melhor inovar? Quando inovamos, nós mantemos ou acabamos esquecendo das tradições? Então, eu só estou fazendo um aquecimento, a inovação sempre vem, agora a tradição não precisa ser jogada fora, só precisa ser recontex15


8º Bunkyo Rural

tualizada. Onde a gente trata como tradição, a cultura, para que a cultura tradicional não impeça a inovação, é diferente, tem gente que só é tradição e se você só fica na tradição acaba se descuidando da inovação, é um problema. O que é o futuro? É mais tecnologia ou vai fazer a gente voltar para o passado, há muitas pessoas que quando vislumbram o futuro falam: "no tempo dos meus pais, avós era bom, morávamos na fazenda, não tinha isso nem aquilo". Pode até ser verdade, mas vai voltar àquele tempo? Não volta mais. Então o futuro sempre vai para frente, e significa mais tecnologia, nunca menos, o futuro é esse aqui conectado ou é esse? Quem está com o celular conectado? Toda sociedade é conectada, então o novo que estou querendo mostrar para vocês, sempre será mais tecnologia, com mais inovação e interligação entre as pessoas. Não tem como voltar atrás, eu vou resumir porque estou falando um pouco de evolução, e eu separei daquilo que compreendo, quatro aspectos que chamo de realidade contemporânea, que fazem parte do nosso mundo hoje, se não considerar, entre outras, essas quatro realidades, nós não saberemos entender o que é o novo. Na primeira urbanização, há quarenta anos, nós não imaginávamos que fosse acontecer uma urbanização como aconteceu aqui no Brasil. Nós achávamos que podíamos seguir um caminho diferente, mas o fato é o seguinte, da população do Brasil hoje, 87% é urbana e 13% é rural, e no mundo a população urbana já é maior que a rural. Na Argentina, 92% da população é urbana. Existem 52 países no mundo maiores e desenvolvidos, cuja população urbana é maior que 80%. Isso está significando 16


8º Bunkyo Rural

o seguinte: Teoricamente, há alguns anos, imaginando que fosse possível ser diferente, as cidades estão atraindo cada vez mais pessoas, e nas cidades as pessoas encontram forças de comunicação que não encontravam no campo. E entre os estudiosos da civilização, poucos conseguem imaginar que será possível frear essa vontade da população. Na África e na Ásia não se está percebendo isso, mas as pessoas querem ir para a cidade. E as metrópoles estão com mais gente se verticalizando, esta é a tendência global e é a nossa realidade, vocês vão entender depois porque eu estou falando isso tudo. A segunda realidade contemporânea é a população, é curioso, quando disseram que era necessário controlar a maternidade, porque a população estava crescendo a uma taxa geométrica e a produção de alimentos a uma taxa aritmética. Essa previsão aconteceu em 1802 e a população era de 1 bilhão de habitantes quando foi feita essa previsão, de que haveria um colapso e seria necessário controlar a população. Ninguém controlou a população e hoje somos 7,2 bilhões de habitantes. A ONU disse que teremos 9 bilhões em 2050 e não houve nenhum colapso. Thomas Malthus estava errado, a população da Terra cresceu de forma inacreditável, continua crescendo e talvez se estabilize em 2050, essa é a nossa história. Entendendo o que está acontecendo no mundo, não se pode desconsiderar a população,

17


8º Bunkyo Rural

eu digo isso porque existem algumas suposições que parecem desconsiderar que somos 7,2 bilhões de pessoas e seremos 9 bilhões, e que as pessoas estão indo para a cidade, aumentando o nível de vendas e a demanda por proteínas. Essa é a realidade, há quem tenha já estudado a pegada ecológica da terra, a tecnologia da WWF, que é uma grande e prestigiada organização internacional. Segundo a WWF, a pegada ecológica da Terra permitiria que estivéssemos no mundo atual vivendo equilibradamente se fôssemos 3,7 bilhões, mas já somos 7 bilhões, então existe uma pegada ecológica que depende de nós que estamos aqui, é terrível, mas é assim. A terceira realidade que eu quero destacar é a qualidade de vida. É fantástico, nós hoje vivemos aqui em São Roque, São Paulo, em qualquer lugar do Brasil e os outros seres humanos em qualquer outro lugar do planeta, em condições materiais muito melhores que tivemos no passado, que tiveram os nossos avós ou nossos pais. Isso facilitou o seguinte: quando estudamos São Paulo, por exemplo, aquilo que nos anos 70 nós chamávamos de periferia, que era onde não tinha asfalto, não tinha farmácia, não tinha alimento, não tinha nada, aquele êxodo rural formando a periferia, hoje se você for à periferia, eles têm tudo lá. É impressionante como a qualidade de vida média da população aumentou, no mundo se relata isso e isso significa o seguinte: hoje essas pessoas não têm mais aquelas exigências de 30 ou 40 anos atrás, e sim novas exigências. Isso tem a ver com os políticos, por exemplo. Hoje o prefeito vai inaugurar uma obra e não vai ninguém. Antigamente até asfalto se inaugurava, e era o acontecimento. Hoje, na verdade, seria proibido, porque se você arrecada recursos, você está fazendo apenas a sua obrigação, é isso que o povo pensa, e não tem mais obras. As pontes, por exemplo, já foram feitas, tudo bem fazer outras, mas a necessidade da população em atender a sua qualidade de vida está em outro nível, ele não quer mais comer, e sim o alimento saudável. É outra exigência, mais "refinado", ele quer qualidade de vida, respirar melhor. Antigamente, ele queria apenas arroz e feijão. 18


8º Bunkyo Rural

Então, a urbanização, o crescimento populacional, o nível médio da qualidade de vida atendido e em quarto lugar está a realidade virtual. Não podia ser outro numa sociedade conectada. Há quem estude esse assunto da internet e chega até a fazer previsões de que em 2037, as pessoas na Terra estarão sendo mais influenciadas pelo mundo virtual do que pelo mundo real. Hoje, muitos dos nossos filhos já são influenciados mais pelo virtual do que pelo real. Onde eles jogam futebol hoje? No computador. Então, está acontecendo uma coisa onde o mundo virtual está se tornando mais importante que o real, o que vai acontecer? Isso está mudando tudo, a política, o marketing, todo processo de vendas e negócios e está sendo terrível. Há quem esteja prevendo que algumas profissões irão desaparecer, até que a profissão de advogado, tomara que não, irá desaparecer, porque você pergunta no iPhone e fala do seu problema. Ele dá uma resposta dez vezes mais curta do que o advogado, o que demoraria duas ou três horas, agora você consegue em questão de segundos. Se eu tenho uma dúvida para fazer isso ou aquilo, em cinco segundos já é dito que tenho que fazer isso e aquilo para resolver. A mesma coisa para os carros. Por que você vai querer ter um carro? Você pede e o carro aparece na sua frente sem motorista. Daqui a 20 anos não vai ter mais motorista de carro, não sei se é verdade ou não. Tenham paciência que eu estou fechando aqui. Vou resumir aquilo que nos interessa nessa realidade para responder e mostrar que nós gostamos do mundo rural e somos interessados em saber o que vem e como nós podemos nos encaixar no novo mundo rural. Temos que enfrentar três desafios que são terríveis. O primeiro é o avanço tecnológico. Há 10 anos nós plantávamos cana do mesmo jeito, hoje tudo mudou, quando você aprender uma coisa já tem outra, a tecnologia está muito na frente e precisamos estar convencidos de que o poder do conhecimento e da informação tecnológica vence qualquer barreira. Às vezes demora, mas vence. A mais demorada barreira de crescimento que se conhece é aquela ultrapassada pelo Galileu Galilei, que desenvolveu o telescópio, e conseguiu vislumbrar 19


8º Bunkyo Rural

as luas de Saturno e disse que Copérnico estava certo. A Terra não é o centro do universo, esse foi o precursor da ciência, porque ele criou uma ferramenta, enquanto Copérnico só idealizou. Quando Galilei disse que Copérnico estava certo, porque eu criei uma ferramenta e olhei, sabe o que aconteceu? Ele sofreu o processo da Santa Inquisição e foi condenado. Morreu pobre, cego e sozinho, em 1642, condenado pela igreja católica. Olha como essa história é incrível. Em 1980, o Papa João Paulo II pediu a revisão da condenação de Galileu Galilei, e em 1992, a igreja católica o absolveu, 350 anos depois de sua morte. Ele estava certo. Ás vezes, o conhecimento tem barreiras, mas veja bem, ele não era louco e sim estava certo. Tem gente que hoje está na frente com uma inovação tecnológica, uma ideia e falam que o cara é louco, mas ás vezes o louco é que está certo, porque quem está fazendo a mesma coisa há 30 anos está seguindo o preceito da tradição, então esse é um aprendizado que a civilização nos deu. Eu trouxe esse gráfico para mostrar para vocês a população de 1950 e 2000 e a produção de alimentos como cresceu, ou seja, a tecnologia vence. Esse para comparar o Brasil com os Estados Unidos nos últimos 50 anos, aqui estão os Estados Unidos em produtividade física por hectare e aqui 20


8º Bunkyo Rural

estamos nós, não é fantástico? A tecnologia dá certo, é incrível, isso se chama intensificação, quando plantamos algodão no estado de São Paulo, quem se lembra? Muitos de nós ficamos um pouco chateados, o algodão desapareceu do estado de São Paulo, no Paraná também não se planta algodão, o algodão foi para a Bahia, Goiás, Mato Grosso e a produtividade lá é 3 vezes maior do que produzimos aqui, e a fibra do algodão é sensacional, nós ficamos para trás. Esta intensificação, muita gente acha que causa problemas ecológicos, mas eu não concordo. Essa é a área que produzimos hoje no Brasil, se nós mantivéssemos o nível de produtividade de 30 anos atrás, nós teríamos que produzir nessa área para ter a mesma produção. Isso pode ser produzido num efeito ambiental com contribuição da tecnologia, ou seja, quanto mais produzirmos por hectare, mais nós economizamos florestas, certo? Se nós não tivéssemos aumentado a produtividade, nós teríamos que ter produzido soja, milho, arroz, mas o que está acontecendo é que os ganhos de produtividade estão economizando área. Eu vou mostrar uma coisa para vocês entenderem a tendência mundial. Este 21


8º Bunkyo Rural

é um desafio da tecnologia, o outro é a globalização. Quem já viu um pouco da vida assim como eu e alguns que estão aqui, lembrando que nos anos 80 no Brasil, todos discutíamos quem era a favor e quem era contra a globalização. Eu lembro que o Nelson veio me procurar falando que estava entrando alho da China no Brasil, está acabando com o alho do Brasil, vamos proibir a importação desse alho. Mas nós queremos vender cana para eles. Se proibirmos a venda do alho deles aqui, eles não vão gostar desta história, mas o que fazemos com nosso alho então? Nós ficamos assim durante 10 anos, sem saber o que é melhor: globalizar ou não globalizar. Na história 30 anos depois, nós descobrimos que a pergunta que deveríamos ter feito não era aquela, mas essa aqui: você quer ser globalizado ou se globalizar? Porque a globalização vai acontecer do mesmo jeito, então se vai acontecer da mesma forma, você quer se globalizar ou ser globalizado? Essa que era a pergunta a ser feita, e sabe o que significa isso? Quem se preparou para a globalização tirou proveito dela, e as empresas que não se prepararam se ferraram. Aquelas que viram a globalização e se prepararam, entraram no mercado globalizado e muitas tiraram sua vantagem e progrediram, enquanto outras ficaram para trás. O terceiro desafio contemporâneo que estamos enfrentando é a sustentabilidade, e eu penso, dou aulas, faço conferências no Brasil fazendo a seguinte pergunta: vocês querem engolir ou dominar a sustentabilidade, sabe por quê? Porque a sustentabilidade veio para ficar e é parecida com a globalização, não adianta gostar ou 22


8º Bunkyo Rural

não, essa é a força global, o mundo globalizado e tecnológico. É também o mundo da sustentabilidade, e portanto, para nós que queremos olhar para o futuro, você só tem uma saída: dominar e se preparar, e assim tirar vantagem da sustentabilidade, caso contrário, você vai se ferrar e a sustentabilidade vai te tirar do mercado. Antes de eu ir para frente e finalizar, eu quero ainda chamar atenção de algumas coisas: a sustentabilidade, os requisitos da produção amigável, os problemas ecológicos vão acabar com o mundo? Tem gente que fala: "se fizer tal coisa o mundo vai acabar", e eu posso responder tranquilamente, o mundo não vai acabar. A mais importante previsão sobre o fim do mundo foi feita no livro "Os limites do crescimento" de 1972. Essa era a previsão sobre os recursos naturais da Terra, sobre crise ecológica e a previsão mostrava, era o início do computador. O resumo da história: todas as curvas se inveteram e haveria um colapso na civilização nos dias atuais, o que não aconteceu e por quê? A capacidade de inovação tecnológica foi superando os obstáculos e dando oportunidades, a população está crescendo, os recursos naturais aumentando a pegada ecológica e novos materias surgiram. Então, falar sobre o mundo da sustentabilidade, global, tecnológico e olhar para frente, fiquem tranquilos porque não haverá colapso na civilização, mas nós precisamos desenvol23


8º Bunkyo Rural

ver conhecimento. O dilema da civilização mostrou Copérnico e Galileu lá atrás, nessa capacidade. Quais são as novas tendências tecnológicas? Primeiro, gás carbônico, hoje é curioso, no Japão e Estados Unidos não se fala mais em sustentabilidade e sim economia de gás carbônico, por conta do aquecimento global. Então, produzir no campo ou produzir na cidade, progressivamente vai ser exigido produzir com tecnologias de baixo carbono, e fundamentalmente, com energia renovável e produtos que não gerem gás para a atmosfera. Essa é uma tendência tecnológica, todas as agriculturas do mundo vão seguir essa tendência e nós não vamos ficar fora dela, quem ficar de fora vai se ferrar, essa é a tendência. A segunda tendência, consequência da primeira, é a biotecnologia, que significa controle biológico de pragas e doenças, mas também energia genética, desenvolvimento e aprimoramento de organismos produtivos. Essa é uma tendência que os grandes laboratórios estão investindo muito nisso. A terceira tendência são as chamadas fazendas inteligentes, que não precisam de terra mais para produzir. Um exemplo é a Smart Farm da Austrália, que produz tomate, planta em quinhentos hectares e usa água retirada do mar e zero pesticida, porque no 24


8º Bunkyo Rural

deserto não tem patógeno. Usando um círculo fechado de energia, energia solar como fundamental, tem alta qualidade e produtividade, 100% de rastreamento, mas ainda é cara, pois a pequena escala é cara, quando se amplia a escala diminui o preço. Em termos de produção essa é a tendência, economia circular, o que é lixo para um acaba sendo matéria prima para outro, não é mais reciclagem, é mais integrável. Aqui no Brasil a gente não consegue nem fazer a reciclagem urbana, separar lixo orgânico do reciclável, enquanto o mundo já está trabalhando em economia circular, sem desperdícios. Isso é um pouco de economia circular, a integração lavoura - pecuária - florestas, que é uma tendência, já existem cinco milhões de hectares no Brasil com essa integração, não é começo, meio e fim, isso volta para o começo, é tendência tecnológica, do futuro, é alimento saudável, gastronomia diferenciada, aliás, na gastronomia muitas coisas curiosas estão acontecendo. Esta é a mais fantástica delas, os inse25


8º Bunkyo Rural

tos estão chegando às mesas, e com certeza farinhas de insetos serão misturadas a farinhas e farofas e distribuídas a pólos que precisam de mais proteína, porque os insetos têm uma média de 50% de proteína sobre seu peso. Quem sabe daqui a uns anos estaremos indo para a padaria comprar pão com um pouco de gafanhoto na farinha de trigo. Aqui tem uma historinha para mostrar a tendência, isso é uma rede de supermercados norte americana, que tem 460 lojas, faturou 16 bilhões de dólares no ano passado e tem mais de 87 mil empregados. Ela foi comprada pela Amazon na semana passada. Vocês acham que orgânico é uma tendência boa ou ruim? Vocês acham que a Amazon ia comprar algo que não tem futuro? São tendências no núcleo da economia global, não é pouca coisa, porque no Brasil muita gente vê essas coisas como sendo da roça e antigo, mas não, orgânico é capitalista e profissional. De repente eu quero fazer para entrar em um circuito diferente, também pode, tem tendências 26


8º Bunkyo Rural

tecnológicas que estão afinadas com aquilo que eu apresentei hoje. O mundo cada vez mais urbanizado, virtualizado, com tecnologias avançando cada vez mais, e no meio disso muitas oportunidades e vantagens. O mundo está indo para frente, os problemas ecológicos não vão acabar com o mundo. Eu quero trazer uma visão otimista dos problemas que teremos que enfrentar e sobre as oportunidades que vão nos abrir, mas eu vou fazer uma pausa agora para terminar. Vou fazer essa pergunta e qual é a resposta? Não, só tecnologia não resolve, é preciso de cooperação e companheirismo, hoje a garotada que faz empreendedorismo fala em "Cocriação" para enfrentar o mundo globalizado e tecnológico. No mundo da sustentabilidade é preciso cooperação, sozinho vai quebrar a cara. Como no caso dos brasileiros, mesmo todos vindo ajudar hoje, o brasileiro é muito individualista, é difícil essa força da cooperação. Tem gente que acha chato, eu penso ainda que mais do que cooperação, é preciso ter novas atitudes e aqui estão sete delas, eu apelidei como 27


8º Bunkyo Rural

"os sete fazeres". A primeira é não esperar e sim fazer acontecer. A segunda é parar de reclamar e sim ir fazer, o agricultor brasileiro reclama muito. O terceiro: corra atrás de conhecimento e saiba fazer, o quarto é participar e fazer política, meio difícil falar sobre isso nos tempos de hoje, mas é fundamental, é a participação do cidadão. O quinto é mudar, fazer inovação e ajudar os outros fazendo o bem, então, quando me perguntam se podemos enfrentar o novo rural, é claro que dá, mas não pensando no passado, é preciso correr atrás. Qual é nosso maior desafio? Como vencer esses desafios da cooperação, novas atitudes, tecnologia, como? Eu respondo: dando poder aos jovens, eles que são capazes de vencer esses desafios. Quem já caminhou na vida como alguns de nós, se acreditamos que é uma contribuição que devemos

28


8º Bunkyo Rural

dar ao mundo novo, é ter a sabedoria de como ver os mais jovens, e nem sempre estamos fazendo isso. Estamos envelhecendo, e os jovens saindo do nosso lado, as nossas atitudes não estão os atraindo, fora a cidade e o virtual que o atrai, mas é claro, você não coloca nem uma antena de internet na fazenda, você quer que o jovem fique do seu lado como? Você quer que ele fique desligado em um mundo conectado? Ele vai embora, a sucessão familiar da agricultura está sendo um drama no Brasil e no mundo inteiro, por problemas dessa natureza, nós temos que ser capazes de dar esse passo. Nos sindicatos no Mato Grosso e Mato Grosso do Sul é proibido ser eleito na vez seguinte, então o que é feito: ele prepara um sucessor. Nós precisamos preparar os nossos sucessores, porque, por mais que nos esforcemos, não sabemos falar inglês direito, no mundo globalizado se você não falar inglês vai acabar se ferrando, assim como é preciso estar conectado no mundo tecnológico. E quem não vai se ferrar? Os nossos filhos, mas eles precisam estar do nosso lado, este é o nosso maior desafio, como cada um vence esses desafios é preciso ver as possibilidades de cada um, enquanto estamos vendo crise, a molecada está vendo oportunidade, esse é o novo mundo rural. Estou terminando, tive a ousadia de trazer minhoca para a cabeça de vocês e chamar atenção para o fundamental das tendências tecnológicas, as tendências globais e os desafios de segurar nossos jovens. Vou fazer uma confissão, sou um homem de muita sorte, não apenas porque estou falando com vocês e na vida fiz coisas, mas sim porque quando eu sair daqui, eu irei sentar na plateia e minha filha fará uma apresentação para vocês, e eu vou aprender com o que ela vai falar sobre certificação orgânica. Isso me emociona, mas é a minha história, porque eu não fiz com ela o que meu pai fez comigo, quando eu me formei em Piracicaba na ESALQ, eu fui tentar ajudar meu pai na fazenda em Araras, e na terceira vez que ele falou: "acabou de se formar e já quer dar aula?", eu fui prestar concurso e comecei a dar aulas na Unesp em Jaboticabal. Quanto mais escuro for a noite, mais brilhante as estrelas. Obrigado! 29


8º Bunkyo Rural

Patrocínio

Av. Brigadeiro Luís Antônio, 2344 -13º andar Jd. Paulista - CEP:01402-900 - São Paulo Fone: (11)3147 2300 contato@fkm.org.br

30


8º Bunkyo Rural

MECANISMOS DE GARANTIA DE QUALIDADE ORGÂNICA Palestrante: Marcelo S. Laurino Auditor Fiscal Federal Agropecuário do MAPA Secretário Executivo da CPOrg/SP Nós vamos falar dos mecanismos de garantia da qualidade orgânica. Somos um país inovador nesse sistema, nós trabalhamos com três mecanismos diferentes: certificação por auditoria, sistema participativo de garantia e uma modalidade mais simples que são as organizações de controle social para venda direta sem certificação, e nós vamos explicar qual o contexto e a utilidade desses sistemas. Em primeiro lugar, é importante que a gente entenda o porquê da certificação, nós falamos do contexto e importância da agricultura orgânica no contexto mundial e atual, e muitos agricultores reclamam com base na seguinte questão: "por que eu faço tudo certo, respeitando o ambiente e utilizando produtos com baixo impacto, tenho que ter certificado e as pessoas que usam agrotóxicos de maneira descontrolada e não respeitam o meio ambiente não tem certificação nenhuma?" É uma pergunta muito difícil de responder e a resposta é essa. Eu sou descendente de italiano, sou um grande admirador da cultura japonesa, e alias sou viciado em comida japonesa, mas devido minha genética, toda quinta-feira e domingo eu tenho que comer uma macarronada com molho vermelho, então eu pergunto para vocês: Quando eu entro em um supermercado ou loja, como eu sei que o tomate que estou comprando é orgânico ou não? Então essa é só uma brincadeira que eu fiz com os agricul31


8º Bunkyo Rural

tores, eu passei em um supermercado perto de casa, em Piracicaba, comprei o tomate orgânico e o convencional, tirei da embalagem e pedi para os agricultores, com suas ferramentas, descobrirem qual era o orgânico e qual era o convencional. Vocês que são produtores e trabalham com isso todo dia, podem me dizer qual é o orgânico e qual é o convencional? Essa é uma brincadeira que eu faço em todas as apresentações, mas só para encurtar um pouco a tortura, a ideia é a seguinte: olhando o produto a gente não vai chegar à conclusão nenhuma, e chegando ao final da brincadeira, metade dos agricultores achou que era a bandeja com quatro tomates e a outra metade achou que a era a bandeja com seis, então se vocês que trabalham com isso todo dia não sabem, quem dirá eu que estou longe do ambiente de produção e estou simplesmente no mercado, como eu vou saber? E a aparência às vezes não diz tudo, ela dá uma indicação, o sabor com certeza, se vocês colocarem uma alface orgânica e uma convencional na salada eu posso dizer qual é qual. Mas isso é depois de comprar. Eu fiz uma experiência como parte de um curso em São Pedro e deixamos alface na geladeira durante vinte dias. Depois, foi possível ainda comer a alface crocante e gostosa, isso não acontece com uma alface convencional. Mas esse tipo de diferença entre produtos orgânicos e convencionais, como por exemplo, a ausência de resíduos, houve a utilização de produtos geneticamente modificados e na produção orgânica não pode usar. Foi utilizada radiação ionizante ou não, ou teve trabalho escravo, exploração indevida de mão de obra infantil no ambiente de produção, como está o ambiente 32


8º Bunkyo Rural

aonde foi cultivada aquela plantação, foi observada a reserva legal, a área de proteção permanente está preservada? Isso nós não vamos saber. Então primeiro precisamos entender o que é um produto orgânico na base da definição legal. O produto orgânico é um produto obtido em um sistema orgânico, ou seja, a definição do que é um produto orgânico não está no produto em si e sim no ambiente onde foi produzido. Então o que define um sistema orgânico é que atenda alguns princípios e técnicas que estão estabelecidos no regulamento. Para vocês terem uma ideia, não vamos mencionar agora pois não daria tempo, mas o regulamento da produção orgânica estabelecido pela lei 10831, traz todos os princípios e técnicas. Construímos esse emaranhado de normas, mas na verdade as normas orgânicas têm outro significado, não é um simples código do que você pode fazer ou não, mas como a agricultura orgânica nasceu de uma crítica ao processo de agricultura industrial, que se formou na metade do século 19. Os movimentos de agricultura orgânica, através de vários pesquisadores e pensadores, se estabeleceram a partir do começo dos anos 1900, e foi um processo de crítica e esse regulamento teve participação de muitos agricultores e pesquisadores do mundo inteiro. Então, na verdade, é o código de como fazer agricultura de uma maneira mais saudável e sustentável, porque a sustentabilidade é uma questão 33


8ยบ Bunkyo Rural

34


8º Bunkyo Rural

importante, não adianta termos altos índices de produtividade se vamos comprometer a capacidade das relações futuras de obter os alimentos. Então, como diz o antigo provérbio dos índios norte-americanos, nós não estamos herdando a terra dos nossos avós, mas sim emprestando a terra dos nossos netos, e para impedir que aconteça a destruição do que temos hoje. Essa imagem que eu trago da ilha de Páscoa, alguma coisa aconteceu ali e nós não temos nem informação, mas com certeza foi a superexploração dos recursos naturais que eles tinham, que acabou chegando à decadência total daquela civilização. E para que isso não venha a acontecer com a gente, precisamos tomar conta dos nossos processos de produção, alimentar nossa humanidade e deixar os processos produtivos sustentáveis. O que a gente tem feito muitas vezes compromete isso, hoje muitos dos nossos colegas agricultores encaram os sistemas de produção como uma máquina de produzir alimentos, onde a única preocupação é a simples produção, a produção física sem se preocupar com o que resta do ambiente depois dessa produção. Então, esse é um esquema industrial de como fazemos agricultura hoje, dependendo fortemente de insumos externos. O que a gente propõe na agricultura orgânica é ter uma outra visão do sistema de produção e encarar a unidade de produção como organismo agrícola, aliás, é por isso que a agricultura orgânica é chamada assim. Não é porque estamos substitu35


8º Bunkyo Rural

indo os fertilizantes minerais por fertilizantes orgânicos, mas sim porque estamos entendendo o sítio como unidade autossustentável, onde a gente coloca todo nosso conhecimento e tecnologia para que a gente dependa cada vez menos de insumos externos e consiga obter o maior proveito dos recursos naturais disponíveis. Voltando para a questão do que é um produto orgânico, é um produto feito utilizando alguns princípios e práticas definidas nesse código de boas práticas que se tornou o regulamento da produção orgânica. O que diz se um produto é orgânico ou não, não é alguma coisa do produto, mas sim do sistema onde ele foi gerado, que deve seguir alguns princípios para que a gente saiba se o produto é orgânico ou não. Alguém precisa visitar essa unidade de produção para saber se aqueles princípios e práticas foram obedecidos, e quem faz 36


8º Bunkyo Rural

isso? Nós podemos descobrir nas páginas do próprio Ministério da Agricultura, onde tem informações sobre o sistema de produção. Vocês entrando na página do Ministério da Agricultura, logo à esquerda tem o ícone dos orgânicos e você clica no cadastro de produtores e vai dar acesso a uma planilha que a gente atualiza todo mês, que tem o cadastro de todos os produtores credenciados e cadastrados para produzir produtos orgânicos no Brasil hoje. Foi feito um levantamento ano passado e pelo menos 22% dos municípios brasileiros já tem uma unidade de produção, e no Estado de São Paulo nós temos mais de 1700 unidades de produção cadastradas. Tem uma concentração na região que estamos e no Vale do Ribeira, onde tem um número expressivo de produtores com cadastro nacional. Essas áreas em branco são o nosso desafio, como fazemos para trazer os agricultores que não têm cadastro e te37


8º Bunkyo Rural

mos certeza que tem interesse de produzir nesse sistema. Mas hoje no levantamento que publicamos em agosto, nós temos mais de 15 mil produtores cadastrados, um pouco menos da metade deles estão sendo acompanhados por certificadores e o restante está dividido no sistema participativo de garantia e as organizações de controle social. É o que vamos tentar explicar rapidamente. Mas antes de falar especificamente dos sistemas de garantia, nós temos que falar como esses mecanismos funcionam. Vou falar rapidinho e depois 38


8º Bunkyo Rural

faremos uma apresentação de como funciona o processo de certificação. Esse sistema é todo baseado na rastreabilidade da produção, nós não conseguimos fazer o acompanhamento da qualidade da produção orgânica se não tivermos registros de tudo que acontece, porque muitas vezes as pessoas perguntam: como o inspetor indo uma vez por ano na unidade de produção pode garantir que nos outros 364 dias do ano estão seguindo os princípios e regulamentos? Com base nos registros, o registro principal é o de manejo orgânico, temos que usar o plano de manejo orgânico não como algo obrigatório do sistema de certificação, mas como instrumento de pla-

39


8º Bunkyo Rural

nejamento do que vocês vão fazer. Organizar o que vocês vão fazer na unidade de produção, e a partir dali vocês colocam todas as técnicas que pretendem utilizar e alguma das entidades vai aprovar essas técnicas baseado no que você está fazendo e o que consta no regulamento. Uma outra coisa importante também são os registros diários e eles não são complicados, trago um exemplo de um agricultor de Porto Alegre, onde todo final do dia ele anotava todas as atividades que tinha feito. Isso permite que tenhamos a história daquela unidade de produção, quando vai o inspetor da certificadora ou o grupo de agricultores do controle social do sistema participativo de garantia, a gente tem um documento para verificar a situação da unidade e se tem contrapartida documental. Vou dar um exemplo: se vocês dizem que a estratégia de manutenção de fertilidade do meu solo é feita com compostagem do esterco das vacas e mais a campineira que eu corto, fazendo aquele sistema de 3 para 1, onde são 3 camadas de palha para 1 de esterco, virando à medida que esquenta e em 4 meses você tem adubo de ótima qualidade. Então se você coloca esse tipo de informação no manejo orgânico, quando formos fazer uma inspeção ou fiscalização, se tiver uma pilha sendo usada, então ela foi feita 4 meses atrás, se hoje estamos no dia 15 de setembro, no registro de 15 de maio deve constar que você começou a fazer aquela pilha. 15 dias depois, você tem o primeiro registro do tombo que você deu

40


8º Bunkyo Rural

para diminuir a temperatura do processo de fermentação. No dia 15 de maio, você tem que ter um recibo de aquisição de esterco ou você fez a coleta do esterno para produzir a pilha, então em uma visita a gente não verifica apenas o que está acontecendo no dia, mas conseguimos esticar o nosso olhar nos cinco ou seis meses anteriores e temos uma noção se aquelas atividades estão de acordo com o plano de manejo e o regulamento. Então, quando me perguntam se visitando apenas um dia por ano ou a cada seis meses é possível garantir que aquela unidade é orgânica, só é possível caso tenha um sistema de rastreabilidade bem implantado. Os mecanismos propriamente ditos, aqui no Brasil a gente adota três. Não vamos falar tanto da certificação, pois vou pedir para a Ingrid fazer uma apresentação mais detalhada, mas as certificadoras foram o ponto de partida do processo de certificação no mundo inteiro. Aqui no Brasil elas são credenciadas no Ministério da Agricultura, mas elas têm que ser credenciadas pelo Instituto Nacional de Metodologia Industrial porque atendem uma norma internacional chamada ISO 17065, que trata exatamente desses sistemas. O sistema de certificação é uma avaliação do manejo orgânico e uma avaliação se o que está no manejo e no regulamento está realmente sendo executado. A certificação tem duas modalidades importantes: a individual, quando você individualmente contrata uma certificadora ou então a

41


8º Bunkyo Rural

certificação em grupo, que é uma alternativa muito interessante e diminui a parte que os agricultores reclamam que é o custo. Você está pagando para alguém inspecionar e às vezes esse custo pode ser um complicador. Mas a certificação em grupo é um mecanismo que o regulamento tem e as certificadoras exercem para baratear esse custo, a Ingrid vai falar nisso com mais calma. Você pode fazer o sistema de despesas, quando você põe agricultores que estão em localidades próximas e consegue otimizar o custo de deslocamento dos inspetores. Outra modalidade é o sistema de controle interno, onde o grupo assume a responsabilidade de fazer a primeira fiscalização, e a certificadora faz uma auditoria no processo de certificação interno do grupo. Acredito que seja o sistema mais acessível. Quando você passa pelo sistema de certificação, você recebe um documento que por enquanto tem validade anual, está sendo estudado para mudar isso, e isso permite que tudo que você produziu nesse período seja comercializado como orgânico. A partir daí você tem o direito e obrigação de usar o selo de sistema orgânico. No Brasil, temos onze certificadoras credenciadas: em Botucatu, Florianópolis, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, e uma curiosidade: Não é cobrado em Minas Gerais, a certificação é de graça, até perguntaram se dava para fazer isso em São Paulo, mas tem que ver com o governo do estado. As duas novas certificadoras que foram recém credenciadas ficam em Joinville e Florianópolis. O Brasil foi o primeiro país no mundo a ter uma alternativa do processo de certificação, com base nos sistemas participativos de garantia, que foi uma criação dos movimentos sociais e contribuíram para o regulamento. Funciona mais ou menos como uma certificadora, a única diferença é que ao invés de trabalhar com o um grupo de avaliação externa, você trabalha

42


8ยบ Bunkyo Rural

43


8º Bunkyo Rural

com o próprio sistema, não só agricultores. Na verdade, tem três categorias, que são: os fornecedores, colaboradores e organismos participativos, que na verdade é uma pequena certificadora, pessoa jurídica, cooperativa que vai pedir o credenciamento no Ministério da Agricultura. Essa avaliação dos sistemas participativos é feita apenas pelo Ministério da Agricultura, pois não existe uma norma internacional como existe na certificação por terceira parte. Está sendo estudada, mas por enquanto é isso. Quem trabalha nesse sistema? Os produtores, comerciantes, processadores de produtos obtidos e também colaboradores, e os consumidores visitando e vendo o que está acontecendo nos processos de produção. Então funciona mais ou menos assim, os sistemas participativos que a gente conhece trabalham em grupos diferentes, um dos primeiros movimentos, que na verdade tem visitas de pares e visitas da comissão de avaliação. As 44


8º Bunkyo Rural

visitas de pares são feitas pelo próprio núcleo onde está o agricultor. Eles fazem visitas cruzadas e verificam o que está acontecendo na produção. No segundo momento, isso o regulamento exige deles, que pelo menos uma vez por ano eles façam visita de verificação, novamente pelos agricultores do grupo, mas com representantes de outros grupos também, para garantir uma ampliação do olhar sobre o que está acontecendo.

Essas são fotos do sistema participativo que fizemos em Porto Alegre, da rede ecológica municipal. É possível ver o produtor explicando para o grupo o que faz e o grupo percorrendo toda unidade de produção, uma coisa interessante que acontece nesses sistemas é a troca de informações e experiências entre os produtores. A construção compartilhada de conhecimento pode ser feita nesses momentos, o grupo não se encarrega apenas de fazer a verificação de conformidade, mas trabalha também no auxílio da solução das não conformidades. Depois, o grupo senta para tomar uma decisão, que muitas vezes é ratificada por uma assembleia de todos os membros do grupo, pois como a responsabilidade entre eles é compartilhada, se tiver um produtor descumprindo o regulamento, isso permite que nós a equipe de fiscalização descredencie todos os outros produtores através do compromisso mútuo que eles têm, onde eles têm que andar juntos e ter uma responsabilidade coletiva. Terminado a avaliação por sistemas participativos, eles também têm o direito de receber o certificado anual, 45


8º Bunkyo Rural

que tem que ser renovado todo ano, e tem o direito e dever de utilizar do selo brasileiro. Em sistemas participativos temos um número expressivo, temos 21 sistemas participativos que foram credenciados pelo Ministério da Agricultura. Aqui no estado de São Paulo temos em Campinas, que foi a primeira que credenciamos e tem a associação biodinâmica que faz parte do movimento biodinâmico. Não confundir com o IBD, que surgiu no movimento biodinâmico, mas hoje é uma pessoa jurídica independente, não é mais o Instituto Biodinâmico de Desenvolvimento rural. Ele só levou as três letras, então ele chama IBD Certificações, agora a ABD sim, Associação Brasileira de Agricultura Biodinâmica tem como responsabilidade fazer pesquisa de extensão rural no âmbito e fundir o conceito de biodinâmica no Brasil. Algumas certificadoras no estado de Minas Gerais, outras no Rio Grande do Sul, em Mato Grosso do Sul, no Distrito Federal, até um grupo de indígenas que produzem mel tem sua certificação pelo projeto socioambiental e estão fazendo certificação para a produção deles. E tem em Pernambuco, no Ceará, no Piauí, no Rio Grande do Norte, e outros que surgiram agora, como no Vale do Jequitinhonha em Minas Gerais. No Estado de São Paulo tem um movimento interessante, pois muitas das organizações que eu vou falar em seguida, elas começaram em um processo mais simplificado, mas como estão restritas à venda direta, muitas vezes o âmbito de comercialização deixa o pessoal insatisfeito. Eles procuram evoluir para algum outro tipo de sistema de avaliação, então muito desses grupos acabam contratando certificadoras e passam a ser certificados por auditoria em grupo. Alguns desses grupos também se organizam e tentam transformar as suas organizações de controle social em sistemas participativos. Nós temos cinco iniciativas se formando, a mais adiantada está em São José do Rio Preto, outra foi a nossa primeira em Americana e está se organizando também um grupo de técnicos da região, que tem 46


8º Bunkyo Rural

interesse em produtores especializados em Cambuci. Isso para realizar uma certificação especial, não só do Cambuci, mas de todas as espécies de interesse econômico da Mata Atlântica. E para encerrar a conversa, nós temos uma outra modalidade. Na época em que estávamos discutindo o regulamento em 2003, apareceu um produtor do Rio Grande do Sul. Ele fez um questionamento, dizendo que é produtor há 20 anos e tem uma relação de confiança com o consumidor, "por que eu tenho que contratar uma certificadora ou sistema participativo para provar para o consumidor com quem já tenho relação direta se sou orgânico ou não?". E a partir dali, depois de uma discussão muito complicada, acabamos propondo para o regulamento brasileiro as organizações de controle social para venda direta sem certificação. Mas ficou restrito aos agricultores familiares, identificado por um documento do governo federal. E não pode ser agricultor isolado, mas sim em grupo, e a responsabilidade da qualidade orgânica do produto envolve todos os membros. E esse produto não pode entrar em uma cadeia de processamento, não pode ser vendido em loja ou por atacadista, deve ser vendido por venda direta e sem intermediário. O exemplo mais claro é a feira, porque você consegue dialogar com seu consumidor, e caso ele tenha alguma dúvida sobre o produto, ele tem o direito de visitar a unidade de produção e caso o acesso seja vedado, o consumidor deve nos comunicar pois é uma irregularidade passível de penalidade. Existe também a entrega aos consumidores, as cestas, vendas da propriedade, os grupos de compra são uma tendência no mundo inteiro e no Brasil também, que são as CSA - Community Supporter Agriculture - traduzido como a comunidade que sustenta o agricultor. São grupos de consumidores que dizem aos produtores exatamente o que eles querem que se produza, e se combina a produção, ferramentas da produção, dias para entrega, quantidade de produção e também o preço. A gente imagina ser o melhor dos mundos para a comercialização, e cria uma relação intima entre produto47


8º Bunkyo Rural

res e consumidores, que no fundo, a existência de um selo ou não passa a ser secundário. Eventualmente se esse grupo de produtores tiver uma loja exclusivamente com os produtos do grupo, isso pode ser considerado venda direta. Normalmente, as organizações de controle social são grupos isolados, tem grupos que fazem visitas cruzadas e fazem reuniões periódicas para avaliar tudo aquilo que foi verificado no processo de produção, e se por acaso acontecer algum problema, é nessas visitas que você pode suspender ou excluir um produtor que não está seguindo os princípios. No caso do produtor não receber o certificado anual e não ter direito de utilizar o selo do sistema orgânico, ele simplesmente recebe um documento dizendo que está cadastrado no Ministério da Agricultura, é produtora familiar, orgânica e está autorizada a comercializar produtor orgânicos não certificados diretamente a consumidor. Isso é mais ou menos a distribuição de organizações de controle social pelo Brasil. Esse levantamento é de três meses atrás e deve ter crescido um pouco. Tinha 328 organizações de controle social no Brasil e aproximadamente 48


8º Bunkyo Rural

quatro mil produtores. O Estado de São Paulo possui a maior concentração de organizações de controle social, com aproximadamente 90 organizações e mil produtores, o que sobrecarrega um pouco o Ministério da Agricultura, porque a fiscalização dessas organizações é exclusiva do ministério, estamos pensando em distribuir com os órgãos estaduais. É uma oportunidade grande de ingresso dos produtores, mas possui um risco, que eu vou explicar para vocês. Há muito tempo, quando estávamos discutindo a regulamentação, para garantir a qualidade, devia haver outros instrumentos que dão o poder persuasivo de controle policial por parte do Ministério da Agricultura. A sociedade brasileira não tem a pretensão de transformar o Ministério da Agricultura em uma grande máquina de fiscalizar produtos orgânicos. Por isso, adotamos o sistema que o mundo inteiro utiliza que é trabalhar com o processo de certificação, que tem se mostrado bem eficiente, porque hoje eu mostrei um número de 15700 produtores, mas se você entrar no sistema e se cadastrar, você vai receber o número acima de 18 mil. Essa diferença, você tem mais de quatro mil produtores que foram excluídos do cadastro por motivos diversos, ou teve problemas de produção ou de comercialização, ou morreu, voltou para o Japão, mas a maioria foi descredenciada pelo descumprimento do regulamento de produção, então é um sistema que funciona independente de ser um órgão fiscalizador. Mas a mensagem final que eu gostaria de dizer é a seguinte: a gente não está tentando através do sistema orgânico ou de certificação transformar a vida do agricultor em um inferno, dizendo que ele deve cumprir o regulamento, como eu falei para vocês. A agricultura orgânica nasceu em um processo de crítica do processo de industrialização da agricultura, então ela é uma alternativa de como produzir com qualidade e respeitando a saúde das pessoas e do ambiente. É um guia de boas práticas de como produzir de uma maneira melhor, a partir do momento que o produtor consegue sentir isso na prática, não há necessidade de fiscalizá-lo ou de punílo. Essa certificação serve para trazer uma alternativa tecnológica muito mais condizente com as necessidades do mundo atual do que simplesmente um livro de guia de produção, então é colocar alguma coisa de ético, solidário na produção. Esse é o grande papel da certificação e do regulamento brasileiro, e a gente tenta fazer um processo de renovação no processo de produção. Vou pedir para a Ingrid nos apresentar o processo de certificação, obrigado pela atenção. 49


8ยบ Bunkyo Rural

www.campo.com.br

50


8º Bunkyo Rural

CERTIFICAÇÃO POR AUDITORIA DA QUALIDADE ORGÂNICA Palestrante: Ingrid Carvalho Caron Gerente de Programas OIA Brasil Certificações Eu trabalho na OIA, sou gerente dos programas de certificação e vou falar um pouco como funciona a certificação por auditoria, que é o sistema que o Marcelo estava falando e é executado pelas certificadoras. Só para contextualizar um pouco, a OIA é a Organização Internacional Agropecuária, é uma certificadora de produtos agrícolas. Trabalhamos com as diversas normas de certificação orgânica, porque cada país tem sua norma e para acontecer esse processo de globalização e comercialização entre os países, os produtores precisam estar preocupados com cada legislação, e atualmente a OIA tem escritório na Argentina e um no Brasil. Porém, nossos inspetores são sempre regionalizados, buscando estar sempre próximo dos produtores. Em primeiro lugar, o Marcelo deu uma boa pincelada, mas o que faz e qual o papel de uma certificadora? De ma51


8º Bunkyo Rural

neira geral temos três elos, então temos o produtor e seu sistema de produção, e temos as normas e regulamentos, que no caso do Brasil é a lei e as demais instruções normativas. E como podemos garantir que um produtor está em conformidade com as normas? E aí entra a terceira parte que é a certificadora, que tem como função verificar a conformidade das técnicas executadas pelo produtor, sistema de produção de acordo com as normas. Elas funcionam como uma terceira parte e por quê? Porque ela tem que ser sempre imparcial, uma certificadora nunca pode prestar consultoria para um produtor, porque não é imparcial prestar a consultoria e verificar se o produtor está de acordo com as normas da legislação. A certificadora tem que ser sempre imparcial e as decisões precisam ser tomadas sempre em cima da legislação, e quem verifica isso são o MAPA e o INMETRO, que verificam se as certificadoras estão cumprindo a norma que rege a certificação internacional de produtos, que é a 17065. E como a OIA e as demais certificadoras conduzem essas avaliações? De duas formas principais: primeiro com as inspeções de campo, todo produtor primeiro inicia o processo e recebe no mínimo uma inspeção por ano, de um inspetor que sempre vai ser cadastrado naquela norma e naquele sistema de produção. O inspetor vai basicamente avaliar se o que o produtor colocou nos documentos dele e aquilo que está praticando está dentro da legislação. Eu digo que as inspeções são no mínimo anuais, porque dependendo do sistema de produção e da cultura podem receber mais de uma inspeção por um ciclo de um ano, que é o de um certificado. E a outra forma de avaliar é por meio dos documentos. Primeiro que é o mais importante, é o plano de manejo orgânico. Todo produtor deve ter e é basicamente um plano aonde ele vai detalhar quais são suas técnicas, insumos, formas de incremento da biodiversidade, como ele destina seus resíduos, quais são seus confrontantes, ele deve detalhar todo seu sistema de produção. Isso é muito rico, porque depois ele é submetido à certificadora. Então é aqui que os produtores têm a oportunidade de consultar quais são os produtos, quais 52


8º Bunkyo Rural

os princípios ativos que pode usar e estão de acordo ou não com a legislação. Então é muito mais do que apenas uma verificação no campo. Isso serve como uma orientação ao produtor para saber se está fazendo certo e de acordo com a legislação. Depois desse plano de manejo ele vai ser auditado no campo. É ele que o inspetor vai usar para verificar se aquilo que está no plano todo e que o escritório da certificadora aprovou, se ele realmente está fazendo isso no campo. Outro ponto são os controles, que agora um produtor ao se certificar, ele implanta um pequeno sistema em sua propriedade e passa a ter todos os controles de plantio, manejo, aplicações, colheita e de vendas. Isso é um processo muito importante, pois o produtor passa a ter toda informação, todos os dados de sua produção em suas mãos, e consigo passar a ter informações que às vezes podia não ter. Por exemplo, avaliar o plantio e a expectativa de colheita e quanto ele realmente colheu. Pode avaliar suas perdas, ele tem que ter controle de todos os insumos que está usando, pode verificar seu custo de produção e depois comparar com suas vendas. Então é um sistema muito importante, que cada vez mais os produtores terão que estar antenados na questão e encarar a produção como seu negócio. É muito importante, pois o sistema de certificação auxilia os produtores. E todos esses documentos, junto com a inspeção, vão garantir o que é mais importante e vemos que é uma tendência não apenas no Brasil, mas no mundo inteiro, que é a rastreabilidade e a garantia de origem. Ela está presente nos produtos convencionais e é uma coisa que o consumidor pede muito e é muito importante a garantia da origem, esse é o coração da certificação. Existe uma dúvida sobre quais os requisitos para certificação por auditoria e as pessoas podem pensar que é o tamanho da área, número de funcionários, diversidade de produtos, mas enfim, quais são os requisitos? Eles são básicos, primeiro é a legislação ambiental, o produtor deve estar de acordo 53


8º Bunkyo Rural

com a legislação ambiental do Brasil, segundo é legislação trabalhista, convenhamos que não adianta ter uma produção ecologicamente correta e deixar de lado a questão social e, por fim, todas as técnicas e manejos que estão descritas na legislação. Então, os insumos que têm os princípios ativos permitidos ou abono de insumos sintéticos, organismos geneticamente modificados e as demais técnicas que estão descritas na legislação. Para iniciar um processo de certificação, como o Marcelo já falou, mas só para resumir um pouco, dentro de uma certificadora existe a opção de você ser um produtor individual, quando você inicia o processo de certificação individual e segue dependendo apenas da sua propriedade. E existe a certificação em grupo, com ou sem o sistema de controle interno, que facilita a questão de custo que pode ser um empecilho a mais para o produtor. Facilita a questão de produtores que estão iniciando no manejo e ainda não tem conhecimento, e auxilia muito na questão de troca de informação porque o sistema de controle interno de grupos tem sempre a questão de reuniões e estarem associados ao grupo. Sendo um grupo formalmente constituído, como associações e cooperativas. Acredito que seja mais ou menos isso a questão da parte de auditoria, espero que tenha ficado mais claro. Caso tenham dúvida iremos abrir para discussão, e agora eu gostaria de chamar o nosso colega para a próxima palestra, obrigada.

