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A BÍBLIA SAGRADA - (Resumo)
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1850 a.C. – Abraão em Canaã
Há pouco menos de 4.000 anos, vários povos viviam às margens do mediterrâneo, na Ásia e na áfrica. Havia duas grandes potências: Caldéia e Egito. Entre estes dois vastos reinos achavamse pequenos países como a Síria e Canaã (esta também chamada Palestina). Diversas tribos viviam aí da cultura agrícola e de produtos de seus rebanhos, entre as quais se achava a dos hebreus que provinham do patriarca Abraão. Este homem e sua família eram oriundos de Ur, da Caldéia, de onde tinham emigrado para a Palestina no décimo nono século antes da nossa era. Com a vinda de Abraão e seus descendentes começa a História Santa que a Bíblia nos conservou.
O caminho feito por Abraão
A vida nômade e agrícola das tribos provenientes dessa emigração durou cerca de quatrocentos anos. Em seguida, os hebreus, chamados os povos de Israel, de acordo com o sobrenome dado por Deus ao patriarca Jacó, retiraram-se para o Egito, ocupando sem dúvida a região do Delta do Nilo, que era a mais rica e produtiva daquele país.
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1250 a.C. – Moisés (passagem do mar vermelho, os hebreus no deserto)
Os hebreus tornaram-se então objeto de exploração por parte dos egípcios que deles se assenhorearam. Pelo ano 1250 a.C., Deus suscitou-lhes um libertador, na pessoa de Moisés. Sob sua guia, os hebreus atravessaram o mar vermelho para se dirigirem à terra de Canaã. Depois de se deterem por quarenta anos no deserto, os israelitas empreenderam a conquista da Palestina pela tomada de Jericó (pelo ano 1200 a.C.)
O Êxodo
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1200 a.C. – Josué (tomada de Jericó, Conquista da Palestina, Juízes, guerra de Tróia)
A terra ocupada foi distribuída em doze territórios de acordo com as doze tribos, as quais progressivamente se foram estabelecendo nas montanhas e vales de Canaã. Seguiu-se um período difícil de caracterizar. Os israelitas viviam em lutas contínuas com os antigos moradores dessas regiões. Esse período, chamado dos Juízes, durou cerca de 200 anos. O pequeno povo dos hebreus foi-se desenvolvendo aos poucos, até que conseguiu organizarse como um reino no meio de seus vizinhos. O último juiz, Samuel, que era também um profeta, terminou, depois de não pequena hesitação, por conceder ao povo a constituição de um Reino. Saul foi sagrado rei pelo ano 1000 a.C.
As doze tribos
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1000 a.C. – Saul, Rei Davi, Rei Salomão
Saul nunca passou de um pequeno rei local, sendo seu reino apenas um prelúdio. Estava reservado a Davi, seu sucessor, firmar o poder real primeiro sobre a tribo de Judá, e em seguida sobre o conjunto de todas as tribos israelitas. A Davi sucede, em 970 a.C., seu filho, Salomão, que organiza o reino de Israel, faz aliança com o Egito e com Tiro e constrói o templo de Jerusalém.
Reinos de Saul & Davi
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930 a.C. – Divisão do reino
Pouco depois da morte de Salomão, sob o reinado de Roboão, em 930 a.C., há entre as tribos uma dissensão que termina com um Cisma: as dez tribos do Norte se separam de Judá e de Benjamim para construírem um reino independente. Esse reino do Norte durará cerca de dois séculos, tendo por capital a cidade de Samaria, conquistada em 722 a.C. por Sargon II, rei da Assíra. O reino de Judá escapou a essa catástrofe e continuou a existir sob a forma de um estado tampão entre as duas potências rivais; o Egito e a Assíria (bem depressa subjugada por Babilônia).
Divisão do reino
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875 a.C. – Judá (Elias, Eliseu, Amós, Oséias)
A Nação de Israel, por vezes referida como o Reino do Norte, perdurou apenas por cerca de 209 anos depois da morte de Salomão, ou 188 anos depois da morte de Jeroboão, seu filho. Durante esse tempo, 19 reis (incluindo Jeroboão) governaram sobre a Nação de Israel. Alguns deles caminharam honradamente diante de Deus, mas a nação de Israel nunca, em nenhum sentido real, retornou para Deus, mas continuaram servindo outros deuses. Entre seus governantes, estiveram tais monarcas perversos como Acabe e sua esposa má, Jezabel. Ele é mencionado por ter sido mais perverso do que todos os outros reis malvados anteriores a ele. Parece possível que Jezabel assumiu a posição de deusa da idolatria e lá comeram em sua mesa 450 profetas de Baal e 400 profetas dos bosques. Durante esses anos perversos, Deus continuamente deu-lhes profetas fiéis para adverti-los da penalidade por seu pecado e para profetizar sua escravidão. Entre eles estavam Elias, o tisbita, e Eliseu. Eles foram precedidos por Aías e Jeú. Evidentemente, foi entre 880 e 875 a.C. que Onri, pai de Acabe, construiu a Samaria, que permaneceu a capital de Israel até sua queda. Foi por volta de 860 a.C. que Elias apareceu em cena para profetizar contra Acabe e contra a nação pecaminosa de Israel. Por sua palavra, a chuva foi detida por três anos e meio. No final daquele período, ele assassinou os 850 falsos profetas de Jezabel e invocou fogo do céu à vista de Israel (I Reis 18:21-46); mas Israel, mesmo assim, não retornou para o Senhor.
Profeta Elias
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753 a.C. – Fundação de Roma (Itália)
Não está definitivamente provado, mas supõe-se que a cidade de Roma tenha sido criada no dia 21 de abril de 753 a.C. A resposta mitológica à criação de Roma surgiu quando a cidade já havia virado império mundial. Conta a lenda que Enéias, filho do rei de Tróia e da Deusa Vênus, fugiu de sua cidade durante uma batalha. Acompanhado de alguns homens, seguiu para a península itálica, onde seu filho Ascânio iniciou um povoamento chamado Alba Longa. Dois descendentes de Enéias – Numitor e Amúlio – apareceriam mais tarde em relatos sobre a criação de Roma. A lenda continua: ao morrer, Sílvio Procas, duodécimo rei de Alba Longa, teria deixado dois filhos. O mais moço, Amúlio, apoderou-se do trono, preterindo Numitor, seu irmão mais velho. Para garantir o reinado de seus descendentes, matou Lauso, filho de Numitor e obrigou sua sobrinha, Reia Sílvia, a jurar castidade. Contudo, Marte, o deus da guerra, tornou Reia Sílvia mãe dos gêmeos Rômulo e Remo. Quando Amúlio soube disso, condenou Reia Sílvia à morte e ordenou que os dois recémnascidos fossem lançados numa cesta ao rio Tibre. Arrastadas pela correnteza, as crianças teriam sido encontradas por uma loba, na base do monte Palatino, que passou a amamentálos. Nos rastros da loba, pastores da vizinhança encontraram os gêmeos e se encarregaram de criá-los.
Mais tarde, Rômulo e Remo foram levados à presença do solitário Numitor, que reconheceu seus netos e lhes contou a desonra. Num ato de vingança, eles tomaram o palácio de Alba Longa, mataram o rei Amúlio e entronizaram novamente o avô Numitor. Em sinal de gratidão, receberam a autorização para fundar uma cidade no local em que haviam sido abandonados.
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Por vontade dos deuses, o povoado, logo cercado de muralha, se chamou Roma. Remo zombou do fosso de defesa aberto ao longo da muralha e foi morto pelo furioso Rômulo. Ambicioso em seus projetos, este começou a povoar a cidade com pastores, bandidos, escravos fugitivos e aventureiros. Roma é um nome etrusco. Pelos cálculos do historiador romano Marcos Terêncio Varro (116 a.C. - 27 a.C.), levando em conta a lenda de Rômulo e Remo e a mitologia grega, 753 a.C. foi o ano da fundação de Roma. Alguns arqueólogos estimam, porém, que a cidade foi fundada no ano 600 a.C. Não se descarta também a hipótese de que Roma resultou da fusão de pequenos povoados latinos e sabinos do Palatino numa comunidade urbana. Certo é que o nome "Roma" veio dos etruscos, um povo de origem desconhecida que desapareceu na história, deixando rastros enigmáticos de sua cultura, religião e legislação no Império Romano. Os arqueólogos também encontraram marcas dos etruscos nas técnicas de urbanismo e canalização. Pouco a pouco, os romanos conseguiram se livrar do domínio etrusco, expandindo sua influência na África, Europa Central e Ocidental, Grécia e Ásia Menor. Em 509 a.C., a monarquia foi derrubada e instaurou-se a República. De 200 a.C. até o ano 476 d.C., Roma atravessou seis séculos de contínua expansão territorial, formando um império ainda mais vasto do que o de Alexandre, o Grande. Tomada pelos germanos, em 476, Roma entrou para a história como símbolo de poder e civilização, de tragédia e glória – a "cidade eterna". Ainda hoje, qualquer escavação ou simples canteiro de obras revela novos detalhes do passado da cidade.
Império Romano
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722 a.C. – Isaías, Miquéias (queda de Samaria)
Foi por volta de 722 a.C. que a iniqüidade de Israel foi completa diante de Deus, cerca de apenas 730 anos depois do êxodo. Deus os entregou à escravidão Assíria e a Samaria foi repovoada com pagãos.
Império Assírio
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700 a.C. – Jeremias, Sofonias
Jeremias profetizou a Judá durante os reinados de Josias, Jeoaqui, Jeconias e Zedequias. O seu chamado é datado de 626 a.C., e o seu ministério continuou até pouco tempo depois da queda de Jerusalém, em 586 a.C. O profeta Sofonias precedeu ligeiramente a Jeremias e Naum, Habacuque e Obdias foram contemporâneos seus.
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612 a.C. – Naum, Habacuc (queda do império assírio)
Naum, cujo nome significa “confortador” ou “cheio de conforto”, é desconhecido, a não ser pelo breve título que inicia sua profecia. Sua identificação como um “elcosita” não ajuda muito, visto que a localização de Elcose é incerta. Cafarnaum, uma cidade da Galiléia, tão proeminente no ministério de Jesus, significa “Aldeia de Naum”, e alguns têm especulado, mas, sem prova concreta, que seu nome deriva do profeta. Ele profetizou a Judá durante os reinados de Manassés, Amom e Josias. Seus contemporâneos foram Sofonias, Habacuque e Jeremias. O reino dos assírios, havia sido uma nação próspera durante séculos, quando o profeta Naum entrou em cena. Seu território, se mudou com o passar dos anos por causa das conquistas e derrotas dos seus governantes, localiza-se ao norte da Babilônia, entre e além dos rios Tigre e Eufrates. Documentos antigos atestam a crueldade dos assírios contra outras nações. Os reis assírios vangloriam-se de sua brutalidade, celebrando o abuso e a tortura que eles impuseram sobre os povos conquistados. A queda do império Assírio, cujo clímax foi a destruição da cidade de Nínive, em 612 a.C., é o assunto da profecia de Naum. O juízo que cai sobre o grande opressor do mundo é o único motivo para o pronunciamento de Naum. Conseqüentemente, o profeta é judicial em seu estilo, incorporando antigos “oráculos de julgamento”. A linguagem é poética, vigorosa e figurada, sublinhando a intensidade do tema com o qual Naum luta. A cidade de Nínive caiu por volta de 612 a.C. Certamente após o cumprimento da profecia de Naum, Habacuque revelou sua visão da queda do reino babilônico. Os assírios já haviam ido e o império caldeu estava chegando ao triunfo do domínio. Os caldeus, não os Assírios, é que iriam conquistar o reino do Sul – Judá, e a profecia de Habacuque quando o reticente reino do Sul (Judá) reconheceu o perigo iminente da chegada do novo conquistador do mundo. Em 605 a.C., Nabucodonosor já havia levado Daniel, com muitos outros nobres, para o cativeiro chamado babilônico, sendo que a deportação geral foi seguida de uma segunda leva em 597 a.C. A destruição final de Jerusalém foi em 586 a.C.. A descrição feita por Habacuque parece aludir a todos os três eventos. O profeta Habacuque falou de aflições. Escreveu com ternura que se assemelha a de seu contemporâneo, o profeta Jeremias. Do ponto de vista profético viu os caldeus invadirem a sua terra natal, o templo e a abolição do culto sagrado, o país devastado e o povo exilado. Sua profecia é repleta de desprezo, escárnio e desolação, mas não sem esperança. Sua profecia contém todas as glórias e excelências da profecia poética. Abre com um quadro muito animado – a marcha do conquistador, e fecha com outro – a canção sublime de louvor e oração.
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600 a.C. – Ezequiel
O rei Josias em 622, empreende uma vasta reforma religiosa e social, cujos efeitos foram de breve duração. O reino de Judá foi declinando aos poucos até a expedição de Nabucodonosor que em 598 a.C. se apodera de Jerusalém. Cerca de 600 a.C., Ezequiel foi levado cativo, por Nabucodonosor, para Babilônia, onde já se encontrava Daniel na mesma situação. Profetizou ali durante cerca de 20 anos. Durante este período foi contemporâneo de Daniel. Ezequiel foi comissionado por Deus para anunciar aos Judeus cativos, naquela data, em Babilônia e às muitas gerações futuras que se achariam exiladas ao longo dos séculos, por esse mundo a fora, as graves razões por que o Altíssimo lhes reservara aquele destino.
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598 a.C. – Primeiro cerco a Jerusalém (Nabucodonosor/Babilônia)
O conquistador Nabucodonosor, transforma a Judéia em estado vassalo, deporta para Babilônia uma parte da população e estabelece um vice-rei: Sedecias. Mas como este se revolta, Nabucodonosor toma uma segunda vez a cidade de Jerusalém e a incendeia em 589. A quase totalidade da população é então deportada para a Mesopotâmia, ficando o país conquistado sob a administração de um governo caldaico.
Império Babilônico
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587 a.C. – Queda de Jerusalém e a 1ª destruição do Templo
Em conseqüência, no ano nono do reinado de Sedecias, no dia 10 do décimo mês, Nabucodonosor, rei da Babilônia, veio atacar Jerusalém com todas as tropas. Acampou diante da cidade e construiu ao redor uma trincheira. A cidade ficou sitiada até o ano 11 do rei Sedecias. No dia 9 do quarto mês, quando a fome tomava conta da cidade e já não havia pão para o povo, uma brecha foi aberta na muralha da cidade. Então o rei fugiu com todos os combatentes, de noite, pela porta situada entre as duas muralhas, perto do jardim real, embora os caldeus mantivessem o cerco da cidade. O rei tomou o rumo de Arabá. Mas as tropas caldéias se puseram a perseguir o rei e o alcançaram nas estepes de Jericó, enquanto todo o seu exército o abandonava e se dispersava. Os caldeus prenderam o rei e o conduziram para junto do rei da Babilônia em Rebla, onde foi submetido a julgamento. Os filhos de Sedecias foram chacinados debaixo de seus olhos. O rei vazou os olhos de Sedecias e, ligado com dupla corrente, o conduziu para a Babilônia. No dia 7 do quinto mês, data que corresponde ao ano 19 do reinado de Nabucodonosor, rei da Babilônia, chegou a Jerusalém Nabuzardã, comandante da guarda e oficial do rei da Babilônia. Ele mandou pôr fogo no templo do Senhor, no palácio real e em todas as casas de Jerusalém. Mandou queimar igualmente todas as casas das pessoas importantes. Todas as tropas caldeias que estavam às ordens do comandante da guarda se puseram a demolir as muralhas de Jerusalém em toda a sua extensão. O comandante da guarda, Nabuzardã, deportou a população restante que tinha ficado na cidade, os desertores que se tinham passado ao rei da Babilônia, e o resto da população. Mas o comandante da guarda deixou uma parte da gente miúda do país como vinhateiros e agricultores. O exílio dos israelitas durou até que Ciro, rei da Média, autoriza a volta dos deportados sob a direção de Zorobabel em 538 (ano em que se apodera da Babilônia).
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538 a.C. – Exílio dos hebreus em Babilônia (Ciro conquista Babilônia)
O exílio marcou profundamente o povo de Israel, embora sua duração fosse relativamente pequena. De 587 a 538 a.C., Israel não conhecerá mais independência. O reino do Norte já havia desaparecido em 722 a.C. com a destruição da capital, Samaria. E a maior parte da população dispersou-se entre outros povos dominados pela Assíria, o reino do Sul também terminará tragicamente em 587 a.C. com a destruição da capital Jerusalém, e parte da
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população deportada para a Babilônia. Tanto os que permaneceram em Judá como os que partiram para o exílio carregaram a imagem de uma cidade destruída e das instituições desfeitas: o Templo, o Culto, a Monarquia, a Classe Sacerdotal. Uns e outros, de forma diversa, viveram a experiência da dor, da saudade, da indignação, e a consciência de culpa pela catástrofe que se abateu sobre o reino de Judá. Os escritos que surgiram em Judá no período do exílio revelam a intensidade do sofrimento e da desolação que o povo viveu. São os livros de: Lamentações, Jeremias e Abdias. Os exilados na Babilônia igualmente recordaram na dor os que viveram: “A beira dos canais de Babilônia nos sentamos, e choramos com saudades de Sião; nos salgueiros que ali estavam penduramos nossas harpas. Lá, os que nos exilaram pediam canções, nossos raptores queriam alegria: Cantai-nos um canto de Sião! Como poderíamos cantar um canto do Senhor numa terra estrangeira? ” (Sl 137).
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536 a.C. – Retorno dos Judeus à Palestina
Portanto, os judeus deportados foram implantados numa região situada entre a Babilônia e o Uruk, ao longo do canal que Ezequiel designa sob o nome de rio Kebar. Para todos aqueles exilados, a verdade é que a Babilônia, com seus canais, os seus jardins e os seus imponentes edifícios, devia construir um espetáculo pelo menos inesperado. Aos olhos de muito deles aquela cidade devia representar uma civilização e uma religião superiores às de Judá. Contudo, apesar do desastre que implicava o Exílio, não deixou de ser para os judeus fieis, um período de intensa atividade e de reflexão. Foi nesta época, nomeadamente, que foi reunido o essencial dos elementos que permitiram levar a cabo a composição do Antigo Testamento sob a sua forma atual. O exílio corresponde igualmente ao início da dispersão mundial dos judeus. Quando a Babilônia foi vencida, em 540 a.C. por Ciro, rei dos persas, e os exilados foram autorizados a regressar à sua terra, uma parte deles decidiu permanecer onde estava. Por outro lado, uma colônia judaica constituir-se-ia no século V, no Egito, em Elefantina, a norte da primeira catarata do Nilo. Composta por mercenários que tinham servido no exército persa, possuía o seu próprio Templo. Já os que regressaram ao país, por volta de 539 a.C., tiveram de enfrentar numerosas dificuldades e o Templo só pôde ser reconstruído em 516 a.C.. Neemias tinha encontrado Jerusalém num estado desolador. As muralhas estavam arruinadas e os raros habitantes que restavam tinham deixado de respeitar qualquer lei. Com a ajuda de Esdras, que foi seu sucessor, restabeleceu a ordem social e religiosa e permitiu assim a Judá sobreviver ao seu desastre.
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490 a.C. – Ageu, Zacarias, Abdias (batalha de Maratona/Grécia)
Dario I, durante o seu longo reinado (522-486 a.C.), empreende um grande esforço de organização do seu império – divide-o em 20 províncias, chamadas satrapias. Além disso, estende o seu império, fruto de novas conquistas, nomeadamente a Trácia e a Macedónia. Algo que só foi de algum modo travado pela derrota persa contra os gregos na Batalha de Maratona (490 a.C.) e que voltaria a suceder em Salamina (480 a.C.), desta feita com Xerxes I. São de realçar dois acontecimentos na vida da comunidade judaica: 1) O regresso, em 520 a.C., de mais um conjunto de retornados da Babilônia, sob a orientação do príncipe Zorobabel e do sacerdote Josué; 2) Recomeço dos esforços de reconstrução do Templo, com o apoio dos profetas Ageu e Zacarias, e que terminará em 515 a.C. Note-se que este é o chamado «2º Templo», que irá ser posteriormente ampliado por Herodes, o Grande (entre os anos 37 a.C. e 4 a.C.) e que irá ser posteriormente destruído pelos Romanos, no ano 70 da nossa Era.
Império Persa
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450 a.C. – Malaquias, Neemias, Esdras
O rei Artaxerxes I, durante o seu reinado (464-424 a.C.), pacifica o Egito. Envia Neemias (445 a 432 a.C.), funcionário da sua corte, a Jerusalém, que à época estava dependente da Samaria e que a partir daquele momento se transforma numa prefeitura independente. Ocorre a reconstrução das muralhas de Jerusalém, período em que, procurando avivar a fé do povo, decorre a ação profética do profeta Malaquias. Nessa mesma época, a Grécia conhece a sua «idade de ouro» – o século de Péricles (século V a.C.): na Arte, com o Pártenon; na Literatura, com Sófocles e Eurípides; na Filosofia, com Sócrates e Platão. Durante o reinado de Dario II (424-404 a.C.) ocorrem novos combates no Egito. Funda-se uma comunidade judaica na ilha de Elefantina. No reinado seguinte, desta feita do rei Artaxerxes II (404-359 a.C.), o Egito recupera a sua independência face à Pérsia, o que faz renascer a importância de Jerusalém como bastião avançado do Império Persa. Importância essa manifestada pelo envio de Esdras à região (398 a.C.) para pacificar judeus e samaritanos, impondo para tal a obediência à «Lei do Deus do céu» (Esd 7, 21), sob a orientação do sumo-sacerdote. Apesar de todos esses esforços de pacificação, essa união, de tão frágil, durou pouco mais de 20 anos. Além disso, Esdras, recolhendo as diferentes tradições judaicas, e que até então se encontravam dispersas, relê e redige o Pentateuco, completando-o com novas obras (Crônicas, Esdras e Neemias). Nasce o JUDAÍSMO e a sua nova forma de culto (Ne 8-10) – já não sob a forma de sacrifícios, mas pela leitura da Lei e da oração; já não só no Templo, mas também na praça pública. Nasce o culto sinagogal. Reforce-se que o esforço de reconstrução do país se faz com o auxílio de dois personagens importantíssimos – Esdras e Neemias – um no campo politico-administrativo, outro no campo religioso-espiritual. Apresentam a lei como constituição do povo e este aceita-a. A adesão à Lei de Moisés ou Torah, com os seus costumes e normas correspondentes, torna-se a pátria portátil dos judeus. O sábado, a circuncisão e o culto terão muita importância porque a lei assim o diz. Para além disso, é de realçar também a atividade do profeta Abdias e de Terceiro Isaías, bem como, dos sábios que começam a querer a compilar reflexões antigas e a produzir diversas obras (Rute, Jonas, Provérbios, Job) quer a reunir os Salmos. É neste período que se começa a fazer sentir o poder dos sumo-sacerdotes, não só como líderes religiosos, mas também como líderes políticos; a dispersão (diáspora, em grego) dos judeus – em Jerusalém, na Babilônia, em Elefantina...; a afirmação do aramaico, língua próxima do hebraico, como língua primordial no Império Persa (no comércio, na diplomacia), sendo que o hebraico é suplantado por este e mantém-se sobretudo no culto litúrgico.
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333 a.C. – Alexandre Magno/Macedônia (dominação Grega)
Entretanto, e mais uma vez na Grécia, começam a ocorrer grandes mudanças, nomeadamente a sua reunificação sob a égide de Filipe II da Macedónia (338 a.C.) e o do próprio Alexandre, o Grande, (336-323 a.C.). É precisamente no reinado deste último que ocorrem alterações com fortes implicações em todo o mundo conhecido até então. Em 332 a.C., Alexandre conquista o Egito e funda a cidade de Alexandria. No ano seguinte, toma a cidade de Babilônia e derrota o rei persa Dario III, na Batalha de Gaugamela (1 de outubro de 331 a.C.) – batalha de tal modo decisiva que Alexandre acaba por se apoderar de todos os territórios que até então tinham estado sob o domínio dos persas, incluindo, claro está, a própria Palestina. E esse caráter decisivo não se faz sentir somente no domínio político, mas também e sobretudo, no domínio social e cultural. E assim é pelo fato de – apesar de ter sido um reinado curto – ter sido a partir dele que se começou a disseminar a cultura helênica e a formar uma língua comum («koiné»); língua essa que sendo falada na Grécia se dissemina por toda a bacia do Mediterrâneo e se transforma na sua língua comum, algo que se irá manter por, aproximadamente, oito séculos (até 500 d.C.), altura em que é substituída pelo Latim. É em «koiné» que é traduzido o Antigo Testamento, do hebraico para o grego (LXX, séc. III a.C.), e é escrito o Novo Testamento (séculos I-II d.C.).
Mosaico da Batalha de Gaugamela (331 a.C.) entre Alexandre Magno e Dario III, Xá da Pérsia.
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Com a morte de Alexandre na Babilônia (323 a.C.), aos 33 anos de idade, o seu império é dividido pelos seus generais mais próximos, cada qual fundando uma dinastia: os Antigonidas (na Grécia), os Lágidas (no Egito e Palestina) e os Selêucidas (na Síria – que ia desde o Mediterrâneo à Índia). Como se disse, a Palestina fica sob o controle dos Lágidas, suseranos respeitadores das identidades e especificidades locais, o que os leva a manter o estatuto de Israel. Nesta altura existem três comunidades judaicas espalhadas pelo mundo conhecido: a que permaneceu em Babilônia (e que irá dar origem a escritos como o Talmud da Babilônia); a de Alexandria (que irá traduzir o Antigo Testamento para grego), redigir o Livro da Sabedoria e na qual o filósofo Filon irá repensar a fé em grego) e a que vive na Palestina (que se encontra dividida: uns são a favor da helenização da cultura judaica e outros receiam essa mesma infiltração e procuram preservar a cultura, as tradições, os ritos e práticas cultuais como existiam até então. Tudo por considerarem que a fé, tal como se expressava e vivia até então, também permitia o crescimento do ser humano – daí o surgimento de livros como o Qohelet, Tobias, Eclesiástico. Além destes livros são de referir outros, surgidos na mesma época: Cântico dos Cânticos, Baruc, Sabedoria.
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175 a.C. – Antíoco Epífanes (revolta de Judas Macabeu)
Em 198 a.C. (século II a.C.), o rei Antíoco III da Síria derrota os Egípcios em Paneion, perto das margens do rio Jordão, pondo fim ao domínio dos Lágidas na Palestina que passa a partir desse momento para as mãos da Síria dos Selêucidas. Estes, ao contrário dos anteriores, procuram impor pela força a cultura e a religião gregas na Palestina, algo que vai ocorrendo ao longo do tempo e que, pelo fato de ser imposta e de ir frontalmente contra a forma de ser e de estar dos judeus, vai gerar muita resistência em diversos setores da sociedade judaica, embora haja também setores que são a favor da cultura helênica. Exemplo disto, são os seguintes acontecimentos: por volta do ano 167 a.C., Antíoco IV Epifanes suspende os privilégios dos judeus, interdita o sabbat e a circuncisão, profana o Templo e coloca no seu interior uma estátua de Zeus. A crise é grave, pois, os sumo-sacerdotes não são unânimes na defesa da cultura judaica e, alguns, consideram positiva a sua helenização. Por causa das perseguições levadas a cabo pelos Selêucidas, a comunidade judaica da Palestina ainda se divide mais: (a) Saduceus – Alta aristocracia sacerdotal que, aliada dos Asmorreus e defensora da helenização da cultura judaica, procuram manter o poder a todo o custo. (b) Fariseus – Grupo de judeus “piedosos”, muito religiosos, estudiosos da Lei e apegados à Torah (Lei). Vão ser a consciência do Judaísmo. (c) Essênios – Grupo de judeus com a mesma origem dos Fariseus (hassidim), mas que posteriormente acabaram por romper com estes, fundando uma comunidade ascética no deserto de Quhmran, perto do Mar Morto. Preparam a vinda do Messias pela oração, pela meditação e estudo profundo das Escrituras.
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Como resultado de todas estas imposições, desencadeia-se a revolta dos Macabeus que, liderados por Simão Macabeu, conseguem libertar Jerusalém e restabelecer o culto judaico no Templo em 164 a.C. Começa assim um curto período de paz sob a orientação da dinastia dos Macabeus ou Asmoneus. A Judéia conhece então uma independência que se estende por quase um século. Esse retomar das práticas que outros tinham tentado fazer desaparecer leva a que ocorra o surgimento de um profundo desprezo por tudo aquilo que era estrangeiro, isto é, não-judeu, além dum desprezo pelos maus judeus e pelos samaritanos. A partir deste momento o sumo-sacerdote assume-se como chefe espiritual e político dos judeus. A sinagoga ganha uma relevância preponderante. Por outro lado, surge nova literatura: Ester, Judite, 1-2 Macabeus e Daniel. São compostos os últimos salmos e termina a composição do Saltério. Todavia a partir de certa altura, instala-se mais uma vez a discórdia, desta feita por causa do apoio a duas candidaturas diferentes ao cargo de sumo-sacerdote do Templo e porque alguns dos candidatos chegavam a comprar o título de sumo-sacerdote. (Mais uma vez o dinheiro, o poder, a corrupção e a divisão). Contenda que levou à solicitação da arbitragem de Roma, potência que, através da ação de Pompeu, tomou Jerusalém no ano de 63 a.C. e passou a incorporar a Palestina no seu já vasto império.
Pompeu
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63 a.C. – Pompeu conquista a Palestina
No ano 63 a.C., Pompeu, o Grande, à frente do exército romano, invade a Palestina, reduzindoa a uma província Romana. Pouco depois, Julio César entrega o governo da Palestina a Herodes Magno, um príncipe idumeu. Após a morte deste, o imperador romano divide a Judéia em quatro partes (tetrarquia). O Governo da Galiléia cabe a Herodes Antipas, filho de Herodes Magno.
Império Romano
Júlio César havia ampliado os limites do que era um "Império Romano de fato" e se tornara o primeiro governante absoluto de Roma. No entanto, o Império Romano não havia sido oficialmente declarado até que seu sobrinho Otaviano assumisse o poder em 27 a.C. Ele era filho de Caio Otávio e Ácia, cuja mãe era Júlia, irmã de Júlio César. Otaviano tinha trinta anos de idade quando seu tio foi assassinado. Embora César houvesse nomeado Otaviano como seu sucessor, o jovem encontrou oposição tanto dos aliados de seu tio como de seus rivais. Otaviano concordou em governar como parte de um triunvirato (conselho governante composto por três homens), com Marco Lépido (13 a.C.) e Marco Antônio (83-30 a.C.), um dos tenentes de confiança de César. Esse triunvirato, por sua vez, defrontou-se com uma guerra civil movida por Caio Cássio (42 a.C.) e Marco Júnior Bruto (85-42 a.C.), dois dos conspiradores do assassinato de César, que pretendiam restabelecer a República. Após derrotar os rebeldes, o triunvirato dividiu o poder geograficamente: a Europa ficou sob o comando de Otaviano, a África nas mãos de Lépido e o Egito para Marco Antônio.
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31 a.C. – Período romano (batalha de Actium, César Augusto imperador)
No Egito, onde a monarquia local estava sujeita ao governo romano, Marco Antônio estabeleceu seu poder na cidade de Alexandria, onde se apaixonou pela rainha egípcia Cleópatra (69-30 a.C.), que era sua amante. Com freqüência, Marco Antônio dava presentes generosos a Cleópatra, o que provocou uma série de boatos, segundo os quais ele pretendia dar a própria Roma como presente. Quando esses rumores chegaram aos ouvidos de Otaviano, ele ficou enfurecido e imediatamente declarou guerra a Marco Antônio. Os dois lados se enfrentaram na Batalha de Actium em 31 a.C., e os exércitos de Marco Antônio e Cleópatra levaram a pior. Com isso, eles decidiram fugir para o Egito com o que restara de suas tropas e com Otaviano em seu encalço. Sentindo que a derrota era iminente, Marco Antônio e Cleópatra suicidaram-se em 30 a.C. Otaviano retornou a Roma em 29 a.C. e se declarou imperador romano, assumindo o nome de César Augusto. Sob seu governo, o Império Romano tornou-se uma monarquia austera e com controle centralizado. Com ele, também a língua latina e o alfabeto romano tornaram-se padrão para toda a Europa. Embora Roma já fosse um império antes de Otaviano tornar-se César Augusto, coube a ele proclamar "o" Império Romano. Foi ele também quem governava durante o período em que a Pax Romana (a paz de Roma) reinou sobre todo o "mundo conhecido". Unido sob um líder único e forte, o Império Romano teve um próspero desenvolvimento, tanto cultural como comercial. A arte e a literatura tornaram-se hábitos importantes na vida das cidades romanas e foram elaborados grandes projetos para construção de estradas, pontes, aquedutos, coliseus, residências e prédios públicos, não só em Roma como também em outras cidades espalhadas pelo império. Por isso, é comum se dizer que Otaviano herdou uma Roma de tijolos e a deixou feita de mármore.
Roma antiga
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~07 a.C. – Nascimento de Jesus
Herodes – o Grande – apoiado pelo Senado Romano, um idumeu desprezado pelos judeus, para cair nas graças do povo, começa a fazer obras no Templo (19 a.C.) mas as tensões não acabam, levando 6000 fariseus a recusar fazer o juramento de fidelidade a Octávio César Augusto, “filho do divino, pai da pátria”. É precisamente neste clima de tensão que nasce Jesus de Nazaré. Judas, o Galileu, chefe de um grupo armado de fundamentalistas, de fanáticos (os “zelotes”), combate os romanos até que a sua base em Séforis, a 5 Km de Nazaré, é destruída e mais de 2000 dos seus homens são crucificados (4 a.C.). Todavia, as revoltas não terminaram por aqui; pelo contrário, continuaram a ser fomentadas pelos zelotes, levando ao instalar do terror e à sublevação geral da população. Fatos bíblicos que antecederam o nascimento de Jesus Segundo o Evangelho de Lucas, o trabalho da vida de Jesus na Terra, fôra iniciado por João Batista, filho de Zacarias. Este era um sacerdote judeu que tinha por esposa a Isabel, a qual, por sua vez era membro do ramo mais próspero do mesmo grande grupo familiar ao qual também pertencia Maria, a mãe de Jesus. Zacarias e Isabel, embora estivessem casados há muitos anos fossem de idade avançada, não tinham filhos porque Isabel era estéril. O anjo Gabriel apareceu a direita do altar de incenso a Zacarias e anunciou que suas orações haviam sido ouvidas por Deus e Isabel daria à luz um filho que deveria ser chamado por João. E disse mais: contou que seria “grande diante do Senhor” e que teria a virtude de Elias: o grande profeta que os orvalhos e a chuva se submeteram a sua palavra, o grande profeta que ressuscitou o filho de uma viúva, o grande profeta que chamou fogo do céu. Elias que teve sua maior jornada na luta contra os pecados do rei Acabe e da sua esposa Jezabel, promíscua e adoradora de Baal. Segundo Gabriel, João teria a virtude de Elias, como de fato procedeu contra Herodes e Herodias, e sendo respeitado entre os judeus. Quando Gabriel anunciou o nascimento, Zacarias alegou que ele e sua esposa eram velhos para terem filhos. Por conta dessa incredulidade, Zacarias ficou mudo até o nascimento de João. Quando Zacarias terminou de servir no templo e voltou para casa, Isabel concebeu. Seis meses depois do início da gravidez de Isabel, Gabriel foi até Nazaré e saudou Maria, mulher prometida a José: “Salve cheia de graça; o Senhor é contigo.” Foi anunciada a virgem que daria à luz um filho e que deveria ser chamado de Jesus. E disse mais: que seria chamado filho do Altíssimo, Filho de Deus. O anjo disse que Jesus seria “grande”. Observe-se que ele não seria “grande diante do Senhor”, como foi dito de João, ele seria o próprio Senhor que assentaria no trono de Davi e cujo João estaria adiante nos seus passos de anunciação. Quando Maria perguntou como se daria tal coisa, pois era virgem, Gabriel anunciou que seria uma concepção do Espírito Santo.
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Ela já estava comprometida em casamento com José e o noivado judaico era um compromisso tão sério que o noivo já se dizia marido e não podia desfazê-lo, senão por um repúdio e antes que tivessem tido qualquer envolvimento íntimo, se achou grávida pelo Espírito Santo. Segundo o evangelho segundo Mateus, José ao saber, quis deixá-la, achando que ela tinha tido outro homem, mas o anjo Gabriel apareceu a ele em sonho e lhe explicou o que estava acontecendo. Como o anjo havia contado sobre a concepção de Isabel, Maria foi visitá-la e por revelação do Espírito Santo, naquele momento Isabel recebeu a palavra do conhecimento e clamou: “Bendita és tu entre as mulheres, e bendito é o fruto do teu ventre. E de onde me provém isto a mim, que venha visitar-me a mãe do meu Senhor?” No dia da circuncisão de João, contrariando o costume judaico, Isabel escolheu o nome do menino: João; sem que houvesse tal nome na parentela de Zacarias, o mesmo foi interpelado a respeito daquela peculiaridade, e Zacarias escreveu numa tábua: “O seu nome é João”. E todos se maravilharam. E voltou a voz à boca de Zacarias. Segundo a tradição cristã, João Batista, cujo nome significa "graça ou favor de Deus", cresceu habitando em desertos até o início de seu ministério quando haveria de mostrar-se em Israel e anunciar os dias de Jesus. A notícia do anjo Gabriel Maria foi a mãe de Jesus. Ela e o carpinteiro José, seu marido, moravam em Nazaré, uma cidade da província da Galiléia, no norte da Palestina. O Evangelho de Lucas conta que o arcanjo Gabriel apareceu a Maria e anunciou que ela ia dar à luz o filho de Deus, o prometido Messias. Lucas relata também que, após receber a notícia do anjo, Maria teria passado uns três meses com Isabel e Zacarias nas montanhas de Judá e que depois retornou para sua casa. Mateus, por sua vez, traz a informação de que José, não teria compreendido inicialmente que Maria recebera a importante missão de conceber o Messias e se afastou de Maria, pelo que um anjo lhe pareceu em sonhos para que ele a recebesse. O Nascimento de Jesus Jesus nasceu durante o reinado de Herodes, o Grande, que os romanos haviam designado para governar a Judéia. Os calendários são contados a partir do ano em que se supõe ter nascido Jesus, mas as pessoas que fizeram essa contagem equivocaram-se com as datas: Herodes morreu no ano 4 a.C., de modo que Jesus nasceu 3 anos antes, a quando dos censos do povo Judeu, que ocorreu, exatamente, 1 ano após os censos dos outros povos também subjugados ao poder Romano. Estes censos ocorreram para facilitar aos Romanos a contagem do povo e a respectiva cobrança dos impostos. Os Judeus sempre se opuseram a qualquer tentativa de contagem, por essa razão, esta ocorreu um ano depois de ter ocorrido nos povos vizinhos. Desde o século IV, os cristãos festejam o Natal, ou nascimento de Cristo, no dia 25 de dezembro. Esta foi uma adaptação das festas ao deus Sol dos povos pagãos, adquirida pelos Romanos.
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Nascimento em uma manjedoura Algum tempo antes de Jesus nascer, Maria e José foram a Belém, a fim de terem seus nomes registrados em um recenseamento. Devido a um decreto de Otávio Augusto, todas as pessoas que viviam no mundo romano tiveram que se alistar em suas respectivas cidades, sendo que José era de Belém. Belém era uma pequena cidade do sul da Judéia. Maria e José encontraram abrigo num estábulo, e foi aí que Jesus nasceu. Maria fez de uma manjedoura o berço para ele. Os Evangelhos falam de pastores que, perto de Belém, viram anjos no céu e os ouviram cantar: “Glória a Deus nas alturas e, na Terra, paz e boa vontade entre os homens. Algumas traduções da Bíblia dizem: paz na Terra aos homens de boa vontade”.
A visita dos Reis Magos
A visita dos magos do Oriente A Bíblia também relata que vieram sábios do oriente para ver o Messias recém-nascido. A princípio perguntaram por ele na corte de Herodes. Mais tarde puderam localizá-lo, seguindo até Belém a luz de uma estrela. Trouxeram a Jesus oferendas de ouro, incenso e mirra. Herodes pedira-lhes que voltassem para informá-lo quando tivessem encontrado o menino, mas eles não fizeram isso. Herodes tomou-se de fúria e, com medo desse novo rei dos judeus, mandou que fossem mortos todos os meninos de Belém que tivessem dois anos de idade ou menos. Um anjo apareceu a José, em sonho, e o preveniu. José fugiu então para o Egito, com Maria e o menino Jesus. Só retornaram a Nazaré depois da morte de Herodes.
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Data exata de nascimento de Jesus A data de nascimento de Jesus é muito discutida. Devido a falhas do calendário há quem diga que Jesus teria nascido por volta do ano 6 d.C. . Porém, considerando que Jesus nasceu pouco tempo antes da morte de Herodes isto coloca-nos numa data anterior a 4 a.C.. Outra ajuda que temos para facilitar a localização da data do nascimento de Jesus foi que este ocorreu a quando José foi a Belém com sua família para participar do recenseamento. Os romanos obrigaram o recenseamento de todos os povos que lhes eram sujeitos a fim de facilitar a cobrança de impostos, o que se tornou numa valiosa ajuda na localização temporal dos fatos, uma vez que ocorreu exatamente 4 anos antes da morte de Herodes, no ano 8 a.C.. Entretanto, os Judeus tomaram providência no sentido de dificultar qualquer tentativa por parte dos ocupantes em contar o seu povo, pelo que, segundo a história, nas terras judaicas este recenseamento ocorrera um ano depois do restante império romano, ou seja no ano 7 a.C.. Em Belém, o recenseamento ocorrera no oitavo mês, pelo que se concluiu que, Jesus nascera provavelmente no mês de Agosto do ano 7 a.C.. Outros fatos também ajudam a estimar a data exata. Conforme é relatado pelos textos bíblicos, no dia seguinte ao nascimento de Jesus, José fez o recenseamento da sua família, e um dia depois, Maria enviou uma mensagem a Isabel relatando o acontecimento. A apresentação dos bebês no templo, bem como a purificação das mulheres teria de ocorrer até aos quarenta dias após o parto (Lev 12, 1-8). Jesus foi apresentado no templo de Zacarias, em Jerusalém, segundo os registos locais, no mês de Setembro num sábado. Sabe-se que Setembro do ano 7 a.C. teve quatro sábados: 4, 11, 18 e 25. Como os censos em Belém ocorreram entre 10 e 24 de Agosto, o sábado de apresentação seria o de 11. Logo Jesus teria nascido algures de 2 de Agosto do ano 7 a.C..
Purificação de Maria e apresentação de Jesus no Templo
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A infância de Jesus Circuncisão De acordo com a lei judaica, os meninos deveriam submeter-se à circuncisão aos oito dias de nascimento, cerimônia figurativa do Batismo. Nesta oportunidade é que recebiam um nome. Obediente à lei, Jesus - o Senhor, acima de toda a lei - foi, também, como qualquer judeu, circuncidado. Pois Ele veio para ensinar - e, por isso, em tudo, nos deu exemplo. E toda a sua vida é uma lição de amor. Ao ser circuncidado - obediente à lei judaica - derramou uma gota de sangue. No fim de sua vida - obediente até a morte - até à última gota, derramou todo o Seu sangue. Por causa de nosso orgulho e de nosso desamor. O nome de Jesus Na hora da circuncisão, "foi-lhe posto o nome de Jesus, como o havia chamado o Anjo, antes de ser concebido". Jesus, que quer dizer Salvador. Por isso escreveu S. Paulo: "Que ao nome de Jesus todo o joelho se dobre no céu, na terra e no inferno" (Fl 2, 10). Antes, já escrevera o Salmista: "Eu vos louvarei, Senhor Deus meu, com todo o meu coração, e glorificarei o vosso nome eternamente, porque vós, Senhor, sois suave e manso e de muita misericórdia para todos os que vos invocam" (Sl 85, 12 e 5). Jesus é, também, o Cristo, o Ungido, o Sacerdote e Vítima. E o Salvador. Salvador será sempre o Seu nome. E a cruz, o seu símbolo mais perfeito. Mas o peixe também O simboliza. Na Igreja primitiva, o título completo de Jesus, em grego, era Jesus Cristo Deus Filho Salvador, cujas iniciais (em grego) formam a palavra peixe. Por esse motivo, no ano 200, referindo-se ao Batismo, Tertuliano escreveu: "Nós (os cristãos), a exemplo de nosso Jesus Cristo, nascemos na água, como pequenos peixes". Purificação de Maria e apresentação de Jesus no Templo Segundo as rígidas leis judaicas, a mãe deveria apresentar-se ao Templo, para a cerimônia de purificação. Então seguiram para Jerusalém para se apresentarem ao Senhor. Também, nessa ocasião, em que os pais deveriam oferecer para o sacrifício "um par de rolas ou dois pombinhos", o primogênito era consagrado a Deus. É, ainda, nessa oportunidade, que se dá o episódio com o velho Simeão. Fora-lhe revelado (pelo Espírito Santo) que não morreria sem ver, antes, o Salvador. Por inspiração divina, foi ao Templo. E, por inspiração divina, reconheceu no Menino Aquele por quem esperava. Tomando-O, então, nos braços, exclamou: "Agora, sim, Senhor, podeis deixar morrer em paz o vosso servo, conforme dissestes, porque já viram os meus olhos o Salvador que prometestes enviar-nos" (Lc 2, 25s).
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Matança dos inocentes É relatada por S. Mateus, no cap. 2. Pelos reis Magos, Herodes soube que nascera o "Rei dos Judeus". Pediu-lhes, então, que lhe ensinassem o lugar onde se encontrava o Menino, "para, também, adorá-lo". Avisados por um anjo, os bons reis, "por outro caminho, voltaram para a sua região". Herodes pedira-lhes que voltassem para informá-lo quando tivessem encontrado o menino, mas eles não fizeram isso. Herodes tomou-se de fúria e, com medo desse novo rei dos judeus, mandou que fossem mortos todos os meninos de Belém que tivessem dois anos de idade ou menos. Como tantos, ainda hoje, Herodes não entendia que "o reino de Deus não é deste mundo". E, temendo a concorrência, mandou matar os inocentes. A festa aos Santos Inocentes acontece desde o século IV. O culto foi confirmado pelo Papa Pio V, agora Santo, para marcar o cumprimento de uma das mais antigas profecias, revelada pelo profeta Jeremias: a de que "Raquel choraria a morte de seus filhos" quando o Messias chegasse. Esses pequeninos inocentes de tenra idade, de alma pura, escreveram a primeira página do álbum de ouro dos mártires cristãos e mereceram a glória eterna segundo a promessa de Jesus. A Igreja preferiu indicar a festa dos Santos Inocentes para o dia 28 de dezembro por ser uma data próxima à Natividade de Jesus, uma vez que tudo aconteceu após visita dos reis magos. A escolha foi proposital, pois quis que os Santinhos Inocentes alegrassem com sua presença a manjedoura do Menino Jesus. Fuga para o Egito Prosseguindo a leitura do livro de Mateus, mais adiante o evangelista informa a notícia de que José, avisado em sonhos a respeito de um plano de Herodes para matar Jesus, foge com Maria e o menino para o Egito. O momento em que A família de Jesus foge para o Egito também não é suficientemente preciso na Bíblia. O fato de Herodes ter mandado matar todas as crianças de Belém do sexo masculino de dois anos para baixo pode significar que, depois do nascimento de Jesus na manjedoura, José ainda teria permanecido por algum tempo nessa cidade esperando que o menino estivesse em condições para suportar uma viagem de volta à Galiléia. Igualmente, não se sabe ao certo por quanto tempo a família de Jesus teria morado no Egito. Sabe-se apenas que Jesus permaneceu no Egito até a morte de Herodes, quando então José, após ser avisado por um anjo em seus sonhos, retorna para a cidade de Nazaré, para se cumprir o que proferira o Senhor pelo profeta, dizendo: "Do Egito chamei meu Filho". "Retirouse para as partes da Galiléia. Vindo para ai, habitou na cidade que se chama Nazaré, para mais uma vez, cumprir-se o que foi dito pelos profetas: Será chamado Nazareno" (Mt 2, 14 e 23).
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“Infância Apócrifa do Menino Jesus”
Em "Infância Apócrifa do Menino Jesus: histórias de ternura e de travessuras", o padre franciscano Jacir de Freitas Faria pesquisou em textos antigos, chamados de evangelhos apócrifos, ou seja, que não entraram na lista oficial para a Bíblia, e descobriu que Cristo foi uma criança sábia, inteligente, obediente aos pais, mas também muito peralta. Segundo ele, todos os textos pesquisados convergem para um mesmo ponto: "demonstrar o poder do Menino Jesus, sua divindade e sua humanidade". O termo "apócrifos" vem do grego ἀπόκρυφα e significa, justamente, "coisas escondidas". O termo é geralmente aplicado para designar livros que já foram considerados pela igreja como úteis, mas não divinamente inspirados. Assim sendo, referir-se a escritos gnósticos como "apócrifos" pode ser enganador, pois muitos deles não são assim classificados por fiéis mais ortodoxos do ponto de vista doutrinário. A partir do Concílio de Trento, a palavra "apócrifo" adquiriu conotação eminentemente negativa e se tornou sinônima de "espúrio" ou "falso".
Importância dos Evangelhos Apócrifos
Se por um lado estes Evangelhos não podem ser tidos como historicamente confiáveis e contendo tradições legítimas sobre Jesus – devido suas freqüentes fantasias e descrições lendárias sobre Jesus, por outro lado eles servem de fonte para conhecermos e compreendermos melhor as diversas correntes de pensamento da igreja cristã primitiva. Sem dúvida, eles nos permitem um contato direto com os sentimentos, com os estados de ânimo, com as reações, as ânsias e os ideais de muitíssimos cristãos do Oriente e do Ocidente e nos revelam as tendências e as correntes morais e religiosas de muitíssimas igrejas, completando, suprindo e, às vezes, retificando o que chegou até nós por outras fontes. Os Evangelhos Apócrifos nos colocam em contato com a fé diversificada da igreja cristã primitiva, nos primeiros séculos. Além disso, estudiosos tem mostrado ser possível “garimpar” e encontrar tradições autênticas sobre Jesus mesmo nos Evangelhos Apócrifos. Estudos no Evangelho de Tomé tem apontado para a possibilidade de tradições de ditos de Jesus mais antigas que as dos Evangelhos canônicos. Sem dúvida, uma história objetiva da Igreja Cristã Primitiva, de sua liturgia e de seus dogmas, hoje, não pode passar ao largo da literatura apócrifa, especialmente os Evangelhos. Na verdade, a própria antiguidade de alguns escritos já impõe, por si mesma, a necessidade de uma séria consideração. Em mais de um texto ou de um acontecimento transmitido só por apócrifos encontramo-nos diante de material que remonta às mais antigas e autênticas tradições cristãs. Prescindindo dos erros claros e das puras fantasias, certamente não é correta a posição daqueles que rejeitam praticamente tudo. Ainda que nesses textos se encontrem adulterações, mesmo assim eles são reflexos de notáveis estratos populares e completam o quadro oficial que temos através de outras fontes.
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Em suma, os Evangelhos Apócrifos, no mínimo contribuem para o conhecimento das correntes religiosas, das doutrinas e das tendências, muitas vezes heterodoxas, existentes entre os cristãos dos primeiros séculos; a leitura desses escritos além de revelar a fé simples do povo, mostra também suas ansiedades e curiosidades, além de seu inegável valor de testemunhas da literatura.
A infância de Jesus Cristo Segundo Tomé
O Evangelho de Tomé foi escrito no século I d.C. e relata a vida do Senhor Jesus dos cinco aos doze anos. Segundo os estudiosos, é parte de um livro mais antigo ainda, tendo tido diversas versões escritas em grego, siríaco, latim, gregoriano e eslavo. O Evangelho de Tomé relata a vida de Jesus na sua infância, encerrando-se com o episódio de Jesus no Templo de Jerusalém, entre os doutores. Os Evangelhos Apócrifos têm uma importância histórica fundamental, pois preenche uma séria lacuna, devido à falta de informação desse período nos Evangelhos Canônicos. Aqui são relatados os milagres do Salvador, numa narrativa singela e cheia de beleza, que resgata essa importante fase na vida do Senhor Jesus. Esse Menino Jesus, que na época tinha cinco anos, encontrava-se um dia brincando no leito de um riacho, depois de haver chovido. Represando a correnteza em pequenas poças, tornava-as instantaneamente cristalinas, dominando-as somente com sua palavra. Fez depois uma massa mole com barro e com ela formou uma dúzia de passarinhos. Era um Sabbath e havia outros meninos brincando com ele. Um certo homem judeu, vendo o que Jesus acabara de fazer num dia de festa, foi correndo até seu pai, José, e contou-lhe tudo: - Olha, teu filho está no riacho e juntando um pouco de barro fez uma dúzia de passarinhos, profanando com isso o dia do Sabbath. José foi ter ao local e, ao vê-lo, ralhou com ele dizendo: - Por que fazes no Sabbath o que não é permitido? Jesus batendo palmas, dirigiu-se às figurinhas, ordenando-lhes: - Voai! Os passarinhos foram todos embora, gorjeando. Os judeus, ao verem isso, encheram-se de admiração e foram contar aos seus superiores o que haviam visto Jesus fazer.
Naquela época, um certo rabino de nome Zaqueu, o qual, ouvindo Jesus falar dessa maneira, encheu-se de admiração ao ver que, sendo menino, dizia tais coisas. Passado alguns dias, aproximou-se de José e disse: - Vejo que tens um filho sensato e inteligente. Confia-o a mim para que aprenda as letras. Eu, de minha parte, juntamente com elas, ensinar-lhe-ei toda espécie de sabedoria e a arte de saudar os mais velhos, de respeitálos como superiores e pais e de amar seus semelhantes. Disse-lhe todas as letras com grande esmero e clareza, desde Alfa até ômega. Jesus, porém, fixou seus olhos no rabino Zaqueu e indagou-lhe: - Como te atreves a explicar Beta aos outros,
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se tu mesmo ignoras a natureza do Alfa? Hipócrita! Explica primeiro a letra A, se é que sabes, e depois acreditaremos em tudo que disseres em relação a B. Começou a interrogar o professor sobre a primeira letra, porém este não pode responder-lhe. Disse então a Zaqueu na frente de todos: - Aprende, professor, a constituição da primeira letra e repara como tem linhas e traços médios, aqueles que vês unidos transversalmente, conjuntos, elevados, divergentes.... Os traços contidos na letra A são de três sinais: homogêneos, equilibrados e proporcionais. O professor Zaqueu, quando ouviu a exposição feita pelo menino sobre tantas e tais alegorias acerca da primeira das letras, ficou desconcertado diante da resposta e da erudição que ele manifestava. Disse aos presentes: - Pobre de mim! Não sei o que fazer, pois eu mesmo procurei a confusão ao trazer este jovem para junto de mim. Leva-o então, irmão José! Rogote! Não posso suportar a severidade do seu olhar. Não consigo fazer que seu discurso seja inteligível para mim. Este jovem não nasceu na terra. É capaz de dominar até mesmo o fogo. Talvez tenha nascido até mesmo antes da criação do mundo. Não sei qual o ventre que pôde tê-lo carregado e qual seio pôde havê-lo nutrido. Ai de mim! Meu amigo, estou aturdido. Não posso seguir o vôo de sua inteligência. Enganei-me, pobre de mim! Queria muito ter um aluno e deparei-me com um mestre. Percebo perfeitamente, amigos, a minha confusão, pois velho e tudo o mais, deixei-me vencer por uma criança. É de se ficar arrasado e morrer por causa desse jovem, pois neste momento sou incapaz de olhá-lo fixamente. Que vou responder quando todos me disserem que me deixei vencer por um rapazote? Que vou explicar a respeito do que ele me disse sobre as linhas da primeira letra? Não sei, amigos, porque ignoro a origem e o destino dessa criatura. Por isso te rogo, irmão José, que o leves para casa. É algo extraordinário: ou um Deus ou um anjo, ou já não sei o que dizer. Enquanto os judeus se entretinham em dar conselhos a Zaqueu, o menino pôs-se a rir com muita vontade e disse: - Frutificai agora vossas coisas e abri os olhos à luz os cegos de coração. Vim de cima para amaldiçoar-vos e depois chamar-vos para o alto, pois esta é a ordem daquele que me enviou por vossa causa. Quando o menino terminou de falar, sentiram-se imediatamente curados todos aqueles que haviam caído sob a maldição. Desde então, mínguem ousava irritá-lo para que ele não os amaldiçoasse ou viessem a ficar cegos.
Dias depois, encontrava-se Jesus brincando num terraço. Um dos meninos que estavam com ele caiu do alto e morreu. Os outros, ao verem isso, foram-se embora e somente Jesus ficou. Pouco depois chegaram os pais do morto e puseram a culpa nele. Disse-lhe Jesus: - Não, não. Eu não o empurrei.
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Apesar disso, eles o maltrataram. Jesus deu um salto de cima do terraço, vindo cair junto do cadáver. Pôs-se a gritar bem alto: - Zenon, assim chamava-se o menino, levanta-te e respondame, fui eu quem te empurrou? O morto levantou-se num instante e disse: - Não, Senhor. Tu não me jogaste, porém me ressuscitaste. Ao ver isso, todos os presentes ficaram consternados. Os pais do menino glorificaram a Deus por aquele maravilhoso feito e adoraram Jesus.
Poucos dias depois, estava um jovem cortando lenha nas redondezas e aconteceu que o machado escapou e cortou a planta do seu pé. O infeliz estava morrendo rapidamente por causa da hemorragia. Sobreveio por isso um grande alvoroço e juntou muita gente. Também Jesus veio ter ali. Depois de abrir espaço à força por entre a multidão, chegou junto do ferido e com suas mãos apertou o pé injuriado do jovem, que num instante ficou curado. Disse então ao rapaz: - Levanta-te já! Continua cortando lenha e lembra-te de mim! A multidão, quando se deu conta do que havia acontecido, adorou o Menino dizendo: Verdadeiramente, o Espírito de Deus habita esse rapaz.
Quando tinha seis anos, sua mãe deu-lhe certa vez um cântaro para que fosse enchê-lo de água e o trouxesse para casa. No caminho, Jesus tropeçou nas pessoas e a vasilha quebrou-se. Ele, então, estendeu o manto com o qual se cobria, encheu-o de água e levou-o a sua mãe. Esta, ao ver tal maravilha, pôs-se a beijar Jesus e foi guardando em seu íntimo todos os mistérios que o via realizar.
Certa vez, sendo tempo de semeadura, saiu Jesus com seu pai para semear trigo em sua propriedade. Enquanto José esparramava as sementes, o Menino Jesus teve também vontade de semear um grãozinho de trigo. Após ceifar e debulhar, sua colheita somou cem coros, equivalente a quase quarenta mil litros. Convocou em sua propriedade todos os pobres da região e repartiu com eles os grãos. José, depois, levou para si o restante. Jesus tinha oito anos, quando operou este milagre.
Seu pai, que era carpinteiro, fazia arados e cangas. Certa vez, recebeu o encargo de fazer uma cama para certa pessoa de boa posição. Aconteceu que uma das tábuas era mais curta que a outra e por isso José não sabia como proceder. Então o Menino Jesus disse a seu pai: - Põe no chão ambas as tábuas e iguala-as pela metade. Assim fez José. Jesus foi até à outra extremidade, pegou a tábua mais curta e esticou-a, deixando-a tão comprida quanto a outra.
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José, seu pai, encheu-se de admiração ao ver o prodígio e cobriu o menino de abraços e beijos dizendo: - Feliz de mim, porque Deus me deu este menino.
José, percebendo que a inteligência do menino ia amadurecendo ao mesmo tempo que a idade, quis novamente impedir que ele permanecesse analfabeto, por isso levou-o até um outro professor e colocou-o a sua disposição. Disse o professor: - Ensinar-te-ei, em primeiro lugar as letras gregas, depois as hebraicas. Era evidente que o professor conhecia bem a capacidade do rapaz e sentia medo dele. Depois de escrever o alfabeto, entretinha-se com ele por um longo tempo, sem obter nenhuma resposta de seus lábios. Finalmente Jesus lhe disse: - Se és mestre de verdade e conheces perfeitamente as letras, dizeme primeiro qual é o valor de Alfa e então eu te direi qual é o de Beta. Irritado, o professor bateu-lhe na cabeça. Quando o menino Jesus sentiu a dor, amaldiçoou-o e imediatamente o professor desmaiou e caiu de bruços no chão. O jovem voltou para casa de José. Este encheu-se de pesar e disse a Maria que não o deixasse sair de casa, porque todos aqueles que o aborreciam vinham a morrer.
Passado algum tempo, outro professor, que era amigo íntimo de José, disse-lhe: - Leva teu filho à escola. Talvez com delicadeza eu possa ensinar-lhe as letras. José replicou: - Se te atreveres, irmão, leva-o contigo. O professor o aceitou com muito receio e preocupação, porém o menino demonstrou boa vontade e progredia a olhos vistos. Certo dia, ele entrou impetuosamente na sala de aula e encontrou um livro colocado sobre a carteira. Pegou-o e, sem parar de ler as letras que nele estavam escritas, abriu sua boca e começou a falar, levado pelo Espírito Santo, ensinando a Lei aos circunstantes que o escutavam. Uma grande multidão, que havia se juntado, ouvia-o, cheia de admiração pela maravilha de sua doutrina e pela clareza de suas colocações, considerando que era uma criança que assim lhes falava. José, quando soube disso, encheu-se de medo e correu imediatamente até a escola, receando que também aquele professor pudesse ter sido maltratado. Este, porém, lhe disse: - Saiba, irmão, que recebi este menino como se fosse um aluno comum e acontece que está sobejando graça e sabedoria. Leva-o, por favor, para tua casa! Ao ouvir essas palavras o menino sorriu e disse: - Agradeço a ti, por haveres falado com retidão e dado um testemunho justo. Será curado aquele que anteriormente foi castigado. Imediatamente o outro professor sentiu-se bem. José pegou o menino e foram para casa.
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Dias depois, sobreveio um grande tumulto, onde construíam uma casa. Jesus levantou-se e dirigiu-se até o local. Vendo ali um cadáver estendido no chão, tomou-lhe a mão e dirigiu-se a ele nos seguintes termos: - Homem, falo contigo! Levanta-te e termina teu trabalho! Ele se levantou em seguida e o adorou. A multidão que viu essa cena encheu-se de admiração e disse: - Esse rapaz deve ter vindo do céu, pois tem livrado muitas almas da morte e ainda seguirá livrando mais durante a vida.
Quando contava doze anos seus pais, como de costume, foram em caravana até Jerusalém, para assistir às festas da Páscoa. Quando as festas terminaram, voltavam para casa. No instante de partir, o Menino Jesus retornou a Jerusalém, enquanto seus pais pensavam que o encontrariam na comitiva. Depois do primeiro dia de marcha, puseram-se a buscá-lo entre os seus parentes. Não o encontrando, preocuparam-se muito e voltaram a Jerusalém para procurá-lo. Finalmente, depois do terceiro dia, encontraram-no no templo, sentado em meio aos doutores, escutando-os e fazendo-lhes perguntas.
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O Menino Jesus no Templo Vejamos o Evangelho de S. Lucas (Lc 2, 42-51): Aos doze anos, no Templo de Jerusalém, o Menino Jesus confunde os doutores da lei que o ouviam "pasmados de sua sabedoria e das suas respostas". E, à mãe aflita que o procurava, Ele responde que era preciso cuidar das coisas de Seu Pai. Em Sua missão divina, cumpria a vontade do Pai Eterno. O jovem Jesus, então com doze anos, acompanha Maria e José a Jerusalém numa peregrinação, segundo o costume da festa ou seja, a Páscoa judaica. No dia de voltar, ficou em Jerusalém e seus pais, acreditando que ele estivesse à frente com parentes, iniciaram a viagem de volta para Nazaré. Notando o erro, eles voltaram para Jerusalém, encontrando Jesus três dias depois. Ele foi encontrado no Templo, discutindo com os anciãos, que estavam admirados com sua sabedoria e inteligência, especialmente por sua pouca idade. Quando foi finalmente repreendido por Maria, Jesus respondeu «Por que me procuráveis? Não sabíeis que eu devia estar na casa de meu Pai?» (Lucas 2, 49). Depois, voltou para casa. Com Maria e José. E lhes era submisso. E crescia em sabedoria e graça, diante de Deus e dos homens. Jesus crescia realmente quanto ao corpo, e quanto ao espírito, pela ciência adquirida: mas só aparentemente é que crescia na graça, cuja plenitude, já possuída, se manifestava progressivamente. Fazendo-se criança, Jesus quis percorrer todas as etapas da vida humana. Por isso, como um menino, crescia em sabedoria e graça. E, como um menino, era submisso a seus pais. Depois desses fatos, até a idade de 30 anos, nada mais se conhece a respeito de Jesus. Modestamente, obscuramente, até esta idade, Ele viveu em família, santificando a vida em comum, dignificando as tarefas mais simples.
Jesus entre os doutores da lei
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João Batista
João Baptista (Judeia, ~7 a.C. — 28 d.C.) foi um pregador judeu do início do século I, citado pelo historiador Flávio Josefo e os autores dos quatro Evangelhos da Bíblia. Segundo a narração do Evangelho de São Lucas, João Batista era filho do sacerdote Zacarias e Isabel, prima de Maria, mãe de Jesus. Foi profeta e é considerado, principalmente pelos cristãos ortodoxos, como o "precursor" do prometido Messias, Jesus Cristo. Batizou muitos judeus, incluindo Jesus, no rio Jordão, e introduziu o batismo de gentios nos rituais de conversão judaicos, que mais tarde foram adotados pelo cristianismo. João nasceu numa pequena aldeia chamada Aim Karim, a cerca de seis quilômetros lineares de distância a oeste de Jerusalém. Segundo interpretações do Evangelho de Lucas, era um nazireu de nascimento. Outros documentos defendem que pertencia à facção nazarita da Palestina, integrando-a na puberdade, era considerado, por muitos, um homem consagrado. De acordo com a cronologia neste artigo, João teria nascido no ano 7 a.C.. Como era prática ritual entre os judeus, o seu pai Zacarias teria procedido à cerimônia da circuncisão, ao oitavo dia de vida do menino. A sua educação foi grandemente influenciada pelas ações religiosas e pela vida no templo, uma vez que o seu pai era um sacerdote e a sua mãe pertencia a uma sociedade chamada "as filhas de Araão", as quais cumpriam com determinados procedimentos importantes na sociedade religiosa da altura. Aos 6 anos de idade, de acordo com a educação sistemática judaica, todos os meninos deveriam iniciar a sua aprendizagem escolar. Em Judá não existia uma escola, pelo que terá sido o seu pai e a sua mãe a ensiná-lo a ler e a escrever, e a instruí-lo nas atividades regulares. Aos 14 anos há uma mudança no ensino. Os meninos, graduados nas escolas da sinagoga, iniciam um novo ciclo na sua educação. Como não existia uma escola em Judá, os seus pais terão decidido levar João a Engedi (atual Qumram) com o fito de este ser iniciado na educação nazarita. João terá efetuado os votos de nazarita que incluíam abster-se de bebidas intoxicantes, o deixar o cabelo crescer, e o não tocar nos mortos. As ofertas que faziam parte do ritual foram entregues em frente ao templo de Jerusalém como caracterizava o ritual. Engedi era a sede ao sul da irmandade nazarita, situava-se perto do Mar Morto e era liderada por um homem, reconhecido, de nome Ebner. O pai de João, Zacarias, terá morrido no ano 12 d.C.. João teria 18-19 anos de idade, e terá sido um esforço manter o seu voto de não tocar nos mortos. Com a morte do seu pai, Isabel ficaria dependente de João para o seu sustento. Era normal ser o filho mais velho a sustentar a família com a morte do pai. João seria filho único. Para se poder manter próximo de Engedi e ajudar a sua mãe, eles terão se mudado, de Judá para Hebrom (o deserto da Judeia). Ali João terá iniciado uma vida de pastor, juntando-se às dezenas de grupos ascetas que deambulavam por aquela região, e que se juntavam amigavelmente e conviviam com os nazaritas de Engedi. Isabel terá morrido no ano 22.d.C. e foi sepultada em Hebrom. João ofereceu todos os seus bens de família à irmandade nazarita e aliviou-se de todas as responsabilidades sociais, iniciando a sua preparação para aquele que se tornou um “objetivo de vida” - pregar aos gentios e admoestar os judeus, anunciando a proximidade de um “Messias” que estabeleceria o “Reino do Céu”.
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De acordo com um médico da Antioquia, que residia em Písia, de nome Lucas, João terá iniciado o seu trabalho de pregador no 15º ano do reinado de Tibério. Lucas foi um discípulo de Paulo, e morreu em 90 d.C.. A sua herança escrita, narrada no "Evangelho segundo São Lucas" e "Atos dos Apóstolos" foram compiladas em acordo com os seus apontamentos dos conhecimentos de Paulo e de algumas testemunhas que ele considerou. Este 15º ano do reinado de Tibério César terá marcado, então, o início da pregação pública de João e a sua angariação de discípulos por toda a Judeia em acordo com o Novo Testamento. É perspectiva comum que a principal influência na vida de João terá sido os registros que lhe chegaram sobre o profeta Elias. Mesmo a sua forma de vestir com peles de animais e o seu método de exortação nos seus discursos públicos, demonstravam uma admiração pelos métodos antepassados do profeta Elias. Foi muitas vezes chamado de “encarnação de Elias” e o Novo Testamento, pelas palavras de Lucas, refere mesmo que existia uma incidência do Espírito de Elias nas ações de João. O Discurso principal de João era a respeito da vinda do Messias. Grandemente esperado por todos os judeus, o Messias era a fonte de toda as esperanças deste povo em restaurar a sua dignidade como nação independente. Os judeus defendiam a ideia da sua nacionalidade ter iniciado com Abraão, e que esta atingiria o seu ponto culminar com achegada do Messias. João advertia os judeus e convertia gentios, e isto tornou-o amado por uns e desprezado por outros. Importante notar que João não introduziu o batismo no conceito judaico, este já era uma cerimônia praticada. A inovação de João terá sido a abertura da cerimônia à conversão dos gentios, causando assim muita polemica. Numa pequena aldeia de nome “Adão” João pregou a respeito “daquele que viria”, do qual não seria digno nem nemter uma ligação (as com a de apertar as alparcas correias das sandálias). Nessa aldeia também, João acusou Herodes e sua cunhada Herodíades, que repreendeu-o no seu discurso, por este ter uma ligação com a sua cunhada Herodíades, que era mulher de de Filipe, Filipe,reireidadaIturéia e Traconites (irmão de Herodes Antipas I). Esta acusação era mulher Ituréia e Traconites (irmão pública chegou aos ouvidos do tetrarca e valeu-lhe a prisão e a pena capital por decapitação de Herodes Antipas I). alguns meses mais tarde.João batizava em Pela, quando Jesus se aproximou, na margem do rio Jordão. A síntese bíblica do acontecimento é resumida, mas denota alguns fatores fundamentais no sentimento da experiência de João. Nesta altura João encontrava-se no auge das suas pregações. Teria já entre 25 a 30 discípulos e batizava judeus e gentios arrependidos. Neste tempo os judeus acreditavam que Deus castigava não só os iníquos, mas as suas gerações descendentes. Eles acreditavam que apenas um judeu poderia ser o culpado do castigo de
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toda a nação. O batismo para muitos dos judeus não era o resultado de um arrependimento pessoal. O trabalho de João progredia. Os relatos Bíblicos contam a história da voz que se ouviu, quando João batizou Jesus, dizendo “este é o Meu filho amado no qual ponho toda a minha complacência”. Refere que uma pomba esvoaçou sobre os dois religiosos personagens dentro do rio, e relacionam essa ave com uma manifestação do Espírito Santo. Este acontecimento sem qualquer repetição histórica tem servido por base a imensas doutrinas. O aprisionamento de João ocorreu na Pereia, a mando do Rei Herodes Antipas I no 6º mês do ano 28 d.C.. Ele foi levado para a fortaleza de Macaeros (Maqueronte), onde foi mantido por dez meses até ao dia de sua morte. O motivo desse aprisionamento apontava para a liderança de uma revolução. Herodíades, por intermédio de sua filha, tradicionalmente chamada de Salomé, conseguiu coagir o Rei na morte de João, e a sua cabeça foi-lhe entregue numa bandeja de prata. Os discípulos de João trataram do sepultamento do seu corpo e de anunciar a sua morte ao seu primo Jesus.
João Batista
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O Batismo de Jesus
Conta-nos os Evangelhos que Jesus sai da Galiléia e vai ao Rio Jordão a fim de ser batizado por João. Este episódio marcará o início da vida pública de Jesus, ou seja, de sua vida conhecida e relatada pelos evangelistas. João Batista espanta-se com o pedido de Jesus, pois sabia quem Ele era. Jesus não precisava ser batizado para conversão de seus pecados, porque Nele não habitava o mal. Mas quis ser batizado para mostrar que estava junto com o povo peregrino e sofredor. Quis estabelecer, desde já, um vínculo de proximidade com aquela gente infinitamente amada por Ele. Ao povo é revelado naquele momento que Jesus Cristo é alguém totalmente inserido na vida divina: o próprio Deus revelará quem Jesus é e fará descer sobre Ele o Espírito Santo que O acompanhará em Sua pregação. E o povo saberá, então, que é Ele sobre quem o profeta Isaías havia dito: “Eis o meu servo – eu o recebo; eis o meu eleito – nele se compraz minha alma; pus meu espírito sobre ele, ele promoverá o julgamento das nações. Ele não clama nem levanta a voz, nem se faz ouvir pelas ruas. Não quebra uma cana rachada nem apaga um pavio que ainda fumega; mas promoverá o julgamento para obter a verdade. E abrirá os olhos dos cegos, tirará os cativos da prisão e livrará do cárcere os que vivem nas trevas” (Is 42, 1-3.7). Celebrar o batismo de Jesus nos convida a fazer memória do nosso próprio batismo. Como o compreendemos? Como o testemunhamos? Podemos dizer que hoje, em nós, o Espírito de Deus faz morada? Podemos dizer que vivemos plenamente o desejo de Deus em habitar em nossos corações? Testemunhamos um batismo vivo ou apenas um preceito social ou religioso? São perguntas que nos devemos fazer se queremos nos afirmar cristãos. Jesus marca o início de sua vida pública com o batismo de João. Nossa entrada na Igreja também se dá com sacramento do Batismo. E a partir dele? Ensinamos nossos filhos a viver em plenitude a fé? Somos, nós mesmos, exemplos de pessoas que concretizam sua experiência de Deus, como Jesus Cristo a concretizou? Ser batizado é ser inexoravelmente responsável pela construção do Reino de Deus. É uma marca que jamais sairá de nossas vidas e corações. Pelo batismo nos tornamos membros da Igreja de Deus, fiéis aos Seus ensinamentos, desejosos de estabelecer vínculos com o Criador e a Ele testemunhar com nossas vidas. Cabe, pois, a cada um procurar viver concretamente o seu batismo. Só assim poderemos mostrar com a nossa vida a face amorosa de Deus. Textos bíblicos sobre o assunto: Is 42, 1-4.6-7 At 10, 34-38 Mt 3, 13-17
Mc 1, 9-11 Lc 3, 21-22 Jo 1, 29-34
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Todos os três Evangelhos sinóticos descrevem o batismo de Jesus por João Batista, e este evento é descrito pelos eruditos bíblicos como o início do ministério público de Jesus. De acordo com as fontes canônicas, Jesus foi para o rio Jordão onde João Batista estava pregando e batizando as pessoas. Mateus descreve que João estava hesitante em atender o pedido de Jesus para ser batizado, alegando que ele é quem deveria ser batizado por Jesus. Mas Jesus insistiu, "Consente agora; porque assim nos convém cumprir toda a justiça." (Mateus 3:15). Depois que Jesus foi batizado e saiu da água, Marcos afirma que Jesus "viu os céus se abrirem, e o Espírito, qual pomba, a descer sobre ele. e ouviu-se dos céus esta voz: Tu és meu Filho amado; em ti me comprazo." (Marcos 1:10–11). O Evangelho de João não descreve o batismo e nem se refere a João como "o Batista" mas ele atesta que Jesus é aquele sobre quem João tinha pregado — o Filho de Deus. Após o seu batismo, Jesus foi levado para o deserto por Deus, onde jejuou durante quarenta dias e quarenta noites. Durante esse tempo, o diabo lhe apareceu e o tentou por três vezes. Em cada uma das vezes, Jesus rejeitou as tentações respondendo com uma citação das escrituras. Em seguida o diabo se foi e os anjos vieram para cuidar de Jesus. Muitas vezes Deus fez uso da água como linha divisória. Nos dias de Noé, a água do dilúvio separava o mundo pecaminoso da nova vida num mundo purificado (Gênesis 6-8). No Êxodo, a água do mar Vermelho era a linha divisória entre a escravidão e a liberdade (Êxodo 12-15). Nos dias de Naamã, a água do rio Jordão era a linha divisória entre a lepra e a purificação (2 Reis 5). Nos dias do cego, a água do Tanque de Siloé era a linha divisória entre a cegueira e a capacidade de ver (João 9). Por que Deus usou a água nesses casos, nós não sabemos. Mas, sem dúvida, não nos deve parecer estranho que Deus tenha feito a água no Novo Testamento ser a linha divisória entre a velha vida de pecado e a nova vida em Cristo. O batismo não é o único requisito para a salvação hoje, mas não podemos ser salvos sem ele. "Respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo: Quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no reino de Deus" (João 3:5).
A tentação no deserto
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O Ministério de Jesus
Jesus em sua missão glorifica o Pai no amor aos seres humanos, na misericórdia, na compaixão que tinha para com todos, de modo preferencial os empobrecidos. Vem à terra, sendo Deus se torna também humano, para salvar a humanidade dos pecados. Como homem sentia tudo o que nós sentimos: dor, angústia, alegria, chorava às vezes, orava. Seus ensinamentos através de parábolas, milagres, curas, discursos, enfim, todo seu projeto missionário estava em realizar a vontade de Deus. Em seu nome se perseguiu e se assassinou, mas também se evangelizaram continentes inteiros. Séculos de teologias e manipulações não conseguiram apagar as marcas deixadas pelo personagem real e extraordinário de Cristo. Jesus – Profeta – anuncia a salvação a todos os homens de boa vontade, com a missão de salvar a humanidade decaída, iniciando aqui o novo Reino. Jesus – Sacerdote – Ele é o sacrifício perfeito, dado em holocausto por toda a humanidade. Jesus – como Rei – Rei dos Reis, Senhor dos Senhores, o líder que conduz a humanidade para Deus. É o Reino de Deus, implantado por Jesus para restaurar a justiça, a verdade e banir a opressão, a mentira, a violência e o ódio. Jesus traz algo totalmente novo até então, porque era vontade de Deus que Ele libertasse, curasse, enfim realizasse o reinado de Deus já e aqui. Jesus começou a revelar sua missão especial após ser batizado por João Batista, seu primo, que preparava o caminho para Ele, pregando o arrependimento dos pecados e batizando os que aceitavam sua mensagem. Jesus foi ter com João Batista para ser batizado. Vemos em João 1: 35-37 – “No dia seguinte João estava outra vez ali, na companhia de dois dos seus discípulos. E vendo passar a Jesus, disse: Eis aqui o Cordeiro de Deus. E os dois discípulos ouviram-no dizer isso e seguiram a Jesus. ” E sem precisar de batismo Jesus foi batizado por João Batista no rio Jordão. Nessa hora aconteceu um milagre: a manifestação divina. Sobre sua cabeça surgiu uma pomba – o Espírito Santo – enquanto se ouvia uma voz: “Tu és meu Filho amado em quem me comprazo” (Marcos: 1, 11). Dessa forma, Jesus provou ser o Messias prometido, o Salvador esperado. Após o batismo Jesus foi para o deserto onde passou 40 dias e 40 noites, orando e jejuando, sendo sempre tentado por Satanás, que o provocou oferecendo riquezas e duvidando de seus milagres, porém, Jesus com todo o amor que sentia por Deus venceu a tentação e afastou o mal de perto de si, pois Satanás queria desviá-lo de sua missão aqui na terra. Depois do batismo e do tempo passado no deserto Jesus escolheu Cafarnaum, perto do mar da Galiléia, para o centro de suas atividades. Logo vieram juntarem-se a Jesus os primeiros apóstolos: Simão Pedro, André, Tiago e João. Depois escolheu ainda para ajudá-lo: Bartolomeu, Tiago Menor, Judas Iscariotes, Tadeu, Mateus, Filipe, Simão e Tomé.
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Jesus desenvolveu na Galiléia a maior parte de seu Ministério. Mas esteve também na Samaria, em Jerusalém e em outros pontos no norte da Galiléia. Anunciava o Reino de Deus e afirmava ter o poder de perdoar os pecados. Após passar um tempo em Cafarnaum, dirigiu-se a Jerusalém, para a festa de Páscoa que era realizada todos os anos. Ali pela primeira vez, despertou a ira contra si dos sacerdotes hebreus e, sobretudo fariseus, quando enxotou os vendilhões do templo como vemos em João 2, 1316: – “E estava próxima a Páscoa dos Judeus, e Jesus subiu a Jerusalém. E achou no templo os que vendiam bois, e ovelhas, e pombos, e os cambiadores assentados. E tendo feito um azorrague de cordéis, lançou todos fora do templo, bem como os bois e ovelhas; e espalhou o dinheiro dos cambiadores, e derribou as mesas. E disse aos que vendiam pombos: Tirai daqui estes e não façais da casa de meu Pai casa de vendas. ” Jesus Cristo demonstrou sua origem divina com muitos milagres e profecias. Ressuscitava mortos, exorcizava demônios e curava enfermos. Para suas necessidades jamais recorreu ao seu infinito poder. Todos os seus milagres acham-se transpassados por profunda comiseração para com os homens. Seu milagre supremo sem dúvida foi sua própria ressurreição dos mortos. Com esse fato subjugou o poder da morte e deu início a nossa ressurreição que ocorrerá quando Jesus voltar. A vida pública de Jesus durou cerca de 3 anos. Com seu poder sobre a natureza e seu conhecimento sobre o futuro, sendo que todas as profecias realizadas anteriormente se cumpriram, Cristo comprovou a verdade sobre seus ensinamentos, bem como que é verdadeiramente o Filho Unigênito de Deus. Jesus combatia especialmente a crueldade e a hipocrisia para com os fracos, não desprezava os pecadores e estava sempre disposto a perdoar e curar os enfermos e ainda morreu de forma cruel para salvar a humanidade do pecado. Ele ensinou utilizando a linguagem do povo, principalmente, através de parábolas. Seus ensinos eram repletos de ilustrações e exemplos do dia-a-dia, tais como: pesca, rede, peixe; árvore, fruto, solo, semente, etc. Para descrever, por exemplo, o amor de Deus pelos pecadores, ele falou sobre o pastor que saiu em busca de uma ovelha desgarrada e de um pai que esperava ansioso, o retorno de um filho que estava perdido (Lc 15, 1-7, 11-24). Os ensinos de Jesus não alcançavam só o intelecto dos ouvintes, mas, principalmente o coração. Eles eram ministrados no poder do Espírito Santo, qual resplendor de luz a dissipar-lhes as trevas das dúvidas, implantando no seu coração profunda convicção da verdade. Um dos discípulos que o ouviram no caminho de Emaús, disse: “Porventura não ardia em nós o nosso coração quando, pelo caminho, nos falava, e quando nos abria as Escrituras? ” (Lc 24, 32).
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O Primeiro Milagre
Jesus e seus discípulos foram convidados para uma festa de casamento e aceitaram o convite (Jo.2, 1-2). Cristo não era alienado. Ele participava dos eventos sociais, procurando estar sempre com o povo. De outro modo, como poderia cumprir sua missão? Precisava estar perto das pessoas para abençoá-las e salvá-las. Os cristãos, da mesma forma, não podem constituir um grupo isolado. Somos diferentes do mundo, mas não distantes ou fora dele (Jo.17,11,15,16). Não podemos aceitar convites para a prática pecaminosa (Pv.1,10-15). Outros, porém, podem ser aceitos. É necessário, contudo, que o cristão, onde estiver, dê um bom testemunho, sendo sal e luz (Mt.5,13-14), agindo em benefício do próximo. Foi o que Cristo fez. Jesus foi convidado porque sua presença é agradável. Onde ele está, o ambiente é celestial. A certa altura das bodas, acabou-se o vinho. Era comum que as festas de casamento durassem sete dias, mas, sem vinho, isso não seria possível. O que fazer? Talvez pudessem comprar mais. Entretanto, é possível que os convidados não estivessem dispostos a esperar. Fim do vinho significava fim da festa. Como ficaria a reputação do noivo diante de seus amigos? Teria ele falhado na preparação das núpcias? Ficaria marcado como negligente perante a noiva e os familiares? Ainda que os convivas tivessem consumido além do esperado, ou mais rapidamente, o noivo deveria estar prevenido. Estava, portanto, estabelecida uma situação de vergonha e desgosto, podendo marcar, de forma negativa, o início da vida conjugal. Maria, mãe de Jesus, também estava presente e percebeu que o vinho tinha acabado. Não tendo poder para resolver a situação, ela foi falar com seu filho. Ele parece não ter recebido bem a interferência da mãe. Afinal, ele já sabia do fato e talvez estivesse esperando o melhor momento para agir. A presença de Jesus não evita que determinados problemas ocorram. Aliás, eles podem ser necessários e úteis, desde que sejam bem conduzidos e devidamente solucionados. Uma necessidade torna-se oportunidade para o milagre. Não queremos problemas, mas Deus permite que tenhamos alguns para que também possamos ter experiências sobrenaturais. Maria sabia que Jesus ia tomar alguma providência e deu, então, uma sábia orientação aos servos da casa: “Fazei tudo o que ele vos disser” (Jo.2,5). Se temos algo a aprender com as palavras de Maria é no sentido de voltarmos nossa atenção para Cristo, procurando realizar, não apenas parte, mas tudo o que ele nos mandar. Ele podia fazer o milagre, até mesmo antes que a falta do vinho fosse notada, mas isso não atenderia aos seus propósitos. Ninguém saberia. Seu poder não seria reconhecido (2,11) e Deus não seria glorificado. É preciso que, por algum tempo, sintamos a necessidade, a fim de que a bênção seja desejada e valorizada. Se Jesus quisesse, poderia dizer uma palavra e o vinho jorraria de todos os vasos e copos, mas ele deseja a participação dos servos na realização do milagre. Em muitos episódios dos evangelhos aconteceu assim: as pessoas esperavam uma bênção e recebiam uma ordem. É preciso obedecer para ser abençoado, e não o contrário. Deus quer a participação humana em suas obras. Ele pode fazer tudo sozinho, mas nos deu o privilégio e a oportunidade de participar, e isto significa trabalho. A nossa fé deve ser demonstrada através da obediência e do serviço, pois “a fé sem obras é morta”. Jesus faz o milagre, mas precisamos fazer a nossa parte.
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Os servos tinham muito trabalho a fazer, mas isso lhes daria a chance de serem participantes e testemunhas do milagre. Os convidados estavam em posição mais cômoda. Ficavam apenas se divertindo, enquanto esperavam o garçom passar. Qual é a nossa postura no reino de Deus. Agimos como convidados ou como servos? Queremos apenas beber o vinho do milagre ou trabalhar na sua produção? Aquele que tem a iniciativa de servir, também tem oportunidades singulares. Os servos sabiam o que os convidados ignoravam. Jesus mandou que os serventes enchessem de água seis talhas de pedra. Em cada uma delas cabia entre dois e três almudes, ou seja, entre 72 e 108 litros. Era muita água para ser carregada. O Senhor nos manda fazer coisas difíceis, mas, se fizermos, ficaremos satisfeitos com o resultado. Aquele ato de obediência exigia esforço. Jesus abençoa os que trabalham, mas os preguiçosos continuam passando necessidade. As talhas foram cheias até a borda. A obediência foi imediata e completa. Quanto mais água, mais vinho. Não podemos fazer apenas o mínimo, a não ser que queiramos uma bênção pequena. Não podemos ser “econômicos” na oração, no jejum, na leitura bíblica e no serviço ao Senhor. Precisamos fazer mais, fazer muito e fazer bem feito. Para fazer o milagre, Jesus usou o que estava à sua disposição: os servos, as talhas e a água. Estamos disponíveis para Cristo operar? Nossos bens, tempo e talentos estão entregues ao Senhor? Se o dono da casa escondesse os recipientes, talvez o milagre não tivesse acontecido, ou a quantidade seria menor. Todos queriam vinho e Jesus manda encher os vasos com água. Queremos o produto final, pronto e servido. Entretanto, a operação divina pode ocorrer em etapas, conforme seus soberanos propósitos. Aquela ordem parecia não fazer sentido, mas ninguém lhe fez perguntas. Devemos obedecer sem questionar. Nem sempre vamos saber o porquê das ordens ou dos atos divinos. Então, o milagre aconteceu. Jesus transformou a água em vinho. O texto não traz explicações químicas ou biológicas a respeito do processo. Não podemos nem precisamos explicar cientificamente os atos de Jesus. Aqueles que dependem de explicações colocam obstáculos à sua própria fé. Nem sempre vamos saber como Deus opera. Precisamos crer em seu poder, mesmo sem compreender sua forma de agir. Em seguida, os servos levaram o vinho para que o mestre-sala experimentasse. Ele era o responsável pelo controle de qualidade. Quando experimentou o vinho de Jesus, aquele homem ficou surpreso e maravilhado. Suponho que ele nunca houvera bebido um vinho tão bom. Jesus faz, e faz bem feito. O vinho de Jesus é superior. Experimente! Com Jesus, tudo fica melhor. Não aceitemos o que o inimigo oferece. Deus tem o melhor para nós. Não sejamos impacientes. Esperemos o tempo certo, quando ele suprirá a nossa necessidade de forma miraculosa e surpreendente. O mestre-sala disse ao noivo: “Todo homem põe primeiro o vinho bom... mas tu guardaste até agora o bom vinho”. Quando Jesus opera em nós, saímos do limite dos costumes e das tradições para um nível de excelência. As pessoas esperavam que, com o passar do tempo da festa, o vinho fosse piorando, mas, se Jesus está presente, a tendência é melhorar, de fé em fé (Rm.1,17) e de glória em glória (IICo.3.18). As tribulações são grandes, mas as vitórias são maiores. A festa estava salva. A comemoração podia continuar, com alegria ainda maior. Aquele casamento sempre seria lembrado pela presença e pelo poder de Jesus. O problema foi transformado em bênção. Ali Jesus realizou seu primeiro milagre, marcando aquele casal e
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aquela cidade. Caná da Galiléia ficou definitivamente vinculada à maravilha da transformação da água em vinho. O fato de Jesus ter escolhido uma festa de casamento para realizar seu primeiro sinal nos mostra como o matrimônio e a família são importantes para Deus. Além de atender à necessidade do momento, aquele ato de Jesus demonstrou seu poder transformador. Hoje, ele tem transformado muitas vidas. Assim como aconteceu naquelas bodas, pode chegar um momento na vida conjugal ou individual quando a alegria acaba. Tudo estava indo tão bem e, de repente, instala-se o caos. Isto pode ser resultado de algum acontecimento ruim, decisões equivocadas ou práticas pecaminosas. Nessas horas, Jesus é a nossa única esperança. Ele pode fazer o que não está ao nosso alcance, e faz muito melhor, dando aroma, cor e sabor à nossa existência. Jesus é especialista na transformação de vidas. Ele atua naqueles que já foram descartados pela sociedade. Cristo recupera o marginal, transformando-o em cidadão de bem. Acima de tudo, ele nos transforma de tal maneira que possamos ser agradáveis a Deus (Rm.12, 1-2). Depois que a água foi transformada em vinho, a festa continuou, mas isso só foi possível porque os noivos convidaram Jesus para aquele casamento. Todos devem convidá-lo. Nossa vida sem ele é vazia e inútil. Só Cristo pode nos abençoar, nos dar uma nova motivação para viver. Com ele, temos um novo começo, pois seu poder age em nós, fazendo transbordar o nosso cálice.
O primeiro Milagre de Jesus
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Jesus, O Mestre dos Mestres
Uma das maiores declarações acerca de Cristo foi feita por Nicodemos. Ele disse a Jesus: “Rabi, bem sabemos que és Mestre, vindo de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não for com ele” (Jo 3, 2). Das 90 vezes que alguém se dirigiu à Cristo nos Evangelhos, 60 vezes Ele é chamado de Mestre. Grande parte do ministério de nosso Senhor Jesus foi ocupada com o ensino (Mt 4, 23; 9, 35; Lc 20, 1).
Jesus ensinava:
Ele foi reconhecido como Mestre:
Nas sinagogas (Mt 9, 35; 13, 54; Mc 1, 21); Em casas particulares (Mt 9); No templo (Mt 21, 23; Mc 11, 17; 12, 35); Nas aldeias (Mc 6, 6; Lc 13, 22) Nas cidades (Mt 11, 1); Às multidões (Mt 5, 2; Mc 2, 13; 4, 1; 6, 34) Individualmente (Jo 3, 4)
Pelos coletores de impostos (Mt 17, 24); Por um escriba que queria segui-lo (Mt 8, 19); Pelo jovem rico (Mt 19, 16; Lc 18, 18); Pelos discípulos (Mc 4, 38; Mc 9, 5; Lc 8, 24); Pelo cego de Jericó (Mc 10, 51); Pelos discípulos de João (Jo 1, 38); Por Maria Madalena (Jo 20, 16), e outros
A Autoridade dos ensinos de Jesus
O que distinguia os ensinos de Jesus com os ensinos dos escribas e fariseus era a autoridade com que Ele ensinava. Os evangelistas afirmam que todos se maravilhavam de Sua doutrina (Mt 7, 28-29; Mc 1, 21-22). A autoridade da mensagem de Cristo era decorrente do fato de Ele exemplificar em sua própria vida. Ele viveu o que ensinou e ensinou o que viveu! Quando Ele ensinou a orar (Mt 6, 9-13; Lc 11, 2-4), é porque vivia uma vida de oração e comunhão com o Pai (Mt 14, 23; 26-36); Quando ensinou sobre o perdão (Mt 6, 14, 15; Mc 11, 25), é porque vivenciava no dia-a-dia a prática do perdão (Mc 2, 1-11; Lc 23, 34). Por esta razão, Lucas, ao relatar a Teófilo o ministério do Mestre, coloca em primeiro lugar a ação e depois o ensino, quando diz: “Fiz o primeiro tratado, ó Teófilo, acerca de tudo o que Jesus começou, não só a fazer, mas a ensinar” (At 1, 1).