54


8º Bunkyo Rural

NUTRIÇÃO VEGETAL E CULTURA PROTEGIDA Palestrante: Luiz Geraldo de Carvalho Santos Proprietário da Expert Farm (produção de tomates) Proprietário da Ensitec (consultoria técnica) Primeiramente, gostaria de agradecer a honra pelo convite de poder estar palestrando nesse evento e também de poder estar falando na minha cidade. Sou nascido, crescido e formado em Londrina, mas estou em São Roque há quase 30 anos. Ontem eu estava em Brasília na Mama Gê, que é uma empresa que produz molho de tomate orgânico. Fico muito satisfeito de estar falando para vocês porque passou um filme na minha cabeça, quando cheguei aqui em 1989 e comecei no meu primeiro emprego trabalhando com produtos orgânicos. Só conseguia dormir porque tinha gasto minha energia na produção e se o mundo acabasse eu tinha trabalhado com produtos orgânicos. Participei de várias iniciativas na região e inclusive com empresas que fizeram diferença e foram responsáveis por colocar de forma bem-sucedida os produtos orgânicos nos mercados de São Paulo. Além de ser sócio fundador da OA em 1989. De lá para cá trabalhei com produtos orgânicos sistematicamente e por volta de 2000, o pessoal do convencional de Ibiúna começou a me convidar a ajudá-los a ter um produto de melhor qualidade porque estávamos conseguindo uma produção orgânica melhor que a convencional. O pessoal queria saber o que estávamos fazendo, então o foco dessa palestra é explicar um pouco o que a gente fazia e nos últimos dez anos basicamente eu tenho atuado no Centro Oeste. Tenho um projeto em São Roque que deve chamar atenção e no devido momento irão aparecer notícias sobre esse projeto. Mas a sede da minha 55


8º Bunkyo Rural

empresa de consultoria é aqui, mas também tenho uma empresa de produção de tomates, então é disso que vamos falar. O sistema que a gente desenvolveu, de produção orgânica, é baseado em quatro pilares: agronomia, agroecologia, trofobiose e PDCA, o que é isso? Agronomia é a base do que a gente faz, na faculdade a gente entendeu o que é agronomia e dava conta de fazer produção de alta qualidade e produtividade sem veneno, e era o nosso objetivo. Agroecologia como ciência. Então usamos como princípio científico, o enfoque que a gente aplica na análise da propriedade, então é o agricultor no centro do sistema e como ele se relaciona com o ambiente, essa é a abordagem agroecológica que a gente dá. A trofobiose é a relação da nutrição com a saúde da planta, então como a planta é influenciada pela nutrição. E a PDCA é um método de gestão, é uma ferramenta de solução de problemas da Administração, e com isso a gente consegue uma produção orgânica aplicando esse conceito. Aqui ao fundo a gente vê um mosaico de 28 culturas em rotação e circundada pela mata ciliar, é uma reprodução de hortaliça de produção individual do Brasil, certificada por auditoria e produz para submercados. Eu sou um cara de supermercado, então meu negócio é produtos orgânicos em escala

56


8º Bunkyo Rural

porque eu entendi o seguinte: se eu quisesse fazer, eu era muito idealista na faculdade e meus amigos diziam que eu iria morrer de fome, então eu entendi que só tinha um jeito para contribuir para mudar a realidade, que era fazendo a diferença. Então nós trabalhamos para conseguir alocar o produto no supermercado, e como vemos o supermercado? Não vemos o supermercado como um bicho papão como muita gente vê. O supermercado é um cliente e tem necessidades, mas é um cliente grande e pesado com necessidade violentas, e quais são essas necessidades? Ele tem que ser atendido em qualidade, regularidade, quantidade e preço, nessa ordem, e o pessoal se engana muito com a ordem desses fatores. O maior indicador de desempenho do supermercado é Real por metro quadrado. Vocês sabem o que é indicador de desempenho? É como ele verifica o desempenho, e como o supermercado gerencia custo e resultado? Lucro em Reais por metro quadrado e por dia. Se você quer atender bem o supermercado, atenda a necessidade dele, que é regularidade, se for atendido nisso ele atende os objetivos. O setor que dá mais rentabilidade para o supermercado é a mercearia, mas qual a diferença? Vocês já perceberam o estoque? É na gondola? Eu tenho uma gondola com 30 ou 40 centímetros de profundidade e os produtos ficam todos lá, a distância entre os corredores da mercearia é pequena, e como é a distância no FLV (frutas, legumes e verduras)? É grande, e como você empilha FLV? Embaixo, e ainda precisa de refrigeração tendo valor agregado baixo. Se você pesar valor agregado baixo, espaço grande e com custo de refrigeração, então o impacto de faltar FLV é muito grande para o supermercado, derruba a margem da mercearia, então o supermercado bate muito em cima disso. E quando aparece alguém que promete resolver esses problemas o supermercado dá preferência para esse cara. Então a gente se especializou em supermercado, e hoje, aqui uma foto em nossa estufa, em um projeto nosso que arrendamos com clientes, uma estufa de vidro com alta tecnologia, e ainda estamos tímidos na questão de outras alternativas. Estamos longe do mar, não vamos reciclar água do mar, vamos reciclar drenado. A gente pretende investir nessa questão de energias alternativas, mas isso não vai ser no curto prazo, e um exemplo de reciclagem que a gente faz, quando se fala em tomate de ciclo longo, significa que você tem que tirar três folhas por haste por semana. Nós temos 21 mil plantas, então com 2 hastes cada planta, são 42 mil hastes. Tirando três folhas por haste isso dá mais de 120 mil folhas por semana, durante 40 semanas, que 57


8º Bunkyo Rural

é o ciclo do tomate que a gente colhe, então gera um volume de biomassa muito grande. Esse é um problema na Holanda, Canadá, México, no mundo todo onde se tem tecnologia, e nós estamos fazendo o composto para vender composto de folha de tomate. O Brasil está sofrendo uma alteração, com a entrada das estufas de 1260 metros quadrados. Antigamente as estufas no Brasil eram de 350 metros quadrados. Aqui é um projeto de consultoria onde o produtor migrou para quatro mil a sete mil metros quadrados. Nossa estufa é de um hectare, lá fora a tendência são projetos de estufas de 50 hectares, e a tendência no Brasil também é essa, daqui a 20 anos? Não sei quanto tempo vai demorar, mas essa é a tendência para economia de escala e eficiência para esse tipo de projeto. Então nós atuamos com pequenos produtores e até com grandes projetos empresariais, e qual é a nossa atuação? Atuamos na cadeia de valor de hortaliça, nesse caso, o tomate, e nosso objetivo é atender na cadeia de valor. Eu tenho os vários elos: semente, insumos, máquinas e equipamentos, processo de embalagem para gerar um produto diferenciado e entregar para o varejo, mas para resolver o problema do consumidor final, por quê? Quando o consumidor paga, faz toda essa cadeia ter sentido, então 58


8º Bunkyo Rural

como produtor eu também tenho que ser empresário em primeiro lugar, e entender estou trabalhando para que, fornecendo o que e para quem e para obter qual resultado. Então nossa consultoria fornece o papel técnico para o produtor ou gerente de produção que é o cara que a gente atende, e ele vai executar a produção. É muito comum o produtor se enxergar apenas como produtor, e não como gerente nem gestor, muitos produtores não se vêem como o cara que precisa cuidar do negócio. Ontem eu tomei uma decisão, que vai na mesma linha do Graziano, de tirar a botina e vir de sapato. Eu sempre vou para apresentações de botina, por que hoje eu vim de sapato? Não é que estou aposentando minha botina definitivamente, mas eu não posso prender os jovens da minha empresa. Então, enquanto eu continuar dando consultoria pessoalmente minha empresa nunca vai crescer e eu nunca vou evoluir. Eu vou acompanhar o processo que o mercado está passando, então ontem eu deixei minha botina de lado para minha equipe crescer, foi uma coincidência o Chico ter falado nisso, porque eu pensei nisso ontem quando estava voltando, e vi que a condição não é prender os jovens quando o mercado está ai para crescer. E o tema específico da nossa palestra começa aonde? Ainda predomina em grande parte, o grande paradigma de que se eu tenho um problema, eu aplico um produto para matar o problema, mas quando eu faço isso, na verdade eu estou apenas disfarçando o problema e não o resolvendo. Então se eu quiser resolver, eu tenho que olhar o processo que gera o problema, qual o processo que transforma o inseto em praga? Por que eu tenho praga e prejuízo? Porque eu errei no meu processo, o normal da planta não é perda por praga, mas sim sobreviver e gerar descendentes. Ela está preparada para isso há muito mais tempo do que a gente pisa na face da Terra. E os insetos estão tão preparados quanto elas, então quem perde 59


8º Bunkyo Rural

nessa briga somos nós, não adianta ter essa atitude achando que vamos matar as pragas, porque não vamos, nós vamos conviver com elas, por isso temos que mudar essa abordagem. Vou dar um exemplo: quando eu tenho requeima, eu tenho que usar uma cauda protetora para equilibrar a planta. Mudo a irrigação, troco o fertilizante e controlo a requeima, se o clima for favorável eu mantenho a planta sadia, caso contrário eu tenho excesso de nitrogênio e faço requeima de novo. Para vocês terem ideia do que isso representa, até mais ou menos 2010, a nossa média de produtividade por ciclo de tomate em Brasília era quatro quilos por metro quadrado ou quarenta toneladas por hectare, mas o convencional já estava colhendo oitenta toneladas por hectare, enquanto nós estávamos colhendo quarenta em estufa. Durante esses cinco anos, a gente evoluiu tanto na aplicação desse método que estamos colhendo duzentas toneladas por hectare em estufa. Nós estamos fazendo dois ciclos por metro quadrado e é plantio em cima de plantio. O que mudou? Mudou porque percebemos que tinha os indicadores, por volta de 1999 aqui em Ibiúna. A gente conseguiu com o Marcelo Saito a melhor produção de tomate orgânico que eu já havia conseguido até o momento, e pagaram uma viagem para dar uma palestra no México porque nunca haviam visto tomate orgânico daquele jeito. Mas havia uma questão importante de clima que

60


8º Bunkyo Rural

alterava meu resultado, e eu não entendia o porquê, então se o clima me ajudasse eu colhia tomate bom, caso contrário não tínhamos tomate bom. E com o passar dos anos, fomos lapidando o método e entendendo quais eram os indicadores que realmente determinavam o resultado, e a base de tudo está aqui. Então o que representa essa curva? Se eu olhar essa linha verde é o nível de acúmulo de nutrientes, se eu pegar e coletar um lote de tomate, seco e analiso e descubro a quantidade de nutrientes que vou tirar essa semana. Caso faça isso durante o ciclo inteiro, tenho a curva de nível de acúmulo de nutrientes daquela variedade, e tenho um desequilíbrio quando aplico em um momento inadequado do desenvolvimento da planta. Aqui a cor a verde é a quantidade ideal de nutrição da planta. A faixa azul é o limite superior de variação que a planta tolera e a linha vermelha é o limite inferior. Tenho pragas e doenças tanto por ter desequilíbrio por excesso, quanto por falta, e a solução é nutrir a planta de maneira que fique dentro desses limites que a planta tem naturalmente. Para isso, preciso entender quais são as necessidades da planta. Uma coisa importante que temos que entender é o clima. Ele varia para cada região, eu tenho um solo que possui armazenamento e uma planta que tem uma curva de demanda de água que varia, e o que a água tem a ver com a nutrição? Outra pergunta, a planta tem dente? Não, então como ela come? Então quase todos os nutrientes que a planta absorve são pelas raízes. Se eu não entendo o processo de água que eu tenho que fornecer para a minha planta acabo não conseguindo nutrir a planta de maneira adequada. Uma coisa que impede o produtor de entender o que ele precisa, é porque não olha para a irrigação da maneira como deveria. Quem é produtor aqui? Poucos levantaram a mão, mas acredito que tenha mais, muitos produtores aqui enfiam a mão na terra para ver a umidade do solo, e como ele vai saber a umidade? Não vai saber. Eu tenho trinta anos com hortaliça, ontem eu fiz uma pergunta para um cliente na Mama Gê, porque sistematicamente durante o tempo que eu trabalho com eles, desde 2011, a cada visita eu exijo que veja a raiz da planta, porque eu não consigo saber se o que eu olho corresponde ao que a planta está absorvendo, porque só tem um jeito de saber o que a planta está absorvendo de nutrientes: por meio de aparelhos que meçam ou cavar e meter a mão para saber. Outra coisa, já que o tema é cultura protegida, eu preciso entender que 61


8º Bunkyo Rural

quando mudo meu ambiente, saí do campo e cobri a minha estufa, eu altero o clima da estufa retendo o calor, a radiação global que incide em nosso planeta. Tem um espectro de radiação enorme, com faixas de comprimento diferente de radiação, e ela é chamada de radiação global. O que a planta aproveita é a radiação PAR, da sigla inglês de fotossinteticamente ativa, e dessa, uma parte ultravioleta, a parte que é PAR e a parte infravermelha, que é o que gera calor, então quando muda a estufa eu mudo drasticamente o clima.

Essa primeira estufa tem quatro metros de topo e três metros na lateral, quando eu tenho a mesma quantidade de radiação, essa regra vale não só para o tomate mas para morango, flores ornamentais, pepino e outros. Eu tenho uma posição que forma ar quente na estufa, então se eu não tiver ventilação adequada que tire o bolsão de ar quente de dentro da estufa para fora, vai acabar prejudicando o crescimento das plantas, pois vai ter excesso de calor. E quando eu aumento a altura da estufa e a abertura, ai eu tenho dissipação de calor, isso muda o comportamento da planta e da estufa, e a planta começa a trabalhar folgada, porque aqui ela está sobre um estresse violento, e se eu tiver uma estufa melhor, tenho janela dupla que abre conforme a direção do vento e torna a estufa mais eficiente, e a resposta de trocar calor e ajudar a planta é ainda melhor, então eu tenho 62


8º Bunkyo Rural

uma produtividade bem melhor nessa estufa do que nessa. Um exemplo para vocês, em 2012 eu fui para Israel com a demanda de um cliente de melhorar a tecnologia em estufa, e montamos um projeto em Avaré na Castelo Branco. Quando estiverem no Km 254 da Castelo Branco em direção a Ourinhos, do lado direito tem as estufas grandes que nós montamos. E nosso objetivo era melhorar a condição de clima a um custo acessível para o produtor brasileiro, porque esse cliente estava recebendo uma proposta de R$600 por metro quadrado por estufa e estava achando caro. Então, essa é uma estufa de R$100 o metro quadrado e essa de R$300. Convidei uns amigos para ver, e foi a primeira vez que conseguimos colher 27 quilos de tomate por metro quadrado no ano, e bateu o arrependimento, por que não vendi o carro e fui para Israel em 2000? E saltamos de oito quilos por metro quadrado para 27 quilos por metro quadrado. O resto não mexi em nada, o que sabia da produção de tomate continuei fazendo, só que deu esse salto para aumentar a altura da estufa, e agora estamos nessa estufa mais alta com janela dupla e em seis meses já colhemos 26 quilos por metro quadrado. Cada modelo de estufa tem um clima, esse tipo de estufa baixa que forma bolsão de calor é quente e seca, essa um pouco mais alta tende a ser úmida ou seca, dependendo da direção do vento, e essa estufa com janela móvel e abre na direção que for mais conveniente me permite controlar temperatura e umidade dentro da estufa. Nós aplicamos esse conceito de manejo de clima porque ficou tão gritante a diferença de resultado que eu fiquei me perguntando o que fazer, em 2015 nós ficamos batendo cabeça nas estufas de baixa tecnologia, não entendia como melhorar, e fui fazer um curso na Holanda e entendi que não dá para tirar ferramenta, se a estufa é de baixa tecnologia não tem o que fazer, mas o que eu posso fazer melhor com ela? E fiquei deprimido, porque vendo as estufas na Holanda parece que estão 100 anos a nossa frente, mas eu vi que tinha uma coisa que podia ser feita, a irrigação igual deles, porque as empresas que vendem irrigação aqui vendem para a Holanda, México, Canadá. O mesmo equipamento que usam lá a gente também usa aqui, está disponível e é viável, aliás, o governo federal ajuda a financiar esse equipamento. Então quando começamos a automatizar a irrigação e limitar a altura do tomate, alcançamos 10 quilos por metro quadrado com dois ciclos no ano, resultando em 20 quilos por metro quadrado no ano. Eu entendi a 63


8º Bunkyo Rural

minha limitação, então é o que eu tenho e o que eu posso, então eu tenho cliente com estufa de baixa tecnologia e clientes com estufas de alta tecnologia e minha própria estufa, e a expectativa do nosso cliente é de melhorar o resultado dele, e ele tira o melhor aceitando a limitação que tem. Hoje, se a máquina de irrigação custa igual a um funcionário que você vai treinar para ser irrigador e supondo que ele custe R$1.300 por mês, vai acabar custando R$2.600 com os encargos. Isso é mais de R$30.000 por ano. Se ele for embora, você perdeu dinheiro, e um sistema de irrigação bom custa R$75.000 e é um investimento que vai durar mais de 10 anos. Então hoje, o produtor continua errando na irrigação se ele quiser, porque há tecnologia disponível e a primeira coisa que eu aconselho a fazer quando me perguntam é automatizar a irrigação. E tem a pegada de carbono, mas o que está forte na Europa é a pegada de água. Quantos litros de água eu gasto para produzir 1 quilo de alimento, porque isso está muito forte em cima de carnes, hortaliças, aqueles alimentos que consumem mais água, e a exigência vai ficar cada vez maior. Então temos que entender que melhorar a nossa produtividade está ao nosso alcance. O primeiro fator que temos que entender é que a planta se nutre pela água, então se eu não controlo água não controlo nada, e na verdade o produtor é o artista. Mas não pensam nisso, porque são artesãos 64


8º Bunkyo Rural

de luz, alguém já pensou nisso? Porque ele transforma a luz através da fotossíntese no produto, pode aumentar ou diminuir espaçamento, tirar folha da planta, pode fazer o que quiser com a luz. Então a matéria prima do produtor é a luz e não adubo. Eu falo, o cara que lava dinheiro não é o que esconde R$50 milhões no apartamento, e sim o cara que compra uma tonelada de adubo, dissolve na água e manda embora, esse cara lava dinheiro e pior, o dinheiro é dele, não é roubado, enquanto o outro chora de mentira para o juiz para fazer a delação premiada.

Mas para o produtor é duro, se ele não sabe como irrigar ou adubar está jogando dinheiro fora, para vocês terem uma ideia, quanto tempo vocês demoram para fazer a irrigação? Então vou falar sobre situações que eu conheço. Tem um grande produtor de tomate, que deixa a irrigação por uma hora porque foi o que viu na estação meteorológica, que seria o quanto precisava irrigar. Ele observou que irrigando por uma hora, a água desce profundamente, e instalou extrator de solução para ver o que estava acontecendo com a água dele. Ele entendeu que não podia irrigar mais que dois minutos por vez, mas o equipamento não permitia isso. Então ele dividiu e passou a fazer três cursos de 20 minutos. Fazendo isso, a água chegava a 60 centímetros de profundidade e a raiz do tomate tem 20 centímetros, passando 40 centímetros, levando o fertilizante embora para além da zona da raiz e não sendo aproveitado. 65


8º Bunkyo Rural

Quando ele fracionou, a produção saltou, mas era preciso mudar o equipamento, então o primeiro passo era o manejo, porque ele entendeu que gerenciava a fotossíntese. O que temos que entender desse slide é que 90% da planta é água, conforme o tipo de planta 10% de matéria seca e menos de 1% de sais minerais. E o foco do produtor é adubo e veneno, enquanto luz, água e gás carbônico ele não está olhando, deixando o mais importante. O que me impressionou no curso da Holanda, é o foco deles no que é importante primeiro, que é luz, depois oxigênio, CO2 e água. Nos 15 dias que fiquei na Holanda, 50% do curso era fisiologia, porque eles focam no mais importante primeiro, e a gente inverte e ordem. Como não temos controle sobre o clima e nem sobre a irrigação, tendemos a dar importância ao que podemos controlar, que é fertilizante e veneno, mas quando você olha para a ordem certa você vai usar melhor os fertilizantes e utensílios. Não é fácil essa parte da nutrição, o solo tem composição mineral, água, ar e micro-organismos, o clima e fase de crescimento da planta é importante, mas o que temos que entender é que, para entender a nutrição, temos que gerenciar esse conjunto todo, e parece um pouco complicado. O que temos que entender é que a planta não come a mesma coisa todo dia. Se o produtor entender isso, meu objetivo na palestra está cumprido. Por exemplo, em dias de verão e inverno, na mesma estufa, mesmo ambiente e mesmo solo, a planta vai comer igual? Não, porque são temperaturas e níveis de luz diferentes, ás vezes muita e outras pouca, então eu tenho que entender 66


8º Bunkyo Rural

o quanto a planta está crescendo por dia. Vou perguntar para vocês: vocês medem quanto a planta cresce por dia? Me desculpa, mas quem não mede não gerencia e não sabe o que está acontecendo, você só sabe se medir. Agora, quem tem estufa que tem termômetro e leitor de temperatura? A gente segue um conceito chamado Grau dia, onde você pega a temperatura média do dia, mínima mais máxima dividido por dois, então 12 mais 28 é igual a 40 e dividido por 2 é 20. A temperatura basal do tomate é 10, então 10 graus/dia é a quantidade de calor que a planta vai crescer em um dia. Um tomate que precisa de 900 graus/dia para crescer vai demorar 90 dias a 10 graus/dia. Esse é o indicador da agronomia, está aí faz décadas. Essa medida objetiva pode ser usada por qualquer produtor para saber quanto sua planta cresce por dia, mas o produtor que usa o termômetro não sabe direito o que fazer, só ver se está calor ou frio. Outro aparelho importante é o Phmetro. Talvez seja o mais eficiente para cortar custos que o produtor tem dentro da propriedade, para medir a solução do solo, pois existe a faixa ótima de absorção de nutrientes entre 5 e 6. O ferro é um ótimo exemplo, se o ph estiver 6,7 e aplicar ferro acaba queimando a folha. Se estiver 6,8 eu aplico ferro e talvez falte, porque o ferro ficou indisponível e não absorve. Então medindo a solução do solo eu consigo cortar custo, porque eu só vou aplicar nutrientes se for preciso, caso contrário não aplico, então nós temos que medir e controlar. Essa é minha estufa e os vasos, e essa ferramenta que chama irrigômetro.

67


8º Bunkyo Rural

Tem um funcionário que coleta solução todo dia para ver o quanto irrigou de água e quanto foi drenado, fazemos no solo também todos os dias, porque a planta se alimenta todo dia, e com isso a gente consegue fazer uma diferença enorme. Outra questão importante é a questão de variedade, pois cada uma responde de uma forma, então temos que ver como essas variedades respondem e fazer uma coisa que vejo muito pouco, mas é acessível a qualquer um. Quando for plantar uma variedade é preciso deixar um nível de irrigação para o ramal daquela variedade, e não deixar 20 variedades no mesmo ramal de irrigação. Tendo um bom enraizamento, você vai ter uma planta sadia e tem doença também, então é importante sabermos quando ocorre a doença. Hoje a requeima (uma doença) não é algo que vemos mais nas nossas propriedades, porque aprendemos a controlar na nutrição e irrigação, com isso eliminamos a requeima. E achávamos que potássio seria um bom equilibrador de nitrogênio e usávamos para controlar a requeima, mas apareciam cladosporium (fungo) pelo excesso de potássio, mas quando eu monitoro não tenho mais esses problemas. A questão de água nos sistemas automatizados e o que existe em tecnologia para monitoramento vocês não fazem ideia. Tem uma tecnologia imensa disponível, não tem como voltar atrás. Temos que usar. 20 anos atrás eu dava consultoria para um produtor que me perguntou como seria o futuro. Respondi que teria mão de obra muito cara, com poucas pessoas qualificadas para dar retorno, se não acompanhássemos já tinham equipamentos 68


8º Bunkyo Rural

para medir tudo, isso 20 anos atrás, e hoje o Brasil tem tecnologia para medir qualquer coisa relacionada a agricultura. Poucos profissionais do campo estão qualificados para aplicar e utilizar essas tecnologias e aparelhos, aplicando e tendo resultado. Uma coisa para entendermos a relação e importância da questão de nutrição, já falei sobre nitrogênio e potássio, mas vamos entender mais, o potássio é um íon livre, tanto em nós quanto nas plantas. Ele não se liga em nada, e os organismos usam para trocar calor, então se lambermos a pele vai estar salgada, é potássio e sódio, mas uma porcentagem muito mais de potássio. A planta tem um mecanismo chamado bomba de potássio, onde ela absorve água, que tem uma quantidade maior de potássio do que no solo, que caminha no sentido de menor concentração para o maior, que está localizada na folha. Se pegar um pecíolo dessa folha e espremer retirando 1 ml e diluir em 10 ml de água, vai ver que vai dar a produtividade alta, porque a folha está cheia de nutrientes e potássio, utilizado para transpirar. Temos que entender que quando varia o clima, a boa síntese de nutrientes depende do bom balanço de nitrogênio para potássio. Quando eu faço uma 69


8º Bunkyo Rural

relação que está equilibrada, eu acredito que a planta vai ficar em condição normal. Mas quando varia o clima, quando tiver mais luz ou menos luz, isso muda completamente a nutrição que eu fiz, porque varia a absorção de potássio e o equilíbrio que havia sido feito. Se eu mudo a irrigação acabo mudando a absorção de potássio no solo e a disponibilidade de nitrogênio do solo. Aumentando a umidade do solo, eu aumento a atividade biológica e a liberação de nitrato, o que faz a planta absorver mais. Se eu não entender a necessidade de irrigação do solo e que a variação de clima afeta meu manejo, vou ficar eternamente dependente de fertilizantes e defensivos. Como o tempo é curto não dá para entrar em detalhes, então o importante é entender que quando eu estou na estufa, a umidade muda dependendo da altura e o Sol também, o que significa que o ambiente protegido muda completamente a maneira que eu devo trabalhar com irrigação e nutrição. Tenho que lembrar que a matéria prima é essencial para a liberação dos nutrientes e para que planta possa absorvê-los. A gente mediu na estufa, e temos plantas mais rígidas e outras fracas, com o Sol nascendo desse lado e fazendo esse trajeto nessa estufa. Aquele lado estava pouco desenvolvido com a planta sofrendo muito, porque quando o Sol nascia daquele lado, tinha umidade alta de noite e temperatura baixa, e quando o sol começava a incidir do Oeste a temperatura já estava alta e o ar mais seco. Então

70


8º Bunkyo Rural

preciso ter boas condições para ter um bom ambiente de trabalho na estufa, caso contrário eu não consigo manejar adequadamente o ambiente. Um exemplo é o fósforo (P), importante elemento na formação das raízes. Doses elevadas de fósforo aumentam a resposta aos demais nutrientes, principalmente para o Nitrogênio (N). Em condições de umidade adequada, o efeito aparente de uma dose maior de P é equivalente ao aumento da dose de N, mesmo que esta não ocorra. Na foto à esquerda é a parte de cima com sub-irricação. À direita é o centro do pivot que está recebendo mais água, tendo como produção média a média aritmética dos três. Aqui dá para ver a diferença. Então o que a gente consegue de alta produtividade no orgânico, é porque entendemos que temos que ter regularidade. Se mantiver a uniformidade, o peso necessário da planta para produzir diminui. Um exemplo: o produtor queria colher 50 toneladas por hectare, e só precisava dividir 40 mil plantas, resultando mais ou menos em 1,15 para produzir 50 toneladas, e é muito pouco. Mas ele estava fazendo 3 quilos por planta, o que ele estava fazendo daria para produzir 120 de toneladas por hectare. Podem falar: "mas isso é impossível de produzir na batata, ninguém faz isso". Quando você ia na plantação via que tinha uma deformidade enorme, mas a maior preocupação dele não era a uniformidade, mas o fato do custo ficar alto. Então ele precisa entender que precisa medir e controlar para poder produzir e ofertar ao mundo, não deve apenas jogar adubo e veneno. É preciso gerenciar e manter a regularidade para ter uma boa produção. O que temos que entender é que não posso ter uma produção boa se não pensar no solo, no ambiente. Temos conseguido aumentar a produtividade gerenciando e cuidando do tomate, e controlamos o resultado por meio de aparelhos e temos uma metodologia que a gente aplica todo dia. A tecnologia está ai, se vamos gastar com fertilizante, funcionário ou automação de monitoramento, a decisão é de cada produtor. Seremos cobrados por causa da pegada de nitrogênio, carbono e água, o pessoal esquece que essa é uma região de mananciais e São Paulo é uma cidade com população enorme. Quem vai ser o produtor que vai ser fiscalizado por causa de água na região? Vocês serão cobrados. Há três anos, na seca pegaram no pé de vocês, não é porque choveu agora que essa cobrança vai parar, só tende a piorar. Se não usamos a tecnologia a nosso favor, iremos acabar saindo do mercado, e ainda tem a pegada de água e sem veneno, o mercado só fica mais exigente. 71


8ยบ Bunkyo Rural

72


8º Bunkyo Rural

Existe um conjunto de tecnologia que está disponível, isso são tecnologias independentes que vi no curso na Holanda e podem ser usados por qualquer produtor. Mudar a estufa não é difícil, quando o produtor acerta sempre faz coisas novas, a decisão de fazer mais alta ou mais baixa é dele, a produtividade vai ter uma diferença enorme, mexer no espaçamento para alterar ventilação, porque o produtor esquece que a planta também usa CO2. Tem uma porção de tecnologia para locomoção, carrinho para melhorar produção, automação, monitoramento, tudo está disponível e você não precisa pegar tudo de uma vez. Nós desenvolvemos um software, tem muita gente no mercado e nós temos nossas planilhas de Excel, que pode ser um problema porque muitas pessoas não sabem usar ou têm medo, então quando via a planilha já se perdia e não entendia nada, era um grande problema. Por isso criamos um software e entendemos que tem parte de BI (Business Intelligence), porque organiza a informação para eu tomar a decisão. Ele pega umidade, insolação, temperatura, a adubação aplicada e ajuda a tomar a decisão. Meu tempo já estourou, queria deixar de recado para vocês é que a tecnologia está acessível, é possível fazer produção de qualidade, existem vários modelos e sistemas no Brasil, essas são as estufas que eu mostrei, essa em Londrina, a estufa em Avaré que eu havia mostrado, a Mama Gê, a apresentação vai ficar disponível com a organização, e essa é nossa página do Facebook (www.facebook.com/Encistecconsultoria) , queria agradecer a oportunidade aos organizadores e a atenção de todos, obrigado. 73


8ยบ Bunkyo Rural

74


8º Bunkyo Rural

CONTROLE BIOLÓGICO

Palestrante: Mário Sato Professor de Pós-Graduação do Instituto Biológico em Sanidade, Segurança Alimentar e Ambiental no Agronegócio Boa tarde a todos. Primeiramente, gostaria de agradecer a comissão organizadora pelo convite. Vou falar um pouco do nosso trabalho no Instituto Biológico. Partindo para a definição de controle biológico, é um fenômeno natural que consiste na regulação de populações de espécies usando químicos naturais visando a redução populacional. Esse assunto vem crescendo em importância, é uma estratégia que cabe bem em qualquer problema de agricultura sustentável, visa a redução de uso de agrotóxicos e produtos químicos que tem causado uma série de problemas na agricultura. E passa a ser cada vez mais de interesse dos agricultores. Com relação aos tipos de controle biológico, dividimos em controle biológico natural, clássico e aplicado. O natural é associado aos inimigos naturais já presentes na agricultura, e é de grande importância porque normalmente leva ao equilíbrio populacional das pragas, mas que é pouco visto pelos

75


8º Bunkyo Rural

produtores. Com relação ao controle biológico clássico, está relacionado a introdução de algum inimigo natural visando o controle de alguma praga, principalmente uma praga que foi recém introduzida no país e que ainda não tem inimigos naturais contra ela. Normalmente se procura um inimigo natural no local de origem da praga para que possa atuar no controle biológico desse organismo introduzido. E o controle biológico aplicado é aquele que o

76


8º Bunkyo Rural

agricultor conhece e se faz liberação de inimigos naturais ou aplicação de algum fungo ou bactéria para o controle da praga. É alguma coisa semelhante ao controle químico, porém utilizando um inimigo natural. Essas imagens não estão muito claras devido ao problema de luminosidade, mas em termos globais o controle biológico usa agentes associados ao controle biológico e podem ser divididos em: macro organismos, que são principalmente os predadores e os parasitóides, que são organismos relativamente grandes como certos ácaros, e existem os microrganismos, que são os então patógenos. Com relação aos patógenos, são agentes que causam doenças nas pragas, então existem os fungos, bactérias, vírus e alguns protozoários, eles já ocorrem naturalmente no campo, normalmente são dependentes de muita umidade e demandam cuidado na produção, ninguém pode sair produzindo fungos e bactérias como se produzem predadores, por exemplo.

Normalmente essa tecnologia de uso dos microrganismos tem sido associada a grandes empresas, laboratórios que conseguem uma produção de qualidade para garantir que o organismo esteja sendo utilizado para tal determinada finalidade, e que comercializam esses organismos. Os mais conhecidos dos produtores seriam alguns fungos como Bacian, isso pensando em 77


8ยบ Bunkyo Rural

78


8ยบ Bunkyo Rural

79


8º Bunkyo Rural

controle de pragas Beauveria, é um dos mais utilizados na agricultura e normalmente forma essa coloração branca nos insetos. As bactérias mais conhecidas pelos produtores seriam os bacilos, esse é o mais utilizado na agricultura e usado há muito tempo, principalmente no controle de lagartas, e existe uma linhagem para controle de diferentes organismos como besouros, ácaros e outros que podem ser controlados por bacilos. Existe também o grupo dos vírus e o mais conhecido é o Bacuri vírus, diferente das bactérias que têm grande espectro de ação, são bem específicos e possuem um grupo para cada tipo de organismo. Existe também o grupo de nematóides e tem crescido sua importância no mundo. No Brasil existe basicamente uma empresa comercializando e está engatinhando no país. Existem basicamente dois grupos de importância dos nematóides, que servem para inocular algumas bactérias, e quem acaba matando o inseto mesmo é a bactéria, e o nematoide acaba se alimentando da sopa bacteriana que se desenvolve dentro do inseto atacado. Então existe basicamente uma simbiose entre o nematóide e a bactéria. Em países da Europa e nos Estados Unidos a comercialização já vem acontecendo há um bom tempo, mas no Brasil ainda está em fase inicial. Os

80


8º Bunkyo Rural

mais conhecidos do público em geral são os predadores, como a joaninha, percevejos, moscas e vespas, que são bastante importantes. A diferença entre os predadores e parasitóides, é que os predadores, para crescem, precisam se alimentar de diferentes presas, não basta um único tipo para que ele complete seu ciclo. Eles consomem centenas de organismos até atingir sua fase adulta. Existe um predador bastante utilizado no mundo e no Brasil já pode ser adquirido, que é o percevejo Orius, que é um predador bastante efetivo para controle, é bastante utilizado nos Estados Unidos. No Brasil são poucas as empresas que comercializam e o preço é consideravelmente elevado.

Os predadores mais conhecidos pela população são pequenos besouros e joaninhas que se alimentam de organismos de corpo mole. Essa joaninha na fase adulta pode consumir centenas de pulgões em um único dia. Na imagem vocês vêem uma larva, que é a fase jovem da joaninha, que é um caso clássico de introdução de inimigo natural para o controle biológico de uma praga. Então, essa Cochonilha se tornou uma praga muito séria nos Estados Unidos em 1988. Na época em que foi introduzida não havia um inseticida muito efetivo contra essa joaninha, então só com a introdução desse inimigo natural que os produtores conseguiram se livrar dessa praga, na época não havia tecnologia para controlar essa praga. Em termos de 81


8ยบ Bunkyo Rural

82


8º Bunkyo Rural

joaninhas existem várias espécies, algumas têm fase de larvas bastante parecida com essas Cochonilhas. Os quadros superiores seriam larvas de joaninhas, que são inimigos naturais e as de baixo seriam Cochonilhas, então é natural que os produtores confundam inimigos naturais e predadores com pragas, então acabam matando joaninhas achando que são cochonilhas. A grande diferença é a capacidade de movimentação dos dois organismos. Uma larva de besouro se movimenta muito mais rápido que uma Cochonilha. Existem outros organismos, que não sei se são conhecidos de vocês, os Chrysopidae conhecidos como bicho lixeiro e atacam pequenos organismos como pulgões e ácaros, e os exoesqueletos das presas são carregadas por esses organismos, por isso são chamados de bichos lixeiros. Acho que todos já viram aquela imagem, são ovos em cima de pequenos filamentos, muito comum no campo, mas muita gente não sabe o que é, mas são ovos dos Chrysopidae. A imagem não está muito boa, mas no nosso laboratório a gente vem mantendo ovos de uma espécie de Chrysopidae, que é uma das principais no controle de pulgões e Colchonilhas no Brasil. Temos feito testes com esses organismos com moscas brancas e outras pragas, e essa espécie se mostra bastante efetiva. Existem outros organismos que são 83


8ยบ Bunkyo Rural

84


8º Bunkyo Rural

muito abundantes no campo, mas que poucos consideram bons inimigos naturais. É o caso das vespas, que tem uma excepcional atuação no controle de pequenas larvas e lagartas, mas pouco observado pelos produtores, assim como as formigas que não são consideradas agentes de controle biológico, mas existem muitas espécies de formigas que são predadores vorazes e são os primeiros a aturem nos organismos que caem no campo. Em cana de açúcar, que são utilizados alguns produtos que combatem cupins nos canaviais e são extremamente agressivos contra formigas, o que leva ao desequilíbrio populacional. Existem também organismos não muito conhecidos pelos produtores, mas muito comuns nos campos, que seriam estas moscas, parecem uma pequena vespa no quadro direito, cuja larva é muito grande, e esse é um predador muito voraz e comum no campo, normalmente se estão comendo pulgões são essas larvas de moscas, um dos predadores mais comuns em hortaliças. Existem também ácaros predadores, que são muito importantes no controle biológico, são comercializados e muito utilizados pelos agricultores. Existem também algumas aranhas, que em ambientes equilibrados acabam se tornando um dos grupos mais numerosos, e são bastante 85


8ยบ Bunkyo Rural

86


8º Bunkyo Rural

efetivos. Existem aranhas pequenas que pegam ácaros e aranhas de porte maior, que pegam lagartas e outros organismos relativamente grandes. O único problema é o ciclo delas, algumas demoram de meses a um ano para se tornarem adultas, mas em termos globais são muito importantes para o controle biológico de pragas. No interior, antigamente se via as crianças brincando com essas tesourinhas, hoje já nem tanto, mas são muito importantes principalmente nos cultivos de milho, sem aplicação de agrotóxicos, acaba sendo o predador mais abundante nos cultivos e é um predador excepcional de ovos de lagartas. Muitas vezes o produtor aplica o produto, mas acaba não matando a lagarta, pois já está resistente ao produto, e só mata as tesourinhas, o que traz mais problemas. Existe também outro grupo de inimigos naturais que seriam os parasitóides. Na imagem tem um parasitóide colocando um ovo, em uma fase de desenvolvimento do inseto e terminando o seu ciclo, dá origem a uma vespa. Existem parasitóides que atacam ovos e outras larvas e outros atacam adultos, depende da característica de cada parasitóide. Obviamente, os parasitóides que atacam ovos e larvas são mais efetivos no controle biológico do que os que atacam nas fases mais adultas. O controle biológico, ao contrário do controle químico, exige que se tenha 87


8ยบ Bunkyo Rural

88


8º Bunkyo Rural

um ambiente favorável para o estabelecimento e multiplicação desses organismos, então quem pensa em utilizar inimigos naturais tem que fazer o possível para preservar esses organismos, evitando o uso de produtos químicos tóxicos. Caso utilize, aplique apenas em uma pequena parte e não na área total. E para criar esse ambiente favorável, existem variáveis como ajustes, condições climáticas e a manutenção de alimentos para seus organismos, então se você pensa em liberar predadores ou parasitóides, é preciso colocar alguma fonte de alimento para que esse organismo sobreviva. Normalmente, plantas invasoras são aquelas que servem de abrigo e fonte de alimento, como nectários e pólen. Uma coisa muito importante é a preservação dessas plantas invasoras dentro do ambiente para desenvolvimento dos organismos. Após uma pincelada do que são os inimigos naturais, a gente vai falar sobre controle biológico e sua importância no Brasil. Em termos globais no mercado é algo em torno de 2,3 milhões por ano, que é muito pequeno em comparação ao mercado de químicos e inseticidas, e só representa 1,5% do que existe em termos mundiais. Mas o controle biológico, ao contrário do controle químico, vem crescendo em larga escala no país. Enquanto o con89


8ยบ Bunkyo Rural

90


8º Bunkyo Rural

trole químico cresce 3% ao ano, o controle biológico cresce entre 15% e 20% todos os anos. Existe um grande número de produtos já existentes no mercado para fungos. Seriam 56 produtos registrados, e esse número vem crescendo, então sem dúvida o controle biológico vem crescendo em números mundiais. Só no Brasil, considera-se que esse parasitóide da cana representa uma economia de R$1 bilhão por ano. Várias empresas produzem esse organismo, a cana de açúcar é um cultivo em que o controle biológico está muito bem estabelecido, e representa uma grande cultura com participação de inimigos naturais. No caso do tomate, em que o controle de lagartas é bastante problemático, chega a dar 85% de parasitismo, algum parasitóide vem sendo muito utilizado no controle de biológicos, e liberado principalmente em pomares abandonados e no fundo de quintal em que não se pode fazer uso de produtos químicos. Também tem os ácaros predadores que são bastante aceitos e muito utilizados pelos produtores. São utilizados para moscas brancas e outros organismos, essa é uma das espécies mais utilizadas no Brasil. São muito efetivos quando liberados em baixa densidade populacional e tem sido muito utilizados pelos agricultores. O sucesso dos ácaros predadores se deu pelo

91


8º Bunkyo Rural

fato dos acaricidas não serem mais tão efetivos contra os ácaros praga, como eles não estavam conseguindo controlar, acabaram passando para essa tecnologia. Devido ao sucesso desses inimigos naturais, chegamos a implementar uma biofábrica na associação de floricultores, onde se visava principalmente a redução do custo de produção e a efetividade do controle, no caso dos acaricidas já não eram mais tão efetivos. Nesse caso, nós conseguimos uma pequena produção para ajudar os produtores e representou uma boa economia para quem adotou essa tecnologia. Existem pelo menos mais duas espécies que criamos em laboratório, que servem no controle de moscas brancas, cada um chega a consumir em média dez ovos de moscas por dia. Estamos começando experimentos com ornamentais e apresenta bons resultados contra ovos e larvas jovens, vários predadores desse são efetivos no controle. Existem também predadores de solo que são bons para o controle de moscas e têm sido explorados em outros países, em granjas e canaviais, onde

92


8º Bunkyo Rural

tem grandes problemas com moscas, e aonde vem sendo efetivo o uso de ácaros predadores. Nós chegamos a montar um experimento onde liberamos esses predadores em uma área de difícil controle, e o resultado foi que obtivemos um controle bem alto de aproximadamente 90%, apenas com a liberação desses ácaros predadores no solo. Na verdade, o que tinha para falar era basicamente isso, é um tempo bem reduzido para falarmos sobre controle biológico, mas deu para ter uma noção da importância e o que é preciso para o controle ser efetivo e útil ao agricultor.