Ninguém jamais ensinou como Jesus. Isto porque, as verdades mais profundas eram reveladas com autoridade e simplicidade, de forma que podia alcançar a todos. Seus ensinos eram universais, e serviam para todos os homens e de todas as épocas; era capaz de despertar as consciências adormecidas, conduzindo-as à realidade dos deveres para com Deus. Ele foi capaz de resumir toda a Lei e as ordenanças do Antigo Testamento em poucas palavras (Mt 22, 3740); ilustrou seus ensinos com parábolas e fatos comuns; e ensinou com tanta autoridade, que até mesmo àqueles que iam prendê-lo, chegaram a confessar: “Nunca homem algum falou assim como este homem” (Jo 7, 46).
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Jesus ensinando a Palavra
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O novo mandamento de Jesus (Jo 13, 34-35; 15, 9; 12-17)
Ensinou Jesus, o Cristo, o Divino: Novo mandamento vos dou: Amai-vos como Eu vos amei. Somente assim podereis ser reconhecidos como meus discípulos, se tiverdes o mesmo Amor uns pelos outros. O meu Mandamento é este: que vos ameis como Eu vos tenho amado. Não há maior Amor do que doar a própria Vida pelos seus amigos. E vós sereis meus amigos se fizerdes o que Eu vos mando. E Eu vos mando isto: amai-vos como Eu vos amei. Já não mais vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor. Mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto aprendi com meu Pai vos tenho dado a conhecer. Não fostes vós que me escolhestes; pelo contrário, fui Eu que vos escolhi e vos designei para que vades e deis bons frutos, de modo que o vosso fruto permaneça, a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, Ele vos conceda. E isto Eu vos mando: que vos ameis como Eu vos tenho amado. Porquanto, da mesma forma com o Pai me ama, Eu também vos amo. Permanecei no meu Amor.
Jesus lavando os pés dos apóstolos
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Descendência de Jesus Cristo (Mt 1,1-17)
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Abraão, casado com Sara Isaque, casado com Rebecca Jacó, casado com Lia Judá, casado com Tamar Esrom Arão Aminadabe Naassom Salmom, casado com Raabe Boaz, casado com Rute Obede Jessé, casado com Nitzevet Davi, casado com Bate-Seba Salomão, casado com Anelise Roboão Abias Asa Josafá Jorão Uzias
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Jotão Acaz Ezequias Manassés Amom Josias Jecomias Salatiel Zorobabel Abiúde Eliaquim Azor Sadoque Aquim Eliúde Eleázar Matã Jacó José, casado com Maria, mãe de Jesus Jesus Cristo
De sorte que todas as gerações, desde Abraão até Davi, são catorze gerações; e desde Davi até a deportação para a Babilônia, catorze gerações; e desde a deportação para a Babilônia até Cristo, catorze gerações. A Genealogia de Jesus está relatada em dois dos quatro Evangelhos, Mateus e Lucas. Estes relatos são substancialmente diferentes. Várias explicações têm sido sugeridas e tornou-se tradicional desde a explicação que foi dada pela primeira vez por Ânio de Viterbo, no ano de 1490, um erudito católico-romano, pressupor que a genealogia dada por Lucas foi traçada através de Maria e que a Mateus o faz através de José.
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30 d.C. – A morte de Jesus (sob Pôncio Pilatos)
Um dia no tribunal Pôncio Pilatos, militar, talvez nascido em Roma, que como prefeito da província romana da Judéia (26 d.C. - 36 d.C.), de acordo com a Bíblia cristã, no Capítulo 18 do Evangelho de João, foi o juiz que condenou Jesus Cristo (~7 a.C. - 30 d.C.) a morrer na cruz, apesar de não ter encontrado nenhuma culpa nele. Suas origens são desconhecidas até que foi nomeado pelo Imperador Tibério (14 d.C. - 37 d.C.) para ser o “praefectus” da Judéia em uma jurisdição que chegava até a Samaria e a Iduméia, ficando praticamente com poder absoluto, embora subordinado ao governador da Cesaréia. Como prefeito tinha que manter a ordem na província e administrá-la tanto judicial como economicamente. Ainda era cedo de manhã, mas Pôncio Pilatos, já se deparava com uma lista cheia de causas a serem julgadas. Ele não queria ser incomodado com as intrigas do sumo sacerdote dos judeus e seu conselho de anciãos, o Sinédrio. Na Judéia sempre faz calor desde o início do dia e Pilatos já estava suado e irritado, antes mesmo que os membros do conselho judaico se apresentassem diante dele arrastando consigo aquele profeta judeu, pregador do deserto ou seja lá o que fosse. Pilatos habitualmente residia em Cesárea, que era a capital oficial e estava situada à beira mar. Esta cidade foi construída por Herodes o Grande, que lhe deu este nome com o intuito de lisonjear o imperador César Augusto. Transladava-se para Jerusalém com todos os seus soldados, residindo no Pretório, contíguo à torre Antônia, ao noroeste do templo. Agia assim por temer que aquela multidão viesse a tramar alguma insurreição contra o poderio romano na Judéia. Embora seu regimento não superasse a ~4.500 soldados, podia em caso de necessidade, solicitar o auxílio militar do governador da Síria que era o seu superior imediato. Pôncio Pilatos costumava ficar no palácio de Herodes quando visitava a cidade de Jerusalém. Era a ocasião em que os judeus celebravam uma de suas festas religiosas e ele começava a ter uma sensação de que esse era um caso do qual não conseguiria se esquivar. É verdade que ele odiava Jerusalém, bem como os judeus com seus costumes religiosos e suas prescrições insuportáveis, além de odiar a atitude obstinadamente defensiva desse povo no que dizia respeito ao seu templo. Porém, ele sabia que não podia correr o risco de melindrar o Sinédrio, sem dúvida, não agora. Afinal de contas, uma multidão de judeus se reunira do lado de fora do Pretório, junto com os principais sacerdotes e sua ordem religiosa de mestres da Lei. Eles não sairiam dali enquanto ele não julgasse o caso daquele sujeito chamado Jesus.
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Quando Pilatos olhou para o acusado, que estava diante dele manietado e quieto, percebeu que uma “justiça brutal” já tinha sido administrada contra tal homem. As vestes de Jesus estavam rasgadas e era evidente que ele tinha sido espancado. Não há nada de estranho nisso, pensou Pilatos. A não ser por uma coisa. Algo relacionado com o comportamento daquele homem. Será que se poderia chamar aquilo de dignidade? Dificilmente. Um pregador errante; vestido de trapos. Bem, o que quer que fosse, começava a enervar Pilatos. O governador se sentia cada vez mais pressionado a tomar uma decisão. Mas aquele homem, em pé diante dele com um olhar sereno e implacável, sem um pingo de medo ou ansiedade, apesar de ensangüentado e de provavelmente ter que enfrentar a pena de morte, tornava a situação ainda mais difícil. Pilatos não podia ajudar; só conseguia relembrar seu histórico mal-sucedido em Jerusalém. Ele tinha sido convocado à Judéia para reassumir o controle da região. Seu antecessor, Arquelau, um dos filhos de Herodes, o Grande, cometeu um erro sórdido na tentativa de governar aquele território. Esse governante herodiano enviara suas tropas aos pátios do templo a fim de controlar uma rebelião violenta e acabou por massacrar três mil pessoas. Poucas semanas depois, Arquelau ausentou-se tranqüilamente de Jerusalém para fazer uma viagem a Roma e outra rebelião estourou. Essa última insurreição foi, finalmente, subjugada pelos romanos, depois que estes crucificaram dois mil habitantes locais ao redor das muralhas da cidade. Pilatos pensava que podia fazer melhor. Afinal de contas, quando ele chegou a Jerusalém, pela primeira vez, na qualidade de governador, pensara consigo mesmo: César exige paz e ordem nos territórios de sua ocupação – e eu estou pronto a oferecer-lhe o que exige. Mas, então, a realidade chegou. Pilatos, na intenção de sufocar um distúrbio, teve de enviar tropas para dentro da área do templo, as quais mataram muitos galileus, de modo que o sangue destes, derramado sobre o piso pedregoso, acabou por se misturar com o sangue dos animais que tinham acabado de ser sacrificados.
Com o objetivo de fazer uma demonstração de força em Jerusalém e assumir o controle pela intimidação, Pilatos, na calada da noite, ordenou que suas tropas hasteassem estandartes ou bandeiras romanas no contorno de uma determinada área, todas elas com a imagem de César estampada.
Em seguida, aconteceu o fiasco dos estandartes. Com o objetivo de fazer uma demonstração de força em Jerusalém e assumir o controle pela intimidação, Pilatos, na calada da noite, ordenou que suas tropas hasteassem estandartes ou bandeiras romanas no contorno de uma determinada área, todas elas com a imagem de César estampada. Ele nem se importou com o fato de que levantara imagens “idólatras” nas proximidades do templo. Como resultado, irrompeu outra rebelião.
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Dessa vez um enorme contingente de judeus marchou na direção norte até o quartel-general de Pilatos em Cesaréia e exigiu que os estandartes romanos com a imagem de César fossem removidos. Naquele momento, quando Pilatos deu ordens para que seus soldados se dirigissem contra a turba de judeus, os últimos homens da multidão descobriram seu pescoço, desafiando o governador a matá-los. Até mesmo os centuriões ficaram impressionados. Pilatos ficou ainda mais intimidado quando se lembrou da maneira pela qual teve de voltar atrás. Contudo, o que mais ele poderia fazer? A sobrevivência política nesse território abandonado da Judéia obviamente exigia sutileza diplomática, algo que ele considerava insultante. Ele preferia a força bruta. Era mais rápido – mais objetivo. Entretanto, Roma desejava a estabilidade naquela região. Agora Pilatos perguntava a si mesmo se algum dia isso seria possível. Flávio Josefo narra outro episódio ocorrido durante seu mandato. Pilatos mandou construir um aqueduto para levar água das imediações de Belém até Jerusalém. Porém, devido ao alto custo do projeto, resolveu então tomar o dinheiro do tesouro do Templo chamado Korbonan. Este fato deu origem a uma grande rebelião e, para reprimi-la, o governador usou de um cruel estratagema. Mandou que vários de seus soldados fossem à Jerusalém, disfarçados como peregrinos. Deviam estar sem espadas, munidos apenas de um pequeno bastão escondido por entre a roupa. E, quando já se encontravam misturados no meio do povo, todos a uma só vez começaram a golpear os revoltosos. Muitos daqueles que conseguiram escapar das mãos dos soldados, acabaram por morrer pisoteados pela multidão que fugia assustada. Ele encarou Jesus outra vez. Aquele judeu tinha acabado de confessar que era um “rei”. Mas Pilatos era esperto o suficiente para saber que aquele rabi (mestre) itinerante falava acerca de alguma espécie de reino religioso – não de um reino político. Os principais sacerdotes o constrangiam a usar sua autoridade para sentenciar o acusado à pena capital, pela alegação de que Jesus cometera traição. Porém, Pilatos sabia que, pelo rigor da lei romana, aquele homem não representava risco nenhum de provocar uma revolta. Então ele ouviu o grito de um dos escribas (ou era um dos sacerdotes? Talvez ele fosse ambas as coisas) que dizia algo sobre o modo pelo qual Jesus incitara o povo na Galiléia. Pilatos pensou: Herodes Antipas, o tetrarca da Galiléia, está aqui em Jerusalém para a festa. Esse Jesus procede do território que está sob a jurisdição de Herodes. Que Herodes julgue esse caso. Por que deveria eu decidir tal questão? Nesse momento, ao dar novamente uma olhada em Jesus de Nazaré, o governador romano finalmente começou a esboçar um sorriso, que desapareceu de seu rosto quando ele contemplou os olhos fitos de Jesus nele como uma chama de fogo que arde no papiro seco, queimando a fina cobertura que ocultava as motivações políticas de Pôncio Pilatos.
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Diz a história Esse enredo dramático pode ou não refletir com exatidão os mais íntimos pensamentos de Pilatos. Contudo, é coerente com o relato dos quatro Evangelhos e com consideráveis registros da história antiga acerca do julgamento romano de Jesus. A existência histórica do Sinédrio é evidente e a família dos Herodes está solidamente comprovada nos escritos do historiador judeu Flávio Josefo, o qual também escreveu sobre o julgamento de Jesus perante Pilatos. A identidade do governador romano é atestada até mesmo fora dos relatos bíblicos e nos registros de Josefo. Nos idos de 1950, numa escavação em Cesaréia, onde se localizava a residência oficial de Pilatos, descobriu-se uma inscrição em pedra. Embora uma parte dela tenha se perdido, as seguintes palavras ainda podiam ser lidas nitidamente: “Pôncio Pilatos, o Governador da Judéia”. Já ouvi a argumentação daqueles que duvidam da Bíblia, alegando que a prática de Pilatos em conceder à multidão o direito de escolha, pelo voto verbal, entre Jesus e Barrabás, mencionada nos quatro Evangelhos, não era usual, nem histórica. Contudo, essa prática de indultar ou perdoar criminosos pelo voto popular realmente existiu. Um papiro do primeiro século (Papirus Forentinus), originário do Egito sob a ocupação romana, trouxe à luz que a mesma prática foi usada no ano 85 d.C.
Julgamento de Jesus
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Uma amizade misteriosa
Entretanto, há uma pergunta intrigante que nem as Escrituras Sagradas nem a história responderam. Após Pilatos ter enviado Jesus a Herodes para que este desse continuidade ao processo judicial, por que razão a Bíblia declara: “Naquele mesmo dia, Herodes e Pilatos se reconciliaram, pois, antes, viviam inimizados um com o outro” (Lc 23, 12). Será que Herodes simplesmente desejava ser cordial? Isso parece pouco provável. O antigo escritor Fílon (de Alexandria, 20 a.C. - 50 d.C.) relatou que certa feita Pilatos instalou seus escudos distintivos dourados no palácio de Herodes. Herodes Antipas, ultrajado por tal situação, registrou uma queixa perante Tibério César, o qual ordenou que Pilatos removesse seus escudos daquele palácio. Com essa inimizade amargurada entre eles, só mesmo um motivo extremamente interesseiro, que garantisse o benefício de ambos, poderia ter curado a ruptura. Então, será que houve, de fato, uma conspiração entre Herodes e Pilatos? Se a resposta for afirmativa, contra quem seria?
O processo judicial romano reconhecia o direito de ficar em silêncio e a inocência do acusado até que se provasse o contrário. Antigos registros daquela época, transcritos de processos civis romanos, demonstram uma semelhança impressionante com o processo judicial nas cortes de justiça atuais.
Há uma possível explicação. Jesus permaneceu calado perante Herodes. Herodes o mandou de volta a Pilatos, porque não achou nele crime algum “digno de morte” (Lc 23, 15). No entanto, segundo o texto de Atos 4, 27, tanto Herodes quanto Pôncio Pilatos se voltaram contra Jesus. Ao harmonizarem-se tais versículos, chega-se à seguinte possibilidade: Herodes, embora desejasse secretamente livrar-se de qualquer pessoa (em especial, de Jesus) que representasse uma ameaça às suas ambições políticas, talvez tenha pensado que podia usar Jesus como um joguete, um peão no seu magistral jogo de xadrez – com o intuito de dar o xeque-mate no poder crescente do sumo sacerdote e do Sinédrio. Ao mesmo tempo, Pilatos queria simplesmente evitar mais uma decisão impopular e pode ter visto Herodes como um expediente de auxílio. Afinal de contas, Pilatos era uma pessoa moralmente baixa, além de ser um pragmático cruel.
O grande veredicto A despeito dos motivos de ambos, nem Herodes nem Pilatos conseguiram o que desejavam. Herodes, posteriormente, foi deposto por Calígula no ano 39 d.C. e Pilatos, depois de muitos fracassos, foi substituído em sua função de comando por ordens de Roma.
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Todavia, Jesus, condenado sem razão e cruelmente crucificado, foi sepultado no túmulo de um homem rico e, três dias depois, ressuscitou triunfalmente. A tarefa de Pilatos, como governador romano, era a de exercer justiça. Mesmo nos territórios de ocupação romana esperava-se que a justiça prevalecesse. O processo judicial romano reconhecia o direito de ficar em silêncio e a inocência do acusado até que se provasse o contrário. Antigos registros daquela época, transcritos de processos civis romanos, demonstram uma semelhança impressionante com o processo judicial nas cortes de justiça atuais: a presença dos advogados, a apresentação das provas documentais e testemunhais, bem como a formulação de elaborados argumentos legais. Pilatos, porém, desconsiderou todas as salvaguardas, ao permitir – e até mesmo ordenar – a execução de um homem que ele mesmo já tinha declarado inocente de qualquer crime passível de morte (Lc 23, 14-15, 22). A última interrogação de Pilatos a Jesus registrada nos Evangelhos, pergunta essa que deve ter sido feita num tom de frustração e arrogância ultrajante, foi a seguinte: “Não sabes que tenho autoridade (poder) para te soltar e autoridade para te crucificar? ” (Jo 19, 10). Mas a resposta de Jesus a Pilatos deve ter penetrado até a medula, quando ele lembrou ao governador romano que Deus é o Outorgante Supremo da autoridade (v. 11). A partir de então, Pilatos redobrou seus esforços para evitar que o fiasco legal e político se desenrolasse na sua presença, mas tudo foi em vão. Entretanto, Jesus não foi morto por causa do fracasso de Pilatos em exercer justiça, nem por causa da conspiração de Herodes, nem mesmo em virtude da má fé de seus acusadores ligados ao Sinédrio. O sangue de Jesus foi voluntária e propositalmente “derramado em favor de muitos, para remissão de pecados” (Mt 26, 28). O princípio fundamental da justiça romana espelhava-se numa máxima popular (a qual, posteriormente, foi coligida nas Institutas de Justiniano) que Pilatos, sem dúvida, conhecia, mas optou por ignorar: “A justiça é o propósito determinado e constante de retribuir a cada um o que lhe é devido”. Assim, portanto, também há uma decisão pessoal diante de cada um de nós: após considerarmos as alegações, feitas por Jesus, de ser ele o Messias, o Filho de Deus em carne, o Salvador, a perfeita e definitiva oferta pelo pecado, será que nós – eu e você – temos retribuído a Jesus “o que lhe é devido”? Segundo o bispo, historiador e teólogo neoplatonista grego Eusébio de Cesaréia (263-340 d.C.), em sua História Eclesiástica, o ex-prefeito, Pôncio Pilatos, foi desprezado pelo novo imperador, Caio Calígula (12-41 d.C.), e cometeu suicídio em seguida, no ano seguinte a destituição do cargo. Em Jerusalém (1927) o arqueólogo da École Biblique et Archéologique Française, L. H. Vincent, descobriu um pátio calçado com pedras pertencente à Torre Antônia, com aproximadamente 2.500 m², onde o famoso Praefectus teria pronunciado a condenação de Jesus. Segundo a Bíblia, ele teria trazido Jesus para a Gábata, uma palavra aramaica que significa pavimento e que se comprovou que se tratava de um pátio calçado com pedras ao estilo romano. Foi antecedido no cargo por Grato e sucedido por Marcelo. O título do cargo que exerceu foi o de praefectus e está confirmado por uma inscrição que apareceu na Cesaréia
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e em moedas que foram cunhadas por sua ordem (29-31 d.C.). O título procurador que alguns antigos autores utilizam para referir-se ao seu cargo é um erro anacrônico. Os evangelhos referem-se a ele de forma genérica com o título de governador. Personagem por demais conhecida em todo o cristianismo, tanto entre protestantes, católicos romanos ou ortodoxos, seu nome está para sempre ligado à morte de Jesus Cristo e foi incluído no antigo Credo Romano, conhecido como Credo dos Apóstolos: ..., padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado .... Contudo, o mais grave dos casos sucedidos durante o seu mandato foi o violento massacre ocorrido no Monte Garazim no ano 35 d.C.. Um samaritano por acreditar haver chegado o tempo messiânico, convenceu o povo a tomar armas contra os romanos. Pilatos, ao ser alertado sobre o fato, ocupou o caminho que leva até este monte sagrado dos samaritanos e ordenou ao seu exército que apunhalasse os revoltosos. Muitos destes morreram e outros foram feitos prisioneiros. Após este episódio, os samaritanos mandaram uma delegação ao governador da Síria, Lúcio Vitélio, que destituiu Pilatos de seu cargo. Em seguida, mandou-o a Roma para dar contas de sua administração ao Imperador. Depois de 54 dias de viagem desembarcou na Itália. Entretanto, Tibério seu protetor, havia morrido poucos dias antes. Segundo uma tradição recolhida por Eusébio de Cesaréia, o cruel governador não gozava da simpatia do novo Imperador Calígula. Foi então exilado para a França e lá se suicidou.
Data exata da morte de Jesus Lucas nos fornece a única data concreta mencionada não só nos evangelhos (Lc 3, 1), mas em todo o Novo Testamento, o ano quinze do império de Tibério César. Não há de fato outra data que se possa reconhecer em toda a vida de Jesus ou no Novo Testamento exceto esta, e parece claro que ao fornecê-la, Lucas procura datar um fato importante. Todos os quatro evangelhos relatam o batismo de Jesus, mas apenas Lucas, o médico com vocação de historiador, nos dá um detalhe precioso e único em termos cronológicos: a data de seu batismo. Pode-se assim concluir que Jesus foi batizado no 15º ano de Tibério Cesar no poder, correspondente ao ano 28 d.C. de nosso calendário, data esta facilmente comprovável pela história secular. Tibério, segundo todas as fontes históricas acreditadas passou a reinar no ano 14 d.C., ano da morte de Augusto. Desta forma, o ano 14 d.C. é seu primeiro ano de governo e 28 d.C. é seu 15°, uma vez que 14 d.C. é contado como primeiro ano de seu governo.
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A data de Lucas (Lc 3, 1) é a única âncora cronológica em todo o Novo Testamento. Estejamos atentos a isto, pois não há nenhuma outra data identificável por um calendário no Novo Testamento senão esta. O único evento da vida de Jesus claramente mencionado por um calendário é o seu batismo. Partindo, desta forma, do ano 28 d.C. como data de seu batismo, e sabendo que seu ministério durou cerca de três anos, pois os evangelhos mencionam três diferentes Páscoas, podemos concluir que Jesus foi crucificado durante a festa da Páscoa em abril de 30 d.C. O apóstolo São Paulo converteu-se aproximadamente em 36 d.C. São Pedro sofreu o mártirio em Roma conjuntamente com São Paulo entre 60 e 70 d.C. São João, o apóstolo, morreu na Ásia pelo ano 100 d.C.
Jesus crucificado INRI o acrónimo de Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum, "Jesus Nazareno Rei dos Judeus". Segundo os evangelhos, foi o título que Pilatos ordenou que fosse fixado na cruz onde Jesus Cristo foi morto. Segundo o Evangelho de São João, Pilatos teria feito redigir o texto em latim, grego e hebraico.
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Lavando as mãos
Meu nome é Pôncio Pilatos. Sei que sou uma figura mundialmente conhecida, mas, queria lhes contar um pouco da minha vida. Conto com a preciosa atenção de todos, pois, o que aconteceu comigo, poderá acontecer com todos que aqui estão. Sou de origem Samita, nasci no ano ~5 a.C., filho de pais da classe média alta e quando jovem, me ingressei na cavalaria romana e decidi me envolver com a carreira política, tendo sido nomeado pelo imperador Tibério, como prefeito da Judéia, no ano 26 d.C. A Judéia era uma região pouco desejada pelos políticos de carreira, porque, o relacionamento com o povo judeu e em especial, com seus líderes religiosos, era muito problemático. Enfim, quando se está no começo de uma carreira, não dá para ficar escolhendo e então me mudei para Cesaréia, às margens do mar Mediterrâneo, juntamente com minha esposa. como prefeito, tinha pleno controle sobre a província. Possuía uma cavalaria com 120 homens e cinco batalhões de infantaria, num total de ~5.000 soldados. Em Jerusalém, na fortaleza de Antônia, implantei um destacamento militar. Disposto a não dar espaço para as autoridades Judaicas, assumi o controle do templo, administrando suas finanças e nomeando os sumos sacerdotes. Até as vestes sacerdotais, estavam sob meu controle. Além disso, minha primeira ação como governador, foi trazer imagens do imperador para Jerusalém, provocando a ira de todo o povo. O dinheiro arrecadado no templo era muito para a subsistência dos sacerdotes. Assim, resolvi desviar parte da verba para a construção de um grande aqueduto, trazendo água doce de uma fonte localizada à 40 km de Cesaréia. As ruínas deste aqueduto ainda estão por lá! Quando o povo e as autoridades reagiram contra tal projeto, eu, deliberadamente, instiguei a cavalaria a se lançar contra a multidão. Muitos morreram e outros ficaram gravemente feridos. Certa ocasião, o povo de Israel acreditou num falso profeta que dizia existir no monte Gerisim, em Samaria, vasos sagrados enterrados por Moisés, cujos poderes, capacitariam o povo a derrubar o imperador, assim como, derrubaram o faraó do Egito. Cerquei o monte Gerisim, desbaratei a multidão e executei os líderes do movimento. Eu era violento, bravo e gostava de despeitar os outros. Por ser personalista, egoísta e arrogante, não me dava bem com meus colegas governadores. Eu tinha uma raiva muito grande de Herodes e por isso, acabei matando vários de seus súditos. Isto me rendeu um processo e daí em diante, eu decidi dar um outro rumo à minha vida, sendo mais condescendente para com tudo e todos.
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Até mandei tirar as imagens do governador, que havia colocado em Jerusalém, pois, não queria mais problemas na minha carreira. Certa noite de quinta-feira, os sumos sacerdotes trouxeram à minha presença um jovem bem afeiçoado, forte, de olhar profundo e generoso, chamado Jesus. Ele havia nascido em Belém, crescera em Nazaré e estava sendo acusado de heresias e de tentar contra o imperador, pois, se denominava ou era chamado de: “O Rei dos Judeus”. Ora, o Rei dos Judeus só poderia ser o imperador e ninguém mais. Como o Sinédrio, organismo judeu que controlava a religião e os costumes judaicos, estava pedindo a pena máxima, isto é, a pena de morte, se fazia necessário a minha participação no julgamento, pois, só eu poderia decidir sobre se ele merecia morrer ou não. Resolvi interrogá-lo e para a minha surpresa, ele ficou calado diante de muitas perguntas que lhe fiz, mas, cheguei à conclusão de que ele não merecia ir para a cruz, que na época, era o instrumento de pena de morte. Chamei os sumos-sacerdotes e os comuniquei da minha decisão. Eles não gostaram! Preveniram-me de que, desde que o tal Jesus começara seu ministério, a renda do templo tinha caído muito e conseqüentemente, minha parte desta renda, também, tinha diminuído. A pressão desses poderosos líderes foi tão grande que eu decidi “lavar as mãos! ” Ah! Que vergonha! Se eu pudesse voltar atrás e enfrentá-los. Eu, o prefeito romano, a maior autoridade na província não suportei às pressões dos poderosos. Eu espero que você que me ouve nesta noite, seja diferente de mim. Não se deixe vencer! Não se deixe intimidar! Nunca abra mão da sua autoridade por nada neste mundo! Nem por bens, por dinheiro, por poder! Por nada! Mas, além de não suportar as pressões dos poderosos, eu cometi um outro grave erro. Como você se lembra, quando me mudei para Cesaréia, levei minha esposa comigo. Ela nunca se envolvia em questões políticas, ainda que, de vez em quando, eu lhe pedisse algum conselho. É preciso destacar que, todas as vezes que segui suas orientações, sempre fui bemsucedido. Curiosamente, naquela noite, em que estava interrogando Jesus, eis que a minha querida esposa foi até o tribunal e pediu para conversar comigo em separado. Percebi seu rosto tenso, preocupado e até angustiado. Na sala anexa ao tribunal, ela me relatou que tivera um sonho muito ruim, no qual ela muito sofrera por causa do tal Jesus, que estava sendo acusado pelos judeus e interrogado por mim. Pediu-me com todas as forças do seu coração, derramando muitas lágrimas: “não te envolvas com o sangue deste justo! ” Foi interessante, pois, eu não havia tido tempo de ir em casa e não conversara nada com ela sobre Jesus e tanto ela como eu, não estávamos vendo nada que pudesse condenar aquele
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belo jovem à morte. Para lhe tranqüilizar, eu prometi que levaria em conta o seu conselho e que ela poderia voltar para casa. Porém, ao voltar para o tribunal, esqueci-me completamente do seu conselho e me envolvi, cada vez mais, no interrogatório do jovem Galileu, cuja fama era de ter curado enfermos, alimentado multidões, expulsado demônios de muitas pessoas e que só fazia o bem. E ao me esquecer do seu conselho, preferi “lavar as mãos! ” Que tristeza! Eu não levei em conta o conselho da minha esposa e acabei envolvido e me envolvendo num dos maiores crimes da história: a crucificação de Jesus de Nazaré! Ah! Se eu pudesse voltar atrás! Ah! Se eu tivesse atendido ao conselho da minha querida esposa! Por isso, eu digo a você, hoje, com todas as forças que ainda me restam, não jogue fora os conselhos das pessoas que te amam! Não despreze a orientação dos mais velhos! Não menospreze os conselhos dos seus pais, irmãos e amigos! Estes conselhos, se bons e obedecidos, poderão salvar tua vida! Pois é! A minha história ainda não acabou! Houve um momento no julgamento de Jesus, em que eu pensei estar sendo muito esperto. Como a pressão das autoridades era grande, eu procurei uma saída: coloquei Jesus diante de todo o povo! Tudo isto estava acontecendo na festa da páscoa, a principal festa dos judeus e havia uma tradição de que, nesta festa, o imperador podia libertar um ou mais prisioneiros judeus. Olhando a lista dos prisioneiros, escolhi um dos mais perigosos, chamado Barrabás. Ele havia assaltado muitas casas, havia matado cinco pessoas e estuprado várias garotas. Pensei comigo: “ninguém vai querer Barrabás solto na rua de novo! ” Entre Jesus e Barrabás, com toda a certeza eles vão pedir que eu liberte Jesus! Qual foi a minha surpresa! Ao perguntar à multidão reunida em frente do palácio: “qual dos dois quereis que eu vos solte?!” Eles responderam: “Barrabás! Barrabás! Barrabás! ” Tentei mais uma saída: eles poderiam pedir que eu soltasse, também, a Jesus. Eles sabiam que eu tinha este poder, de não libertar apenas um preso, mas, quantos eu desejasse. Então perguntei: “o que farei de Jesus, chamado o cristo?!” A multidão, orientada pelos sacerdotes, respondeu: “Crucifica-o! Crucifica-o! Crucifica-o! ” Não convencido, ainda perguntei: “mas, que mal fez ele? ” Entretanto, a multidão não me ouviu, pois continou gritando: “Crucifica-o! Crucifica-o! ” Vendo que não conseguia me comunicar mais com o povo e não querendo desagradá-lo, “lavei as mãos! ”
Ah! Meus caros ouvintes! Quem dera eu não tivesse cedido às pressões populares. Para não estragar a festa deles, preferi me calar. Importava-me mais, não gerar nenhum tipo de conflito popular, pois, eu desejava crescer na vida política.
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Prestem atenção: mesmo quando toda a sociedade pender para um lado que seja errado e condenável, seja firme! Não faça como eu! Mantenha sua posição, seus princípios, sua dignidade acima de tudo. Especialmente a vocês jovens, eu digo: cuidado com certos convites, com determinados ambientes e pessoas. Pode parecer que não há nenhum perigo, mas, é assim mesmo, os caminhos de morte nunca se manifestam feios para nós! Só depois e às vezes já sem retorno, é que a gente descobre a armadilha em que caiu. Finalmente, pois, ninguém aqui é obrigado a ficar ouvindo minha história e minhas memórias, eu ainda fiz mais uma coisa errada: eu fiz calar a minha própria consciência! Eu era o prefeito! Tinha me preparado para ser autoridade romana com muito esmero! Sabia que, diante de tudo que tinha apurado e de todas as pressões que estava recebendo, que Jesus era inocente! Ao saber que ele era Galileu, portanto, vivia na província vizinha governada por Herodes, meu inimigo, resolvi enviar-lhe Jesus, afim de me livrar da situação. Herodes desejava muito conhecer Jesus e quis obrigá-lo a realizar um milagre, mas, Jesus o recusou! Diante disso, Herodes o tratou com desprezo, vestiu nele um manto e o trouxe de volta a mim. Uma coisa interessante foi que, naquele dia, por causa de Jesus, eu e Herodes reatamos nossa amizade, nos reconciliamos diante dos problemas do passado. Nem mesmo isso despertou a minha consciência! Aquele jovem simples, porém, de olhar penetrante, foi o instrumento para minha reconciliação e eu não fiz nada para retribuir-lhe. Novamente, estava eu na sacada do palácio, tendo uma grande multidão diante de mim. Já estava amanhecendo a sexta-feira! O assunto Jesus durou toda a noite de quinta. Eu estava exausto! Cansado! Mesmo assim, decidi o seguinte: já que nem eu nem Herodes achamos nada em Jesus que pudesse condená-lo, vou castigá-lo com algumas chibatadas e depois soltá-lo. Quando a multidão ouviu minha decisão, gritou ainda mais forte: “fora com Jesus! Queremos Barrabás! Por mais duas vezes, eu disse que libertaria Jesus e eles gritavam tanto que, mandei trazer uma bacia com água e desejando acabar logo com tudo aquilo, querendo ir embora para casa e não desejoso de me envolver mais com Jesus, fiz um gesto pelo qual passei para a história. mesmo quando a minha consciência me dizia que Jesus era inocente, eu preferi, “lavar as mãos! ”
Que lamento! Quem dera eu pudesse voltar no tempo e fazer aquilo que a minha consciência ordenava fazer. Porém, vencido pelo cansaço, pelas pressões e pela omissão, eu tentei abafar a minha consciência.
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Senhoras e senhores que me ouvem neste auditório: permitam-me lembrar-lhes que, colocar a cabeça no travesseiro e dormir em paz é uma das melhores coisas da vida. Porém, como é difícil conciliar o sono com a nossa consciência nos acusando! Portanto, no que depender de vocês, vivam em paz com vocês mesmos, com todos e acima de tudo, com Deus! Vocês sabem como está a minha vida hoje? Logo após a morte de Jesus, minha mulher me deixou e eu entrei numa profunda depressão. Sem motivação, doente e combalido, descuidei do meu trabalho e no reinado de Gaio, no ano 37 d.C., fui substituído no governo da Judéia. Acabei encostado num canto escuro pelo imperador, que nunca mais me recebeu em sua presença. Perdi tudo o que tinha, tentando curar minha depressão que em pouco tempo, se transformou em loucura. O pior de tudo é que, todas as vezes que vou lavar as mãos, eu me lembro de Jesus, do seu rosto, do seu olhar, das suas mãos e pés furados pelos pregos, do sangue correndo pela sua face, ferida por uma coroa de espinhos. E o que mais me desespera é que, quanto mais eu lavo as mãos, mais eu as vejo manchadas com o sangue daquele justo! Meu destino não será outro senão o suicídio! Uma vez mais, serei covarde comigo mesmo e com a vida. Meus sonhos não se concretizaram, porque um dia… “eu lavei as mãos! ”Senhoras e senhores, no que depender de vocês, nunca façam o que eu fiz! Nunca lavem as mãos. (Sermão dramatizado, pregado pelo Pr. Paulo Damião, vestido com roupas típicas da época de Pilatos, no domingo de páscoa – 23/04/2000)
Jesus Crucificado
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Sábado Santo “Era o dia da Preparação, e o sábado começava a despontar. As mulheres tinham vindo da Galiléia com Jesus. Observaram o túmulo e como o corpo de Jesus fora ali depositado, em seguida voltaram e prepararam aromas e perfumes. E, no sábado, observaram o prescrito. ” (Lc 23, 55-56) Dia de silêncio e de oração; tempo de contemplação e de espera da ressurreição do Senhor.
Domingo da Ressurreição
O anjo disse às mulheres: “Não tenham medo. Eu sei que vocês estão procurando Jesus, que foi crucificado. Ele, não está aqui. Porque já Ressuscitou como havia dito...” (Mt 28, 5-6) Na madrugada do primeiro dia da semana (domingo) algumas mulheres vão ao túmulo onde fora sepultado Jesus, e não vêem senão a pedra removida e o sepulcro vazio. Ficam perplexas. Podemos imaginar o alvoroço. Correm para contar aos apóstolos. Estes tem dificuldade para acreditar que Jesus ressuscitou. Várias aparições de Jesus às mulheres e aos apóstolos em momentos e circunstâncias diferentes. De fato, Jesus está vivo e aparece a seus amigos. Devolve a eles a alegria e o conforto da sua presença. Reforça-lhes a fé e a esperança. Conforma-lhes a certeza de que o caminho para Deus agora está livre, desimpedido. Jesus está vivo. É a vitória da luz sobre as trevas, da vida sobre a morte. Tudo agora tem sentido: o calvário, a cruz, as quedas. O calvário não poderá ser o fim. Foi sim, a passagem para a glória. A ressurreição de Jesus é importante por vários motivos. Primeiro, é um testemunho do imenso poder de Deus. Acreditar na ressurreição é acreditar em Deus. Se Deus realmente existe, e se Ele criou o universo e tem poder sobre o mesmo, então Ele tem poder de ressuscitar os mortos. Apenas aquele que criou a vida pode ressuscitá-la depois da morte; só Ele pode reverter o horror que a morte é, e só Ele pode remover o aguilhão que é a morte e a vitória que pertence ao túmulo. Ao ressuscitar Jesus dos mortos, Deus nos faz lembrar de Sua absoluta soberania sobre a morte e vida. Segundo, a ressurreição de Jesus é um testemunho da ressurreição de seres humanos, que é uma doutrina básica da fé Cristã. Ao contrário de outras religiões, o Cristianismo possui um fundador que transcende a morte e promete que os Seus seguidores farão o mesmo. Todas as outras (falsas) religiões foram fundadas por homens e profetas cujo fim foi o túmulo. Como Cristãos, podemos nos confortar com o fato de que Deus Se tornou homem, morreu pelos nossos pecados, foi morto e ressuscitou no terceiro dia. O túmulo não podia segurá-lO. Ele vive hoje e se senta à direita do Pai no Céu. A igreja viva tem um Cabeça vivo!
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Em 1 Coríntios 15, Paulo explica em detalhe a importância da ressurreição de Cristo. Alguns em Corinto não acreditavam na ressurreição dos mortos, e nesse capítulo Paulo lista seis
consequências desastrosas se a ressurreição nunca tivesse ocorrido: 1) Pregar sobre Cristo seria em vão (v.14); 2) Fé em Cristo seria em vão (v.14); 3) Todas as testemunhas e pregadores da ressurreição seriam mentirosos (v.15); 4) Ninguém poderia ser redimido do pecado (v.17); 5) Todos os Cristãos que dormiam teriam perecido (v.18); e 6) Os Cristãos seriam os mais infelizes de todos os homens (v.19). Mas Cristo realmente ressuscitou dos mortos e é “as primícias dos que dormem” (v.20), assegurando-nos de que vamos segui-lO na ressurreição. A inspirada Palavra de Deus garante a ressurreição do crente na vinda de Cristo para o Seu Corpo (a Igreja) durante o arrebatamento. Tal esperança e segurança são ilustradas em uma grande canção de triunfo que Paulo escreve em 1 Coríntios 15, 55: “Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão? ” Como é que esses versículos se relacionam com a importância da Ressurreição? Paulo responde: “o vosso trabalho não é vão” (v.58). Ele nos lembra que por sabermos que vamos ser ressuscitados a uma nova vida, podemos sofrer perseguição e perigo pela causa de Cristo (v.29-31), assim como Ele o fez, e assim como milhares de mártires por toda a história, que de bom grado trocaram suas vidas terrenas por vida eterna através da ressurreição. A Ressurreição é a vitória triunfante e gloriosa para todo o crente em Jesus Cristo, pois Ele morreu, foi enterrado e ressuscitou no terceiro dia de acordo com as Escrituras. E Ele voltará! Os mortos em Cristo vão ser ressuscitados, e aqueles que permanecem vivos na Sua vinda vão ser transformados e receber corpos novos e glorificados (1 Tessalonicenses 4, 13-18). Por que a ressurreição de Cristo é tão importante? Por ter demonstrado que Deus aceitou o sacrifício de Jesus a nosso favor. Ela prova que Deus tem o poder de nos ressuscitar dos mortos. Ela garante que aqueles que acreditam em Cristo não vão permanecer mortos, mas serão ressuscitados à vida eterna. Essa é a nossa abençoada esperança! A Ressurreição de Cristo é diferente das ressurreições que ele operou em algumas pessoas (filha de Jairo, jovem de Naim e Lázaro). É essencialmente diferente. Em seu corpo ressuscitado, ele passa de um estado de morte para uma outra vida, para além do tempo e do espaço. Na ressurreição, o corpo de Jesus é repleto de poder do Espírito Santo; participando da vida divina no estado da sua Glória, de modo que Paulo pode chamar a Cristo de - o homem celeste - (1 Cor 15, 35-50). A ressurreição é objeto de Fé enquanto intervenção transcendente do próprio Deus na criação da história. Nela, as três pessoas divinas agem ao mesmo tempo, juntas e manifestam sua originalidade própria. O mistério pascal, isto é, a morte e ressurreição de Cristo, é o fato fundamental do Cristianismo. Dele depende toda a nossa Fé (1 Cor 15, 1417), a Nova Páscoa é o começo da vida do novo povo de Deus. Para nós, cristãos, é o centro de tudo, porque se ele em verdade ressuscitou, então nós o seguiremos e “em Cristo, todos receberão a vida” (1Cor 15, 22). Jesus come com seus discípulos e demonstra que era ele mesmo (Lc 24, 41-43), (Jô 21, 12).
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A Ressurreição aconteceu pelo poder do Pai, que ressuscitou Jesus, seu filho, e desta forma introduziu de modo perfeito a sua humanidade – com o seu corpo – na Trindade. É a prova mais forte de sua divindade, é o argumento mais convincente de que a sua doutrina e a sua obra são divinas. Tudo o que Ele disse e o que Ele fez, pela Ressurreição dos mortos recebeu a sua afirmação final. E Jesus, pelo seu poder de Deus, sobe aos céus de corpo e alma (ascensão).
A Cruz de Jesus Cristo
Ascensão de Jesus
“Os onze discípulos foram para a Galiléia, ao monte que Jesus lhes tinha indicado. Logo que o viram prostraram-se; alguns, porém, duvidaram. Então Jesus se aproximou e lhes disse: "Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, pois, fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a observar tudo quanto vos mandei. Eis que eu estou convosco, todos os dias, até o fim do mundo."(Mt 28, 16) Durante os quarenta dias de permanência na terra, após sua ressurreição, Jesus aparece por diversas vezes aos seus discípulos. Depois, retorna ao Pai na Glória Celeste. Agora cabe aos seus seguidores, guiados pelo Espírito Santo, continuar a obra de Jesus. Como sempre, a mensagem deste evangelho é atual. Nós somos os discípulos! Cabe a cada um de nós a difícil tarefa de transformar todos os povos em discípulos seguidores de Jesus. Esse trabalho seria difícil e, até mesmo impossível, se estivéssemos sós, porém Jesus promete que nunca nos abandonar.
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"Eis que estarei com vocês todos os dias, até o fim do mundo". Estas palavras devem nos estimular, devem servir de alavanca para nos levar a assumir a evangelização. Assumir com garra nossa "herança" batismal, que é levar aos povos a Boa Nova da presença de Deus entre nós. Jesus continua presente entre nós, presente em nossos lares e na comunidade. é uma presença invisível, mas real, concreta. Jesus está presente na sua Palavra e na Eucaristia. Está presente em nossas vidas, no nosso trabalho, em nossos momentos de oração, nos momentos felizes e, principalmente, nas horas de angústia. Jesus é uma presença constante, está sempre ao lado de sua Igreja. Jesus está presente no nosso próximo. Presente, sobretudo naqueles que sofrem, nos pobres, nos humildes e nos menores. Quem quer de fato encontrar Jesus, deve procurá-lo entre os oprimidos, fracos e pequenos. "Ele está no meio de nós!" Com muita convicção recitamos estas palavras nas nossas celebrações. Essa certeza deve acompanhar-nos sempre. Jesus continua presente em nossa vida, na história e nos acontecimentos do dia-a-dia. Jesus está ao lado de quem o anuncia e observa suas Palavras. O Sacramento do Batismo nos incorpora a Cristo e à sua Igreja. O batismo nos confere a missão de propagar o evangelho e de testemunhar o amor do Pai que está manifestado em Jesus. É o Espírito Santo quem nos sustenta nessa missão, quem dá forças, esperança e alegria. Com muita fibra, com perseverança, vamos viver e ensinar tudo aquilo que Jesus nos deixou. O mundo precisa “A Ascensão é o último ato da nossa aprender a praticar a justiça e a caridade em favor libertação do peso do pecado”, disse o Papa, dos pobres e marginalizados. que acrescentou: “Por isso os discípulos,
Na Ascensão de Cristo ao Céu, o ser humano entra quando viram o Mestre levantar-se da terra numa nova intimidade com Deus, sem precedentes. e elevar-se para o alto, não foram tomados O homem encontra agora, e para sempre, espaço pelo desconforto, mas sentiram uma grande em Deus. O ‘Céu’ é algo muito mais ousado e alegria e sentiram-se encorajados a sublime: é o próprio Cristo, a Pessoa divina que proclamar a vitória de Cristo sobre a morte". acolhe, pela graça salvadora, plenamente e para Jesus carregará para sempre as marcas nos sempre a humanidade, Aquele no qual, somente pés e nas mãos que mostram o Seu pela Fé, Deus e o homem estão inseparavelmente sofrimento e morte para a Salvação do ser unidos para sempre. humano.
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Como era a pessoa de Jesus Cristo
Jesus, era um homem virtuoso, que o povo considerava um profeta, e seus discípulos, o Filho de Deus, criador do céu e da terra. Todos os dias se ouvia contar dele coisas maravilhosas. Numa palavra, Ele ressuscitava os mortos e curava os enfermos. Era um homem de estatura regular, em cuja fisionomia se reflete tal doçura e dignidade, que a gente se sente obrigado a amá-lo e temê-lo ao mesmo tempo. A sua cabeleira vem até as orelhas na cor das nozes maduras e, daí aos ombbros tingem-se de um louro claro e brilhante; dividi-se uma risca ao meio, à moda nazarena. A sua barba, da mesma cor da cabeleira, e encaracolada, não longa e também repartida ao meio. Os seus olhos severos têm o brilho de um raio de sol; ninguém o pode olhar em face. Quando ele acusa ou verbera, inspira o temor, mas até no rigor é afável e benévolo. Diz-se que nunca ninguém o viu rir, mas muitas vezes foi visto chorando. As suas mãos são belas como seus braços, toda gente acha sua fala agradável e sedutora. Não é visto amiúde em público e, quando aparece, apresenta-se modestissimamente vestido. O seu porte é muito distinto. É belo. Maria, Sua Mãe, aliás, é a mais bela das mulheres que já se viu nessa terra. Ele nunca estudou, mas conhece todas as ciências. Anda descalço e a cabeça descoberta. Muitos riem, quando ao longe o enxergam; desde que, porém, se encontram face a face com Ele, tremem e admiram-no. Dizem os hebreus que nunca viram um homem semelhante, nem doutrinas iguais às suas. Muitos crêem que Ele seja Deus. Diz-se ainda que Ele nunca desgostou ninguém, antes se esforça para fazer toda gente venturosa. Quem anda com Ele, encontra a paz, vive o amor ao próximo e passa ter esperança e fé.