93


8ยบ Bunkyo Rural

94


8º Bunkyo Rural

SAF SISTEMA AGROFLORESTAL

Palestrante: Michinori Konagano Presidente da CAMTA - Cooperativa Agrícola Mista de Tomé Açu Boa tarde a todos. Depois do almoço dá um sono, não é? E o calor também, mas vamos aguentar mais um pouco. Primeiramente gostaria de agradecer o convite do Bunkyo, toda diretoria e equipe, muito obrigado. Gostaria de agradecer a CKC pelo apoio, custeando todas as minhas despesas de viagem e estadia para participar deste evento. Gostaria de complementar as palestras anteriores. De manhã fiquei observando, todos falaram sobre orgânicos, produtos naturais, controle biológico, questões climáticas e sociais. Todas essas coisas, desde várias décadas estamos observando e visando preservar a natureza, a saúde e os animais, e vamos enfatizar a questão dos trabalhos sociais. Gostaria de falar um pouco uma história de 80 anos. A nossa localização, para quem não conhece, eu venho do Norte, a 3.000 quilômetros daqui. Saí ontem e cheguei de noite. De Belém para cá são quatro horas de vôo, então é uma distância muito grande. O município de Tomé-Açu possui mais ou menos 5.000 quilômetros quadrados e uma população de 60 mil habitantes. Nós temos nas redes municipais e estaduais 25 mil alunos, e 45 mil eleitores no município. Dá para perceber que essa conta não está certa, tem muito mais gente na cidade do que os números oficiais indicam. A história começou em 1929. Houve um convite do governo do Estado para instalar colonos para desenvolver a agricultura. O governador da época 95


8º Bunkyo Rural

cedeu o terreno para uma empresa japonesa, que deu origem à cidade, cuja área até então pertencia ao município de Acará. Fazem 58 anos da emancipação do município de Tomé-Açu. A história começa em 1929 na fazenda Bela Vista, onde chegavam os primeiros colonos japoneses, na década de 30 teve a instalação da cooperativa de hortaliças, que passou por dificuldades de comercialização pois não havia rodovias para transporte e tiveram que ser utilizadas as embarcações, levando um dia para chegar a Belém e outro para voltar. Em 1933 teve a implantação de muda de pimenta, começou-se com 20 mudas que foram se propagando ao longo dos anos. Em 1949 foi cadastrada a Cooperativa de Tomé-Açu, tudo que era feito era controlado pelo governo, então era preciso criar uma independência e adquirir embarcação própria e ter a própria cooperativa, e foi um grande desafio. Até a década de 50 prevalecia a monocultura, com a cultura da pimenta-do-reino e também muita hortaliça. Na época os paraenses não consumiam tanta verdura e nem arroz, e foi um desafio para mudar essa cultura. Na década de 70, com a proliferação de doença na pimenta, muitos estavam desistindo da agricultura. Entre os anos 70 e 80 chegaram alternativas como cacau, mamão, 96


8º Bunkyo Rural

melão, maracujá, acerola e graviola. Isso detalha como o pessoal que mora na região ribeirinha controla as plantações. É uma plantação mista, de várias espécies e durante os 12 meses do ano. Essas alternativas estavam dando certo, sem doenças e insetos e uma pessoa viu que estava dando certo e resolveu implantar esse sistema, que a população nativa já praticava há muito tempo, na sua propriedade, enquanto outros estavam desistindo. Em 1987, foi implantada a primeira indústria apoiada pelo governo japonês, o que facilitou a produção e comercialização de produtos. Então todos os produtores começaram a entrar com diversificações, variação de produtos principalmente tropicais para serem industrializados. De 2000 em diante, foi reconhecido o sistema agroflorestal em Tomé-Açu, muitos professores e pesquisadores fizeram levantamento nas propriedades. Nós chamávamos de consórcio, ou seja, várias culturas numa propriedade, quando veio um professor americano e disse que na verdade se tratava de um sistema agroflorestal. Agricultura com floresta juntos. Por que e como surgiram sistemas agroflorestais em Tomé-Açu? Pela dificuldade da produção de uma única cultura, o que obriga a buscar alternativas de culturas para se produzir. A partir dos sistemas agroflorestais começaram a surgir 97


8ยบ Bunkyo Rural

98


8º Bunkyo Rural

espécies que seriam predominantes na Amazônia, como por exemplo, o cacau, por causa das florestas. Isso aumentou bastante a nossa indústria e a agricultura. Em termos ambientais vieram as madeireiras, o pessoal do Sul e Sudeste para explorar a Amazônia. Enquanto eles estavam devastando, nós estávamos tentando recuperar o terreno que estávamos, visando a preservação do ambiente. Sempre tivemos consciência disso. Essas são as análises da propriedade com estudos das culturas. No primeiro ano tinha pimenta-do-reino, milho e cacau. O segundo ano é representado pela fotografia que eu mostrei anteriormente, com pimenta-do-reino, cacau e bananeira fazendo cobertura, porque o clima lá é tão quente que amanhece com 30 graus e anoitece com 35 graus. Quem vem mais do Sul vai se espantar com o calor que nós passamos hoje. Essa é outra propriedade com pimenta-do-reino, açaí, cupuaçu e outras culturas como acerola, que é uma cultura da Amazônia e tem grande concentração de vitamina C. Essa outra propriedade parece uma floresta. Toda pesquisa que viemos realizando é da associação entre pimenta-do-reino, banana e cupuaçu, onde anteriormente era com arroz e trigo, e mostra como cada cultura tem que se adaptar a cada local. Além de ter que observar o mercado, porque não adianta plantar e não ter mercado para essa produção. Esse é um sistema 99


8ยบ Bunkyo Rural

100


8ยบ Bunkyo Rural

101


8ยบ Bunkyo Rural

102


8º Bunkyo Rural

formado, como já comentamos, é a castanheira de um amigo nosso, que é uma floresta. Esse é um exemplo para todos, quando vemos na televisão ou jornal, de agricultura familiar vamos passar para floresta. Esse é um projeto feito com produtores, foi um desafio para muitos cientistas, e foi descoberto que as sementes que ninguém conhecia vieram da África e acabou virando nativo . Além disso, deve ter espaçamento entre as raízes, porque senão vai acabar tendo raízes disputando espaço entre si, que é o exemplo das palmeiras que tem raiz mais profunda, mas na natureza não existe apenas as palmeiras, mas uma enorme diversidade, e não deve ser uma competição. Esse é outro projeto que fizemos para melhoramento de material genético, para então poder produzir em um espaço menor. É fundamental que tenha um material genético de ótima qualidade, então foi feito um trabalho junto com nossa cooperativa, onde foi plantado em nossa propriedade com nosso monitoramento. Hoje temos resultados que estamos passando para os agricultores, enquanto se produz um quilo de cacau, é possível produzir dois ou três quilos de amêndoa seca, na mesma área. E como podemos ver se o solo está bom? Pela umidade é possível ver o nível de preservação do solo, e também as minhocas, são um ótimo indicador de qualidade do solo. E a qualidade depende também da cultura que está sendo produzida, em casos que não é preciso usar herbicidas, o que mostra também a qualidade do ambiente de trabalho para o funcionário. Às vezes, por ficar embaixo do sombreado, os funcionários acabam não percebendo que as horas já passaram rápido, porque quem trabalha no sol não vê a hora de ir embora, mas quem trabalha na sombra acaba esquecendo da hora. Durante os 12 meses tem produção e renda, que são importantes para as famílias. Uma produção saudável de alimentos. Na abertura de manhã, o professor Francisco Graziano Neto falou dos jovens, com alta tecnologia e mecanização, e não passando o facão nas plantas. Temos mais de 1000 agricultores familiares beneficiados pela cooperativa. No setor de administração e agroindústria, temos parceria com várias empresas que dão apoio aos projetos, empresas que compram e outras que financiam projetos sociais. Então essa é a infraestrutura da matriz. Produzimos cacau e exportamos o produto final, seja óleo, geléia, pimenta-doreino. 103


8ยบ Bunkyo Rural

104


8º Bunkyo Rural

Esse é o laboratório que temos controle, e esse é o resíduo que é transformado em compostagem, nossos produtos que são exportados para vários países, como amêndoa, cacau e pimenta do reino. Exportamos amêndoa principalmente para o Japão, que está precisando desse produto e gosta muito das nossas amêndoas. Temos projetos sociais de auxílio para a agricultura familiar, das matas ciliares, manejo do açaí orgânico, damos treinamento também. Temos contribuição de mais de mil famílias por meio desses projetos e auxílios, em várias localidades, não só nas associações que beneficiamos. Esse é um treinamento que temos feito em comunidades familiares, trazendo pessoas de fora e passando para as famílias. Esses são prêmios e reconhecimentos que recebemos se não me engano, em 2010, pelos trabalhos sociais, e esse foi pela seleção das melhores amêndoas. Por meio desse certificado conseguimos vender para muitas empresas, parece pouco, mas tem um grande valor agregado. Vou deixar meu contato aqui, e muito obrigado. CAMTA-COOPERATIVA AGRÍCOLA MISTA DE TOMÉ-AÇU Av. Dionísio Bentes, 210 - Quatro Bocas - Cep 68.682-000 - Tomé-Açu - Pará Tel: +55 (91) 3734-1084 / 3734-1352 Website: http://www.camta.com.br - e-mail: camta@camta.com.br

105


8ยบ Bunkyo Rural

106


8º Bunkyo Rural

A LOGÍSTICA NA DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS HORTIFRUTI ORGÂNICOS Palestrante: Newton José Diniz CAISP - Cooperativa Agrícola de Ibiúna Boa tarde a todos. Eu poderia começar essa palestra fazendo uma logística de como eu vim parar aqui. Se vocês lerem a revista e o anúncio já dá para ver que é uma logística confusa para eu estar aqui hoje. Estarei apresentando nosso processo na Caisp, que é uma cooperativa que nasceu em 1995. Até então, ela era formada por um pequeno grupo de produtores, e naquela época ela nasceu com foco em redução de custos. Essa era a primeira necessidade. Obviamente, muitos devem estar pensando que as cooperativas basicamente nascem disso, mas três anos depois, a Caisp mudou um pouco o foco, e começou a pensar em acesso ao mercado. Desde então, a cooperativa vem focando na comercialização, e é isso que eu vim trazer hoje, um pouco da nossa experiência durante esses 22 anos. Prometo fazer uma palestra bem leve, sei que esse horário já está bem cansativo, mas eu vou fazer uma palestra bem rápida e concisa para todos aproveitarem o máximo. Essa imagem mostra nossos números. Hoje, temos 35 produtores que são cooperados, com mais de 600 hectares de produção. Além desses 35, contamos com a colaboração de 107


8º Bunkyo Rural

mais 150 produtores parceiros, que vão do convencional ao orgânico. Essa era nossa sede no começo, de 1995 até 2012 (foto na página anterior). A Caisp viveu de aluguel, e essa foi inaugurada em 2012, que é nossa sede própria, que tem mais de 5000 metros quadrados de construção e uma área total de 55 mil metros. Vou falar um pouco dos segmentos que trabalhamos, temos quatro grupos importantes: convencional, e dentro dele nós temos o convencional hidropônico, os orgânicos, que são a parte de folhas e legumes, e também as novas linhas que são a tendência do mercado. Além desses, trabalhamos com os legumes que vocês viram no nosso estande. Esse é nosso histórico de faturamento ao longo dos anos. Vocês podem ver o crescimento da Caisp, inclusive já está projetado que esse ano fecharemos perto dos R$ 56 milhões. Para vocês entenderem um pouco desse número, para o segmento de hortaliça significa que é muito volume. No slide anterior onde mostrei os nossos grupos, 60% hoje são de produção convencional. No total da Caisp são 2 milhões de unidades vendidas por mês, é muita coisa. Aqui é nossa rede de clientes. Atendemos desde varejo até institucionais, marcas como Subway e Frango Assado, inclusive redes de aeroporto também estamos vendendo. No total são 108


8º Bunkyo Rural

mais de 300 clientes atendidos, espalhados em 35 municípios do Estado de São Paulo. A Caisp atende apenas o Estado de São Paulo e regiões como Grande São Paulo, interior e litoral paulista. Aqui um pouco do nosso cenário do frete de hortaliça. Todo mundo sabe como é difícil conciliar custo logístico com demanda. A parte de hortaliça, como eu citei, tem um valor muito baixo, então, desde 2016 a Caisp vem trabalhando para otimizar o frete. Vocês vão ver nesse gráfico basicamente como era em 2014: tínhamos 180 clientes com custo médio de 9,46%. Em 2015 com 210 clientes o custo médio era de 9,55%. Em 2016 já tínhamos 250 clientes e o nosso custo fechou em 109


8º Bunkyo Rural

8,95%. Nesse ano com mais de 300 clientes, nosso custo está em 7,89%. Então essa parte do gráfico representa a eficiência que estamos tendo no setor logístico da Caisp. E para atender esses clientes espalhados por São Paulo, contamos com mais de 1000 profissionais conectados a Caisp e 800 conectados diretamente no campo. Na Caisp temos 226 colaboradores registrados, onde 156 estão na sede e 73 fazendo trabalho de conta, ou seja, fazendo a parte comercial dos clientes. Também contamos com 35 motoristas terceirizados. A brincadeira no começo da palestra não é verdade, não vou falar sobre mim, vou falar um pouco do cenário de distribuição e comercialização de orgânicos da Caisp. Trouxe algumas curiosidades que vão atrair um pouco mais quem está na dúvida se vale investir no orgânico. Apesar de tudo que já foi falado hoje, vamos tentar livrar essas dúvidas que estão no ar. Para quem é do ramo de hortaliças, essa é uma pesquisa feita em parceria com a ABRAS. Para quem quiser, está muito fácil de achar no Google, basta colocar ABRAS orgânico. É uma das primeiras que vai estar lá, e essa pesquisa tem muito conteúdo sobre orgânico. Para quem não conhece, a ABRAS é uma associação brasileira de supermercados, eles falam sobre tudo referente a mercados, e abriram um espaço para falar de orgânicos, muito

110


8º Bunkyo Rural

interessante. Aqui fala que nos supermercados, 63% dos produtos consumidos são verduras, o que significa que de 10 consumidores, 6 estão indo no mercado comprar uma alface ou escarola. Os outros percentuais estão bem distribuídos, sendo 25% legumes, 25% em frutas e 12% cereais. Isso tira a dúvida o quanto o legume está em ascensão na parte de hortaliças. E olha que engraçado, eu mostrei anteriormente o faturamento total da Caisp. Esse é um desenho do faturamento do segmento orgânico. Observe o que vem acontecendo na cooperativa nesses últimos anos. Desde 2013 decidimos fazer uma estratégia diferente para o orgânico, então tudo começou aqui, o orgânico está na Caisp desde 2004, mas o marco do orgânico está aqui. Em 2013 crescemos 37% em relação ao ano anterior, em 2015 foi 55%. Nesse ano, o Brasil estava em uma crise danada, o que não é novidade para nós, mas nesse período quando íamos em algumas lojas falavam que iam crescer em torno de 18%. Quando falávamos que crescemos 55% no orgânico ninguém queria acreditar. E em 2017 estamos projetando um crescimento de 17% referente a 2016. O previsto é fechar perto de R$14 milhões. Aqui a divisão do nosso produto orgânico, o que converge um pouco com aquela pesquisa da ABRAS, onde 64% do 111


8º Bunkyo Rural

nosso volume hoje é hortaliça, estando diretamente relacionado a folhas, os outros 33% estão em legumes e 3% em frutas. Só em orgânico por mês são mais de 500 mil unidades, só que 350 mil já sai pronto do nosso produtor. Ele entrega já pronto e embalado no saquinho, como vocês viram no nosso estande. Os outros 150 mil são padronizados na nossa sede, isso apenas do orgânico. Existe um volume muito maior que é padronizado na Caisp. Se for falar no movimento geral, os produtos padronizados na Caisp chegam aproximadamente a 12 milhões de unidades, o que gera 80 toneladas de resíduos por mês. Temos uma área de compostagem onde é processado, e depois esse composto retorna aos produtores para fertilização do solo. Então é uma cadeia cíclica, mesmo que o produtor não entregue o produto acabado nós conseguimos fazer o reaproveitamento de todo esse produto. Só de orgânico nós temos mais de 100 itens cadastrados. O slide sobre como está a Caisp mostra mais de 250 itens cadastrados onde 100 são orgânicos. Os carros chefes, obviamente, é a alface crespa na parte de hortaliça com a couve manteiga, e na parte de legumes é a cenoura e o tomate. Mas para abastecer 100 itens de orgânicos não dá para ficar apenas em Ibiúna. Esses são nossos parceiros hoje, Distrito Federal, Minas Gerais, e em São Paulo. Vocês podem ver que são várias regiões que forne112


8º Bunkyo Rural

cem produtos orgânicos, e a região Sul, inclusive já estou entrando em contato com o pessoal da região Sul porque quero os produtos de lá. Sobre a questão da distribuição do orgânico, a Caisp é certificada pela Ecocert, o que permite fazer todo esse trâmite do orgânico, desde comercialização até a compra. Então a Ecocert é responsável por permitir a entrada de novos produtores orgânicos dentro da cooperativa, ou seja, não é por maldade, mas mesmo que o produtor seja orgânico e tenha a maior das boas intenções, ele não entra se não tiver certificação. Isso serve para eliminar aquela dúvida se o produto realmente é orgânico. Além disso, somos auditados duas vezes por ano pela Ecocert, além de outros órgãos que fazem as inspeções, mas a Ecocert foca muito na questão de rastreabilidade e análise da água. Parte dos documentos e relatórios usados para controle, inclusive até o produto que é usado para a higienização de facas e máquinas, eles são bastante rigorosos nesses pontos. Tudo isso para a gente preparar, nós temos um programa exclusivo de orgânicos para nossos funcionários e prestadores de serviço, onde a gente explica o teor e as necessidades dos cuidados com orgânicos. Quando eles recebem esse treinamento, no final a gente certifica que ele compreendeu tudo e eles assinam um termo de responsabilidade. E a gente faz o máximo

113


8º Bunkyo Rural

possível para eliminar todos os tipos de brechas. Até na parte de armazenamento e estocagem dos produtos, nós fazemos com que todos os produtos orgânicos fiquem em caixas laranja. Toda vez que vocês forem a Caisp, estão todos convidados para conhecerem. Se vocês virem algum produto estocado em caixa laranja pode ter certeza que é produto orgânico. E para melhorar ainda mais isso, a gente controla todos os nossos produtos com essa etiqueta na caixa, bastante simples, mas muito funcional. Basicamente tem o nome do produto, até porque não dá para estar escrito abobrinha na etiqueta e dentro da caixa ter tomate, mas basicamente tem o nome do produto, código, nome do produtor, e um lote criado com rastreamento interno, que consiste no ano invertido com dois dígitos, mês, dia e horário que chegou na Caisp. Isso gera um código único a partir do momento que chega na cooperativa. E isso, depois de ser colocado, serve tanto para matéria prima quanto para o produto acabado. Os nossos estoques são controlados também de forma separada em orgânico e convencional. A gente faz todo o trabalho possível para que não haja contaminação cruzada, inclusive nós temos câmara fria e câmara seca para produtos exclusivos para o orgânico. Ou seja, não ficam em momento nenhum junto com o convencional.

114


8º Bunkyo Rural

A gente fala de hortaliças e legumes, então a gente cria um controle até de como esse produto sai da Caisp. Não podemos trabalhar apenas com PEPS. Para quem não sabe PEPS significa "primeiro que entra é o primeiro que sai" na tradução abrasileirada. Também trabalhamos com a maturação, porque pode acontecer de hoje entrar um tomate muito mais maduro do que outro que chegou quatro dias atrás. Além de caixas, a gente fez uma identidade visual para o orgânico. Toda embalagem de orgânico vocês vão ver que é laranja, os produtos orgânicos vão ter Caisp orgânico e caixa laranja. Isso ficou fácil porque o colaborador, ao embalar uma alface orgânica, sabe que precisa solicitar uma embalagem laranja. Ele nunca vai embalar um orgânico em uma embalagem verde escrito alface crespa. Isso já fez uma associação com nosso colaborador, mas também com o consumidor. Quando ele vê embalagem laranja nos mercados já sabe que é Caisp, então ele consegue identificar pela própria cor da embalagem. Mas também atendemos outras marcas, como a marca exclusiva do Pão de Açúcar que é a Taeq, a marca do Walmart e a marca do Carrefour que é o Viver. Essas marcas, embora sejam marcas próprias, o que às vezes é dilema para o fornecedor, porque a gente acaba perdendo visibilidade. Quem quiser saber se o produto é da Caisp vai encontrar essa informação nas etiquetas porque está sempre lá, produzido ou embalado por Caisp. E a distribuição é a melhor parte disso tudo, esses são números reais de cases nossos. De 10 clientes que procuram a Caisp, 9 querem orgânico, é assustador, mas é a pura realidade. Se formos falar do convencional vai estar apenas o único cliente que não entrou na conta, ele pode querer o convencional, mas pode querer o orgânico também senão não entra na parceria. E daqueles 300 clientes atendidos, 70% já tem produtos orgânicos em suas cestas de compras. Então para quem acredita que não existe mercado como esse, estou tirando todas as dúvidas. Isso é como funciona o pagamento para nossos produtores, essa linha laranja representa a flutuação dos preços dos produtos orgânicos. Vocês vão ver que durante o ano ele se mantém estável, não tem tanto declínio, agora olhem essa linha verde representado pelo convencional. Vocês vão ver nos primeiros seis meses, se referindo mais ou menos ao verão, onde a oferta é muito baixa e a demanda é muito alta, e o preço estoura. Nas gôndolas do mercado alface crespa tem preço absurdo, e isso é a realidade. Só que no inverno, é ladeira abaixo, nem sempre o que o produtor ganha no verão é suficiente para pagar os custos do ano inteiro. Para o produtor 115


8º Bunkyo Rural

orgânico isso acaba sendo um benefício porque se torna mais estável. E ao final, quando a gente tem esse vínculo com nosso produtor, tentando explicar que temos controles rigorosos, que colocamos produtos em caixas diferenciadas, ainda vai existir dúvidas. Isso é natural, e consumidores que queiram mais informações além das que estão nas etiquetas podem entrar em contato conosco por esse 0800, ou através de dois canais de e-mail que é o SAC, que é nosso serviço de atendimento ao cliente, ou ao e-mail exclusivo do orgânico. Quem não conseguir contato pelo 0800 pode preencher o formulário no site da Caisp, que será respondido da mesma forma. Só para explicar um pouco mais, a PariPassu é a empresa responsável em fazer todo controle e rastreabilidade, mas toda embalagem da Caisp possui informações da Caisp. Estou quase acabando, prometo que já vou terminar, mas esse é o cenário de onde os produtos orgânicos são comercializados. 64% está no supermercado, então não precisa reinventar a roda. O público de orgânico no Brasil, essa é continuação da pesquisa da ABRAS em supermercados. Estou falando que 63% estão consumindo hortaliças e 64% estão no mercado. É tudo que a Caisp quer na vida, mas também pode ser uma oportunidade para muitos que querem investir em feiras, que estão representando 26%. A 116


8º Bunkyo Rural

gente vê que está sendo uma nova tendência, e seguido pelas lojas de produtos naturais, que representam 4% e pode ser um número simbólico, porque essas lojas vendem orgânicos, mas a maioria são industrializados. Se estiver falando de produtos frescos duas alternativas estão surgindo: diretamente com o produtor e compras coletivas. Tem muita gente procurando e esse vínculo que inclusive tem essa relação, será que o produtor está vendendo produto orgânico? Amanhã terá um evento de visita ao produtor Antônio Dias, que tem uma produção excepcional, e temos outro grande produtor que é o Massami Yoshizumi. São os nossos melhores produtores orgânicos, a produção deles é excepcional. O consumidor orgânico também tem que ver como são feitos os produtos orgânicos e tirar as dúvidas. E o cultivo orgânico é muito legal de ser aprendido, porém as compras coletivas são números que estão dentro das estatísticas anteriores de 9 dos 10 clientes. Sempre tem um cliente daqueles 9 que perguntam se fornecemos cestas orgânicas por delivery. É claro, se tiver demanda nós fornecemos ou não. Tem uma nova tendência que são aquelas caixas surpresas, não sei se vocês estão a par, onde fazem caixas com cujo conteúdo ninguém sabe. Você faz assinatura como se fosse Netflix de verdura, e chega uma caixa de verdura com alface, tomate e 117


8º Bunkyo Rural

outros produtos que são diferenciados. E cria uma experiência, porque você não sabe o que vai vir naquele mês. E a popularização do orgânico, durante o dia todo basicamente foi falado, cada vez mais a gente quer uma alimentação saudável e vai procurar orgânico, é inevitável. Esse é um cenário em que duas grandes redes varejistas fizeram ações absurdas em volumes de orgânicos. O que até então não era assim no mercado, hoje tem aqueles números que eu falei, mas antigamente era restrito, o orgânico até então era elitista. A gente está conseguindo quebrar esse tabu, hoje o mercado busca ter uma banca cheia de produtos orgânicos com preços acessíveis porque sabe que o consumidor precisa de produtos assim. Isso é muito interessante, é a mais pura realidade e vem acontecendo nos últimos anos, por isso a Caisp precisa procurar produtos em Minas Gerais, no Sul e no Distrito Federal, porque a demanda está começando se tornar absurda. Antigamente era isso que a Caisp fazia, era um volume simbólico e não esse conceito de relação com o produtor. Hoje em dia estamos fazendo bancas cada vez maiores. Além disso, a Caisp faz ações de degustação, com suco Detox, que é outra procura legal, então ela degusta e de brinde já 118


8º Bunkyo Rural

compra, porque ela compra a couve e faz o suco. E diante de todo trabalho que a gente faz com logística e distribuição, atendimento e inclusive compra de produtos orgânicos, a Caisp já recebeu três prêmios de grandes clientes do varejo, o mais recente de 2015 que a gente recebeu do grupo Pão de Açúcar. Na categoria de folheados e processados a gente ficou em primeiro lugar, e foi uma satisfação enorme para nós ver que o trabalho suado está dando resultado. Estou deixando meu contato, para quem quiser tirar alguma informação da palestra ou receber a apresentação fiquem à vontade para entrar em contato. Vou estar no evento hoje e amanhã, então quem quiser visitar o estande e conhecer melhor nossos produtos fique a vontade, muito obrigado. NEWTON JOSÉ DINIZ pcp@caisp.com.br +55 15 97403-4435

119


8ยบ Bunkyo Rural

120


8º Bunkyo Rural

INSTITUTO CHÃO

Palestrante: Fábio Mendes Um dos fundadores do Instituto Chão Boa tarde. Gostaria de agradecer a oportunidade de apresentar um pouco do que a gente faz, sem imagens e só com a voz mesmo. Eu acho que o CHÃO surgiu da vontade de buscar novas formas de organização. A gente sempre se apresenta como forma de experimentação, experimentar novas formas de se relacionar economicamente, socialmente. O meio encontrado foi criar uma associação sem fins lucrativos, e fazer parceria com diversos produtores orgânicos, especialmente associações lucrativas de pequenos produtores, produtores familiar e assentamentos. Sempre procuramos parcerias que trabalhem da mesma forma que a gente, ou que tenham uma visão parecida de buscar uma cooperação e uma estrutura autogestionária mais horizontal voltada para a economia solidária, que retira o capital como sujeito da economia e coloca as pessoas. Acho que é essa inversão que precisamos buscar, não adianta falar de sustentabilidade ligando a baixo carbono porque é muito mais do que isso. É social, econômica, distribuição de renda, não dá para achar que plantar sem agrotóxico, em um país que 1% das pessoas tem 40% da renda, é sustentável. O que buscamos foi construir esse espaço onde todo mundo pode colaborar e tudo é transparente, acho que dando essa linha ideológica dá para apresentar o nosso trabalho. É um espaço de 200 metros quadrados na Vila Madalena, que abrimos faz 121


8º Bunkyo Rural

dois anos, com financiamento coletivo de R$ 40 mil. A nossa proposta era se juntar e comprar o primeiro estoque com as pessoas que têm interesse, que elas viriam aqui comprar o que têm interesse e financiar esse espaço coletivamente. Compramos e vendemos todos os produtos pelo mesmo preço e expomos os custos mensais em uma lousa em cima do caixa e realizamos uma projeção de vendas. Então, a simples proporção de previsão de vendas no mês com os custos mensais dá um parâmetro para as pessoas de quanto custaria manter a compra de cada um. Hoje temos aproximadamente R$ 180 mil de custo e R$ 600 mil de previsão de vendas mensal. Então se a pessoa compra com R$ 100 e contribui com mais R$ 30, ela já mantêm os custos referentes a compra dela. Isso é uma doação para associação sendo uma opção do cliente, além de ser uma redistribuição de renda. Quem puder deixar mais ajuda a contribuir com pessoas que não podem doar tanto, para aumentar produção e incentivar a reforma agrária e os pequenos produtores. Acho que precisamos focar nesse mercado dos orgânicos e em algo que saia desse nosso sistema capitalista e explorador, que é a mesma lógica do sistema convencional. Não desse sistema que estamos visando como diferente da lógica que a gente sempre utilizou. Então, acho que se a gente inserir essa produção dentro do mesmo sistema, o destino é ter os mesmos objetivos que é sempre o acúmulo de lucro e isso independe do meio. En122


8º Bunkyo Rural

tão, o principal ponto que precisamos tocar nessa nova forma é a centralização da terra. Acho que o novo rural precisa ter as terras redistribuídas dentro do Brasil com financiamento, planos de manejo. Acho que precisamos transformar a forma de agir como se fosse uma política nacional mesmo, e não englobando o sistema de agroflorestal e a produção orgânica dentro do sistema convencional. Das grandes redes onde os produtores são achacados, onde tem desconto financeiro, você sofre com perdas, tem que bancar a loja, e não focar no que a gente realmente precisa, que é o desenvolvimento tecnológico, o aumento e a redistribuição dessa produção. Foi a partir daí que fomos desenvolvendo nosso trabalho e montando nosso espaço. Eu até fiquei impressionado em números comparativos. Começamos com R$ 40 mil e hoje giramos em torno de R$ 9 milhões por mês, se contar a receita com a contribuição para manter o espaço funcionando, com uma equipe de 12 pessoas trabalhando, onde ninguém é explorado. Decidimos tudo em assembleias semanalmente. Todo mundo fazendo planejamento estratégico e tirando tomates podres das caixas, e a gente consegue estabelecer uma outra forma de convívio e trabalho. Qualquer pessoa que entrar na equipe vai ter o mesmo poder decisório, não tem hierarquia. E acho que essa parceria com os produtores, a gente se responsabiliza pelo que pede, devolvemos o que não foi vendido para ele fazer compostagem. A não ser que venha um produto muito ruim, a responsabilidade é de quem pediu. A rastreabilidade que o Marcelo vem batendo, acho que ainda é precária para nós, mas sempre escrevemos quem é o produtor. Temos o certificado de todos expostos, com o preço que ele pôs para vender e que vai ser repassado ao nosso cliente. Nossos custos, ou seja, o que precisamos para viver que seria nosso salário, também está exposto, e com isso deixamos claro para quem chega naquele espaço, o que precisa para funcionar e o que está justo para o produtor receber. Acho que é uma nova maneira de conviver. Toda essa cadeia é nosso objetivo e o que estamos conseguindo desenvolver. Hoje, nós funcionamos de segunda a sexta-feira das 8:30 até 13:30. Muita gente vem falar da proporção de custo, manter 30% de custo do que o produtor precisa para ele viver. Eu fico imaginando se uma grande rede funcionasse dentro destes moldes, provavelmente de domingo a domingo, apenas 5% do que eles faturariam já pagaria todos os custos, se não fosse 123


8º Bunkyo Rural

toda essa visão de exploração e acúmulo de capital, então acredito que seja uma transformação da cadeia de produção e comercialização dos produtos.

Palestrante: Marco Magri Associado ao Instituto Chão Meu nome é Marco, sou associado ao instituto também. Vou falar um pouco apenas para finalizar e passarmos a parte de perguntas e interação com o público. Foi falado na primeira parte sobre a prorrogação da nossa juventude e os novos desafios. O que mostramos na experiência do Instituto Chão é como incentivamos os produtores, que são os que temos mais contato. É ajudar a superar os desafios dos produtos orgânicos para o futuro. Como o Fabio falou, temos hoje um faturamento muito acima do esperado para um grupo de 12 pessoas, mas isso só é possível vendendo os produtos a preço de custo. As pessoas que vão lá procuram e encontram produtos orgânicos a um preço acessível e talvez seja esse o maior desafio para o futuro desse mercado, não restringir o produto por causa do preço. E o que estamos tentando apresentar aqui é que boa parte do custo da produção da folha, da planta, não fica com o produtor, mas alguém que fica no meio do caminho entre o produtor e o consumidor. A nossa experiência tem mostrado que, ao diminuir a quantidade de atravessadores, todos saem ganhando. Isso tem se mostrando essencial para aumentar a chance de comercializar tudo que foi produzido.

124


8º Bunkyo Rural

COOPERATIVISMO PARA PEQUENOS PRODUTORES Palestrante: Diógenes Kassaoka Diretor Geral do Instituto de Cooperativismo e Associativismo, Codeagro / SAA Boa tarde a todos. Eu costumo falar que sou um palestrante atípico porque não consigo falar sentado, e sendo o último palestrante da tarde vou aproveitar para falar em pé. Antes de mais nada a gente sempre agradece ao nosso secretário Arnaldo Jardim, deputado federal, que tem dado muito engajamento e força para a Secretaria da Agricultura. E eu preciso agradecer ao nosso coordenador José Valverde, que tem atuado firme para estarmos com esse trabalho. Naquele dia que estávamos na Secretaria, eu e o Nelson (Kamitsuji, da Comissão Bunkyo Rural), ficamos duas horas conversando. Então, hoje eu só vou ficar até as 21:30, tudo bem? Aí todos ficam confortáveis e voltam para casa feliz. Brincadeira, irei seguir meu horário, mas sempre preciso agradecer ao pessoal do Bunkyo pelo convite para podermos conversar hoje. O trabalho do Instituto de Cooperativismo e Associativismo é viajar o Estado todo, organizando os produtores em cooperativas e associações. Hoje vou fazer uma palestra bem breve com um objetivo simples, que é tentar solucionar duas questões: por que se organizar e por que é tão difícil se organizar? Eu poderia ficar conversando sobre os princípios do cooperativismo, adesão livre, a questão da união e solidariedade, mas infelizmente eu não tenho tempo e não vou fazer isso. Vou mostrar alguns dados do porque se organizar e tirando algumas dúvidas.

125


8º Bunkyo Rural

Região Metropolitana de São Paulo Em relação a outras cidades do Estado

Cidade de São Paulo Em relação a outras cidades da Região Metropolitana de São Paulo

126

Estávamos na Secretaria vendo nossos sistemas de informação e conversamos muito. Passou a época do chute, no Estado estamos acostumados a conversar com pessoas que chutam. Evitem chutar. Eu gosto de olhar e falar de coisas reais e quando a gente fala para o produtor o porquê que precisa se organizar é por uma questão muito simples. Dêem uma olhada nesse mapa. Representa a distribuição demográfica do Estado de São Paulo. Se eu fosse analisar isso para vocês, 50% da população está na região metropolitana de São Paulo. São Paulo tem 44 milhões de pessoas e metade mora na Grande São Paulo. Vou dividir mais uma vez: se eu olhar a região


8º Bunkyo Rural

metropolitana de São Paulo, desses 32 municípios, 56% das pessoas moram na cidade de São Paulo. São 11 milhões de pessoas em uma única cidade. A gente costuma falar que se fosse a representação verdadeira, essa mancha azul não existiria, porque 22 milhões em São Paulo estoura a curva geográfica. O segundo município de São Paulo com a maior população é Guarulhos com 1 milhão, enquanto São Paulo tem 11 milhões. Para fazer a proporção, São Roque tem 88 mil pessoas, isso causa algumas questões muito particulares no nosso Estado. Não ia falar disso, mas eu puxei alguns dados no CEASA (CEAGESP), de São Paulo. Eles comercializam 3,3 trilhões de quilos de mercadoria, o segundo CEASA que mais vende fica em Minas Gerais, vendendo metade, e o terceiro colocado fica no Rio de Janeiro, se somar o segundo e o terceiro colocado ainda não chega ao volume do CEASA de São Paulo. Por que estou falando de população para falar da organização rural? Teve um dado estatístico que falava quais os municípios que vendiam mais para os outros CEASAs. Está pequena a letra, mas eu conheço de cor isso. Esse é um mapa com os municípios que mais vendem laranja para outros CEASAs, Belo Horizonte e São Paulo. Quantos pés de laranja existem na cidade de São Paulo? Esse é um produto que veio do interior de São Paulo, ganhou nota

127


8º Bunkyo Rural

fiscal e foi para Belo Horizonte. Mas isso só acontece com Belo Horizonte? Isso acontece com CEASA Rio de Janeiro também. São Paulo é o município que mais fornece sem ter um pé sequer. Por uma questão bem simples, desde o início da manhã o Chico Graziano vem nos desafiando a entender as novas formas e as formas tradicionais de comercialização que vocês estavam falando. O produtor não se organiza, você tem atacadistas e players que fazem o trabalho logístico, o atravessador só existe dentro da CEAGESP, que é aquele cara que vende sem oferecer o serviço. Quem oferece serviço é atacadista ou varejista ou tem seu papel na cadeia. Então como a gente fala, todas as estradas vão para São Paulo, porque a população está aqui, então muitas vezes o produtor não se organiza. Eu estava em Adamantina esses dias onde eles produzem tomate rasteiro, organizam em lote no caminhão e desce a Castelo Branco em direção a São Paulo. A gente tem alertado os produtores de que esse é um motivo muito básico, não sabem o porquê de se organizar, não fazem pesquisas da região porque no momento não interessa. Tirando a questão de que existe concentração em nosso Estado, existe uma questão fora da logística que também afeta o produtor e traz vantagem competitiva, afeta o bolso do produtor. E essa vantagem competitiva, o poder de barganha dos fornecedores e dos clientes. Por que estou falando disso? O preço do adubo e da semente variam de acordo com quem vende, o que os produtores não sabem é que ficam apoiados na concorrência com vizinhos, e isso é bobagem, porque o vizinho passa pelas mesmas condições que você. Acha que ele é o principal concorrente, e não percebe que os fornecedores do Sul e de outros clientes estão concentrados, isso pode ser no orgânico ou em qualquer outro setor, as atividades vão se concentrando. Toda vez que você tiver algum tipo de insumo ele se concentra. Toda vez que você tiver uma gama de clientes, eles se concentram, os supermerca128


8º Bunkyo Rural

dos não têm se concentrado? É fácil negociar com supermercado? Isso foi um bom exemplo, negociar com supermercado. Agora imagina cada ano os produtores deles negociando com os supermercados, sozinhos, com o Pão de Açúcar. Tem que pagar caixa que desmonta, pagar higienização da caixa e funcionários. Se você não tem uma estrutura igual a uma cooperativa ou associação para intermediar esse trabalho, você simplesmente fica rendido. Vou dar um exemplo para vocês. Os produtores de flor, violeta africana, lá de Atibaia ficavam apertados e toda vez que tinha inauguração de supermercado, esse pedia um presente. Como o produtor não ganha nada por potinho, como vai mandar uma caixa de violeta de graça para o supermercado? Quantos supermercados fazem aniversário por dia? Então os produtores começaram a se concentrar na cooperativa de Holambra e de lá negocia com eles. Porque um a um, o pequeno produtor, o grande e o médio, todo mundo está nesse sistema. Das pessoas que estão antes da porteira, que são quem fornece insumo, fábrica de sementes e defensivos, independente do tipo de cultivo, e quem está depois da porteira, que são os clientes. Graças a Deus tem existido novas formas de comercialização, de venda 129


8º Bunkyo Rural

direta, mas a única forma que o produtor encontra de poder competir igualmente e ganhar escala é através de uma cooperativa ou associação. Isso me joga na segunda pergunta direta: por que é tão difícil se organizar? Porque dá muito trabalho, é muito fácil falar de união e solidariedade usando um lápis de exemplo, porque o lápis é tudo do mesmo tamanho e medida. São iguais. As pessoas são todas iguais? As pessoas têm diferentes vontades e formas de compreender as coisas e por isso a união de pessoas é tão difícil. Eu insisto que a gente tende a achar que é normal, não existe um conceito de normal, para uma tribo ficar sem roupa é normal, vendo o branco da África do Sul que anda de roupa nesse calor não é normal para eles. E esse cara da África do Sul, provavelmente de descendência inglesa, deve achar: "esse cara é um aborígene, um selvagem, não usa roupas", mas existe o conceito de normal? Se a gente sentasse para conversar, cada homem tem a sua forma de ver as coisas, então como vamos conseguir trabalhar de forma coletiva? A solução é simples e muito conhecida: ouvir, mediar. Vou dar um conselho que aprendi com meu "ditchan" (avô), porque apesar de não parecer, eu sou "sansei" meu avô é japonês, ele dizia uma coisa muito simples: "você fala baixo". E por que fala baixo? Se a gente estiver discutindo e eu falar mais alto, você vai falar mais alto também, e eu vou tentar falar mais alto e levantar, e a gente vai acabar brigando. Falar alto é o primeiro passo de quem não sabe ouvir, não adianta nada discutir. Quem aqui é casado, levanta a mão. O casamento é mesma coisa. Quantas vezes você está brigando com sua mulher e nem está mais ouvindo o que ela está falando. Você já está pensando o que vai responder e não no que ela está falando. Para resolver algo de alto atrito de imediato você precisa ouvir a pessoa e entendê-la. Às vezes eu falo assim: "Senhor Luiz, vamos até lá embaixo no meu carro? ", se me responde não , já penso que ele é preguiçoso. Mas se o sapato dele está apertado, se ele está com problema no joelho e não pode descer? Então, melhor do que julgar, não é conversar, ouvir e mediar? E quando você faz isso, você cumpre uma coisa muito básica que é respeitar a outra pessoa e a limitação dele, saber entender a situação que a pessoa está vivendo. Nosso trabalho nas cooperativas e associações vai um pouco além. Dá trabalho, porque você tem que explicar que o grupo vai trabalhar em autogestão, e assumir as responsabilidades é muito difícil. Por que é difícil trabalhar em cooperativa? Por causa da diversidade, e quem manda na cooperativa? O cooperado, mas ele faz isso apenas na assembleia geral. 130


8º Bunkyo Rural

Cooperativa boa só tem duas coisas: uma regra muito clara e execução impecável. Vou dar um exemplo lá de casa que minha mãe fazia comigo: "Diógenes, não deixa sapato jogado ou vai levar cintada". No dia seguinte, deixou o sapato jogado, vai guardar o sapato e volta para levar cintada. No dia seguinte tem sapato no chão de novo, regra simples e execução feita. Até hoje eu tenho medo de deixar sapato jogado. Então a gente brinca dessa postura do cooperado, cumprir as regras determinadas na assembleia no outro dia é complicado. Ele decide hoje que a taxa administrativa da cooperativa vai ser de R$10 e amanhã ele não quer pagar. Foi decidido que as caixas usadas seriam azuis. No dia seguinte ele pede para aliviar porque todas as caixas dele são pretas. Então é esse nível de responsabilidade, tomar decisão em assembleia e cumprir quando você é cooperado. É o que fazem as cooperativas fracassarem ao longo do tempo. E aí a gente coloca muito peso no presidente da cooperativa, porque é ele que faz o ponto de flexão. Ele ouviu as demandas dos clientes, criou a regra e deve executá-la. Na hora da assembleia ele é subordinado de todo mundo, mas no dia seguinte é ele quem coordena e isso nunca é fácil. Então a dica que eu deixo para vocês trabalharem com associação, coope-

131


8º Bunkyo Rural

rativa ou qualquer outro tipo de relacionamento, é tentar se basear no respeito. Você acha que eu decorei, foi o estagiário que escreveu. E porque está escrito oportunidade ali? Pelo seguinte, existem diversas oportunidades quando você trabalha no coletivo, porque você não é mais um produtor só. Hoje, a APPC não precisa mais trabalhar assim, mas surgiu daqui, observando que só com caqui não seria possível sobreviver e era preciso negociar mais variedades. Assim foi buscando soluções e cada dia surgiram novas dificuldades. Eu uso muito a APPC de exemplo. Eles tiveram problemas com documentos fiscais e viraram cooperativa. Ouvi que já estão se preparando para exportar, é isso? Já estão exportando, e antes não conseguiam definir o tamanho da caixa para o carrinho. Eu falo para padronizar o tamanho da caixa e o tamanho do fruto e separar os preços de acordo com os tamanhos, e a vida segue.

132


8º Bunkyo Rural

Então, quando a gente coloca tudo isso para esse produtor, imagina como é judiado carregar essa sacola de laranja. Essa pessoa só terá uma forma de sobreviver e se manter na atividade de forma lucrativa, que é de trabalhar de forma conjunta e organizada. Vou ser criterioso com meu horário, vou falar sobre o monitoramento das contas da agricultura familiar. Temos um sistema em que todas as contas são monitoradas, e disponibiliza esse mapa interativo. Quando começamos a trabalhar com contas públicas, diziam que a prefeitura é toda enrolada, o edital ficava escondido e era todo trambique. Então trabalhamos muito nesse sistema de contas para agricultura familiar por um motivo muito simples. Essas contas representam esse orçamento para as prefeituras do Estado de São Paulo: R$ 213 milhões. Só a secretaria de educação do Estado tem R$ 45 milhões para acoplar no pequeno agricultor mais o que tem de vendas. Então por essa relevância a gente monitora as contas. Eu separei quantas contas a gente viu na região de Sorocaba. Nós encontramos 67 hectares que disponibilizaram R$ 14 milhões de contas da agricultura familiar, só na região de Sorocaba. No estado todo foram 607 hectares que representaram R$ 51 milhões. Vocês têm ideia do que é esse dinheiro? Eu trabalhei no programa Viva Leite, onde a gente gastava R$ 140 milhões por ano. E é um benefício do agricultor, por 133


8º Bunkyo Rural

isso a secretaria da agricultura tem falado muito, porque nosso objetivo é que o agricultor utilize isso, faça parte dessa política. Nosso sistema também tem uma consolidação estatística. Quem quiser ver e acompanhar pode pegar no site, com preços médios, preços por município, valor e quantidade. Tudo isso para dar mais transparência para o trabalho do agricultor, estamos trabalhando para trazer mais, temos uma parceria com a doutora Anita Gutierrez da CEAGESP, para disponibilizar aos produtores o preço médio dos alimentos. E para realmente finalizar, estamos em um momento realmente difícil no Brasil. Se ligar a TV depois da novela, passa nas notícias um caso de corrupção por dia. Você até perde a noção, é um debate muito grande na ética, e o que é ética? É simples, traz o equilíbrio do que você quer fazer, o que pode e o que deve fazer, porque tem coisas que você quer, mas não pode, como fazer um curso, mas não tem dinheiro, e fica frustrado. Às vezes você quer fazer uma coisa, mas não deve, e você faz e fica arrependido. Então a gente coloca isso. O equilíbrio da ética fica entre o que você quer fazer, pode fazer e o que deve fazer, para chegar ao fim do dia e seguir em frente. A gente coloca nossa secretaria da agricultura a disposição e agradece vocês, muito obrigado.

134


8º Bunkyo Rural

TRANSFORMAÇÕES NA AGRICULTURA MODERNA Palestrante: Décio Zylberstajn USP/Pensa - Centro de Conhecimentos em Agronegócio Tenho que agradecer o convite, para mim é um prazer estar aqui com uma comunidade que respeito e admiro muito, por tudo que trouxe para o Brasil e o que nos ensina. No dia de hoje, eu quero tratar com vocês algumas ideias, acho interessante compartilharmos ideias sobre o que acontece no mundo. O que fazemos nas nossas propriedades agrícolas não é independente daquilo que acontece no mundo, as grandes tendências. Então quero falar sobre as grandes tendências e o que influencia nas atividades, portanto vou falar rapidamente de seis pontos. Primeiro, quero olhar um pouco para trás para algumas ideias iluminadoras, pessoas que antes criaram e hoje usamos essas ideias. Depois quero falar sobre as diferentes agriculturas no mundo e no Brasil. O terceiro ponto que vou tratar são as grandes tendências, em inglês seriam os "Megatrends", e o que as grandes tendências mudam na nossa vida. Depois eu quero falar sobre algumas estratégias para o agro, quero dizer, dentro dessas tendências. O que implica para nós é se a gente quiser olhar o agro do futuro, vamos pensar em um horizonte para 2030. Quero falar de alguns minicasos e exemplos de pessoas que fizeram coisas diferentes e podem inspirar cada um de nós nas nossas atividades. Finalmente, quero concluir e talvez dê tempo de ouvir um pouco vocês. Deixa eu começar pelo primeiro ponto que é olhar para trás, olhar um pouco para as pessoas que pensaram antes que a gente, esse jovem que 135


8º Bunkyo Rural

esta ai já faleceu, era o professor Theodore Schultz. Ele estudava economia, ganhou prêmio Nobel da economia e estudou economia agrícola a vida toda, e trouxe um conhecimento muito importante para a economia, que é a ideia do Capital Humano. Ele escreveu um livro chamado "A Transformação da Agricultura Tradicional". Quando estava na ESALQ eu descobri esse livro, que me inspirou a estudar economia agrícola. Esse livro dizia que, para mudar a agricultura era preciso fazer uma coisa: educação. E foi com isso que ele ganhou o prêmio Nobel. A ideia de que a educação muda o mundo, então essa é uma primeira ideia iniciadora, muito importante hoje quando falamos que temos que inovar, consegue inovar quem tem educação, então essa é a primeira ideia inspiradora. Deixe-me colocar para vocês uma segunda ideia inspiradora.

Esse outro jovem que está ai é um professor de Harvard e está vivo ainda. Ele criou nos anos 60 o estudo do Agrobusiness. Essa palavra não existia no dicionário inglês, foi ele que criou, mas ele criou essa ideia trazendo um ponto muito importante. Ele dizia para o produtor olhar o consumidor lá na ponta, porque o que é feito vai chegar lá. Se não entender o que o consumidor quer você vai ficar no reboque, e ele trouxe alguns números dos anos 60, mostrando que da renda gasta com comida, a maior parte fica no super136


8º Bunkyo Rural

mercado. E isso se mostrou uma verdade. Cada vez mais nas cadeias quem ganha mais é quem está mais perto do consumidor. Então vem a pergunta: como os agricultores podem entender melhor e se aproximar mais do consumidor para pegar parte dessa renda que hoje fica no supermercado e no processamento?

Portanto eu defendo o primeiro ponto: se a gente quer buscar soluções para o futuro as ideias importam, e esses dois nomes que eu falei implantaram algumas ideias que eu acho bom a gente parar para pensar. O que eu quero explorar com vocês ao longo da nossa conversa, primeiro é inovar e segundo, o agricultor deve estar coordenado dentro da cadeia produtiva para que possa capturar algum valor a mais da sua produção. Isso me leva ao segundo ponto, que quero tratar de forma bem breve. É a gente perceber que no mundo existem diversas agriculturas e elas são diferentes. Na mesma região eu posso ter situações diferentes, vamos ver, por exemplo, uma primeira agricultura, que eu chamo de fase 1, que é intensiva no trabalho. Está desconectada do mercado e mal consegue gerar renda para o produtor. Isso caracteriza a agricultura africana e de muitas partes do Brasil, em que a agricultura é desconectada do mercado, essa tende a não sobreviver. O que eu chamo de fase 2 é uma situação que muda, entra tecnologia, a 137


8º Bunkyo Rural

produtividade aumenta e começa a buscar ganho de escala, "mas sou pequeno, não posso ganhar escala". Você pode ganhar escala com sua cooperativa, junto com ação coletiva e então consegue ganhar um pouco mais de valor. Mas essa agricultura da fase 2 caracteriza as commodities e boa parte das tecnologias do pós-guerra, de base química, que estão aí ainda. Essa que eu chamo de fase 2, ela não está olhando muito para o consumidor, e sim para dentro da porteira. O que chamo de fase 3, é uma agricultura que dá um passo adicional, já é mais eficiente e tem mais tecnologia, mas agora começa a se preocupar com qualidade, coordenação, se ela quer produzir alguma coisa para chegar na prateleira do supermercado. Nós temos empresas da área de orgânico, vocês sabem muito bem disso. Para o supermercado colocar o orgânico implica que o produtor deve seguir certas regras, tenho que coordenar isso de forma muito intensa, o orgânico é só um exemplo. A fase 3 então produz ideias de rastreabilidade, introduz a preocupação com o meio ambiente e, daqui vou usar um termo e depois vocês vão entender porque, muita gente acha que as pressões ambientais são limitantes para nós. Na fase 3 o produtor olha as restrições do que não pode fazer no meio ambiente ainda como um fator limitante. Isso vai mudar daqui a pouco. Cada vez mais a regulação pública, ou seja, eu tenho regras e leis que vão pautando aquilo que o produtor pode fazer. Isso que eu chamo de fase 3. Já a fase 4 é uma agricultura que fez tudo que a fase 3 fez, só que deu um passo mais adiante e está cada vez mais olhando o consumidor. Já possui rotulagem, diferenciação de produto e começa uma preocupação. Quero produzir um frango para o consumidor, para que uma família cada vez menor possa comprar a quantidade que deseja. Isso vai afetar a embalagem, ou seja, começa cada vez mais a ideia de diversificação de valor. A temática ambiental, que antes era vista como impedimento, agora o agricultor pode ver como uma oportunidade. Eu faço diferente, respeito o meio ambiente e ponho no rótulo. Algum consumidor vai aceitar pagar por esse atributo que o que eu produzo tem, mas para fazer isso o produtor deve estar conectado com o processador, com o supermercado até fazer essa informação chegar ao consumidor. E a fase 5 é a última que eu coloco. É aquela situação mais avançada que a gente caminha também. Na fase 5 tenho cada vez mais a preocupação com o consumidor individual, preocupado com novos temas que até alguns anos 138


8º Bunkyo Rural

atrás a gente dava risada: compras locais, identidade do produtor. Poucos anos atrás, quando surgiu o código de barras, era uma história fantasiosa onde diziam que seria possível ver a fotografia do produtor que produziu. Hoje, com a tecnologia que temos é brincadeira. O consumidor lá na ponta vê sua foto no código de barras, no telefone se ele quiser. Então essa nova agricultura já está preocupada com o orgânico, paisagem, tipos de uso da terra, ou seja, todos esses tipos de agricultura existem no Estado de São Paulo, no Brasil e no mundo. É uma continuidade, começamos em uma agricultura que não estava nem ligada no mercado para uma agricultura que, cada vez mais, pensa no que o consumidor quer e o que é preciso produzir. E isso me leva ao terceiro ponto. Esse eu gostaria muito de compartilhar com vocês porque na verdade essas são ideias que estão pairando pelo mundo e não tem a ver com o agro. São macrotendências globais, mas vocês vão ver como tem ligação com nossa vida. Eu peguei essas informações de uma revista desenvolvida por um instituto de estudos, e eles levantaram tendências, não especificas, mas a macrotendência global. É isso que eu queria colocar para vocês. Eles colocam cinco tendências, primeiro é a mudança do poder econômico. Nós todos de nossa geração vivemos em um período em que se concentrou todo poder praticamente em um país, que é os Estados Unidos. A Europa fazia um balanceamento e essa era a 139


8º Bunkyo Rural

polarização. No mundo de hoje, nesse momento, isso já mudou e tende a aprofundar essas mudanças. Vou mostrar algumas figuras para vocês. A grande mudança é a Ásia, China, a grande diferença é que o mundo hoje já dialoga com dois grandes blocos, e a China com uma visão bem clara do que deve ser feito. Gostaria de abrir um parêntese. Voltei na semana passada de um encontro na Islândia, um país que não produz nada. Se você puder imaginar, nem deveriam existir pela condição climática, lá no Círculo Polar Ártico. Entretanto, ele tem a décima maior renda do mundo. Liguei a televisão lá e não vi CNN, não tinha NHK, que gosto de assistir, falo isso para meus amigos nipônicos. Tinha canais chineses em inglês e fiquei impressionado porque não parava de falar do Brasil e da América Latina, dizendo que é com eles que temos que ir junto. E isso não chega nem para nós, quer dizer, a Ásia está olhando essa mudança de poder no mundo. A China tem olhado para nós e isso aparece nos investimentos que eles têm feito, nas empresas que tem comprado no Brasil. É importante que percebamos isso, pois vai afetar nossa vida. O segundo ponto, sobre a mudança populacional, vou mostrar um quadro para vocês, mas já antecipo, estou chegando na faixa dos 65.

A grande tendência do número de pessoas com mais de 65 anos aumentar no mundo todo, isso está começando agora e essa curva é ascendente. Isso implica para nós. Qual o tipo de alimento que essa população deseja? Isso 140


8º Bunkyo Rural

vai afetar o produtor agrícola sim, essa população quer e precisa de outras coisas, e isso é uma tendência muito grande. Tecnologia, outro grande fator de mudança, eu trabalhei nos anos 90 com a primeira empresa de biotecnologia no Brasil. Naquela época, falar de biotecnologia era uma grande mudança, e hoje isso já está incorporado, não tem porque levar susto. A nossa questão hoje são as novas tecnologias, principalmente as que cabem no celular e isso muda totalmente a forma de nos relacionarmos com o mercado lá na ponta. A conectividade, a gente ainda não entende o que vai impactar no modo de viver no mundo todo, e meu monitor está pensando em agricultura e eu que quero fazer junto com vocês um pensamento para ver o que isso implica para nós no meio rural. Meio ambiente nem precisa dizer, representa uma variável que já está incorporada e o Brasil não está mal na figura. Já fizemos coisas que, quando conto nos congressos internacionais, a legislação brasileira de reserva legal de 20%, 35% e 80%, o pessoal me pergunta se os agricultores não saíram brigando. Isso não aconteceu, os agricultores estão se adequando. O mundo acha que a gente só destrói, mas não sabem direito que temos uma legislação mais avançada que a europeia e a americana. E que vocês agricultores têm que se adequar e ninguém está julgando vocês. É um fator positivo pela contribuição que estamos dando para nossa Terra, que tem que aguentar uma população crescente e o agricultor tem que receber um diploma por isso, pois está fazendo a coisa certa. E finalmente, esse é muito importante, é a mudança de valores, o jeito que a gente pensa. Vamos ver daqui a pouco três fatores importantes que o Euro monitor destaca, a forma pela qual a população enxerga o alimento e como se comporta está mudando rapidamente, e isso afeta nossa vida até porque somos parte dessa mudança. Sei que não dá para ver direito, mas só vou mencionar para vocês. A parte de baixo (da figura da próxima página) mostra atualmente o valor da produção no mundo. Ele está na mão de poucos países desenvolvidos e essa outra parte mostra os países em desenvolvimento. Olha o que se espera ao longo do tempo. Hoje, a produção nos países em desenvolvimento principalmente no BRICS, nós vamos ter uma parcela muito maior de valor na produção do mundo, está ligado com aquela mudança do poder. Essa outra mostra a proporção de população com mais de 65 anos. Percebam como isso sobe, isso é 2030, e atualmente, essa barra de baixo mostra a presen141


8º Bunkyo Rural

ça da China e aquela o mundo todo. Percebam que a população com mais de 65 que tem exigências muito peculiares vai ter que ser atendida, e também na parte de alimento. Portanto, vocês têm um papel importante aí. Veja por exemplo as assinaturas de telefonia celular atualmente no mundo. Em 2030 teremos em torno de 10 bilhões de habitantes e todo mundo conectado pelo celular. Hoje estamos na parte em que a conexão ainda é pouca e o agricultor brasileiro está ainda mais defasado. Tem regiões no país com conexão muito pobre, se não resolvermos isso rápido ficaremos desconectados do mundo. Esse (gráfico da página seguinte) mostra aquilo de falei de valores, aquilo que as pessoas pensam, e esse primeiro mostra a pesquisa em três anos: 2011, 2015 e 2016. A pergunta era: quem acha que tem que simplificar a vida, pois está muito complexa? A tendência cresceu, as pessoas estão buscando uma vida mais simples, e o simples cada um entende como quiser. Quer disser que se alguém me oferecer soluções, vou aceitar pagar por isso porque quero simplificar minha vida, se eu sou produtor agrícola e alguém me oferece algumas soluções técnicas que eu não preciso me envolver, eu acabo aceitando pagar por isso. Então surgem ideias para algumas estratégias. Vou voltar nisso daqui a pouco. 142


8º Bunkyo Rural

Essa segunda mostra a ideia de novidades, o consumidor quer cada vez mais produto com novidades, embalagem com novidades ou produtos com inovações e isso está sendo valorizado. E finalmente, a última parte é bem interessante. Você estaria disposto a pagar por soluções que otimizem seu tempo? Tem muito a ver com o primeiro. A resposta é sim, nós valorizamos serviços que nos poupe tempo, não quero viver em um mundo tão complexo e sim simplicidade, quero simplificar a vida. Esses pontos do Megatrends são muito importantes. Só fazendo um resumo para passarmos para a última parte. O mundo está muito polarizado, a China tem um papel, surgem novos mercados, a busca por uma vida mais saudável, logística e conectividade. Se meu produto está conectado eu não preciso ficar viajando, a informação viaja e chega direto no consumidor. Essas mudanças encurtam a cadeia produtiva, o crescimento do consumidor de acima de 65 anos, valores éticos cada vez mais aparecendo nas respostas, e finalmente, o consumidor conectado que sabe como o produto que ele consome está sendo produzido. Pois bem, olhamos esses pontos e meu próximo passo e falar as implicações no mundo do agro, que é o que interessa. O modelo que tínhamos, para o agricultor individual e desconectado, é de se repensar. Tenho novos modelos de negócio e novos produtos e serviços, será que alguma empresa 143


8º Bunkyo Rural

faz a parte de colheita? Não estou falando nenhum exagero, meu aluno acabou de fazer a tese no Sul de Minas Gerais sobre o crescimento de empresas que oferecem serviços de colheita de café. Não estou falando da colheita manual e sim da mecanizada, ou seja, surge uma nova forma de empresário rural que também é produtor. Ele tinha equipamento que estava ocioso, e começa a investir oferecendo serviço, simplificando a vida do produtor, pois ele não precisa daquele equipamento estacionado na garagem dele se ele tem o serviço de colheita na hora que ele quer. Isso não é novidade, a Argentina tem isso há muito tempo, para soja e grãos. É um exemplo de empresa que surge oferecendo, não é novidade. Depois, posso explorar isso com vocês. Implicações dessas tendências, a questão de marca e origem. Cada vez mais o consumidor lá na ponta quer ver marca e saber de onde o produto veio, a marca leva muitas informações. Vou mostrar um caso daqui a pouco. Novo perfil do produtor, um produtor empresário, no sentido mais puro do termo, produto inovador que olha sua condição de produção, mas olha também a ponta do mercado, e isso exige um novo perfil de produtor que pode ter uma formação totalmente diferente do produtor tradicional. Reconstrução dos canais. Alguém vendia o produto em uma região no Sul de Minas Gerais. Eu e minha esposa cansamos de ver o caminhão do processador vir buscar as batatas, isso é coisa do passado, você tem novas formas de fazer esse produto escoar. Se alguém oferecer um serviço desnecessário na

144


8º Bunkyo Rural

cadeia vou acabar não aceitando, quero um serviço que simplifique. A conectividade me leva a reconstruir canais. E à mudança dos processos produtivos. Isso vocês fazem no dia a dia em suas propriedades, porque tem que seguir a legislação que cada vez mais limita coisas que podemos ou não fazer. Mas também porque vocês podem estar conectados a novas redes de produção e novos modelos de negócio. Por exemplo, que exija para que você entre na rede, seu produto precisa ser levado para a Ásia e não pode usar determinados insumos. É legal e pode ser usado aqui, mas caso você queira que seja vendido lá você não pode usar. Esses são exemplos de novos modelos de negócio que afetam os processos produtivos. Isso me leva para o penúltimo ponto da nossa conversa e depois vamos para as conclusões. Que estratégias essas grandes mudanças no mundo fazem a gente pensar no mundo do agro? Existem muitas, escolhi alguns por causa do tempo limitado, que são: o primeiro é a chamada agricultura de contratos. A FAO, órgão de agricultura das nações unidas, criou um grupo de trabalho de agricultura de contratos e que foi dirigido por quase 10 anos por um colega nosso, que voltou para o Brasil ano passado. Nós vamos lançar no Brasil um livro de agricultura de contratos traduzido para português no ano que vem. A ideia é a coordenação do produtor com o processador, distribuidor, consumidor, mas fazer isso só via mercado não dá. É preciso ter um relacionamento que se transforme em algumas regras, até se formar um contrato, muitas vezes não formal, entre as partes. A agricultura de contrato cresce no mundo. Gostaria de fazer um comentário: o pessoal da FAO olha muito a parte de agricultura de contrato, do agricultor para frente e estão trabalhando muito no tipo 1, tipo de agricultura da África. Querem mudar e implantar algum contrato para aquele produtor que não tem renda nenhuma, e eu apoio essa ideia de contrato para frente. Vou mostrar um caso de um produtor de café lá de Minas Gerais, que tem contrato com a indústria na Itália. Ele é um pequeno produtor de Minas Gerais. Mas acho que o contrato vai além, também olho o contrato para trás. O produtor quer contratar serviços como de colheita, de plantio, assistência técnica, ou seja, posso ter esse relacionamento que torna a propriedade mais simplificada. Vou dar um exemplo: produtores de leite de várias regiões do mundo e no Brasil, pararam de produzir o volumoso (feno ou capim picado) porque no bairro tem uma empresa que está produzindo volumoso e se especializou nisso, e começou a vender para produtores de leite que usam para alimentar as vacas. 145


8º Bunkyo Rural

Mais um passo adiante dessa agricultura de contrato, vou dar esse exemplo do leite que começou na Nova Zelândia, mas já chegou ao Brasil. No Nordeste, o produtor de leite, além de não ter o volumoso também não tem a vaca, mas como assim ele produz e não tem vaca? Na verdade, ele tem a vaca, mas é do processador. Tem um processador que tem marca de leite, aqui em São Paulo. A genética dele, quando a produtividade dele cair ele troca, igual se faz com carro, o animal não é mais do produtor. Aliás, isso não é novidade para muitos de vocês, tem gente de Bastos aqui? Pessoal do frango conhece bem as integradoras, com o ovo. O animal não é dele, mas está no contrato, ele me cede o pintinho e devolve o frango para abater, ou seja, não é novidade. Só que convivemos tanto que já acostumamos, mas a questão é que está chegando à pecuária leiteira, que a vaca não é do produtor, o rebanho é da integradora. Muito interessante isso da agricultura de contratos. Novos papéis da agricultura: vou mostrar um caso que tenho verdadeira admiração, pois atuei na organização desse caso que acontece na Holanda, mas basicamente a ideia é que a agricultura, além de produzir alimento e energia, começa a produzir outras coisas também para a sociedade, e recebe por isso. Vamos ver exemplos disso. O tema da conectividade rural, é outro tema que acho fundamental pensarmos para montar nossa estratégia. Deixa eu fazer um paralelo: tem um professor da USP chamado Milton Santos, que foi um dos poucos professores negros que a USP teve e foi um grande geógrafo. Ele dizia que as cidades eram maravilhosas, porque pelas cidades as pessoas se encontravam e surgiam oportunidades de troca, de trabalho, ideias novas que aparecem da conexão das ideias das pessoas quando se encontravam. E ele falava da vantagem da cidade. Ele já não está mais vivo para ver o mundo hoje, com a conectividade você pode ter conexão com seus parceiros e clientes onde quer que estejam no mundo. Antigamente, para tradução de artigos, quem fazia para mim era uma pessoa aqui do Brasil. Hoje quem faz isso é um cara do Canadá, que não conheço e provavelmente nunca irei conhecer. É simples, eu mando o e-mail para ele, me devolve corrigido e eu faço o depósito para ele. Simples assim. Ou seja, a conectividade ampliou o mercado, isso acontece no dia a dia e nas propriedades também. E finalmente um tema que bate em toda agricultura mundial, que é a questão da sucessão. Difícil, por vezes evitado de se tratar e que torna uma 146


8º Bunkyo Rural

discussão difícil. Vocês têm na comunidade especialistas na área. Um deles é meu ex-aluno Fábio Mizumoto, um dos grandes especialistas no Brasil, no tema de sucessão familiar. Deve-se ter os olhos voltados, porque você pode depreciar patrimônios se não se planejar bem essa questão de transição entre gerações. E somando uma coisa com a outra, com o aumento da longevidade das pessoas nas propriedades que são administradas pela família, você vai ter mais gerações juntas. Então são questões que merecem um olhar. Vou falar de forma muito breve alguns pontos a mais, essa ideia da agricultura de contratos. Eu fui ao congresso de Agrobusiness esse ano em Miami. Eles estão chamando de "Uberização" do agro, porque uma das maiores empresas que é o Uber não tem carro. Eu dei o exemplo de uma empresa de leite que não tem vaca. Então eu sou produtor que quero colher, mas de repente não preciso ter a colheitadeira. Pode ser de outra empresa que vai me oferecer o serviço. Então essa ideia abre uma serie de possiblidades, tanto para frente para comercialização como para serviços para o agro. Conheci a empresa de um brasileiro que mora nos Estados Unidos. Formado pela Politécnica/USP, faz um tempo que montou uma empresa de custo agrícola e ele oferece contrato para os produtores. Ele analisa a estrutura e caso consiga diminuir 5% do custo, ele pega 1% para si. Ele tem vivido com essa empresa há bastante tempo, ou seja, é um contrato onde a pessoa olha de cima, reorganiza a empresa e fica com a caixa de sucesso. Um exemplo de negócio apenas, e isso gera muitas oportunidades no meio rural. Ou seja, a agricultura de contratos, ainda discutida pelo Ministério da Agricultura é uma realidade. Por que a empresa pode subcontratar, mas o agricultor não? Tem que poder também, e ter modelos mais eficientes dentro do regulamento normal, com o agricultor podendo aliviar financeiramente o modelo de capital investido. É muito melhor ter capital de giro do que capital fixo. Banco sabe fazer isso, não tem capital fixo, mas muito capital rodando. Nós na agricultura somos o contrário, alocamos por um período muito grande, tem o valor da terra e nosso giro é baixíssimo. Se for cultura anual gira uma vez por ano, é o pior do mundo, por isso precisamos tentar melhorar o denominador e aumentar os investimentos. Conectividade: j á falei dos serviços on-line. O produtor pode se integrar a uma rede de produção, é uma parte de uma rede maior, as cooperativas sempre fizeram isso. Nós fizemos o case da Cotia (cooperativa). Foi o único 147


8º Bunkyo Rural

estudo de caso que eu conheço sobre uma empresa que já não existe, e tivemos a grande colaboração da liderança da comunidade para conseguir fazer isso. As cooperativas podem representar uma rede, nem sempre percebem isso, mas o produtor integrado na rede, o produto dele chega à ponta. Sabe quem faz isso muito bem? Aquele produtor de vinho na França, que tomamos aqui. Ele está dentro da rede que é coordenada e é um fornecedor que tem uma meta de qualidade e caso não atinja não entrega o produto. Mas se conseguir se organizar, está coordenado com a indústria e o produto dele chega na nossa mesa aqui no Brasil ou em qualquer lugar do mundo. Marca, certificação, tecnologia e acesso ao mercado são resultados que a conectividade nos permite, e isso pode complicar o que eu acabei de falar que, eu como produtor tenho que me adequar tecnologicamente para poder participar dessa rede. Vou dar um exemplo de uma empresa de café da Itália, onde produtores brasileiros atuam na forma contratual, mas para atuar eles devem atingir uma excelência para produzir o café de alta qualidade, e o que acontece? Cada fornecedor da empresa não fornece mais do que 10% da sua produção, porque não consegue atingir aquele nível. Só que os outros 90% ele consegue vender por um preço muito melhor porque ele é fornecedor daquela empresa e o mercado sabe que ele é bom. Com a Nestlé acontecem coisas parecidas, é um efeito indireto de se participar de uma rede. Sucessão, já toquei no assunto, mas só relembrando alguns pontos, difícil separar a empresa do empresário. Eu posso ser filho, portanto posso ser herdeiro, mas não gosto de agricultura, então vou fazer outra coisa, não estou falando nada de novo para vocês. Como lidamos com essa situação que mostra que tem uma grande massa de jovens que não querem ficar na 148


8º Bunkyo Rural

atividade, portanto, são herdeiros, mas não atuam na empresa. O outro filho ou filha que ficou na empresa, como eu resolvo essa questão? Essas são questões que temos que pensar. O filho pode ser herdeiro, mas não é gestor. Esses direitos têm que ser acordados primeiro e serem abertos e conversados. É difícil lidar com a dinâmica familiar, sabemos que é complicado, entretanto é necessário, e não tem como não bater na questão da pessoa física e pessoa jurídica. A empresa que, no Brasil, por várias razões envolve questões tributárias, o agricultor prefere ser pessoa física, mas não consegue resolver coisas que conseguiria como pessoa jurídica, como a questão sucessória. E agora só vou contar uma história e terminamos, porque quero ouvir vocês. Deixa eu colocar alguns minicasos, que vão envolver todos esses conceitos que falamos. Primeiro, novos modelos de negócio, a agricultura de contrato, o exemplo que eu já dei, o agricultor que consegue entrar naquela rede e a indústria quer fazer contrato. Nem sempre o agricultor quer, mas a indústria quer, então ele trava o preço e tem menor flutuação de preço, mas não aparece só preço no contrato, tem outros aspectos também. Vocês tiveram nesse evento no ano passado, pelo que vi no material, o querido Roberto Rodrigues, não foi? O Roberto, não sei se ainda está com atividades no ramo de laranja, ele vivia querendo um contrato com a indústria de laranja, mas a indústria não queria. Ele queria um contrato de longo prazo, porque enxergava a importância de eliminar flutuações de preço, mas o exemplo onde foi travado o preço e com assistência técnica, é um belo exemplo onde ele teve atuação direta. O produtor Adolfo Ferreira, de Minas Gerais, produz cafés especiais em montanha, que é uma questão difícil. Sul de Minas Gerais é todo montanhoso, tem que competir com o café do cerrado mineiro que é colhido por máquinas, enquanto ele tem que colher na mão. Mas ele era dentista com excelente formação e deixou a atividade. Olha a questão do capital humano não apenas no agro, 149


8º Bunkyo Rural

mas em toda área, e ele se torna um indivíduo que é capaz de produzir cafés especiais e vende sob contrato. E tem um detalhe interessante. Muitos de vocês aqui conhecem o café lá em Tóquio, que é o Café Paulista. O Adolfo produz um micro lote, lembram das tendências, da pessoa conseguir fazer coisas voltadas para o consumidor? Ele consegue fazer micro lote para o Café Paulista em Tóquio. Sabe qual o maior orgulho que ele mostra quando visitam a propriedade dele? A foto dele está no saco vendido lá em Tóquio. Percebam quantas das tendências que eu falei que aparecem aí. Pergunta se o Adolfo está preocupado com flutuação de preço. Ele prepara o micro lote que o cliente quiser em sua propriedade, e detalhe, como o micro lote demanda embalagens menores, e hoje as commodities de café usam "bags", como ele vai fazer o micro lote? Então ele foi à Klabin, em busca de embalagem, papel e celulose, e desenvolveu junto à Klabin embalagens para micro lote. Agora todos os produtores do Sul de Minas Gerais que querem isso podem comprar. Isso é inovação, educação, percepção do consumidor e pró-atividade. Não dá para ver muito bem nessa foto, mas aqui sou eu, nosso colega e um consultor, e um colega que produz assistência técnica, sabe tudo de tecnologia de café (foto acima). 150


8º Bunkyo Rural

O segundo exemplo foi no Estado de São Paulo. Também tive envolvimento, uma indústria de celulose, que pelo interesse social, prefere contratar pequenos produtores para plantar pinus, do que pagar por vinte mil hectares em São Paulo, onde a terra á muito cara. Ela prefere fazer contrato de longo prazo com esses pequenos produtores. Ela foi visitar vários produtores da região e inclusive em assentamentos rurais, onde muitos foram contra a ideia de fazer contrato com indústria. Aqueles que fizeram, hoje estão bem, pois além de vender a madeira, também aumentaram a renda com resinagem, e que antes não ganhavam nada com isso. Então eles introduziram uma atividade em propriedades pequenas no Sul do Estado de São Paulo, e houve aumento substancial da renda via contrato com indústria. Quero encerrar com esse exemplo que é muito importante. Eu atuei via universidade com a Holanda em um convênio de cooperação por mais de uma década. Fui membro de um conselho de um programa, e o que eles perceberam? A agricultura ao redor de Amsterdã estava perdendo as terras. Elas estavam começando a se misturar com área urbana. Deixando de ser só agricultura, o valor da terra ficava alto e os agricultores estavam com problemas de renda. Por iniciativa de uma agricultora, que era enfermeira na sua origem, eles tiveram uma ideia. Estou dando esse exemplo para ver outras atividades do agro, atividades geradoras de renda que ninguém tinha pensado. Ela sabia quanto custava um paciente em uma fase pós-operatória. É muito caro e é melhor ele ficar fora do hospital, então ela começou a organizar a propriedade dela que ficava na periferia de Amsterdã para receber pacientes. A coisa cresceu e virou cooperativa. Quando visitei tinha mais de mil membros, e teve ajuda do seguro de saúde, hospital e agricultor, gerando uma atividade inovadora. Fiquei encantado com 151


8º Bunkyo Rural

isso. E tem mais na Europa, principalmente no Reino Unido e Holanda. Eles chamam de "CareFarm", e o produtor é "cuidador". A coisa deu tão certo que eles estão avançando para outras populações, além das questões hospitalares, sabe qual? No Brasil é até difícil de pensar. População penitenciaria na fase de reintegração à sociedade. E eu vi também no dia em que chegou o ônibus com crianças com problemas mentais e que vinham passar o dia. Isso com o seguro ajudando a pagar, claro que aquela família foi treinada para receber. Agora vou ligar isso com o "megatrends" das pessoas com mais de 65 anos, vocês não acham que o idoso urbano precisa ter suporte para passar alguns dias em espaços rurais que possam abraçá-lo, possa ter saúde e etc.? Isso não é sonho, está acontecendo. Então era arranjo contratual, virou cooperativa, envolveu agricultores, hospitais e seguros e hoje está se expandindo para outras áreas. Quero encerrar essa conversa voltando ao início, Theodore Schultz falava que o que transforma a agricultura são as instituições de educação, novos modelos de educação. No Brasil temos que fazer muito mais do que já fizemos para podermos olhar para agenda dos anos 60. O Japão fez isso maravilhosamente bem. No Brasil não, a minha geração perdeu isso. Pre-

152


8º Bunkyo Rural

ciso olhar mais o consumidor, capturar mais valor com novos modelos de negócio na agricultura em rede, foi falado isso nos anos 60. Então eu acho que essas ideias inspiradoras nos fazem pensar que transformar a agricultura moderna é inovar, é gerenciar escassez de água, de solo, de áreas, de terra agrícola, pensar em sustentabilidade e sucessão, inserir o agricultor em redes bem organizadas e o olho no consumidor final. Esse é o pacote de mensagens que deixo para vocês. E só para encerrar, falar que precisamos olhar para trás para poder olhar para frente. Quero deixar uma homenagem a uma pessoa que influenciou muito a minha vida e tive o prazer de trabalhar no início da minha carreira, doutor Shiro Miyasaka. Talvez eu não precise explicar quem é. Ele nos deixou faz pouco tempo. E com isso, eu concluo a nossa conversa. Se tiver tempo e perguntas, estou à disposição, obrigado.

153


8º Bunkyo Rural

Associação Paulista de Produtores de Caqui 154


8º Bunkyo Rural

PROJETO ACOLHIDA NA COLÔNIA

Palestrante: Thaise Costa Guzzatti Professora da Universidade Federal de Santa Catarina

Bem, boa tarde, vou contar então a experiência em Santa Catarina, que agora nós estamos saindo aqui de São Paulo, dessa iniciativa que se chama Associação de Agroturismo Acolhida na Colônia. Essa é uma associação que existe em Santa Catarina desde 1999, ou seja, com quase 20 anos de estrada. Se desenvolve, sobretudo em produção familiar, especialmente no Estado de Santa Catarina. O território que está localizado entre Florianópolis que é a capital, na área de praia, e a Serra Catarinense são de pequenos municípios. Lá na década de 90, municípios muito pequenos de 2 mil a 3 mil habitantes, quando eu conheci, esses municípios registravam forte êxodo rural por causa de uma crise muito forte, porque são municípios muito tênues, de topografia e relevo extremamente acidentados, onde a agricultura competitiva e mecanizada não era possível de se desenvolver. O desafio foi tentar várias alternativas, tentaram a produção de leite e de ovos, e não conseguiam, não tiveram um sucesso econômico. E em municípios muito pequenos os jovens começaram a ir embora. Assim, o que já era difícil vai ficando mais difícil,. Então, como manter escolas com poucos alunos, como reivindicar melhorias de estradas com poucos moradores, como reivindicar melhorias do abastecimento da energia elétrica, se as comunidades parecem estar mais abandonadas. E assim não vale a pena investir em melhoria de estrada se você tem um povo saindo. Então a gente estava vendo uma redução real do número de pessoas. O que fazer 155


8º Bunkyo Rural

nessas localidades? Então, um grupo de pessoas, pesquisadores e pessoas da comunidade, se reuniu e começou a pensar no que a gente pode fazer, para mudar esse cenário. Já que a alternativa apontava para o agro, mas a mecanização, a modernização e a produção de sal não são viáveis aqui. Que alternativas a gente pode desenvolver? Então esse grupo de pessoas começou a se reunir, e a primeira alternativa que apareceu foi a mudança do processo produtivo de uma agricultura convencional. Eles então começaram a produzir orgânicos e fundaram a associação. Mas antes disso, eles realizaram uma festa. É, esse debate, a reflexão se deu numa festa, a festa dos que foram embora, e dos que ficaram. Promoveu-se uma festa em torno do prato típico do local, e se percebeu que pessoas que tinham ido embora, muitas vezes, pessoas que tinham ido morar em Florianópolis, na Grande Florianópolis, só conseguiram ir e, em muitos casos, tiveram sucesso, porque alguém da família ficou trabalhando na roça e mandando dinheiro. Olha, ninguém quer ver o seu lugar afundar, vamos chamar essas pessoas para pensar com a gente o que fazer para que a sua terra não desapareça. Então foi em uma festa, e nessa festa a primeira coisa que apareceu foi a produção orgânica. Olha, se o que está aí não serve para nós, vamos tentar alguma coisa diferente. Então, ainda falando do contexto da crise, o fumo era muito forte, a infraestrutura das estradas de chão, o asfalto entre as cidades no conceito urbano e toda atividade desenvolvida aqui também era bastante 156


8º Bunkyo Rural

precária. Então nesse meio tempo foi bem difícil mesmo. E a gente perguntava para as pessoas, como ficam os que estão aqui, os municípios? E o pessoal dizia: "não é perto de nada, é longe de tudo, daqui só se vai embora e ninguém fica", ou seja, não se tinha mais expectativa por parte das pessoas de que aquilo pudesse se desenvolver. Nessa festa, uma das principais coisas que a gente discutia era isso, como reverter essa tendência de abandono, como melhorar a autoestima. Não dá para pensar em um rumo para essas pessoas, se as pessoas mesmo não conseguem se enxergar. E se a gente não gerar renda, ninguém vai ficar, não adianta dizer que é lindo e maravilhoso. Se não tiver nem um pouco de dinheiro no bolso ninguém vai querer ficar. A breve mudança começou com um ato de mudança massiva da produção convencional para produção orgânica. O município de 2 mil habitantes, onde fica a sede da nossa associação, é a capital da agroecologia, tem uma cooperativa e vende para muitos municípios e estados. Por outro lado a gente não queria olhar só as coisas ruins, a gente começou a olhar as possibilidades, o que tinha de bom nesse território? Tinha muitas belezas naturais e abrangentes culturais. Foi uma região colonizada sobretudo por alemães e ainda havia os indígenas, comunidades formadas por uma mistura, então havia atrativos culturais. A agricultura 157


8º Bunkyo Rural

era familiar e variada, uma policultura, uma produção para subsistência. Você vai à casa do agricultor e vê a mesa na hora do almoço. É tudo produzido por eles: frango, arroz, milho, salada, é uma riqueza. O que a gente chama de vir da terra, então, são essas pessoas que saíram, 158


8º Bunkyo Rural

mas se engajaram em um movimento para buscar alternativas para seu município. Pessoas começaram a se interessar e queriam ajudar, mas não havia local para hospedagem. E assim surgiu a ideia de abrir as propriedades dos agricultores familiares para acolher esses visitantes. Isso serviu para aumentar a renda do agricultor. Um parêntese importante: eu trabalho nesse projeto desde o início, eu sou agrônoma. Uma coisa que sempre me incomodou muito, aliás, me incomoda na agricultura, é a invisibilidade do trabalho das mulheres. As mulheres têm uma coisa do sistema conjugal. Perguntam: "ah o que você faz?". "Eu ajudo o meu marido". Ela vai para a roça, trabalha muito às vezes, mas é um trabalho que ainda é visto como ajuda, não tem valor geralmente. Não sei como é aqui com vocês, mas no meu estado a gestão ainda é assim. Então como agrônoma, eu pensava em atividades que possam ser desenvolvidas pelas mulheres, que valorizassem o trabalho das mulheres, e que dê mais autonomia financeira para elas. Aí apareceu uma atividade bem bacana, porque quem se ocupa dessa atividade na propriedade é a mulher. Da comida, do aconchego, da pousada, enfim, era uma possibilidade que talvez desse para trabalhar com as mulheres. Então a gente criou o agroturismo. A gente fala muito que não é turismo rural, porque a gente 159


8º Bunkyo Rural

nem gosta do turismo, é o Agroturismo. A agricultura das propriedades de agricultura familiar, e as pessoas vão lá para estarem nesse ambiente, compartilhar essa experiência com as pessoas. Os nossos agricultores oferecem serviços de hospedagem, alimentação, atividades de lazer, culturais, alimentos saudáveis, venda de produtos orgânicos e muito mais. A comunidade compartilha esse conjunto de experiência e de conteúdo. Tudo é diferente do que a população urbana conhece. Ninguém sabe muito sobre eles. Na Colônia a gente tem esse altruísmo de vivência mesmo, você vai lá para entender mais sobre aquela vida, aquele espaço e aquelas pessoas. É um pressuposto desse projeto o agricultor gostar de contar, conversar, de compartilhar, se não, não vai ter sucesso. E o nosso slogan é justamente "Acolhida na Colônia". É criar um espaço de vida e de encontro. Nós fazemos parte de uma rede francesa, uma associação de 30 anos na França, que se chama Accuiel Paysan, junto com mais de 30 países. O Brasil foi o primeiro país da América Latina a se associar, e é o pais que está mais organizado e que tem mais associados depois da França. A gente, ao longo desses 20 anos criou uma metodologia própria. A ideia é basicamente você ver, receber os visitantes, e a gente se preparar para isso. Por mais que a gente diga que a gente quer que mude o mínimo possível, não é verdade, a gente quer sim a autenticidade, mas há uma necessidade de você se preparar, de preparar a sua casa, de se preparar para esse ciclo de atividade. Isso não só o agricultor, mas o município, a localidade precisa se preparar primeiro. Esses são os passos que a gente está desenvolvendo agora em Parelheiros. Depois a Valéria pode contar um pouquinho. Primeiro, sensibilizar um pouco os agricultores quanto a essa possibilidade. Eu lembro das primeiras reuniões, há mais de 20 anos, o que eu fazia para discutir, para mudar para 160


8º Bunkyo Rural

o agroturismo, a gente fazia convites, só que as pessoas ali não tinham interesse. Eles nunca fizeram turismo, ou não tinham interesse? Não existia isso nos municípios, não era uma realidade deles. Não imaginavam na época, dada a baixa estima de que alguém pudesse se interessar em conhecer a casa deles. Então, o que motivava eram coisas ruins, onde, o que está acontecendo, o que isso pode trazer, de bom ou de ruim. No Brasil muita coisa pode acontecer, um estranho aparecer na sua casa... Geralmente turismo dá muito trabalho no final de semana e a gente tinha muitas coisas nessa comunidade, mas houve um trabalho de sensibilização para abrir essa possibilidade. Depois a gente passa para uma etapa de diagnostico participativo nas propriedades rurais. Nós montamos um grupo de interessados, e ao invés de ir consultar um especialista, eu, ou qualquer outro, que entende em tese o que seria uma pousada, foi lá para fazer uma avaliação sobre o tipo de cada propriedade. Na prática, a propriedade nos acolhe como turista. No começo, antes de fazer melhorias, a gente foi vendo dentro da propriedade absolutamente tudo o que tinha de bom e o que tem tinha que melhorar para trabalharem depois. Também passaram a conhecer as necessidades de melhorias das propriedades dos demais colegas. "Olha, você precisa melhorar aquilo ali", "opa, agora eu que tenho que ir lá e retirar o que eu 161


8º Bunkyo Rural

disse". E uma outra ideia é que não existe nenhum lugar que é totalmente ruim nem totalmente bom. A gente pode construir coletivamente, ajudar, dar e receber, e vice versa. Então a gente trabalha com essa associação, os agricultores fazem parte desse projeto, o presidente é o servidor de cinco associações de grau de instituto no âmbito estadual. Depois desses agricultores, que querem fazer e trabalhar nesse diagnóstico, uma pousada, um restaurante, café colonial, trabalhar com fins pedagógicos. E começa a trabalhar com associações, por exemplo, em Parelheiros. Na semana passada aconteceu uma oficina de decoração. São dias de ensino de campo prático para poder ensinar aos agricultores como devem adequar eventualmente os seus espaços, para poder tocar os negócios. Sempre a lógica é o menor investimento possível para começar. O sonho pode começar com um quarto na casa, arrumando bem esse quarto, e depois trabalhar com a ideia de evolução. Acolhida na Colônia, de maneira própria na qual ela mesma financia um sistema de melhorias, sem burocracia, então a gente empresta, para o agricultor, até 5 mil reais para poder comprar, por exemplo, louça e talheres. Mas as possibilidades hoje apontam para o desenvolvimento do agroturismo. Depois que o negócio está implantado, é preciso organizar a parte da divulgação e é importante falar da parte de certificação. Como não existem 162


8º Bunkyo Rural

regras, só existem regras de serviços do meio urbano e não do rural, nós criamos nossas próprias normas. Chama-se caderno de normas para associados que vivem na Colônia, nesse lugar, pode ser uma pousada ou um restaurante. A gente vem brigando para que isso seja de alguma forma 163


8º Bunkyo Rural

aceito na legislação oficial. Conseguimos aprovar em 2007 a lei do turismo rural na região de Santa Catarina e, no ano passado, a lei do agricultor primário, que permite que os agricultores tirem nota fiscal dos serviços de hospedagem. Então, a gente está conseguindo trazer novas normas, inclusive para a legislação do Estado. Depois que ele ganha a certificação, a marca de certificação participativa, ele entra no nosso programa de promoção no site e tem o acompanhamento da associação. As perguntas que eles fazem geralmente são: como desenvolver programas desse tipo em municípios sem sinalização, sem telefone, internet. Imagina há 20 anos, quando a gente começou, como se dava isso, como eles sinalizavam? Sinal de fumaça, era quase isso, a gente mandava recado pelos ônibus escolares, igrejas, e a gente vem tentando levar estrutura. Quando esse programa começou a ser implantado nos municípios foi mais complicado, mas hoje é diferente. Nos últimos anos existe um programa de controle do Estado, que se chama SC Rural, da Secretaria da Agricultura e Pesca, que visa o desenvolvimento do meio rural, com o financiamento do Banco Mundial. Assim, a gente tem conseguido avançar, mas de fato esses elementos apresentam dificuldades que precisam ser solucionadas, da mesma forma que precisamos nos preocupar com os agricultores, porque se formos esperar que os agricultores venham a ter uma condição boa, então 164


8º Bunkyo Rural

os agricultores tem que estar preparados para o que vier. Temos aqui alguns exemplos, esse era um galpão de madeira, confortável, tudo trabalho de organização do espaço que já existe, e do trabalho voluntário de decoradores, de profissionais arquitetos, para aproveitar espaços que estão ociosos, mal utilizados. O modelo de sinalização que a gente adota. Geralmente, os agricultores começam com uma plaquinha lá em cima, que é bem ecológico geralmente, e sem investir muito. Depois, ele passa a servir café, depois passa a alugar o quarto, passa a virar pousada. A ideia é que ele vá aumentando os serviços. A culinária é talvez o principal atrativo do nosso projeto. A gente convida as pessoas a entenderem essa perspectiva de planta e colhe, da agricultura orgânica, a gente trabalha com livros de receitas, e tudo mais que viabiliza a rentabilidade. Algumas fotos: a culinária, as espelhagens são bem simples, mas a gente trabalha muito com a parte da decoração visando a simplicidade, de coisas simples mas que sejam confortáveis. Muito forte agora são os projetos pedagógicos. Segunda-feira a gente vai receber uma escola que vai ficar com a gente durante uma semana. É uma coisa de ciclo turismo muito forte, e essas coisas que eram mal utilizadas, agora são atrativos culturais. Vocês sabem o que é essa foto (página 164)? Esse redondo? Esse é o antigo forno de carvão e hoje é uma sauna e lá em cima, aquela lareira era a fornalha de principio de fumo. Então a ideia é montar circuitos principais, essa foi a proposta de extensão promovida em municípios pequenos. Hoje 165


8º Bunkyo Rural

nós estamos já em 120 propriedades, 5 associações em fórum, e uma expansão para Parelheiros, mas eu vou convidar a Valéria para falar um minutinho. Obrigada. Thaise Costa Guzzatti thaise.guzzatti@ufsc.br www.acolhida.com.br Valéria Maria Macoratti Bom dia pessoal, eu sou a Valéria, presidente da Cooperapas, uma cooperativa de agricultores agroecológicos, a primeira cooperativa orgânica dentro da cidade de São Paulo. A importância desse projeto ocorrido na Colônia foi que gerou em São Paulo a Acolhida em Parelheiros. É uma parceria da Cooperapas com o pessoal da Acolhida na Colônia, em Santa Catarina. E trata-se de dar poder ao agricultor familiar. A nossa cooperativa é uma cooperativa pequenininha, moldada muito no sentido de trazer de novo o poder para o agricultor, porque em São Paulo a agricultura, como o pessoal está dizendo, assim como em todo Brasil, está envelhecendo. As pessoas estão vendo esse êxodo rural, e em Parelheiros, particularmente como a Thaise falou, que em Santa Catarina é "o fim do mundo virando a esquerda", então as pessoas acham que a nossa região só tem coisa ruim. Que tem bandido, desova de carros, tem locais que não tem acesso, não tem telefone, não tem internet, não tem nada, mas esquece de falar uma coisa muito importante. Parelheiros é o último remanescente da Mata Atlântica dentro da cidade de São Paulo. Nessa última crise que nós tivemos há 2 anos, Parelheiros salvou a lavoura, porque as nossas represas, são duas represas, a Billings e a Guarapiranga, conseguiram fornecer a água o suficiente para abastecer minimamente a cidade de São Paulo. A cada 3 copos de água que abastece a cidade, 1 sai de Parelheiros. A Cooperatas viu esse potencial de desenvolvimento do turismo sustentável, dedicando esforços muito mais na base comunitária. Nós não queremos ver a nossa região dominada por resorts, mas nós podemos acolher sim, as pessoas que têm grande vontade de sa166


8º Bunkyo Rural

ber o que existe ali nessa área rural, na cidade de São Paulo. O lugar é tão bonito, mas é tão desprezado pelos governantes. Esse projeto está ainda em fase inicial, nós estamos fazendo esse diagnóstico inicial nas comunidades junto com os participantes porque nós chegamos lá como turistas. E dai nós verificamos exatamente isso que a Thaise falou. O que temos de potencial, o que é bom e o que dá para melhorar. Não que tenha algo que seja errado, o que você pode melhorar, o que você tem para atrair mais a atenção, que pode te gerar renda legal pelo turismo? E a nossa região está dentro da cidade de são Paulo, a maior cidade da América Latina, da América do Sul. Então, tem quantos milhões de habitantes dentro da cidade de São Paulo, qual o potencial que a gente tem? É muito grande. Quanto ao turismo pedagógico, você achar uma escola daqui para ir a Santa Catarina é mais difícil. E nós temos faculdade em Parelheiros, nós temos cachoeiras, temos matas, temos tudo. Então, é a gente capacitar as pessoas e mostrar para o poder público que dá sim para trabalhar, dá para preservar. A cooperativa, junto com esse programa agora em Parelheiros, veio mostrar que a gente tem que amar o local que a gente vive, a gente tem que preservar. Em Parelheiros, vocês não imaginam, há especulação imobiliária, uma pressão sobre a nossa região, com tanto desmatamento, e São Paulo chegou a uma situação, onde ou ele preserva ou nós não vamos ter água para as futuras gerações. Então, o nosso trabalho é levar os jovens também a descobrirem que você não precisa ter esse regime da área rural, que você não precisa ter nojo da terra rural, estigma criado na mente da população. Falando mais uma coisa da agricultura, nós precisamos aprender, e aprender bastante, se o produtor não planta, o cidadão não janta, então a gente tem que mudar essa visão de que o supermercado tem tudo, tudo o que tem no supermercado saiu da zona rural. Uma boa palestra a todos.

167


8ยบ Bunkyo Rural

168


8º Bunkyo Rural

TURISMO RURAL, INSTITUIÇÕES E MARCO LEGAL Palestrante: Maria Beatriz de Almeida Prado Conselheira da ABRATURR SP - Associação Paulista de Turismo Rural

A Associação Paulista de Turismo Rural tem como objetivo a consolidação do segmento turístico rural com o fomento de práticas comprometidas com o desenvolvimento sustentável. Exerce o papel aglutinador do segmento, com força e representatividade para promover ações e parcerias que contribuam para o crescimento da atividade de seus associados comprometida com a preservação do patrimônio ambiental, arquitetônico, histórico, cultural e social. Incentiva a participação em feiras e seminários, suporte de informações técnicas ou legislativas e agregando os vários segmentos do turismo rural, proporcionando sempre um ambiente de interação, conhecimento e crescimento profissional e pessoal. Os Associados da Abraturr SP, em grande maioria, são pessoas jurídicas, ou organizações regionais de Turismo Rural existentes em todo o Estado de São Paulo, além de uma minoria de empreendedores, pessoas físicas, quando em locais ou regiões onde inexistem associações locais. Tem assento no Conselho Estadual de Turismo do Estado de São Paulo e na Câmara Setorial de Lazer e Turismo no Meio Rural, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.

169


8º Bunkyo Rural

O que é Turismo Rural O Turismo Rural é um grande e diversificado mosaico de atividades praticadas em pequenas, médias e grandes propriedades rurais, e pode acontecer em fazendas históricas, em propriedades agrícolas para visitação e colheita, passeios a cavalo ou para fins pedagógicos. Enfim, é turismo cultural, de aventura, contemplação, experiência, etc. É definido nos Marcos Conceituais do MTur como: "Conjunto das atividades turísticas desenvolvidas no meio rural, comprometidas com a produção agropecuária, agregando valor a produtos e serviços, resgatando e promovendo o patrimônio cultural e natural da comunidade". Dificuldades encontradas no que se refere à legislação: As Atividades Rurais enquadram-se economicamente no Setor Primário da Produção. Os produtores rurais não conseguem emitir os documentos fiscais exigidos por agências de turismo, porque a prestação de serviços não se enquadra no rol das atribuições do Setor Primário. Pela falta de legislação específica, muitos empreendimentos turísticos rurais atuam na informalidade. Para resolver essa questão é necessário colocar o turismo no rol das atividades rurais descritas na Lei 8.023/90. PL 5077/09 - Esse Projeto de Lei visava incluir o turismo rural no rol das atividades descritas como atividades rurais. Com isso, a atividade passaria a ter um tratamento tributário igual e poderia se expandir. O mesmo valendo para o trabalhador rural que atua no turismo rural. Esse Projeto também dispõe sobre o empregador rural e dá outras providências. O Congresso Nacional decreta: Art. 1º O art. 2º da Lei nº 8.023, de 12 de abril de 1990, passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único: "Art. 2º Parágrafo único. Também se considera atividade rural, desde que oferecida em meio rural, comprometida com as atividades da exploração agropecuária, de forma vinculada ou não à exploração de atividade agropecuária: I - administração de hospedagem em meio rural; II - fornecimento de alimentação e bebidas em restaurantes e meios de hospedagem rurais; III organização e promoção de visitas a propriedades rurais produtivas ou propriedades rurais inativas de importância histórica; IV - exploração de vivência de práticas do meio rural; e V - exploração de manifestações artísticas ou religiosas no meio rural." NR 2 Art. 2º O § 1º do art. 3º da Lei nº 170


8º Bunkyo Rural

5.889, de 1973, passa a vigorar com a seguinte redação: Art. 3º§ 1º Incluise na atividade econômica, referida no caput deste artigo, além da exploração industrial em estabelecimento agrário não compreendido na Consolidação das Leis do Trabalho, a exploração do turismo rural ancilar à exploração agroeconômica." NR Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação. A Lei do Turismo rural - LEI 13.171/2015 VETO PARCIAL DA PRESIDÊNCIA: O dispositivo que dizia considerar atividade rural "o conjunto das atividades turísticas desenvolvidas no meio rural, comprometidas com a produção agropecuária, que agregue valor a produtos e serviços do meio rural", foi substituído por, "inclui-se na atividade econômica (atividade rural), além da exploração industrial em estabelecimento agrário, a exploração do turismo rural ancilar (relacionada) à exploração agroeconômica". MOTIVO DOS VETOS - Enquadramento indevido de certas atividades turísticas, possibilitando aplicação distorcida de benefícios tributários no âmbito do imposto de renda rural. A proposta não foi acompanhada das estimativas de impacto orçamentário-financeiro e das compensações necessárias, desrespeitando ao que determina as leis de Responsabilidade Fiscal e de Diretrizes Orçamentárias. Na prática, a lei contempla o produtor rural na questão trabalhista, ou seja, o produtor rural pode empregar seus funcionários em regime de trabalhador rural para a prestação de serviços turísticos. Entretanto, o produtor rural continua não podendo emitir nota fiscal pela prestação de serviços turísticos, ou seja, a maioria dos empreendimentos continuará atuando irregularmente. O paradigma do setor primário As pessoas buscam cada vez mais consumir com qualidade e não tanto mais quantidade. Movimentos como "Da Fazenda para a Mesa" cada vez ganham mais força e adeptos. O produtor rural que se moderniza para acompanhar as novas formas de consumo, participa do mercado on-line, comercializa pelas redes sociais, etc. E a prestação de serviços continua sem enquadramento no Setor Primário! De acordo com a Organização Mundial do Turismo, pelo menos 3% de todos 171


8º Bunkyo Rural

os turistas do mundo orientam suas viagens para o turismo rural. O turismo rural possui um potencial inesgotável de expansão, especialmente, para o desenvolvimento da agricultura familiar ou de pequena escala, na recepção de visitantes e hospedagem ou ainda por meio de programações artísticas, históricas ou vivenciais. A sustentabilidade A pressão sobre as áreas naturais, com impactos nos ecossistemas associados na atividade turística deve ser considerada e dimensionada para que os impactos negativos sejam minimizados através de mecanismos de gestão e aplicação de boas práticas ambientais. Esses impactos devem ser considerados especialmente no meio rural onde estão localizados os mananciais de água que precisam ser protegidos e, onde os serviços públicos como coleta de resíduos e esgoto, fornecimento de energia e água são precários e muitas vezes inexistentes. A Abraturr SP defende a necessidade de elaboração de Políticas Públicas para o Desenvolvimento Sustentável do Turismo Rural no Estado de São Paulo Maria Beatriz de Almeida Prado E-mail - mbeatrizaprado@gmail.com

172


8º Bunkyo Rural

A ROTA DO CAMBUCI

Palestrante: Gabriel Menezes Presidente do Instituto Auá

Desmatamentos sucessivos e exploração predatória, com ocupação desordenada, urbanização e modelos agrícolas insustentáveis, além do consumo excessivo e a consequente poluição da água e do solo levaram a uma situação crítica, onde só restam 12,5% da Mata Atlântica, em 17 Estados, onde vivem quase 80% da população brasileira. Ela está entre as cinco florestas mais ricas e ameaçadas do planeta, que garante o clima, a qualidade do ar, do solo e de rios e nascentes que abastecem as cidades e sustentam as atividades humanas. São 20 mil espécies de plantas no bioma, com 8 mil endêmicas, que só existem ali, mas há quase 400 espécies animais ameaçadas na Mata Atlântica e mais de 100 frutas nativas que correm o risco de extinção. A Reserva da Biosfera do Cinturão Verde de São Paulo integra a proteção de biomas e gestão de cidades que ocupam 600 mil hectares de vegetação nativa e onde vivem 24 milhões de pessoas. A Rota do Cambuci é um empreendimento Socioambiental de conservação do Cambuci (Campomanesia Phaea), fruto nativo da Mata Atlântica do Sudeste, valorizando a cultura local, a agroecologia, 173


8º Bunkyo Rural

o comércio justo e o turismo sustentável. Envolve governos, produtores, consumidores e sociedade civil organizada. Está integrado à Reserva da Biosfera do Cinturão Verde de São Paulo e possui as seguintes frentes de atuação: Rota Gastronômica do Cambuci, Arranjo Produtivo Sustentável e Rede de Pesquisas do Cambuci. O nome tem origem tupi-guarani (caá = mato ou fruto, mbocy = dividido em dois) e está relacionado ao formato do fruto. Também significa 'pote d´água'. Nome científico: Campomanesia phaea (O.Berg.) Landrum. Nome vulgar: Cambuci, da família Myrtaceae, como a jabuticaba, pitanga, goiaba, uvaia, araçá e eucalipto. A árvore do Cambuci chega até 15m de altura, pode viver mais de 50 anos e 174


8º Bunkyo Rural

produz frutos verde-amarelados de 30g a 100g, com 2 a 8 sementes cada. O fruto possui nível de acidez e vitamina C igual ao do Limão Taiti, é adstringente e possui alto teor de pectina. A partir do 5º ano, inicia a safra, normalmente de fevereiro a maio e, em algumas regiões, de agosto a outubro também. Com 8 anos, o cambucizeiro produz em média 50Kg/ano e a partir de 10 anos produz mais de 100Kg/ano, podendo chegar a 200Kg/pé/ ano quando adulto. No seu habitat natural, a ocorrência média é de aproximadamente 50 pés/ hectare; em área de cultivo recomenda-se plantar até 200 pés por hectare, consorciando com outras espécies nativas. Está na lista vermelha da UICN - União Internacional para a Conservação da Natureza, mas não consta na lista oficial de espécies ameaçadas de extinção do Ministério do Meio Ambiente do Brasil. A missão da Rota do Cambuci é promover a conservação do Cambuci e seu bioma, a Mata Atlântica do Sudeste, valorizando a cultura e gastronomia local, a agroecologia, o comércio justo e o turismo sustentável. Além disso, proporcionar maior visibilidade, conhecimento e consumo do Cambuci pela população, especialmente a paulista. E aumentar a área de terras convertidas para cultivo sustentável de Cambuci junto com outras nativas e gerar aumento de renda para seus produtores nas regiões onde o fruto é endêmico, especialmente no entorno da Serra do Mar paulista. Assim possibilitar o desenvolvimento econômico local sustentável a partir da cultura do Cambuci e construção de um modelo de referência para as demais frutas nativas da Mata Atlântica. Há 9 anos, a Rota Gastronômica do Cambuci reúne Festivais Gastronômicos realizados por municípios do entorno da Serra do Mar paulista, em eventos abertos que proporcionam ao visitante uma experiência com a cultura da fruta Cambuci para valorização do bioma da Mata Atlântica e o desenvolvimento local. Para 2017 estão previstos 14 Festivais, de abril a outubro, em 12 municípios com um público aproximado de 80.000 pessoas. A Rota Turística do Cambuci é formado por atrativos que proporcionam ao turista uma experiência com a cultura da fruta Cambuci para valorização do bioma Mata Atlântica e o desenvolvimento local. Já estão mapeadas mais de 60 propriedades rurais e estabelecimentos culturais e gastronômicos como potenciais atrativos, com capacidade para atendimento total de até 2.000 pessoas por dia. 175


8º Bunkyo Rural

Há um grupo definido de parceiros gestores produtores e parceiros gestores consumidores, voltado à comercialização e conservação do Cambuci, com sistema de certificação participativa, que é pautado pelos seguintes princípios: 1) AGROECOLOGIA - cultivo sem agrotóxicos e petroquímicos, visando colheita de pés plantados e consorciados em Sistemas Agroflorestais de espécies nativas. 2) COMÉRCIO JUSTO - conforme Decreto Federal 7.358, que cria o Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário e propõe - 1) Co-responsabilidade nas relações comerciais entre os diversos participantes da produção, comercialização e consumo; 2) Valorização, nas relações comerciais, da diversidade étnica e cultural e do conhecimento das comunidades tradicionais; 3) Transparência nas relações comerciais, na composição dos preços praticados e na elaboração dos produtos, garantindo acesso à informação acer176


8º Bunkyo Rural

ca dos produtos, processos e organizações que participam do Comércio Justo e Solidário. 3) ORIGEM - valorização de produtos e produtores locais da área onde o fruto é endêmico. São 80 produtores rurais e 15 beneficiadores gerando 200 toneladas de fruto por ano no sistema agroecológico de produção, com princípios do comércio justo. Esses produtos são comercializados pelo Empório Mata Atlântica. Existe um Boxe Mata Atlântica no Mercado Municipal de Pinheiros onde se comercializa chocolates, paletas e cachaças do fruto e cremes desenvolvidos por indústrias parceiras, como AMMA, Cambusanto, Ecofresh e Sorvetes Naturale. As receitas foram desenvolvidas por chefs em mais de 50 estabelecimentos gastronômicos, como Nambu e Tète a Tète.