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70 d.C. – 2ª destruição de Jerusalém e a 2ª destruição do Templo
Por mais de um século, o povo judeu vinha sofrendo a humilhação de estar sob a dominação romana. Ao entrar triunfante em Jerusalém, em 63 a.C., o general Pompeu teve o atrevimento de penetrar no Templo, iniciando um período de profanação que acentuou ainda mais a perda de independência da nação judaica. Entretanto, enquanto o Templo permanecesse de pé e houvesse um rei judeu no trono (Agripa), haveria a esperança de uma independência futura. Por isso, à medida que o século se aproximava do fim, a crescente expectativa messiânica combinava-se com as aspirações nacionalistas judaicas e os conflitos provocados pela ambição política de grupos rivais. Do ponto de vista de Roma, o judaísmo era uma autonomia insuportável, só tolerada para manter o nacionalismo judaico sob controle. Entretanto, se os ideais religiosos desencadeassem os sentimentos nacionalistas, Roma estaria pronta para intervir. Em 44 d.C., a morte do rei Agripa colocou todo o país sob a administração direta de Roma, acabando com a ilusão da independência judaica. A crescente opressão romana, o alinhamento das autoridades romanas ao lado dos gentios que habitavam a terra, e as repetidas violações da santidade do Templo criaram uma atmosfera propícia à revolta. Em abril do ano 66 de nossa era, quando o governador romano confiscou dezessete talentos do tesouro do Templo, os nacionalistas judeus se rebelaram. Eles se apoderaram do Templo, interromperam os sacrifícios diários em honra ao imperador romano e capturaram a fortaleza de Massada. A revolta A Grande Guerra, ou Primeira Revolta Judaica, foi um evento ímpar naquela região, porque os judeus foram o único povo no antigo Oriente próximo a lançar uma ofensiva em larga escala contra o Império Romano. Ímpar também foi o fato de que nenhum outro conflito da Antigüidade foi relatado com tantos detalhes por uma testemunha ocular. Essa testemunha foi um historiador judeu do primeiro século chamado Yosef Ben Mattityahu, mais conhecido como Flávio Josefo. Josefo era um ex-fariseu e comandante das forças nacionalistas judaicas na Galiléia. O historiador romano Dio Cássio também forneceu outro importante relato, baseado em documentos militares oficiais. Em resposta à insurreição judaica, concentrada principalmente em Jerusalém, Vespasiano, principal comandante romano, foi enviado para sufocar o levante com cerca de cinqüenta mil soldados. O ataque de Vespasiano começou no norte de Israel que, ao contrário de Jerusalém, ofereceu pouca resistência. Por exemplo, as famílias judias que ocupavam a Fortaleza Galiléia de Jotapata, defendida por Josefo, preferiram cometer suicídio a se renderem ao inimigo. Quanto a Josefo, ele passou para o lado dos romanos. Uma exceção foi a cidade de Gamla, nas Colinas de Golã, que, no outono do ano 67 d.C., tentou conter o avanço romano em direção a Jerusalém. Os romanos, porém, dizimaram a cidade, massacrando quatro mil judeus. Para que suas famílias não fossem vítimas da brutalidade de Roma, cerca de cinco mil judeus tiraram a própria vida, saltando para a morte do alto dos abismos que cercavam aquela área. A atitude heróica daquela cidade lhe rendeu o título de "Massada do Norte".
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O cerco de Jerusalém No verão do ano 70 de nossa era, a Décima Legião de Vespasiano chegou às portas de Jerusalém e sitiou a cidade. Por causa da afluência de refugiados vindos de outras cidades judaicas destruídas pelos romanos, além dos próprios habitantes da Judéia que fugiam das legiões, a população de Jerusalém tinha, no mínimo, triplicado. A reputação de Jerusalém como cidade grande e inexpugnável (ela era uma das maiores cidades do mundo antigo) fazia dela um desafio significativo para os já enfraquecidos soldados romanos. Entretanto, como centro da autoridade política e espiritual da revolta judaica, a cidade estava também destinada a ilustrar de forma exemplar o castigo aplicado por Roma a seus inimigos.
O Parque Arqueológico Ofel, adjacente ao monte do Templo, em Jerusalém. Pedras do antigo Templo cobrem a rua herodiana, no extremo sul da Muralha Ocidental, da Porta dos Mouros até o lado sudoeste do monte do Templo.
Na época do cerco romano, duas das mais combativas facções nacionalistas judaicas, os zelotes e os sicários, tinham assumido o controle do monte do Templo com a ajuda de mercenários idumeus (descendentes dos edomitas). Os idumeus tinham assassinado impiedosamente os saduceus e fariseus que constituíam as alas mais moderadas da sociedade e ocupavam as posições de governo. Desde o início, o objetivo dos combatentes era aniquilar as forças de ocupação romanas e expulsar os invasores da terra de Israel. Agora que a guerra havia chegado à Cidade Santa, era vencer ou morrer. Para evitar que a população judaica da cidade fugisse ao invés de lutar até a morte, os zelotes destruíram os depósitos de alimentos e proclamaram a inviolabilidade divina de Jerusalém. Como a única maneira de sair da cidade era num caixão, um dos líderes da seita dos fariseus, o rabino Yochanan ben Zakkai, escapou escondendo-se num deles e rendendo-se a Vespasiano. Ao ser levado à presença do general, o prisioneiro dirigiu-se a ele como imperador e disse que Deus só permitiria que Sua Cidade Santa fosse conquistada por um grande soberano. Segundo a tradição, naquele mesmo instante chegou um mensageiro vindo de Roma para comunicar que o imperador havia morrido e que Vespasiano tinha sido escolhido como seu sucessor. Impressionado com a profecia do rabino, o novo imperador permitiu-lhe proteger os rolos da Torá e os eruditos que se dedicavam ao seu estudo na cidade de Yavneh. Assim, embora o Templo tenha sido destruído, a Torá foi preservada; e, embora Jerusalém tenha sido arrasada, o judaísmo foi poupado.
O Golpe Final Vespasiano retornou a Roma para assumir seus deveres como imperador e entregou a seu filho Tito, comandante da Décima Legião, a tarefa de completar a tomada de Jerusalém. Apesar da fome que tomava conta da cidade, os judeus celebraram a última Páscoa em seu Templo e se prepararam para a ofensiva romana.
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O ataque começou dias depois, com um bombardeio de catapultas que durou dois meses, até que, finalmente, os romanos romperam o muro. Indo de casa em casa, os conquistadores incendiaram a cidade, massacrando todos os judeus que encontravam pela frente. Um testemunho arqueológico da ferocidade dos combates é a "Casa Queimada", localizada dentro do atual Bairro Judeu (da Cidade Antiga). Ali estão as ruínas de uma das casas destruídas pelos romanos em 70 d.C., com os restos de uma mulher que foi morta com uma lança na mão e tombou na soleira da porta. Embora enfraquecidos pela fome, os judeus defenderam o monte do Templo contra a invasão dos romanos por três semanas. Então, no nono dia do mês de agosto, os romanos atingiram o complexo do Segundo Templo. Como um sinal dos céus, o primeiro Templo havia sido destruído pelos babilônios nesse mesmo dia, 656 anos antes. Dio Cássio descreveu a resistência final dos judeus reunidos em torno do recinto sagrado: O povo estava posicionado embaixo, no pátio, os anciãos nos degraus, e os sacerdotes no Santuário propriamente dito. E, embora eles fossem apenas um punhado de pessoas lutando contra um exército muito Escultura de Vespasiano. superior, só foi possível derrotá-los depois que uma parte do Templo foi incendiada. Diante disso, eles buscaram a morte. Alguns se lançavam contra as espadas dos romanos, outros matavam seus companheiros, outros tiravam a própria vida e outros se jogavam no meio das chamas. Parecia a todos, e principalmente a eles mesmos, que, longe de ser uma derrota, o fato de perecerem junto com o Templo representava vitória, salvação e felicidade. Depois disso, os romanos saquearam o Templo e retiraram dele todos os objetos de valor. Mais tarde, esses tesouros foram exibidos em Roma, durante a parada da vitória, carregados por milhares de escravos judeus. A imagem desse dia permanece até hoje no Fórum Romano, gravada num dos altos-relevos do monumento conhecido como o Arco do Triunfo de Tito. Uma vez começado o incêndio do Templo, os romanos cortaram as árvores daquela área para fazer uma grande fogueira em torno da estrutura. A umidade acumulada nos blocos de pedra calcária do Templo se expandiu com a alta temperatura e explodiu as paredes, e todo o edifício sagrado ruiu num só dia.
A Questão do "Por quê?" Josefo comentou que a demolição do Templo contrariou as ordens específicas de Tito, que queria preservá-lo. Realmente, a política romana era controlar os templos dos povos conquistados e depois permitir que eles fossem novamente utilizados para o culto de seus deuses, como um ato de clemência em troca da completa submissão. Alguns eruditos acreditam que os soldados romanos, meio enlouquecidos pela duração da resistência judaica e pelo desejo de se apoderarem dos tesouros do Templo, incendiaram tudo deliberadamente.
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Algumas fontes judaicas afirmam que o fogo começou acidentalmente quando a tocha de um soldado atingiu as cortinas do santuário. Entretanto, quando minha turma na Universidade Hebraica de Jerusalém debateu essas opções, nenhuma delas nos pareceu satisfatória. Então procuramos nosso professor, Isaías Gafni, um judeu ortodoxo, e perguntamos qual era a sua opinião. Depois de uma pausa e de um sorriso, ele nos disse: "Talvez Jesus tivesse razão!" Quer sua resposta tenha sido apenas uma tática de retórica rabínica ou um lampejo inconsciente de inspiração, o fato é que ela acabou com a discussão. Para os rabinos, o motivo da destruição do Templo foi sinat chinam, "ódio sem sentido" entre os judeus. Segundo essa teoria, a violenta rivalidade entre as seitas judaicas explodiu numa espécie de guerra civil, dividindo o povo judeu, enfurecendo a Deus e expondo a nação ao juízo divino e à fúria dos romanos. Contudo, se levarmos em conta a suposição do professor Gafni, Jesus esclareceu qual foi a principal causa da destruição de Jerusalém: "Pois sobre ti virão dias em que os teus inimigos te cercarão de trincheiras e, por todos os lados, te apertarão o cerco; e te arrasarão e aos teus filhos dentro de ti; não deixarão em ti pedra sobre pedra, porque não reconheceste a oportunidade da tua visitação" (Lc 19, 43-44; cf. Mt 23, 37-38; At 3, 13-15). Embora outros fatores internos estivessem em ação, a rejeição de Jesus como o Messias prometido, por parte da nação judaica, foi o ato culminante que desencadeou o julgamento divino. Apesar desse juízo ter acabado com a instituição do Templo e forçado a reformulação do judaísmo, ele não pôs fim ao povo judeu nem às promessas pactuais e incondicionais de restauração nacional e bênçãos futuras através do Messias. Jesus incluiu essa esperança até mesmo em Seu discurso profético contra Jerusalém e o Templo: "Eis que a vossa casa vos ficará deserta. DeclaroParte da "Casa Queimada" descoberta em vos, pois, que, desde agora, já não me vereis, até escavações no Bairro Judeu em 1970. A casa foi que venhais a dizer: Bendito o que vem em nome completamente queimada na conflagração que do Senhor!" (Mt 23, 38-39). arrasou a Cidade Alta de Jerusalém deixando-a em cinzas no dia 30 de agosto do ano 70 d.C.
O apóstolo Paulo, baseando-se nas profecias de Isaías, ensinou que esse dia de arrependimento nacional dos judeus acontecerá na volta de Jesus a Jerusalém: "E, assim, todo o Israel será salvo, como está escrito: Virá de Sião o Libertador e ele apartará de Jacó as impiedades. Esta é a minha aliança com eles, quando eu tirar os seus pecados" (Rm 11, 26-27).
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A chamada ao arrependimento em relação a Jesus, reconhecendo-O como o Messias prometido, foi feita por muitos judeus piedosos antes da destruição do Templo e continua a ser feita atualmente. O apóstolo Pedro, que fez sua exortação ainda nos dias do Segundo Templo, nos recorda que a esperança da restauração de Israel está em seu arrependimento: "Arrependei-vos, pois, e convertei-vos para serem cancelados os vossos pecados, a fim de que, da presença do Senhor, venham tempos de refrigério, e que envie "E, assim, todo o Israel será salvo, como está ele o Cristo, que já vos foi designado, Jesus, ao escrito: Virá de Sião o Libertador e ele apartará qual é necessário que o céu receba até aos tempos de Jacó as impiedades. Esta é a minha aliança da restauração de todas as coisas" (At 3, 19-21). Sempre que um judeu responde a esse chamado, ele encontra sua libertação. Quando a nação judaica atender finalmente a essa exortação, o desastre da Grande Guerra será transformado na vitória da Grande Redenção.
com eles, quando eu tirar os seus pecados" (Rm 11, 26-27). Na foto: judeus junto ao Muro das Lamentações.
Jerusalém: Mesquita Al Aqsa
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2013 d.C. – O Terceiro Templo
O Terceiro Templo ainda não foi construído até os dias de hoje. O Monte do Templo, em alusão ao antigo templo construído pelos judeus e cristãos, e Nobre Santuário pelos muçulmanos, também conhecida como a Esplanada das Mesquitas, é um lugar sagrado para muçulmanos e judeus e é um dos locais mais disputados do mundo. É o lugar mais sagrado do judaísmo, já que no Monte Moriá se situa a história bíblica do sacrifício de Isaac (para os muçulmanos, lá teria ocorrido o sacrifício de Ismael). O lugar da pedra do sacrifício (a Sagrada Pedra de Abraão) foi eleito pelo rei David para construir um santuário que albergasse o objeto mais sagrado do judaísmo, a Arca da Aliança. As obras foram terminadas por Salomão no que se conhece como Primeiro Templo ou Templo de Salomão e cuja descrição só conhecemos através da
O Monte do Templo, em Jerusalém.
Bíblia, já que foi profanado e destruído por Nabucodonosor em 587 a.C., dando início ao exílio judaico na Babilónia. Uns anos depois foi reconstruído o Segundo Templo, que voltou a ser destruído em 70 d.C. pelos romanos, com a exceção do muro ocidental, conhecido como Muro das Lamentações, que ainda se conserva e que constitui o lugar de peregrinação mais importante para os judeus. Segundo a tradição judaica, é o sítio onde deverá construir-se o terceiro e último templo nos tempos do Messias. O local é o terceiro lugar mais sagrado do islamismo, referência a viagem até Jerusalém e a ascensão de Muhammad ao paraíso. O local é também associado a vários profetas judeus, sendo que os próprios muçulmanos consideram estes profetas judeus como muçulmanos. Lá localiza-se a Mesquita de Al-Aqsa e o Domo da Rocha, construídas ambas no século VII, uma das estruturas mais antigas do mundo muçulmano. Segundo a ortodoxia judaica, os judeus não devem penetrar no Monte do Templo porque o consideram um lugar sagrado profanado e porque poderiam, sem querer, violar o sancta sanctorum do desaparecido templo, isto é, a zona do mesmo cuja entrada só estava permitida, e ainda é assim, ao sumo sacerdote. O Califa Omar ordenou a construção de uma mesquita ao lado sudeste do local, em direção Em 691 uma mesquita octogonal com uma cúpula foi construída sobre as rochas, chefiada pelo califa Abd al-Malik, ficando o santuário conhecido como o Domo da Rocha. Sua cúpula em si foi coberta de ouro somente em 1920. Em 715, os omíadas liderados pelo califa al-Walid I, construíram um templo nas proximidades de Chanuyos, que deram o nome de al-Aqsa ou traduzido a mais distante mesquita.
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Após o local ter sido conquistado pelos cruzados, Saladino reconquistou Jerusalém e os templos em 2 de outubro de 1187, através do Cerco a Jerusalém. Antes da queda pelos cristãos, Saladino ofertou generosos termos de rendição os quais foram rejeitados. Após o cerco ter iniciado, ele ofereceu 25% do reino de Jerusalém ao povo cristão, que também foi rejeita-
Sinal à entrada da Esplanada das Mesquitas colocado pelo Grande Rabinato de Israel, proibindo o acesso aos judeus (1978).
do, porém após a morte de uma série de muçulmanos (estima-se 5.000), as forças cristãs lideradas por Balião de Ibelin iniciaram a destruição dos locais sagrados muçulmanos localizados na Esplanada das Mesquitas, o que gerou a revolta entre os muçulmanos. Após a captura de Jerusalém, Saladino convidou os judeus a voltarem a cidade, sendo que estes anteriormente foram expulsos pelos cristãos. Os judeus de Ashkelon, uma grande população judaica, aceitaram este convite e voltaram a viver em Jerusalém. Frequentemente o acesso aos templos é bloqueado por questões de segurança (o que algumas organizações vêem como violações aos direitos humanos), porém em determinadas ocasiões do ano o acesso de fiéis oriundos da Cisjordânia é liberado pelo exército israelense; durante o Ramadã de 2008, por exemplo, o então ministro da defesa do país, Ehud Barak, permitiu o acesso, durante as reuniões de sexta-feira, apenas de homens entre 45 e 50 casados, mulheres de 30 e 45 anos, além de homens com mais de 50 e mulheres com mais de 45 anos. Um comercial produzido pelo Ministério das Relações Exteriores de Israel foi proibido antes de ir ao ar, e gerou imensa polêmica no Estado judeu. O motivo seria a ideia de destruição da Mesquita de Al-Aqsa, o famoso Domo da Rocha, um dos locais mais sagrados do mundo para os muçulmanos. O vídeo apresentado por Danny Ayalon (vice-ministro das Relações Exteriores) tem cerca de cinco minutos e mostra diferentes atrações turísticas de Israel. Ao parar em frente à mesquita, enquanto um calendário mostra o tempo regredindo, ela some para dar lugar ao Templo de Salomão. O claro objetivo é mostrar que o judaísmo estava na região muito antes do Islã. O anúncio tem como objetivo promover o turismo em Jerusalém além de contar um pouco da história judaica da cidade, que Israel considera sua eterna capital, embora oficialmente o centro administrativo do país é Tel Aviv. Essa versão do vídeo já foi uma alteração do original, onde a mesquita era implodida digitalmente. O grande problema em se colocar um templo virtual sobre as ruínas da mesquita é uma disputa histórica pelo local entre judeus e muçulmanos. Os funcionários do Ministério do Exterior decidiram que a cena deveria ser apenas com a substituição, para não parecer que se sugeria um atentado contra o local sagrado e um descontentamento entre os muçulmanos.
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Mesmo assim o filme foi proibido e está disponível apenas no Youtube https://www.youtube.com/watch?v=3KxxOBRNhrQ . Assim que foi noticiado pela imprensa, acabou denunciado como uma tentativa do governo israelense de destruir a identidade árabeislâmica de Jerusalém. Especialistas temem que possa causar uma reação semelhando ao filme A Inocência dos Muçulmanos, com protestos de islâmicos descontentes. Ikrima Sabri, chefe do Conselho Supremo Islâmico em Jerusalém, disse em um comunicado que o anúncio é parte dos planos de ocupação [israelenses] de revelar suas intenções hostis em relação ao santuário. O fato de não ser um material feito por grupos extremistas judeus, e sim uma produção oficial do governo, causou preocupações sobre ser uma declaração política clara anti-islâmica.
O Terceiro Templo - digitalizado pelos judeus
O Domo da Rocha é um santuário reverenciado por muçulmanos do mundo todo, os quais acreditam que neste local o profeta Maomé ascendeu milagrosamente ao céu. Ele foi construído no local original do templo de Salomão, destruído durante o cerco de Jerusalém pelos romanos no ano 70 d.C. As profecias bíblicas afirmam que o Templo será reconstruído. A mera sugestão que o Domo da Rocha seja demolido já seria motivo suficiente para uma guerra de Israel com o mundo árabe. Em especial no momento em que se propôs a divisão de Jerusalém em duas, sendo que sua metade árabe seria capital do Estado Palestino. Essa ideia tem crescido por causa do apoio da ONU e do presidente Obama para que isso ocorra em breve. Abdul Salam Abadi, ministro jordaniano para as dotações islâmicas, afirmou que Israel quer repartir o Monte do Templo em Jerusalém. O ministro acusou publicamente Israel de querer dividir o recinto da praça do Monte do Templo, atualmente conspurcado pelo Domo da Rocha e mesquita de Al-Aqsa, para erigir ali o seu Terceiro Templo.
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Segundo a comunicação social jordana, o ministro para as dotações islâmicas partilhou com uma delegação de clérigos australianos de visita à Jordânia ter recebido instruções da liderança hashemita para salvaguardar a identidade árabe e muçulmana de Jerusalém. A Jordânia, que estendeu a sua soberania a Jerusalém oriental e à Margem Ocidental em 1950, continua a administrar os lugares sagrados islâmicos no Monte do Templo. Abadi referiu à delegação australiana que o seu ministério emprega 600 funcionários civis em Jerusalém e supervisiona 40 escolas em Jerusalém.
Segundo o diário jordano independente AlGhad, Abadi vincou a necessidade de apoiar os residentes de Jerusalém na sua perseverança face aos repetidos ataques israelitas à sagrada mesquita de Al-Aqsa e aos lugares sagrados islâmicos em Jerusalém. Israel assinou um acordo de paz com a Jordânia em 1994. Mesquita Al-Aqsa
O departamento jordano para as dotações islâmicas, conhecido como Waqf, que administra a praça que rodeia a mesquita de Al-Aqsa e o Domo da Rocha, proíbe os judeus de orarem no Monte do Templo, onde outrora se ergueram os 2 grandes Templos judaicos de Jerusalém. Em 1989, a revista Time publicou um artigo intitulado - Tempo para um Novo Templo? - Em que relatava o desejo crescente de muitos judeus devotos de verem um novo templo construído no Monte do Templo em Jerusalém. O correspondente começou escrevendo: - Que a Tua vontade seja a rápida reconstrução do Templo em nossos dias… - Esse pedido a Deus, recitado três vezes ao dia nas orações judaicas, expressa um desejo que faz do Monte do Templo em Jerusalém os 35 acres potencialmente mais instáveis do mundo. Nos anos que se seguiram a esse artigo, nada diminuiu o desejo de reconstruir o templo. Na verdade, a expectativa e os preparativos continuam a crescer. O apoio do público israelense para a reconstrução do templo, antes fraco, está aumentando gradativamente. A tensão no Oriente Médio continua alta e os problemas religiosos e políticos da região continuam nas manchetes em todo o mundo. Mas, mesmo nestes tempos turbulentos, os ativistas do Movimento do Templo continuam a intensificar seus esforços. Os esforços da política, da diplomacia, da religião e da cultura convergem todos para o Monte do Templo – provavelmente o terreno mais disputado da terra. Uma das tensões mais importantes entre judeus e muçulmanos é a de que uma mesquita muçulmana, o Domo da Rocha, foi construída no local do templo em Jerusalém. O ativismo em torno do templo tem provocado preocupação e conflito internacional e continua sendo um pavio curto que pode detonar a próxima guerra mundial. Não existem soluções fáceis ou simples nesse complexo drama internacional e há muita retórica.
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O líder dos Fiéis do Monte do Templo, Dr. Gershon Salomon, que é um dos defensores mais conhecidos e declarados de um templo reconstruído, afirma: Eu creio que essa é a vontade de Deus. Ele [o Domo da Rocha] deve ser retirado. Devemos, como sabem, removê-lo. E hoje temos todo o equipamento para fazer isso, pedra por pedra, cuidadosamente, embalando-o e enviando-o de volta para Meca, o lugar de onde veio.
O Domo da Rocha
Afirmações tais como essa estão carregadas de emoção e são defendidas com convicção. Qualquer atividade relativa ao Monte do Templo certamente criará o caos e trará reprovação de uma ou mais entidades religiosas ou políticas envolvidas. No entanto, o sonho de reconstruir o templo é realista e biblicamente correto; um dia ele se realizará. A Bíblia ensina explicitamente que a reconstrução se tornará realidade. Mas a alegria será passageira e a adoração será interrompida. Como veremos através de alguns tópicos da história e da Bíblia, o novo templo não será nem o primeiro nem o último a ser erguido. Sua construção é certa, mas os dias turbulentos que a acompanharão também. Muitos planos estão sendo feitos para a reconstrução do templo, e vários grupos diferentes em Israel estão se preparando para isso. Algumas das organizações e atividades incluem: Os Fiéis do Monte do Templo, liderados por Gershon Salomon, que usam medidas ativistas para tentar motivar seus compatriotas a reconstruírem o templo. Uma dessas medidas foi sua tentativa periódica de colocar uma pedra angular de 4 toneladas e meia no Monte do Templo. O ativista Gershon Salomon demonstra sua determinação quando diz: No dia certo – creio que em breve – essa pedra será colocada no Monte do Templo, trabalhada e polida… e será a primeira pedra para o terceiro templo. Agora mesmo essa pedra não está longe do Monte do Templo, bem perto das muralhas da Cidade Velha de Jerusalém, perto da Porta de Shechem… e dessa pedra se pode ver o Monte do Templo. Mas o dia está próximo em que essa pedra estará no lugar certo – pode ser hoje… ou amanhã, estamos bem pertos da hora certa.
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Outra ação que eles instituíram foi o sacrifício de animais. O Instituto do Templo, liderado por Israel Ariel, que já fez quase todos os 102 utensílios necessários para a adoração no templo conforme os padrões bíblicos e rabínicos. Eles estão em exposição para turistas no centro turístico do Instituto do Templo na Cidade Velha em Jerusalém. O Ateret Cohanim fundou uma yeshiva (escola religiosa) para a educação e o treinamento dos sacerdotes do templo. Sua tarefa é pesquisar regulamentos, reunir levitas qualificados e treiná-los para um sacerdócio futuro.
Candelabro do Templo Antigo
Muitas yeshivas surgiram em Jerusalém para fazer preparativos para a eventualidade de culto no templo reconstruído e funcional. Estão fazendo roupas, harpas, plantas arquitetônicas geradas em computador. Alguns rabinos estão decidindo quais inovações modernas podem ser adotadas num templo novo. Além disso, eles estão fazendo esforços para ter animais kosher (puros) para sacrifício, inclusive novilhas vermelhas. E algumas pessoas continuam a orar no Monte do Templo para ajudarem a preparar o caminho. Muitos outros preparativos estão em andamento para a volta de Israel a todos os aspectos da adoração no templo. O templo da Tribulação é importante porque é o templo que muitos judeus em Israel estão tentando reconstruir no presente. Saber o que a Bíblia ensina sobre os templos do passado, presente e futuro dá aos crentes a base necessária para ver o Terceiro Templo do ponto de vista de Deus. Apesar de que a esperança judaica para o próximo templo é que ele seja o templo messiânico, a Bíblia deixa claro que ele será, na verdade, o templo transitório do Anticristo. O fato de Israel ter sido restabelecido como nação em 1948, de Jerusalém ter sido reconquistada em 1967 e dos judeus estarem fazendo esforços cada vez mais significativos para a construção do Terceiro Templo, demonstra que estamos chegando perto do fim da atual era da Igreja e do início da Tribulação. O cenário divino para o fim dos tempos está tomando forma e o centro das atenções é a reconstrução do Terceiro Templo em Jerusalém. A mão de Deus está agindo. Caso o partido Likud, liderado pelo primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, vença as eleições no início do próximo ano, o mundo poderá ver surgir um Terceiro Templo de Salomão. Funcionários da Fundação Al Aqsa alertaram para essa possibilidade de que a atual mesquita seja demolida e seu terreno invadido pelo governo de Israel. A denúncia veio após as primárias para a eleição de 22 de janeiro de 2013 apontar para o favoritismo da ala ortodoxa judaica liderada por Moshe Feiglin para o Knesset (Parlamento de Israel).
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Atualmente, a mídia do mundo árabe continua denunciando o que chama de invasões dos judeus ao chamado Monte do Templo. Até hoje os muçulmanos proíbem os judeus de entrar no local para fazer orações ou carregar outros artigos sagrados. A Autoridade Palestina e o ramo islâmico do chamado Movimento da Galileia alegam que Israel está cavando secretamente por baixo do Monte do Templo para causar o seu colapso. A Fundação Al Aqsa, nome da mesquita que se encontra no local onde a Bíblia aponta que ficava oTemplo de Salomão original, teme que um novo governo de direita contamine o Monte do Templo. Segundo o jornal online Israel National News, membros da Fundação dizem que às vésperas da eleição o primeiro-ministro Netanyahu irá anunciar os planos de construção do Terceiro Templo, que eles chamam de falso. Para a maioria dos muçulmanos, nunca houve naquele local o Primeiro e Segundo Templo sagrado para os judeus. Eles agora fazem um apelo ao mundo muçulmano, alegando que a mesquita de Al-Aqsa está em perigo e os muçulmanos fiéis devem assumir a responsabilidade de salvá-la, invocando a tradição que considera o local sagrado para o Islã. Feiglin é conhecido por seu desejo de retomar o Monte do Templo, e depois da operação Coluna de Nuvem, de combate ao terrorismo, escreveu: - Devemos expulsar os muçulmanos do Monte do Templo e restaurar a soberania israelense exclusiva. O Monte é o local mais sagrado do judaísmo. Devemos encorajar os judeus a subir o Monte do Templo, após os preparativos adequados de purificação e retomar sua soberania sobre o coração da nação judaica. O deputado nacionalista Zevulun Orlev defendeu a aprovação de uma nova Lei Básica que garantiria o financiamento e a mão de obra necessária, para construção do Terceiro Templo. Ele publicou um artigo no semanário hebraico Olam Katan, com o título de Reforma Interna e Legislativa, defendendo que o Templo deve ser reconstruído em Jerusalém e que eram necessárias mudanças fundamentais na sociedade e no governo israelenses para que o projeto tenha sucesso. O deputado reconheceu que para remover o impedimento religioso e político de seu plano, ou seja, a presença da mesquita de Al-Aqsa e o Domo da Rocha no topo do chamado Monte do Templo, resultaria no enfrentamento dos cerca de um bilhão de muçulmanos do mundo certamente numa possível nova guerra mundial.
O Monte do Templo
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Um pouco de Geografia
A Palestina desde o ano de 63 a.C. que fazia parte do Império Romano com o nome oficial de «Judéia». Tem uma superfície de 26.000 Km² (pouco mais do que ¼ de Portugal). É atravessada de norte a sul pelo rio Jordão, que nasce em três fontes no sul do Líbano, faz o seu percurso abaixo do nível do mar e tem 320 km de comprimento (um pouco menor do que o rio Minho). Forma três grandes lagos: Hulé, Tiberíades (ou mar da Galileia, ou ainda Genesaré, com 45 metros de profundidade, e com 172 km²) e o Mar Morto (aonde as águas do Jordão vão parar (200 m³ por segundo) mas que nunca enche por causa da grande taxa de evaporação. Este mar encontra-se 392 m abaixo do nível do Mar Mediterrâneo e apresenta uma salinidade de 20% (seis vezes superior à do Mediterrâneo). Por outro lado, podemos dividi-la em duas partes: a Cisjordânia (W do Jordão) e Transjordânia (E do Jordão, atual Jordânia). É sobretudo na Cisjordânia que se desenrola todo o ministério de Jesus de Nazaré – esta ainda se pode dividir (N-S) em Galileia, Samaria, Judéia. A zona costeira é plana e o vale do Jordão encontra-se entre duas cadeias montanhosas de pequeno porte. Além de ser uma região fronteiriça do Império Romano, era pobre, por causa das condições edafo-climáticas e da má distribuição da riqueza. Apresentava, essencialmente, um clima subtropical, com duas estações – Inverno (setembro a abril) e Verão (maio a setembro) – e era povoada por, aproximadamente, 600.000 pessoas.
Palestina
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A Galileia era composta, na sua zona montanhosa, por cidades como Naim, Nazaré, Canã e Séforis. Na sua parte plana, à volta do lago de Tiberíades, era abundante em cereais, fruta, oliveiras, peixe e seus derivados; existiam cidades como Cafarnaum, Corozaim e Betsaida. A Samaria, zona central da Palestina, é fértil e de alto nível urbano. Os samaritanos admitem exclusivamente o Pentateuco e mais nenhum livro do Antigo Testamento, esperam a vinda do Messias que será um novo Moisés, e não reconhecem Jerusalém como centro religioso, tendo o seu templo no monte Garizim (perto de Siquém, o templo é destruído por volta do ano 100 a.C.). Em Cesaréia do Mar vivia o prefeito Romano. Outras cidades importantes: Siquém, Samaria e Betel. Cesaréia
A Judéia é a região mais a sul (meridional) da Palestina. Tem por cidade principal Jerusalém, cidade de importância sobretudo religiosa, principalmente, para todos os judeus. É o também em termos políticos, pois, foi aí que se instalou Herodes e o sinédrio (assembléia suprema dos judeus). Há ainda que acrescentar a sua importância econômica. Na parte montanhosa, junto ao Mar Morto, no deserto de Judá situava-se o principal centro essênio: Qumran. Outras cidades eram Arimatéia, Efraim, Emaús, Jericó, Betfagé, Betânia e Belém – cidade que ficava a 8 km de Jerusalém e a 148 km de Nazaré. As duas esferas da sociedade judaica: Do ponto de vista da organização social, reconheciam-se na Palestina duas esferas – uma política e outra religiosa. A esfera política era dominada por três entidades: 1) Herodes I – rei da “Judéia” entre 34 a.C. e 4 a.C. De origem Idumeia, é escolhido pelo senado romano para governar sobre toda a Palestina. Político extremamente hábil e cioso da sua soberania, que procurou manter a todo o custo – veja-se que chegou ao ponto de mandar matar vários dos seus filhos e a sua mulher. Apesar deste seu caráter assassino, durante o seu reinado, o seu reino viveu numa paz forçada e um período de relativa prosperidade. Fez muitíssimas obras públicas (para que fosse aceito e querido pelo povo): (I) reconstrução do templo; (II) reconstrução dos sepulcros dos patriarcas; (III) construção de aquedutos, teatros, fortalezas (Torre Antônia); (IV) construção de cidades (Cesaréia Marítima); (V) construção de estádios desportivos e fomento de jogos (Olimpíadas). Além disso, do ponto de vista econômico, conseguiu, com todas estas obras, criar postos de trabalho; controlar o banditismo a favor do comércio; em épocas de fome chegou a derreter a sua baixela de prata para alimentar os necessitados; e ainda, reduzir os impostos sobre as populações em diversas ocasiões. Antes da sua morte, procurou dividir o reino pelos seus filhos: Arquelau (Samaria e Judéia), Herodes Antipas (Galileia e Pereia) e Filipe (Itureia e Traconítide). Todavia, tal não foi tolerado por Roma que condescendeu que estes se tornassem governadores e não reis! Notese que Arquelau, por ser demasiado cruel, acabou por ser exilado na França e substituído por Prefeitos Romanos, cujo 5º foi Pôncio Pilatos.
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2) Pôncio Pilatos – Prefeito Romano entre os anos 26 a 37 d.C.. Tinha por função controlar a região, nomear ou destituir o sumo-sacerdote, cobrar os impostos (por meio de uma rede de agentes publicanos) e autorizar a pena de morte, principalmente por delitos políticos. Agripa descreve Gaio Pilatos como «inflexível de caráter, arbitrário e impiedoso» e acusa-o de «venalidade, desaforos, roubos, ultrajes, acumulação de execuções sem julgamento prévio, de crueldade selvagem e incessante», citando exemplos de todas estas acusações. Pilatos residia em Cesaréia Marítima. Por diversas vezes provocou os judeus: (I) trouxe descobertas, até Jerusalém, as insígnias das legiões romanas (as águias imperiais e a imagem do Imperador), algo que se tinha evitado até então uma vez que as imagens de homens e animais são contrárias à religião judaica; teve de recuar depois de terem ocorrido tumultos e mortes; (II) utilizou dinheiro do Templo (dinheiro sagrado) para a realização de obras hidráulicas: (III) fez matanças no Templo, primeiro de galileus e posteriormente de samaritanos; (IV) nas suas moedas estavam os símbolos de culto ao Imperador. 3) Sinédrio – «conselho». Órgão máximo do mundo judaico, com poder legislativo, judicial e executivo, apenas limitado pelo ocupante romano, e com poder sobre todos os judeus, incluindo os da diáspora. Pensa-se que no Império Romano, à época, existissem 7 milhões de judeus. O sinédrio era composto por 71 membros, de três classes: (I) anciãos (senadores e presbíteros, pertencentes à aristocracia, e homens de negócios), (II) sumo-sacerdotes (retirados e/ou membros das suas quatro famílias) e (III) letrados ou escribas (majoritariamente fariseus). O presidente do sinédrio era o sumo-sacerdote em exercício, que tinha por função governar o país sob as orientações de Roma. Em termos de poder judicial, existiram épocas em que não podiam aplicar a pena de morte sem autorização do prefeito romano; nos restantes casos, aplicavam sentenças para cada delito contra a lei, fixavam a doutrina e controlavam toda a vida religiosa. A esfera religiosa era dominada: 1) Templo – único em todo o mundo judaico, apesar dos vários ataques e das diversas campanhas de reconstrução. O essencial do culto consistia no sacrifício e queima de animais, aos quais se retirava previamente a pele. Por detrás do altar encontrava-se o Santuário (um cubo com 50 metros de lado), composto por dois compartimentos, separados por um véu: o Santo e o Santo dos Santos. O primeiro continha no seu interior um altar com incenso, uma mesa com os pães da proposição e um candelabro com sete braços; o segundo encontrava-se vazio, pois, era o lugar da presença do SENHOR, no qual o Sumo-Sacerdote só entrava uma vez por ano, por altura da grande festa do «Yom Kippur» - a festa do perdão. O culto era realizado pelos sacerdotes, sob a direção do sumo-sacerdote, que, além de ter um papel político, tinha também um papel religioso importante, na medida em que era considerado o intermediário entre Deus e o povo e seu representante perante Deus. Sacrificavam-se diariamente no templo, como culto oficial, 4 animais, além de todos aqueles que tinham origem privada, independentemente de ser dia de festa ou não. Os sacerdotes do Templo eram aproximadamente 7.200, divididos em 24 seções; faziam turnos de 2 semanas por ano e também nas três grandes festas. Obedeciam a um conjunto muito estrito de normas higiênicosanitárias para não provocar epidemias. Além disso, eram coadjuvados por cerca de 10.000
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levitas – sacerdotes, normalmente pobres, e que não acediam ao sacerdócio por vocação, como acontece nos nossos dias, mas por herança. 2) Festas judaicas – Festas de índole religiosa que sofreram grandes alterações desde a sua origem. Havia a «Festa do Ano Novo», em setembro, que era a festa de YHWH-Rei. Dez dias depois, tínhamos a festa do «Yom Kippur». Cinco dias depois, a «festa das tendas» (vindimas) – onde os judeus recordavam o tempo vivido em tendas no deserto. Na primeira lua de Primavera, havia a festa da Páscoa (festa principal) – nela se recordava a saída do Egito, comiase o cordeiro e pão ázimo, sendo que, por ocasião da Páscoa acorriam cerca de 180.000 judeus e estrangeiros à cidade de Jerusalém. Por fim, 50 dias depois da festa da Páscoa, tínhamos a «festa do Pentecostes», em que se recordava a aliança do Monte Sinai, a aliança entre Deus e o seu povo. Cada uma das festas principais durava uma semana, além dos dias de viagem até Jerusalém. 3) Sinagoga – Edifício onde se reunia o povo judeu, de base retangular e com as suas três naves orientadas para Jerusalém. Possuía um armário onde eram guardados rolos da Lei; servia também por vezes de escola. Podiam existir diversas sinagogas na mesma cidade. Os ritos religiosos de Sábado consistiam em duas partes distintas: (I) a «Shemá» (escuta), profissão de fé ou credo judaico, leitura do decálogo e das 18 bênçãos, a que os assistentes respondiam com um «ámen»; (II) Leitura dum excerto da Torah (Pentateuco) e outro dos profetas (estando escritos em Hebraico, eram traduzidos, linha-a-linha, para Aramaico). Todos os presentes podiam comentar as leituras. Só os homens maiores de 12 anos podiam ler e deviam assistir pelo menos 10 homens livres. Qualquer um podia pregar. A pirâmide social: A pirâmide social era composta por diversas classes: 1) Saduceus – grupo social do qual faziam parte a aristocracia sacerdotal e os grandes proprietários. Era uma classe rica, influente, conservadora e colaboracionista com o poder instalado no momento. Conservadores quanto ao funcionamento do Templo e quanto aos seus ritos e cerimônias solenes e faustosas. Admitiam a Torah, mas rejeitavam a ressurreição dos mortos. Consideravam que Deus premiava imediatamente os bons (eles são ricos, portanto, Deus diz que eles são bons); eram materialistas, liberais nalguns aspectos e inimigos dos fariseus, bem como de todos os demais grupos sociais. Eram adeptos de culturas estrangeiras e controlados por Roma (que escolhia o sumo-sacerdote) e tiveram de aceitar muitas coisas que não eram do seu agrado. A sua autoridade moral foi substituída, aos olhos do povo, pela dos fariseus. 2) Fariseus – Grupo social intermédio (artesãos e escribas). Eram considerados pelo povo os guardiães da fé e os seus guias espirituais. Em termos religiosos, eram estritamente fiéis à lei e às tradições dos antepassados, transmitidas por via oral. Acreditavam na ressurreição dos mortos, nos anjos e na recompensa divina pelo cumprimento escrupuloso da lei. Consideravam que até Deus estava submetido à Lei: se os fariseus tinham de cumprir a sua parte, Deus também tinha de cumprir a d’Ele. Os doutores da Lei tinham o poder de determinar o que era permitido e o que era proibido. Note-se que este zelo pela lei, leva-os a ser intolerantes e, por vezes, desumanos, embora respeitassem a vida do homem (a dispensa do sábado em caso de perigo de morte, ao contrário dos essênios). Esperavam o Messias e a vinda do Reino dos Céus. Consideravam-se o «resto de Israel», isto é, os verdadeiros israelitas. Não cortaram com o Templo e dominavam as sinagogas. A princípio, protegeram os cristãos judeus por serem bons cumpridores da Lei. Não eram colaboracionistas
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e estavam contra tudo o que não respeitasse a lei judaica; não eram tão extremistas como os zelotes. 3) Essênios – grupo social aparentado com os fariseus e com os quais romperam. Por isso formam uma comunidade no deserto (Qumran), que se dedica à meditação, à oração, à ascese e à espera do Messias. Antes de ingressarem na comunidade (aos 20 anos), com um juramento solene, deviam passar por dois anos de prova. A maior parte dos seus membros tinha uma esperança média de vida de 30-40 anos. 4) Zelotas – grupo social composto por pessoas geralmente pobres e que ingressavam em grupos causadores de distúrbios contra Roma. Apesar de terem havido revoltas organizadas por eles, tal não constituía a sua práxis. Podiam ser desencadeadas revoltas com diversos motivos e/ou objetivos: 1) por causa do não cumprimento da lei; 2) como castigo aplicado por causa de casamentos entre judeus e não-judeus e 3) como castigo aplicado a não-judeus que profanassem o Templo. 5) Marginalizados sociais Muitos eram os marginalizados da sociedade judaica, no tempo de Jesus. Alguns desses grupos: (I) “os «am-ha-ares» ou «povo do país» eram a classe social inferior, a plebe, basicamente composta por habitantes do campo, muitas vezes descendentes de estrangeiros, que apenas conheciam a lei fundamental, mas nem sequer isso cumpriam. Eram desprezados sobretudo pelos fariseus, que lhes chamavam «gentalha» ou «povo maldito». Não se devia ter pena deles, nem lhes comprar fruta nem os receber em casa, porque nem sequer ressuscitariam. ”; (II) “os escravos estrangeiros (árabes) também só se integravam como mãode-obra. ”; (III) “os publicanos eram (…) [os] que cobravam, por arrendamento aos romanos, os tributos sobre as mercadorias importadas, tendo empregados a seu cargo para isso. Como o dinheiro cobrado tinha de ultrapassar o tributo para que tivessem lucro, cometiam muitos abusos e o povo, em geral, odiava-os e considerava-os ladrões.”; (IV) “Determinados doentes, sobretudo da pele (tidos como leprosos) e de afecções mentais (tidos como possessos), viamse afastados de toda a vida social e até religiosa enquanto padecessem dessas enfermidades.”; (V) “Bastardos, eunucos, hermafroditas também ficavam à margem.”; (VI) “Os deficientes (coxos, cegos, paralíticos, etc.), freqüentemente convertidos em mendigos, eram outro tipo de marginalizados.”; (VII) “Os gentios (os que não eram judeus) e os pecadores públicos (prostitutas, adúlteras, etc.) eram discriminados por motivos religioso-morais.”; (VIII) “os samaritanos formavam um caso à parte: eram «os imbecis que viviam em Siquém». Chamar «samaritano» a alguém era o pior dos insultos”.
A vida social e econômica: A economia da Palestina centrava-se sobretudo em duas atividades: a agricultura e o turismo religioso rumo a Jerusalém. A agricultura limitava-se aos cereais, às oliveiras, às figueiras, aos sicómoros e à vinha. Era uma economia pobre em matérias-primas, exportando apenas azeite, azeitonas e vinho; todo o restante era importado, com os correspondentes encargos. Existia igualmente alguma pecuária, nomeadamente em terras impróprias para o cultivo (bovinos, ovinos, caprinos, burros e algumas aves – pombas e galinhas), e pesca (no Lago de Tiberíades, “Mar da Galileia”), sendo que se consumia mais peixe salgado e fumado do que propriamente carne.
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Outros agentes econômicos a destacar são os artesãos (alfaiates, sapateiros, carpinteiros pedreiros, fabricantes de tendas, ferreiros oleiros, ourives, etc.) e os comerciantes (oriundos das caravanas, cameleiros, estalajadeiros, tendeiros, cambistas; todos suspeitos de vigarice pelos restantes membros da população). Além do mais, existiam também os jornaleiros, os latifundiários (proprietários de terras na Galileia, residentes em Jerusalém, e com administradores locais). Havia ainda os escribas (teólogos de carreira), os escravos israelitas (pessoas respeitadas que tinham trabalho fixo durante 6 anos) e os escravos não-israelitas (que ao contrário dos anteriores, eram-no para sempre e regiam-se por outro estatuto). Quanto ao turismo religioso rumo a Jerusalém, este era estruturante para Israel. E assim era, na medida em que, todos os judeus deviam ir, pelo menos uma vez na vida, ao Templo, em Jerusalém. De cada vez que se ia a Jerusalém, e apesar de terem alojamento gratuito, todos os judeus deviam gastar uma determinada quantia em dinheiro (segundo dízimo, um dízimo do produto agrícola), além dos gastos com os tributos religiosos a pagar no Templo, com a compra de vítimas para os sacrifícios, com o câmbio das moedas e com as «recordações». Note-se que, três semanas antes da Páscoa, já se montava o mercado às portas do Templo e que as obras deste último ocupavam vários milhares de pessoas, nem todas residentes em Jerusalém. Em diversas épocas o desemprego, bem como a emigração, foram muito elevados (recordemo-nos que apenas o primogênito herdava…, prática que se manteve em todo o Mediterrâneo até praticamente aos nossos dias…). Com desempregados, doentes e mendigos, as ruas de Jerusalém ficavam bastante congestionadas. De referir que na sociedade judaica daquele tempo existiam duas “práticas” importantes: o ano sabático – que decorria de 7 em 7 anos, altura em que não se semeava a terra, os escravos israelitas eram libertos e as dívidas caducavam; e o ano jubilar – que acontecia de 50 em 50 anos, altura em que as terras eram redistribuídas e em que cada israelita voltava a ter o que a sua família talvez tivesse vendido anteriormente. Mas parece que esta “lei” nunca chegou a ser aplicada. No que se refere à vida diária e à estrutura base da sociedade – a família – esta era profundamente patriarcal, onde o pai/marido era o mestre e senhor de todos os seus membros; a mulher era respeitada desde que tivesse filhos; caso contrário era desprezada, não sendo sujeito de direito, tendo por isso que ser defendida por algum membro masculino da sua família (pai, marido, irmão). A mulher devia lavar os pés ao marido, prática proibida até aos escravos. A mulher não era saudada na rua e, apenas no dia do casamento, ia de rosto descoberto. Estava em estado de impureza legal (higiênico-religiosa) durante a menstruação e 40 ou 80 dias após o parto, conforme tivesse dado à luz um menino ou uma menina. As viúvas ficavam completamente desamparadas, não serviam de testemunhas e eram discriminadas religiosamente: “Seria melhor queimar a Lei do que ensinar às mulheres”. “Sejas louvado porque não me fizeste mulher, pois estas não estão obrigadas aos mandamentos, mas só às proibições”. As filhas eram pouco mais do que bens que se vendiam aos pretendentes, que as compravam como se fossem escravos. Eram dadas em casamento antes dos 12 anos e meio, idade a partir da qual seria necessário o seu consentimento. Os filhos varões eram instruídos pelos pais nos costumes e na religião israelita. Os homens casavam-se, normalmente, entre os 18 e os 24 anos. Era muito freqüente o casamento com sobrinhas e a poligamia prática era muito comum. O homem podia repudiar a mulher, segundo alguns, se esta lhe queimasse a comida ou se encontrasse outra mais bonita do que ela. Outros eram mais severos nas causas. Dada a natureza do contrato matrimonial (pai-marido), este não equivalia ao que hoje se considera divórcio (que se deduz de um acordo entre marido e mulher). O judeu devia rezar
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três vezes ao dia a oração das 18 bênçãos, virado para Jerusalém, de pé, com as mãos levantadas e com a vista baixa. O sábado era o dia de repouso respeitado pelos judeus de todo o mundo, sendo dia de repouso inclusive para os animais.