177


8º Bunkyo Rural

O Empório Mata Atlântica é um empreendimento socioambiental do Instituto Auá para conservação do Bioma por meio do Comércio Justo. Ele comercializa produtos do APS e de outros produtores de nativas da Mata Atlântica. A Rota do Cambuci e o fruto têm sido pauta cada vez mais frequente nos principais veículos de comunicação e vêm despertando a curiosidade e interesse do público pela fruta, pelos festivais, por seu potencial gastronômico e pela sua região. A nossa ideia é trazer uma perspectiva para os jovens que estão saindo da região por falta de atividades. Trazendo com o que é nosso por natureza. As regiões passam por um ciclo, por isso é necessário renovar, que nem o que o Patrick faz ali no Vale do Paraíba. Ele é a testemunha viva, porque trabalha com frutas exóticas, promove o desenvolvimento de uma região, a partir de exóticas, planta café, eucalipto, você vai ver que isso acontece há 500 anos nesse país e a gente que não aprendeu ainda. Então é esta a ideia da rota do Cambuci. Obrigado gente. Instituto AUÁ de Empreendedorismo Socioambiental www.aua.org.br facebook.com/institutoaua contato@aua.org.br 178


8º Bunkyo Rural

TURISMO AGROECOLÓGICO FAZENDA CORUPUTUBA Palestrante: Patrick A. Assumpção Empresário e produtor rural, fundador do Projeto Caminhos do Rio Paraíba

Obrigado, boa tarde. Bom, eu sou de Pindamonhangaba, eu tenho uma fazenda do meu bisavô, são 4 gerações produzindo geralmente arroz. Eu vim da área de subcultura, então temos produção de madeira, segundo o Gabriel falou, ela é uma árvore exótica, ela sempre esteve ali. No Brasil, sempre tivemos essas plantas exóticas, mas quando a gente fala em utilizar, em consumir, aquilo que a gente consome não é do Brasil. Nunca houve interesse em estudar plantas brasileiras. Houve interesse em estudar e desenvolver plantas estrangeiras conhecidas no solo brasileiro. E a gente, ironicamente, saiu de um ciclo em meados de 2006, 2007, e seguimos a cultura de eucalipto. Fui estudar os sistemas de madeira, onde eu encontrei uma nativa brasileira chamada guanandi, que é uma madeira anfíbia, pode viver no brejo e no seco, utilizada para fabricar canoas, mastros de navios, vigas para construção civil, assoalhos, marcenaria e carpintaria. Mas é um investimento de longo prazo, é um trabalho de 20 anos, em que você tem que ter uma terra modernizada para isso, porque senão precisamos tirar algumas outras plantas que poderiam estar compondo esse sistema. No inicio, foi uma grande resistência, porque tem que ser lucrativa para o produtor. Depois, por ser uma planta nativa, existem as regulamentações e eu me instrui, eu 179


8º Bunkyo Rural

fui atrás do conhecimento, fui até o Ibama, secretaria ambiental, e outros órgãos. Depois de regularizar tudo, você pode plantar a árvore e cortar em todo o território nacional. Só tem que saber qual tipo de espécie você vai plantar, se essa espécie está em extinção ou não. Essa é a área onde a gente diversificou, no meio das produções, os dois tipos de madeira e a diversificação. Plantamos mandioca em consórcio com outras plantas, então desse volume de diversificação, eu tive um lado positivo que é a diversidade do fator ecológico muito importante. Porém, eu tinha muitos produtos, de vários tipos que dificultavam a minha comercialização. Assim como todo produtor rural, que vai plantar, colher, irrigar e botar no carro, quer dizer, vai ficar maluco se você tiver 30 variedades diferentes para cuidar e vender. Por isso, tivemos alguns problemas e gerou um trabalho a mais para entendermos o que acontece com outros produtores. E vendo todo esse processo, a gente introduziu outras plantas nas áreas da floresta. Se eu iria produzir alguma coisa que é comum no local, eu realizava um tipo de pesquisa na região para saber o que e como se produzia. E também ver qual era o costume do povo daquela região do Vale do Paraíba há 200, 300 anos. Encontramos uma série de plantas, que hoje, no final a gente chama de não convencionais, porém, eram muito 180


8º Bunkyo Rural

convencionais há 150, ou 200 anos atrás, e desde esse processo, a gente entendeu que elas têm um grande valor na cobertura vegetal do solo. Elas podem compor um ambiente, onde você pode retirar produtos econômicos de uma área de floresta. Então nós entramos em um processo de trabalho de restauração florestal, junto com as grandes entidades, a Secretária do Meio Ambiente e MAPA, para poder entender arranjos florestais produtivos. Hoje, a gente tem a condição de produzir em área de reserva legal, com a lei nova, no Estado de São Paulo, onde está o Vale do Paraíba para a formação de um pólo florestal de múltiplos usos. Se você tem 25.000 hectares de área de reserva legal para plantar as árvores nativas, frutíferas, como a gente estava comentando aqui, uma boa

181


8º Bunkyo Rural

parte delas, como cambuci, uvaia, cereja do Rio Grande, e outras árvores nativas brasileiras, como jequitibá, guanandi, louro pardo, mogno. Então a gente desenha arranjos florestais, com uma série de especialistas, agrônomos, para entender a forma de a gente poder retirar essa madeira, com o arranjo florestal ao longo de 20 anos, dando uma opção, uma condição para o produtor rural poder entender que a área de reserva legal não é uma área perdida. O agricultor vai diversificar a sua atividade principal, então o cara tem 100 hectares de feijão, tem 200 de reserva e não pode plantar só feijão, tem que plantar várias outras. Sempre tem a questão do povo pedir diversidades de espécies, enfim, uma série de fatores, e o sistema agroflorestal caiu como uma luva, o que no passado era tido como uma agricultura de subsistência. Fizeram vários estudos de atividades econômicas, não só aqui no Estado de São Paulo, mas no Brasil inteiro, para ver quais os arranjos florestais com os melhores resultados. Isso eu não vou me aprofundar aqui, porque não é o caso, mas isso entra na questão da sucessão. No estágio inicial tem um período de adaptação, quando a gente vai plantar as árvores frutíferas, as arvores verdes, as rasteiras, aquelas que você faz em 3 meses, aquelas que conseguiu ter folhas com 9, 10 meses, e aí vai, tudo dependendo do solo, temperatura e altitude. Nisso você vai tendo 182


8º Bunkyo Rural

essa sucessão, então não é nem durante esse período de fato de 10, 15, ou 20 anos. No décimo ano, vai ser cultura diferente do primeiro ano, do segundo, do terceiro e assim por diante. A dificuldade está nisso, se eu fizer isso sozinho, no décimo eu vou ter que criar um novo mercado, um quadro novo para um novo produto. Se tiver um volume de produtores, sem serem de reserva ou mesmo em área de horto, se a gente firmar um acordo, fazer um planejamento a longo prazo, de plantar as mesmas espécies florestais de madeira, escolhendo 5 ou 6 espécies, as frutíferas idem, e as outras plantas comerciais no início, você gera um grande volume de produto, maior diversificação, e faz todo o trabalho de reciclagem do solo. Por isso, tem muitos fatores ambientais inseridos dentro de um fator econômico. Bom, a gente deu uma ideia do que seriam as escolhas das espécies. Então você tem uma floresta que tem que estar totalmente tomada, desde o solo até a parte superior da floresta. Isso seria o ideal numa vegetação natural ou produzida pelo homem dentro da floresta. Isso aqui é um pequeno modelo, que é um sistema criado lá na fazenda, inclusive, esse sistema de produção não tem uma receita. No começo você não sabe o que vai plantar, qual o tipo de adubo, como vai colher. Nós plantamos a mandioca, a palmeira real e a banana. Por isso, temos uma série de coisas que, conforme vai passando os anos você vai colhendo. Uma plantação de pinha do brejo, que colhe, morre, enfim, há uma sucessão. Esse é um outro arranjo, tem juçara, nativa, banana, guandu, araruta, não sei se vocês conhecem é um tubérculo. A mandioca, o mangarito é um outro tubér183


8º Bunkyo Rural

culo, e curcuma, esses são de folhas largas, eles dão em área de meia sombra, então é uma opção importante. Por que plantar mandioca? Vamos plantar uma mandioca diferenciada, não é uma mandioca comum, é uma mandioca com um alto valor nutricional. Ela apresenta mais de 800 U.I. de Vitamina A, mais do que a amarelinha que está no mercado e foi desenvolvida em 2001. O produtor tem a resistência de trocar, porque o mercado não aceita, então o consumidor acaba tendo um produto de menor qualidade, porque o produtor que não quer mudar, tem medo de mudar, então tem essa história, não entra na minha cabeça porque tem gente que pensa dessa maneira. Essa é a araruta, tam-

bém a gente tem na parte de sombra. Bom, a gente consegue ver uma planta adaptada a esse tipo de condição, sob essas arvores estão a 3 por 2 a 3 metros de linha. Aqui a banana também, a planta escolhida, aqui em baixo está o inhame. Aqui, uma colheita 184


8º Bunkyo Rural

em sistema agroflorestal em uma área que em 2 anos de plantação vai estar com toda a cobertura vegetal pronta. No Bairro do Paraíba, assim como no Brasil inteiro, tem a Cop 21 (Acordo de Paris), sabe, aí vem a 22 em Marrakech (Marrocos), e 186 nações no mundo inteiro assinaram. Tratase de um controle ambiental para restaurar florestalmente o mundo em 30 milhões de hectares até 2020. O Brasil se comprometeu a formar 2 milhões de hectares, e o Estado de São Paulo teve o compromisso de montar 350 mil hectares até 2030. É bem ambicioso, um projeto bastante ambicioso. Nesse quesito estão envolvidas algumas entidades de várias partes do mundo. Aqui, por causa da crise hidráulica, de 2013 e 2014, que acabou com o sistema de abastecimento de água daqui da Grande São Paulo, a empresa teve problema para trazer a água do Rio Paraiba, que abastece 70% do Rio de Janeiro. De lá para cá, entrou um projeto de restauração florestal em larga escala, onde tem essa área de reflorestamento, e a Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo fez esse trabalho para formação de um lugar onde tem 25 mil hectares de área que precisa ser restaurada. Como fazer para convencer o produtor rural a entrar com um bom conteúdo e um pouco tempo, o que já é difícil, ou mesmo pedir para ele plantar uma área de restauro de reserva legal? Como é que você vai convencer o cara a

185


8º Bunkyo Rural

plantar jequitibá rosa e falar que daqui a pouco vai aparecer um monte de gente querendo comprar a madeira de você? O cara vai falar: eu nunca vi isso na vida, como é que eu vou plantar isso, e você vai me prometer que vão comprar. Então tem essa questão, a horta que o Gabriel colocou aqui, dentro do possível, daqui a pouco vai se tornar uma rota de frutos da Mata Atlântica. A questão das madeiras, também é algo de fundamental importância, e se não tiver o turismo agregado a isso, a coisa não funciona. Ele não vira pólo, não vira uma questão de escala, isso precisa de escala. Estamos fazendo um trabalho bem crescente na beira da Via Dutra, do morro onde a gente está fazendo essa restauração concomitantemente criando boi e burro e trazendo as fronteiras de volta para essas áreas de plantio. Até então não havia mais perspectiva, cada um estava lá em suas casas, desanimados, então, foi introduzido na cultura o sistema de restauração como o agregador de turismo rural dentro dessa área. O que você vai plantar hoje, daqui a 6 meses estará diferente, daqui um ano você já está colhendo. Então a pessoa que está vindo fazer turismo nessas áreas, vai ter em cada momento, uma situação diferente. Esses esforços em conjunto, eu faço parte do conselho, se chama corredor ecológico de turismo. São 2600 hectares para serem restaurados nessa região, então é exatamente esse o momento de entender quais os tipos de espécies que serão necessários para colocar dentro dessa área, para gerar comércio e gerar o coletor de semente. E toda essa cadeia produtiva precisa produzir e conseguir chegar dentro do mercado. Uma das entrevistas que a gente fez foi justamente para entender esses produtores, nem todos são produtores orgânicos, mas eles têm o entendimento dessa questão do uso do solo, que em minha opinião é muito mais importante do que você ter um selo orgânico. Se ti186


8º Bunkyo Rural

vesse um selo agroecológico não seria melhor, mas seria um valor agregado a mais, do que um selo orgânico. Finalizando, você vê esta área de madeira, milho, mandioca em área de madeira (página anterior), pesando as árvores (ao lado), aqui a parte de ocupação verde, a entrada de mandioca e o plantio. Isso aqui é uma metodologia de consideração (abaixo), então indo para etapa de meio ambiente, que ele faz uma avaliação de 62 indicativos gerais, sociais, econômicos, valores ambientais, e daí você tem uma planilha final, onde con-

187


8ยบ Bunkyo Rural

188


8º Bunkyo Rural

segue fazer uma avaliação da sua propriedade, o que você pode melhorar, o que já está bom. Aqui é o inicio do plantio na área de varzea. Aqui, as aplicações dessas madeiras que estavam aí no mercado, ou no ambiente de floresta. Ai são os outros derivados da madeira de guanandi. A apicultura é bastante comum na região (acima). O segundo Mutirão Agroflorestal do Vale do Paraíba, que já tem 62 famílias assentadas no Movimento dos Sem Terra, e outros agricultores na região. Aqui, áreas de formação de madeira acá189


8º Bunkyo Rural

cia com aveia, e uma área com mogno, guanandi e acácia, que são arranjos florestais, todos da região do Vale do Paraíba.

Enfim, isso é o que tinha para mostrar hoje em termos de arranjos vegetais. Obrigado gente, desculpa falar demais.

190


8º Bunkyo Rural

OBAATIAN CHÁ DA VOVÓ Palestrante: Swan Yuki Hamasaki Diretor de Marketing da empresa Obaatian - Chá da Vovó

Quase boa tarde. Eu vou finalizar aqui com o nosso chá, mas antes de começar a minha parte aqui, eu queria falar que a gente mora no bairro do Cambuci, em São Paulo. A minha avó acabou de plantar nesta região, então, eu me identifiquei muito com as apresentação que vi aqui no 8º Bunkyo Rural, vamos lá. Obaachan quer dizer vovó em japonês. Minha avó começou essa empresa, e antes de mais nada eu vou falar do chá. O que é esse chá. Temos que explicar para as pessoas que o chá preto e o chá verde são da mesma planta. Quando a gente fala do chá preto, do chá verde, do chá brasileiro e alguém pergunta: "E o chá de hortelã?" O chá de hortelã é de hortelã, é uma infusão da planta hortelã. O chá preto vem de uma planta que se chama Camellia Sinensis cujo nome popular é chá. Então, a palavra chave em português tem origem nessa planta. É chá. Dá uma confusão enorme na cabeça das pessoas. Então eu arrumei um nome popular para gente chamar o nosso chá. O chá não é nativo do Brasil, ela vem do Sul da China e do Norte e Nordeste da Índia. Ela é muito autosuficiente, não demanda tantos insumos e está bem adaptada no Vale do Ribeira. Só que a gente teve um 191


8º Bunkyo Rural

pequeno problema lá naquela região com essa planta, houve uma crise ali na região. Na região do Vale do Ribeira tinha mais de 1000 produtores de chá, e mais de 40 fábricas e todas fecharam as portas. Acho que existe uma ou outra marca que ainda tem um produto, tem uma outra marca, tem uma fábrica que acabou voltando, mas desde aquela década de 90 para cá, foi uma queda vertiginosa no mercado dos chás. Em 2011, a minha avó produzia ainda chá, ela vendia como produtora rural, e ela vendia para uma fábrica. Só que essa era a última fábrica ativa na região e parou de funcionar. Foi o encerramento da era do chá. Só que minha avó não desistiu. Em 2014, ela foi para o ferro-velho, e comprou as máquinas de beneficiamento do chá que estavam sucateadas. Mandou reformar tudo e abriu a sua própria fábrica de chá. Isso aconteceu em 2014, quando ela tinha 87 anos, e hoje ela está com 90 anos. Três anos de estrada e é difícil comparar com os outros projetos que a gente vê. Só que estamos entusiasmados com o que conseguimos. Hoje a

192


8º Bunkyo Rural

gente tem o valor de vendas que é equivalente ao valor de produção. Vamos produzir mais, só que a gente não quer parar por ai, a minha avó tentou recuperar a produção do Chá no Vale do Ribeira, com o objetivo de recuperar a região. A minha família saiu de lá e o Vale do Ribeira é um lugar que parece que vai mas não vai, você acha que vai sair algo, mas não sai, você vai começar alguma coisa, mas não começa. Mas a cidade vai crescendo e esquece do produtor rural, que sustentou e sustenta aquela região. A lógica da urbanização e da desvalorização local saiu da capital e foi para a zona rural. E nem quem mora lá valoriza, e isso é muito triste. Quando a minha avó começou esse projeto, ela começou com esse ideal. Essa é a história da nossa marca, ela tem 3 anos de história, e a gente passou por uns bons bocados até chegar aqui. Tivemos ajuda de muita gente e a minha avó sempre pensava isso, ela só conseguia viver do chá dela com a ajuda dos familiares, que ajudaram bastante, netos ajudaram bastante, entidades ajudaram bastante, ela pôde ir para o Japão levar o projeto dela pra lá. Teve produtor do Japão e da China que bancaram a própria passagem direto para o Brasil, para ver o nosso cultivo e orientar a gente. Eles ajudaram a gente por conta própria, inclusive a minha avó mostra lá nos vídeos dela lá. E a gente desde então tem uma amizade muito grande com eles, e eles estão nos ajudando, mesmo de longe. Hoje eu vim pra falar aqui, mais sobre a construção da marca, de como a gente constrói uma marca. A minha formação é de publicidade, eu trabalhei muito mais nessa área do que na área rural, então pra mim está sendo um grande aprendizado, muita coisa legal, e vou falar aqui de como a gente constrói uma marca. Eu vou falar como foi a construção da nossa marca, porque, cada situação pela qual nós passamos, eu espero que vocês possam aplicar, e a gente

193


8º Bunkyo Rural

pode falar aqui em método de exposição. Dessa história da minha avó, que eu contei para vocês, podemos destacar alguns itens. O primeiro deles, que tudo mundo já bate de cara, é a ideia de uma senhora de 87 anos começar um empreendimento. É encantador, é inspirador, e assim, os jornais adoram, todo mundo quer falar sobre isso, todo mundo fica encantado, quando eu falo isso para as pessoas, que respondem: "eu quero comprar o seu chá", então a ideia é de empreendedorismo, com ideais e a fé. No mês passado a minha avó começou a tomar cerveja. Com 90 anos ela falou que ia começar a tomar cerveja, então ela toma um dedinho de cerveja para acompanhar a minha tia. E assim, existe uma coisa muito engraçada sobre a gente falar da avó, porque todo mundo aqui ou a grande maioria tem uma avó, tem um grande muito carinho pela avó, e parece que as pessoas projetam esse carinho numa marca. Quando a gente fala avó, as pessoas entendem, logo de cara o que a gente quer dizer.

Segundo, ajudar a comunidade. A minha avó sempre bateu muito nessa tecla, vender o chá não é só o suficiente, a gente tem que recuperar os outros produtores, recuperar a autoestima dos produtores. Sempre que um produtor recebia uma notícia de que não iam mais comprar os produtos deles, começavam a tirar tudo, entrava em depressão. É uma história bem comum na região por isso ajudar a comunidade era muito importante para ela. Recebemos muitas pessoas que são amantes de chá aqui no Brasil, então é a rota do chá que está voltando. 194


8º Bunkyo Rural

Por último, a ideia de qualidade. Quando ela começou a produzir o chá, ela não produzia como as grandes indústrias que compravam folhas de chá, e depois produziam na fábrica. Ela começou a fazer como era feito no passado, tanto que a gente está bem defasado, podíamos modernizar alguns processos, mas assim com colheita manual, ela colhe na mão o chá, e depois processa tudo artesanalmente. Para você fazer um chá gostoso, você não pode cortar a folha, tem que colher o fruto, existem máquinas que fazem isso, fazem a separação, e tudo mais, mas no caso do nosso sítio, além da gente não fazer o uso dessa máquina para o plantio, existe a questão de incentivar e especializar a mão de obra dessa região. A ideia de colheita manual, de processo de qualidade do chá, olhando hoje o mercado como está, vejo que poucos estão indo nesse sentido.

195


8º Bunkyo Rural

Em resumo, para a produção de chá de boa qualidade são esses 4 pontos, que eu tiro da história da minha avó: Empreendedorismo, carinho e afeto, comunidade e qualidade. São os valores, coisas e princípios que eu tirei da história da minha avó, da história que ela conta, da história que as pessoas enxergam dela, então agora eu vou falar um pouco sobre a imagem e a identidade. Quando eu falo de construir uma imagem, a imagem é o que os outros enxergam de mim. A minha imagem perante a minha mãe é diferente daquela diante de meu pai, assim como a imagem que minha esposa tem de mim é diferente daquela de meu pai e também a da minha mãe. Eu era professor, os meus alunos tinham uma imagem de mim muito diferente do que os pais dos alunos tinham de mim. Imagem é o que os outros enxergam de você. Agora identidade é um conceito muito mais pessoal. É a sua identidade, o que você se identifica, o que você constrói, o que você quer ser e o quanto você se esforça para ser quem você quer ser. Identidade está mais ligada com a sua visão sobre si próprio, como você constrói isso. A gente tem essa idéia de vender uma imagem, quando a gente está falando de uma imagem, a gente está falando de como tentar convencer a outra pessoa no ambiente onde eu estou falando da minha marca. Estou aqui vendendo a minha marca, então é bem diferente de construir uma identidade, são duas coisas completamente diferentes, construir uma identidade é uma atitude de uma pessoa, que diz muito mais sobre ela, do que ela diz sobre ela mesma. Se ela vem falando pra mim: "pô, eu sou muito gente boa, cara", quando uma pessoa fala isso para mim eu já não confio nela, certo. Ela tem que te dar o espaço para você conhecê-la, só que se o cara me ajuda sem cobrar nada em troca, isso diz muito mais sobre ela, do que ela diz para mim.

196


8º Bunkyo Rural

Então, quando a gente vai construir uma identidade, ela tem que ser verdadeira, ela tem que ser sincera, não pode pegar esses 4 itens do nada e querer vender. Todos os projetos que foram apresentados aqui são muito sinceros, eu tenho certeza que quando a gente fala do pequeno produtor, a gente está trabalhando com coisas muito pessoais, histórias de vida, de famílias. É até chato a gente tentar vender uma coisa que não é verdade, esse tipo de ideia de vender uma imagem, não dá certo. Teve até gente que ligou para minha avó lá e falou assim: " E aí, essa velhinha existe mesmo?" Minha avó ficou possessa e respóndeu "eu existo sim, eu ainda não morri" para um jornalista da cidade Quando eu vou construir uma identidade, como é que eu construo? Como é que eu gero atitudes para minha marca? Primeiro, a ideia de qualidade, como é que eu construo a ideia de noção de qualidade? E eu não vou nem bater na tecla, por exemplo, de saúde, porque saúde, quando fala: "meu chá faz isso", legal, mas todo mundo hoje em dia já sabe disso, todo mundo já toma chá para isso, para aquilo, só que chá não é remédio. O problema do remédio é que ele tem demanda negativa, ninguém quer comprar remédio, só começa a tomar quando precisa, então, se eu for vender o meu chá como remédio, pega mal pra caramba. E outra coisa, chá não é que nem um remédio, a gente toma porque a gente gosta, se eu não gostasse eu não tomava 1 litro e meio de chá por dia. Desde criança a gente toma chá, é de manhã é chá depois do café, depois do almoço chá, no lanche da tarde chá, eu tomo chá em 4 estações do dia. Já é um habito, já criou uma coisa rotineira para gente, e a gente não toma porque faz bem, se faz bem para a saúde eu acho que é uma conseqüência. Quando você falou para mim no Cambuci, que tem gente com diabetes, eu até pensei o contrario, quem sabe a gente está tendo 197


8º Bunkyo Rural

aquele surto de diabetes, um surto de doenças porque a gente vai deixando de consumir coisas que antes eram normais. A gente volta a consumir coisas que são da nossa terra, que são da nossa cultura, e ai de repente o nosso povo fala: pô, era isso que estava faltando. Então eu acho que tem um pouco disso. A crença da comunidade. A gente está construindo, a gente não está simplesmente dizendo, a gente quer construir o negócio para os nossos vizinhos, tanto que o nosso próximo projeto é pegar as pessoas que estão produzindo chá, querendo produzir chá, só que não tem estrutura, e a gente está colocando eles dentro da nossa cadeia, e usando a nossa marca para vender. Assim eles crescem e a gente cresce junto, e a gente fortalece a comunidade. Carinho e afeto, esse é um conceito que é muito difícil de explicar e difícil de transmitir, só que na verdade isso acaba acontecendo naturalmente. Quando as pessoas veem um post no facebook ou quando eu escrevo alguma coisa da minha avó, as pessoas já logo sabem, que eu estou falando da minha avó. Quando eu estou em alguma feira e eu falo assim: "ó, esse é o chá da minha avó". As pessoas já sabem que tem um carinho muito grande, então o fato da família dela estar envolvida com o chá dela, já agrega valor, já agrega algo à essa idéia. E por fim, a ideia de empreendedorismo, eu já nem bato muito nessa tecla, que ela é chata para caramba, e está super na moda, todo mundo fala sobre isso, todos os jornais falam sobre isso. É assim, falar para o produtor pequeno sobre empreendedorismo, é como se o trabalho dele não valesse, porque a gente está lá na lavoura todos os dias, e ouvir falar: "pô vamos lá, não sabe ser otimista". Eu acho um discurso bem chato, então a gente não bate nessa tecla que muitos jornais batem, e é assim que a gente constrói a nossa identidade, trazendo atitudes e ações que carregam esses valores, só que de forma sincera e de forma verdadeira. Como eu agrego esse valor ao produto final? O cara vai lá pegar meu produto, e ele vai olhar e falar, meu, tudo que eu construí, toda aquela história que eu contei, tem que estar agregado naquele produto final que ele vai levar para casa, e ele vai tomar esse chá. Na hora que ele tomar esse chá, essa pessoa vai sentir tudo isso que eu contei? Ela vai pensar como é que eu faço para tomar isso? E o pior é que é uma questão bem simples, e é com isso que eu fecho aqui a minha fala. 198


8º Bunkyo Rural

São 4 faces, que a gente abre aqui. A primeira é a embalagem. Não dá para contar tudo numa logomarca, não dá para falar tudo, agregar todos os conceitos em uma bandeira. O que a gente consegue fazer? A gente consegue criar uma identidade visual, a gente consegue criar uma embalagem com toda uma decoração, que seja passível de receber significado. O que isso quer dizer? Eu tenho uma logomarca que não diz: Olha só, o meu chá significa comunidade, só que eu não tenho nada naquela marca que diz que eu sou egoísta. Eu não estou falando: gente olha só, eu sou uma pessoa que está preocupada com a emissão de carbono, só que eu não vou colocar nenhum símbolo no meu logo que tenha alguma coisa a ver com fumaça, porque não vou conseguir agregar esse valor. Construir uma marca é basicamente deixar ela passível de receber significado, então o designer entra e a partir daí através da propaganda, insistência para gerar familiarização, a gente insiste tanto, bate nas 4 teclas que eu falei, e as pessoas aos poucos vão vendo e criando familiaridade com essa idéia. Quando elas veem a minha marca elas já olham, já sabem o que eu estou falando com aquilo, então quando ela tomar o nosso chá, ela sabe de onde veio, ela sabe o significado, e para fechar esse ciclo, existe a visitação ao sítio. Ali a gente deixa as portas abertas, se a pessoa quiser verificar a 199


8º Bunkyo Rural

história que a gente está contando, ela pode chegar lá, bater na nossa porta, que a gente vai estar com as portas abertas para recebê-la. E essa é a parte que a gente vai ter que desenvolver agora, e esse é o desafio, como a gente agrega todos esses valores, em uma experiência rural, uma experiência no sítio, uma experiência no passeio, e não é nada fácil. Então gente, muito obrigado.

200


8º Bunkyo Rural

ALHO NEGRO DO SÍTIO

Palestrante: Fernando Kondo Empresário e distribuidor do Alho Negro do Sítio

No Japão o boom do alho negro começou em 2006, e você vai a qualquer estação do metrô e vê que tem alho negro sendo vendido. Mas no Brasil é bem difícil achar o alho negro. Nós produzimos o alho roxo tradicional há mais de 30 anos e, em 2010, o meu pai (Shiro Kondo, imigrante japonês) começou a fazer experimentos com a produção do alho negro em escala pequena, em panelas, ou em estufas pequenas, e começou distribuir para os amigos e a vender na Liberdade. Bom, na verdade, apesar de ser formado em agronomia em Tóquio e estar há dez anos na área agrícola, minha experiência profissional é diferente. Eu trabalhei na área de informática, no Japão e aqui no Brasil, durante dez anos. Só 201


8º Bunkyo Rural

que em 2012 eu acabei deixando o emprego para abrir um negócio na área de informática também, e foi aí que eu fiz um site para o meu pai, do alho negro (http://alhonegrodositio. com.br), e aí teve uma rede grande, que é o São Marchê e eles entraram em contato. E foi aí que o alho negro começou a deslanchar no mercado. Já existiam dois empreendedores em São Paulo, acho que todo mundo conhece, a Marisa Ono e a Rossi, que são famosos hoje. O alho negro está aí no mercado, mas como a gente tem essa pegada de agricultor e a garantia de origem, a gente começou a se destacar um pouco mais no mercado. Em 2014, a gente abriu um CNPJ próprio e começamos uma produção em grande escala. Bom, como eu era da área de informática, no começo o nosso principal segmento era o e-commerce, mas hoje o atacado é maior. O atacado em restaurantes e o varejo, mas no começo era o e-commerce. Em 2015, começamos fazendo um investimento grande na assessoria de imprensa para a gente conseguir divulgar mais, porque ninguém conhecia, e hoje a gente está em uma outra etapa e produzindo vários derivados com alimento. Bom, agora eu quero dizer o que é o alho negro. O alho negro na verdade é o alho que é negro dessa forma mesmo. Na 202


8º Bunkyo Rural

verdade, é um alho normal que passa por um processo de maturação, na verdade eu coloco o alho roxo, que a gente colhe no sítio, a gente coloca no forno por duas semanas mais ou menos. A gente deixa mais uma semana descansando em uma temperatura de 65ºC mais ou menos. E aí o que acontece, na verdade, é igual quando a gente coloca a cebola no fogo baixo e vai caramelizando. A reação é conhecida como "maillard"e aí é o próprio açúcar do alho que ele ressalta. Então, por isso ele tem um sabor adocicado, e a cor negra é uma oxidação, é como quando a gente descasca maçã, banana, ele tem contato com o oxigênio e fica negro. É um processo bastante parecido, só que o alho tem o zinco, então nesse forno, nesse processo de maturação, ele fica negro e o bacana é que assim, todas as propriedades do alho se mantêm, e como eu falei àquela hora. Polifenol, como ele é potencializado, ele é muito vendido para a saúde fora do Brasil. Além de antioxidante, que aqui no Brasil quem tem pressão baixa sabe que o alho ele afina o sangue. Ele dá tontura porque ele afina o sangue e abaixa a pressão, e como no Brasil tem muita gente com problemas sangüíneos, tem que evitar tudo que entope veia, causa varizes, trombose, infarto, colesterol e pressão alta. A gente tem muitos clientes que não podem tormar remédio químico embora tenham varizes e sintam dor, então eles compram bastante o alho negro com a gente, como alimento funcional. Há também pessoas com arritmia cardíaca, mas esses são mais pontuais, não são em grande volu203


8º Bunkyo Rural

me, felizmente. O alho negro antigamente era tudo com a casca, então a gente vendia nos potes. Hoje nós já trabalhamos com alho descascado e moído. A gente começou a colocar no forno o alho já descascado e esse na verdade virou o nosso carro-chefe. Inclusive nas lojas a gente vende mais o alho descascado, em embalagens de 100 gramas, e para restaurantes vendemos em embalagens de 1 quilo. O alho roxo, muito consumido em restaurante ou padaria, é pedido toda semana. Mas no caso do alho negro, que hoje é utilizado em pizzaria, às vezes fazem pedidos pequenos, em quantidade mais baixa, pois ninguém conhece. Então a gente começou a fazer derivados há mais ou menos um ano, e isso tem dado bastante certo. Assim como todos os agricultores nós temos um problema de custo fixo muito alto, e quando a gente entra num varejo a gente vê que nos meses de janeiro, fevereiro e março a gente não vende praticamente nada e esse é um grande desafio para todos. Aí surgiu a idéia de fazer esses co-brandings. Co-branding na verdade é a união de duas marcas. Quando a gente participava de diversas feiras, encontrava produtores, por exemplo, de manteiga ghee, este amarelo é uma manteiga ghee, e o que a gente fazia, se unia com eles e fazia uma co-branding. Todos os produtos iam com o logo deles e o nosso. Como a gente compra e vende, se as vendas caem, também não tem problema porque a gente não precisa comprar. Isso rende mais de 30% do nosso custo variável. Isso tem mudado muito a saúde financeira. Inclusive a pasta de alho negro, nós descobrimos recentemente, nós estamos no laboratório pesquisando agora, que ele é um amaciante de carne natural. Esta semana participamos de um evento em São Paulo. Colocamos dois contra-filés, um com a pasta e o outro sem a pasta, o mesmo pedaço. Quando você pega um ele está duro e 204


8º Bunkyo Rural

o outro fica totalmente macio, parece um filé mignon. Isso se aplica a frango, peito de frango, assim, estamos na verdade fazendo novos produtos além do alho negro, para ter maior lucratividade nas prateleiras. Bom, o nosso mercado é composto de empórios e lojas. Na capital em São Paulo estamos nos principais pontos, no Inter, no São Marche. A gente tem várias lojas também, mas um terço do nosso faturamento vem de pizzarias e em restaurantes. Em pizzarias eles utilizam, como ele é adocicado, ele tem aquele saborzinho doce, numa brusqueta, num queijo, num alho e óleo. Então ele é vendido bastante assim para diversas pizzarias e restaurantes. Por exemplo, eles usam no salmão, então uma porção mais para finalizar prato, eles pegam e colocam um pedacinho de alho negro, aí quando eles colocam e comem, ele vê aquele sabor doce, que é meio trufado. Recentemente estamos trabalhando nas principais feiras e eventos, da capital de São Paulo, como Naturaltech, Equipotel, para a gente conseguir divulgar e também aumentar o capital de giro, que é um problema muito grande para todo produtor. Temos projetos ainda para este ano, de produtos orgânicos, 205


8º Bunkyo Rural

porque todos os nossos parceiros praticamente trabalham com produtos orgânicos. Já fizemos alguns workshops de culinária de alho negro, mas a gente precisa fazer mais, mas esses que são pagos e que ajudam bastante também a divulgar, principalmente agora no final do ano. Temos alguns projetos também de sustentabilidade, de redução dos custos, de energia limpa, e também com embalagem, e esse estudo do alho negro como amaciante de carne natural. Está OK? Bom, já deu mais ou menos 15 minutos, então acho que temos algumas perguntas, eu vou finalizar por aqui. Pergunta: Sr Fernando, com relação a essa propriedade terapêutica do alho negro, tem alguma confirmação? Fernando: Sim, no Japão na verdade, o alho é um dos alimentos que mais tem polifenóis, existe um projeto que chama Designers' Food e na

verdade foi o resultado disso que começou a ser utilizado para prevenir o câncer no Japão. Mas existe uma biblioteca que chama Biblioteca Online do Instituto Nacional de Câncer e de Estudo Nacional da Saúde dos Estados Unidos, que chama MCBI, é uma sigla, e se colocar "MCBI black garlic" o senhor vai encontrar vários artigos científicos já comprovando a qualidade do alho negro, que junta várias pesquisas de universidades. Além disso, no Japão tem vários livrinhos assim. No Japão você vai ao metrô, e em qualquer estação tem gente vendendo o alho negro, mas para fins de saúde. Este ano, assim como o ano passado, minha mãe foi visitar um produtor em Kanagawa, eles também estão começando a diversificar alguns produtos, mas ainda acredito que lá é um pouco diferente, mais para a saúde mesmo. Pergunta: Qual o maior problema que enfrentam com o alho? Olha, até o começo do ano a gente tinha muito problema de capital de giro, porque nós colhemos o alho e para se tornar vendável demora mais ou menos 1 mês, mas ainda precisamos colocar em estufa por um tempo, gastando energia. Para vender e finalmente receber o pagamento leva mais ou menos cinco meses. Isso requer muito capital de giro para pagar as contas desde o início da

206


8º Bunkyo Rural

produção. No São Marchê, por exemplo, eles pagam em 48 dias. A estufa era complicada para controlar, o tempo variava bastante, podia demorar 25 dias ou 35 dias, não se sabia ao certo. E dependendo do tempo, a qualidade ficava ruim. Nós tiramos a estufa e fizemos um secador, que resolveu o problema. Agora, como todos os produtores pequenos, temos problemas com a parte comercial, não queremos pegar distribuidor ainda, e a gente está com vários representantes. O distribuidor cobra 25% para 30% de margem, e o representante pequeno, a médio e longo prazo, seria um distribuidor, mas agora estamos trabalhando com vários representantes. Perguinta: Existe uma preocupação de vocês com a literatura, de divulgar, de ter esses vários livrinhos, e como vão divulgar as propriedades do produto? Fernando: Olha, a gente tem essa dificuldade, mas na verdade, hoje a gente usa muito e-mail, e além do Instagram e do Facebook, a gente tem uma pessoa que é recém-formada no Mackenzie em marketing, então isso ajuda bastante, mas hoje a gente faz um mailing. Quando a gente vê que tem algum estoque enviamos alguns e-mails e isso facilita bastante, mas trabalhamos em eventos, que é um pilar muito for-

te, porque conseguimos vender. Assim, participamos de todos os eventos que conseguimos participar. Pergunta: quantos pedaços dá para comer? Fernando: Olha, isso depende muito do corpo de cada um. No Japão, eles vendem sete dentes em um saquinho embrulhado e às vezes fica 1 semana a 2 semanas. No Brasil, alguns nutricionistas dizem que depende do corpo de cada um. Quem tem o corpo mais limpo fica com um efeito, agora quem bebe muito tem outro resultado. O ideal é consumir pelo menos dois a três dentes por dia, por um período razoável e a gente consegue sentir a diferença no corpo. Pergunta: A variedade do alho adequado para fazer o alho negro? Fernando: Olha, a gente fez com alho chinês, alho argentino e alho roxo. O nosso roxo é mais forte, então

207


8º Bunkyo Rural

para gastronomia é melhor. Pergunta: Sobre as propriedades terapêuticas, o alho é antioxidante, mas se oxida com a estufa, como ficam os polifenóis? Permanecem? Fernando: Eu não sei responder isso. Na verdade, eu sei que ele tem muito polifenol, depois de fermentado, e acredito que a cor negra deve ser porque está oxidando o zinco. Isso eu sei porque isso é científico, mas estudos comprovaram que o polifenol é potencializado em 10 vezes mais, por isso, para prevenir o câncer é muito bom. No Japão é vendido como sendo bom para pele, funcionando como antioxidante.

208


8º Bunkyo Rural

CRIAÇÃO DE PEIXES CONJUGADO COM HIDROPONIA Palestrante: Profa. Luciana Thie Seki Dias Professora Associada II do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de São Carlos

Muito obrigada a todos. Muito obrigada pelo convite. É um prazer estar aqui participando deste 8º Bunkyo Rural, é com muita alegria também que recebi esse convite do Marcelo Castanholi e do Mario, os parceiros nossos de trabalho, de pesquisa da Universidade Federal de São Carlos. Hoje a gente tem a missão de falar um pouquinho a respeito do cultivo de peixes conjugado com a hidroponia. Então, quando a gente pensa no cultivo de peixe com hidroponia o que será que é isso daí, é alguma coisa muito mirabolante, muito diferente, como é e como funciona. Bom, se a gente pensar que a hidroponia é uma coisa muito nova, uma técnica muito nova, inovadora, eu diria que não. Porque desde muito tempo, desde antes de Cristo, nós temos, por exemplo, essa imagem que é um cultivo de cana, onde tem algumas graminhas, aqui tem bois pastando e está nas margens do rio Nilo, no Egito. Desde a época do Egito Antigo já existia, não com a técnica, não com a ciência de hoje, mas tinha a ciência de que se esse rio aqui inundasse, quanto maior o nível de água, maior seria a produção de grãos de milho, de soja, en209


8º Bunkyo Rural

fim, de tudo que estaria sendo produzido no Egito. E da mesma forma aqui num plantio de arroz com carpas lá na China, já era sabido também que quando você colocava peixes junto com o cultivo de arroz você melhorava então a produtividade daquela cultura. E não precisa ir muito longe, aqui no Delta do Parnaíba, isso aqui são plantas de arroz. Nesse momento estava alagado, estava inundado, mas depois de certa hora do dia a inundação cede, então os terrenos ficam só úmidos, só encharcados. Tanto no Egito quanto na cultura do arroz na China ou no Brasil já existia a utilização desse consórcio, ou seja, a utilização de peixes junto com culturas vegetais. Então um pouquinho da história da hidroponia e podemos lembrar dos Jardins Suspensos da Babilônia e que na evolução do tempo nós tivemos o Marco Polo lá na China dizendo muito a respeito de cultivos em água, como já mostramos ali na foto anterior. E com o passar do tempo, a primeira pessoa que usou o termo hidroponia foi esse pesquisador americano da Califórnia, o W. F. Gericke, que na década de 1930 começou a falar em hidroponia, e começou a fazer pesquisa com soluções nutritivas, mas, começou por um acaso. Naquela época, o que eles queriam fazer, o que os pesquisadores americanos desejavam? Simplesmente observar algumas situações onde eles queriam promover deficiência nutricional na planta. Então, eles iam colocando ou tirando elementos de dentro da água e cultivando plantas dentro da água, pra ver qual era o sintoma de deficiência desses elementos, e a partir desse momento então, eles começaram a observar que era possível o cultivo de plantas dentro da água, desde que se respeitassem a necessidade nutricional dessas plantas. Foi o inicio da hidroponia no mundo. E no Brasil? No Brasil, a história da hidroponia se deu em 1988, com quem, com o doutor Pedro Furlani, que foi doutor, recebeu títulos de doutor em 1981 lá no Nebraska e ele foi pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas. Ele começou a trazer essa ideia de lá dos Estados Unidos, o que ele aprendeu e começou a falar de hidroponia no Brasil. E depois que o doutor Pedro Furlani começou com essa ciência, essa nova ciência, nós temos o 210


8º Bunkyo Rural

doutor Diego Weber, que foi quem instalou em 1990 a primeira hidroponia comercial do Brasil. Foi notícia no jornal Folha de São Paulo no dia 17 de Novembro de 1990. Ele era novinho aqui na foto da época, mas já muito respeitado então e nesta foto mais recente, já um senhor, e foi quem começou com tudo isso. Então em 1990, se iniciou o crescimento da hidroponia no Brasil com diversos cursos, principalmente no CPT - Centro de Produções Técnicas, que naquela época tinha bastante curso, vídeo aulas tal, mas não tinha internet, naquela época então se utilizava a fita VHS. E a gente tem até as culturas muito, muito recentes como a Brunela que foi desenvolvida lá dentro da Universidade Federal de São Carlos pelo professor Fernando César Sala. É uma alface gourmet sendo produzida aqui no Brasil, e a gente tem hoje dentro da indústria hidropônica alguns exemplos de empresas que estão trabalhando e algumas dessas empresas, como a Sakata, por exemplo, faz parte deste evento aqui. Não só a Sakata, mas todas as outras empresas agrícolas também participam, direta ou indiretamente, do processo do cultivo hidropônico. Qual é a vantagem da hidroponia? A vantagem da hidroponia, principalmente 211


8º Bunkyo Rural

a alface, que é o carro chefe de todas as nossas saladas, é que se consome tanto no inverno quanto no verão. Mas não só as folhas, mas também as frutas e outras olerícolas. A qualquer hora e dia que a gente chega numa grande rede de supermercados a gente consegue comprar esses produtos. Não só em questão de tecnologia hidropônica, mas a gente precisa falar também que temos hoje, cultivos protegidos, não só de plástico, como era feito logo no começo dos cultivos protegidos, mas a gente tem tecnologia de ponta. Empresas como a Sansuy conseguem aquecer, manter a temperatura dentro de um galpão ou até resfriar o interior de um galpão, graças a essas tecnologias modernas que se tem hoje. Então, aliando as diversas ciências com a hidroponia e a nutrição de plantas, e mais o cultivo protegido, a gente tem, uma planta viva e sendo comercializada em diversos setores do mercado. É possível colocar a marca do produtor e o tipo de alface, e colocar como se fossem expor flores dentro de um supermercado. A durabilidade é muito maior porque ela vai ser comercializada com a raiz, então ela ainda consegue extrair água, pelo menos água, pra não perder aquela crocância e a rigidez das folhas. Isso serve só para alface? Não, a gente tem outros tipos de olerícolas. Uma coisa que está muito em moda, principalmente para quem está nas grandes capitais e grandes cidades, é a aquisição de plantas pequenas com raiz. Nós temos os baby leaf (plantas que ainda estão em crescimento) e que são comercializados largamente e principalmente em grandes centros. Rúcula sendo produzida também em siste-

212


8º Bunkyo Rural

ma hidropônico, chicória, almeirão, coentro e todos os outros tipos de tempero, salsa, cebolinha e couve de folhas. É possível ter couves. Aquela couve com a qual a gente faz salada refogada é possível que tenha também hidropônico. Olha, algo muito inusitado como rabanete. Um pouquinho di-

213


8º Bunkyo Rural

ferente porque ele ainda tem uma outra tecnologia agregada para poder desenvolver. Nós temos pimenta, vários tipos de pimenta, tanto pimentas doces, quanto pimentas ardidas. Muitas das pimentas tiveram melhoramento genético aqui dentro do país. Morango, com o advento do hábito de 214


8º Bunkyo Rural

consumir comidas saudáveis com menos agrotóxicos. É possível então a produção de morangos em regime protegido. Morango é uma cultura que se via só no inverno e hoje é possível ver em outras estações do ano. Pepino é uma outra cultura que exigia bastante agrotóxico. Com hidroponia e mais o

regime protegido é possível a diminuição de insumos agrícolas. No tomate, outra cultura que utiliza bastante defensivo, é possível também. Não sei se todos conhecem, mas isso é uma hidroponia aqui na vizinhança de vocês, é muito bonita, por sinal. E hoje a gente planta o que? Com aproximadamente dois mil hectares aqui no Brasil, o crescimento ao redor de 30% ao ano. 30% pensando bem é um grande crescimento com empresas ligadas, direta ou indiretamente a essa cultura de hidroponia. Então, se você pensar na Sansuy, já que estamos falando de cultivo vou pensar na Sansuy. Sansuy tem ligação direta com hidroponia. Por exemplo, as coberturas da Sansuy são utilizadas para manter temperatura ou perder temperatura. Você pode pensar em emprego direto dessa empresa, e assim por diante para todas as outras empresas, 215


8º Bunkyo Rural

empresas de substrato, empresa de nutrientes e minerais, e assim por diante. Embalagem, saquinhos motoristas de caminhão que fazem o transporte dessas olerícolas e até o próprio fabricante do caminhão, de tratores, maquinários e equipamentos. Ah, é possível trabalhar com uma mão de obra treinada, claro. Vamos ter produto de maior qualidade, porque já vai embalado, já sai embalado de dentro do galpão. Essas telas vermelhas aqui são telas para dissipar raios solares, dependendo da cor da tela, tem tela preta, tela vermelha, cinza. Tem algumas empresas que já estão trabalhando com essas colorações de telas, para controlar melhor o ambiente de cultivo. São vários tipos de canaletas, de vários tamanhos e bocas, para poder

passar água. Cada cultura exige um tipo para esses canais de cultivo. E tudo isso gera muita pesquisa dentro das universidades e institutos de pesquisa. Graças a essa tecnologia, essa modernização do campo é possível os professores irem divulgar seus estudos em congressos específicos de hidroponia, assim como é possível a nossa presença aqui hoje conversando diretamente com muitos produtores rurais. Vocês acompanharam dentro de universidades o lançamento de variedades de alface, e como está essa hidroponia aqui no país? Quase 100% da hidroponia brasileira 216


8º Bunkyo Rural

segue esse modelo. Ficam as soluções nutritivas aqui em baixo, um balcão com um certo declive onde ficam os canos, e as culturas aqui, seja alface, pimentão ou o que for plantado. Ele fica correndo essa solução nutritiva por aqui e cai num outro tanque, então a gente tem o que normalmente chamamos de que Sistema NFT (Nutrient Film Technique ou Técnica do

217


8º Bunkyo Rural

Fluxo Laminar). Qual a maior vantagem da hidroponia nos dias atuais? Nós tivemos uma seca muito grande aqui no Estado de São Paulo, de 2014 para 2015, e até hoje a gente não conseguiu se recuperar, por mais chuvas que tenham tido nos últimos anos. Do ano passado a este ano choveu até pouco tempo atrás, em junho, mas nós não conseguimos recuperar essa quantidade de água que tinha dentro dos nossos reservatórios. A gente tem o que? Vamos pensar em alface. Uma alface no cultivo hidropônico, 4 litros de água, enquanto que no solo, no canteiro convencional de terra é necessário de 25 a 30 litros por planta. Então é uma quantidade assim muito grande que economizamos. E pensando numa quantidade muito grande de água nessa escassez hídrica, que nós estamos enfrentando, cada vez mais nós temos que trabalhar com o uso racional da água, pensando sempre em 218


8º Bunkyo Rural

sustentabilidade, em produções sustentáveis. Então, nós já falamos que lá desde a época da China Antiga, do Egito Antigo já tínhamos a utilização de alguma técnica com pouca ou muita água. Na época já tínhamos o cultivo de peixes, associados ou não com a vegetação, então, com a necessidade de água e com a necessidade crescente de prote-

219


8º Bunkyo Rural

ína animal. Não adianta a gente pensar que nós podemos cavar tanques, que nós temos grande quantidade de água sem a gente pensar numa utilização racional desse recurso. Então, com a exploração de peixes, nós temos vários tipos de exploração, desde tanques escavados que não precisam ser revestidos, até tanques onde precisam de revestimento por estarem localizados em solos arenosos demais, onde não daria para cultivar peixe, mas essa água é uma água que seria descartada no ambiente. Precisamos de tecnologia para poder produzir plantas aqui ao fundo com o resto dessa água que sai da criação de peixes, e o próprio peixe aqui dentro. Nessa linha de aquaponia, existem várias formas que a gente pode pensar para proporcionar a utilização racional de água para produção de peixe e de plantas. Um modelo bem tradicional de produção de tilápias aqui no país utiliza tanques em braços de rios, ou em rios ou em grandes represas. Essa é uma exploração que a gente tem trabalhado bastante. Aqui é um workshop que a Sansuy ajudou a realizar lá na Universidade, são tanques de grande volume, retangulares, redondos e circulares. Isso aqui é o cultivo de plantas e a gente pode colocar um tanque de peixes, porque a gente viu que existem varias formas de exploração de peixes. É possível varias formas de exploração, então nós precisamos ajustar esses tanques de peixes a essas cana220


8º Bunkyo Rural

letas. Nós expusemos o equipamento dentro do estande da Sansuy. Aqui são outras feiras que a Sansuy realizou. Uma forma de melhorar a qualidade de água dos peixes é fornecer os nutrientes necessários para essa planta. Aqui neste tanque de peixes não é necessário mais colocarmos soluções nutritivas porque os próprios peixes se alimentam de ração, fazem, excretam fezes e urina dentro dos tanques e esses dejetos servirão de nutrientes para essas plantas. Se pensarmos em desenvolvimento sustentável, produtividade sustentável de plantas e peixes, temos uma diminuição da utilização de água, uma otimização dessa utilização de água, e nós temos a possibilidade de diminuição ou até a não utilização de nutrientes para essas plantas. Isso aqui é uma outra feira também com a mesma tecnologia. Alguns eventos que nós estivemos dentro da Universidade, onde nós realizamos ativi221


8º Bunkyo Rural

dades com alunos do Colégio Agrícola de Segundo Grau, porque eu acho que é uma tecnologia que nós conseguimos levar, divulgar amplamente para diversas faixas etárias. Nós podemos mostrar as tecnologias que estão ao alcance e mostramos que podemos produzir plantas.

Esse aqui é um outro sistema, é um sistema de floating. Aqui a água fica passando, mas precisa tomar certo cuidado porque tem que ter o tempo de aeração ou tem que ter um tempo seco para que essas raízes não apodreçam imersas dentro d'água o tempo todo. É um outro tipo de tecnologia. E ai a gente fica pensando: bom, falou, falou, falou e o que a gente pode levar, o que a gente pode pensar, pesquisar mais a respeito de plantas, peixes, hidroponia, aquaponia? Não importa se você vai fazer dessa forma a hidroponia ou a aquaponia, ou qualquer que seja a criação. Se você tem peixes, se tem uma horta, e se você vai usar 100 litros de água por dia pra molhar o canteirinho de salsa, cebolinha, ou alguma coisa que você tem no fundo do quintal. Se você colocar uma caixa e colocar peixe e tirar água daquele peixe do tanque com regador e for lá e molhar sua horta, você já está fazendo o que? Uma forma diferente de aquaponia. Utilizando nutrientes que o peixe está deixando lá dentro da água e reutilizando aquela água que está lá. Então, quando a gente fala de aquaponia, não é uma aquaponia sempre muito grande ou num ambiente macro. Como todo bom descendente de japonês e de algumas raças europeias, sempre tem um quintalzinho, sempre tem um canteirinho onde tem salsa, cebolinha, um "nirá" pra colo222


8º Bunkyo Rural

car no "missoshiru". Se tiver um peixe lá, mesmo que seja um peixe de aquário, se você vai tirar aquela água para molhar uma planta, uma flor, uma roseira, um pé de Azaléia? Sim pode, está carregada de nutrientes, isso é legal, isso é bom. Então por que vai jogar fora a água? Não tem necessidade de jogar fora, então vamos fazer a utilização racional dessa água. Então a ideia central não é só focar em grandes produções, dá pra gente pensar também pequenininho dentro de casa. Não sei se fui clara, não sei se sobraram, ficaram muitas dúvidas, se a gente puder esclarecer alguma coisa. Então, muito obrigada pela atenção. Pergunta: Estou criando tilápias, tilápia nilótica. Como a tilápia come simultaneamente ração industrializada e a celulose, a gente não tem perigo de comer sashimi de tilápia? Luciana: Quando a gente pensa em peixe a gente sempre pensa assim. Eu vou responder fazendo outra pergunta para o senhor. Se você vai num pesqueiro e você tira o peixe, se você vai num rio e pesca o peixe. O peixe, claro, quando você pescou está vivo. Você põe, tira do anzol o bicho, que fica pulando. "Nossa, esse peixe aqui é bom para fazer sashimi, está fresquinho". O peixe está fresco, lógico, ele estava vivo. Então, você corta ali no barco mesmo ou na margem e faz o sashimi. O gengibre sempre cabe dentro do bolso. Rala ali ou usa wasabi. Agora tem em pasta não precisa mais nem ficar preparando. Você está achando que esta consumindo um peixe bom, de boa qualidade? Depende da qualidade de água. Então, o peixe está vivo, o peixe está bonito, tirei ele do rio. Muitas vezes, não dá para responder com 100% de certeza o que é bom ou não porque eu não sei o que tinha dentro daquela água. Se de repente quebrou um termômetro dentro daquela água, um termômetro? É, um termômetro, pode ter mercúrio lá dentro, e o peixe sem querer comeu aquilo lá. Será que aquele peixe está legal ou não? Não. Então não é por que ele esta vivo que está fresco, não é por que está fresco que está bom. Então, tem que ver a qualidade da água onde esse peixe está sendo criado. A qualidade de água está boa porque eu crio num lugar que eu sei, eu coloco água de nascente. Mas e se você está criando e tem mais dois ou três sitiantes para cima, você não sabe o que esse cara fez com a água, e essa água esta chegando para você. Então não dá pra gente responder é bom ou não é bom. Por que é bom ou não é bom? Porque eu não sei o que tem para cima, eu não sei como é a qualidade da sua água. É uma pergunta difícil, quando a gente trabalha com peixe. Então, respondi a pergunta do senhor, mas deixei um monte de dúvida agora 223


8º Bunkyo Rural

para o senhor pensar. Mas tem meu e-mail aqui caso queira conversar mais, fica à vontade. Pergunta: É possível obter certificação orgânica com a hidroponia? Luciana: Quando a gente pensa em certificação de orgânico a gente pensa assim: A gente tira o agrotóxico, tira o defensivo agrícola então é orgânico. Não. Tem todas as regras para ter a certificação de orgânico. O Instituto Biológico aqui em São Paulo faz esse credenciamento, ele faz esse checklist ali na propriedade e se você tiver dando alguma ração comum para o peixe, a sua alface não vai ser orgânica no sistema de aquaponia. Então, a ração do peixe e tudo o que você vai colocar tem que ser orgânico. Não pode ser só uma parte. Então, se o peixe comer um milho que não foi cultivado organicamente, e que está dentro da ração do peixe, aquela alface da aquaponia não é mais orgânica. A gente ouve: "eu só cultivei alface aqui com esterco, então é orgânico." Não, essa não é a definição de orgânico. O orgânico com a certificação do IBD é outro orgânico, é orgânico mesmo, livre de um monte de insumos agrícolas. Pergunta: E no caso da hidroponia? Luciana: É possível, só a hidroponia é possível, da mesma forma que é possível produzir ovos orgânicos, carne de boi orgânica. Mas tem que pegar a cartilha do IBD e ver o que pode e o que não pode fazer para cada atividade. Produzir ovo orgânico dá? Mas onde vai entrar cálcio e fósforo? Por onde entra, se não for cálcio e fósforo que a gente compra normalmente? Existe sim, existem outras formas de se fornecer tudo isso. Mas isso ai é caso a caso, e tem que consultar a cartilha lá do IBD para ver o que pode ou não. Pergunta: Foi falado em condições de água e nutrição na água para hidroponia. Existe uma relação de quantidade de peixes ideal? Luciana: Existe sim. Tanto o peixe quanto a planta precisa de temperatura de água, PH de água, que são as necessidades básicas. Pelos dados que nós temos são necessários de 60 a 100 gramas de ração para o peixe, por dia, independente da espécie do peixe, para fazer com que um metro quadrado seja cultivado. Pergunta: Qual a quantidade de peixe? Luciana: Depende, porque a gente coloca às vezes pensando em tilápia. Se 224


8º Bunkyo Rural

você coloca a tilápia desse tamanho, quantas tilápias você precisa ter para comer 100 gramas? Depende se você tem tilápia de 1 kg, quantas tilápias você precisa ter para comer esses 60 a 100 gramas mais ou menos? Então vai depender do que? Do tamanho da sua tilápia. Se você colocar 100 tilápias hoje para comer 100 gramas, na semana que vem você vai ter que tirar um tanto de tilápia ou vai ter que aumentar a área. Essa dinâmica de crescimento do peixe e crescimento das plantas você tem que ir sempre mantendo. O mesmo acontece quando você planta um canteiro de rabanete, ou um canteiro de alface. Se você não transplantar, não fizer a muda para transplantar você tem que ralear. Peixe é a mesma coisa, ou você vai raleando ou você vai aumentando a água. De qualquer forma vai raleando, diminuindo a densidade. Pergunta: Se você tiver mais peixe do que planta? Luciana: Não, o ideal é mais planta do que peixe, mas dependendo do tipo de planta. Se eu plantar tomate? E se for uma cultura que fica lá três meses no campo? Mas e se for uma cultura de rabanete, que fica de 20 a 30 dias, de rúcula, de 20 a 30 dias, depende então de cada cultura. Então tem que fazer continha, não tem fórmula, tem continha. Pergunta: Qual a proporção de peixe para a área cultivada? Luciana: Não existe uma quantidade de peixe, existe uma quantidade de ração que ele vai comer porque ele come e mais ou menos 50% ele defeca. Então se ele come 100 gramas ele defeca aproximadamente 50 gramas. Se você coloca peixes pequenininhos, quantos peixes você precisa para comer aquela quantidade de ração para defecar aquela quantidade. Defecar e urinar aquela quantidade de nutrientes que é possível você cultivar em um metro quadrado. Pergunta: Existe ração orgânica para peixe? Luciana: Existe a ração orgânica de peixe sim, mas é caríssimo. Pergunta: Como fica a lucratividade nesse processo de aquaponia? Luciana: Eu não vou saber precisar em números a lucratividade porque vai depender muito de quanto vai ser seu valor agregado. Se você conseguir vender um pé de alface por cinco reais porque ele é orgânico e ele esta no sistema de aquaponia, ou vai conseguir colocar num outro mercado onde 225


8º Bunkyo Rural

você consiga 10 reais por um pé de alface, sendo que o convencional você consegue comprar por um real hoje no mercado. Você tem que fazer continha realmente e ver quanto vai custar aquela ração, quanto custa a ração e por qual valor você vai conseguir vender e quão grande ela vai ser. Se de repente você for pequeno, mas não quer trabalhar e vai contratar gente, se você vai pagar um salário mínimo para um funcionário com todos os encargos, sai quase dois salários mínimos por mês. Vai depender muito da sua mão de obra e de onde você vai conseguir vender. Fazer ração em casa, por mais que seja orgânico, eu acho bastante complexo, principalmente quando você trabalha com ração úmida. Existem peixes que comem ração e ficam lá no fundo. Se forem peixes que precisam comer ração que ficam flutuando, é uma outra situação. Que tipo de tanque você vai usar? Se você usar um tanque lonado e tiver um peixe que come lá no fundo, não tem problema, você consegue. Mas e se não? E se você tiver um tanque muito grande de chão batido? Então, vai depender muito disso daí. Eu particularmente, trabalhando com algumas propriedades rurais que produzem peixes, eu não recomendo a fabricação caseira da ração do peixe. Pergunta: Qual a melhor ração? Luciana: Depende da região em que você está. Tem lugares que você pode comprar, mas tem que fazer encomenda. Você não consegue comprar assim facilmente. É um mercado muito pequenininho para uma fabrica de ração. Pode ser que em outros países já seja diferente, mas a realidade do Brasil é essa.

226


8º Bunkyo Rural

KORIN ALIMENTOS ORGÂNICOS

Palestrante: Julio Baumgartner Bóbbo Engenheiro Agrônomo da Korin Agropecuária

Boa tarde, meu nome é Júlio, eu sou consultor técnico de vendas da Korin, também sou agrônomo, e eu vou falar um pouquinho para vocês sobre o bokashi, na verdade o Fert Bokashi Premium, que é um produto orgânico da Korin e que hoje a gente está usando bastante na agricultura. O que seria o bokashi: o bokashi , o nosso Fert Bokashi Premium, é um produto líquido, comercializado em frascos de 1 litro e de 5 litros. Ele é concentrado, então mais para a frente eu vou falar como é a ativação, mas 1 litro do produto rende 10 vezes, e é em cima desse volume final 10 vezes maior que a gente vai expor a nossa recomendação. E o que é que a gente tem hoje dentro do Fert Bokashi Premium? Como eu disse, ele é um produto líquido, que dentro do produto apresenta 36 microorganismos. Esses microorganismos estão dentro destes grupos e eu dou um destaque muito grande para o bacilo. Por que o bacilo? Hoje temos muito estudos, principalmente com bacilos utilizados no controle de nematóides, e é onde a gente vem tendo resultados muito bons.. Eu vou mostrar mais para frente uma reportagem em que se demonstra um controle de até 80% em coisa de 60 a 90 dias. E qual é a função do microorganismo, isso não só o microorganismo do meu produto, qualquer microorganismo benéfico presente no ambiente. Ele vai 227


8º Bunkyo Rural

ajudar na solubilização do fósforo. Pegar aquele fósforo quando a gente faz a análise do solo, ver que nosso fósforo está lá em cima, só que mesmo assim precisa fazer uma adubação fosfatada. Por quê? Porque esse fósforo está retido no solo, então a planta não consegue captar esse fósforo, mas um microorganismo consegue solubilizar o fósforo, lógico que não em grande escala, algo em torno aí de 5% a 7%, mas é uma coisa que já estava perdida e eu consigo retornar. Outro ponto é a fixação de nitrogênio. De que forma? Não de forma direta, mas de forma indireta, porque, um microorganismo benéfico, diferente do patógeno, precisa de outro microorganismo benéfico para estar se multiplicando com mais facilidade. Não quer dizer que ele sozinho não se multiplique, vai se multiplicar só que de forma mais lenta. Então, quando eu coloco vários microorganismos juntos no solo, ele vai estimular por exemplo o Rhizobium. O Rhizobium é o que vai auxiliar a fixação do nitrogênio e também vai acabar atuando em cima da decomposição da matéria orgânica. Ele está ligado diretamente na estruturação do solo, então quando você pega um solo com um bom teor de matéria orgânica, ele é com certeza um solo mais estruturado, mais poroso, isso tudo vai refletir na questão do enraizamento. Aqui é um exemplo, da nossa área, que é uma área de milho do Centro de Pesquisa Mokiti Okada, ele está na 9ª safra consecutiva de milho, e aqui é uma área de um vizinho de cerca nosso, também produtor de milho. Se você olhar, é um perfil raso de solo, de 0 a 10 cm. Você vê, praticamente não tem diferença na questão de estruturação, você vê que é um solo bastante aerado, então ele vai facilitar o desenvolvimento radicular, a penetração de água, porém de 10 a 20 cm, se você olhar, não sei se dá para 228


8º Bunkyo Rural

ver, mas assim, na questão do produtor convencional, de 10 a 20 cm o solo está completamente compactado, então isto aqui vai interferir na retenção de água, pois na hora que chover, a água em vez de penetrar, vai inundar e atrapalhar a minha agricultura. A questão do enraizamento, eu vou ter um enraizamento superficial, o solo a gente sabe que seca de cima para baixo. Numa planta nessa condição, se eu pegar aí um veranico de 30 a 40 dias, uma planta nessa condição vai sentir muito mais do que uma planta nessa outra condição. Por quê? A minha raiz consegue ser mais profunda e um volume maior, que é o que a gente fala, é a boca da planta, en229


8º Bunkyo Rural

tão quanto mais raiz eu tiver, mais minha planta vai conseguir comer. Aqui é um outro exemplo também, esta imagem (página anterior) foi publicada na revista Attalea Agronegócios, no ano de 2007, é uma cultura de café. Metade do talhão a gente não usou o Fert Bokashi Premium, e metade do talhão usou o Fert Bokashi Premium. Esse solo era no início de 2007, um solo do produtor, e é no meio de 2009, então foi um trabalho de 2,5 anos, que eu saí desta situação e passei para esta situação, tudo bem que aqui é uma foto, mas a questão da coloração do solo se você olhar esses agregados que seriam uns torrões, isso é um indício de que o solo está sendo estruturado. Lógico que para confirmar isso teria que fazer mais estudos e análises ali, mas isso já é um indício de que está havendo estruturação. Só um detalhe, com eu disse, foi um trabalho de 2,5 anos, então acaba sendo complicado lidar com um produtor que não me conhece e falar "olha, usa o meu produto que daqui a 2,5 anos você vai ter resultado". O produtor vai olhar na minha cara, e vai bater nas minhas costas e falar "amigo, obrigado, mas fica para a próxima", então o que a gente tem de resultado imediato, eu digo imediato é dentro do próprio ciclo da cultura. Enraizamento, aqui é um exemplo, foi feito em Atibaia, um milho com bokashi e um milho sem bokashi. Para vocês verem o volume de raiz é

230


8º Bunkyo Rural

nítida a diferença, e a espessura da canelha do milho. Isto aqui se eu pegar uma área com muito vento, a questão de tombamento, o meu milho vai ser muito mais resistente do que um milho com essa espessura mais fina, então tudo isso vai refletir em produtividade. Em outra cultura, no caso o café, eles chamam de mudão, as duas estão com 45 dias, porém a da esquerda com bokashi e a da direita sem bokashi. De novo, se você olhar o volume de raízes, comprimento da parte aérea, sendo que as duas têm ao mesmo tempo 45 dias, é uma diferença considerável para absorção, principalmente no início, na parte vegetativa, onde ela teve um desenvolvimento mais rápido. Outro ponto que o Fert Bokashi vai atuar é na questão do controle de doenças, tanto doenças do solo quanto doenças da folha. Portanto, o produto pode ser usado tanto no solo quanto na folha. Então aqui, se eu for exemplificar como foi feito, a gente colocou 4 doenças aqui em cima, seria uma requeima, dois tipos de antracnose, e uma fusariose. Embaixo colocamos também a mesma doença, no mesmo dia, porém a gente fez na linha de baixo uma aplicação do meu produto. Então, eu vou pegar essa antracnose da bana231


8º Bunkyo Rural

na, por exemplo, aqui embaixo a antracnose é essa mancha maior, esses pontos aqui em volta são os meus microorganismos. Mostrando um produto biológico cujo intuito não é matar, mas sim, fazer com que equilibre o microorganismo patogênico no solo para que ele não cause mais dano econômico. Na verdade, o que seria um patógeno benéfico? Eu gosto de usar essa analogia, é a mesma coisa quando a gente vai ao médico. O médico fala "olha, toma 1 comprimido por dia", se você tomar 5, ele vai deixar de fazer bem e vai começar a te fazer mal. O microorganismo é a mesma coisa, por exemplo, a fusariose, se eu tiver ela em equilíbrio no solo, é um dos microorganismos que mais estimulam a planta a enraizar, mas ele tem que estar em equilíbrio. Se não estiver em equilíbrio ele vai causar doença, então é tudo uma questão de equilíbrio mesmo, e como eu havia dito, o intuito não é matar. Então, se eu pegar no caso aqui, bater um durex e pôr no microscópio, eu vou ver que o patógeno está vivo, mas ele não vai estar em nível de causar dano econômico.

Um outro resultado que a gente tem em cima de controle de doença, foi aquele que eu mencionei no início da apresentação, que foi em cima de Bacillus subtilis é com nematóides, também foi publicado em maio de 2015, na revista Attalea Agronegócios. A gente usou a variedade de tomates 232


8º Bunkyo Rural

Santa Clara, que é uma variedade suscetível a ataque de nematóides de galho, no caso foi analisado só em uma parte do galho, e depois de 90 dias do início do tratamento a gente teve 80% de controle, tanto do javanica quanto da incógnita. Isso em 3 meses, que é um período muito curto para ter um controle tão eficiente. É lógico, isso se eu der continuidade no uso, a tendência não é zerar, mas ele continuar diminuindo para que fique aí em equilíbrio e não me cause dano. Na primeira foto é um exemplo do que eu fiz nessa safra de soja, na região de Primavera do Leste, no Mato Grosso. É uma soja sem ataque de nematóide, onde ela foi tratada com o meu produto, na mesma área, do lado, não tem divisória, dividindo o talhão em duas partes, a parte onde não foi feito o tratamento. Na segunda foto a mesma soja, olha isso como ela está, ela parece que está muito mais lembrando o gengibre como a gente fala, que é o sintoma do nematóide. Aqui, na terceira foto, olha aqui o detalhe, uma raiz nessa situação já não absorve mais, não que não absorva, mas a planta não consegue aproveitar. Quem pega esse alimento são os nematóides que estão aqui dentro, e isso vai influir diretamente na minha produtividade. E como é feita no caso a ativação? Como eu havia dito no começo, 1 litro rende 10 litros, então eu pego 1 litro do produto, 1 quilo de açúcar, só não pode ser o açúcar refinado por causa da química, e 8 litros de água não clorada. Coloco isso numa balde, misturo bem e deixo descansando por 48 horas. Após 48 horas esse produto vai estar pronto para uso, então o meu litro concentrado vai virar 10 litros de produto ativado. 233


8º Bunkyo Rural

Essa recomendação é para hortifruti. Para cereais a recomendação é um pouco diferente. Para preparo de solo, eu ordeno meu canteiro, eu vou jogar a matéria orgânica, por cima dessa matéria orgânica eu vou utilizar 1 litro do produto ativado, então é 1 litro daqueles 10 litros que estavam prontos, para cada 100 metros de canteiro. No preparo de solo vai a carga mais alta do meu produto, onde eu jogo 10 vezes mais. Depois do preparo do solo, vamos pegar o tomate como exemplo, então fiz o preparo do solo do tomate, fiz o canteiro e plantei o meu tomate. Na parte de irrigação, ele tem total compatibilidade com sais, então se não for um produtor orgânico, ele pode misturar com sais e se for um produtor orgânico é perfeito porque todos os sais dele acabam sendo orgânicos, então tem menos interferência ainda. Eu também usaria 1 litro do produto ativado, porém para cada 1000 m² de área. Então, vamos supor que eu tenha uma estufa de 1000 m², eu fiz o meu preparo do solo, depois eu vou a cada 15 dias soltar 1 litro do produto na parte de irrigação. Ah, mas qual o volume de água? O volume de água que o produtor está acostumado a usar. Eu tenho casos de produtores que usam 50 litros, eu tenho casos de produtores que vão usar 100 litros, aí varia conforme a cultura e conforme o produtor. Não é amarrado tanto no preparo de solo quanto na parte de irrigação, ele não é amarrado no volume de água, e sim na área, então o importante é estar em 1000 m² ou 100 metros de canteiro. E existe a aplicação foliar, que acaba sendo destinada mais para produtor orgânico. Por quê? Se eu fizer uma aplicação foliar do meu produto em um produtor convencional, depois vamos pegar o tomate, que usa muito em cima, ele vai afetar o veneno em cima e vai matar todo o meu microorganismo. Então, quando eu inicio um trabalho com um produtor convencional, eu acabo fazendo mais a parte do solo com ele. A partir do segundo ano eu começo a arcar com a aplicação foliar., Por que? Porque eu consigo, mesmo usando só no solo. O produtor com o passar do tempo diminui a aplicação de defensivo. Eu falo isso porque eu tive um caso em Faxinal no Paraná, quando iniciei o trabalho ele fazia dez aplicações por semana. Depois de 2,5 anos trabalhando, ele passou a fazer uma única aplicação por semana. Se eu pensar isso em um mês, eu saí de doze aplicações de defensivo para quatro aplicações de defensivo. Lógico, ele ainda é um defensivo, não é o ideal, mas a 234


8º Bunkyo Rural

gente está caminhando para o ideal, porque também não adianta eu chegar para o produtor e falar "não, vamos mudar agora de um dia para outro". Não dá, porque aí ele se quebra, a gente tem que fazer uma transição gradativa. Agora aqui são mais resultados. Aqui, um milho com bokashi e um milho sem bokashi, de novo a questão de enraizamento que dá grandes espigas. Então, isso em um fruto de melhor qualidade. Questão da decomposição de matéria orgânica, aqui é uma palhada de café com 45 dias, com bokashi e sem bokashi. Aqui eu degrado, mas eu degrado de que forma, eu não quero que minha palhada suma para não perder a plantação no solo. Nesta situação ela está mais quebradiça, então o nutriente dessa palhada já retornou para a planta e a parte de teor de matéria orgânica está indo para o solo para deixar o solo com melhor qualidade. E aqui são alguns relatos, e o que é que é interessante, por exemplo, este produtor usou no milho o bokashi. Ele produziu 92 sacas. Onde ele não usou o bokashi ele produziu 56 sacas. Ele praticamente dobrou a produtividade. Num outro exemplo, onde o produtor usou o bokashi não foi necessária a

235


8º Bunkyo Rural

aplicação de inseticida para percevejo e nenhuma aplicação de fungicida. E isso não foi recomendação nossa, foi o produtor que no campo olhou e viu que não precisava. Além de a gente melhorar a produtividade, eu consegui diminuir o custo e melhorar a qualidade também desse alimento. Aqui, a foto do produtor com a raiz e aqui um outro produtor que não precisou usar o defensivo e, observem que a raiz dele chegou a 60 centímetros. Isso não é assim, era para ser normal, mas hoje por causa do defensivo não é normal. Eu só queria fazer um adendo, apesar do produto da Korin ser orgânico, eu atendo muitos produtores de cereais. 99% dos meus clientes são convencionais e a grande maioria que me procura é produtor convencional que usa veneno. Ele me procura e fala "o veneno não está segurando mais, eu não sei mais o que fazer". Então a gente dá essa alternativa do biológico e vai encaixando o manejo dentro do manejo dele, que é aquilo que eu falei, não tem como eu mudar de uma hora para a outra. Obrigado.

Julio Baumgartner Bóbbo E-mail: julio.bobbo@korin.com.br Celular: (19) 99704-4435 236


8º Bunkyo Rural

ROCHAGEM E REMINERALIZAÇÃO NA AGRICULTURA Palestrante: João José Cardinali Ieda GPEMSO - Mineralogia do Solo Esalq/USP

Primeiramente, eu quero fazer uma rápida recordação histórica do ser humano. Antes de mais nada, eu agradeço muito o convite para estar aqui, é um privilégio poder compartilhar meus conhecimentos com vocês, para desenvolverem a agricultura por um mundo melhor. O homem veio do fogo, lembram-se disso? Depois qual foi a evolução depois do fogo? Vocês podem me ajudar? Depois do fogo foi a... Agricultura. Foi quando o homem precisou se alimentar, tinha uns animais, ele pegava lá e comia da forma que podia e precisava, mas ele percebeu que para isso ele precisava de grãos. Então aqui estou diante daqueles que reproduzem aquilo que foi a segunda evolução do homem, a agricultura. Aqui faço uma reverência a esses que reproduzem esse conhecimento, aqueles que nos permitem estar aqui de corpo e alma. A agricultura é aquela que nos fez começar um progresso, continuando na revolução industrial e agora está na revolução da comunicação, tanto é que nós precisamos de vários equipamentos para isso. Para isso nós estamos aqui estudando cases inovadores do Novo Rural e eu queria compartilhar com vocês. Tomei um puxão de orelha em termos de

237


8º Bunkyo Rural

tempo, vou tentar ser o mais breve e objetivo com vocês. No caso da inovação, nós temos que considerar que a inovação está diante de nós todos os dias, desde o Sol nascer, o por do Sol, o ar, está se permitindo que nós nos renovemos diariamente, nos relacionar, inclusive estabelecer aquilo que nós conversamos aqui hoje, fazer encontros. Cada vez que a gente pensa em encontros nós passamos a ser um pouco melhor. Para isso nós vamos aqui estar exercitando o chamado Novo Rural, que é cada vez mais o que foi falado por Diógenes, foi falado pelos outros colegas ou mesmo outros pareceres, que são os encontros que estabelecem conhecimento, a reprodução de conhecimento. O conhecimento não está aqui, e muito menos está nos livros, nós sabemos onde está o conhecimento. Onde está o conhecimento? Em cada um de nós, e quando nós nos encontramos com o outro nós reproduzimos um novo conhecimento, e esse conhecimento, mudando a habilidade de falar, de conversar, de compartilhar, de ceder, ou até de se restringir, de se preservar, mas principalmente na atitude de ser muito melhor. Esse Novo Rural é o que eu estava esperando ter hoje aqui. E eu gostaria de compartilhar o que é rochagem. Rochagem nada mais é do que a ração da rocha. Se nós nos recordarmos como surgiu este planeta e tivemos vários movimentos de transformação há milhões e milhões de anos, essa rocha um dia sofreu reações de tempo, mas também de água, de sol e nesse processo de transformação ela foi nos permitindo estar onde nós estamos hoje. Aqui, no segundo pavimento deste ginásio, mas se nós formos pisar lá na graminha, o que temos lá? O solo. Nada mais é o solo o resultado de uma transformação dessa rocha. Estamos diante de uma rocha transformada. Senhores agricultores nos permitiram reconhecer lá atrás que através desse solo podemos ter a planta, os seus grãos, as suas folhas e tudo mais. E com isso, podermos nos alimentar através desse elemento que é o solo. Claro que tem outras tecnologias usando a água, permitindo que isso faça até um uso melhor ou apropriado para aquela situação que se faz necessário. E a pergunta é sobre "rochagem". E remineralização? Um termo meio complicadinho? Nada mais é que um mineral em ação colocado mais de uma segunda vez. Então, já existe um conhecimento praticado muito tempo atrás sobre a remineralização. Eu gostaria de compartilhar com vocês, senhores e senhoras, um desenvolvimento natural e com intervenção humana.

238


8º Bunkyo Rural

Senhor Julius Hensel, em 1898, foi contemporâneo de Liebig, que foi o criador da fórmula NPK, sistema de transformação técnica e química. Ele escreveu o seguinte texto: "A verdadeira cura para um solo desgastado consiste em administrar-lhe rochas trituradas. Desta maneira, as plantas recebem novamente o que elas por natureza necessitam. Prova disso pode observar-se na milenar fertilidade das terras do Egito; o lodo do Nilo as nutre quase que exclusivamente de rochas finamente trituradas, junto com ingredientes orgânicos nitrogenados" Lá atrás quando a gente senta na escola e fala sobre o Egito, o que se aprende sobre o Egito ou o Rio Nilo? O período de cheia, o período de planta, irrigação e cultivo. Já é uma estrutura milenar, então a rocha que foi mineralizada, transformada em dimensões que a água permite levar junto com os nutrientes. Mas não só a água. A areia do Saara, que não é só areia, atravessa o Atlântico e é despejada na floresta Amazônica, fertilizando-a. São 182 milhões de toneladas de poeira da região oeste do Saara, que são carregados pelo vento, anualmente. Parte deste material cai nas águas durante a travessia do Atlântico. Perto da costa da América do Sul, 132 milhões de toneladas ainda permanecem na atmosfera, e 27,7 milhões de toneladas são depositadas na bacia do Rio Amazonas, e cerca de 43 milhões de toneladas seguem viagem e caem sobre o Mar do Caribe. São dados provenientes dos cálculos da Nasa, das observações entre 2007 e 2013 feitas pelo Satélite Calipso. Como as gotículas de ar e mais o processo de reversão e de bombeamento que as árvores permitem, elas são depositadas nessa região do Amazonas, suprindo alguns componentes, um deles o fósforo. Diante dessas duas verdades, temos algumas situações em que o processo reprodutivo de transformação da rocha em pedras, pedras pequenas, permite também um reco239


8º Bunkyo Rural

nhecimento dessa pedra, dessa rocha diminuída, ou triturada em dimensões de pó. E aí vem a nossa provocação, esse setor produtivo de produção de pedra está à disposição em vários setores e em vários locais. Nós do Grupo de Pesquisa da Mineralogia do Solo identificamos alguns desvelamentos (área que se tornou visível) que podemos notar. Aqui em São Paulo é o desvelamento das algas e alguns outros espaços estão nos permitindo conhecer Minas Gerais, alguns segmentos, que são partes de rocha e fosfato, ou outras rochas que estão aparecendo para nós que desenvolvemos a pesquisa. Foi ai então que nós identificamos, em 2009, 2010, que coincidiu com o movimento nacional, inclusive de reconhecimento dessas pedras, essas rochas moídas, quando transformadas em pó, que em dimensões menores podem ser aplicadas sim como insumo agrícola. Por isso que veio uma lei, nós vamos entrar em detalhes logo em seguida e depois há instrução normativa. Só resgatando um pouco mais da história, existe um livro que é o "Pães de Pedra" (Julius Hensel, 1898), sobre nada mais que o caminho da transformação do pó da pedra ao pão, sobre o trigo que foi transformado em pão, e que tem uma síntese, "As terras novas são ricas em minerais", "A exploração agrícola esgota as reservas minerais do solo", o que é natural, a gente tira o grão e está tirando os nutrientes dela, então a gente precisa fazer a reposição. 240


8º Bunkyo Rural

E esses minerais são provenientes de composições químicas das rochas que formaram o terreno, nada mais que o terreno limpo, que plantando, precisou ser alimentado, e transformou isso no grão, transformou isso no fruto, transformou isso na folha e que vai levar embora. O que precisa fazer? Reposição. E ai depende das estruturas, estruturas de agricultura, pode ser uma reposição no próprio local, que são chamadas de agriculturas naturais ou mesmo a agricultura biodinâmica ou aquelas de começo que precisam de uma intervenção. Então esse livro, inclusive é bom, eu preciso traduzir aqui para os senhores e que foi escondido por 110 anos, e desses 60 anos ele está na mão de vencedores da guerra, alguém que ganhou a guerra lá sabe, eles guardaram por uns 60 anos. Sabe o que quanto está esse livro aqui? Ele está patenteado nos Estados Unidos, com prefácio atualizado e que demonstra sua importância em combater o efeito estufa na mudança climática. Tá lá, guardadinho, então busquem, mais uma porta de entrada para nós fazermos o conhecimento da humanidade. O Brasil, vou fazer rapidamente um descritivo, os senhores já sabem muito bem, que as diversas condições geográficas do Brasil que é extenso, exigem diversas soluções diferentes. Temos que reconhecer que as necessidades e soluções são diversas, que pode servir a hidroponia, pode servir o bokashi, pode servir a rochagem. O que importa é que nós temos agricultura, isso é que importa, e que estejamos atentos ao processo de decisão. Os nutrientes da planta estão se esgotando e nós temos uma dependência, ou da parte de pó, do potássio. Numa agricultura convencional, 98% do potássio são importados. 98%. Se fecharem as portas lá de nossos fornecedores de potássio, nós não temos mais agricultura baseada em potássio. Nem temos outras alternativas, então é um desafio para a inteligência nacional fazer uma busca pela manutenção da soberania nacional. E essa soberania é dependente de todo esse conhecimento que hoje permite que a ciência trabalhe à disposição da evolução da agricultura. E tem as alternativas que falei hoje, a alternativa do deserto do Saara na Amazônia, mas tem muito mais exemplos. Temos agricultores já trabalhando nisso, não vou citar nomes, mas no Centro Oeste ele já está na quarta produção de soja, sem qualquer interferência de ração nutricional. Ele aproveitou, ele reconheceu a propriedade nutricional que se apresentava e viu quanto essa planta precisava tirar, fez um balanço e deu um suporte para mais quatro anos. E está chegando ao seu quinto ano sem alteração. Nós aqui temos que ter a humildade de reconhecer que essa tecnologia da NPK é útil, é necessária, 241


8º Bunkyo Rural

mas algumas vezes não é suficiente. Ela é necessária a ponto de que a rochagem possa ser, não um substituto, mas sim um complementar diminuindo a dependência de insumos importados. Bom, eu vou passar rapidamente dois casos que me permitiram conhecer em função da dissertação de doutorado, depois um outro de livre-docência. Um experimento de término e conclusão de curso e outro um experimento em que teve uma jovem graduanda na Esalq, que fez esse experimento. Então vou compartilhar com os senhores e senhoras, é claro que são resultados de pesquisa. Qualquer dúvida sobre os conceitos vocês podem buscar nesses artigos que eu vou reproduzir, mas vou focar em dois aspectos. Nesse experimento de Pirassununga entre 2012 e 2014, que é quando houve aquele período de seca, vocês se recordam daquele período em 2013, 2014, que foi demais, mas foi muito interessante o que aconteceu. Nós fizemos um experimento em 2012 e 2013 numa primeira etapa e depois um experimento em 2013 e 2014. A pesquisa foi sobre a aplicação do pó de basalto no milho como fonte de nutrientes. Dividimos em parcelas e nessas parcelas tivemos esses rochinhos aqui sem tratamento, o inoculante na Geobásio, ah, desculpa, nós tivemos dois tipos de rocha, nesse caso especificamente foi a rocha basalto tá? De uma origem de uma pedreira localizada no centro do Estado de São Paulo. E na sequencia do ano 2013 e 2014 nós mantivemos os tratamentos relacionados àquele que é sem nada, no caso tínhamos umas aplicações de 4 toneladas in242


8º Bunkyo Rural

crementando a 15 toneladas, acrescentamos 19 toneladas por hectare. Foi para experimentar e ver o que acontece de fato, se você quer conhecer um caminho a gente tem que conhecer onde nós estamos e para onde nós vamos. O que vamos fazer depende do que a gente vai ver em qual veículo. Nós fizemos isso, nós colocamos zero e colocamos um valor bem acima para compreender esse funcionamento dessa rocha colemanita que é o Geobásio. Aplicamos uma parcela de potássio e na parcela do Geobásio que só tinha aquelas 4 toneladas, nós mantivemos para ver o residual. Qual o resultado obtido? Ah, só mais um detalhe importante para citar, nessa aplicação do Cloreto de Sódio (KCl) que eu disse, ele tem uma segunda aplicação para lembrar que esse processo é para garantir que a produção daquele milho, se der uma perda ou não, continue conforme o uso que é do produtor. A gente queria entrar no ambiente dele, mas aproveitando o que ele sabe. O que aconteceu? Entre o ano 2013 e 2014, partindo do primeiro mês os dois, os quatro conjuntos de parcela estavam todos iguais, já na sequencia de 42 dias, importante entender que por 42 dias estamos analisando o solo. A alteração de potássio foi observada. E42 dias eles estavam ainda próximos, houve uma incorporação do potássio como adubo, e o que aconteceu

243


8º Bunkyo Rural

aqui com aquela parcela que tinha 15 ou 19 toneladas? Ela começa se mostrar que o potássio começa a se disponibilizar de fato no solo, e fica lá aquela condição, que é a condição de controle, e a condição que é do Geobásio de 4 toneladas muito próximos. Aquela que sofreu ação do potássio, que foi colocado KCl, ele mostra um incremento e tivemos a seca. Nessa seca nos 101 dias ainda o potássio se mostra disponível. E aquele potássio proveniente do Geobásio começa se mostrar que está sendo absorvido da mesma forma que o KCl, que nós acompanhamos aqui na mesma forma de intensidade, absorvido pelo KCl, e ai ele entra num processo de equiparação entre aquele que era o controle, aquele que era o de 4 toneladas e o de 15 toneladas. Ou seja, supriu o que era necessário e aqui o KCl acima. Essa diferença aqui era tão necessária assim? É uma pergunta. É um deposito que esse agricultor fez? Provável que ele fez um depósito mesmo, mas era necessário o aumento, ele precisava colocar aquele recurso para aquela necessidade e manter aquele disponível? Fomos também entender o que acontece com o solo em nível de reagentes, de reagentes, que é o CTC, cátions, todos os descartes estão disponíveis no solo, e o que nós observamos aqui? Que como reação inicial no quadragésimo segundo dia, os dois solos se apresentavam com o Geobásio. Ele tem um incremento significativo de quase 30% de reagentes. Ele ficou vivo em termos de íons, provavelmente deve ter microorganismos. Ficaram próximos, enquanto o KCl e outra testemunha, ficaram quietinhos. Na sequência do septuagésimo primeiro dia, aquele que era de 4 toneladas foi absorvido da mesma forma ficou o KCl e o da testemunha, mas daí ó, aquele que tinha uma super dosagem se manteve superior e na sequência ele foi subindo significativamente, e o mais interessante para nós foi, olha só que interessante, que o solo não teve nenhuma interação do Geobásio e do KCl. Olha aqui, ele reagiu, ele disponibilizou potássio. Onde estava esse potássio? Onde estava? Eu na verdade eu estou apoiando a pesquisa, eu sou um agente de interação da inovação. Vem a pergunta, o que aconteceu com esse potássio? Da onde ele veio? E nós estamos, desculpa, não é só potássio, tem mais outros elementos, o que aconteceu com esse reagente de solo, como ficou o reagente num certo momento que juntamente com aquele que foi o Geobásio? É porque esse solo passou a ter uma vida diferente, alguma coisa aconteceu com ele aqui. É esse trabalho em literatura de dissertação, eu vou passar a referência, vocês vão poder buscar, mas a ciência está aqui. É só colocar o conheci244


8º Bunkyo Rural

mento dos nosso agricultores, parceiros e ou mesmo atuantes junto com os agricultores, saber que existe aqui uma ocorrência de que o Geobásio, o mineral tem um potencial de contribuição para os solos, pelo menos esses de Pirassununga na Fazenda de Figueira Branca onde foi cultivado o milho. Nós fizemos um segundo experimento, isso já num ambiente controlado, na Casa de Vegetação da Esalq/ USP. Aqui também teve esse processo de acompanhamento, de incubação, da cultura 1 e 2 com aveia e milheto. Aqui cabe uma explicação, o resultado não foi instantâneo, vocês podem buscar isso na literatura, vou compartilhar, mas é importante notar o seguinte, não vamos iludir, por que o Geobásio nesse caso não é o que nós estamos tratando aqui. Acho que foi uma rocha fosfática, nessa rocha fosfática, tem um material de rocha com um material de potencial de 5 a 10 por cento de fósforo total e de 30% de fósforo total. E foi uma combinação para gente aprender o que acontece com uma rocha com esse potencial. Tem também outros elementos que podem ser conveniente aos espaços onde não tem fósforo. Aqui nós aprendemos, que nas produções de massas secas, no quesito sódio e fosfato, o material de 30% e o material de 100% eles se apresentam não com muitas diferenças, nós estamos aqui falando de grandezas de 10 pontos em relação à grama, e ai eles se equiparam e ficam próximos e tal. Mas nós não podemos nos iludir, porque a maior produtora aqui que é o milheto e indo para aveia, houve um incremento aqui, a aveia respondeu 245


8º Bunkyo Rural

melhor sob uma condição do superfosfato em relação ao S5, que seria o 5% de fósforo em rocha ou S30 100%, 30% em rocha, então existe uma condição respeitável, que naquela cultura de 30 a 40 dias, da cultura 1, 2 e 3 houve uma interpelação aqui na relação peso de fosfato versus peso da planta, mas não o suficiente para causar uma reorganização significativa. De qualquer forma essa pesquisa esta à disposição. A gente tem que lembrar que é qualquer rocha que serve? Vai lá pegar uma aqui na perimetral e colocar lá? Eu recomendo que conheçam, da mesma forma que os consumidores tem de conhecer os produtores, vocês agricultores conheçam seus fornecedores. Então antes de pegar qualquer rocha conheçam, que já existe demonstração que tem rochas que são inertes, que não tem nenhum fator, e tem rochas inclusive piores, que levam o chamado efeito de interação de alimentação, ou seja ele vai levar materiais mais pesados, eles chamam de elementos potencialmente tóxicos. Existe já uma regra que veio de uma pesquisa científica, foi definida por uma deficiência crônica em que regulam esse chamado rocha ou remineralizador. E isso eu posso afirmar de que para rochas fertilizantes já estão à disposição a instrução normativa 46 de 22 de novembro de 2016, do ano passado, que confirma essas rochas. Se vocês fazem uso ou querem fazer 246


8º Bunkyo Rural

uso delas sem estudo, eles têm orientação, estão capacitados para fazerem isso ou trocar o remineralizador que é a composição de minerais. Existe uma lei definida em 2013 que confirma que ele é um insumo e tem as instruções normativas 5 e 6, que tem que assegurar. De qualquer forma, só pra rapidamente passar para os senhores, o remineralizador, diferente de uma rocha fosfática, em termos de fertilizante, é material de origem mineral que tenha sofrido apenas redução e classificação de tamanho de partícula por processos mecânico, que se aplicado ao solo, altere os seus índices de fertilidade, por meio de adição de macronutrientes e micronutrientes para as plantas,e promova a melhoria de propriedades físicas, físico-químicas ou da atividade biológica do solo. Ele veio com essa proposta, de operar o índice de fertilidade, por meio de adição de nutrientes e por meio das atividades físicas, físico-químicas ou atividades biológicas do solo. Tudo isso tem que ser comprovado cientificamente, antes desse material ser colocado como alternativa para a qual vocês tenham necessidade. Bom, antes de passar rapidamente, agora a instrução normativa esta à disposição para os senhores lerem, mas é interessante alguém verificar para fazer a interpretação porque vocês são clientes potenciais, então é