Maquete do Templo - Jerusalém
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Nazaré É a cidade na qual viveram Maria e José e também onde residiu Jesus até sua revelação como o Messias, depois dos trinta anos. A cidade está parcialmente isolada nas montanhas, na metade do caminho entre o Mediterrâneo e o mar da Galiléia. Porém, ficava perto da freqüentada estrada entre o Egito e a Mesopotâmia. Ali, sem dúvida, Jesus viu passar caravanas de muitas nacionalidades. A Igreja da Anunciação, que tradicionalmente assinala o lugar onde morava a Virgem Maria, foi edificada sobre os alicerces de uma igreja erguida pelos cruzados no século XII. Debaixo da nave, há uma capela, na qual se encontra a inscrição latina “Aqui o Verbo se fez carne” (Jo 1:14). Ainda são realizadas escavações debaixo da igreja. O lugar mais autêntico de Nazaré com relação à sagrada família é o poço da Virgem, o único local onde existe água. A verdadeira fonte de água é um manancial nas ladeiras, quase 1,5 km fora da cidade, do qual um conduto leva a água a esse poço coberto. Maria provavelmente vinha a esse poço com o tradicional cântaro de água sobre a cabeça, e o menino Jesus talvez a acompanhasse algumas vezes.
Cafarnaum Estava situada na costa noroeste do mar da Galiléia, em um lugar chamado Tell Hum. Foi o principal centro comercial e social da região na época do ministério de Jesus. Na grande estrada entre a Síria e a Palestina, eram recolhidos os impostos alfandegários, e uma guarnição romana achava-se estacionada ali. Jesus veio a esse lugar após sair de Nazaré e chegou a morar na casa de Pedro. Nesse lugar, convocou Mateus e aí ensinou, pregou e realizou muitos milagres. Cristo profetizou a queda de Cafarnaum, e atualmente montes de pedras de basalto negro provenientes das edificações estendem-se por 1,5 km ao longo da costa do mar. Por todos os lados, na superfície, aparecem linhas tênues de edificações. Muitos crêem que seja essa a sinagoga edificada pelo centurião, a qual Jesus visitou em Cafarnaum, porém a maioria dos arqueólogos acredita que ela foi erguida no século II ou III d.C., no suposto lugar da sinagoga da época de Cristo. Eles baseiam suas conclusões na arquitetura e especialmente na ornamentação.
Betsaida Era o povoado natal de Filipe, André e Pedro. Estava localizado na planície de Batia, a noroeste do local em que o rio Jordão desemboca no mar da Galiléia. A planície estende-se por 3 km ao longo das margens do Jordão e por 1,5 km na direção leste, até as montanhas. Et-Tell é um pequeno monte na larga margem norte da planície geralmente identificada como Betsaida. Alguns, porém, acreditam que as ruínas chamadas el-Araj, na costa do mar, diretamente a leste de onde o rio desemboca, seja a localização mais provável de Betsaida, “o povoado de pescadores”. Alguns pensam que a “Betsaida da Galiléia” (Jo 12:21) era outra cidade e que
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existiam dois lugares chamados Betsaida, um dos qual situado a oeste do Jordão, nas proximidades de Cafarnaum. Mas as referências bíblicas, em termos gerais, parecem indicar que havia somente uma cidade chamada Betsaida, e com isso concordam as tradições mais antigas. Talvez escavações futuras esclareçam a dúvida, mas a incerteza quanto à localização exata da cidade não atinge as narrativas dos evangelhos.
Betânia Era a cidade em que viviam Marta, Maria e Lázaro. Seu nome atual é el-Azariyeh (“o lugar de Lázaro”). Está situada a 3 km leste de Jerusalém, na ladeira oriental do monte das Oliveiras. As ruínas mais antigas constam de uma tumba em forma de cova, que alguns afirmam ser o sepulcro de Lázaro. Há também ruínas de duas edificações, as quais alguns guias afirmam aos turistas (sem qualquer base histórica) serem as ruínas da casa de Simão, o leproso, e a casa de Marta, Maria e Lázaro. A suposta “tumba de Lázaro” é uma caverna à qual se chega por meio de uns 25 degraus. É pouco provável que tenha relação com a sepultura de Lázaro, ainda que seja apontada como tal desde o ano 300 d.C. As ruínas em forma de torres gêmeas conhecidas como a casa de Simão, o leproso, onde Jesus foi ungido com um perfume caríssimo (Mc 14:3-9), são de origem medieval. É também improvável que as ruínas sem teto apontadas como o lugar em que Marta “o recebeu em sua casa” (Lc 10:38) seja a mesma casa que Jesus e seus discípulos visitavam com freqüência em Betânia. Todavia, essas três ruínas comemoram incidentes sagrados na vida de nosso Senhor.
Jerusalém Jerusalém, al-Quds al-Sharif (a nobre cidade santa), tem uma longa e rica história acentuada por seu significado religioso, simbólico e estratégico. Ela permanece como testemunha da vida e das culturas dos numerosos povos que ali reinaram. A longa historia, sua importância central e o imaginário espiritual da cidade deram origem a uma vasta literatura sobre o passado de Jerusalém. E graça à emoção que a cidade suscita, poucos autores foram capazes de resistir a colorir seus trabalhos com análises seletivas visando a mostrar que grupos de pessoas tem mais direito sobre a cidade. o resultado é que agora se pode achar diversas fontes de apoio a qualquer argumento, e que há pouco consenso acerca de longos períodos da história da cidade. Na verdade, há, provavelmente, poucos assuntos que tenham gerado tanta pesquisa e análise mutuamente contraditórias. Portanto, uma revisão geral da história de Jerusalém não deveria se deter sobre detalhes, mas ao contrário, tentaria detectar as linhas gerais que se combinam para formar o legado de Jerusalém. A diversidade e santidade da cidade, bem como seu potencial como um centro de convergência de diversas civilizações e intelectuais, são a grandeza de Jerusalém. É este legado que nós, que lidamos com Jerusalém presentemente, devemos lutar para proteger.
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A terra, o seu povo e a sua história. Há mais de 5000 anos, depois de um período de seca que assolou a Península Arábica, os cananeus, tribos dos árabes semitas, vieram se estabelecer nos territórios a leste do Mar Mediterrâneo que formam, hoje, a Síria, o Líbano, a Jordânia e a Palestina. Os Jebusitas, um subgrupo cananeu, fundaram Jebus – Jerusalém – no lugar onde ela está localizada hoje e edificaram o primeiro muro ao seu redor, dotado de 30 torres e sete portões. Aproximadamente 2000 anos mais tarde, os filisteus, vindos de Creta, chegaram na terra de Canaã. Misturaram-se com as tribos cananéias e viveram na área sudoeste da moderna Palestina, sobre a costa do Mar Mediterrâneo na área que agora se estende na Faixa de Gaza até Ashdod e Ashkelon. Os cananeus deram aos territórios que eles habitaram o nome bíblico de "A Terra de Canaã", enquanto os filisteus deram-lhe o nome de Filistina ou 'Palestina'. Os cananeus descobriram que estavam numa localização estratégica e cercada por poderosos impérios originários do Egito a sudoeste, através do Mar Mediterrâneo a oeste, e Mesapotâmia e Ásia a nordeste. Mais de um milênio antes do nascimento de Cristo, egípcios, assírios, babilônicos, persas, mongóis, gregos e romanos cresceram ao redor da terra dos cananeus e filisteus e a governaram por variados períodos de tempo. A posição geográfica da área significava que ela servia tanto como uma ponte entre os vários impérios regionais, como uma arena para lutas e conflitos entre eles. Em conseqüência, os cananeus nunca puderam estabelecer um estado forte e unificado, e suas organizações políticas tomaram a forma de cidades independentes dotadas de governos ligados por relações federativas. Entre as cidades costeiras mais proeminentes dos filisteus, cananeus e fenícios que habitaram a área da atual Palestina estavam Beirute (Bairtuyus), Sidon, Tiro, Acre, Ashkelon e Gaza. As cidades cananéias do interior incluíam Jericó, Nablus (Shikim) e Jerusalém (Jebus). A religião dessas primeiras civilizações da Palestina era centrada na natureza: o céu era o Deus Pai e a terra era a Mãe Terra. Esses povos semitas de Canaã formaram a base do tronco do qual descendem os palestinos de hoje. Em termos de geografia, demografia, sociedade, economia e vida cultural, Jerusalém tem sido o centro da Palestina e o grande ponto de encontro de importantes corredores leste-oeste, norte-sul. De fato, desde os tempos das civilizações mais primitivas da Palestina, Jerusalém tem sido a parte mais importante e inseparável da Palestina. Assim, quem quer que controle Jerusalém fica numa posição de dominação sobre a Palestina. Nela localiza-se a raiz da turbulenta e conflituosa história da cidade de Jerusalém. Por volta do século XVIII a.C., Abraão veio de Ur, no sul da Mesopotâmia, para a terra de Canaã. Ele se estabeleceu nas cercanias do Vale do Jordão. Visto que nem o velho e nem o Novo Testamento não haviam sido revelados durante sua vida, Abraão não era nem judeu nem cristão, mas um crente na unicidade de Deus. Ele é descrito no Gênese como tendo adorado "o mais alto Deus". O Corão menciona que ele era um 'muçulmano', não na acepção moderna de alguém que segue as leis reveladas no Corão, mas sim no sentido de Ter entregue "sua submissão à vontade de Deus". Assim, cristãos, muçulmanos e judeus ainda rogam por ele em todas as suas preces, como acreditam que Deus lhes exortou a fazerem. Agar, a concubina de Abraão, lhe gerou seu filho Ismael, de quem os atuais muçulmanos traçam sua descendência; entrementes, sua mulher Sara gerou-lhe o filho Isaac, do qual os atuais judeus traçam sua linhagem. Abraão se mudou para um lugar perto de Hebron (al-Khalil), onde viveu pregando o
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monoteísmo. Quando morreu, Ismael e Isaac sepultaram-no na mesma cova onde sua mulher Sara foi sepultada. Seu filho Isaac gerou Jacó (Israel), que viveu na região de Harran (Aram). Por volta de 1300 a.C., os doze filhos de Jacó (Israel) partiram para o Egito. Eles se integraram aos egípcios e José, o mais jovem dos filhos de Jacó, casou com a filha do sumo sacerdote. Originalmente um pequeno grupo de pessoas, eles se multiplicara, e ganharam força durante várias centenas de anos no Egito, tornando-se os israelitas. Foi no Egito que Moisés, 'o fundador do judaísmo e o mais eminente legislador e também profeta para as três religiões reveladas, nasceu e estudou filosofia egípcia, tornando-se letrado em todas as ciências dos egípcios. Moisés, juntamente com seu povo (B'nei Israel) deixaram o Egito por volta do século XIII a.C.. vagaram durante 40 anos no Sinai, e durante esse tempo ele recebeu a lei divina judaica no monte Sinai (Tur). Após a morte de Moisés, Josué assumiu a liderança dos israelitas e os conduziu para o oeste pelo rio Jordão até Canaã. A primeira cidade cananéia que Josué conquistou foi Jericó, destruindo-a juntamente com seus habitantes. Depois, ele assumiu o controle de Yashuu'(Bayt Ele), Likhish, e Hebron, embora os filisteus tenham bloqueado o avanço do povo de Moisés rumo à costa, na área entre Gaza e Jafa, enquanto os cananeus impediram-nos de conquistar Jerusalém. Quando chegaram a Canaã, foram influenciados pelos cananeus e imitaram seus ritos religiosos, especialmente na apresentação de ofertas sacrificiais ao Deus Baal. Nos 150 anos seguintes, os israelitas, filisteus e cananeus controlaram, alternadamente, porções da área da moderna Palestina, com os cananeus (jabusitas) controlando Jerusalém. Ma nenhum grupo foi capaz de consolidar o controle sobre toda a área. Houve numerosas lutas entre grupos, sendo que cada um mantinha sua própria cultura e sua própria independência. Por volta de 1000 a.C., o rei dos israelitas, Davi, pôde subjugar os pequenos estados de Edom, Moab e Amon. Durante sete anos ele fez de Hebron sua capital, mas, depois transferiu o centro do poder para Jerusalém pelos últimos 35 anos de seu reinado. Depois dele, o poder passou para o seu filho Salomão, que é famosos por ter erguido o lugar de adoração conhecido como o Templo de Salomão. Para os judeus, esse templo tornou-se o centro da vida religiosa e o símbolo básico de sua unidade. Tornou-se ainda um ponto de peregrinação emocional para o povo judeu. Com a morte de Salomão, seu reino foi dividido em dois: o Reino de Israel, ao norte, composto por dez tribos, com Samaria (Sabastia) como sua capital, e o Reino da Judéia, ao sul, composto por duas tribos, com Jerusalém como sua capital. Lutas crônicas entre os dois estados e batalhas colocando-os contra os cananeus e os filisteus, caracterizaram esse período da história do Oriente Próximo. Por volta de 720 a.C. os assírios, sob o rei Sargão, destruíram o reino israelita ao norte. Em 600 a.C. os babilônios, sob o comando de Nabucodonozor, conquistaram o reino israelita sudeste, destruindo o templo de Salomão em aproximadamente 586 a.C.. Em ambos os casos, a maioria da população foi levada para a Assíria e a Babilônia, na Mesopotâmia, como escrava. Quanto a Jerusalém, tornou-se colônia babilônica. Por volta de 838 a.C., Ciro, rei dos persas, foi capaz de conquistar o império babilônico (Mesopotâmia), prosseguiu em suas conquistas até que ocupou a Síria e depois a Palestina, incluindo Jerusalém, permitiu que os escravos de Nabucodonozor retornassem à Palestina, e o Segundo Templo foi concluído em 515 a.C..
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Quando o império grego floresceu (eles ainda governaram Jerusalém durante sete anos) a Palestina caiu sob o domínio do Egito (322-200 a.C.) e depois por um certo período sob o governo dos selêucidas da Síria de 200 a 142 a.C.. Nesse ano, o rei Antióquio IV, que tinha danificado o Templo de Salomão forçou os judeus a renunciarem ao judaísmo e a abraçarem o paganismo grego. Por volta de 63 a.C., depois que os romanos subjugaram os seldúcidas na Síria, o general romano Pompeu assumiu o controle sobre Jerusalém. Com a ajuda dos romanos, Herodes se tornou rei da Judéia no ano 40 a.C. seu reinado durou até sua morte no ano 4 a.C.. Durante esse tempo, o Templo de Salomão foi reconstruído em Jerusalém e houve a perseguição, em seguida, o processo de crucificação de Jesus Cristo, depois do que, sobreveio a propagação da fé cristã. Na era de Tito, cerca de 70 d.C., os romanos infligiram aos judeus uma derrota devastadora. Tomaram Jerusalém e queimaram o templo judeu de uma vez por todas. Sob Adriano, várias décadas depois, os remanescentes finais da população judaica foram subjugados e expulsos da Palestina. Os romanos ergueram uma nova cidade sobre as ruínas de Jerusalém, a qual eles dominaram de Aelia Capitolina, com referência ao imperador Aelius Adrianus. Cerca de 395 d.C., Jerusalém tornou-se uma cidade bizantina e cristã. Mas embora a Palestina e seus habitantes se tornassem uma parte do império bizantino política e religiosamente, a vida e a cultura dos cananeus locais permaneceram voltadas para Jerusalém. Após um breve período de controle pela Pérsia, no começo do século VII d.C. a Palestina e o resto da Síria saíram do julgo dos romanos e caíram na esfera do império árabe-islâmico. Jerusalém tornou-se a primeira direção das preces dos muçulmanos (qibla) - 'o primeiro dos dois qiblas'- e a Palestina 'os recintos que Deus abençoou'. Em 638 d.C., o segundo califa, Omar ibn al-Khattab, chegou a Jerusalém. É importante notar que pelo, aproximadamente, 1300 anos desde a chegada da civilização árabe-muçulmana à Palestina, até o século em curso, Jerusalém permaneceu árabe, do ponto de vista da língua, da cultura e da demografia. Omar acreditava que Alá ordenara respeito à santidade a cidade de Jerusalém e o respeito por Ahl al-Kitab (O povo do livro). De acordo com o islã, a liberdade de culto a Ahl al-Kitab em Jerusalém é uma dádiva de Deus e, por isso, não pode ser subtraída por mãos humanas. Assim, Omar não tomou a cidade pela força, mas pelo contrário, instituiu a Convenção de Omar, um acordo que determinava o controle muçulmano sobre a cidade mas reconhecia o direito inalienável à liberdade de expressão para judeus e cristãos em Jerusalém. Omar confiou as duas famílias árabes muçulmanas em Jerusalém as chaves da Igreja do Santo Sepulcro. Ele agiu assim a fim de mandar uma mensagem aos muçulmanos de que a igreja era um templo sagrado que não deveria ser danificado, desrespeitado ou violado de nenhum modo, e como uma resolução para rixas entre várias seitas cristãs sobre quem deveria controlar a igreja. Das famílias árabes residentes na cidade, algumas se converteram ao islã imediatamente, enquanto outras mantém até hoje sua fé cristã. Entre essas famílias árabes cristãs e muçulmanas da velha Jerusalém estão os Khalidis, os Alamis, os Nuseibehs, os Judahs, os Nassars e os Haddads. A lei muçulmana vigorou em Jerusalém e na Palestina desde o século VII d.C. até o começo do século XX, excetuando o período das Cruzadas. Os cruzados capturaram a cidade em 1099 d.C., viram-na libertada pelos aiúbidas sob Saladino em 1187 d.C., e depois recapturaram-na em 1229 d.C.. Cerca de 15 anos mais tarde, os muçulmanos outra vez ali restabeleceram seu governo, e a cidade não saiu mais do seu controle até a ocupação britânica na I Guerra Mundial, em 1917.
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As dinastias islâmicas - ao omíadas, abássidas, os fatimidas os seldúcidas, os aiúbidas, os mamelucos, os otomanos e os hashimitas - respeitaram o "status quo ante" instituído na Convenção de Omar ibn al-Khattab. Todos eles participaram da reconstrução de Jerusalém, preservando a santidade de sua herança e desenvolvendo seu legado islâmico e árabe. Essas dinastias se esforçaram para reconstruir as mesquitas da Abóbada da Rocha e de al-Aqsa, referenciadas no primeiro verso da Sura 17 do Qur'na. Finalmente, os governantes árabes estavam ansiosos para dar a Jerusalém um status especial; o primeiro califa omíada, Muaawiyah uniu sua identidade pessoal com Jerusalém, denominando-se o califa de Bait alMaqdis. O califa Abd al-Malik ergueu, em 691, a magnífica abóbada (Qubbat al-Sakhra) sobre a rocha santa de onde Maomé ascendeu para falar com Alá e onde Abraão quase sacrificou Ismael. Também ergueu a Mesquita de al-Aqsa na parte sudeste da área de al-Haram, al-Sharif, para substituir a construção em madeira da velha mesquita. Estas duas última mesquitas foram restauradas e embelezadas pelos governantes árabes subsequentes, mais recentemente pelo rei Fahd, da Arábia Saudita, e o rei Hussein, da Jordânia.
Jerusalém
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A Bíblia em geral
Foi no seio do povo hebreu que nasceu a Bíblia. A Bíbia é a coleção dos livros (considerados pela Igreja como escritos sob a orientação do Espírito Santo) que contém a Palavra de Deus. A Bíblia é uma mensagem que Deus dirigiu e continua a dirigir aos homens. O termo grego de onde provém a palavra Bíblia significava originariamente: os livros. A Bíblia completa contém 73 escritos. Os títulos desses livros lembram por vezes o nome dos seus autores, outras vezes o nome dos seus destinatários, ou ainda os assuntos que neles são tratados. É-nos desconhecido o nome de muitos desses autores; Alguns escritos são produto de uma colaboração, ou constituem uma coleção de textos antigos compilados posteriormente. Os autores bíblicos viveram em lugares e em ambientes muitos diversos: cada um deles imprimiu na sua obra traços muito característicos de sua personalidade. Mas como todos eles escreveram sob a inspiração do Espírito Santo, é Deus mesmo quem deve ser tido como autor primário de toda a Bíblia.
Manuscritos da Bíblia
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Divide-se a Bíblia em duas grandes partes, chamadas respectivamente Antigo e Novo Testamento. O termo testamento substitui atualmente um antigo termo grego que significa pacto ou aliança. Com efeito, em toda a Bíblia trata-se da aliança feita por Deus com os homens, primeiramente por intermédio de Moisés e em seguida pelo ministério de Jesus Cristo. É sumamente útil lembrar como foi feita cada uma dessa coleções. A coleção dos livros do Antigo Testamento originou-se no seio da comunidade dos judeus que a foram ajuntando no decorrer de sua história. Dividiram-na em três partes: 1) A Lei (Torá), contendo cinco livros (chamados mais tarde de o Pentateuco, que significa os cincos volumes), forma o núcleo fundamental da Bíblia. Esses cinco livros são: Gênese, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. 2) Os Profetas, os judeus abragiam sob esse título não somente os livros que hoje são denominados Profetas, mas também a maioria dos escritos que hoje costumamos chamar de Livros Históricos. 3) Os Escritos, os judeus designavam por esse nome os seguintes livros: Salmos, Provérbios, Jó, Cântico dos Cânticos, Rute, Lamentações, Eclesiastes, Ester, Daniel, Esdras e Neemias e as Crônicas. É esta divisão que se refere o divino Mestre quando mais de uma vez (Mt 22,40) falou da “Lei e os Profetas”. Essa coleção já estava terminada em 200 a.C.. No tempo da Reforma, os protestantes, depois de hesitarem por algum tempo, decidiram não mais admitir os seguintes livros: Tobias e Judite, alguns suplementos dos livros de Daniel e Ester, os livros da Sabedoria e do Eclesiástico, Baruc e a Carta de Jeremias, que se lê hoje no último capítulo de Baruc. A Igreja Cristã admitiu-os como inspirados da mesma forma que os outros livros. Quanto ao Novo Testamento, não há diferença alguma. A Bíblia católica divide os 46 livros do Antigo Testamento do seguinte modo: 1) O Pentateuco (isto é, a Lei) 2) Os Livros Históricos: Josué, Juízes, Rute, os dois Livros de Samuel, os dois Livros dos Reis, os dois Livros das Crônicas ou Paralipômenos, os Livros de Esdras e Neemias, os três Livros de Tobias, Judite e Ester, e por fim os dois Livros dos Macabeus. 3) Os Livros Sapienciais: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, Livro da Sabedoria e Eclesiástico. 4) Os Livros Proféticos, designados pelo nome dos Profetas: Isaías, Jeremias (ao qual se acrescentaram Lamentações e Baruc), Ezequiel, Daniel, Oséias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias.
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A coleção dos Livros do Novo Testamento começou a formar-se em 75 d.C.. Seus 27 livros são assim distribuídos: 1) Cinco livros Históricos: quatro Evangelhos segundo S. Mateus, S. Marcos, S. Lucas e S. João, e Atos dos Apóstolos. 2) Vinte e uma cartas dos Apóstolos: São Paulo escreveu 14 cartas: 1 aos Romanos, 2 aos Coríntios, 1 aos Gálatas, 1 aos Efésios, 1 aos Filipenses, 1 aos Colossenses, 2 aos Tessalonicenses, 2 a Timóteo, 1 a Tito, 1 a Filêmon e 1 aos Hebreus. As outras cartas são as seguintes: 1 de São Tiago, 2 de São Pedro, 3 de São João e 1 de São Judas. 3) Um Livro Profético: o Apocalipse de São João. As duas coleções que formam a Bíblia foram sendo traduzidas do grego para o latim desde 200 d.C.. Mas a tradução latina mais divulgada é a que fez S. Jerônimo à base dos textos originais hebraico e grego no fim de 400 d.C., denominada “Vulgata”.
1 – O Pentateuco Chama-se Pentateuco a coleção de cinco livros que formam o cerne da Bíblia. Os antigos judeus deram-lhe o nome de Torá (que significa a Instrução, a Lei). Antiguissima tradição considera Móises como autor do Pentateuco. Os cinco livros do Pentateuco são: A) Gênese – Livro das origens. B) Êxodo – Cujo assunto principal é a saída do Egito. C) Levítico – Coleção de prescrições rituais relativas ao culto público e privado. D) Números – Narração da permanência dos hebreus no deserto. E) Deuteronômio – Coleção de discursos e de exortações à fidelidade para com Deus pela observância dos seus mandamentos.
1A – Gênese O livro Gênese, ou livro das origens contém tradições da mais remota antiguidade. Não se trata de um verdadeiro livro de história, nem um manual de história natural com a finalidade de expor as origens do mundo e da humanidade. Seu autor teve em vista apresentar um ensinamento religioso que determina as relações entre o homem e seu criador.
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Divide-se em duas partes: As origens propriamente ditas (cap. 1 a 11), e em seguida a história dos três grandes patriarcas do povo de Deus. Deus é o criador do mundo e é distinto do universo. O mundo é bom. A finalidade da criação é a paz de Deus, figurada no repouso do sétimo dia. O homem foi criado da terra, mas animado com um sopro de vida. Destina-se ele a viver na amizade com Deus, que lhe concedeu o dom da liberdade. O homem seduzido pelo poder da mentira, expõe-se a desobedecer a Deus, na vã esperança de tornar-se igual a ele. Dessa forma o pecado entrou no mundo. O homem foi excluído das delícias do paraíso. Foi-lhe, contudo, permitido alimentar a esperança de uma libertação, através da redenção de Jesus Cristo. Depois da primeira queda, o homem, entregue a si mesmo, é dominado pelo pecado. O primeiro crime é causado pela inveja. O mal generaliza-se numa corrupção que parece irremediável. Sobrevém o dilúvio. Depois do dilúvio entra em vigor a primeira aliança entre Deus e os homens. A humanidade salva das águas deve demonstrar fidelidade a Deus pela observância dos mandamentos divinos (Gên 9,1-7). A narração da torre de Babel e a confusão das línguas é a divina resposta à negligência humana em observar as cláusulas da aliança. O homem quase volta ao caos primitivo. A segunda parte do Gênese (cap. 12 a 50) ensina, pela história dos patriarcas, como Deus colocou em Abraão os primeiros alicerces da verdadeira Aliança, não mais com a humanidade inteira, mas com um povo eleito, do qual Abraão seria o pai. Essa aliança será proclamada por Moisés 500 anos mais tarde. Aproximadamente no ano 2000 a.C., Abraão, pagão de origem, guiado por Deus, deixa a sua terra natal e vem estabelecer-se na Palestina. Aí ele recebe as promessas divinas; será o pai de um povo numeroso e abençoado, A Aliança consistirá na fidelidade que o povo saído de Abraão deverá guardar para com Deus. Como sinal dessa aliança, foi instituído o rito da circuncisão para sempre. Abraão é chamado a testemunhar sua fé numa prova de excepcional importância: o sacrifício do filho único, no qual repousava a promessa divina. Isaac e Jacó aparecem em seguida. É principalmente neste último que se fixa a livre escolha de Deus. Jacó, homem cheio de defeitos, é, entretanto, o elo que levará às gerações futuras a bênção divina. Ele recebe um novo nome – Israel – e torna-se um homem novo. Entre seus filhos, José, apesar de suas vicissitudes, torna-se o titular da eleição e da bênção divina, que se realiza fora da lógica dos planos humanos. Esta parte do Gênese propõe, portanto, um ensinamento relativo à missão do povo eleito. Este deve voltar ao seu Deus pela esperança de uma libertação futura, consoante a promessa divina, e pela fidelidade aos seus mandamentos.
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1B – Êxodo A libertação do povo de Deus da servidão do Egito constitui o assunto do Êxodo (Êxodo significa saída). Os hebreus, estabelecidos no delta do Nilo, depois da morte de José, tiveram de suportar o julgo dos egípicios. Em toda a Bíblia, o Egito tornar-se-á o simbolo do adversário-tipo do povo eleito, o poder terreno que procura contrariar os planos divinos. Deus chama Moisés para uma grandiosa missão e revela-se a ele primeiro na sarça ardente. Moisés torna-se o chefe do povo oprimido e combate, sob a guia divina, os poderes do mundo. A passagem do anjo, que extermina os filhos dos egípcios, testemunha que o povo eleito, libertado, terá que viver, daí em diante, no temor de Deus e reconhecido ao seu grande benfeitor. Depois de ter libertado seu povo, Deus o conduziu através das águas e através do deserto. No monte Sinai, ele quis intervir solenemente e proclamar a Aliança com seu povo: “Se obedecerdes à minha voz e guardardes a minha aliança, sereis, entre todos os povos, o meu povo todo particular... sereis uma nação consagrada” (Êx 19,5-6). Um grande sacrifício estabeleceu a solene conclusão dessa aliança. Entretanto, o pacto, apenas concluído, foi violado. O povo cede à antiga tentação de materializar o seu Deus para torná-lo visível, construindo um ídolo, como símbolo de sua força e de sua fecundidade. Esse modo de manifestar ao ídolo o seu culto parece-lhe mais fácil do que adorar em espírito um Deus invisível. Deus irrita-se e castiga o seu povo, mas por fim mostra-se magnânimo. A Aliança é renovada: a fidelidade dos hebreus, tanto às prescrições cultuais como aos mandamentos do Decálogo, (Os Dez Mandamentos), deverá servir, para o futuro, de testemunho de seu reconhecimento para com os benefícios divinos. O sinal visível do pacto entre Deus e o seu povo serão as tábuas da lei, guardadas na arca da Aliança. Essa arca tem o valor simbólico do trono de Deus: ela testemunha que Deus habita no meio do seu povo, como penhor da fidelidade de suas promessas. Os Dez Mandamentos ou o Decálogo é o nome dado ao conjunto de leis que segundo a Bíblia, teriam sido originalmente escritos por Deus em tábuas de pedra e entregues ao profeta Moisés (as Tábuas da Lei). As tábuas de pedra originais foram quebradas, de modo que, segundo Êxodo 34, 1, Deus teve de escrever outras. Encontramos primeiramente os Dez Mandamentos em Êxodo 20, 2-17. É repetido novamente em Deuteronômio 5, 6-21, usando palavras similares.
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Decálogo significa dez palavras (Êx 34, 28). Estas palavras resumem a Lei, dada por Deus ao povo de Israel, no contexto da Aliança, por meio de Moisés. Este, ao apresentar os mandamentos do amor a Deus (os quatro primeiros) e ao próximo (os outros seis), traça, para o povo eleito e para cada um em particular, o caminho duma vida liberta da escravidão do pecado. De acordo com o livro bíblico de Êxodo, Moisés conduziu os israelitas que haviam sido escravizados no Egito, atravessando o Mar Vermelho dirigindo-se ao Monte Horeb, na Península do Sinai. No sopé do Monte Sinai, Moisés ao receber as duas "Tábuas da Lei" contendo os Dez Mandamentos de Deus, estabeleceu solenemente um Pacto (ou Aliança) entre Deus e povo de Israel.
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Os Dez Mandamentos
São as leis que Deus nos deixou para sabermos se estamos seguindo a Sua vontade e desta forma O estamos obedecendo. Os Dez Mandamentos são normas para conduta humana. São prescrições morais resumidos em dez itens. Os mandamentos são força libertadora, ao invés de ser coisa que aprisiona. Na medida em que você tem um indicador para seguir, você evita cometer erros que o afastam do plano de Deus. O que Deus manda, torna-o possível pela Sua graça:
1º) Amar a Deus sobre todas as coisas. 2º) Não tomar seu Santo Nome em vão. 3º) Guardar domingo e festas. 4º) Honrar pai e mãe. 5º) Não matar. 6º) Não pecar contra a castidade. 7º) Não furtar. 8º) Não levantar falso testemunho. 9º) Não desejar a mulher do próximo. 10º) Não cobiçar as coisas alheias.
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1º - Amar a Deus sobre todas as coisas (Êx 20, 2-5) "Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças" (Dt 6,5). O primeiro mandamento convida o homem a crer em Deus, a esperar nele e a amá-lo acima de tudo. O homem deve poder professar livremente a religião, tanto em particular como em público. A superstição é um desvio do culto que rendemos ao verdadeiro Deus. Ela se mostra particularmente na idolatria, assim como nas diferentes formas de adivinhação e de magia. A ação de tentar a Deus, em palavras ou em atos, o sacrilégio, a simonia são pecados de irreligião proibidos pelo primeiro mandamento. Enquanto rejeita ou recusa a existência de Deus, o ateísmo é um pecado contra o primeiro mandamento. Este mandamento se encontra na Bíblia assim: "Não terás outros deuses além de mim! Não farás para ti imagem, com semelhança alguma... não te inclinarás diante desses deuses e não os servirás..." (Ex 20,3-6). No Egito, na "casa da escravidão", a religião dos deuses era usada para reforçar o sistema e o poder do faraó. Ele fazia grandes estátuas e templos para impressionar o povo e mandava que o povo dobrasse os joelhos diante dele próprio, como se fosse um deus. Este mandamento, portanto, quer combater essa situação, convidando o homem a crer em Deus, a esperar Nele e a amá-lo acima de tudo. O culto às imagens sagradas está fundamentado no mistério da encarnação do Verbo de Deus. Além disso, o uso de imagens de santos se iguala ao uso dado às fotografias de nossos entes queridos. Não contraria o primeiro mandamento.
2º - Não tomar seu Santo Nome em vão (Êx 20, 7) "Senhor nosso Deus, quão poderoso é teu nome em toda a terra" (Sl 8.11). O segundo mandamento prescreve respeitar o nome do Senhor. O nome do Senhor é santo. O segundo mandamento proíbe todo uso impróprio do Nome de Deus. A blasfêmia consiste em usar o Nome de Deus, de Jesus Cristo, da Virgem Maria e dos santos de maneira injuriosa. O juramento falso invoca Deus como testemunha de uma mentira. O perjúrio é uma falta grave contra o Senhor, sempre fiel a suas promessas. "Não jurar nem pelo Criador, nem pela criatura, se não for com verdade, necessidade e reverência".
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No Batismo o cristão recebe seu nome na Igreja. Os pais, os padrinhos e o pároco cuidarão que lhe seja dado um nome cristão. O patrocínio de um santo oferece um modelo de caridade e garante a sua oração. O cristão começa suas orações e suas ações pelo sinal da cruz "em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém". Deus chama cada um por seu nome. Este mandamento prescreve respeitar o nome do Senhor. O nome do Senhor é SANTO. Com isto, é proibido o uso impróprio do Nome de Deus.
3º - Guardar domingo e festas de guarda (Êx 20, 8-11) "Guardarás o dia de sábado para santificá-lo" (Dt 5,12). "No sétimo dia se fará repouso absoluto em honra do Senhor" (Êx 31,15). O sábado, que representava o término da primeira criação, é substituído pelo domingo, que lembra a criação nova, inaugurada com a Ressurreição de Cristo. A Igreja celebra o dia da Ressurreição de Cristo no oitavo dia, que é corretamente chamado dia do Senhor, ou domingo. No domingo e em outros dias de festa de preceito, os fiéis têm a obrigação de participar da missa, evitando as atividades e negócios que impeçam o culto a ser prestado a Deus, a alegria própria do dia do Senhor e o devido descanso da mente e do corpo. A instituição do domingo contribui para que todos tenham tempo de repouso e de lazer suficiente para lhes permitir cultivar sua vida familiar, cultural, social e religiosa. Todo cristão deve evitar de impor sem necessidade aos outros aquilo que os impediria de guardar o dia do Senhor. "O domingo... deve ser guardado em toda a igreja como o dia de festa por excelência ".
4º - Honrar Pai e Mãe (Êx 20, 12) "Honra teu pai e tua mãe" (Dt 5.I6; Mc 7,8). "Filhos, obedecei a vossos pais, no Senhor, porque isso é justo. Este é o primeiro mandamento acompanhado de uma promessa: Honra teu pai e tua mãe, para que sejas feliz e tenhas longa vida sobre a terra" (Ef 6,1-3).
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De acordo com o quarto mandamento, Deus quis que, depois dele, honrássemos nossos pais e os que ele, para nosso bem, investiu de autoridade. A comunidade conjugal está fundada na aliança e no consentimento dos esposos. O casamento e a família estão ordenados para o bem dos cônjuges, a procriação e a educação dos filhos. Os filhos devem a seus pais respeito, gratidão, justa obediência e ajuda. O respeito filial favorece a harmonia de toda a vida familiar. Os pais são os primeiros responsáveis pela educação de seus filhos na fé, na oração e em todas as virtudes. Têm o dever de prover em toda a medida do possível as necessidades físicas e espirituais de seus filhos. Os pais devem respeitar e favorecer a vocação de seus filhos, ensinando que a primeira vocação do cristão consiste em seguir a Jesus. "A salvação da pessoa e da sociedade humana está estreitamente ligada ao bem-estar da comunidade conjugal e familiar." Lembrem-se e ensinem que a primeira vocação do cristão consiste em seguir a Jesus. A autoridade pública deve respeitar os direitos fundamentais da pessoa humana e as condições de exercício de sua liberdade. É dever dos cidadãos trabalhar com os poderes civis para a edificação da sociedade num espírito de verdade, de justiça, de solidariedade e de liberdade. O cidadão está obrigado em consciência a não seguir as prescrições das autoridades civis quando contrárias as exigências da ordem moral. "É preciso obedecer antes a Deus do que aos homens " (At 5,29). Toda a sociedade baseia os seus juízos e a sua conduta numa visão do homem e do seu destino. Sem as luzes do Evangelho a respeito de Deus e do homem, as sociedades facilmente se tornam totalitárias.
5º - Não matar (Êx 20, 13) "Deus tem em seu poder a alma de todo ser vivo e o espírito de todo homem carnal" (Jó 12,10). Toda vida humana, desde o momento da concepção até a morte, é sagrada porque a pessoa humana foi criada por si mesma à imagem e á semelhança do Deus vivo e santo. A vida humana é sagrada porque desde a sua origem ela encerra a ação criadora de Deus, e permanece para sempre numa relação especial com o Criador, seu único fim. Só Deus é o dono da vida, do começo ao fim; ninguém em nenhuma circunstância pode reivindicar para si o direito de destruir diretamente um ser humano inocente. O assassinato de um ser humano é gravemente contrário à dignidade da pessoa e à santidade do Criador. A proibição de matar não ab-roga o direito de tirar a um opressor injusto a possibilidade de prejudicar. A legítima defesa é um dever grave para quem é responsável pela vida alheia ou pelo bem comum.
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Desde a concepção a criança tem o direito á vida. O aborto direto, isto é, o que se quer como um fim ou como um meio, é uma "prática infame" gravemente contrária à lei moral. A Igreja sanciona com pena canônica de excomunhão este delito contra a vida humana. Visto que deve ser tratado como uma pessoa desde a sua concepção, o embrião deve ser defendido em sua integridade, cuidado e curado como qualquer outro ser humano. A eutanásia voluntária, sejam quais forem as formas e os motivos, constitui um assassinato. É gravemente contrária à dignidade da pessoa humana e ao respeito do Deus vivo, seu Criador. O suicídio é gravemente contrário à justiça, à esperança e à caridade. E proibido pelo quinto mandamento. O escândalo constitui uma falta grave quando por ação ou por omissão leva deliberadamente o outro a pecar. Por causa dos males e injustiças que toda guerra acarreta, devemos fazer tudo o que for razoavelmente possível para evitá-la. A igreja ora: "Da fome, da peste e da guerra livrai-nos, Senhor". A Igreja e a razão humana declaram a validade permanente da lei moral durante os conflitos armados. As práticas deliberadamente contrárias ao direito dos povos e a seus princípios universais constituem crimes. "A corrida armamentista é a praga mais grave da humanidade, que lesa intoleravelmente os pobres". "Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus" (Mt 5,9).
6º - Não pecar contra a castidade (Êx 20, 14) "O amor é a vocação fundamental e originária do ser humano". Ao criar o ser humano homem e mulher, Deus dá a dignidade pessoal de uma maneira igual a um e outro. Cada um, homem e mulher, deve chegar a reconhecer e aceitar sua identidade sexual. Cristo é o modelo da castidade. Todo batizado é chamado a levar uma vida casta, cada um segundo seu estado de vida próprio. A castidade significa a integração da sexualidade na pessoa. Inclui a aprendizagem do domínio pessoal. Entre os pecados gravemente contrários a castidade é preciso citar a masturbação, a fornicação, a pornografia e as práticas homossexuais.
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A aliança que os esposos contraíram livremente implica um amor fiel. Impõe-lhes a obrigação de guardar seu casamento indissolúvel. A fecundidade é um bem, um dom, um fim do casamento. Dando a vida, os esposos participam da paternidade de Deus. A regulação da natalidade representa um dos aspectos da paternidade e da maternidade responsáveis. O adultério e o divórcio, a poligamia e a união livre são ofensas graves à dignidade do casamento.
7º - Não furtar (Êx 20, 15) "Não roubarás" (Dt 5,19). "Nem os ladrões, nem os avarentos... nem os injuriosos herdarão o Reino de Deus" (1Cor 6,10). O sétimo mandamento prescreve a prática da justiça e da caridade da administração dos bens terrenos e dos frutos do trabalho dos homens. Os bens da criação são destinados a todo o gênero humano. O direito à propriedade privada não abole a destinação universal dos bens. O sétimo mandamento proíbe o roubo. O roubo é a usurpação de um bem de outrem contra a vontade razoável do proprietário. Toda a forma de apropriação e uso injusto dos bens de outrem é contrária ao sétimo mandamento. A injustiça cometida exige reparação. A justiça comutativa exige a restituição do bem roubado. A lei moral proíbe os atos que, visando a fins mercantis ou totalitários, conduzem à servidão dos seres humanos, à sua compra, venda e troca como mercadorias. O domínio concedido pelo Criador sobre os recursos minerais, vegetais e animais do universo não pode ser separado do respeito às obrigações morais inclusive para com as gerações futuras. Os animais são confiados à administração do homem que lhes deve benevolência. Podem servir para justa satisfação das necessidades do homem. A Igreja emite um juízo em matéria econômica e social, quando os direitos fundamentais da pessoa ou a salvação das almas o exigem. Preocupa-se com o bem comum temporal dos homens em razão de sua ordenação ao Sumo Bem, no fim último. O próprio homem é o autor, o centro e o fim de toda a vida econômica e social. O ponto decisivo da questão social é que os bens criados por Deus para todos de fato cheguem a todos, conforme a justiça e com a ajuda da caridade.
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O valor primordial do trabalho despende do próprio homem, que é seu autor e destinatário. Através de seu trabalho, o homem participa da obra da criação. Unido a Cristo, o trabalho pode ser redentor. O verdadeiro desenvolvimento abrange o homem inteiro. O que importa é fazer crescer a capacidade de cada pessoa de responder à sua vocação, portanto ao chamamento de Deus. A esmola dada aos pobres é um testemunho de caridade fraterna e é também uma prática de justiça que agrada a Deus. Na multidão de seres humanos sem pão, sem teto, sem terra, como não reconhecer Lázaro, mendigo faminto da parábola? Como não ouvir Jesus que diz: "Foi a mim que o deixastes de fazer" (Mt 25,45).
8º - Não levantar falso testemunho (Êx 20, 16)
"Não levantarás falso testemunho contra teu próximo" (Êx 20,16). Os discípulos de Cristo "revestiram-se do homem novo, criado segundo Deus na justiça e santidade da verdade" (Ef 4, 24). A verdade ou veracidade é a virtude que consiste em mostrar-se verdadeiro no agir e no falar, fugindo da duplicidade, da simulação e da hipocrisia. O cristão não deve "se envergonhar de dar testemunho de Nosso Senhor" (2Tm 1,8) em atos e palavras. O martírio é o supremo testemunho prestado à verdade da fé. Este mandamento proíbe falsear a verdade nas relações com os outros. Essa proibição moral decorre da vocação do povo santo a ser testemunha de seu Deus, que é e quer a verdade. O respeito à reputação e à honra das pessoas proíbe toda atitude ou palavra de maledicência ou calúnia. A mentira consiste em dizer o que é falso com a intenção de enganar o próximo, que tem direito à verdade. Toda falta cometida contra a verdade exige reparação. A regra de ouro ajuda a discernir, nas situações concretas, se convém ou não revelar a verdade àquele que a pede. "O sigilo sacramental é inviolável". Os segredos profissionais devem ser guardados. As confidências prejudiciais a outros não devem ser divulgadas. A sociedade tem direito a uma informação fundada na verdade, na liberdade e na justiça. É conveniente que se imponham moderação e disciplina no uso dos meios de comunicação social. As artes, mas sobretudo a arte sacra, têm em vista, "por natureza, exprimir de alguma forma nas obras humanas a beleza infinita de Deus e procuram aumentar seu louvor e sua glória na medida em que não tiverem outro propósito senão o de contribuir poderosamente para encaminhar os corações humanos de Deus".
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9º - Não desejar a mulher do próximo (Êx 20, 17) "Todo aquele que olha para uma mulher com desejo libidinoso já cometeu adultério com ela em seu coração" (Mt 5,28). O nono mandamento adverte contra a cobiça ou concupiscência carnal. A luta contra a cobiça carnal passa pela purificação do coração e a prática da temperança. A pureza do coração nos permitirá ver a Deus e nos permite desde já ver todas as coisas segundo Deus. A purificação do coração exige a oração, a prática da castidade, a pureza da intenção e do olhar. A pureza do coração exige o pudor que é paciência, modéstia e discrição. O pudor preserva a intimidade da pessoa.