247


8ยบ Bunkyo Rural

248


8º Bunkyo Rural

importantes vocês estarem suportados por organismos como cooperativas ou engenheiros, que logo vão permitir comprar ou adquirir esse material, ele tem no mínimo uma validação em termos de registro. Se não for registrado a responsabilidade é dos senhores, mas se tiver registro já está compartilhada com o Ministério da Agricultura. Aqui está o descritivo, eu gostaria de falar sobre inovação, rapidinho, já que nós falamos sobre o fogo, sobre o estado da agricultura no passado, depois veio a Revolução Industrial e tudo mais, eu queria passar rapidamente. Existem ondas, e é importante saber se a gente fica na crista da onda ou embaixo da onda, ou a gente fica consciente. Não sejamos aquele que fica na crista, pois um dia vai e também não sejamos aquele que fica embaixo, nós vamos conscientemente entender como é esse processo evolutivo, nós tivemos aqui a primeira grande inovação que foi a energia hidráulica em 1785. As grandes inovações aconteciam em 50, 60 anos e depois havia vários outros estágios intermediários. E agora, se nós observarmos em questão de 30 anos tivemos a grande modificação, que foi através desses meios de comunicação, o uso do software, sistemas de informação, que está cada vez mais nos exigindo atenção. Da mesma forma que ele é bom, ele pode ser ruim também. Tem frequências magnéticas e eletromagnéticas que podem entrar como recurso na produção agrícola. Para terminar, esse senhor estudou muito a inovação. Joseph Alois Schumpeter define que o empresário inovador. é o responsável por novos produtos para o mercado, por meio de combinações mais eficientes dos fatores de produção. Tipificando, as combinações inovadoras se configurariam nos seguintes casos:

249


8º Bunkyo Rural

1) Introdução de um novo bem; 2) Introdução de um novo método de produção, baseado numa descoberta cientificamente inovadora; 3) Abertura de um novo mercado; 4) Conquista de uma nova fonte de matérias-primas 5) Estabelecimento de um novo modo de organização de qualquer indústria (criação ou fragmentação de uma posição de monopólio, por exemplo). O empresário agrícola é o maior inovador, tanto é que precisa estar atento diariamente, são novas plantas, novas sementes, novos incrementos. Introdução do novo método de produção, a abertura do novo mercado. Constantemente nós estamos revendo nossos fornecedores e clientes. Conquista de uma nova fase ou fontes de matérias primas, seja sempre crítico dos fornecedores de matérias primas, exija que eles, da mesma forma que você tem que estar ligado em nós os consumidores, sejam críticos sim para aqueles que fornecem material, que eles tem, não mais a chamada "varinha mágica", e principalmente ilusória, que fica nos iludindo e tal, sejamos bem críticos, que a ciência está ai para nos ajudar. E o estabelecimento que foi falado muito aqui, do novo modo de organização, que é nada mais que uma cooperativa, associativismo e um conjunto de pessoas. Só para lembrar, o grupo nosso (GPEMSO) tem uma forte atuação que vem nos contemplando com o CNPq, Apoio ao Desenvolvimento Científico, Tecnológico e de Inovação no Setor Mineral, na área inclusive mineralógica. Nós não vamos nem trabalhar com o pessoal da agronomia. Fomos contemplados com o pessoal da mineralogia, da 250


8º Bunkyo Rural

geociências. Disseram: "esses caras podem estudar assim porque nós queremos saber o que esta embaixo do nosso solo". Temos um projeto chamado "Planalto Ocidental Paulista", e apoiamos todas as iniciativas de agricultura orgânica, natural e biodinâmica. Segue um texto que eu compartilho com os senhores e que foi desenvolvida na livre-docência do professor doutor Antônio Carlos de Azevedo: "O uso de rochas moídas como insumo agrícola é antigo (Hensel, 1894). Apesar disto, o entendimento dos mecanismos pelos quais os pós de rocha podem incrementar a produtividade das culturas ainda são bastante obscuros, devido à sua complexidade e sinergismos com os organismos e minerais presentes no solo, que possuem também uma grande variação em função do domínio agroecológico em que se encontram e de sua história de manejo. Além disto, os pós de rocha possuem vários minerais em sua composição, dependendo da rocha utilizada, cada qual com sua dinâmica de dissolução, que por sua vez é influenciada pela dissolução dos outros minerais da rocha (por exemplo, pelo efeito de íon comum) e pelas condições do entorno (clima, solo, planta). Assim, características da rocha (composição mineralógica, textura, distribuição granulométrica, etc.) se associam aos fatores do solo (textura, teor de matéria orgânica, acidez, etc.), do clima (excesso hídrico, temperatura, distribuição de chuvas, etc.) e da planta (morfologia do sistema radicular, exsudação de ácidos orgânicos, etc.) para criar um cenário complexo de previsão de incremento na produção de biomassa pelas culturas. Some-se a este quadro, fatores sinérgicos (por exemplo, o estimulo aos microrganismos litotróficos no solo) e indiretos (por exemplo, a melhoria na arquitetura de planta e no uso da agua causada pelo aumento da absorção de silício). Dentre estas possíveis interações, um tema recorrente nos debates (Congresso de Rochagem, Bancas de defesa,e tc.) tem sido a possibilidade de neoformação de colóides minerais como produto da alteração rápida dos remineralizadores". Aqui, as citações da qual eu reproduzi aqui aos senhores como base, se vocês precisarem, até livre-docência e tudo mais. Tese para Livre Docência - Avaliação de um remineralizador de diabásioProfº Dr. Antonio Carlos de Azevedo; Tese para Doutorado - Intemperismo de Minerais de Um remineralizador - Dr. Rafael Cipriano da Silva; 251


8º Bunkyo Rural

Trabalho de Conclusão do Curso - FÓSFORO TROCÁVEL NO SOLO E NA PLANTA APÓS APLICAÇÃO DE REMINERALIZADOR - Engª Bruna Oliveira Ferreira; Experimento Milho: Aplicação do pó de basalto em milho (Zea maiz) como fonte de nutrientes para as plantas -Engª Marina Elias Cury; Orientação Profº Dr. Antonio Carlos de Azevedo Qualquer coisa também estou aqui à disposição por esse e-mail, os canais de comunicação estabelecidos aqui pela nossa conversa. Muita gratidão pela atenção. joao.ieda@terra.com.br

252


8º Bunkyo Rural

UMA VISÃO DA AGRICULTURA JAPONESA 6a. FASE DA INDUSTRIALIZAÇÃO AGRÍCOLA Palestrante: Fábio Maeda Fazenda Maeda, ex-bolsista da JICA e da CKC

Bom, boa tarde a todos. No Japão, apesar de guerras, terremotos e tsunamis, existem 3113 empresas com 200 anos, 435 empresas com 300 anos, 124 empresas com 500 anos e 19 empresas com 1000 anos. Por que eles duram tanto tempo assim, sabendo que a maioria das empresas dura no máximo até a 2ª ou 3ª geração? Foram estudadas essas empresas para ver o que elas tinham em comum e chegaram à seguinte conclusão: que todo produto, toda empresa, ela tem um ciclo de vida e que é necessário uma inovação para que haja um novo ciclo, e assim sucessivamente. Então, tem a fase de crescimento, uma fase de estagnação, e nessa fase de estagnação precisa haver uma inovação para que comece um novo ciclo. Outra característica em comum entre elas é que todas as empresas possuem três pilares de sustentação, um sempre bem forte, porque 253


8º Bunkyo Rural

se um dos pilares cair, os outros dois reconstruiriam o terceiro pilar. Se a empresa tivesse dois pilares não fortes, não adiantaria lançar o terceiro pilar, o quarto, o quinto, porque não iria dar certo. Agora esta aqui é uma brincadeira de criança. Supomos que nós estamos aqui, e isto daqui é inovação, nós chegamos na conclusão de inovação. Tem quatro caminhos para nós tomarmos, qual seria o caminho mais fácil para a gente atingir o objetivo? Eu vou fazer essa pergunta para o Anacleto, chefe dos escoteiros (risos). Anacleto, qual é o caminho mais fácil para a gente atingir a inovação? A inovação ela está aqui, nós estamos aqui. Tentativa e erro... (risos) e acerto. E se fizéssemos o caminho inverso? Todo mundo concorda em seguir o caminho inverso para achar? Então, já que a gente decidiu fazer o caminho inverso, vamos ver o que está acontecendo no Japão para a gente poder fazer o caminho inverso. Antes de eu falar sobre essas visitas que nós fizemos para conhecer as inovações no Japão, eu gostaria de apresentar um raio-x do Japão. A área

254


8º Bunkyo Rural

aproveitada do Japão é de apenas 30%, 70% é constituído de matas e montanhas. O Japão importa 60% dos alimentos, ele só consegue produzir 40% do que ele consome. Nós fomos em Mikkabi, província de Shizuoka. Mikkabi é uma região produtora de laranja. Bom, aqui está claro, mas a cidade de Mikkabi está cercada por matas e montanhas, eu tirei esta foto (acima) na visita porque esta propriedade aqui, para vocês terem uma idéia, a superfície do terreno deles é uma pedra contínua. O agricultor quebra a pedra, enche com terra, e planta laranja. E nesta região eles criaram uma marca, uma marca para certificar a qualidade deles e que é conhecida no Japão inteiro agora, a marca Mikkabi. Na cooperativa deles, eles pegam um produto, no caso a laranja, e desenvolvem uma série de produtos em cima daquela matéria-prima: vinhos, bolachas, doces, tudo o que vocês imaginarem. Aqui eu tenho um vídeo da cooperativa de Mikkabi. Primando pela qualidade do produto, mais do que a produtividade 255


8º Bunkyo Rural

até, eles querem um produto sem nenhum defeito. É claro que tudo o que a gente vê no Japão não dá para a gente fazer igual no Brasil, mas a gente pode ir adaptando, não é? Bom, de Mikkabi nós fomos para Tóquio. E fomos visitar uma loja"antenna shop"da província de Mie. O que é uma loja "antenna shop"? É uma loja construída em Tokyo onde são divulgados os produtos da província, então as províncias como de Nagasaki ou de Mie, constroem uma loja na capital e divulgam os produtos do seu estado lá. E por que loja"antenna shop"? Deixa eu fazer uma pergunta para o Shiraishi-san, da Noroeste. Shiraishi-san, por que esse nome? Eu perguntei "por que vocês colocaram esse nome na loja?". Porque "antenna shop"? Será que fazem com vários produtos paralelamente? Isso, isso, é, como eu tinha falado, eles divulgam o produto da sua província, mas ele funciona como um antena mesmo, ao mesmo tempo que divulga o produto ele pega da Capital as tendências e transmitem para as suas províncias, as tendências que os 256


8º Bunkyo Rural

consumidores estão querendo. As antenas também têm uma função de solidariedade. Quando ocorre, por exemplo, um terremoto em Nagasaki, os consumidores vão consumir lá para ativar a economia daquela província, para ajudar na reconstrução. Aqui é uma vista de dentro da loja, com os produtos regionais de Mie, depois nós fomos para o mercado de Oota. No mercado de Oota no Japão passam 10% de todos os produtos agrícolas consumidos no Japão, e metade dos produtos que são consumidos em Tóquio. O mercado de Oota foi construído do lado do porto e do aeroporto para facilitar a chegada de mercadorias. São realizadas várias análises dos produtos por segurança alimentar antes de distribuir na Capital, e chegam produtos do mundo inteiro lá. Nós pudemos constatar, durante as visitas, que chegam produtos do mundo inteiro lá no Japão. Depois nós fomos visitar uma rede de loja de presentes, Sembikiya, lá em Tóquio ainda. Em um país que tem de tudo, o que dar da presente? Os eletrônicos mais avançados, todo mundo tem, todo mundo tem um alto poder aquisitivo. O que as pessoas iriam dar de presente lá? Vou fazer a pergunta para a Harumi.

257


8º Bunkyo Rural

Eu sabia (risos). Eles dão frutas. Olha, se nós pegarmos aqui, a grosso modo tiramos dois zeros do preço, um melão custa 270 dólares lá, aqui é 162 dólares o outro melão, esta caixa de frutas aqui é 270 dólares nesta loja de presentes. Só que são produtos de extrema qualidade. Olha este melão, 270 dólares dois melões.

Aí nós fomos para Saitama ver a 6ª industrialização. É 6ª industrialização, não é 6ª fase da industrialização, não é que aconteceu a 1ª, 2ª, 3ª eles falam 6ª industrialização quando une o mesmo produtor, ele produz, pro258


8º Bunkyo Rural

cessa e comercializa, só que a diferença está aqui na comercialização. Ele também está criando um parque temático para o produto, nós fomos visitar lá um produtor de porco, mas o parque não é onde produz o porco não, é separado o local. Aqui é o parque, cujo tema é o porco. Aqui está ele, o parque, tem restaurantes, lanchonetes, cafés, tem até um onsen (thermas) lá e o parquinho para as crianças. As pessoas passam o final de semana lá, isto aqui dá para adaptar para o turismo rural. 259


8º Bunkyo Rural

Depois nós fomos para Gunma visitar um parque de konyaku. O Japão e o Brasil, apesar de estarem em lados opostos do mundo, eles são parceiros ideais. O Japão tem uma pequena extensão territorial e o Brasil tem uma grande, a produção de alimentos no Japão é pequena e no Brasil é grande. O que nós precisamos melhorar é a qualidade dos alimentos, o processamento e o cooperativismo. Este aqui é para lembrar como está o Estado de São Paulo, o Estado mais desenvolvido do país, que é cortado por rodovias que ligam ao porto de Santos e precisamos aproveitar isso, a malha rodoviária que liga ao porto de Santos, e temos aqui aeroportos a cada 100 quilômetros, por exemplo, Rio Preto, Araçatuba, Marília, Bauru. Isto daqui foi uma sugestão que eu fiz em uma apresentação lá na Noroeste. E por que não criar uma marca da Noroeste atestando a qualidade dos produtos que alcançarem aquele nível? Nós temos 33 associações nipobrasileiras ao longo da rodovia da Marechal Rondon, com prédios próprios, por que não canalizar tudo isso? A minha conclusão é que a curto e médio prazo precisamos aumentar a qualidade dos produtos e as marcas regionais, promovendo a 6ª industrialização, e a médio e a longo prazo estar preparados para fornecer alimentos processados através de cooperativas ou associações para o Japão. Como vimos, o Japão importa 60% de tudo que consome e já está preparado para receber as mercadorias em seus portos e aeroportos que necessita importar, desde que haja qualidade. Então muito obrigado. 260


8º Bunkyo Rural

DIA DE CAMPO: PREPARAÇÃO DE BOKASHI Palestrante: Kunio Nagai Especialista em Agricultura Natural e consultor em Agricultura Sustentável

O prof. Kunio Nagai, especialista em agricultura sustentável, realizou uma oficina prática de preparo do "bokashi", um adubo orgânico altamente eficiente, durante o Dia de Campo no Sítio Orgânico Antonio Dias, em Ibiúna. Por ser uma atividade prática, a simples transcrição da gravação da oficina não reproduz a riqueza de informações que foram transmitidas na participação ao vivo. Por isso, publicamos um trecho do trabalho da autoria do próprio prof. Kunio Nagai em conjunto com o prof. Akira Kishimoto. O título do trabalho é "Manejo do Solo e Adubação" e foi publicada em 2008 pela JATAK. Para uma compreensão mais completa do tema, recomendamos a leitura do original, que está disponível e pode ser baixado gratuitamente pela internet: https://issuu.com/nsp-editora/ docs/manejo_do_solo_e_adubacao INSUMOS NATURAIS 6.1.Coleta de inoculante. O inoculante pode ser coletado no próprio sitio, na mata ou no bambuzal. Processo: Em um cocho de bambu cortado ao meio, coloca-se arroz cozido sem sal, somente com água, de preferência do tipo cateto ou japonês, que é mais 261


8º Bunkyo Rural

glutinoso. O colmo de bambu em formato de cocho deve ser fechado com a parte superior do bambu e amarrado com arame, elástico ou barbante, e colocado no bambuzal ou na mata, no solo, em meio às folhas secas, caídas. Deve protegê-lo com uma tela de arame para evitar o ataque de eventuais animais e, nos dias seguintes, examina, se há presença de bolor branco ou rosa, bolor de cor negra deve ser eliminado. Em período muito seco, convém umedecer as folhas caídas onde será colocado o cocho. Esse arroz assim embolorado é colocado em um balde de 20 litros, onde se acrescenta 2,0 kg de açúcar mascavo, ou melaço, ou caldo de cana (5 vezes), obtendo assim inoculante pronto para ser usado, após ser coado para retirar o arroz residual. Multiplicação do inoculante liquido: Uma vez obtido o inoculante, poderá ser multiplicado duas a três vezes. Ingredientes: - 20 litros de água pura, sem cloro ou qualquer produto químico ou contaminante; - 2,0 kg de açúcar mascavo ou melaço, ou 10 litros de caldo de cana; - 0,5 litro do inoculante. Colocar os ingredientes em um balde bem limpo e cobrir com tela ou pano para evitar insetos ou sujeiras. Agitar a solução duas a três vezes por dia. Após três dias, o inoculante estará pronto e deverá apresentar odor de fermentação alcoólica, idêntico ao inoculante original. Embalar o inoculante em vasilhames bem limpos e secos, isentos de produtos químicos ou contaminantes, e armazenar em local fresco ao abrigo da luz e calor. 6.2.Adubo líquido caseiro (tenkei-jiru = suco abençoado) De uma maneira geral, as plantas nativas ou cultivadas desenvolvem-se em harmonia com a natureza, portando, nas superficies das folhas e nas 262


8º Bunkyo Rural

rizosferas, microrganismos benéficos. Entretanto, em condições adversas, os microrganismos se enfraquecem e reduzem em número, prejudicando o desenvolvimento normal das plantas. Nestas condições, os adubos líquidos aplicados, nas folhas ou nos solos, irão beneficiar e fortalecer aqueles microrganismos debilitados, fornecendo hormônios, enzimas, sais minerais, vitaminas e outros ingredientes nutritivos e estimulantes. Preparo: O adubo líquido caseiro pode ser preparado na própria fazenda, com ingredientes disponíveis na região. Ingredientes: Biomassa vegetal (broto novo de capim, folhas novas e tenras, broto de bambu, artemísia, tiririca, etc., enfim materiais de plantas de crescimento vigoroso, cerca de dois sacos (tipo usado para cebola e batata) cheios com uma pedra no fundo para servir de peso; - Tambor de 200 litros; - Água pura; - 5,0 kg de farelo de arroz; - 2,0 kg de açúcar mascavo ou melaço, ou caldo de cana (5 vezes mais); - 1,0 L de inoculante. Modo de preparar: Coloca-se uma travessa de madeira (bastão) sobre o tambor e penduramse os dois sacos de nylon telado cheios de biomassa triturada. Colocados todos os ingredientes, agitar o líquido com uma pá de madeira duas vezes ao dia, para forçar a aeração e facilitar a fermentação. Estado final do líquido. Apresenta-se transparente no início, depois de 2 a 3 dias, completa a fermentação, e o líquido assume a cor verde-amarelada e emana cheiro agradável de fermentação alcoólica. Pode-se também adaptar uma bombinha de oxigenação de aquário, introdu-

263


8º Bunkyo Rural

zindo o tubo dentro do tambor. Neste caso, acelera a fermentação e completa em um ou dois dias. O líquido resultante deve ser coado para a sua utilização, a fim de evitar o entupimento do pulverizador. Aplicação: A calda verde amarelada, produto da fermentação, poderá ser utilizada com diluição de 5 a 10% (5 a 10 litros em 100 litros de água) para pulverização foliar, e 10 a 20 litros em 100 litros de água para aplicação em solo. 6.3. Bokashi 6.3.1. Bokashi simples O bokashi é um adubo orgânico que substitui perfeitamente os adubos químicos, contendo adequadamente os nutrientes N, P, K, Ca, Mg e S, além dos micronutrientes. O bokashi, ao contrário dos adubos químicos, fornece à planta nutrientes de forma gradual, branda e racional, pois a sua absorção não segue o processo de osmose, mas sim, através de microrganismos que se multiplicam na rizosfera das plantas. Existem várias fórmulas para se obter, a mais simples consiste no seguinte:

264


8º Bunkyo Rural

Ingredientes: Terra virgem de barranco, avermelhada, mais ou menos seca, peneirada: ................................................................................. 500 kg Farelo de arroz: ...................................................... 120 - 200 kg Esterco de poedeira, puro, seco e peneirada: ................... 120 - 200 kg Farinha de osso ou fosfato natural ou termofosfato: ........... 50 - 100 kg Inoculante: ...................................................................... 1,0L Modo de preparo: - Misturar os ingredientes o mais uniforme possível. - Aplicar o inoculante diluído em 50 litros de água. - Umedecer a mistura com água, até atingir 50% de umidade. Quando se apertar um punhado da mistura e ele ficar moldado sem escorrimento de água entre os dedos, desmanchando facilmente ao ser tocado é a consistência ideal. Essa massa deve ser coberta com sacos de aniagem para evitar o ressecamento da superficie. - Haverá elevação de temperatura pela fermentação aeróbica, e quando atingir 60°C, deve ser revirada. Essa temperatura pode ser avaliada colocando a mão ou um termômetro de barra no interior. Se não conseguir manter a mão na massa, ou segurar a barra de ferro por muito tempo, deverá ter atingido essa temperatura. - Pode ser que haja necessidade de revirar mais de uma vez por dia, dependendo da temperatura, e, quando a fermentação terminar, a temperatura se estabiliza, o que ocorre normalmente, dentro de 5 dias. Modo de aplicação. O bokashi pode ser aplicado, depois de estabilizada a temperatura, ou seja, terminado o processo de fermentação; estando o produto com a umidade de 12% pode ser ensacado e armazenado durante 6 meses no máximo, para ser utilizado na ocasião propícia. Quanto à dosagem, varia conforme a 265


8º Bunkyo Rural

cultura, porém, pode ser tomada a base de 150 gramas por metro linear de plantas, ou na base de 500 a 1.000 gramas por metro quadrado. Depende também do tipo de solo e da cultura. O bokashi deve ser enriquecido com carvão triturado(fino do carvão), tratado com extrato pirolenhoso, na seguinte proporção: 1,0 litro do extrato para 50 litros de água, cuja solução é suficiente para tratar 100Kg de fino de carvão (pó e migalhas) e esta mistura aplicada em 500 a 1.000 kg de bokashi. 6.3.2. Bokashi sem terra. Pode-se preparar o bokashi sem terra, utilizando farelos e outros resíduos, como exemplo: Farelo de arroz: .............................................................. 500 kg Esterco de galinha seco e puro, ou torta de mamona ou farelo de soja: ...................................... 250 kg Farelo de trigo: .............................................................. . 100 kg Farinha de osso, fosfato natural ou termofosfato: .................... 100 kg Farinha de came: ............................................................... 50kg Inoculante: ....................................................................... 3 kg Melaço: ............................................................................ 3 kg Água: ................................................................ 250 a 300 litros Nota: As quantidades e os tipos de ingredientes poderão ser alterados, conforme a disponibilidade na região. O melaço pode ser substituído por açúcar mascavo ou caldo de cana (garapa), neste caso usar 15 litros. Modo de preparo: Proceder da mesma forma, como no preparo de bokashi simples.

266


8º Bunkyo Rural

FERTILIDADE NO SISTEMA ORGÂNICO ONDE ESTÁ E COMO MANEJAR Palestrante:Carlos Armênio Kathounian Professor do Departamento de Produção Vegetal da Esalq/USP

O que eu me organizei para conversar com vocês foi de como é a minha percepção hoje nessa caminhada de produção de base ecológica, e sobretudo em termos da fertilidade dos sistemas de produção orgânica. Em geral repete-se uma frase que foi bastante lógica cunhada há uns 30 ou 40 anos, que é "sobre um solo sadio tudo vai bem". Se tivesse uma planta sadia, você tem pessoas sadias também se alimentando disso. Eu tenho dificuldade em separar o solo do conjunto do sistema de produção e acho que esse conceito de focar somente no solo não é adequado para criação de sistemas menos dependentes de insumos. É isso que eu vou tratar com vocês. Mas antes disso, eu acho que é importante ter em mente que há diferentes formas de organização no nosso ambiente quanto à sobrevivência econômica na agricultura. Então uma forma muito frequente, talvez a mais cobiçada pela maior parte dos agricultores, tentando fugir dos preços mais baixos em épocas de safra, em regiões favoráveis a determinados produtos, a gente busca estes produtos fora de época. Ou seja, a gente está numa região que determinado produto não é comum. Digamos que você está na Amazônia e você quer produzir brócolis. Como o brócolis tem um preço elevado no mercado, tem que produzir aquela cultura que está fora da região das suas necessidades, 267


8º Bunkyo Rural

mas essa é uma estratégia. E acho que nessa estratégia nós andamos bastante. Normalmente, essa estratégia pode ser caracterizada por aqueles itens da linha amarela. Precisa de bastante dinheiro, aqueles sistemas caros, protegidos. Sempre tem um risco de insucesso biológico, da planta ser atacada por patógenos, pragas, problemas fisiológicos e não produzir o suficiente. Tem a questão da exposição a venenos. Os consumidores se importam muito com a sua exposição ao veneno, mas na verdade, os agentes que mais se expõem aos venenos são os trabalhadores da indústria do veneno e os aplicadores do veneno. O agricultor e o empregado da indústria de veneno são realmente os mais expostos. A Fundacentro, que é uma organização federal que cuida da redução de doenças ocupacionais, coloca a contaminação com veneno agrícola como a principal doença ocupacional do litoral brasileiro. E é um problema para nossa produtividade, porque além das perdas que a própria pessoa pode ter que enfrentar, existe um custo para a sociedade de uma aposentadoria precoce em média aos 40 anos. Então, quando o trabalhador for inutilizado por veneno, vai custar, vai ser um peso para família, um peso para sociedade. Em termos de conhecimento, vamos pensar na produção de tomate cereja em estufa. O que precisamos aqui é um know how bastante específico, é um conhecimento detalhado sobre as particularidades daquela planta naquele sistema de produção. E uma outra coisa: o mercado é completamente anônimo, é um mercado vago. Uma pessoa produz sem saber quem vai ser seu consumidor. O mercado é uma nebulosa. É uma coisa que de certa maneira se forma um preço e a pessoa vende naquele preço. Pode ser que no dia seguinte o preço não seja mais aquele. Se chegar ao Ceasa 3 ou 4 caminhões com o mesmo produto ao mesmo tempo, o preço pode ir pra baixo, mas é um mercado anônimo. Ninguém sabe quem é o seu consumidor. E uma outra estratégia que vem sendo utilizada cada vez mais, mas ainda é claramente minoritária, é em lugar de se arriscar a produzir numa região fora de época, tenta produzir na melhor condição para aquela espécie biológica. Normalmente, esse tipo de iniciativa exige investimento em dinheiro muito menor. O risco biológico de você trabalhar com plantas, podendo ser animais também, na sua melhor condição. É muito difícil perder. Você 268


8º Bunkyo Rural

entendeu? Mas tem um detalhe: exige conhecimento amplo e o conhecimento necessário, em contraposição ao sistema de fora de época, ele é de base biológica. Essencialmente, como funciona a natureza e o conhecimento sobre a agrobiodiversidade. Então, por exemplo, quem trabalha com o tomate cereja em estufa, tem que aprender para tentar ter sucesso no tomate cereja em estufa. Quem quiser trabalhar numa situação de melhor adaptação a cada época do produto vai ter que conhecer a biologia de um número muito maior de plantas e saber como é a natureza, como o meio ambiente aberto funciona, como a natureza cria e recria fertilidade. Faz dez anos que eu me tornei professor. Me tornei professor com quase cinquenta anos de idade. Eu não tinha ideia disso que eu estou especificando para vocês, até começar a trabalhar com os estudantes. Pouquíssimos estudantes têm coragem de sair por ali. Nós temos na escola um trabalho, na Esalq, um trabalho, uma iniciativa de produção orgânica de leite no pasto. É muito fácil explicarmos essa iniciativa. São três ou quatro espécies de forrageiro que nós exploramos e uma espécie animal que é a vaca. Mas conseguir estagiários para trabalhar em hortas diversificadas é bem mais difícil porque o estudante precisa estudar muito mais. Então o conhecimento aqui é diferente. E uma outra característica indispensável para o sucesso nesta modalidade de produzir na melhor época e na melhor região é que na melhor época e região o produto vale menos. Especialmente no mercado capitalista. Então, se você quiser trabalhar nesse caminho, você tem que ter a personalização do seu cliente. Sobretudo esses esquemas de, talvez o mais avançado disso seja essa situação onde grupos de consumidores que estão conectados com um agricultor ou um grupo de agricultores. Tem sido chamado, tem tido vários nomes. Isso nasceu no Japão com o nome de "teikei": um conjunto de consumidores associado a um agricultor, com um contrato por uma safra agrícola, normalmente um ano, 32 semanas, em que os consumidores se comprometem a comprar num preço pré-definido e o agricultor compromete-se a entregar uma cesta de produtos que vai variar ao longo das estações, mas que tem um certo número de itens pré-definidos. Isso na França tem sido chamado de Amap, se procurar na internet aparece muita coisa assim; nos Estados Unidos foi chamado de CSA (Community Support Agriculture) e uma moça recentemente, na faixa de seus 30 e poucos anos, se entusiasmou tanto que trouxe para o Brasil e ela tentou apro269


8º Bunkyo Rural

veitar a sigla CSA, e ela teve que ajustar as palavras em português, e ela chamou isso de Comunidade que Sustenta a Agricultura. Na década de 1993 e 2001, ou até final de 2000, eu acabei virando um produtor de hortaliças e era num sistema meio como esse. Em uma ocasião, nós tivemos um granizo que estragou tudo. Eu recebi antecipadamente e houve um granizo que estragou completamente a produção. As folhas de couve eram uma peneira. Mas minha esposa, que está ali atrás, é quem fazia as entregas. Pensei: "Como é que eu vou fazer agora?". Eu recebia antes, tinha que entregar o produto pronto. Tivemos que entregar pedindo desculpas: "É, a couve furada. Passou um granizo...". Apenas um consumidor se queixou. Os demais consumidores comentaram: "Ah é, passou um vento". Mas por quê? Porque aquela couve tinha nome e sobrenome. Aquela couve era sedimentada, selada numa regulação pessoal de fornecimento que virava amizade com o tempo. Se eu fosse levar aquilo para o mercado, aquilo não teria a menor chance de sucesso. Então, o cliente com nome e sobrenome é essencial para uma iniciativa desse tipo. Essas iniciativas não são mais novidades, elas estão em crescimento e é um dos que mais cresce. Nos EUA, isso aqui cresce mais rapidamente do que a agricultura orgânica certificada. E a agricultura orgânica certificada, por sua vez, é o setor que mais cresce dentro do mercado de alimentos. No Brasil, isso vem crescendo bastante. Eu pintei aqui em amarelo e em verde porque realmente quando a gente se lança a produzir fora de época e fora da região está sempre no amarelo. A gente pode seguir a melhor época de produção, mas você não tem 100% de chance de sucesso biológico e pode ter insucesso no mercado. Mas é uma atividade, a hidroponia, que encaixaria bem na agricultura orgânica. Enquanto esta situação de produzir na melhor época e na melhor região, que pintei em verde, normalmente o risco é bem menor. Mas sem um conhecimento dela, você não consegue fazer. Uma outra diferença entre estas duas maneiras de produzir, é que no caso da produção fora de época, o conhecimento é sobretudo de natureza química e mecânica. Então o sujeito precisa saber bem como funciona a bombinha que faz a solução nutritiva rodar. Ele precisa saber bem se ele coloca um pouco mais ou um pouco menos de nitrato na solução. Exige, e isso o pessoal que trabalha nessa linha tem que saber, um trabalho muito cuidadoso. Todos os dias dentro da estufa observando cada uma das diferenças. 270


8º Bunkyo Rural

E o foco disso é na qualidade do produto. O produto tem que ser tal que o comprador consiga acompanhá-lo no mercado. Enquanto nesse outro sistema, o conhecimento da agrobiodiversidade do conjunto, quando você vai cultivar, é muito mais relevante. Existe uma necessidade, que eu observei, de habilidade relacional. Como você vai trabalhar diretamente com o seu cliente, você estará muito próximo dele. Se você não souber trabalhar com pessoas, se você for daquele tipo de agricultor que fala: "Olha, eu prefiro entregar toda a minha produção pra alguém. E não ficar dor de cabeça", aí talvez esse sistema não sirva pra você. Porque é na relação com o cliente que está o foco disso. O maior patrimônio para quem quer trabalhar neste outro sistema é a clientela. A clientela. Tenho dois estudantes, dois ex-estudantes que trabalharam toda a graduação com a ideia de serem produtores orgânicos com comercialização direta e eles têm um espaço na internet que é o "Meu Quintal Orgânicos". Eu não sei quantas vezes eu conversei com esses meninos para montarem o negócio deles com foco na clientela. O maior patrimônio é a clientela. O seu trator pode ser velho. O equipamento de irrigação pode precisar de muita manutenção. Mas a clientela tem que ser bem cuidada. Bom, então esses dois vieram com essas duas situações bem contrastantes. Não quer dizer que necessariamente esse 'produzir fora de época, fora da região' seja sempre convencional. Nós tentamos fazer isso dentro da produção orgânica também, mas temos os mesmos riscos e as mesmas características em termos de conhecimento também. Pois bem, daqui para frente toda a minha conversa será nesse sentido de discutir elementos para produzir de acordo com o funcionamento da natureza e, no final, um pouco da biodiversidade. Meus amigos, todo mundo disse que trabalha o tempo todo com a natureza. Eu estou nessa posição de agrônomo e me graduei em 1983. Então são 34 anos tentando entender ao longo dessa minha trajetória profissional o que é produzir de acordo com a natureza. Por que ninguém acha que não está produzindo de acordo com a natureza? Eu não sei qual é a melhor resposta. Mas a melhor resposta que eu encontrei foi observando o funcionamento das florestas. As florestas aqui no caso do Brasil são a forma mais disseminada de vegetação natural. 85% do país era floresta. Essa região que a gente está era totalmente florestada. A Mata Atlântica, você tem uma foto da Mata Atlântica no Par271


8º Bunkyo Rural

que do Iguaçu, ela tem essa configuração aí há 4 milhões de anos. Há 4 milhões de anos e quanto se produz aqui? Bom, em termos biológicos, uma floresta como esta produz na ordem de 60 toneladas de matéria seca por hectare por ano. As florestas daqui de São Roque produziam isso. E quanto produz de matéria seca uma área agrícola? Uma cana, que é a nossa cultura mais produtiva, se você pegar o rendimento de cana, você vai chegar num número da ordem de 30. A floresta produzia 60 e a cana, nossa cultura mais produtiva de biomassa, 30, considerando o que fica no campo, a matéria seca. E se pegar uma lavoura de soja, 6, incluindo o que fica. Então, na verdade, esses sistemas naturais são muito mais produtivos, sem necessidade de interferência nossa. O meu raciocínio é que, quando tem cultura numa área produtiva, depois que ela é convertida de floresta pra lavoura, na história do Brasil, com cultura perene, um exemplo mais numeroso são as áreas de café. Entre 20 e 30 anos depois, sem a ajuda de insumos externos, não dá mais café. E com culturas anuais, entre 3 e 5 anos, depois vai continuar produzindo com a ajuda de insumos externos. Então, a minha indagação era como essa floresta cria e mantém fertilidade? Será que se a gente entendesse essa floresta a gente conseguiria trazer esses mecanismos para dentro das áreas agrícolas? Claro, tendo a floresta como exemplo. De alguma forma a gente teria que intervir. E certamente teríamos que intervir, então se a gente entender como a floresta funciona, nós poderíamos listar talvez 50, 60, a listagem mais longa que eu fiz tinha 63 mecanismos através dos quais a floresta mantém sua condição de produção. Mas isso não dá pra trabalhar. A primeira foto aqui é dos meus estudantes, porque 63 não tem jeito. Tá fora do alcance. Então eu comecei a me perguntar quais são os mecanismos mais importantes. E a melhor síntese que eu cheguei foi a seguinte: primeiro, aquele ali. Não existe planta que não esteja bem adaptada que sobreviva numa floresta igual aqui à da região. Se não tiver bem adaptada, some. Segundo, a floresta mantém uma capa de folhas realizando fotossíntese, coletando energia solar 100% do tempo. E nas áreas agrícolas? Nas áreas agrícolas não. Se você olhar para uma área agrícola, boa parte dos 365 dias do ano ela não tem uma cobertura de folha. Quer dizer, os nutrientes disponíveis no solo ou na água não se convertem em biomassa. 272


8º Bunkyo Rural

Terceiro, vocês aqui já ouviram muitas vezes a seguinte pergunta: "o que é que eu ponho no terreno pra ele produzir mais?". Mas tem uma pergunta que eu nunca ouvi e imagino que vocês também nunca tenham ouvido, nem de técnicos nem de agricultores. Talvez essa eu não tenha ouvido também. Mas a outra é: "como é que eu faço para que aquilo que eu coloquei no terreno permaneça ali?". Já ouviram alguma vez essa pergunta? Então você põe. Por que põe? E a razão disso talvez seja porque a espécie humana é a responsável pela maior quantidade de movimentação de materiais no planeta hoje. Nenhum fenômeno natural desloca tanta quantidade de matérias na superfície do planeta como nós. Então nós temos o ferro de Carajás que dá um passeio enorme para chegar à construção da China. Pois bem, e a floresta? Nos ambientes naturais, o aporte, a entrada de materiais é muito menor. Se você considerar o crédito agrícola, é praticamente nula. Então a floresta se organiza para não perder o que ela tem. E não perder nutriente por lixiviação exige uma trama radicular bem seletiva o ano inteiro. Se você semeia cenoura e põe água para molhar a sua sementinha para ela germinar, qualquer excedente d'água vai levar o nutriente para baixo. Você tra273


8º Bunkyo Rural

balha com ideia de que 50% do que é colocado é perdido. Então, como a floresta não tem isso, a trama radicular é essencial. A quarta diretriz é menos evidente. Para quê a gente precisa manter uma camada generosa de detritos em cima do terreno. A gente raciocina que a erosão está ligada à declividade do terreno. Aí, vocês todos já desceram para praia. Você olha para a serra. Aquele paredão da serra vai passar na parte baixa da faixa litorânea, bem no sopé da serra. Você não vê marcas de erosão. Ué, por quê? Se fosse pela inclinação... Na verdade, existe um complexo de organismos que trabalham na decomposição desse material. E esses organismos criam galerias. Eles entram na terra, eles saem da terra. Minhoca, coró de besouro, lacraia, centopeia, vários organismos. A maior parte dos insetos empupa (ação de se transformar em uma pupa, período em que insetos holometábolos preparam-se para entrar na fase adulta) no solo. E ao criar esses canais, qualquer chuva que cai, penetra. E a chuva que penetra, renova o ar do solo. Por aquele mesmo canal por onde vai a água, vai o oxigênio. De tal maneira que, com isso, nós fazemos algumas coisas. Nós seguramos bastante a erosão, tanto o aspecto físico, quanto o resultado biológico dessa atividade. E tem um outro aspecto. O nutriente, a gente é bombardeado com informação sobre nutrição mineral, que é essencial para as plantas. Só que o nutriente mineral, que é mais exigido ao nível das raízes das plantas, em geral o pessoal fala "nitrogênio", mas não. É oxigênio. Para respiração das raízes o nutriente mais exigido é o oxigênio. E o oxigênio só vai ter se tiver uma boa quantidade importante de canais, macroporosidade da interação que resulta dos organismos que trabalham na decomposição dessa biomassa. Então se você tirar a vegetação natural de uma área, logo de cara ela tem bastante porosidade. Depois de uns anos, ela vai diminuir. Ai se você quiser retomar a porosidade, você tem que arar. Arar é uma operação que você realiza; em algumas horas você realiza um hectare, dependendo do equipamento que você tem. Mas é uma operação. E esse negócio, a decomposição da biomassa, não é uma operação. É um processo que ocorre todos os dias do ano. Alimentado pela energia solar que está nos resíduos de plantas. E de outra forma, você vai ter que por energia de óleo diesel para fazer. E finalmente, se você pensar num talhão de eucalipto... o eucalipto é adaptado aqui? Não tem dúvida. Mantém o terreno coberto o ano inteiro? Mantém. Muito melhor do que qualquer lavoura de planta baixa. Tem trama 274


8º Bunkyo Rural

radicular densa, típica? Tem. Claro que para nenhum desses casos, mantém como a Mata Atlântica, mas é muito melhor do que as nossas culturas anuais. Só tem um drama. O pesadelo das indústrias que dependem de eucalipto são as pragas. O aparecimento de uma única praga, uma única lagarta, pode causar a perda do sistema. Então, a última diretriz é maximizar a biodiversidade. Essa é a mais difícil das diretrizes, porque em geral os sistemas de produção agrícola estão interessados em umas poucas plantas ou uma única. Enfim, são essas cinco diretrizes que criam e mantêm a fertilidade nos sistemas naturais.Quando eu falo trabalhar de acordo com o funcionamento da natureza, na minha cabeça não é um negócio abstrato, é completamente isso aqui. Ó, aqui eu não falei de Bokashi, não falei de composto, não falei de microrganismos eficientes, não falei de adubo verde. Todas essas coisas são elementos que a gente pode lançar mão, mas para olhar o sistema, a primeira condição à continuação dos sistemas, para mim são essas diretrizes. Aqui no slide, isso aqui é uma foto do oeste catarinense. Você vê que nessa foto aérea tem áreas que estão sem vegetação, tem áreas com remanescentes de floresta, talhões com pinus, eucalipto, tem pasto, áreas de soja. Então, quando a gente olha para esse mosaico, nós temos diferentes intensidades de decaimento (perda) do terreno em função de diferentes níveis de aderência àqueles princípios. Então essas áreas que estão sem vegetação, o decaimento é muito mais rápido. Enquanto uma área com vegetação natural ou a vegetação arbórea, o decaimento é muito mais lento. No pasto, é intermediário. Tentando sistematizar esse nível de degradação com reconstituição da fertilidade, eu trabalho com um quadro assim. 275


8º Bunkyo Rural

Imagine que no trópico úmido onde nós estamos, se a gente considerar dez mil anos de recursos, em 9950 anos houve um método predominante de recuperar o potencial de produção dos sistemas, que é a capoeira deixada de vegetação natural para se recuperar. Depois de um período de anos, você poderia voltar para aquela área, que vai estar apta para produzir uma nova safra boa. Por razões que vocês conhecem e eu também, isso não é mais possível na maior parte das situações. Mas para efeito de raciocínio, eu dividi a forma de ocupação do solo em dois campos: um campo da degradação e outro campo da recuperação. Então, por exemplo, produção de feno ou silagem, imagina aí, estão produzindo silagem de milho. O milho é bem adaptado? Isso é. Mas não cobre o terreno bem o ano inteiro. Não produz sistema radicular o ano inteiro. Não deixa cisco. Então você tira tudo. Biodiversidade é praticamente o milho. De tal maneira que esta é uma receita rápida para desgastar o terreno. A forma mais rápida pra desgastar um terreno é com produção de feno ou silagem. Por outro lado, se você deixar uma área em repouso arbóreo, você deixar encapoeirado com uma leucina, bracatinga, ou você planta por exemplo, siriguela. Também não deixa de ser uma forma de ocupação arbórea, ai você passa a ter uma situação de mais recuperação do que desgaste. Hortaliças desgastam menos do que silagem ou feno, mas ainda desgastam bastante. Culturas anuais (da mata) já deixam um pouco mais de cisco, então desgastam um pouco menos. Quando a gente vai para culturas anuais de plantio direto, se conseguir acumular palha, a gente já dá um outro salto. E a erosão diminui muito, que também é um fator muito positivo. Mas se em vez de culturas anuais de plantio direto, tiver uma cultura perene capinada, por exemplo, de café, aí eu dou um outro salto porque a gente já tem bem mais tempo para fotossíntese, sistema radicular 276


8º Bunkyo Rural

com mais tempo funcionando. No caso do café não vai juntar cisco, o que não bate. E biodiversidade? É fraco. Bom, culturas perenes, se passo a roçar, melhora, porque tenho dois espaços de captação de luz. Pastagem mais, e finalmente um pousio (ano em que as terras são deixadas sem semeadura, para repousarem) arbustivo, por exemplo, com uma adubação verde com um adubo com um coquetel que inclua plantas arbustivas, eu tenho esse quadro aí. Quer dizer que eu não posso ter uma área constantemente com hortaliças porque vai desgastar logo? Ah, mas tem áreas no cinturão verde com quase cem anos. Não, você pode manter. Só que aí, quando você caminha do pousio arbóreo no sentido de feno, silagem, hortaliça, você tem que aumentar a quantidade de insumos. E do outro lado, quando você desce, por exemplo, você vai converter uma área que era de hortaliça em plantação de caqui, aí você tem menos necessidade de insumo, vai ganhando sustentabilidade. Eu vou mostrar um exemplo de produção de feno ou silagem. Então, aqui o sujeito tomou pinga tão cedo, falou que ia mostrar um exemplo de feno ou silagem e mostrou um canavial sendo queimado? Não. Eu sou muito fraco tomador de pinga e eu não tomei pinga nenhuma. É que se você pensar numa exploração como essa, ela produz muita biomassa. Mas no final, da biomassa já seca que é filtrada no terreno, que o pessoal estima em, da cana entre 10 e 15 toneladas/hectare de hortaliça, na hora que você queima vai embora. E o restante, você leva pra indústria e acabou. Então na verdade, isso funciona como uma área de produção de feno porque você leva tudo embora. Não sobra nada. O resultado é que a cana levou a fama de cultura que degrada muito o terreno. Nas ilhas do Caribe, a cana passou e deixou deserto atrás. O Haiti, que hoje é um país completamente desmatado e muito árido, no final dos 1700, o Haiti era a joia da Coroa. Era a colônia mais cobiçada da América Central. Mas, e se eu mudar e em vez de queimar a cana, que é um processo que no estado de São Paulo está praticamente concluído, e colher a cana crua, a cana, esses 10 a 15 toneladas de biomassa que iriam ser queimados, estão ficando aqui. A cana fixa nitrogênio. Estima-se que 60 a 100 kg de nitrogê277


8º Bunkyo Rural

nio são fixados por ano num canavial, em média no Brasil. No sistema anterior era tudo queimado. Aqui fica. E aqui tem uma outra coisa. Na produção de cana queimada, a gente tem historicamente duas razões para usar insumos químicos. Duas razões mais relevantes. A primeira era que o nitrogênio era provido em forma de ureia. E a segunda era herbicida. Com a manutenção dessa variável, boa parte das plantas invasoras sumiu. Mudou. Foi isso aqui. Foi essa percepção de que colhendo a cana crua haveria menos necessidade de adubo nitrogenado e de herbicida, que levou a Usina de São Francisco lá em Sertãozinho a se indagar: se nós já estamos a meio caminho do orgânico, por que não termina isso e faz 100% orgânico? Hoje, a última vez que fui para usina de São Francisco faz um ano e meio ou dois anos, eles estavam com 17 mil hectares de cana orgânica. O que é significativo em termos produção orgânica no estado de São Paulo. Então vocês vejam que nesse caso, uma única mudança no padrão de cultivo,

278


8º Bunkyo Rural

mudou completamente o panorama dessa cultura. Como é no caso da cana crua, a cobertura verde? 100% do tempo? Não é 100% do tempo. Mas a parte do ano que a gente não tem cobertura é da ordem de 2 meses. 10 meses de fotossíntese. Bom, né. Um número muito menor de meses em outras culturas. Como é a trama radicular densa, ativa? Na época que chove, a cana renova o sistema radicular anualmente. Ela tem uma trama radicular densa, ativa. Não é Mata Atlântica, mas é melhor do que a maior parte das culturas. Biodiversidade? Ah, isso já é mais difícil. Mas o resultado disso é que essa cana passou a ser uma cultura extremamente mais ecológica. Se a gente fosse olhar para isso aqui, eu diria que a gente sairia de uma situação de feno ou silagem para uma situação semelhante à pastagem perene. Então, a gente teve um tremendo ganho em termos de rentabilidade por conta disso. Vamos dar um exemplo de cultura perene de capinagem. Então isso aqui, um laranjal, queimado com glifosato nas entrelinhas, isso aqui é convencional. E na manhã eles tinham passado uma grade para quebrar essa camada cimentada que tinha se formado pelo uso continuado de glifosato. Você vê que ai do lado tem as plantas, ervas secas. Pois bem, provavelmente alguns de vocês conhecem o Kiyoshi Yamada. O Yamada, ele se define como um vendedor de adubo. E ele é um vendedor de adubo muito bom ator. O Yamada se perguntava do ponto de vista agronômico: "faz sentido eu colocar adubo embaixo dos pés de laranja?". A trama radicular das laranjeiras não é muito eficiente. Eu vou colocar fertilizante aí, boa parte disso daí vai ser perdido. Então ele engenhou uma maneira de adubar as ruas, as entrelinhas. De colocar o adubo em cima do mato, do capim. Na maior parte das vezes aqui é Brachiaria. A Brachiaria tem uma capacidade de converter aquele fertilizante mineral em muito mais biomassa e mais rapidamente do que a laranja. E aí, no passo seguinte, era passar com a roçadeira com um jato direcionado para baixo da saia da laranjeira. Na verdade, esse ovo de Colombo do Yamada foi perceber que ele poderia fazer uma adubação mais eficiente colocando fertilizante no capim e ai o capim teria uma adubação predominantemente mineral e depois jogando essa palha embaixo da laranjeira, ele tinha uma adubação orgânica na laranjeira, que se decompõe mais lentamente, estimulava o desenvolvimento dessa camada de vida, que cria canais, que alimenta o solo. E ai ele tinha entrado com umas roçadeiras, que ele tinha chamado de ecológicas. 279