10º - Não cobiçar as coisa alheias (Êx 20, 17) "Onde está teu tesouro, aí estará teu coração" (Mt 6, 21). O décimo mandamento proíbe a ambição desregrada, nascida da paixão imoderada das riquezas e de seu poder. A inveja é a tristeza sentida diante do bem de outrem e o desejo imoderado de dele se apropriar, é um vício capital. O batizado combate a inveja pela benevolência, a humildade e abandono nas mãos da Providencia divina. Os fiéis de Cristo "crucificaram a carne com suas paixões e concupiscências" (Gl 5,24); são conduzidos pelo Espírito e seguem seus desejos. O desapego das riquezas é necessário para entrar no Reino dos Céus. "Bem-aventurados os pobres de coração ". Eis o verdadeiro desejo do homem: "Quero ver a Deus". A sede de Deus é saciada pela água da Vida Eterna.
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1C – Levítico Com efeito, os descendentes de Levi foram colocados à testa do culto em Israel: recrutavam-se entre eles os sacerdotes e os servidores do templo. O Levítico é um manual redigido para eles, de acordo com usos já muito antigos. Esse manual passou por muitas transformações e recebeu adições depois da construção do templo de Salomão em 1000 a.C.. Os antigos hebreus conheciam quatro espécies de sacrifício: os holocaustos, nos quais a vítima oferecida era totalmente consumida pelo fogo; as oblações, ou ofertas de frutos, de farinha e de outros produtos da agricultura e da criação que acompanham o holocausto cotidiano; o sacrifício pacífico, ou de ação de graças; e os sacrifícios de expiação, destinados a reparar os pecados e as faltas involuntárias contra as leis cerimoniais. Enfim, encontrar-se-á no Levítico um esboço de código civil e de leis morais que, embora imperfeitas, testemunham como se tinha aperfeiçoado a inclinação do povo eleito pela verdadeira moral. Não será inútil observar qual a lei de Talião: “olho por olho e dente por dente”, abolida por Jesus Cristo, constitui a seu modo um verdadeiro progresso, se considerarmos os costumes existentes então, segundo os quais costumavam, habitualmente, vingar sete vezes as injúrias e as injustiças recebidas.
1D – Números O nome do livro dos Números provém das importantes listas de números e de nomes contidos nos seus primeiros capítulos. No mais, este livro é uma continuação normal do Êxodo. O livro dos Números supõe que o povo hebreu já estava divido em doze tribos ou clãs, e que estas viviam uma existência mais ou menos autônoma, apenas com uma vaga coesão por participarem das mesmas crenças, do mesmo culto, da mesma legislação e da fidelidade à mesma Aliança religiosa. As leis aí contidas se referem à permanência dos hebreus no deserto, mas foram retocadas e adaptadas à vida de comunidade desse mesmo povo. A história dos hebreus no deserto não é, realmente, muito edificante. Formavam um povo de dura cerviz que reclamava uma vida fácil, murmurava contra Deus e chegou mesmo ao ponto de contestar a legitimidade da autoridade de Moisés (12,2). Todavia, apesar de suas inconstâncias, o povo eleito permanece sempre o objeto de particular misericórdia e de benévola atenção da parte de Deus. O fim do livro dos Números narra as lutas dos hebreus com as povoações vizinhas à Palestina que se opuseram à sua passagem no decorrer dessa lenta imigração. Essas mesmas narrações explicam também como as instituições sociais e religiosas do povo eleito se baseavam na fé no Deus com o qual tinham feito aliança.
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1E – Deuteronômio O quinto livro do Pentateuco é essencialmente religioso e jurídico. Deuteronômio significa segunda lei. O seu texto deve ter permanecido ignorado por muito tempo. Descoberto sob o reinado de Josias, em 622 a.C., num adito do templo de Jerusalém, tornou-se a base de uma importante reforma religiosa e moral, depois de uma era de decadência e de idolatria. A doutrina do Deuteronômio é apresentada numa íntima ligação com a legislação anterior a Moisés, de onde se seguem uma verdadeira continuidade e uma íntima coerência no desenvolvimento da revelação em Israel. O livro termina com dois maravilhosos discursos, que descrevem as bênçãos divinas sobre os israelitas fiéis e as maldições que atingirão os pecadores. Num apêndice pode-se ler ainda a breve notícia da morte de Moisés, à qual é acrescentado um poema de encômios ao grande legislador. Com este livro fecha-se a coleção do Pentateuco, esse conjunto de narrações, de exortações e de textos legais, que urge considerar, antes de tudo, como o testemunho da fé em um Deus que quer reinar sobre a humanidade inteira, mas especialmente sobre o povo por ele escolhido, ao qual, como recompensa à sua fidelidade, promete a maior abundância de bênçãos. A idéia central do Pentateuco é, portanto, da Aliança.
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Conclusão
O livro do Gênese deve ser lido por extenso. Contém as mais veneráveis e as mais solenes páginas de toda a Bíblia. Apenas os capítulos 9, 11, 36 e 46 (genealogia) é que poderiam ser deixados à parte. Há no Êxodo diversas passagens legislativas cuja leitura apresenta menos interesse. Mas os capítulos seguintes são de essencial importância: 1 a 19, vida e missão de Moisés; 20, o Decálogo; 32 a 34, o bezerro de ouro e as manifestações divinas a Moisés. Para aquele que tomou contato com a Bíblia, o Levítico, com suas leis rituais e suas prescrições cultuais, causa decepção. Todavia, não será sem proveito que o leitor leia os capítulos 19 e 25 que contém leis sociais, bem como o capítulo 26, ao qual são enumeradas as bênçãos e as maldições prometidas aos fiéis ou aos pecadores. Nos Números, impõe-se à leitura a bela fórmula de bênção (6,22-27), em seguida a relação das peregrinações dos hebreus (10,14,16 e 17), e por fim a narração dos episódios da água que saiu do rochedo, da serpente de bronze, da guerra contra Moab e do adivinho Balaão (20 a 25). O Deuteronômio apresenta capítulos de excepcional importância: 4 a 6, exortação à obediência e recapitulação de Decálogo; 7 a 11, o que Deus fez pelo seu povo, e o que dele exige; 27,28 e 30, bênçãos prometidas por Deus ao povo fiel.
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2 – Livros Históricos A sequência dos livros da Bíblia tem vários traços de uma longa parábola histórica e o interesse pela História já estava bastante presente nos livros do Pentateuco. Mas é costume chamar Livros Históricos a um conjunto que vem depois do Pentateuco. Na verdade, só se consegue fazer uma História de Israel em sentido atual a partir da instalação do povo em Canaã. E esse fato da atual historiografia coincide com a classificação tradicional do referido conjunto, que inclui os livros seguintes:
2A – Josué Deve este livro seu nome ao general e sucessor de Moisés, cuja missão é aí relatada. Seu autor permanece desconhecido. A redação final deve ter sido feita na época dos reis, mediante documentos antiquíssimos, que, em parte, podem remontar até os próprios tempos de Josué. Os acontecimentos que este livro nos narra parecem datar do fim do século 13 a.C.. Trata-se da lenta instalação dos israelitas na terra de Canaã. Apesar das derrotas, das privações e dos muitos obstáculos, o povo de Deus conserva inalterável esperança no cumprimento das promessas divinas. As passagens principais são o episódio de Raab, a prostituta, recompensada por Deus pela assistência dada aos israelitas (cap. 2); a passagem do Jordão, assinalada por um prodígio comparável ao da travessia do mar vermelho (cap. 3); a tomada de Jericó, relação que atribui ao poder divino a vitória dos homens (cap. 6); a derrota diante de Hai, atribuída ao crime de Acã e a consequente tomada dessa cidade (cap. 7 e 8). A vitória de Josué em Gabaon merece particular menção por causa da célebre narração da parada do sol. Parece que devemos interpretar esse texto, que é, aliás uma citação tirada de uma antiga coleção de cânticos guerreiros, como uma espécie de figura de estilo poético, para exprimir o fervor da oração de Josué e, ao mesmo tempo, a imediata graça, concedida por Deus, de alcançar a vitória antes do pôr-do-sol (cap. 10). As narrações de Josué não se esforçam por silenciar ou por encobrir os costumes cruéis e brutais dos povos antigos, mas timbram principalmente em enaltecer o poder divino, mais forte do que o dos inimigos. Em numerosas passagens lemos menções à fidelidade a Deus. O povo de Deus, atualmente, tão bem como nos tempos de Josué, não pode subtrair-se às condições de existência que lhe foram traçadas. Ainda hoje guerras e lutas são inevitáveis para que os homens possam atingir sua verdadeira pátria, que é o Reino dos céus. As palavras de despedida de Josué, já envelhecido (cap. 23 e 24), encerram um belo ensinamento de fidelidade, de gratidão e de confiança nas promessas divinas: “Apegai-vos, diz ele, ao Senhor que depôs em vosso proveito povos numerosos e poderosos.... Se acaso vos desagrada servir ao Senhor, escolhei neste dia a quem quereis servir. Mas eu e minha casa serviremos ao Senhor. ” A esta declaração, o povo responde: “Nós serviremos ao Senhor, nosso Deus, e obedeceremos à sua voz. ”
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2B – Juízes O livro dos Juízes, cujo autor é desconhecido, delineia a historia do povo hebreu durante um período de cerca de 200 anos, desde a morte de Josué até meados do século 11 a.C.. Temos aí uma espécie de coleção de narrações épicas inspiradas nas ações heróicas de homens chamados Juízes. Esses homens foram, antes de tudo, chefes militares em épocas perigosas. Surgiram no meio de diversas tribos que haviam libertado, ao menos provisoriamente. É um período de decadência política e religiosa. As tribos israelitas ainda não tinham força bastante para impor-se no meio das populações cananéias e para resistir à pressão dos filisteus. Por outro lado, o povo se vai deixando seduzir pela vida fácil das nações vizinhas, cujos costumes grosseiros e práticas idolátricas vão adotando. Dir-se-ia que a história é considerada aqui como uma verdadeira pedagogia divina: as desgraças são consideradas como um castigo, a libertação, como um perdão. Deus é o único guia do seu povo. Eis aqui as passagens mais notáveis: Cap. 2: Onde se expõe a interpretação que se deve dar aos acontecimentos que em seguida se vão ler. Cap. 3: História de Otoniel e de Aod. Cap. 4: História de Débora, a profetisa e juíza. Cap. 6 a 8: História de Gedeão. Cap. 9: O usurpador Abimelec. Cap. 11: A história decepcionante de Jefté, que nos demonstra que os heróis do povo de Deus, afinal de contas, não passam de simples homens e que este povo, embora escolhido de Deus, estava ainda inteiramente eivado de costumes bárbaros das nações vizinhas. Cap. 13 a 16: A história de Sansão, um homem eleito, mas desobediente, que enfrenta a paciência divina; ele não deixa de cumprir a missão a qual a graça o destinara, e, em virtude dessa mesma eleição, obtém que o castigo divino seja atenuado e que em último lugar triunfe a misericórdia. Sansão, de acordo com a sua descrição na bíblia hebraica, foi um homem nazireu, filho de Manoá, nascido de mãe estéril (Juízes 13,2) e que liderou os israelitas contra os filisteus. Ele era da tribo de Dã e foi o décimo terceiro juiz de Israel, sucedendo a Abdon. A Bíblia relata que Sansão foi juiz do povo de Israel por vinte anos (Juízes 16,31), aproximadamente de 1177 a.C. a 1157 a.C., sendo o sucessor de Abdon e o antecessor de Eli. Distinguia-se por ser portador de uma força sobre-humana que, segundo a Bíblia, era-lhe fornecida pelo Espírito do Senhor enquanto se mantivesse obediente ao senhor dos Exércitos. Subjugava facilmente seus inimigos e produzia feitos inalcançáveis por homens comuns, como rasgar um leão novo ao meio, enfrentar um exército inteiro e matar uma multidão de filisteus (depois de descobrir que foi enganado) para pegar suas roupas, pagando uma aposta. (Juízes 14,6; 15,14; 16,23). De acordo com o texto bíblico, Sansão apaixonou-se por Dalila, uma mulher do povo filisteu, a qual o traiu entregando-o aos chefes de sua nação, depois de saber sobre os seus cabelos, os
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quais eram a fonte de sua força sobre-humana. Após ser cegado pelos filisteus, Sansão passou à condição de escravo. Sansão morreu sacrificando-se para se vingar de seus inimigos, após ter clamado a Deus pela restituição de sua força para um último e definitivo ato. A leitura do livro dos Juízes prende o interesse dos leitores, apesar dos atos de barbarismos aí relatados por diversas vezes, testemunhando uma civilização ainda primitiva e um senso moral em vias de ser aperfeiçoado.
2C – Rute A história de Rute ocorreu no tempo dos Juízes. Não sabemos o autor dessa encantadora narrativa, nem a data exata de sua composição, provavelmente posterior ao exílio. Trata-se de uma mulher estrangeira, viúva de um judeu. Veio ela fixar-se em Israel para permanecer fiel ao afeto que tinha à sua sogra, Noêmi. Aí desposou, depois de ter abraçado a fé israelita, Boaz, que, de acordo com a lei mosaica, estava obrigado a tomar por mulher a viúva de seu parente mais próximo sem filhos. Assim, Rute, embora estrangeira, entra para a comunidade de Israel. Pelo seu casamento com Boaz, torna-se uma antepassada do rei Davi, e figura como uma das quatro mulheres mencionadas na genealogia de Jesus (Mt 1,5). Rute deve ser citada como um modelo de piedade filial e de fidelidade. “Para onde tu fores, disse ela, também eu irei; onde tu te detiveres, aí eu me deterei. Teu povo será o meu povo, teu Deus será o meu Deus”, (cap. 1,16). Por outro lado, o fato de Deus tê-la elegido demonstra que a escolha do povo eleito não é tão exclusiva que Deus se desinteresse das outras nações. Ao contrário, temos aqui um sinal da universalidade da salvação. Rute teve um filho de nome Obede; que gerou a Jessé e Jessé gerou a Davi.
2D – Os dois livros de Samuel Os dois livros de Samuel formavam, primitivamente, uma única obra. Ignora-se quem foi seu autor. A redação final deve ser posterior ao ano 622 a.C.. O autor serviu-se, sem dúvida, de tradições orais que se estenderam desde o fim da época dos Juízes até a do segundo rei dos israelitas: Davi; portanto, por cerca de 100 anos. O assunto dessa narração histórica pode ser assim resumido: a crise da realeza em Israel; o estabelecimento e o caráter sacro da dinastia de Davi. Essas narrações são dominadas por dois grandes vultos brilhantes, apesar de seus lados sombrios: Samuel e Davi. Num segundo plano, aparece a fisionomia pálida e indecisa de Saul,
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que fracassou na execução de uma grave missão e foi reprovado formalmente por sua desobediência. Samuel eleito pelo povo durante um período de decadência política e religiosa, juiz e profeta ao mesmo tempo, representava o antigo conceito de Deus, único chefe e guia de seu povo. É o que se chama teocracia. Só depois de penosa hesitação e de longa resistência é que ele se resignou a conceder ao povo um rei. Esse primeiro reinado não foi feliz. A autoridade de Saul começou bem depressa a vacilar. Sua débil saúde e sua neurastenia tornaram-no impopular e, no final de sua vida, uma dissensão entre o rei e o profeta-conselheiro tornou-o ainda mais desprezado diante do povo. Mas o jovem Davi, pelos seus feitos guerreiros, foi conquistando sempre maior celebridade e o favor do povo. Consagrado rei em lugar de Saul, reinou primeiros sete anos em Hebron, sobre a tribo de Judá, e mais tarde em Jerusalém, sobre as doze tribos, fazendo de Israel um verdadeiro reino. Seus últimos anos foram entenebrecidos por revoltas e guerras civis. Entretanto, esse rei, apesar de suas faltas, fiel a observância da vontade divina, tornou-se o condutor de seu povo conforme o coração de Deus, um predecessor do Messias Jesus, o qual foi, de um modo único, o guia, o rei e o salvador da humanidade. Pode-se hesitar em fazer uma escolha entre as magníficas narrativas dos livros de Samuel, talvez as mais tocantes de toda a Bíblia. Encontramos aí trechos lindíssimos sobre a obediência a Deus por parte de Samuel e Heli (I Sam cap. 1 a 4), sobre a desobediência de Saul (I Sam cap. 13 a 15), sobre os começos do ministério profético (I Sam cap. 3 a 12), sobre a admirável amizade que unia Davi a Jônatas (II Sam cap. 1), sobre a queda e o arrependimento de Davi (II Sam cap. 11 e 12). Lemos aí as célebres narrações do combate de Davi com o gigante Golias, a proscrição de Davi por Saul, o reino de Davi, o crime e o arrependimento desse rei, e por fim as revoltas de seu filho Absalão e de Seba. David ou Davi (em hebraico: דוד, literalmente "querido", "amado"; no hebraico moderno Dávid, no hebraico tiberiano Dāwiḏ; em árabe: )داودDavi foi o maior rei de Israel, um grande e importante homem tendo muitas glórias e dons na sua vida, como o dom da música, da poesia e dos salmos, que o levou a fazer o maior livro bíblico, o Livro de Salmos. O célebre arqueólogo americano Edwin Thiele estabeleceu sua data de nascimento por volta de 1040 a.C., e sua morte em 970 a.C., tendo reinado sobre Judá de 1010 a 1003 a.C., e sobre o reino unificado de Israel de 1003 a 970 a.C. Os livros bíblicos de Samuel, I Reis e I Crônicas são a única fonte de informação disponível sobre sua vida e seu reinado, embora a estela de Tel Dan registre a existência, em meados do século IX a.C., de uma dinastia real judaica chamada de "Casa de Davi". A vida de Davi é particularmente importante para a cultura judaica, cristã e islâmica. No judaísmo David, ou Melekh David ("Rei Davi"), é o Rei de Israel e do povo judaico; um descendente direto seu será o Mashiach, o Messias judaico. No cristianismo Davi é mencionado como um ancestral do pai adotivo de Jesus, José, e no islamismo é conhecido como Daud, um profeta e rei de uma nação. Filho de Jessé, da tribo de Judá, teria nascido na cidade de Belém e se destacado na luta dos israelitas contra os filisteus. Tornou-se rei, sucedendo a Saul e conquistou Jerusalém, que transformou em capital do Reino Unido de Israel.
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Seu nome é citado 1.139 vezes na Bíblia. Davi viveu algures à volta de 1050 a.C., foi o segundo rei de Israel sucedendo a Saul (sua história é relatada em detalhes nos livros de I e II Samuel). Foi um rei popular e o homem do Antigo Testamento que mais vezes é mencionado na Bíblia. Caçula, ele foi o oitavo filho de Jessé, um habitante de Belém. O seu pai parece ter sido um homem de situação modesta. O nome da sua mãe não se encontra registrado, mas costuma-se atribuir a ela o nome de Nahash. Quanto à sua aparência pessoal, se sabe apenas que tinha cabelos ruivos, formoso semblante e gentil aparência. Na narrativa bíblica, ele é descrito inicialmente como tocador de harpa na corte de Saul e ganha notoriedade ao matar em combate o gigante guerreiro filisteu Golias, ganhando o direito de se casar com a filha do rei Saul, além da isenção de impostos. Depois da morte de Saul, Davi governou a tribo de Judá, enquanto o filho de Saul, Isboset, governou o resto de Israel. Com a morte de Isboset, Davi foi escolhido o rei de toda Israel e seu reinado marcou uma mudança na realidade dos judeus: de uma confederação de tribos, transformou-se em uma nação estabelecida. Ele transferiu a capital de Hebron para Jerusalém, após conquistá-la, pois esta não tinha nenhuma lealdade tribal anterior, e tornou-a o centro religioso dos israelitas, trazendo consigo a Arca da Aliança. Expandiu os territórios sobre os quais governou e trouxe prosperidade a Israel. Seus últimos anos foram abalados por rebeliões lideradas por seus filhos e rivalidades familiares na corte. Foi concedido por Deus, de acordo com a Bíblia, que a monarquia israelita e judaica iria certamente vir da sua linha de descendentes. O Judaísmo Ortodoxo acredita que o Messias será um descendente do Rei Davi. O Novo Testamento qualifica Jesus como seu legítimo descendente, quer por uma descendência legal – era filho adotivo de José, o Carpinteiro, da tribo de Davi – quer por descendência sangüínea, já que era filho de Maria que, assim como o marido, fora recensear-se em Belém, terra de seu ancestral. Foi sagrado rei pelo profeta Samuel ainda durante o reinado de Saul, causando ciúmes de sua parte. Por isto, Davi se exilou por um tempo (evitando uma rebelião contra o rei, pois confiava em Deus, e não tinha o direito de tocar no ungido do Senhor). Foi durante seu reinado que Jerusalém foi capturada dos jebuseus, tornando-se capital do reino de Israel. Deus havia ordenado por meio de Samuel que Saul destruísse completamente o povo amalequita por haverem atacado o povo de Israel durante o período do êxodo do Egito, no entanto Saul não destruiu o melhor dos despojos e o próprio rei Amalequita Agague. Por essa desobediência Samuel profetizou que Saul não seria mais o rei de Israel. Samuel, instruído por Deus vai secretamente até a casa de Jessé para ungir um novo rei para Israel. Apesar de Davi ser o mais novo de seus sete irmãos ele foi o escolhido por Deus para ser ungido. A bíblia relata que nessa época um "mau espírito" atormentava Saul e seus servos buscaram alguém que soubesse tocar lira para que Saul se acalmasse. Saul se afeiçoou por Davi e fez dele seu escudeiro. Mais tarde quando o exército filisteu se reuniu para enfrentar os israelitas, um gigante chamado Golias desafiou o exército israelita a enviar um homem para enfrentá-lo, no entanto, os israelitas tiveram medo do gigante. Davi, indignando-se da vergonha que Golias trazia a Deus e a todo exército de Israel com suas palavras, decidiu enfrentá-lo. Saul ofereceu sua armadura para Davi, no entanto ele recusou por não ser
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treinado no combate com armadura e ser de pequena estatura em comparação à armadura (a Bíblia relata que Saul era particularmente alto dizendo que seus ombros sobressaíam acima do resto do povo), então Davi enfrentou Golias munido apenas de uma funda e algumas pedras. Logo no começo da batalha Davi acertou-lhe a testa com uma pedrada e, caindo Golias, arrancou-lhe a cabeça com sua própria espada. Após a vitória Davi foi colocado como líder de um grupo de soldados e tornou-se o melhor amigo de Jônatas, filho de Saul. Algumas passagens Bíblicas falam da grande amizade que havia entre Davi e Jônatas. Como no caso da Declaração de Davi, para a Morte de Jônatas, onde Davi afirma: "Angustiado estou por ti, meu irmão Jônatas; quão amabilíssimo me eras! Mais maravilhoso me era o teu amor do que o amor das mulheres." (II Samuel 1,26). Sendo Davi bem sucedido em todas suas missões e ganhando fama entre o povo, o rei Saul passou a invejá-lo e temeu perder o poder para Davi. A partir daí Saul tentou por inúmeras vezes matar Davi, o qual fugiu para salvar-se. Percebe-se nitidamente na narrativa bíblica que Davi sempre respeitou a unção de Saul como rei. Davi fugiu para o deserto, e começaram a reunir em torno de si, todos os indesejáveis da época, a Bíblia fala que ladrões e assassinos começaram a procurá-lo, formando um pequeno contigente bélico, o qual o ajudava a se defender das investidas tanto do rei Saul, quanto de outros povos. Quando rei Saul morreu Davi governou a tribo de Judá. E Isboset, filho de Saul, governou o restante de Israel. Quando Isboset morreu Davi foi escolhido por Deus para governar a toda Israel. Ele foi um homem usado por Deus e fez muitas mudanças a Israel.
2E – Os dois livros dos Reis Formando primitivamente uma só obra, esses dois livros traçam-nos a história dos israelitas, desde a morte de Davi, que devemos situar no ano de 970 a.C., até a destruição de Jerusalém, com a deportação do povo por Nabucodonosor em 587 a.C.. Os autores dessa compilação de fontes, de origem e de épocas diversas, são-nos desconhecidos. A maior parte certamente já estava redigida no final do 7º século a.C.. As fontes dessa compilação são mencionadas com freqüência: a mais importante é a Crônica dos Reis de Israel e Judá, composta, sem dúvida, de acordo com os arquivos dos dois reinos. Com a morte de Salomão, em 931 a.C., o reino foi divido em conseqüência da separação das dez tribos do Norte, que se constituíram num reino independente, o qual, em 722 a.C., foi conquistado e deportado por Sargon II, rei da Assíria. O autor permite-se um julgamento sobre cada um dos reis, comparando-os com Davi, que ele considera um rei íntegro e fiel. O número dos reis julgados maus é muito superior ao número dos bons. Só Salomão, Asa, Josafá, Joás, Osias, Joatão, Ezequias e Josias escapam do julgamento de reprovação, sendo os dois últimos considerados, aliás, como verdadeiros modelos. Urge notar que o critério desse juízo se baseia quase que exclusivamente na fidelidade ao verdadeiro culto, de acordo com o espírito do Deuteronômio, colocando-se o autor num ponto de vista totalmente religioso.
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Profeta não significa homem que prediz o futuro, embora ocasionalmente o faça. Profeta significa o homem que fala em nome de Deus. É, antes de tudo, um pregador que exorta o povo a ser fiel ao seu Deus. No começo do livro de Samuel, o profeta chamava-se ainda vidente. Os profetas, portanto, falavam e agiam em nome de Deus, lembrando ao povo o seu destino e eram como que conselheiros privados dos juízes e reis; recordam-lhes os deveres, censuramlhes as falhas e encorajam-nos as generosas iniciativas. Desde Moisés até João Batista, os profetas foram as testemunhas do verdadeiro Deus e trabalharam em prol do mais perfeito monoteísmo. Investiram contra a injustiça dos grandes e dos ricos, contra a inércia das massas populares. Viviam habitualmente como os seus contemporâneos e exerciam uma profissão particular. Havia, entretanto, vários agrupamentos de profetas, análogos a comunidades religiosas, vivendo os discípulos em torno de um mestre e levando uma existência frugal e apartada do convívio dos homens. Nas narrações sobre Elias e Eliseu faz-se menção a essas corporações que, contudo, se limitavam a um ministério meramente oral. Só no oitavo século a.C. em diante é que alguns profetas começaram a redigir suas mensagens. Aliás, essa redação foi simplesmente acessória: faziam-se compreender, o que era o principal. Esses homens de Deus eram notáveis reivindicadores. Têm a consciência despertada de não pregarem doutrina nova; sua missão consistia em lembrar o povo os termos do contrato da aliança que os ligava a Deus.
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O Grande Profeta Elias
Elias foi um profeta no Reino da Samaria durante o reinado de Acabe (século IX a.C.), de acordo com os Livros dos Reis. Conforme os Livros dos Reis, Elias defendeu o culto de Yahweh contra o culto popular a Baal; ele ressucitou um morto; fez fogo cair do céu e subiu ao paraíso num redemoinho (acompanhado por uma carruagem e cavalos de fogo ou montado nela). No livro de Malaquias, o retorno de Elias é profetizado: "antes da vinda do grande e terrível dia do Senhor," fazendo dele um precursor do Messias e da escatologia em várias religiões que reverenciam a Bíblia hebraica. Referências a Elias são feitas no Talmud, Mishnah, Novo Testamento e Corão. No judaísmo, o nome de Elias é invocado no ritual Havdalah semanal que marca o final do Shabat, e Elias é invocado em outros costumes judaicos, entre eles o Sêder de Pessach e do brit milá (ritual de circuncisão). Ele aparece em várias histórias na literatura rabínica e no Hagadá, incluindo o Talmude Babilônico. No cristianismo, o Novo Testamento descreve como Jesus e João Batista são comparados a Elias (em algumas ocasiões, considerados por alguns como manifestações de Elias) e como se deu a transfiguração de Jesus, onde Elias aparece ao lado de Moisés. Era um período de sucessão de reis ímpios: Nos dias de Elias, Israel estava sendo governado por reis maus e idólatras. A Bíblia diz que Onri “… fez o que era mau aos olhos do Senhor; e fez pior do que todos quantos foram antes dele” (I Rs 16, 25-26). Quando Onri morreu, em seu lugar reinou seu filho Acabe (I Rs 16, 28), que teve a capacidade de fazer pior do que todos os
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reis que lhe antecederam. A Bíblia diz acerca de Acabe: “E fez Acabe, filho de Onri, o que era mau aos olhos do Senhor, mais do que todos os que foram antes dele…” (I Rs 16, 30-31). Era um período de idolatria: O rei Acabe destaca-se nas Escrituras como um rei idólatra, pois ele andou nos caminhos de Jeroboão (I Rs 16, 31); serviu a Baal e o adorou (I Rs 16, 31); conduzindo toda a nação à idolatria. Como se não bastasse, Acabe casou-se com Jezabel, filha de Etbaal, rei dos sidônios; casamento este, jamais aprovado por Deus. Tudo isto fez Israel mergulhar no mais profundo paganismo, sem nenhuma pretensão de preservar o culto a Jeová, tornando-se uma nação idólatra e pagã, como as demais nações. Era um período de crise: Quando Acabe, influenciado por sua esposa Jezabel, substituiu o culto à Jeová pela adoração à Baal (I Rs 16, 31-33), Elias apareceu repentinamente perante o rei para anunciar a ausência de chuva e orvalho sobre a terra (I Rs 17, 1). Como a chuva é um dos principais elementos de sustentação da natureza, a falta dela provocou seca, fome e miséria. As Escrituras dizem que “… a fome era extrema em Samaria” (I Rs 18, 2). Isto fez com que Acabe se irasse ainda mais com Elias, pois achava que ele era o culpado daquela calamidade. Era um período de inversão de valores: Em meio a crise e à miséria, o rei Acabe parece estar mais preocupado com os cavalos e as mulas do que com os súditos do seu reino; pois ele chama Obadias, e saem à procura de água para preservar a vida dos animais (I Rs 18, 5-6). Possivelmente movido pelo desespero, o próprio Acabe sai à procura de água com Obadias, o que não era um fato comum, pois, como rei, ele podería apenas ordenar a seus servos que saíssem à procura de água. Era um período de idolatria e perseguição aos profetas: Jezabel, esposa do rei Acabe, ocupa o lugar de esposa mais ímpia da Bíblia. Além de controlar o seu esposo (I Rs 21, 25), ela levou a nação de Israel a adorar seus deuses (I Rs 18, 19-20). Como se não bastasse, intentou matar a todos os profetas do Senhor (I Rs 18, 4). Foi nessa ocasião que Obadias, um homem temente a Deus e servo do rei Acabe (possivelmente um mordomo ou camareiro do palácio), conseguiu esconder cem profetas do Senhor e os sustentou com pão e água, pondo em risco a sua própria vida, pois, caso fosse descoberto, tanto ele como os cem profetas, seriam mortos ao mando de Jezabel. Era um período de abuso de poder: No capítulo 21 de I Rs, está registrado que Acabe desejou adiquirir uma vinha que pertencia a Nabote. Como Nabote recusou-se vender a sua vinha para Acabe, Jezabel enviou cartas aos anciãos e aos nobres da cidade, com o selo do rei (como se estivesse sido escritas por ele), e mandou colocar duas falsas testemunhas contra Nabote, acusando-o de blasfêmia contra Deus e contra o rei, e, depois, o apedrejassem; fazendo com que seu marido possuisse a vinha que pertencia a Nabote (I Rs 21, 1-16), numa demonstração de que, tanto Acabe como sua esposa Jezabel, eram capazes de fazer qualquer coisa para conseguir seus objetivos, até mesmo, mandar matar pessoas inocentes. É em meio a essa crise social, moral e espiritual, que Deus levanta o profeta Elias para combater o pecado, proclamar o juizo e chamar o povo ao arrependimento. Elias aprendeu a confiar em Deus: Profetizar no tempo de Elias não era uma tarefa fácil. Era colocar a sua própria vida em risco (I Rs 18, 4). E Elias foi chamado para profetizar exatamente contra aqueles que tinham o poder nas mãos: o rei Acabe e sua ímpia esposa, Jezabel. Mas Elias não vacilou: Profetizou a falta de chuva e de orvalho (I Rs 17, 1); combateu o pecado de Acabe, chamando-o de perturbador de Israel (I Rs 18.18); desafiou os profetas de Baal (I Rs 18,
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22-40) e predisse a morte do rei Acabe e de sua esposa Jezabel (I Rs 22, 17-24). Somente uma confiança inabalável em Deus poderia levar um homem a profetizar naqueles dias. Elias aprendeu a depender de Deus: Ao contrário do que muita gente pensa, depender de Deus não é uma tarefa fácil. É preciso ter fé. A trajetória de Elias nos ensina isto: ora bebendo água de um ribeiro e se alimentando de pão e carne trazidos pelos corvos (I Rs 17, 1-6); ora sendo sustentado por uma pobre viúva (I Rs 17, 8-16); ora alimentando-se de pão e água trazidos por um anjo (I Rs 19, 5-7). Com certeza, a confiança de Elias não estava depositada nos corvos, nem na viúva, nem mesmo no anjo, e sim, em Deus, o Senhor que provê. Elias aprendeu a ter intimidade com Deus: O ministério de Elias não foi marcado apenas por profecias, mas também, por muitos milagres, tais como: multiplicação de azeite e farinha (I Rs 17, 16); ressurreição (I Rs 17, 22); fogo no altar (I Rs 18, 16-46); morte dos soldados do rei Acazias (II Rs 1, 9-14); divisão do rio Jordão (II Rs 2, 8). Todos estes milagres demonstram claramente que Elias era um homem que vivia em íntima comunuhão com Deus. A maior prova disto é que, semelhante a Enoque, Deus o tomou para si (II Rs 2, 11-12). Elias aprendeu a se fortalecer em Deus: Quando Elias foi ameaçado por Jezabel, após a morte dos profetas de Baal, perdeu o ânimo e desejou a morte (I Rs 19, 4). Parecia o fim da jornada daquele destemido profeta. No entanto, Deus envia um anjo para lhe dar pão e água (I Rs 19, 5-7). Com a força daquela comida, Elias caminhou quarenta dias e quarenta noites até chegar à Horebe (I Rs 19, 8). Ao chegar em Horebe, ele esconde-se em uma caverna, onde tem um encontro com Deus, que lhe fala numa voz mansa e delicada (I Rs 19, 12). Suas forças, então, são renovadas, fazendo com que ele saísse daquela caverna e executasse os propósitos divinos (I Rs 19, 15-21). O ministério de Elias foi marcado por profecias, milagres, desafios e muitas experiências com Deus. Porém, o acontecimento mais notável na vida do profeta Elias não foi profetizar a falta de chuva, nem desafiar os profetas de Baal, nem ressuscitar o filho da viúva. Sem dúvidas, o fato mais notável foi quando lhe apareceram cavalos e carros de fogo e, em um redemoinho, ele foi levado ao céu (II Rs 2, 11).
Profeta Elias sendo arrebatado por Deus
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Profeta Eliseu
Foi o sucessor de Elias no Reino do Norte de Israel. Era filho de Safat e vivia em Abel Mehola, no Vale do Jordão. Pertencia a uma abastada família que possuía 12 juntas de bois. Serviu a Elias durante algum tempo e, antes deste ter ascendido em direção aos céus numa carruagem de fogo, Eliseu pediu-lhe "porção dobrada do espírito de Elias", isto é, uma porção dupla, que era devido a sua primogenitura como seguidor de Elias. Ele ocupa esta posição por causa da sua designação oficial como sucessor de Elias, na época que em que Elias lançou sobre ele seu manto oficial.
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Foi um dos profetas que mais tem milagres registrados na Bíblia e dentre eles estão listados: o o o o o o o o o o o o
Abriu as águas do Jordão com a capa deixada por Elias (2Reis 2, 14). Transformou uma fonte de água má em água potável utilizando sal (2Reis 2, 19-22). Amaldiçoou os rapazes que zombavam de sua calvice. Deus então envia duas ursas que matam e despedaçam quarenta e dois destes rapazes (2Reis 2, 23-24). Previu ao rei uma expedição bem-sucedida contra os moabitas (2Reis 3, 11-27). Multiplicou o óleo de uma viúva (2Reis 4, 1-7). Previu o nascimento do filho de uma sunamita e, quando o menino morreu, Eliseu orou e o trouxe de volta à vida (2Reis 4, 8-37). Alimentou cem homens com vinte pães e algumas espigas (2Reis 4, 42-44). Curou o capitão da Síria Naamã de lepra (2Reis 5, 1-19). Fez um machado que havia caído no rio flutuar (2Reis 6, 1-7). Adivinhou os planos dos inimigos do rei (2Reis 6, 8-12). Previu, durante a grave fome de Samaria, que haveria abundância de comida no dia seguinte e, profetizou a morte do oficial que zombou da profecia (2Reis 7). Após a sua morte, quando um cadáver foi jogado em sua sepultura, assim que tocou nos ossos do profeta, voltou à vida (2Reis 13, 20-21).
Eliseu foi atacado por uma doença sem cura. Ele chamou Jeoás, filho de Jeoacaz e neto de Jeú para ir visitá-lo. Eliseu disse que ele foi como um exército para defender Israel. Ele também pediu que pegasse um arco e flechas e abrisse a janela que desse para o lado da Síria. Eliseu disse para que o rei retesa-se o arco, e pos suas maos sobre as do rei, orientando-o a lancar as flechas e declarou..." Flecha da vitoria do Senhor", anunciando assim a vitoria sobre os siros.Logo em seguida disse a ele que atira-se contra o solo, o que fez o rei, mas somente por tres vezes, indignado Eliseu lhe afirma que, se o tivesse feito por seis vezes, teria vencido totalmente os siros. Um bando de moabitas invadia Israel todo ano. Um desses bandos invadiu um funeral e todos fugiram e jogaram o defunto na sepultura de Eliseu. Quando esse defunto tocou nos ossos do profeta, ele voltou a viver. (2Reis 13, 20-21)
2F – Crônicas Os livros das Crônicas, chamados também, Paralipômenos, constituíam primitivamente uma só obra com os livros de Neemias e de Esdras. Percebe-se ainda o traço dessa unidade na coincidência do final das Crônicas com o começo de Esdras. O cronista que escreveu sem dúvida no começo do 3º século a.C., utilizou-se de grande número de fontes que ele cita com exatidão: os Livros de vidente Samuel, do profeta Natã, os Oráculos de Aías de Siló, as Memórias de Jeú. Outras fontes eram os Anais dos Reis de Israel e de Judá; por fim, certos trechos do livro de Samuel e dos Reis são reproduzidos textualmente. O autor, certamente membro de uma família sacerdotal, coloca-se sob um ponto de vista particularmente religioso. Antes de tudo, quer pôr em evidência como Deus se utiliza do governo dos reis para a realização dos seus desígnios, nomeadamente para a conservação integral da Aliança. Tenciona ele igualmente demonstrar que a verdadeira vocação do povo eleito consiste em dedicar-se ao culto divino do templo, que assim se deve tornar o centro de
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toda a nação. Justificava-se esse ponto de vista na época em que o livro foi exarado. Os judeus deportados foram então reintegrados na Palestina pelo decreto de Ciro, em 536 a.C., depois de terem permanecido cerca de 70 anos em Babilônia. Já não existia, então, nenhuma autonomia nacional. Só a religião e o culto é que ainda podiam servir para fortalecer a alma da comunidade judia restaurada. A explicação dessa transformação de uma nação politicamente autônoma numa comunidade religiosa constitui a finalidade do autor das crônicas. Essa obra parece ser uma reivindicação, cheia de convicção, do primado do culto, da religião e da fidelidade à Aliança divina sobre todos os valores políticos e terrestres. Em vários lugares ela testemunha a mais viva fé na retribuição divina numa intervenção direta de Deus no curso dos acontecimentos históricos. Dessa forma é sua intenção inculcar no leitor uma sólida esperança na vinda de uma realeza espiritual e um digno sentimento de soberania exclusiva de Deus sobre o mundo. Três passagens dos livros das Crônicas merecem ser assinalados de modo particular; as duas orações de Davi (I Crôn 17 e 29); a oração de Salomão suplicando a sabedoria (II Crôn 1); a dedicação do Templo (II Crôn 6 a 7).
2G – Esdras – Neemias Estas duas obras, primitivamente unidas, devem ser certamente atribuídas ao autor das Crônicas, das quais formam a sequência natural. Esses livros contêm diversos textos de arquivos, listas de recenseamento e documentos oficiais em aramaico e as memórias pessoais de Esdras e Neemias. Um estudo aprofundado do texto revela que a ordem cronológica nem sempre foi seguida à risca, e que necessário se torna inserir o livro de Neemias depois de Esdras. O Autor relata-nos a restauração religiosa ocorrida quando Ciro, rei dos persas, autorizou, em 538 a.C., os judeus deportados a voltarem novamente à Judéia. Esses judeus, assim que se foram estabelecendo em Jerusalém, começaram a reconstruir o Templo. Mas a oposição dos vizinhos hostis impediu-os de restaurar as fortificações da cidade. Foi então nomeado e empossado, em 445 a.C., um governador leigo, que muito teve que esforçar-se para restaurar uma sociedade eivada de abusos religiosos (mormente muitos casamentos entre judeus e pagãos) que constituíam grande perigo para a estabilidade da religião. Foi neste momento que interveio o sacerdote Esdras, personalidade cuja influência foi crescendo sempre mais. Por sua atividade ele conseguiu que a lei mosaica fosse novamente observada e que o culto fosse regulamentado e praticado, nomeadamente quanto à questão dos casamentos mistos. Pelo fim do período descrito nos livros de Esdras e de Neemias (cerca de 400 a.C.), a comunidade judaica de Jerusalém parece ter conquistado certa estabilidade: a Aliança divina aparece então como restabelecida, e os judeus, privados como estavam da independência política, unem-se numa verdadeira comunidade religiosa. Portanto, de uma nação política, o povo eleito torna uma igreja, isso pelo efeito todo particular da escolha de Deus e em função da Aliança sempre existente. Notava-se então um verdadeiro despertar espiritual e moral. A partir dessa época a classe sacerdotal vai adquirindo uma influência sempre maior: o templo aos poucos centralizava a nação toda, o culto alcançava um lugar mais e mais preponderante na vida popular, assim, pouco a pouco, o judaísmo foi apresentando aquela fisionomia toda particular, qual o conhecemos pelas narrações evangélicas. Os judeus insistiam na necessidade de um culto exterior e de uma observância rigorosa da lei, criando assim aquele deplorável
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formalismo, repassado de hipocrisia religiosa, que nos é conhecido pelo nome de farisaísmo. Os fariseus eram homens que se tinham em conta de justos e de santos, unicamente pela observância literal dos ritos cultuais e das regras exteriores da lei. O capítulo 9 de Esdras, bem como a bela oração de Neemias (cap. 1) são trechos encantadores que merecem ser lidos e meditados. Igualmente, a narração da reconstrução do templo (Esd 4 a 6) e a oração de confissão dos pecados (Ne 9 e 10) são admiráveis.
2H – Tobias – Judite – Ester Estes três livros apresentam um aspecto comum que deve ser caracterizado antes de passarmos a uma análise particular de cada um. Não são obras meramente históricas. A intenção de seus autores é manifesta: quiseram servirse de elementos históricos, conhecidos, como uma moldura, na qual inseriram, sob uma forma concreta, ensinamentos religiosos. Os fatos verdadeiros ou mais ou menos fictícios, embelezados, poetizados, são, portanto, apenas um modo de apresentar uma idéia. Nesses livros lemos o que se pode chamar de “narrações episódicas ou literatura edificante”. O livro de Tobias foi certamente escrito em aramaico na metade de 200 a.C.. O texto primitivo só nos foi conservado em versões gregas e latinas que por vezes se discordam entre si, como indicam as variantes nas notas do texto.
A história de Tobias tem uma grande importância religiosa. Avantaja-se pela comovente evocação do ideal religioso de uma família de israelitas que primava pela fé. Apresenta-se a história como transcorrida em Ninive, no tempo do exílio. Apreciamos nessas páginas a virtude, a piedade, e a felicidade do velho Tobias, postas à prova pela providência divina; e em seguida admiramos como essa mesma providência divina tudo encaminha para o seu bem verdadeiro, atendendo às duas orações, feitas simultaneamente pelo ancião cego e pela jovem Sara, infeliz, como era, em seus sucessivos casamentos: é-lhes enviado o anjo Rafael que conduz o jovem Tobias durante a viagem; fá-lo encontrar o remédio para a vista de seu pai, ao mesmo tempo que lhe consegue a esposa que o fará feliz. Em torno desse assunto central vão-se inserindo belíssimas notas de profunda riqueza religiosa quanto ao amor de Deus, à piedade filial, à perseverança nas provações, à misericórdia, à esmola, à santidade do casamento. O livro de Tobias é um verdadeiro espelho de um judeu justo, espelho esse que se pode aplicar a um cristão quase sem nenhuma transposição. O livro de Judite não nos foi conservado em seu texto hebraico. Resta-nos apenas sua tradução grega. O autor é ignorado. Pela descrição de uma situação concreta, a libertação de Betúlia, sitiada por Holoferne, general de Nabucodonosor, o autor quer demonstrar que a confiança em Deus, manifestada por fiel dedicação ao seu serviço, acaba triunfando de todas as potências terrestres, por mais temíveis que sejam. Ao poder incomensurável de um senhor deste mundo, é oposta a fraqueza de uma mulher; mas essa mulher é uma judia digna dessa raça que pratica fielmente a lei, crê na força da oração e confia em seu Deus.
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O espírito de vingança e do fanatismo nacional, que em prol do triunfo justifica o emprego de todos os meios, mesmo do assassínio, estava tão profundamente arraigado na alma judia que, como no caso presente, parece poder subsistir ao lado dos mais elevados sentimentos. O livro de Judite leva os leitores espontaneamente a pensar nas lutas que os judeus tiveram que sustentar pela sua fé, lutas essas que se tornaram particularmente agudas dois séculos antes da era cristã. Será certamente por essa época que o livro de Judite foi composto. O livro de Ester, cuja parte principal subsiste ainda em hebraico, contém uma série de suplementos escritos num grego assaz tardio. Para explicarmos de onde devem ter procedido esses suplementos, podemos pensar numa tradução independente do texto primitivo ou numa adição de data mais recente. São Jerônimo, quando traduziu a Bíblia para o latim (fim de 400 d.C.), colocou esses suplementos num apêndice. Nossa tradução reproduz fielmente essa disposição, explicada nas notas que acompanham o texto. O autor é desconhecido. Podemos supor que ele tenha vivido no fim do século quarto a.C.. O livro retrata a época persa, durante a qual os judeus eram dominados e oprimidos por estrangeiros. Lemos aí o célebre episódio do decretado morticínio dos judeus, frustrado pela intercessão da rainha Ester, ao qual se seguiu a tremenda vingança, cruel e violenta, por parte dos judeus. Depara-se também nesse livro esse misto de espírito de vingança e de grande elevação mental. O autor parece ter querido inculcar no leitor, de um lado, a idéia de que Deus salva seu povo por meios inesperados e irrisórios; e de outro, o intenso sentimento de patriotismo e de orgulho nacional. Poder-se-ia pensar mesmo numa verdadeira volta àquele nacionalismo fanático que se foi formatando outrora com o crescente poderio político dos dois reinos de Israel e Judá. Na primeira parte do livro não ocorre nem uma única vez o nome de Deus; no suplemento, ao contrário, essa ausência do nome divino é como que corrigida. Entretanto, a ação da providência divina faz-se sentir a cada passo na sucessão dos acontecimentos sempre favoráveis ao povo eleito e que deram lugar à instituição da festa nacional do Purim. Trata-se, ainda aqui, da vingança, da violência e do orgulho nacional. O povo de Deus provou que tinha necessidade de uma redenção para aprender a colocar sua esperança em coisas mais altas. O livro de Tobias pode ser lido e relido sem excetuar-se trecho algum. No livro de Judite é particularmente notável a magnífica oração do cap. 9, no meio da cativante narrativa da libertação de Betúlia. No livro de Ester podemos ler com proveito as duas orações, de Mardoqeu e de Ester (cap. 13 e 14) e em seguida a intervenção de Ester junto ao rei Assuero (cap. 5 a 7).
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2I – Os dois livros dos Macabeus Os dois livros dos Macabeus eram, originariamente, dois escritos distintos um do outro. Provém-lhes o nome do sobrenome dado a Judas, filho de Matatias, por ocasião da terrível derrota que infligiu aos inimigos. Esse sobrenome tornou-se hereditário em toda a sua família. O Primeiro Livro dos Macabeus estende-se por um período de quarenta anos, do ano 175 até 135 a.C.. Foi redigido na Palestina, no começo do primeiro século antes da nossa era, em hebraico ou aramaico, tendo-se perdido esse texto primitivo. Possuímos hoje apenas um texto grego. Coloca-se o autor sob um ponto de vista religioso, salientando a predileção divina por Israel, a reação dos judeus que permaneceram fiéis contra o poder sírio que ocupava o seu território, e sua luta contra o paganismo grego que ameaçava invadir a comunidade israelita. Aconteceu isso na época iniciada logo após a morte de Alexandre Magno, em 323 a.C.. Seu império, por falta de um herdeiro de seu próprio sangue, foi dividido entre seus generais, passando a Palestina, juntamente com a Síria, a ser dominada pela dinastia dos Seleucos. Um dos seus sucessores, Antíoco Epifanes (175 -163 a.C.) esforçou-se de todos os meios para iniciar os judeus no espírito helênico. Eclodiu entre os judeus uma revolta, denominada macabaica, primeiro só de caráter religioso, e em seguida transformada numa guerra santa de independência, a qual se prolongou por um século, sob chefia dos descendentes dos Macabeus, terminando com uma verdadeira autonomia nacional. Foram os romanos, sob Pompeu, no ano 63 a.C., que reduziram definitivamente essa independência e sujeitaram os judeus. Dominados pela força, os judeus alimentavam implacável ódio contra os usurpadores de sua terra e viviam em perene expectativa de uma insurreição. Compreende-se que as esperanças messiânicas se foram tornando ainda mais generalizadas e vivas. O espírito judaico da época caracterizava-se por um misto de legalismo e nacionalismo. Semelhante era o ambiente por ocasião do aparecimento de Jesus Cristo. Nesse livro salienta-se particularmente os sentimentos de fé: uma fé ardente, acompanhado de um sentido quase exagerado da infinitude de um único Deus, de uma inviolável fidelidade à lei e de um apego fanático à cidade santa de Jerusalém. O Segundo Livro dos Macabeus, muito diferente do primeiro quanto ao fundo e quanto à forma, narra alguns episódios da primeira parte da luta, descrita no livro precedente. A obra foi redigida em grego, mais ou menos no ano 100 a.C., por um judeu que, cuidadosamente, resumiu um escrito não inspirado, composto por Jasão de Cirene no ano 160 a.C.. O escopo dessa obra é, antes de tudo, a edificação religiosa. Desse modo temos ante os olhos narrações mais episódicas do que históricas. São-nos apresentados heróis e ações heróicas que testemunham uma fé ardente e viva, que não arrefece nem mesmo perante o martírio. Sua finalidade imediata é avivar o sentimento patriótico dos judeus que residiam na Alexandria. Acha-se neste Segundo Livro dos Macabeus o testemunho de uma crença até certo ponto nova nos ensinamentos religiosos dos judeus: a fé na imortalidade da alma. É só neste livro e no livro da Sabedoria que se manifesta esse desenvolvimento na revelação, sendo ele o último a ser escrito antes do Evangelho.
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A leitura dos livros dos Macabeus apresenta menos riqueza em conteúdo religioso do que o resto dos livros históricos. Entretanto, algumas célebres passagens merecem toda a atenção. No primeiro livro são notáveis: o retrato de Judas Macabeu (cap. 3); a morte de Antíoco Epifanes (cap. 6); a aliança com os romanos (cap. 8); o governo de Simão (cap.14). No segundo livro recomenda-se: o prefácio (cap. 2); o episódio de Heliodoro (cap. 3); o martírio de Eleazar e dos sete irmãos (cap. 6 e 7).
3 – Livros Sapenciais 3A – Jó O livro de Jó é uma composição literária estreitamente aparentada com o gênero dramático, cuja ação nos é apresentada numa introdução e numa conclusão em prosa que enquadram um longo poema dialogado. O autor, aliás, desconhecido, situa sua composição em 500 a.C., em lugares e em situações assaz imprevistas. O personagem de Jó era, para os antigos israelitas, uma figura-tipo do justo sofredor. O assunto do poema é o problema do sofrimento. Três amigos (aos quais mais tarde se ajunta um quarto) apresentam-se a Jó para consolá-lo em suas desgraças: - inopinadamente ele se vira privado de todos os seus bens, de seus próprios filhos, e, ao mesmo tempo atingido em SUS própria saúde. Os amigos de Jó representam as idéias correntes em Israel: o sofrimento é um castigo; todo homem é pecador; apenas, porém, com uma idéia nova, a da missão educativa e purificadora do sofrimento. O problema embora ventilado de todos os lados, permanece sem solução. As piedosas e inofensivas consolações que os amigos propõem ao patriarca em seus sofrimentos, Jó responde com uma afirmação de sua inocência e com um apelo incessante a Deus, do qual sabe perfeitamente que procedem as suas provações. Então, Deus mesmo entra em cena: responde a Jó, reconhecendo que ele é um justo, mas que não procedeu com bastante retidão, pretendendo perscrutar os desígnios de Deus. Enviando provocações aos homens, o Senhor é ao mesmo tempo justiça e bondade. Ao homem toca humilhar-se com paciência e esperança na sua presença, sem querer desvendar os planos misteriosos do Criador. Portanto, o problema do sofrimento não é resolvido totalmente. Cumpriria ao homem esperar a satisfatória solução que lhe seria dada pela voluntária paixão e morte de Jesus Cristo; só então é que a mente humana poderia descobrir o sentido divino e eterno do sofrimento e tirar dele não só a conformidade com os decretos divinos, mas ainda a verdadeira paz e as consolações celestiais. Esse poema, composto num estilo totalmente oriental, estende-se longamente em discursos extenuantes. Entretanto, alguns capítulos podem ser enumerados entre as composições mais belas de toda a bíblia.
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Tais são: o prólogo (cap. 1 e 2); a primeira queixa de Jó (cap. 3); as lamentações do justo (vários capítulos); o apelo a Deus (cap. 12 a 14); as obras de Deus e seu governo (cap. 36 e 37); as palavras de Deus sobre as maravilhas da criação (cap. 38 a 42).
3B – Salmos O Saltério era o livro de oração dos antigos judeus. Também para os cristãos ele tornou-se o livro dos enlevos espirituais, depois de tê-lo sido para o próprio Jesus Cristo. A palavra salmo (psalmus) é a tradução do termo hebraico que quer dizer louvores. Entretanto, esse termo exprime apenas um aspecto do conteúdo desse livro, no qual se encontram lamentações, cânticos de penitência e de reconhecimento, poemas didáticos e suplicias ardentes. Os salmos eram cânticos destinados principalmente ao uso litúrgico do templo de Jerusalém, mas neles percebe-se muitas vezes o eco de sentimentos religiosos inteiramente pessoais. Já em remota antiguidade, muitos desses cânticos tinham sido reunidos em coleções, das quais encontramos alguns traços na divisão atual em cinco livros. Foram certamente os autores dessas coleções que lhes inseriram as conclusões ainda hoje existentes. Parece averiguado que essas coleções foram sendo feitas independentemente uma das outras; daí não nos podermos admirar se encontrarmos algumas repetições. Foram esses mesmos redatores que, por vezes, ajuntaram dois salmos num só e que escreveram os títulos que ainda hoje lemos em muitas dessas composições. Em todo caso, essas inscrições são antiguíssimas. Conservaram-nos elas o nome do provável autor e várias circunstâncias da composição dos salmos, apresentando expressões assaz obscuras a respeito da sua execução musical e do seu emprego litúrgico. Quando os Salmos foram traduzidos para o grego, a significação exata dessas inscrições era duvidosa; hoje muitas vezes podemos apenas conjecturar o que elas significavam. O mesmo se deve dizer da palavra sela que aparece no fim de numerosas estrofes. Essa palavra, em vista de seu sentido obscuro, foi omitida na presente tradução. Ignora-se quando e quem reuniu a última coleção dos cincos livros em uma única, a que nos foi conservada. As inscrições do texto original atribuem 74 salmos a Davi, 10 aos filhos de Coré, 8 a Asaf, 2 a Salomão, e 1 respectivamente a Hemão, a Etão e a Moisés. É difícil averiguar o valor histórico exato desses dados. Entretanto, não há motivo para duvidar que numerosos salmos provenham do rei Davi. Sejam quais forem seus autores humanos, a inspiração divina revestiu sua beleza natural de um profundo sentido religioso, que fez deles, para sempre, uma inexaurível fonte de vida religiosa e de piedade. Essas composições dirigiram-se, em primeiro lugar, aos judeus. Daí, serem impregnadas do espírito judaico, que ainda não tinha atingido a plenitude da caridade cristã. Como em outras passagens do Antigo Testamento, a justiça divina é descrita nos salmos de um modo rude e forte. Muitas vezes, o ruído das armas perturba a calma da oração. Entretanto, urge considerar: primeiro, a mentalidade própria dos hebreus, segundo a qual só Deus era o rei do povo, que os levava a considerar como inimigos de Deus os inimigos do povo eleito; assim, estes deviam ser julgados severamente. Em seguida, o crente sabia que o poder do inimigo devia ser destruído no futuro, porque assim o exigia a santidade de Deus. Dessa forma, a vingança, expressa com tanta violência, era atribuída ao próprio Deus; daí o fato de sua misericórdia acompanhar sua justiça. Não nos afastaremos, portanto, do verdadeiro espírito
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dos salmos, ao procurar penetrar no cerne espiritual que está por debaixo da casca dura, e aplicá-lo às nossas lutas interiores, como outros tantos apelos veementes ao auxílio divino. Muitas vezes o homem vê-se inclinado para as coisas terrenas e mal consegue rezar. “Não sabemos o que devemos pedir, nem rezar como convém”, dizia São Paulo (Rom 8,26). Nos salmos deparam-se-nos maravilhosos formulários de oração que nos ensinam como devemos nos dirigir a Deus. Em sentido verdadeiro e profundo, os salmos só poderão ser devidamente interpretados por aquele que crê em Jesus Cristo. Isto é evidente quanto aos salmos messiânicos. Mas a mensagem de outros salmos, como de inumeráveis textos bíblicos, só encontra sentido verdadeiro à luz da vida do Senhor Jesus. Os sofrimentos do justo, por exemplo, são, nos salmos, uma clara imagem dos tormentos suportados por Jesus na sua Paixão. O saltério é, em verdade, o livro de oração da Igreja e da alma cristã. Eis uma relação dos mais belos salmos, agrupados de acordo com seu sentido geral: Salmos de confiança: 22, 26, 120, 130; Ensinamentos da sabedoria: 1, 31, 36, 118; Meditações: 8, 9, 11, 35, 38, 48; Louvores: 7, 18, 28, 46, 92, 95, 96, 97, 145; Salmos reais ou messiânicos: 2, 18, 19, 20, 21, 44, 68, 71, 109, 144; Lamentações e orações intensas: 24, 31, 32, 43; Ações de graças: 33, 65, 102, 135.
3C – Provébios Por uma ficção literária, o Livro dos Provérbios é atribuído a Salomão. Menciona, com efeito, o Primeiro Livro dos Reis (4, 29-34) que Salomão produziu numerosíssimos provérbios de sabedoria. Na realidade, o livro dos Provérbios é uma coleção composta de oito partes; 1 – A primeira é formada por seis exortações, entrecortadas de evocações poéticas, nas quais a sabedoria personificada entra em cena e pronuncia os seus discursos. 2 – A grande coleção salomônica de provérbios que tratam dos vários estados da vida. 3 e 4 – Duas pequenas coleções, atribuídas aos “sábios”. 5 – Provérbios salomônicos recolhidos “pela gente do rei Ezequias”. 6 – Um fragmento atribuído a Agur, filho de Jaque, autor aliás desconhecido. 7 – Uma coleção de conselhos de uma rainha-mãe ao seu filho. 8 – Enfim um poema acróstico, seguindo as letras do alfabeto, que faz o elogio da mulher forte. Entre as sentenças contidas nesse livro, grande número é de origem popular, como os rifões. Importante fragmento (cap. 10 a 22 e cap. 25 a 29) é atribuído a Salomão, sem que se possa saber com exatidão a parte que esse rei teve na sua redação. Ressalta no livro dos Provérbios um conceito puríssimo de Deus, de um Deus insondável, justo, benevolente, misericordioso e criador. Do ponto de vista moral, a humanidade é dividida em duas categorias: os sábios e os insipientes. Por sábio deve-se entender todo aquele que é inteligente, bem avisado, virtuoso e íntegro. Entre os insipientes devem ser enumerados os
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maus, os mentirosos, os negadores, os ladrões, os malfeitores, os perjuros. O autor insiste particularmente nas virtudes da caridade, da justiça, da moderação e da discrição. Por outro lado, ele investe contra os vícios da embriaguez, da gula, da luxúria e da preguiça. De modo especial acentua a piedade filial e a educação das crianças. Em todo o livro se manifesta viva fé numa retribuição, recompensa ou castigo. Mas não existe ainda a idéia de uma vida eterna. A moral, tal como lemos neste livro, poderá parecer, a uma consideração superficial, muito primitiva. De fato, os autores dos Provérbios limitaram sei interesse a normas de caráter prático. Entretanto, os sábios israelitas sabiam proclamar que a verdadeira sabedoria ultrapassava infinitamente a simples virtude da prudência. Assim é que aí se nos depara a célebre máxima: “O temor ao Senhor é o começo da sabedoria” (1, 7 e 9, 10). Essa sabedoria só pode provir de Deus mesmo (8, 22); é ela que nos faz compreender algo da justiça e dos juízos de Deus (2, 5-9), como é ela também que produz a verdadeira humildade (15, 33).
3D – O Eclesiastes Este livro apresenta-se como uma série de meditações sobre a instabilidade da vida humana, entrecortadas várias vezes por uma sorte de estribilho que indica a linha diretriz que o autor tinha em mente: “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. Desconhecemos o autor, que coloca suas reflexões na boca do "Eclesiastes". Nesse personagem vê-se uma alusão ao rei Salomão, que a tradição judaica considerava como a personalização da sabedoria. O último redator do livro, que lhe deu a forma atual, deve ter vivido no terceiro século a.C.. Para o autor, como para seus contemporâneos, todos os homens vão, depois da morte, para um único e mesmo lugar, o cheol, ou a região dos mortos. A existência desse lugar é descrita como uma existência sem consolações, nas trevas, sem felicidade alguma, onde nenhuma relação mais se tem com que acontece na terra. Essas ideias sombrias a respeito da vida e da morte formam a base do pessimismo que se desprende desse escrito. Entretanto, o autor alia a esse pessimismo um espírito de profunda religiosidade. Ele insiste na disposição sempre sábia, embora impenetrável, da providência divina. Tudo que há de bom na vida, é Dom de Deus. Um dia, o homem deverá prestar contas ao seu Criador de todos os atos praticados na terra. Essas considerações conservam seu valor para todos os tempos. A piedade é o principal meio de alcançarmos nosso destino. Toda a moral do livro resume-se nos seus últimos versículos: "como conclusão geral, teme a Deus e observa os seus preceitos; eis aí o homem todo".
3E – O Cântico dos Cânticos Denomina-se Cântico dos Cânticos (expressão esta que significa: o mais belo dos cânticos) uma coleção de poemas que, originariamente, devem ter sido destinados às solenidades nupciais.
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O amor humano - por mais estranho que isso possa parecer - foi escolhido como tema para esses poemas inspirados. O amor que une o homem e a mulher no casamento foi querido por Deus no plano da criação: ele é em si uma coisa boa e digna de ser enaltecida. Por outro lado, as festas nupciais eram para os antigos judeus uma ocasião propicia para a manifestação de sua fé nos destinos da nação escolhida, que era considerada a esposa do Senhor. Na união dos novos nubentes viam com religiosa alegria como a Aliança divina se ia perpetuando. O amor humano tornava-se-lhes, portanto, um verdadeiro símbolo da Aliança de Deus com seu povo. O Cântico foi considerado e lido pelos judeus, desde a sua origem, como um cântico de amor de Deus para com seu povo. Uma comunidade que não duvida interpretar dessa forma esses poemas compreende perfeitamente que esse amor divino, assim expresso, solicita por sua vez a resposta do amor humano. O Cântico prega a fidelidade. A Igreja cristã, estendendo ainda mais o simbolismo desses hinos, nunca cessou de ver neles uma figura do amor de Cristo para com sua Igreja, considerada sua esposa. O Cântico celebra então a satisfação única e perfeita que a alma cristã encontra no seu Bem-amado. Convém por fim mencionar a liturgia da Igreja que se utiliza das palavras do Cântico para celebrar o amor da Virgem Santíssima para com seu Filho.
3F – A Sabedoria O conteúdo deste livro é um louvor à sabedoria Divina. Na primeira parte, o autor mostra a sabedoria nas obras da vida de cada homem, sendo recompensada pela vida eterna. Na segunda parte, expõe o papel que a sabedoria representou na vida do rei Salomão. Ainda numa terceira parte, apresenta a sabedoria em ação: na criação, na história da humanidade e em particular na história do povo de Deus. Ao tratar do reino de Salomão, a sabedoria é descrita como uma irradiação do Deus Altíssimo. A finalidade do autor, que se dirige aos judeus moradores do Egito, é acautelá-los contra um duplo perigo, a saber: serem desencaminhados pela filosofia grega, e serem tentados a abandonar o culto de um deus único. Ele quer mostrar que o conceito judaico da vida nada tem a invejar da sabedoria profana do paganismo. Ao contrário, é ela que proporciona ao homem a imortalidade. Só essa sabedoria, que tira sua origem de Deus, é um guia seguro para a nossa vida religiosa e moral, como uma salvaguarda contra a idolatria, iluminando a história de Israel e os terríveis castigos que o culto aos deuses falsos arrasta para si. Mui provavelmente o livro da sabedoria foi escrito em grego. Todavia, o estilo de sua primeira parte faz pensar na poesia hebraica; no restante do livro o estilo é mais livre e aproxima-se da língua grega. O desconhecido autor apresenta-se, por vezes, falando na pessoa de Salomão, circunstância essa que levou outrora muitas pessoas a atribuírem toda a obra ao grande rei de Israel. Mas trata-se de uma ficção literária, como no livro do Eclesiastes. O autor deve ter escrito para os judeus que falavam grego e que viviam fora da Palestina, provavelmente no Egito. Não nos é possível determinar com exatidão a data de sua composição, provavelmente durante o último século que precedeu a nossa era. A convicção profundamente religiosa que emana de todas essas páginas já muito se aproxima da revelação do Novo Testamento. Esse livro não é citado nos Evangelhos, nem em São Paulo;
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mas numerosas passagens, principalmente na Epístola dos Hebreus, fazem alusões evidentes a certos trechos da Sabedoria. Esse livro do Antigo Testamento contém as primeiras revelações sobre imortalidade da alma e a seu destino eterno, e estabelece, portanto, uma digna transição entre a antiga Aliança e a plena revelação evangélica.
3G – O Eclesiástico Este livro leva, no texto grego, o título de Sabedoria de Jesus, filho de Sirac. Na Igreja latina, foi-lhe dado o título de Eclesiástico, ou livro da Igreja, porque era usado com grande frequência na Igreja, para instrução dos fiéis. Trata o autor de todos os aspectos da vida humana: exortações aos maridos, às mulheres, aos pais, aos filhos, aos senhores, aos homens da lei, aos anciãos. Deparam-se-nos aí pequenos tratados sobre a riqueza e sobre a pobreza, sobre o comércio e sobre a educação, sobre o modo de proceder em geral e em particular e sobre a hospitalidade. Todos esses assuntos são considerados sob um ponto de vista religioso. Apresenta-se o autor com o nome de Jesus, filho de Eleazar, filho de Sirac. Era um escriba originário de Jerusalém. Por essa razão, o livro do Eclesiástico muitas vezes é designado simplesmente pelo nome de Sirac. Esse livro deve ter sido escrito no ano 200 a.C.. Decorria então um período agitadíssimo, devido às disputas da Palestina por parte dos reis da Síria e do Egito. O livro do Eclesiástico, tal como a Igreja cristã o encontrou na tradução grega em uso no tempo dos apóstolos, só foi incorporado muito mais tarde na coleção dos escritos inspirados; por essa razão, os judeus e os protestantes não reconhecem a sua canonicidade. O texto do Eclesiástico passou por várias alterações no decorrer dos séculos. Perdeu-se o texto hebraico original. Entretanto, foram encontrados no fim do século passado importantes fragmentos. O texto grego que possuímos é uma tradução feita pelo neto do autor, para pô-lo à disposição dos judeus egípcios, os quais na época em que escreveu, já não conheciam o hebraico e o aramaico.
4 – Livros Proféticos Os Profetas Profeta, no feminino profetisa (do grego: πρoφήτης, prophétes) pode significar a pessoa que é capaz de predizer acontecimentos futuros; ou ainda uma pessoa que fala por inspiração divina ou em nome de Deus. Aos falsos profetas aplicava-se a pena de morte, na Lei Mosaica. O livro do Antigo Testamento, revela antes de serem comumente chamados profetas, tais pessoas eram chamadas de videntes. É um nome sugestivo que descrevia as pessoas a quem Deus revelava os acontecimentos futuros, por meios de sonhos, visões ou aparições de anjos. Eram escolhidos por Deus e tinham enorme autoridade religiosa e influência. Normalmente, eles eram tidos como conselheiros e instrutores da Lei de Deus.
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A expressão "filhos dos profetas", designava todos aqueles que se tornavam discípulos e ministros ajudantes (ou seja, servidores) dos profetas do Antigo Testamento. A expressão "os Profetas", pode referir o conjunto de livros escritos pelos profetas. O profeta é visto como instrumento de algo divino, algo sobrenatural, onde é falado a situação presente futura e passada. O profeta é uma figura chave em muitas religiões: judaísmo, cristianismo, islamismo e outras. Nem todos os reis de Israel foram fiéis a Deus e alguns adoraram outros deuses. Josias destruiu o lugar de culto a Bethel que Jeroboão tinha edificado quando o Reino foi dividido. Depois foi por todas as cidades para destruir os altares. Apesar das bênçãos de Deus, o povo hebreu muitas vezes violou a Aliança com Deus, pelo pecado. Em resposta Deus enviou-lhes os Profetas, cuja missão era a de chamar o povo ao arrependimento, a mudar os seus caminhos perversos e voltar ao cumprimento da Aliança com Deus. Os Profetas foram enviados por Deus primariamente para levarem o povo a mudar a sua vida para o cumprimento da Aliança feita entre ele e Deus. A missão dos Profetas não era principalmente a de anunciar o futuro, embora o fizessem com a inspiração de Deus. A mensagem dos Profetas foi algumas vezes anunciada com palavras ásperas para convencer o povo dos seus pecados e para o levar ao arrependimento (pela violação da Aliança) e mudança de estilo de vida, mas outras vezes foi uma mensagem de esperança e consolação, nas aflições que resultaram dos seus pecados de infidelidade. O verdadeiro Profeta falava, não com as suas próprias palavras, mas com a palavra de Deus, sob a inspiração do Espírito Santo. Uma Profecia é uma mensagem de verdade recebida de Deus e transmitida através de um Profeta que serve de intermediário entre Deus e o Seu povo, e que diz coisas do futuro que nunca se saberiam de outro modo: As profecias do Antigo Testamento são únicas na sua origem, por causa do seu conteúdo ético e religioso, que incluem a revelação da vontade salvífica de Deus para com o Seu povo, censuras morais, avisos sobre o castigo divino por causa das violações da Lei e da Aliança, em forma de promessas, admonições, repreensões e ameaças. Embora Moisés e outras figuras do passado sejam considerados como Profetas, o período das Profecias é geralmente considerado desde os primeiros tempos da monarquia até cerca de 100 anos depois do exílio da Babilônia. Desde o tempo da Lei escrita e interpretada, os Profetas são considerados como os guias do povo. Os Profetas do Antigo Testamento são citados no Novo Testamento com a consciência de que Deus falou através deles e de que alguns foram os oráculos de Deus, e isto foi plenamente demonstrado por Cristo. João Batista é a figura profética proeminente do Novo Testamento. Cristo nunca desejou para Si o título de Profeta embora muitas pessoas afirmassem que Ele o era, pelo que anunciava e porque disse a Seu respeito que "Um profeta só é desprezado na sua terra" (Mt. 13,5 7). Na Sinagoga de Nazaré, Jesus, depois de ler uma passagem do profeta Isaías, acrescentou: - «Cumpriu-se hoje mesmo o passo da Escritura que acabais de ouvir». (Lc 4,21). Houve Profetas na primitiva Igreja e S. Paulo menciona o carisma da Profecia: - Procurai a caridade e aspirai aos dons espirituais, sobretudo ao da profecia, (1 Cor. 14,1).
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- O que profetiza edifica a Igreja de Deus. Quisera eu que todos vós falásseis línguas, mas sobretudo que profetizásseis, (1 Cor. 14,4-5). A Profecia desapareceu após os tempos do Novo Testamento, e o Apocalipse (ou Revelação) é considerado como o único livro profético do Novo Testamento. Há na Bíblia 18 Livros Proféticos: São 17 do Antigo Testamento: - 5 Profetas maiores: Isaías, Jeremias, Baruc, Ezequiel e Daniel. - 12 Profetas menores: Oseias, Joel, Amós, Jonas, Miqueias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias. Há apenas 1 no Novo Testamento: Apocalipse. O estudo dos livros dos profetas, sejam eles considerados maiores ou menores, é fundamental ao amadurecimento da Igreja. Não podemos esquecer que o Antigo Testamento era a Bíblia que Jesus lia. Ele mesmo fez menção da mensagem dos profetas ao revelar-se, após a ressurreição, na estrada de Emaús, quando discorria a respeito do cumprimento das profecias a seu respeito (Lc. 24, 27-32). Ainda hoje, quando meditamos na Palavra de Deus, nosso coração arde através da chama do Espírito, que nos instiga à fé nessas palavras fieis e verdadeiras e dignas de toda aceitação.
Os Profetas
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4A – Isaías Isaías é considerado, em geral, como o maior dos profetas de Israel. Nascido por volta do ano 760 a.C., de uma família nobre do reino de Judá, foi chamado por Deus no ano 740 a.C. ao ministro profético, que exerceu por cerca de 50 anos. O livro de Isaías compõe-se de duas partes muito distintas. Os 39 primeiros capítulos, que contém frequentes alusões a Isaías e ao seu tempo, são perfeitamente inteligíveis no ambiente dos acontecimentos dos reinados de Osias, de Joatão, de Acaz e de Ezequias. Os capítulos 40 a 66, ao contrário, supõem uma época muito diferente e posterior. Dirigir-se-ia então o profeta aos israelitas deportados, ou já reintegrados na sua pátria, como se ele vivesse no meio deles. Tal é a opinião que presentemente prevalece entre os católicos. Entretanto, cumpre notar que a maioria dos intérpretes, que se manifestaram até há poucos anos, opinavam que também esses últimos capítulos deviam ser atribuídos ao próprio Isaías. Seja qual for a solução do problema, urge que o leitor, que quer compreender com exatidão a segunda parte do livro, a leia a luz dos acontecimentos do exílio e da restauração de Israel. Podemos considerar Isaías como o profeta da justiça. Insurge-se ele contra a idolatria e os abusos sociais que se alastravam no seu tempo; ele ameaça os ricos e os poderosos e eleva sua voz contra os hipócritas e todos aqueles que levavam vida frívola. Com grande veemência ele chama o povo ao arrependimento e à fé. Um terrível julgamento divino vai desencadear-se sobre Israel: as nações pagãs serão as executoras desse julgamento, mas também elas, por sua vez, serão castigadas e destruídas. Quanto a Israel, um "resto" será salvo. Todos esses oráculos estão impregnados da mais firme esperança num rei glorioso que há de vir e restaurar a ordem no mundo: o Messias, O Príncipe da Paz. Na segunda parte do livro, Isaias apresenta-se como o profeta da consolação e da esperança. Depara-se-nos aí um conceito majestoso de Deus, o criados e soberano Senhor, vencedor do mundo e salvador do seu povo. É principalmente notável a série de misteriosos poemas que se referem ao servo do Senhor. Não sabemos ao certo que figura daquele tempo é mencionada por esse enigmático personagem. Pensaram alguns em Ciro, rei dos Persas, que reintegrou os israelitas à sua pátria; pretenderam outros interpretar esse passo como uma figura da nata do povo, esse pequeno resto, ao qual o profeta tantas vezes se refere. Mas a tradição cristã sempre descobriu nesses trechos uma belíssima imagem de Jesus Cristo: porque o servo do Senhor não é apenas um chefe dedicado e amante, um mediador, um salvador, mas é chamado também de homem das dores, título aplicado por excelência a Jesus, que salvou seu povo pelos seus próprios sofrimentos. O capítulo 53 de Isaías pode ser considerado como o auge da profecia: aí Deus se manifesta como já mais o tinha feito. Só mesmo o Evangelho pode ser comparado a essa mensagem. Quanto as profecias contra as nações pagãs, devemos notar: era uma ideia comum entre todos os profetas que os crimes do povo eleito seriam punidos por Deus. Senhor da História, Deus
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serve-se dos acontecimentos para dar uma lição aos homens. Assim é que os Assírios, depois os Caldeus, os Egípcios e os pequenos povos vizinhos da Palestina aparecem como o instrumento da vingança divina. Entretanto essas nações conquistadoras serão castigadas por Deus a seu tempo e cairão sob os golpes de outras mais poderosas que elas. Entre as passagens mais célebres de Isaías notemos as seguintes: censuras a Jerusalém (1 a 5); vocação do profeta (cap. 6); o reino do Messias (9 e 11); cânticos dos resgatados (cap. 26); felicidade dos tempos messiânicos (cap. 36); anúncio da libertação (cap. 40); o servo do Senhor (cap. 42 a 55); a glória da nova Jerusalém (60 e 61); orações no tempo da angústia (62 a 64).
4B – Jeremias A pessoa do profeta Jeremias é atraente de um modo todo particular. Ao passo que os oráculos dos outros profetas pouco ou nada nos revelam sobre as pessoas dos seus autores, o livro de Jeremias, ao contrário, é cheio de episódios e de poemas que se relacionam com a própria pessoa do profeta, e nos conservam vários acontecimentos de sua carreira, bem como os seus sentimentos, suas lutas interiores, seus sofrimentos. Nasceu Jeremias de uma família sacerdotal em Anatot, aldeia da Judeia, por volta de 650 a.C.. O tempo de sua profecia se se estendeu por cerca de 40 anos, tomando ele a palavra pela primeira vez sob Josias, em 622 a.C., na época em que foi descoberto no templo de Jerusalém um exemplar do livro da lei, identificado como o Deuteronômio. A tarefa do profeta era austera: temperamento tímido e hesitante, coração ardente e sensível, Jeremias viu-se obrigado a ser, contudo, o profeta das desgraças. Esta era sua missão tornou-o objeto da ira daqueles cujos abusos e pecados ele não cessava de combater. Foi caluniado, preso e correu o risco de perder a vida. Acusavam-no de derrotismo, porque ele aconselhava aos que tinham escapado do primeiro sítio da cidade a não se revoltarem contra os Caldeus, procurando asilo no Egito, o que traria consigo terrível repressão da parte dos vencedores. Ele predissera aos deportados um longo exílio de 70 anos. O rei destruiu o volume no qual estavam consignados esses oráculos. Prendem o profeta numa cisterna como fundo cheio de lodo, por onde ele é libertado por um escravo do rei. Jeremias, sempre destemido, apesar de seu caráter tímido, continua a prever a queda de Jerusalém, mas anuncia que haveria ainda uma esperança no porvir. Quando esse desastre sobreveio, em 586 a.C., o profeta assistiu às deportações, ficando, porém, com alguns pobres agricultores autorizados a permanecer na Palestina. Alguns deles, tomados de pânico, fogem para o Egito, levando-o consigo à força. Jeremias anuncia ainda a invasão do Egito e entrevê e prediz o fim do exílio. Morreu em Tafnés, no Egito, sem dúvida por volta do ano 586 a.C.. O sentido geral do livro de Jeremias consiste na interpretação providencial da catástrofe nacional que ele anunciou e viveu: Deus, implacável juiz, serve-se da ruína do seu povo para levá-lo, de acordo com um plano preestabelecido, ao perdão e à renovação da Aliança, fruto da misericórdia e da graça.
A pessoa de Jeremias, símbolo do justo sofredor, reveste-se de excepcional importância. Tornou-se ele um prenúncio de Jesus Cristo, o homem das dores, habituado ao sofrimento por
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causa dos pecados do seu povo. São as queixas diante das injustiças, de que ele foi vítima, que servem ainda hoje, nos ofícios religiosos da Semana Santa, para exprimir a dor e os sofrimentos internos do divino Salvador. Eis aqui algumas passagens de relevante importância: a vocação do profeta (cap. 1); os oráculos contra os juízes infiéis (2 a 7); contra a idolatria (cap. 10); os sofrimentos e queixas do profeta (15 e 18 a 20); as ações simbólicas (cap. 19 e 24); as promessas da restauração 930 e 33); o episódio da vida do profeta (36 a 44).
4C – Lamentações Compõe-se este escrito de cinco poemas ou lamentações fúnebres. Os quatro primeiros são exarados, como alguns salmos e o elogio da mulher forte, em forma de acróstico, começando cada estrofe por uma letra do alfabeto. O quinto é uma oração. Foram compostos durante os anos que se seguiram à destruição de Jerusalém, em 586 a.C.. Não podemos afirmar com absoluta certeza se foi Jeremias seu autor, todavia não é impossível que o tenha sido. Esse livro era lido todos os anos na comunidade judaica, no dia do aniversário da destruição do templo, e era destinado a levar seus ouvintes a reconhecer as próprias faltas e a excitá-los a uma nova confiança na misericórdia de Deus que, apesar de tantos castigos infligidos ao seu povo, permanecia sempre fiel às promessas e à Aliança eterna.
4D – Baruc Os historiadores contemporâneos estão de acordo em não reconhecer em Baruc o mesmo personagem que serviu de secretário a Jeremias, embora lhe seja homônimo; deve ter sido um profeta posterior a restauração. A primeira parte foi possivelmente composta em hebraico, mas só possuímos hoje o texto da tradução grega; consiste numa magnífica exortação à penitência. A segunda parte, provavelmente escrita em grego, abrange, além de um majestoso poema À sabedoria, como único meio de chegar-se a Deus, um veemente apelo à coragem, à resignação e à esperança. Uma carta de Jeremias aos cativos foi acrescentada, em época desconhecida, ao livro de Baruc. Parece ter sido uma tradução livre do cap. 10 de Jeremias contra a idolatria.
4E – Ezequiel Quando Jerusalém foi tomada pela primeira vez por Nabucodonosor, em 599 a.C., o rei, as autoridades do reino, os altos comerciantes e sete mil guerreiros foram deportados para Babilônia. Não se tratava propriamente de um cativeiro, mas de um exílio. Receberam os deportados autorização para se estabelecerem onde quisessem, para cultivar terras, comerciar e dedicarem-se às industrias e, por fim, para se organizarem em comunidades. O que mais lhe causava pesar não era propriamente o cativeiro, mas as saudades da pátria e da vida religiosa nacional, bem como a decepção de se verem misturados com povos pagãos. Israel conheceu nesse momento uma época de sombrio desespero.
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Infelizmente, sob a influência dos pagãos, o povo eleito foi-se deixando corromper e foi adotando os ritos, da idolatria e os costumes depravados dos vencedores. Foi então que surgiu Ezequiel, em 593 a.C.. Enviado por Deus aos deportados, cuja vida manifestava que não tinham compreendido a lição do castigo. Ezequiel exercia no exílio a mesma missão de Jeremias, relativamente aos israelitas permanecidos na Palestina. Ao povo que ainda guardava falsas esperanças, anunciou a destruição de Jerusalém. Realizouse esta, e uma nova deportação veio aumentar o número de exilados. Interpreta-a o profeta como um castigo divino pela infidelidade, principalmente dos chefes, que em geral deram ao povo o exemplo da corrupção. É esse o assunto dos 33 primeiros capítulos desse livro. Mas a mensagem do profeta daí em diante muda de caráter. Ei-lo que exalta o novo Pastor do povo de Deus, anunciando a ressurreição de Israel, a restauração do templo e o restabelecimento de uma ordem de coisas onde, sob a direção divina, reinará a justiça. Entre os profetas, Ezequiel é conhecido pela linguagem intrépida e pelo estilo imaginativo. A visão na qual Deus lhe revela sua missão tornou-se célebre (cap. 1 a 5). Foi-lhe dado contemplar a glória divina. Apesar da detalhada descrição que aí lemos, mal podemos representar com exatidão essa aparição divina. Com efeito, Deus não pode ser descrito. É impossível à inteligência humana compreender a divindade. Ante a glória divina toca ao homem humilhar-se sem discutir. Deparam-se-nos particularmente três trechos que podem causar espanto pelas suas expressões ousadas: os capítulos 16, 20, 23. Para compreendê-los devidamente, urge lembrarmo-nos de que o profeta compara a união do povo eleito com seu Deus à união de um esposo com sua esposa. Ele chama de adultério toda infidelidade para com Deus, e prostituição, todo ato de idolatria. Os capítulos 34 a 36, que se referm à restauração, devem ser lidos cautelosamente, bem como o capítulo 37, que, pela famosa visão dos ossos ressequidos, anuncia a renovação que Deus sabe operar nas almas desesperadas. Nos capítulos 40 a 48, lemos a visão do novo templo e do estado judaico: devemos interpretálos mais como um sermão do que como um plano verdadeiro. O sentido dessa descrição consiste em salientar que o santuário e o culto divino centralizarão toda a vida nova.
4F – Daniel Daniel é um israelita levado à Babilônia entre os deportados por Nabucodonosor. Jovem, era possuidor de uma fé ardente e de um patriotismo violento. Ele deve ser tido não tanto como autor do livro que traz seu nome, mas como seu herói principal. Com efeito, esse escrito foi redigido em três línguas: hebraico, grego e aramaico; ora, os dois últimos idiomas não eram ainda utilizados no tempo em que o livro coloca o profeta. Seu redator, que escreveu certamente no segundo século a.C. serviu-se de documentos anteriores, que podem remontar até a própria época de Daniel.
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Notáveis e interessantes são as seguintes passagens: o sonho da estátua (cap. 2); o festim de Baltazar (cap. 5); a cova dos leões (cap. 6), a oração de Daniel (cap. 9); os tempos messiânicos (cap. 12); a história de Susana (cap. 13).
4G – Oséias O profeta Oséias era oriundo do reino do Norte. Seu ministério parece ter começado no fim do reino de Jeroboão II (787 a 746 a.C.). Exerceu ele esse mesmo ministério profético até o reinado de Manaem (745 a 735 a.C.). Toda a sua profecia é uma descrição das infidelidades de Israel para com seu Deus; pela primeira vez na Bíblia, a união de Deus com seu povo é comparada por ele com o noivado. Essa imagem será empregada de novo por quase todos os profetas que o seguirão. Oséias insiste no caráter moral dos castigos que ele anuncia, e põe um acento particular sobre o amor de Deus para com seu povo.
4H – Joel O profeta Joel só nos é conhecido por seu poema. Sabe-se que ele profetizou no reino de Judá, e sobretudo em Jerusalém, de onde era originário. Ele mostra o conhecimento do culto, o amor do povo e acultura religiosa que se espera encontrar num membro da classe sacerdotal. Por falta de indicações cronológicas e de indícios decisivos, os autores discordam quanto ao tempo em que ele viveu; mas, segundo o parecer de muitos, terá ele vivido depois do exílio. Muitas circunstâncias levam a pensar que ele conheceu o livro de Amós.
4I – Amós Amós era pastor em Técua, localidade vizinha de Belém. Camponês de alma religiosa, no meio da prosperidade do reino de Jeroboão I ele só prega ameaças e anuncia castigos. Insurgi-se contra as injustiças sociais que devastam a Samaria: opressão dos pobres e corrupção dos juízes. Insiste no castigo do reino do Norte, mas dá a entender que também o reino de Judá será punido por sua idolatria. A perspectiva messiânica é descrita por ele sob a imagem de uma extraordinária prosperidade agrícola.
4J – Abdias Parece que a composição do oráculo desse profeta, em parte desconhecido, deve ser fixada na época do exílio. O oráculo é dirigido contra Edom, que é censurada por alegrar-se com a ruína de Jerusalém: a vingança de Deus vai atingi-la da mesma forma que aos outros pagãos.
4K – Jonas O livro de Jonas é colocado entre os profetas, porque conta as aventuras de um profeta que tem esse nome. No segundo livro dos Reis 14, 25, fala-se de um profeta Jonas contemporâneo de Oséias e de Amós, mas não foi este quem escreveu o livro de Jonas. O livro em apreço foi redigido depois do exílio de Babilônia.
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Muitos perguntam se é preciso tomar à letra a narrativa maravilhosa de Jonas. Com São Gregório Nazareno, cremos que é preciso ver aí um ensinamento religioso velado sob as formas de uma parábola. Esse ensinamento é muito importante: Jonas, enviado a Nínive, significa que Deus chama ao perdão não somente os judeus, mas também os pagãos. Jonas, recusando ir até lá significa que os judeus são ciosos de seus privilégios. Isso é claramente expresso no último capítulo, quando Deus mostra a Jonas que, se ele se preocupa com uma árvore que o sol secou, não é de estranhar que Deus se preocupe com todo um povo que deseja converter-se.
4L – Miquéias O profeta Miqquéias era judeu originário de Moreset, aldeia vizinha de Hebron. Foi contemporâneo de Isaias. Profetizou a ruína de Samaria, sobrevinda em 722 a.C. e anunciou ao reino de Judá um castigo semelhante. Sabe-se por uma passagem de Jeremias (26, 18-19) que sua pregação causou profunda impressão em Jerusalém. É possível que os oráculos dos capítulos 4 e 5 contenham um quadro da restauração messiânica, relacionando-se com a época da reforma religiosa de Ezequias.
4M – Naum A vida desse profeta é desconhecida. Ignora-se onde se situava a aldeia de Escosh, de onde ele era originário. O oráculo que nos é conservado a esse respeito descreve antes de tudo o julgamento divino que se exerce no mundo, e em seguida manifesta uma alegria transbordante com a ruína de Nínive (608 a.C.).
4N – Sofonias Sofonias exerceu seu ministério sob o reinado de Josias, por volta do ano de 625 a.C.. É um profeta justiceiro que anuncia o dia do Senhor sob a figura de um sacrifício ritual, em que todos serão castigados, salvo os que praticarem a justiça, a humildade e a obediência à lei de Deus. Ao anúncio do castigo sucede uma perspectiva messiânica: o nome de Deus será glorificado entre os pagãos, e Israel, purificado pela prova, será restaurado na amizade divina.
4O – Habacuc Este oráculo parece pertencer à época que se seguiu à batalha de Carquêmis, em 605 a.C. Anuncia a invasão iminente dos caldeus. Habacuc é um profeta filósofo que parece ter sido um dos primeiros israelitas a pensar no problema do mal. A solução que ele propõe é que Deus, no final, salvará o justo, punindo o invasor. Então a terra inteira ficará cheia do conhecimento de Deus.
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4P – Ageu Ageu é mencionado em Esdras 5, 1 e 6, 14. O livro que trz seu nome foi provavelmente redigido por um discípulo, que a ele juntou fragmentos onde Ageu é nomeado na terceira pessoa. Este exerceu seu ministério em Jerusalém, por volta do ano 520 a.C., quando se reconstruía o templo.
4Q – Zacarias Contemporâneo de Ageu, esse profeta estende seu olhar sobre um horizonte mais vasto. Sua linguagem é tenebrosa e simbólica: um anjo transmite-lhe os oráculos divinos. Ele prega uma reforma moral, ao mesmo tempo que exorta o povo a reconstruir o templo. Vê em Zorobabel o eleito de Deus, dando-lhe o título messiânico de germe. O escrito contém uma importante descrição do reino pacífico do Messias, e uma espécie de apocalipse, anunciando a ruína dos inimigos de Jerusalém e a conversão das nações. A segunda parte do livro (9 a 14) representa uma situação histórica diferente, que parece referir-se às últimas décadas do século IV antes de Cristo.
4R – Malaquias É comumente admitido que os oráculos de Malaquias tenham sido pronunciados nos anos que precederam imediatamente a vinda de Neemias (444 a.C.). Esse profeta fala do amor de Deus por seu povo, do qual é uma prova do recente castigo de Edom. Mas explica também por que Deus não é mais generoso em bênçãos: negligências no ministério sacerdotal, no respeito à santidade do matrimônio (casamentos mistos e divórcios), no pagamento dos dízimos. A pregação de Malaquias preparou a grande reforma de Neemias.
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O NOVO TESTAMENTO
1 - Os Evangelhos
A palavra Evangelho é de origem grega e significa a Boa Nova. Os Evangelhos são escritos que contam a boa nova da vinda entre os homens daquele que se fez "filho do homem", a fim de que nos possamos tornar "filhos de Deus". Os Evangelhos são um gênero de literatura do cristianismo primitivo que contam a vida de Jesus, a fim de preservar Seus ensinamentos ou revelar aspectos da natureza de Deus. O desenvolvimento do Cânon do Novo Testamento deixou quatro evangelhos canônicos, que são aceitos como os únicos evangelhos autênticos para a maioria dos cristãos. Entretanto, existem muitos outros evangelhos. Eles são conhecidos como apócrifos e foram escritos depois dos quatro evangelhos canônicos. Alguns destes evangelhos deixaram vestígios importantes na tradição cristã, incluindo as imagens, pinturas e outras artes plásticas.
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Mas antes de ser um livro, o Evangelho foi uma palavra pregada: antes de ser lido, ele foi ouvido. Como o Senhor Jesus tinha falado, assim falaram os apóstolos depois de sua morte. Mas eles não se contentaram em transmitir sua doutrina; acrescentaram-lhe um testemunho sobre sua vida e suas ações; "o que ele fez, o que ele ensinou", como diz o livro dos Atos dos Apóstolos. O ensinamento dos apóstolos se inseria no quadro seguinte: 1. 2. 3. 4.