8º Bunkyo Rural

Isso aqui, se a gente comparar isso com isso, aqui, nós coletamos energia do sol 100% do tempo, mas não toda a energia disponível. O outro, a gente coleta energia do sol em dois níveis: no nível das laranjeiras e no nível das plantas baixas. A trama radicular aqui, a laranjeira, tem a recomendação de colocar o adubo embaixo das plantas da laranjeira. Por quê? Porque nessa situação tem pouca raiz de laranjeira na rua, no meio da rua. Porque isso aquece a ponto de a gente não conseguir andar. Então a planta não vai lançar raízes ai pelos absorventes. No caso seguinte, nesta situação, as raízes da laranjeira têm uma distribuição muito mais generalizada no solo. A trama radicular conjunta, laranjeira e Brachiaria, é muito mais eficiente do que só a laranjeira. Junta cisco aqui, não dá para ver bem por causa da claridade, mas junta, pode juntar cisco, dependendo de como a gente manejar. Então isso aqui está muito mais próximo. Quer dizer que não precisa aplicar insumo aqui? Não. Quer dizer que esse sistema, ele é capaz de se manter com muito menos interferências. O que poderia ser melhorado aí? Pode incorporar o capim, só que ele perde essa cobertura nesse momento de incorporar. Em geral, a pessoa olha isso e fala: "ah, podia colocar um adubo verde ai no meio para fixar nitrogênio". Sistemas agrícolas demandam muito nitrogênio. Mas querem ver um outro passo? Podia tentar diversificar esse sistema. Colocando, por exemplo, leguminosa. Aqui é uma foto de uma fazenda (Sítio Monã) comprada pela Faculdade Castelli em Canela, no Rio Grande do Sul. Essa Universidade de Castelli, eles têm um curso de hotelaria e o, não sei como é o primeiro nome dele, todo mundo chama-o de Velho Castelli. O seu Castelli, um italianão muito empreendedor, tem esse negócio de hotelaria que casa bem com agricultura orgânica. Então ele comprou uma fazenda e incluiu no curso de hotelaria disciplinas de agricultura orgânica. E aí, nessa fazenda, o filho dele se encantou com essas bruxarias de biodinâmica e tal e então a fazenda virou biodinâmica. E aí vocês estão 280


8º Bunkyo Rural

vendo que as laranjeiras estão bem altas. Laranja Bahia, que estava condenada e, na hora da conversão, fizeram uma poda drástica para ver se dava uma sobrevida para as laranjeiras produzirem alguma coisa ainda. Não tinham muita esperança. Aqui nós estamos vendo uma foto de novembro. No meio das ruas dá impressão pela posição da câmera que a rua é larga. Uma rua de 6 metros. Só que em vez de plantar uma espécie, eles fizeram um coquetel. Um coquetel em que esse aqui é trevo branco, que é uma leguminosa que fixa bem o nitrogênio, aqui é ervilhaca peluda, que também fixa, e aqui é ervilhaca comum. Plantas que se adaptam bem àquela condição. E aqui é folha de aveia. E tem azevém, aí por baixo também. Eles fizeram uma adubação verde com cinco espécies e nessa perspectiva de melhorar a biodiversidade do sistema e também de fornecimento de nitrogênio. Então aqui, em Junho de 2012. Não sei é bem visível aqui: a cor meio alaranjada, fraca em nitrogênio das folhas da laranjeira neste momento; e esse verde melhor em junho de 2012. Em um único ciclo de adubação verde desse coquetel. Tem mais uns detalhes aqui nesse siste281


8º Bunkyo Rural

ma que não aparece. Aqui a gente não vê, mas o material debaixo está nascendo de novo. É que em vez de utilizar, como no caso do Yamada, uma roçadeira, que naquele caso do Yamada já era um avanço sobre o anterior, eles têm um triturador biológico que dá carne e lã. Eles mantêm ovelhas, então o sistema ali é pela biomassa, eles soltam as ovelhas e as ovelhas trituram aquilo, urinam, defecam e assim vão... E tem esse excedente de produção. Pergunta do público: qual seria um erro conceitual nessa planta? Então aqui, um problema que eu vejo nesse sistema, e eles já melhoraram isso, é que citrus não convive bem com gramínea no pé. Então o meu palpite para eles aqui era que pelo menos numa faixa de 2 metros de fora a fora eles eliminassem a vegetação herbácea. Pergunta do público: eu tenho outra pergunta. Nem todo lugar presta para citros? Você está vendo uma rua aí, não sei quanto tempo de sombra tem isso, parece ser legal você ter ruas sempre orientadas para o norte. Onde dá pra fazer, em situações em que você pode, tem relevo mais plano, isto é uma consideração interessante. Aqui, Canela, Gramado, na Serra Gaúcha o terreno é muito quebrado. Enfim, a laranja não consegue conviver bem ali, mas a saia está alta, porque foi podada recentemente. Mas o que eu queria falar para vocês aqui, que a gente pode olhar para essas diretrizes e ir tomando a sopa quente pela beirada. O que eu posso fazer em cada cultura. Então, de culturas diferentes capinadas, se eu fosse olhar esse quadro, que o salto de inovação foi transformar isso em uma pastagem perene com árvores, porque a natureza não sabe. Isso aqui é semelhante a isso. Isso é uma área de pasto com uma árvore de Leucena. Quero dizer, do ponto de vista de construção da natureza, Laicar é um extrato herbáceo e permeado contínuo com árvores num extrato descontínuo. Aqui também, o sistema radicular, coleta de luz seguem um pa282


8º Bunkyo Rural

drão semelhante. Vou trabalhar um pouco com hortaliças que eu acho que é a atividade mais importante originalmente e talvez frutas também, mas eu me preparei para hortaliças. Então, tem uma ideia assim: não, vamos fazer produção de hortaliças, aí a gente faz reciclagem, pega os restos de cultura, faz composto e assim o sistema se fecha e fica o cíclico, tal. É uma ideia falsa. Por que é falsa essa ideia? Porque a reciclagem não vai garantir esse sistema. Vamos imaginar que a gente comece aqui com uma quantidade de restos de cultura e esterco, nós fazemos uma pilha de composto. No processo de compostagem, normalmente nós temos perdas importantes de potássio, nitrogênio e biomassa, aquele aquecimento se dá pelo que as bactérias consomem da biomassa. Mas não perde fósforo. Bom, aí a gente entra com uma pilha de composto. Normalmente a pilha de composto, uma quantidade de composto pronto, normalmente o composto pronto dá metade do volume da pilha. E afinal, nós vamos tirar esse composto de onde ele está e aplicar. Tem perdas na aplicação e tem perdas depois no solo. Mas afinal a gente tem as culturas em crescimento que vão gerar um produto. E uma parte do que cresceu aqui vai para lá. Só que essa parte é muito menor do que o que entrou, de tal maneira que esses sistemas, na verdade, acabam dependendo de uma entrada anual de material vindo de fora. Se você for reciclar o que sai do sistema, você não consegue manter isso funcionando plenamente. Isto aqui não é novidade nenhuma. Todo mundo que trabalha com hortaliças sabe dessa necessidade anual. Então, no caso de hortaliças, eu acho que a grande pergunta é como a gente reduz o tamanho dessa entrada anual. Eu fiz uma conta por cima, do Paraná, de milho, com os dados de produção da região. Um hectare da horta lá, convencional ou orgânica, recebe anualmente ao redor de 40 toneladas de composto por 283


8º Bunkyo Rural

ano. Se esse esterco for de vaca, considerando o rendimento das pastagens lá e quanto as vacas produzem de esterco, são necessários mais ou menos 6,5 hectares de pasto para manter um hectare de horta. E se for esterco de porco, que não é utilizado para hortaliça, mas isso é mais para efeito de cálculo. Quase 14 hectares. O porco é mais forte. Mais forte que esterco de galinha. No caso de esterco de aves, 16 hectares a gente precisa para manter. 16 hectares com milho e soja para manter um hectare. Ah, então não é sustentável só para que se produza alimentos? Muito difícil. E aí você entende que esterco de galinha seja muito mais forte porque na verdade ele está carregando um potencial de fertilidade numa área muito maior do que no caso de vaca. Então, como é que a gente pode diminuir essa relação? O ideal é que a gente não precisasse trazer material de fora. Mas isso não é possível. Então conheci uma maneira muito simples. Esse aqui em Londrina, uma horta orgânica comercial do seu Paulo Nakamura, que era meu vizinho. Ele fazia o seguinte: ele plantava cenoura e junto com a cenoura ele plantava 284


8º Bunkyo Rural

rúcula, no mesmo dia. Qual era a lógica? Ele ia ter que por fertilizante, por água, cuidar do mato. E se ele tivesse só cenoura, era mais complicado para ele, na escala que ele trabalhava, fazer tudo isso do que se colocasse rúcula no meio. Que a rúcula chega ao ponto da colheita em perto de 30 dias. Vocês vêem a rúcula, quase poderia colher já. Vou deixar mais uns poucos dias para colher. Enquanto a cenoura está até agora assim. Então o mesmo trabalho, a mesma dedicação, o mesmo fertilizante que ele colocou, que ele colheria só a cenoura em 3 meses, 3 e meio, aqui ele está colhendo rúcula agora e a cenoura mais para frente. Dá certo isso aí? Esse lugar é próximo da Mata Atlântica. Mas esse sistema, em relação à cenoura isolada, sozinha, ele colhe melhor a luz, tem mais raiz e não deixa cisto nenhum. Cisto, eu vou comentar sobre o cisto. Com cisto tem mais biodiversidade do que se fosse sem. Por que ele não usa cisto? Porque isso aqui é uma horta orgânica, coisa aí de uns 2500 metros de horta orgânica que ele vende na vizinhança. Porque o consumidor orgânico acha muito legal o fato de não ter veneno. Só que esse encantamento dura até a dona de casa encontrar a primeira lesma. Encontrou a primeira lesma, acabou o encantamento. Então, qual que é o ambiente ideal para a lesma? Matéria orgânica abundante, umidade e baixa temperatura. Se eu colocar cisto aqui, ele sabe que vai precisar irrigar menos, que ele vai manter o sistema melhor, mas, vai formando esse meio propício para o desenvolvimento de lesmas. Então, por isso que não tem cisto. Isso aqui é uma horta orgânica com dimensão bem maior em Foz do Iguaçu. Daqui é difícil distinguir que culturas são. Mas dá pra você verem que tem uma linha mais escura e uma mais clara. Isso aqui é uma combinação de alface com almeirão pão de açúcar. Então o almeirão pão de açúcar pede um espaçamento bem maior e tem um ciclo bem mais longo e raiz muito mais profunda. Esse agricultor fornece para hotéis em Foz do Iguaçu e planta o almeirão e a alface, as mudinhas no mesmo dia. Aí o espaçamento é para o almeirão. A alface vai no meio 285


8º Bunkyo Rural

do almeirão. Em 35 dias sai a alface e com 60, 65 dias depois do transplante, sai o almeirão. Então, é a mesma lógica da rúcula com a cenoura, só que com o sistema menor e uma duração maior. Aqui ele usa cisto mesmo no inverno. Por que em Foz do Iguaçu tem temperaturas bem mais elevadas durante o dia no inverno do que em Londrina, então ali o risco de lesma é menor. Aqui é outro exemplo, de repolho com alface. É um negócio mais radical. É uma horta doméstica, minha casa, em Londrina. Vocês estão vendo mais almeirões e uns pézinhos de couve. Qual era a minha lógica? Se eu plantasse um metro quadrado com dez pés de alface, era muito mais do que eu preciso para minha família em uma semana. Então o que fazia era misturar sementes de alface e almeirão, tudo junto. Algumas variedades de alface e outras de almeirão. Com 3 semanas, a alface é bem mais rápida que o almeirão, então com 3 semanas já tinha alface bebê. E a alface romana é mais rápida do que a americana e a americana é mais rápida que essa brunela. Então, quando a americana tava assim, quando a rúcula tava assim com 3 semanas, já virava alface bebê. E à medida que tirava cada uma delas, ia abrindo espaço para as outras. Aqui já não tem mais alface. Terminei de colher alface, eu dei uma catadinha no mato e vocês vêem o almeirão. Este é almeirão folha larga, aqui é o pão de açúcar, aqui é uma variedade de radiche. É almeirão também. Aqui é outra variedade radiche um pouco mais clara. E no meio você vê os pezinhos de couve. 286


8º Bunkyo Rural

Um mês, no máximo um mês e meio depois da data dessa foto, não tinha mais almeirão. Aí a couve já vai ficar naquele canteiro e ai ela vai ficar uns 6~8 meses, dependendo da planta. Então na verdade, isso aqui em miniatura é a mesma sucessão ecológica que você vê em uma floresta. Só que é tudo em miniatura. Isso aqui colhe muito melhor a luz, tem muito mais raiz, aproveita melhor os nutrientes, tem mais biodiversidade. E neste caso aqui não tem cisco. Por que não tem cisco? Isso aqui é Londrina de novo. Pela mesma razão que a minha esposa que está ali, ela é desse jeito assim ó. É o que eu estava descrevendo, ela acha tudo muito legal desde que não encontre lesma. Então, se pusesse cisco, podia reduzir a frequência de irrigação. Mas aí teria esse inconveniente. Isso aqui é uma horta numa outra condição. Isso aqui é uma horta orgânica grande. É a horta da Vila Yamaguishi. É uns 8 hectares, aqui em Jaguariúna. Possivel287


8º Bunkyo Rural

mente alguns de vocês conhecem o lugar. Nesse esquema da Vila Yamaguishi a gente não vê consorciação. No esquema de trabalho deles é difícil isso. Mas o que eles tentam fazer é a reposição de uma cultura imediatamente depois que outra sai. Então nós temos aqui 100% do tempo coberto, sem grandes janelas. Mas tem uma pequena janela no início de cada cultura. Então colhe relativamente bem a luz, mas não tão bem quanto à situação que mostrei do seu Paulo Nakamura ou a minha. Aqui tem raiz absorvendo? Tem. Podia ser melhor um pouquinho. Mas tem. Mas o que realmente tem de muito legal aqui é biodiversidade. E a própria, quando você pensa numa horta de 8 hectares, você não imagina que vai encontrar tanta variedade. Você imagina que vai ter, por exemplo, um hectare só de repolho. E outro hectare só de outra coisa. Mas na verdade a horta deles, eles trabalham com aquela lógica de contato direto com o consumidor, eles têm um sistema de distribuição também direto, então eles têm essa tremenda diversidade. A horta da Vila Yamaguishi é a horta mais biodiversa que eu já vi na vida. A cada semana eles colhem 20, 30, até 40 produtos em ponto de colheita. Mas ao longo ano, acho que dá uns 60, 70 produtos diferentes que eles vão servindo. Uma outra coisa interessante na aplicação das diretrizes é em relação ao mato. Então a cobertura do cisco é uma coisa importante não apenas por alimentar o sistema de decomposição que areja o solo, mas também pelo controle de mato. Essa é uma área que foi com Crucíferas, cada linha é um tipo de planta, aí tem repolho, brócolis, couve-flor. Vejam, 28 de maio. Essa aqui, 28 de junho. Aqui você vê melhor. E foi colocado aí o que tinha de cisco nessa área demonstrativa. E essas crucíferas foram até o final do ciclo sem ver enxada, por conta do cisco. Nós fizemos um trabalho num assentamento em Americana com cobertura 288


8º Bunkyo Rural

morta. Faz uns 4 ou 5 anos. Desde então, os agricultores vão ao canavial, tiram as folhas secas para fazer o efeito de cobertura morta no controle de mato que é muito grande. E tem uma iniciativa muito legal, não sei se vocês conhecem, do NEA, Núcleo de Estudos em Agroecologia e Produção Orgânica de Avaré. É um sistema que envolve a escola, envolve também a CATI. É um sistema que eles estão chamando de PMB. O que esse PMB? P de Palhada, M de muda alta e B de biofertilizantes. Então eles tentaram fazer um sistema em que você incorporasse essas diretrizes na produção comercial de hortaliças em maior escala. Mas aí o drama era o mato. Então o mato eles resolveram com a camada de palhada bem alta. Eles depararam com um problema. Com uma camada desse tamanho de palha, como é que eu vou pôr a mudinha, que é desse tamanho? Então eles começaram a fazer a recria das mudas. Eles tiram as mudinhas do alvéolo pequeno e colocam num copinho. E ficam na casa, na área protegida. Aí quando um pezinho de repolho já tem esse tamanho, eles levam para o campo, que ele já consegue conviver com isso. Escuta, como é que a gente vai adubar um negócio assim? Foi aí que entrou o terceiro elemento, P da Palhada, M de Muda alta e o B de Biofertilizante. Lá eles estão usando esterco de galinha num sistema anaeróbico em água. E aí eles aplicam isso. E esse material ele escorre por entre a palha e vai chegar e alimentar a planta. É interessante por que uma lavoura de repolho, por exemplo, você ia ocupar o terreno dois meses e meio se fosse mudinha, eles ocupam por bem menos tempo. Eu não sei dizer exatamente quanto, acredito que ao redor de um mês e meio. Por quê? Porque a mudinha já vai vir mais alta. Num mesmo espaço, se você conseguir no inverno, espaço para fazer 3 repolhos, ou 3 culturas de um mês e meio, dois meses, você consegue fazer um número maior de culturas. Porque essa fase inicial da cultura em que ela não está usando bem o terreno, ela está dentro da área protegida. 289


8º Bunkyo Rural

Então o que eu falei até esse momento, era sobretudo em termos de como a natureza funciona. Vou falar um pouquinho agora de agrobiodiversidade. Em geral, a conversa é assim: "ah, produzir verdura, produz bem no inverno. Mas quando chega o verão, não dá muito certo. Não tem verdura que sai bem no verão." Quero dizer, tem e não tem. Então eu vou comentar uns poucos exemplos. Isso aqui vocês conhecem, é feijão de metro. Feijão de metro é um feijão que dá desse tamanho assim. Até meio de dezembro, a gente consegue colher vagem comum, sem grandes dificuldades. Mas de meio de dezembro para frente, as doenças e a temperatura elevada fazem vagem comum ficar bem difícil. Essa espécie aqui, ela foi domesticada no sul da Ásia, selecionada para produzir vagem na época mais quente e mais úmida do ano. São meses de janeiro, fevereiro, março, aquele calorão e ela está produzindo bem. Tem um problema com essa espécie. É que depois que você dá esse para cozinheira, ela não vai querer mais a vagem comum. Porque essa não tem que tirar fio. Por que essa aqui é uma domesticação muito mais antiga no sul da Ásia do que a vagem comum. E aí o alho poro, que é só para chamar a atenção. Eu não sei por que a gente não planta mais alho poró? Por que é uma planta considerada sofisticada, mas que em termos de produção não tem nada de sofisticação. Tem um ciclo longo mas... Isso aqui é uma plantinha de tomate que, vocês vêem pelo tamanho dos frutos que a planta é muito vigorosa mas não tem folha. As folhas foram queimadas. Por quê? Nada. Começou a chover. A planta do tomate, ela não consegue conviver, lá no processo de evolução dela, foi em ambiente seco, de ar seco. Então ela não consegue con290


8º Bunkyo Rural

viver direito com ar úmido. Se for ar úmido e calor, aí a pinta preta (ou alternaria) come. Se for ar úmido e frio, aí a phytophthora (podridão) destrói. Você não colhe. E se não tiver o ar úmido praticamente nós não temos doenças foliares. Porque o tomate se originou nas montanhas do México numa condição assim. Isso aqui é tomate em Londrina também, em casa. Vocês vêem pelo matagal que está aqui, que eu não sou um sujeito muito cuidadoso, de ficar alisando muito. Quando eu tenho tempo eu aliso a minha mulher. Que ela vai falar também que é pouco, que tinha que ser mais. Esse aqui é tomate industrial. Se você comparar o tomate industrial com o tomate de mesa, o tomate industrial foi feito, foi selecionado para ser rústico e para dar bastante matéria seca, porque vai ser convertido em molho, purê e tal. E o tomate de mesa? O tomate de mesa foi e continua sendo selecionado para dar fruto que enche a vista e que aguenta bastante tempo de deslocamento. Você chega nuns tomates de mesa modernos, a maior parte deles não tem gosto de nada. Se comer isopor é quase igual comer um tomate isopor com água. Eu não dou conta desse tipo de tomate, como é que você se abastece de tomate o ano inteiro? Não me abasteço o ano inteiro de tomate. Mas isso aqui vira molho. Para mim não é uma atividade comercial. Mas é uma atividade que pode ser comercial para muita gente. Aproveitar a melhor época do ano para transforma o tomate produzido nessa época em molho. O tomate industrial, eu trabalho com uma panela para fazer molho para meu consumo, que cabe uma caixa. Essa caixa com esse tipo de tomate, quando ela perde um terço do volume, já está bem espesso do jeito que a gente gosta. E se for tomate de mesa para fazer 291


8º Bunkyo Rural

alguma coisa, precisa reduzir até metade da panela. Quer dizer, esse tomate tem mais matéria seca do que o outro. E aqui são duas fotos tiradas no mesmo dia na Fazenda Nata da Serra, em Serra Negra, onde o pessoal do Ricardo Schiavinato produz sobretudo laticínios orgânicos, mas tem uma produção de tomate também. É o tomate que estava no campo. E aqui é o tomate que estava dentro da estufa. Esse aqui é a estufa. Então a minha sugestão é que você plante tomate em estufa? Não, você faz o que você quiser. Só estou querendo mostrar como o ambiente é importante para a manifestação do problema. Se você quiser fazer tomate em estufa, provavelmente você pode ter mais sucesso do que se fazer em ambiente aberto quando você tem bastante chuva. Mas você vai estar numa situação também de mais risco do que o tomate a céu aberto na melhor época. Bom, então o que dá para fazer em cada época do ano com essa história do conhecimento da agrobiodiversidade? Eu perguntava para minha esposa porque ela é bem mais esperta do que eu. Então eu estava pensando em ser professor e aí um domingo a gente, não lembro se ela tomando café ou almoçando, eu falei para ela: "como será que eu faço para mostrar para os estudantes as possibilidades que a gente tem em cada época, de produtos?". Aí ela falou: "tira fotografia!". Tira fotografia como? Aqui a história era o seguinte, para o nosso consumo, lá em Londrina, eu normalmente colhia os produtos no sábado de manhã ou no domingo de manhã. Por que se estivesse na horta, ai não tava muito fácil, tinha que estar mais perto da geladeira. Sábado de manhã, passava ali e colhia as coisas, que ficavam na geladeira para abastecer a semana. Ai eu fui tirando as fotos, ao longo de um período de cada. Se vocês olharem as datas aí e voltarem num calendário, é sempre num sábado ou num domingo. Essa foi a minha primeira foto. Foi dia 29 de outubro. Então já no começo da primavera. As culturas de inverno estão praticamente no final e as de verão não entraram bem ainda. Essa foto aqui, ó é o que eu colhi nesse dia. 292


8º Bunkyo Rural

Não quer dizer que não poderia colher outras coisas ou que não haja outras plantas passíveis de produzir nessa época. É efetivamente o que eu colhi. Então vocês vêem aqui que eu tinha terminado de colher feijão, são 3 variedades de feijão. Tinha terminado de colher amendoim. Tinha jilozinho, aqui a cebola, alho, tomate cereja, um pouco de grumixama, almeirão pão de açúcar, alho poró, isso aqui acho que é espinafre, isso aqui um outro almeirão, repolho, funcho, isso aqui eu não estou sabendo o que é agora, beterraba, esse almeirão às vezes o pessoal chama de almeirão roxo, almeirão branco, na verdade é uma alface silvestre. Aqui, banana ouro, aqui banana nanica, mandioca, aqui eu não sei, parece limão. Aqui rabanete, salsão. É, enfim, isso foi o que eu colhi nesse dia. Mas eu não sou especialmente trabalhador. O que entrava para fazer essa produção aqui? A água, um pouco de esterco e um pouco de suor. E biofertilizante, calda bordalesa, calda sulfocálcica? Eu acho que esses são recursos interessantes, mas não para isso que eu fazia. Por que isso aqui era para eu consumir, então eu não tinha como ficar tratando cada planta na sua situação ideal. Eu tinha que trabalhar com as plantas que estavam bem adaptadas à condição. Essa foi a minha primeira foto. Esta foi a segunda. Ó, eu evolui, né. Eu evolui nas fotos. É jaca? É jaca. Então de novo: banana prata e banana nanica, jaca. Isso aqui em 6 de janeiro. 6 de janeiro que é o típico do verão. Aquela vagem de metro que eu estava falando para vocês, uva, acerola, abóbo293


8º Bunkyo Rural

ra, manga, mamão, maracujá, limão, pimenta doce, quiabo, milho verde, feijão de corda. Esse aqui? É feijão de metro. Vai ter alguma foto que o feijão de metro é o primo hortícola do feijão de corda. E aí quiabo, carambola, tal. Por que é que não tem folha aqui? Na verdade, não tem porque eu não colhi, mas se eu quisesse plantar alface nessa época seria complicado. Nessa época podia estar colhendo, por exemplo, bertalha, podia estar colhendo taiova, couve. Tem um tanto de folhosas que se adaptam bem nessa época. Mas eu não colhi. Por que foi o que eu colhi, não é o que seria possível nessa data. E isso aqui numa época em que se você for olhar os agricultores vão dizer: "não, tem pouca verdura, é muito complicado". Mas aqui tem verdura para comer vários dias. Especialmente, se você olhar talvez dê para comer dois ou três tipos de verdura cada dia da semana e não vai gastar tudo. Manga verde, manga é fruta ou é verdura? É fruta. Mas se você for pensar um pouquinho, pergunte para si mesmo: qual é diferença entre uma fruta e uma verdura? Provavelmente você vai descobrir que a gente tende a chamar de fruta o que é usado para sobremesa ou para fazer suco. Em geral é doce, mas às vezes não. E a gente tende a chamar de verdura o que acompanha prato salgado, normalmente é um prato salgado, comida crua ou cozida, em geral um acompanhamento. Então chuchu é verdura. Couve é verdura. Mas laranja é fruta. Escuta, e se a gente pegar manga verde e fizer salada? É uma fruta, mas está sendo usada como verdura. Faz sentido? Se pegar abacate também. Se fizer mamão verde refogado? Espera, mas quem vai comprar mamão verde? Se você for depender do mercado anônimo, muito pouco. Se você tiver uma relação com seus consumidores, você vai contribuindo para o aprendizado deles também. No sul da Ásia, a jaca verde é uma hortaliça tradicional. Colhe bem verdinha. Esse aí é janeiro, melhorei de qualidade. Esse aqui março. Março é o sinal do verão. Em março você vê aqui de novo, as bananas e jaca o ano inteiro, aí outra banana, alho poró. Vejam que o alho poró ainda nessa época, final de verão, a gente tinha. Milho verde e isto aqui é fruto de juçara. O fruto de juçara dá uma bebida que lembra muito o açaí. Quem não é de Belém do Pará não diferencia e o pessoal do litoral aqui tem produzido juçara e tem chamado de açaí da Mata Atlântica. Não é difícil fazer: põe na água morna e depois bate em peneira. E aqui vocês têm pupunha, que é uma planta da Amazônia, abacate. E esse aqui é o feijão de corda mesmo. Aqui acho que é acerola, que é 294


8º Bunkyo Rural

um cítrico. Isso aqui é jerivá. Para quê que você pôs isso daí? Para foto ficar bonita? Também, mas na verdade era para outra função. Mas você come jerivá assim, coquinho amarelo? Ah, uma meia dúzia. E o restante do cacho, o que você faz? Os porcos aproveitam bem, eles se distraem e depois isso vira torresmo. Por essa razão, por essa razão que o jerivá está aí. Mas tem um professor da Universidade Federal de Santa Catarina, o professor Richard Miller, que vem trabalhando para produzir uma bebida semelhante ao açaí do fruto do jerivá e vendendo para merenda escolar lá no litoral catarinense. Palmito de jerivá é uma possibilidade, mas demora muito para crescer. E isso é a cereja do bolo. Isso é jurubeba. Como é que o pessoal come jurubeba? Faz um picles, ele é amarguinho. Na França, os franceses fazem um esforço para valorizar esses produtos locais e transformar isso em alta gastronomia. Então, a gente pega, todo mundo aqui já comeu alcaparra. O que é alcaparra? É o botãozinho de um arbustinho que cresce nas encostas rochosas do Mediterrâneo. O botãozinho da flor antes de abrir. Se aqui fosse a França e isso não chamasse jurubeba, talvez chamasse "jurrubeb", se fosse "jurrubeb" nós valorizaríamos bastante, mas como é jurubeba, a gente não valoriza. Se faz cachaça? Mas é uma outra espécie. Mas tem outros usos também. Aqui em 20 de maio. Vocês vêem, já é outro elenco de plantas. Vocês 295


8º Bunkyo Rural

conhecem? Orelha de padre? Então, o gosto é muito semelhante à ervilha torta. Mas do ponto de vista agronômico, é completamente diferente. Ervilha torta é uma planta de clima temperado, de inverno. Enquanto que isso aqui, a orelha de padre, é uma variedade hortícola do lablab (planta de cobertura), o mesmo que é usado na adubação verde. Ele dá uma vagem grande, é bastante rústico, ramifica e trepa bastante. Se você plantar aqui nesse comprimento, a gente poderia colocar umas 4 ou 5 covas, tomaria completamente. É um pouco diferente de ervilha torta, mas é muito parecido. Uma pessoa que não tem o hábito de comer ervilha torta acharia a mesma coisa. É uma forma de ocupar a cerca, tal. Aqui, isso aqui é nabo, bom, para o pessoal da colônia japonesa, não tem necessidade de falar de nada. Mas tem duas hortaliças, que é a mesma espécie botânica, mas tem duas hortaliças do ponto de vista do consumo. Tem a folha e tem a raiz. E isso aqui vermelhinho vocês consegue ver o que é? Hibisco. "Ume", né. Interessante que o ume, o ume e o quiabo são plantas muito aparentadas. Só que o ume não pega nematoide. O nematoide de galha não causa dano no ume. No quiabo, sim. Então para mim, como eu tinha muito nematoide de galha, estão na mesma cova, ume e quiabo. Se tiver nematoide sai ume. Se não tiver nematoide, o quiabo sai na frente. Mas o interessante do ume é que o ume é uma planta de uso múltiplo no Brasil, mas de uso restrito por cada grupo populacional. Então o japonês usa para fazer picles, é o uso mais tradicional. Alemão não faz picles de ume, faz geleia. Faz geleia e é uma geleia que dá ponto muito rápido. E aí o pessoal chama de geleia de hibisco, geleia de vinagreira. No Maranhão, ume é a hortaliça de folha mais consumida. O pessoal chama de cuxá. Chama arroz de cuxá. Se botar na internet arroz de cuxá vocês vão ver ume. No interior de São Paulo, de Minas, norte do Paraná você vê uso do mesmo pedacinho da planta para fazer suco e o pessoal chama de groselha. Eu, na época que eu plantava hortaliça para vender, umas vezes eu comecei colocando ume. Explicava como é que era. Algumas vezes que não deu tempo de colher frutinho por frutinho, cortava o galho e punha ali. Uns dias depois vinha a reação das famílias que a gente entregava: "Manda mais daquele negócio, mas manda no galho". Porque o pessoal achou bonito para usar como ornamental. Então é interessante que, quando você tá interagindo com o consumidor, você descobre que ele tem outras expectativas em relação ao que você está fornecendo, que não é apenas para comer. Para mim, estava ótimo. 296


8º Bunkyo Rural

Essa foto é de 30 de julho. Nessa foto de 30 de julho parece mais de catálogo de empresa de semente. Por quê? Por que catálogo de empresa de semente tem sobretudo espécies de época fria, que são as espécies de primavera temperada que a gente aqui cultiva no inverno. Aqui tem couve flor, almeirão pão de açúcar, repolho, alface americana, salsão. Tem outras coisas tropicais que continuam aqui. Acho que é espinafre, almeirão vermelho, mas tem mandioca, jaca, tomate cereja, açafrão. Não tem problema, assim. Bom, o que vocês viram nessa série de slides? Na verdade é que em cada semana, isto aqui era para eu comer. Sem fazer um, nenhum esforço sobrenatural, tinha uma dúzia, duas dúzias, talvez mais de produtos prontos para serem colhidos. Se eu quiser trabalhar isso de maneira mais profissional, poderia ter muito mais espécies sendo produzidas em cada época, usando como insumos materiais um pouco de esterco e água. Mas aqui tinha muito desse insumo imaterial que é o conhecimento da agrobiodiversidade. E o conhecimento da clientela. Na verdade o meu aprendizado é que a gente pode criar sistemas menos 297


8º Bunkyo Rural

dependentes de insumos externos e estimulando a criação de fertilidade, a manutenção tanto quanto possível no próprio sistema e usando a biodiversidade. Era isso que eu me preparei para compartilhar com vocês, meus amigos. Obrigado.

298


8º Bunkyo Rural

NOVOS RUMOS DA AGROECOLOGIA: TROCAS DE EXPERIÊNCIAS Palestrante:Ondalva Serrano Sócia Fundadora e Conselheira do Instituto Auá

Há toda uma interatividade muito grande entre a natureza, o solo, a biodiversidade e o ser humano, e com a sua grande capacidade de, ao coviver com a natureza, aprender a ler as leis e os mecanismos que regem a vida. E foi este contato direto do ser humano gerado pela natureza do nosso bioma, dos nossos biomas terrestres que possibilitou que nós, seres humanos, desenvolvêssemos e materializássemos nosso potencial vocacional de ser criativo, inventivo, comunicador, que realize e transforma. Então, parabéns e grata meu querido amigo, e também a sua esposa porque parece que têm um processo de aprendizado conjunto e recíproco. Por que os dois trabalham, eles não só vivem juntos, eles pensam juntos, trabalham juntos e fazem as coisas juntas. Nós não teríamos tempo hábil para poder explicar todos os campos de trabalho que faz o Instituto Auá, mas nós temos todo um processo de resgate dos nativos da Mata Atlântica. Então todo um conjunto de alimentos, que durante séculos alimentou a população que habitava o Brasil, hoje é desconhecido, então nós estamos num processo de resgate das frutíferas, resgate das culturas nativas, das chamadas plantas daninhas, e que são excelentes elementos fitoterápicos e nutritivos. Essa é uma das nossas linhas de trabalho.

299


8º Bunkyo Rural

Outra é também a inspiração do CSA, consumidores dando sustentabilidade à agricultura, ao processo produtivo. Nós temos a banca orgânica, com base em produtores orgânicos. Com essa dificuldade deles contatarem e localizarem os nichos de consumidores, que querem consumir produtos orgânicos, eles desenvolveram um grupo, um grupo comprometido com a agricultura orgânica. Trata-se de um grupo de consumidores que efetivamente têm compromisso com a ampliação do número de agricultores convertidos em orgânicos ou agricultores naturais. Essa banca orgânica faz essa interligação, utilizando-se inclusive dos meios da internet para fazer os contatos e fazer as distribuições. Existem inclusive endereços de empresas ou de instituições que pedem para serem os intermediários de locais de pontos de entrega desses produtos, é um compromisso muito conjunto. Existe também uma linha de trabalho comprometida com a educação, uma educação integral. Nós somos de uma espécie chamada "Humana", mas a nossa espécie humana tem uma característica que cada um aqui já percebeu. Cada um de nós é único, somos singulares, cada um tem uma forma de pensar, de captar as impressões do meio, uma forma singular de processar as informações que capta e inclusive uma forma singular de expressar. É muito difícil a gente encontrar sintonia em tudo. Quando casamos percebemos isso, que enquanto a gente namora a gente consegue mais colaborações e mais sintonia. Depois que casa e assume todas as tarefas de todas as instâncias da vida fica mais difícil da gente encontrar a sintonia sempre. Se não houver amor, se não houver afeto, se não houver respeito dificilmente o casal continua muito tempo junto. Esse ser humano, ele ainda tem um fator complicador. Ele tem um grupo de pessoas do sexo masculino, e um grupo de pessoas do sexo feminino, e o corpo, o arquétipo, a estrutura de corpo e a função de homem e de mulher são diferentes. Na nossa sociedade nós temos o habito de chamar tudo de "O", é O homem, mas a mulher não se identifica no corpo do homem, ela tem um aparelho reprodutor que durante nove meses abriga o semêm que ela recebeu, com o espermatozóide. E ela vai desenvolver um novo ser, uma nova vida, e ela tem todo o processo de uma relação direta e estreita com este novo ser. Esse afeto, esse amor incondicional, que ela sente no seu corpo, na materialidade do seu corpo nas energias dela. O homem não tem essa oportunidade de viver, o homem só vai entender o amor incondicional quando ele tem o filho, e convive com a esposa e o filho, e neste 300


8º Bunkyo Rural

contato ele vai perceber o que é o amor, ai ele assimila este sentimento que é prioridade inicial da mulher. A educação dentro do Instituto Auá tem o compromisso de resgatar a singularidade de cada ser e respeitar a diferença entre homens e mulheres, mas ao mesmo tempo saber que existe um sentimento de empatia, de respeito e de amorosidade. O que faz com que todos nós nos entendamos, nos respeitemos, convivamos juntos e criemos coisas novas. Viver hoje em busca da sustentabilidade das famílias agrícolas, principalmente as famílias agrícolas orgânicas, é muito difícil. É um grande desafio, nós estamos com desestruturações das nossas legislações, dos nossos governantes e tudo o que a gente já conquistou em beneficio da população. Nós precisamos hoje termos uma atitude de repensar nosso dia de hoje, repensar o nosso futuro, repensar o que vamos deixar para nossos filhos, netos e bisnetos. A educação integral e o resgate entre relação de famílias consumidoras com famílias produtoras, resgatar o respeito recíproco com agricultor. A família agricultora, precisa ser respeitada pelas famílias da cidade, pelas consumidoras, porque são as famílias rurais agricultoras que mantêm as nossas possibilidades de sustentação local, e ao mesmo tempo também elas precisam respeitar as famílias consumidoras, porque o que eles estão vendendo para elas é alimento, alimento é vida, vida que dá possibilidade de sustentação da gente. Então, a relação campo-cidade é indispensável, o conhecimento do ser humano sobre toda a sua potencialidade de ser, que é o ser humano que cria, é o ser humano que criou as artes, as ciências, as filosofias, as tecnologias, as religiões. Tudo isso é obra criativa humana, então nós temos que respeitar o ser humano, a empatia é indispensável nos tempos atuais. Eu peço desculpas, mas esse é um pequeno triângulo do que é o esforço e o trabalho do Instituto Auá. Eu espero que em outra ocasião eu possa estar 301


8º Bunkyo Rural

com vocês e a gente possa aprofundar um pouco este plano estratégico, assim como ele usa o plano estratégico para trabalhar o solo, para trabalhar os plantios. Nós vamos também poder trabalhar o plano estratégico da espécie humana no nosso planetinha Terra, para poder criar novas formas de organização e interações respeitosas, realmente de sustentabilidade, com sanidade e com solidariedade. Não se pode separar essas três coisas. Sanidade, solidariedade e sustentabilidade estão ligadas. Obrigada pela atenção de vocês.

302


8º Bunkyo Rural

SÃO ROQUE, DA ALCACHOFRA, DO VINHO E DOS IMIGRANTES Com 40% do seu território coberto pela Mata Atlântica, o município foi elevado à categoria de Estância Turística em 1990. Desde então, a cidade vem trabalhando para aumentar o potencial turístico, que já dispõe de uma estrutura hoteleira, formada principalmente de pousadas e hotéis-fazendas, e de um bom roteiro gastronômico. Estando a apenas 60 km da cidade de São Paulo, de fácil acesso pelas rodovias Raposo Tavares e Castelo Branco, era natural que o local fosse apreciado pelos paulistanos, que procuram adquirir chácaras ou vão passar os finais de semana para desfrutar da boa qualidade do ar.

te, à produção do vinho. Os imigrantes japoneses chegaram bem mais tarde. A imigração em si só começou em junho de 1908, mas os japoneses que vieram a bordo do navio Kasato Maru foram inicialmente para os cafezais de Guatapará e outros do interior do Estado, e depois de cumprirem os contratos de dois anos, ou fugirem deles, foram para São Paulo e Santos. A chegada em maior volume dos japoneses se daria após a fundação da Cooperativa Agrícola de Cotia, pelos bataticultores em Moinho Velho (Cotia), que depois expandiu sua área de atuação através dos depósitos regionais em Vargem Grande Paulista e Ibiúna. Em São Roque, os japoneses se dedicaram inicialmente ao cultivo da batata e depois foram diversificando, sempre como pequenos produtores.

No passado, São Roque possuía espécies vegetais nativas de utilização comercial, como peroba, cedro, pau d'alho, amoreira, figueira branca, Na década de 1930, a jatobá, canela e ipê, e principal atividade econôpor isso mesmo, os priFoto de Marise Caetano mica de São Roque era a meiros colonizadores exagricultura. Atualmente, a participação traíram a madeira e posteriormente coda agropecuária no PIB do município é meçaram o cultivo de trigo e uva, inicialpequena, uma vez que os pequenos promente com a mão-de-obra indígena e dutores foram agregando valores à atividepois com os escravos africanos, amplidade de campo, com construção de pouando a produção para milho, cana e café. sadas, indústrias, lojas e turismo rural, Com um crescimento lento em relação a estabelecendo uma relação direta entre São Paulo, o povoado só se tornou uma o produtor e o consumidor. cidade em 1864. Depois, com a chegada da Estrada de Ferro Sorocabana e outras Alcachofra melhorias, chegaram os imigrantes porA alcachofra é uma hortaliça originária tugueses e italianos, que reforçaram a do Sul da Europa e Norte da África. As vocação agrícola do município, dedicangrandes brácteas que envolvem as flores do-se à cultura da uva e, posteriormen-

303


8º Bunkyo Rural

da alcachofra são as partes comestíveis, e elas são muito apreciadas na culinária. No Brasil, a alcachofra foi introduzida pelos italianos e é produzida principalmente no Estado de São Paulo, na região considerada fria, onde se localizam as cidades de Piedade, Ibiúna, São Roque e Capão Bonito. Além dessa parte comestível, a alcachofra apresenta uma bela flor, que também pode ser comercializada. Nesse caso, os produtores cobrem as flores com papel para não receber excesso de raios solares. Em São Roque, alguns produtores passaram a processar e a produzir conservas de alcachofra, sendo que muitas vezes fazem venda direta ao consumidor, o que acabou aumentando o rendimento dessas famílias. Há caso de uma família que investiu num disputado restaurante que serve, evidentemente, alcachofra, mas também produz e vende doces e artesanato. Roteiro do Vinho

Foto de Francisco Sato

São Roque começou a realizar a Festa do Vinho em 1942 e passou a ser conhecida como a Capital do Vinho. Só que esse vinho que vinha à mente era aquele vi-

304

nho de garrafão, de baixa qualidade. Mesmo assim, na década de 1950, São Roque contava com uma centena de produtores de vinho, atraindo a atenção de marcas estrangeiras que se instalaram na região. Até a comunidade nipo-brasileira chegou a ter uma fábrica de vinhos em São Roque, conhecida nacionalmente pela marca Caeté, fundada em 1952. A partir da década de 1970, com a melhoria das vias de acesso e a conseqüente valorização imobiliária, muitos viticultores deixaram sua atividade por ser mais vantajoso vender suas propriedades ou transformá-las em outra fonte de renda. Com a concorrência dos vinhos importados e dos produzidos no Sul do Brasil, o paladar dos consumidores ficou mais refinado, requerendo dos produtores maior atenção com a qualidade e variedade. Produtores como a Vinícola Goes, fundada em 1938, já na sua quarta geração, investiram pesado e produzem atualmente 8 milhões de litros por ano. Já exportam para o Reino Unido, Angola e China, e negociam exportação para países como o Japão e até França e Portugal. Além disso, para aproveitar a vocação turística da região, criaram o Roteiro do Vinho, onde é possível encontrar 31 estabelecimentos distribuídos por três agradáveis vias, entre restaurantes, vinícolas e lojas de doces. Outro destino conhecido na cidade é o Ski Mountain Park, que conta com pista de esqui, e a Fazenda Angolana, onde as crianças podem ter contato direto com os animais.


8º Bunkyo Rural

CENTRO ESPORTIVO KOKUSHIKAN DAIGAKU O Centro Esportivo Kokushikan Daigaku, antes conhecido como Fundação Escolar Kokushikan, no município de São Roque, foi doado ao Bunkyo em 1997. Na década de 1980, a Universidade Kokushikan, com sede em Tóquio, fundada em 1917, possuía um plano de expansão, que previa filiais em várias partes do mundo. Uma dessas filiais seria instalada em São Roque, local ideal para treinamento intensivo de atletas, principalmente de kendô, esgrima japonesa. Vale observar que essa universidade é conhecida por possuir equipes competitivas em várias modalidades esportivas. Entretanto, com o estouro da "bolha econômica", assim como outras entidades japonesas, a universidade resolveu fechar as instalações internacionais e manter as atividades restritas ao Japão. Assim, em 30 de janeiro de 1997, o Centro Esportivo passou a fazer parte das propriedades da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social. "Agora podemos concretizar o sonho do Bunkyo de possuir um centro esportivo", declarou Atsushi Yamauchi, então presidente do Bunkyo, referindo-se ao projeto de 1983, que nunca saíra do papel. Na ocasião, prometeu manter o nome da universidade na denominação do local e não medir esforços para que a missão original, de desenvolver o ser humano por meio da cultura e do esporte seja continuada. Localizado a 51 quilômetros da cidade de São Paulo, o Kokushikan totaliza 581.758 m², tendo 194.016 m² cobertos de mata nativa e três lagos com nascentes próprias. Entre as instalações, estavam o ginásio esportivo, com cerca de 500 m², o campo de voleibol, o minicampo de futebol, o tanque com peixes, a churrasquei-

ra, o escritório e o estacionamento. Entre as atuais instalações, destacam-se: um ginásio esportivo, dois campos de mallet golf com 18 buracos cada, duas quadras de tênis de saibro e cerca de 400 pés de cerejeiras, das variedades Okinawa, que possuem flores de cor rosa acentuada, Himalaia, com flores pequenas em tom claro, e Yukiwari, com flores mais claras. Aproveitando a beleza do florescer das cerejeiras, realiza-se em julho a Festa das Cerejeiras Bunkyos - Sakura Matsuri, que integra o calendário oficial da Estância Turística de São Roque e atrai público de toda a região e do Estado. O evento é realizado em parceria com entidades nipo-brasileiras de Vargem Grande Paulista, Mairinque, São Roque e Cotia. O Sakura Matsuri oferece ao público uma oportunidade de vivenciar a cultura japonesa e se divertir com uma série de shows, oficinas culturais e outras atividades ao ar livre. Além disso, há diversas oficinas culturais, uma praça da alimentação, venda de flores e verduras da região. Em 2017 foi realizada a 21ª edição do Sakurá Matsuri, que alcançou grande sucesso, contando com a participação de inúmeros voluntários da região e de São Paulo. Centro Esportivo Kokushikan Daigaku Estrada do Carmo, 801 - Bairro do Carmo - São Roque - SP Contato: Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social - Bunkyo Rua São Joaquim, 381 - Liberdade - São Paulo - SP CEP 01508-900 - tel.: (11) 3208-1755 www.bunkyo.org.br - contato@bunkyo.org.br

305


8º Bunkyo Rural

O QUE É BUNKYO RURAL? O Bunkyo Rural é uma das comissões temáticas formadas por associados-voluntários dentro da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social. O objetivo da comissão Bunkyo Rural é promover o intercâmbio de ideias e conhecimentos entre produtores, profissionais, pesquisadores, estudantes e empresários/fornecedores relacionados à área rural, propiciando a integração entre eles. O principal evento organizado por essa comissão é o Encontro Bunkyo Rural. Os Encontros Bunkyo Rural realizados até agora: - 2009 - Pompéia - 2014 - São Paulo - 2010 - Araçatuba - 2015 - Piracicaba - 2011 - Presidente Prudente - 2016 - Pilar do Sul - 2013 - Mogi das Cruzes Além do Bunkyo Rural, a entidade mantém outra atividade ligada à comunidade agrícola: a promoção do Prêmio Kiyoshi Yamamoto, que visa homenagear as personalidades que contribuiram para o desenvolvimento da agricultura no Brasil. O prêmio Kiyoshi Yamamoto já está na sua 47ª edição. Objetivo do 8º Encontro Bunkyo Rural O 8º Encontro Bunkyo Rural teve por objetivo aprofundar as discussões sobre as mudanças socioculturais e ambientais que afetam o sistema da produção e abastecimento agrícola no Brasil. Com palestras sobre temas atuais, o encontro levou novas ideias para auxiliar o agricultor e os profissionais de áreas relacionadas. O tema foi Novo Rural - Uma Nova Visão sobre a Agricultura Sustentável , um assunto bastante atual, onde as apresentações de soluções pelos especialistas, e as discussões entre autoridades, técnicos, agricultores e produtores, poderão resultar na melhoria da qualidade de vida do próprio agricultor.

Coordenador do 8°Bunkyo Rural Membros: Fábio Maeda Geni Satiko Sato Guenji Yamazoe Hiroshi Nozawa Issao Ishimura Katsuyoshi Murata Kazoshi Shiraishi Kenji Kiyohara Mauricio S. Tachibana Mitsutoshi Akimoto Miyoko Shakuda

Tomio Katsuragawa Kiyoji Nakayama (in memoriam) Carlos Kendi Fukuhara Celso Norimitsu Mizumoto Nelson Hitoshi Kamitsuji Nobuyoshi Narita Osamu Matsuo Reimei Yoshioka Roberto Yoshihiro Nishio Shinichi Yasunaga Shiro Kondo Shoji Korin Toshio Koketsu Yasuyuki Hirasaki Assessoria de Comunicação: Francisco Noriyuki Sato

Informações: www.bunkyorural.com.br Rua São Joaquim, 381 - Liberdade - São Paulo/SP Tel. 11-3208-1755

306

nsp-editora.com.br

Comissão Bunkyo Rural 2017 Presidente: Vice-presidente: Vice-presidente: Vice-presidente:


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.