A pregação de João Batista A missão de Jesus na Galiléia A missão de Jesus na Judéia e em Jerusalém Sua paixão, sua morte e sua ressurreição
Esse ensinamento foi em breve consignado parcialmente por escrito, para que fosse conservado com fidelidade. É esse o quadro em que se amolda a narrativa dos três primeiros evangelhos. Mateus, Marcos e Lucas, dos quais um somente era apóstolo de Jesus. É certo que essas três redações não são as únicas que foram compostas. Mas são as únicas que nos foram conservadas. Lucas faz expressamente alusão aos documentos dos quais ele se serviu para redigir o seu texto. É verossímil que tenham existido, desde os primeiros anos que se seguiram a morte de Jesus, várias coleções de palavras do Salvador (como o discurso sobre o monte, cap. 5, 6 e 7 de Mateus), ou narrações propriamente ditas (como a da paixão). Esses três primeiros relatos, feitos num mesmo plano, foram chamados Evangelhos sinóticos, porque seu conteúdo pode ser abraçado de um só olhar, distribuindo-o em três colunas paralelas. Se os Evangelhos sinóticos se assemelham a ponto de apresentarem às vezes uma reprodução textual de certas narrativas, nem por isso deixam de ter entre si grandes diferenças, que destacam a originalidade dos seus autores. Tradicionalmente, os autores dos quatro primeiros livros do Novo Testamento recebem o nome de "evangelistas", título que na Igreja primitiva correspondia às pessoas a quem, de modo específico, se confiava a função de anunciar a boa nova de Jesus Cristo. Durante os anos que se seguiram à ascensão do Senhor, a pregação apostólica foi sobretudo verbal, como vemos na leitura de Atos. Mais tarde, quando começaram a desaparecer aqueles que haviam conhecido Jesus em pessoa, a Igreja sentiu a necessidade de fixar por escrito a memória das palavras que haviam ouvido dele e dos seus atos que haviam presenciado. Durante certo tempo, circularam entre as comunidades cristãs de então numerosos textos referentes a Jesus, que, na maioria dos casos, eram simples apontamentos dispersos e sem conexão. Apesar do seu caráter fragmentário, porém, aqueles breves relatos representaram a passagem da tradição oral à escrita, passagem que presidiu o nascimento dos nossos quatro Evangelhos. O propósito principal dos evangelistas não foi oferecer uma história detalhada das circunstâncias que rodearam a vida do nosso Senhor e dos eventos que a marcaram, tampouco se propuseram a reproduzir ao pé da letra os seus discursos e ensinamentos, nem as suas discussões com as autoridades religiosas dos judeus. Há, consequentemente, muitos dados relativos ao homem Jesus de Nazaré que nunca nos serão conhecidos, embora, por outro lado, não reste dúvida de que Deus já revelou por meio dos evangelistas tudo o que não devemos ignorar.
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Na realidade, eles não escreveram para nos transmitir uma completa informação de gênero biográfico, mas, como disse João, "para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome". Os Evangelhos contêm, pois, um conjunto de narrações centradas na pessoa de Jesus de Nazaré e escritas com um propósito testemunhal, para a edificação da Igreja e para a comunicação da fé. Mas isso não significa que os evangelistas manejaram sem cuidado os dados, as palavras e os fatos que recompilaram e que foram os seus elementos de informação. Pois, se bem que é certo que eles não trataram de escrever nenhuma biografia, igualmente é que os seus escritos respondem com fidelidade ao discurso histórico tal e como era elaborado então, seja por haverem conhecido pessoalmente a Jesus ou por terem sido companheiros dos apóstolos que viveram junto dele. A obra dos evangelistas nutriu-se especialmente das memórias que, em relação ao Senhor, eram guardadas no seio da Igreja como um depósito precioso. Essas memórias transmitiram-se no culto, no ensinamento e na atividade missionária, isto é, na pregação oral, que, durante longos anos e com perspectiva escatológica, foi o meio idôneo para reviver, desde a fé e em benefício da fé, o acontecimento fundamental do Cristo ressuscitado. A simples leitura dos Evangelhos conduz logo a uma primeira classificação, que é resultante da constatação, de um lado, de que existe uma ampla coincidência da parte de Mateus, Marcos e Lucas quanto aos temas de que tratam e quanto à disposição dos elementos narrativos que introduzem e por outro, o Evangelho de João, cuja aparição foi posterior à dos outros três, parece ter sido escrito com o propósito de suplementar os relatos anteriores com uma nova e distinta visão da vida de Jesus. Porque, de fato, com exceção dos acontecimentos que formavam a história da paixão de Jesus, apenas três dos fatos referidos por João (1, 19-28; 6, 1-13 e 6, 16-21) encontram-se também consignados nos outros Evangelhos. Daí se conclui que, assim como o Evangelho Segundo João requer uma consideração à parte, os de Mateus, Marcos e Lucas estão estreitamente relacionados. Seguindo vias paralelas, oferecem nas suas respectivas narrações três enfoques diferentes da vida do Senhor. Por causa desse paralelismo, pelas muitas analogias que aproximam esses Evangelhos tanto na matéria exposta como na forma de dispô-la, vêm sendo designados desde o séc. XVIII como "os sinóticos", palavra tomada do grego e equivalente a "visão simultânea" de alguma coisa. Os sinóticos começaram a aparecer provavelmente em torno do ano 70. Depois da publicação do Evangelho segundo Marcos, escreveu-se primeiro o de Mateus e depois o de Lucas. Ambos se serviram, em maior ou menor medida, da quase totalidade dos materiais incorporados em Marcos, reelaborando-os e ampliando-os com outros. Por essa razão, Marcos está quase integralmente representado nas páginas de Mateus e de Lucas. Quanto aos novos materiais mencionados, isto é, os que não se encontram em Marcos, uma parte foi aproveitada simultaneamente por Mateus e Lucas, e a outra foi usada por cada um deles de maneira exclusiva. Apesar de que os autores sinóticos tenham redigido textos paralelos, fizeram-no de pontos de vista diferentes e contribuindo cada qual com a sua própria personalidade, cultura e estilo literário. Por isso, a obra dos evangelistas não surge como o produto de uma elaboração conjunta, mas como um feito singular desde seus delineamentos iniciais até a sua realização definitiva. Quanto aos objetivos, também são diferentes em cada caso: enquanto Mateus contempla a Jesus de Nazaré como o Messias anunciado profeticamente, Marcos o vê como a manifestação do poder de Deus, e Lucas, como o Salvador de um mundo perdido por causa do pecado.
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Para a comunidade cristã, o valor dos Evangelhos é insubstituível e permanente ocupam um lugar único, tanto no âmbito geral da Igreja como no particular da devoção privada. Os Evangelhos são o único canal que conduz ao conhecimento da vida do nosso Senhor Jesus Cristo, pois não existe nenhum outro documento que o torne realmente presente.
Ademais, põem de manifesto como o Espírito Santo inspirou nos evangelistas a boa nova da salvação, para que eles, por sua vez, proclamem-na com a sua própria voz, humilde e singela, mas chamada a fazer chegar a palavra de Deus a toda a humanidade.
1A - Mateus
Mateus, Cujo verdadeiro nome é Levi, coletor de impostos antes de ter sido chamado pelo Senhor para fazer parte do colégio apostólico, redigiu seu Evangelho em aramaico (dialeto do hebraico), segundo uma antiquíssima tradição, no ano 60 d.C.. Esse texto, não conservado, foi depressa traduzido para o grego. O tradutor, em certos lugares, parece que ser serviu do texto de Marcos. Durante a ocupação romana, que iniciou em 63 a.C. com a conquista de Pompeu, Mateus coletava impostos do povo hebreu para Herodes Antipas, o tetrarca da Galileia. Sua coletoria estava localizada em Cafarnaum. Judeus que enriqueciam desta maneira eram desprezados e considerados párias. Porém, como um coletor de impostos, ele deve ter alfabetizado em aramaico. Foi neste cenário, perto de onde hoje está Almagor, que Jesus convidou Mateus para ser um dos Doze Apóstolos. Após o chamado, Mateus convidou Jesus para um banquete em sua casa. Ao ver isto, os escribas e os fariseus criticaram Jesus por cear com coletores de impostos e pecadores. A provocação fez Jesus responder, «Não vim chamar os justos, mas os pecadores ao arrependimento. » (Lucas 5:29).
O ministério de Mateus no Novo Testamento é bastante complexo de atestar. Quando ele é mencionado, é geralmente junto com Tomé. Como discípulo, ele seguiu Cristo e foi uma das testemunhas da Ressurreição e da Ascensão. Depois, Mateus, Maria, Tiago e outros seguidores próximos a Jesus se recolheram ao cenáculo em Jerusalém. Na mesma época, Tiago sucedeu a Jesus como líder da igreja de Jerusalém. O Evangelista Mateus inspirado por um anjo. Por Rembrandt.
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Eles permaneceram nas redondezas de Jerusalém e proclamaram que Jesus, filho de José, era o Messias prometido nas profecias. Acredita-se que estes primeiros cristãos judeus eram chamados de nazarenos. É quase certo que Mateus era um deles, uma vez que tanto o Novo Testamento quanto o Talmud assim atestam. Mateus pregou por quinze anos o Evangelho em hebraico para a comunidade judaica na Judeia. Mais tarde, ele viajaria pelas nações gentias e espalhou os ensinamentos de Jesus entre os etíopes, macedonianos, persas e partos. Acreditase também que ele tenha morrido uma morte natural, na Etiópia ou na Macedônia. Porém, tanto a Igreja Católica quanto a Ortodoxa sustentam a crença tradicional de que ele tenha morrido mártir.
2B - Marcos Marcos, é o sobrenome de João, primo de Barnabé, do qual se fala no livro dos Atos dos Apóstolos 12, 12. É um discípulo de Pedro e companheiro de Paulo em sua primeira viagem missionária. Seu Evangelho representa um apanhado dos ensinamentos de Pedro em Roma, pouco antes de 64 d.C.. As minúcias de alguns detalhes nos garantem que há nele um testemunho direto da vida e da atividade de Jesus. De acordo com Eusébio de Cesareia, Herodes Agripa I em seu primeiro ano de governo sob toda a Judeia (41 d.C.) matou Tiago, filho de Zebedeu, e prendeu Pedro, planejando matá-lo após a Páscoa judaica. Pedro foi salvo milagrosamente por anjos e escapou do reino de Herodes (Atos 12, 1-19). Depois de muitas viagens pela Ásia Menor e pela Síria, ele chegou em Roma no segundo ano do imperador Cláudio (42 d.C.). Em algum ponto pelo caminho, Pedro encontrou Marcos, o evangelista, restaurou sua fé (após ele ter deixado Jesus em João 6, 44-66), e tomou-o como companheiro de viagem e intérprete. A pregação de Pedro na cidade teve tanto sucesso que ele foi presenteado pelos habitantes da cidade com uma estátua e, a pedidos da população, Marcos escreveu os sermões de Pedro, compondo assim o Evangelho segundo Marcos antes de partir para Alexandria no terceiro ano de Cláudio (43 d.C.). Lá, ele fundou a Igreja de Alexandria, cuja sucessão até os dias de hoje é alegada por diversas diferentes denominações, mas principalmente pela Igreja Ortodoxa Copta. Aspectos da liturgia copta podem ser referenciados ao próprio São Marcos. Ele então se tornou o primeiro bispo de Alexandria e tem a honra de ser também o fundador do Cristianismo na África. Ainda de acordo com Eusébio, o sucessor de Marcos como bispo de Alexandria foi Aniano, no oitavo ano do imperador Nero (62-63 d.C.), provavelmente por conta de sua morte. Tradições coptas posteriores dizem que ele foi martirizado em 68 d.C. A evidência de que o autor do Evangelho que tem o seu nome é Marcos vem de Pápias de Hierápolis, nos fragmentos de sua "Exposição dos oráculos do Senhor". Em 828 d.C., relíquias que se acredita serem de São Marcos foram roubadas em Alexandria por dois mercadores venezianos e lavadas para Veneza. Uma basílica foi construída para guardá-las, chamada de Basílica de São Marcos.
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São Marcos, por Donatello
Em junho de 1968, Papa Cirilo VI de Alexandria enviou uma delegação à Roma para receber uma relíquia de São Marcos do Papa Paulo VI. A relíquia era um pequeno pedaço de osso que havia sido presenteado ao Papa romano pelo Cardeal Urbani, Patriarca de Veneza. O Papa Paulo, pelo Cardeal Urbani, Patriarca de Veneza. O Papa Paulo, endereçando à delegação, disse que o resto das relíquias permanecerão na cidade.
3C - Lucas
Lucas é de origem grega. É também um companheiro das missões de Paulo. Lucas escreveu também os Atos dos Apóstolos pouco antes de 68 d.C.. Seu evangelho é, pois, anterior a essa data. Embora não tenha ele sido testemunha ocular dos acontecimentos, seu livro é digno de crédito por causa do cuidado que teve o autor em documentá-lo. Ele utilizou certamente o texto de Marcos e o de Mateus. Lucas foi um médico grego que viveu na cidade grega de Antioquia, na Síria Antiga. A primeira referência de Lucas encontra-se na Epístola a Filemon de Paulo de Tarso, no versículo 24. É mencionado também na Epístola aos Colossenses, 4, 14, bem como na Segunda Epístola a Timóteo 4, 11. Alguns manuscritos afirmam que Lucas morreu em Tebas, Capital da Beócia, aos 84 anos. Todas estas referências parecem indicar que Lucas terá, de fato, seguido Paulo durante algum tempo. Lucas foi a companheiro de Paulo, e segundo a quase unânime crença da antiga igreja, escreveu o evangelho que é designado pelo seu nome, e também os Atos dos Apóstolos. Ele é mencionado somente três vezes pelo seu nome no Novo Testamento. Pouco se sabe a respeito de sua vida. Tem alguns julgados que ele foi do número dos setenta discípulos, mandados por Jesus a evangelizar (Lc 10, 1), outros pensam que foi um daqueles gregos que desejavam vê-lo (Jo 12, 20), e também considerando que Lucas é uma abreviação de Lucanos, já têm querido identifica-lo como Lúcio de Cirene (At 13, 1). Era médico (Cl 4, 14). Ele não foi testemunha ocular dos acontecimentos que narra no Evangelho (Lc 1, 2), embora isso não exclua a possibilidade de ter estado com os que seguiam a Jesus Cristo. Parece que Lucas se juntou a Paulo em Troâde (At 16, 10-11), e foi com ele até a Macedônia. Depois viajou com o mesmo Apóstolo até Filipos, onde tinha relações, ficando provavelmente ali por certo tempo (At 16, 12). Uns sete anos mais tarde, quando Paulo, dirigindo-se a Jerusalém, visitou Filipos, Lucas juntou-se novamente com ele. Lucas acompanhou Paulo a Jerusalém e com ele fez viagem para Roma. E nesta cidade esteve com o Apóstolo durante sua primeira prisão e achava-se aí também durante o segundo encarceramento, precisamente pouco antes da morte de Paulo (2 Tm 4, 11). Uma tradição cristã apresenta-o como pregando no sul da Europa, encontrando na Grécia a morte de um mártir.
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São Lucas, mostrando uma pintura de Maria, por Guercino
4D - João
O evangelho de João deve ser apresentado à parte. Seu autor é o apóstolo João, irmão de Tiago, filho de Zebedeu. Ele foi um dos mais íntimos discípulos de Jesus, a quem o Salvador confiou o cuidado se sua mãe no momento de sua morte. Por várias vezes ele designa discretamente a si mesmo pelas palavras: "o discípulo que Jesus amava". João compôs seu Evangelho, seja em Antioquia, seja em Efeso, nos últimos anos do primeiro século, mais de trinta anos após a redação dos três primeiros. Ele não escreve para os pagãos, mas para os cristãos, que tem ouvido já numerosas objeções, e lutado para defender a fé contra doutrinas estranhas. Com uma narrativa original, completando a de seus predecessores, ele quer mostrar a divindade manifestando-se aos homens na pessoa de Jesus. Nele, ele quer mostrar o Filho de Deus, sofredor e glorificado. Apresentando-o "como a água da vida eterna", "o pão vivo descido do céu", "a luz do mundo", "o bom pastor", "o caminho, a verdade e a vida", "a vida eterna". Ele quer mostrar que Jesus, que era a "Luz", não foi recebido pelos judeus, ficando desconhecido mesmo dos seus; e que, morto por aqueles que o rejeitaram, ele se tornou, em sua ressurreição, a manifestação gloriosa de Deus. A vida de Jesus é um dom que Deus faz aos homens, os quais poderão aceitá-lo ou rejeitá-lo. João conta não somente fatos, gestos e discursos de Jesus, mas fala-nos também de sua experiência pessoal junto ao Mestre: ele diz-nos o que Jesus é para o crente. São João Evangelista ou Apóstolo João, foi um dos doze apóstolos de Jesus e além do Evangelho segundo João, também escreveu as três epístolas de João (1, 2, e 3) e o livro do Apocalipse. Há que se destacar aqui a existência de uma controvérsia sobre o verdadeiro autor do Apocalipse, mas uma tradição representada por São Justino e amplamente difundida no século II, identifica o autor como sendo o apostolo João, o autor do quarto evangelho. João seria o mais novo dos 12 discípulos, tinha provavelmente cerca de vinte e quatro anos de idade à altura do seu chamado por Jesus. Consta que seria solteiro e vivia com os seus pais em Betsaida. Era pescador de profissão, consertava as redes de pesca. Trabalhava junto com seu irmão Tiago Maior, e em provável sociedade com André e Pedro. As heranças deixadas nos escritos de João, demonstram uma personalidade extraordinária. De acordo com as descrições ele seria imaginativo nas suas comparações, pensativo e introspectivo nas suas dissertações e pouco falador como discípulo. É notório o seu amadurecimento na fé através da evolução da sua escrita.
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São João, escultura de Donatello
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Conclusão
Os evangelhos constituem, pois, um documento inestimável sobre a vida e o ensinamento de Jesus. Tem-se muitas vezes objetado que eles não são perfeitamente concordantes. A resposta a dar a essa objeção é que as diferenças só se referem a elementos acessórios e a detalhes. Essas diferenças, por outra parte, são devidas ao fato de que os evangelistas não pretendem fazer da vida do Senhor uma narrativa propriamente histórica. Os Evangelhos são escritos religiosos, doutrinais, destinados a alimentar a fé e a comunicá-la, fazendo conhecer a pessoa de Jesus. Cada autor, ao escrever, tinha seu ponto de vista particular. Mateus escreve na Palestina para leitores judeus; seu texto se particulariza pela abundância de citações do Antigo Testamento. Marcos quer apresentar Jesus para os pagãos, fazendo notar sobretudo o que havia de extraordinário e de valor probatório de sua missão nos milagres por ele operados. Lucas, escrevendo também para os pagãos, tem a visível preocupação de apresentar Jesus sob um aspecto mais atraente e comovedor, fazendo notar, antes de tudo, a bondade e a misericórdia do Salvador. João procura mostrar aos seus leitores a divindade de Jesus e revelar-lhes um pouco de sua realidade invisível. Mas conservando o cuidado de apresentá-lo como um homem no concreto de seus atos e de seus discursos. Malgrado todas essas diferenças, a Igreja tem sempre o vivo sentimento de que não houve jamais senão um Evangelho, uma só Boa Nova de salvação, mas apresentada sob quatro formas: segundo Mateus, segundo Marcos, segundo Lucas e segundo João.
Jesus ressuscitado
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2 - Os Atos dos Apóstolos
Os Atos dos Apóstolos formam a sequência do terceiro Evangelho, e foram escritos pelo mesmo autor, Lucas, que, para redigi-los, utilizou tradições escritas e orais e escreveu, numa parte importante de sua narrativa, suas próprias memórias. Os Atos contam os acontecimentos que marcaram o nascimento da Igreja primitiva: a ascensão e Jesus, o Pentecostes, a primeira pregação em Jerusalém e na Palestina; em seguida, a conversão de Paulo e suas viagens missionárias através da Ásia Menor e da Grécia, sua prisão, seu processo e sua transferência para Roma. A narrativa termina bruscamente, sem falar da libertação do apóstolo e de suas viagens antes do martírio. O livro dos Atos em sua primeira parte, insiste antes de tudo na influência do Espírito Santo sobre o desenvolvimento das primeiras comunidades cristãs. Na segunda parte, ele se restringe a mostrar como Paulo, seguindo nisso o exemplo de Pedro, é o grande realizador da entrada em massa dos pagãos na Igreja. A leitura dos Atos dos Apóstolos, aliás fácil e atraente, é indispensável para uma boa inteligência das Epístolas de São Paulo. Os Atos dos Apóstolos (Latim: Acta Apostolorum) é o quinto livro do Novo Testamento. Geralmente conhecido apenas como Atos, ele descreve a história da Era Apostólica. O autor é tradicionalmente identificado como Lucas, o Evangelista. O Evangelho de Lucas e o livro de Atos formavam apenas dois volumes de uma mesma obra, o qual daríamos hoje o nome de História das Origens Cristãs. Lucas provavelmente não atribuiu a este segundo livro um título próprio. Somente quando seu evangelho foi separado dessa segunda parte do livro e colocado junto com os outros três evangelhos é que houve a necessidade de dar um título ao segundo volume. Isso se deu muito cedo, por volta de 150 d.C.. Tanto em sua intenção quanto em sua forma literária, este escrito não é diferente dos quatro evangelhos. Escritores do século II e III fizeram várias sugestões para nomear essa obra, como O Memorando de Lucas (Tertuliano) e Os Atos de Todos os Apóstolos (Cânon Muratorio). O nome que finalmente iria consagrar-se aparece pela primeira vez no prólogo antimarcionita de Lucas (final do século II) e em Irineu. A palavra Atos denotava um gênero ou subgênero reconhecido, caracterizado por livros que descreviam os grandes feitos de um povo ou de uma cidade. O título segue um costume da literatura helenística, que conhecia os Atos de Anibal, os Atos de Alexandre, entre outros. O objetivo desse livro é mostrar a ação do Espírito Santo na primeira comunidade cristã e, por ela, no mundo em redor. O conteúdo do livro não corresponde ao seu título, porque não se fala de todos os apóstolos, mas somente de Pedro e de Paulo. João e Felipe aparecem apenas como figurantes. Entretanto, não são os atos desses apóstolos que achamos no livro, mas antes a história da difusão do Evangelho, de Jerusalém até Roma, pela ação do Espírito Santo.
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O livro de Atos termina abruptamente com Paulo em seu segundo ano na prisão de Roma, que teve início cerca de 60 d.C.. Lucas não dá informação sobre o martírio do apóstolo Paulo que morreu decapitado entre 66 e 68 d.C.. Os eruditos acreditam que Lucas teria incluído acontecimentos importantes se tivesse escrito depois de 64 d.C., como as perseguições empreendidas por Nero (64-68 d.C.) ou a destruição de Jerusalém (70 d.C.). Portanto, Atos foi escrito provavelmente entre 61 e 63 d.C. Atos é dirigido a uma pessoa específica, Teófilo. Embora tivesse escrito para alguém específico, muitos acreditam que ele tenha se dirigido a todos os que amam a Deus, uma vez que "Teófilo" significa "aquele que ama a Deus". De qualquer modo, Lucas escreveu Atos para que pudesse ser lido por muitos. Esses leitores tinham familiaridade com o império romano e com a Ásia Menor, mas talvez não com a Palestina, o que explicaria a informação cuidadosamente detalhada de Lucas sobre determinados lugares. Justamente devido à tradução do nome Teófilo, alguns pensam que esta carta era aberta e não a um indivíduo que se chamava assim. Este livro é importante por mostrar um dos acontecimentos importantes da história do Cristianismo o Concílio de Jerusalém.
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Fatos importantes
O Livro de Atos inicia-se com a ascensão de Jesus Cristo, o qual determinou aos seus discípulos que permanecessem em Jerusalém até que fossem revestidos com por uma unção celestial que é descrita nos fatos ocorridos durante o dia de Pentecostes. A escolha do discípulo Matias que foi precedida do suicídio do traidor Judas, nos versículos de 1, 16 -20, Pedro fala sobre o campo (Aceldama) que ele adquiriu com as 30 moedas de prata. Os capítulos seguintes relatam os primeiros momentos da igreja primitiva na Palestina sob a liderança de Pedro, as primeiras conversões de judeus e depois dos gentios, o violento martírio de Estevão por apedrejamento, a conversão do perseguidor Saulo de Tarso (Paulo) que se torna a partir de então um apóstolo, mencionando depois as missões deste pelas regiões orientais do mundo romano, mais precisamente pela Ásia Menor, Grécia e Macedônia, culminando com a sua prisão e julgamento quando retorna para Jerusalém e, finalmente, fala sobre sua viagem para Roma. Pode-se dizer que do começo até o verso 25 do capítulo 12, o Livro de Atos dá um enfoque maior ao ministério de Pedro, em que, depois da ressurreição de Jesus Cristo e do Pentecostes, o apóstolo pregou corajosamente e realizou muitos milagres, relatando, em síntese, o estabelecimento e a expansão da Igreja pelas regiões da Judéia e de Samaria, seguindo para alguns países da Ásia Menor. Já a outra metade da obra centraliza-se mais no ministério de Paulo (do capítulo 13 ao final) e poderia ser subdividido em seis partes: 1. A primeira viagem missionária liderada por Paulo e Barnabé; 2. O Concílio de Jerusalém; 3. A terceira viagem missionária de Paulo em que o Evangelho é levado à Europa; 4. A terceira viagem missionária; 5. O julgamento de Paulo; 6. A viagem de Paulo a Roma.
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Importante destacar que no livro de Atos é narrada a rejeição contínua do Evangelho pela maioria dos judeus, o que levou à proclamação das Boas Novas aos povos gentios, principalmente por Paulo. Narra o livro de Atos que, antes de subir aos céus, Jesus determinou aos seus discípulos que permanecessem em Jerusalém até que recebessem o poder do alto através do Espírito Santo e que a partir de então eles se tornariam suas testemunhas até os confins da terra. Enquanto aguardavam o cumprimento da promessa, foi escolhido o nome de Matias em substituição a Judas Iscariotes que tinha suicidado. Com a descida do Espírito Santo no dia de Pentecostes, ocorre uma experiência sobrenatural em que os judeus de outras nacionalidades que estavam presentes na festa ouviram os discípulos falando em seus próprios idiomas, o que chamou a atenção de uma multidão de pessoas para o local onde estavam reunidos. Corajosamente, Pedro inicia um discurso explicando o motivo do acontecimento em que três mil pessoas são convertidas para o cristianismo que foram batizados, passando a congregar levando uma vida comunitária de muita oração onde se presenciavam prodígios e milagres feitos pelos apóstolos. De acordo com os versos 42 a 44 do capítulo 2, os cristãos primitivos tinham todos os seus bens em comum, o que parece ter se mantido por anos na igreja de Jerusalém. Já os versos 32 a 37 do capítulo 4 informam que "ninguém considerava exclusivamente sua, nenhuma das coisas que possuía" e que os que eram donos de propriedades vendiam suas terras ou casas e depositavam o valor da venda perante os apóstolos para que houvesse distribuição entre os que tinham necessidades materiais. Um milagre importante, a cura de um homem coxo de nascença que pedia esmola na porta do Templo, é relatado logo no capítulo 3 do livro, o que provoca a prisão de Pedro e do Apóstolo João que são trazidos perante o Sinédrio. Repreendidos pelas autoridades judaicas para que não pregassem mais no nome de Jesus, os dois apóstolos, os quais responderam que estavam praticando a vontade de Deus e não dos homens. Novas prisões dos apóstolos ocorrem no livro de Atos, pois o crescimento da Igreja incomodava o sumo sacerdote e a seita dos saduceus, conforme é narrado nos versos de 17 a 42 do capítulo 5 da obra. Porém, com o parecer dado pelo rabino Gamaliel, o Sinédrio resolve libertar Pedro e os demais, depois de castigá-los com açoites. Com o crescimento do número de discípulos, é instituído o cargo de diácono para ajudar nas atividades da Igreja, entre os quais estavam Estevão e Filipe, os Evangelistas que muito se destacaram em seus ministérios. Porém, Estevão é preso, conduzido ao Sinédrio e condenado à morte. Após o apedrejamento de Estevão, Saulo de Tarso empreende uma grande perseguição à Igreja em Jerusalém, o que dispersou vários discípulos pelas regiões da Judeia e Samaria, chegando também o Evangelho à Fenícia, Chipre e Antioquia.
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Algumas obras de Filipe, o Evangelista, são narradas em Atos, entre as quais a sua passagem por Samaria e a conversão de um eunuco etíope na rota comercial de Gaza. Saulo de Tarso ao tentar empreender novas perseguições, converte-se quando viajava para Damasco e tem uma visão de Jesus, ficando cego por três dias, até ser curado quando se encontra com Ananias. Depois destes acontecimentos, a Igreja passa por um período de paz. Dois milagres de destaque narrados nesse momento da obra de Lucas são a cura do paralítico Enéias, em Lida, e a ressurreição de Dorcas, na cidade de Jope. Vimos em Dorcas um exemplo de alguém que se doou para que a Igreja nascente tivesse razão social de ser, além de razão espiritual convincente. Se a Igreja manifestava Jesus Cristo como aquele capaz de conduzir o homem a Deus pelo seu grande amor e doação pelos seres humanos, Deus usava seres humanos como Dorcas para manifestar o seu grande amor aos demais seres humanos numa dimensão horizontal. Foi assim que, morrendo Dorcas, a Tabita querida, Deus pode e quis ressuscitá-la pelo seu grande poder e amor diante do clamor dos que foram por ela favorecidos - toda a comunidade jopeana.
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O Evangelho chega aos gentios
Narra o capítulo 10 de Atos que Simão Pedro, encontrando-se em Jope, recebe uma visão em que Deus lhe ordena alimentar-se de vários animais considerados imundos ou impróprios para o consumo (v.11), conforme a lei mosaica. Pedro entende então o real significado. A visão não o estava pedindo ou mudando a lei no que se refere a carne de animais imundos, mas que Deus estava o orientando para não fazer discriminação, pois o evangelho deveria ser pregado a todos independente da origem, judeus ou gentios (v.28). Entendendo isso, Pedro prega o Evangelho na casa de um centurião romano de Cesaréia chamado Cornélio, o qual se converte juntamente com todos os que ouviram o discurso do apóstolo, sendo depois batizados. Por este motivo, Pedro é questionado pelos outros apóstolos e cristãos da Judeia que se convencem. O rei Herodes Agripa I prende a Tiago, irmão de João, chegando a matá-lo. Depois prende a Pedro, mas este é milagrosamente liberto pela ajuda de um anjo. E também é através de um anjo que Herodes é morto comido por vermes.
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A primeira Viagem de Paulo
Depois de ter sido um feroz perseguidor da Igreja, Paulo passa a congregar na igreja de Antioquia, na Síria, e inicia suas viagens missionárias pelo mundo romano, das quais três são relatadas no livro de Atos. Entre os anos de 48 a 50 d.C., em sua primeira expedição evangelizadora, na companhia de Barnabé, Paulo parte de Antioquia e vai para a ilha de Chipre. Lá pregam na cidade de Salamina, desafiando o poder de um feiticeiro que enganava a população. Ao sair de Pafos, São Marcos deixa o grupo e retorna para Jerusalém. Paulo e Barnabé prosseguem navegando para Perge na província romana da Panfília e, por terra, vão à Antioquia da Pisídia, na Pisídia, prosseguindo depois para Icônio, Listra e Derbe, cidades da Galácia, pregando tanto em sinagogas aos judeus e aos gentios.
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Devido à cura de um paralítico de nascença, Paulo e Barnabé são aclamados como encarnações de deuses greco-romanos pelos cidadãos supersticiosos de Listra e precisaram impedir as multidões de lhes oferecer sacrifícios. Depois disto, foi apedrejado, mas sobreviveu. Ao pregarem em Derbe e fazer discípulos retornam para Antioquia, promovendo nas novas igrejas as eleições dos seus presbíteros, deixando-lhes recomendações.
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Concílio de Jerusalém
A notícia de conversão dos gentios gerou impactos dentro da Igreja, visto que alguns judeus da seita dos fariseus impunham a circuncisão aos novos cristãos. Tendo a Igreja se reunido em Jerusalém, com a presença dos apóstolos, ficou decidido que os gentios convertidos não deveriam ser incomodados com a observância de detalhes da lei mosaica, mas apenas que se abstivessem da idolatria, das relações sexuais ilícitas, da carne de animais sufocados e do sangue.
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A segunda viagem de Paulo
A segunda viagem missionária de Paulo ocorre entre os anos de 51 a 53 d.C., em que depois de percorrer por terra algumas regiões da Ásia Menor, Paulo recebe um aviso em uma visão sobrenatural em Trôade para atravessar para a Europa e pregar nas cidades da Macedônia e da Acaia. Nesta segunda expedição, Paulo é acompanhado por Silas e anuncia o Evangelho também em Neápolis, Filipos, Anfípolis, Apolônia, Tessalônica, Beréia, Atenas e Corinto, de onde retornam para à Ásia Menor, desembarcando em Éfeso. Porém, desde que atravessou a província da Galácia, Timóteo havía juntado-se ao grupo, tornando-se um outro importante colaborador do apóstolo. Em Filipos, Paulo é preso após ter libertado de uma possessão demoníaca uma escrava que fazia adivinhações, porém é milagrosamente libertado à noite através de um terremoto. Na cidade de Atenas, Paulo faz um discurso no Areópago, na colina de Marte, mas poucos se convertem. É na cidade de Corinto que Paulo funda uma importante igreja, onde é ajudado por um casal de judeus, Áquila e Priscila que também lhe ajudam até Éfeso. De Éfeso, Paulo navega então para Cesaréia, apresentando-se em seguida para a igreja de Jerusalém. Durante a sua segunda viagem missionária Paulo escreveu duas Epístolas: I Tessalonicenses, escrita de Corinto, 52 d.C., II Tessalonicenses, escrita de Corinto, 53 d.C. São Paulo o
A terceira viagem de Paulo
A terceira viagem missionária de Paulo ocorre entre os anos de 54 a 57 da era comum e teve por objetivo fortalecer os discípulos nas novas igrejas na Ásia Menor e Grécia. Tal como nas missões anteriores, Paulo sempre parte da igreja onde congregava em Antioquia, de onde segue por terra até Éfeso, passando por Tarso, Derbe, Listra, Icônio e Antioquia da Pisídia.
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Nesta expedição, Paulo dá mais atenção à igreja de Éfeso onde acontecem milagres e o apóstolo sofre a oposição dos ourives que lucravam fabricando imagens da deusa Diana (mitologia), provocando um grande tumulto na cidade. Após a confusão, Paulo segue para a Macedônia e Acaia onde visita as igrejas. De volta à Ásia, Paulo reúne-se com a igreja de Trôade, ocasião em que é presenciado um milagre de ressurreição de um jovem que havía despencado da janela do terceiro andar ao adormecer durante o prolongado discurso proferido por Paulo. Ao desembarcar em Mileto, Paulo tem um comovente encontro com os presbíteros da igreja de Éfeso. Deixando Mileto, Paulo passa por Tiro e Cesaréia, indo novamente apresentar-se em Jerusalém, sabendo que lá iria ser preso.
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A prisão de Paulo
Em sua estadia em Jerusalém, após ter regressado de sua terceira viagem missionária, Paulo é detido pelos judeus quando se encontrava no templo cumprindo seu voto. Devido à confusão que foi formada na ocasião da prisão de Paulo, as autoridades romanas em Jerusalém intervieram, evitando que o apóstolo fosse morto. Invocando sua cidadania romana, Paulo obtém algumas proteções enquanto permanecia em custódia aguardando julgamento, o que motivou a sua transferência para Cesaréia, sob os cuidados de Félix, governador da Judéia, perante o qual foi acusado pelos judeus de ter causado inquietação política e profanação do templo. Com dificuldades para decidir sobre o caso de Paulo, Félix o mantém em custódia por dois anos até ser substituído por Festo que, ao fazer um acordo com os judeus, promete encaminhar o apóstolo para ser julgado em Jerusalém. Não concordando que o seu julgamento fosse realizado em Jerusalém, Paulo interpõe um apelo para impedir tal determinação e, devido ao seu requerimento, consegue pelas leis romanas que o seu caso fosse apreciado pelo imperador em Roma. Isto porque a legislação da época permitira que um cidadão romano que não se sentisse tratado com justiça pudesse apelar para o imperador nos casos em que a pessoa jamais tivesse sido condenada por um tribunal inferior e a acusação não se tratasse de crimes comuns. Enquanto esteve sob a custódia de Festo, o caso de Paulo chegou a ser submetido ao rei Herodes Agripa II, porém depois de seu apelo ao imperador. Agripa não encontrou em Paulo nenhum motivo para ser condenado, contudo de nada adiantou o seu parecer.
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A viagem de Paulo a Roma
A viagem de Paulo a Roma ocorre entre os anos de 59 e 60 d.C., que o apóstolo atua como um verdadeiro missionário junto aos criminosos que estavam sendo transportados no navio. A viagem foi turbulenta, tornando-se perigosa depois que o navio já se encontrava em Creta, quando todos foram surpreendidos por um forte tufão quando navegavam pelo lado sul da ilha. Enfrentando uma longa tormenta, o navio afastou-se de Creta vindo a naufragar em Malta, onde Paulo permaneceu por três meses em terra curando os enfermos da ilha. Em
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Malta, tem-se o relato de mais um milagre ocorrido quando Paulo é picado por uma serpente e sobrevive sem sentir nenhum efeito do veneno da víbora. Depois disto, Paulo chega a Roma sendo muito bem recebido na cidade onde passa a aguardar o seu julgamento em custódia domiciliar, por dois anos, pagando por sua própria conta o aluguel de uma residência. Ali recebe vários judeus e lhes anuncia o Evangelho, entre os quais alguns crêem e outros não. A Bíblia não relata a morte de Paulo.
As viagens missionárias de Paulo
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Um pouco sobre Paulo
O martírio de São Paulo é celebrado junto com o de São Pedro, em 29 de junho, mas sua conversão tem tanta importância para a história da Igreja que merece uma data à parte. Neste dia, no ano 1554, deu-se também a fundação da que seria a maior cidade do Brasil, São Paulo, que ganhou seu nome em homenagem a tão importante acontecimento. Saulo, seu nome original, nasceu no ano 10 na cidade de Tarso, na Cilícia, atual Turquia. À época era um pólo de desenvolvimento financeiro e comercial, um populoso centro de cultura e diversões mundanas, pouco comum nas províncias romanas do Oriente. Seu pai Eliasar era fariseu e judeu descendente da tribo de Benjamim, e, também, um homem forte, instruído, tecelão, comerciante e legionário do imperador Augusto. Pelo mérito de seus serviços recebeu o título de Cidadão Romano, que por tradição era legado aos filhos. Sua mãe uma dona de casa muito ocupada com a formação e educação do filho. Portanto, Saulo era um cidadão romano, fariseu de linhagem nobre, bem situado financeiramente, religioso, inteligente, estudioso e culto. Aos quinze anos foi para Jerusalém dar continuidade aos estudos de latim, grego e hebraico, na conhecida Escola de Gamaliel, onde recebia séria educação religiosa fundamentada na doutrina dos fariseus, pois seus pais o queriam um grande Rabi, no futuro. Parece que era mesmo esse o anseio daquele jovem baixo, magro, de nariz aquilino, feições morenas de olhos negros, vivos e expressivos. Saulo já nessa idade se destacava pela oratória fluente e cativante marcada pela voz forte e agradável, ganhando as atenções dos colegas e não passando despercebido ao exigente professor Gamaliel. Saulo era totalmente contrário ao cristianismo, combatia-o ferozmente, por isso tinha muitos adversários. Foi com ele que Estêvão travou acirrado debate no templo judeu, chamado Sinédrio. Ele tanto clamou contra Estevão que este acabou apedrejado e morto, iniciando-se então uma incansável perseguição aos cristãos, com Saulo à frente com total apoio dos sacerdotes do Sinédrio. Um dia, às portas da cidade de Damasco, uma luz, descrita nas Sagradas Escrituras como "mais forte e mais brilhante que a luz do Sol", desceu dos céus, assustando o cavalo e lançando ao chão Saulo, ao mesmo tempo em que ouviu a voz de Jesus pedindo para que parasse de persegui-Lo e aos seus e, ao contrário, se juntasse aos apóstolos que pregavam as revelações de Sua vinda à Terra. Os acompanhantes que também tudo ouviram, mas não viram quem falava, quando a luz desapareceu ajudaram Saulo a levantar pois não conseguia mais enxergar. Saulo foi levado pela mão até a cidade de Damasco, onde recebeu outra "visita" de Jesus que lhe disse que nessa cidade deveria ficar alguns dias pois receberia uma revelação importante. A experiência o transformou profundamente e ele permaneceu em Damasco por três dias sem enxergar, e ao seu pedido também sem comer e sem beber. Depois Saulo teve uma visão com Ananias, um velho e respeitado cristão da cidade, na qual ele o curava. Enquanto no mesmo instante Ananias tinha a mesma visão em sua casa. Compreendendo sua missão, o velho cristão foi ao seu encontro colocando as mãos sobre sua cabeça fez Saulo voltar a enxergar, curando-o. A conversão se deu no mesmo instante pois ele
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pediu para ser Batizado por Ananias. De Damasco saiu a pregar a palavra de Deus, já com o nome de Paulo, como lhe ordenara Jesus, tornando-se Seu grande apóstolo. Sua conversão chamou a atenção de vários círculos de cidadãos importantes e Paulo passou a viajar pelo mundo, evangelizando e realizando centenas de conversões. Perseguido incansavelmente, foi preso várias vezes e sofreu muito, sendo martirizado no ano 67, em Roma. Suas relíquias se encontram na Basílica de São Paulo Fora dos Muros, na Itália, festejada no dia de sua consagração em 18 de novembro. O Senhor fez de Paulo seu grande apóstolo, o apóstolo dos gentios, isto é, o evangelizador dos pagãos. Ele escreveu 14 cartas, expondo a mensagem de Jesus, que se transformaram numa verdadeira "Teologia do Novo Testamento". Também é o patrono das Congregações Paulinas que continuam a sua obra de apóstolo, levando a mensagem do Cristianismo a todas as partes do mundo, através dos meios de comunicação.
3 - As Epístolas de São Paulo Para bem compreender as cartas de São Paulo, é preciso colocá-las em sua ordem cronológica e situá-las na narrativa dos Atos dos Apóstolos.
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Aos Tessalonicenses
As duas aos Tessalonicenses são as mais antigas. Elas devem ter sido escritas por volta dos anos 50 d.C.. Na primeira, o apóstolo lembra aos fiéis de Tessalônica com que desinteresse ele lhes pregou o Evangelho (cap. 1 e 2): fala-lhes da alegria que lhe causa o pensamento da fidelidade deles e da esperança que tem ele de vê-los progredir sempre mais (cap. 3). Convidaos a se mostrarem firmes e encoraja-os a viverem na esperança, falando-lhes da ressurreição dos mortos (cap. 4 e 5). Na segunda carta, ele previne seus leitores contra as falsas ideias relativas ao retorno glorioso do Senhor, que então se figurava muito próximo (cap. 1 e 2). Convida os fiéis a porem toda sua confiança em Deus, para que se fortaleçam e sejam preservados do demônio, e procura ajudálos a evitar a ociosidade (cap. 3).
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Aos Gálatas
O motivo da Epístola aos Gálatas foi o seguinte: alguns judeus cristãos queriam obrigar os pagãos neoconvertidos a se conformarem à antiga lei religiosa judaica. O apóstolo protesta contra este particularismo. Nessa epístola (cuja data é controvertida, colocando-a alguns em 48 e outros mais ou menos em 56 d.C.), ele conta como foi chamado ao apostolado pelo próprio Jesus, e afirma que só há
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um Evangelho autêntico, aquele que foi anunciado unanimemente por todos os outros apóstolos (cap. 1 e 2). Mostra em seguida a conformidade de sua doutrina com as promessas do Deus de Abraão, que foi justificado pela fé (cap. 3 e 4). Finalmente expõe o que é a liberdade cristã e a vida do fiel sob a conduta do Espírito de Deus (cap. 5 e 6).
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Aos Romanos
A epístola aos Romanos (que se pensa geralmente ter sido escrita no ano 57 d.C.), desenvolve ainda esse ponto de vista num magnífico comentário doutrinal, cujas ideias principais são: cap. 1 a 3: o estado do pecado em que se encontram os homens e a impossibilidade de se salvarem com seu próprio mérito; cap. 4 a 6: a salvação que Deus tinha dado pela fé a Abraão ele a concede agora a todos os homens pela fé em Jesus Cristo; cap. 7 e 8: a transformação operada por Deus no fiel pelo poder do Espírito Santo, e o dom inestimável que Deus dá aos homens por amor; cap. 9 a 11: exame da missa do povo hebreu, depositário das promessas, infiel à sua vocação, mas chamado a uma conversão futura. Numa segunda parte, cap. 12 a 15, o apóstolo expõe os fundamentos de uma vida moral verdadeiramente cristã, onde descreve os deveres dos cristãos para com seus adversários, as autoridades; recomenda a tolerância e a condescendência mútua na caridade.
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Aos Coríntios
A Primeira aos Coríntios é dirigida aos fiéis de uma comunidade onde já reinavam disputas e abusos. Ela é escrita de Éfeso, por volta do ano 55 d.C.. O apóstolo começa por pregar a união, dando como motivo de sua atitude a bela doutrina sobre a humildade que nos ensina a cruz de Jesus (cap. 1 a 3); lembra seus direitos à afeição dos fiéis de Corinto (cap. 4); protesta contra os escândalos sobrevindos na comunidade: processos judiciais entre os fiéis, imoralidade; e aproveita a ocasião para expressar sua opinião sobre o casamento e a virgindade (cap. 5 a 7); examina o que se deve fazer com as carnes provenientes dos sacrifícios pagãos aos ídolos (cap. 8 a 10); trata do traje das mulheres na Igreja e da celebração da comunhão (cap. 11); dá conselhos a respeito dos dons espirituais, escrevendo então uma célebre passagem sobre a caridade (cap. 12 a 14); fala da ressurreição dos mortos (cap. 15); e enfim apela para a generosidade de seus leitores em favor da comunidade de Jerusalém. Depois dessa epístola deve-se colocar uma carta aos mesmos destinatários, atualmente perdida, à qual alude aquela que chamamos de Segunda aos Coríntios. Nesta, o apóstolo defende-se de seus contraditores, primeiro de um modo geral, defendendo os direitos dos apóstolos, e em seguida justificando-se pessoalmente de todas as acusações de que ele fora objeto por parte dos fiéis de Corinto.
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Aos Efésios, Filipenses e Colossenses
As epístolas aos Efésios, aos filipenses e aos Colossenses são chamadas epístolas do cativeiro porque foram escritas durante uma detenção que sofreu o apóstolo em Éfeso e em Roma em
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60-62 d.C.. Nessas epístolas (sobretudo nas epístolas aos Efésios e aos Colossenses, que têm o mesmo plano), São Paulo trata do mistério do Cristo na Igreja, e junta, em uma segunda parte, uma série de conselhos morais dirigidos aos fiéis que vivem a nova vida de Jesus Cristo. A Epístola aos Filipenses, que tem um caráter mais pessoal, é notável pela multiplas expressões de alegria que contém. Quanto à Epístola a Filêmon, é mais um bilhete que uma carta, e dirigese a um rico cristão de Colossos, cujo escravo fugitivo viera buscar proteção junto ao apóstolo. Este implora do senhor irritado o perdão para o escravo arrependido.
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A Timóteo e Tito
As epístolas chamadas pastorais, duas a Timóteo e uma a Tito, foram escritas fora do quadro que nos oferece a narração dos Atos dos Apóstolos. Elas devem ser situadas as ultimas viagens que fez o apóstolo, depois de sua provável libertação em 62 d.C.. Timóteo, oriundo de listra, na Licaônia, é filho de pai grego e de mãe judia. É discípulo de Paulo e seu companheiro de viagem. A seguir é colocado à frente da comunidade de Éfeso. A Primeira a Timóteo é uma carta que visa a lembrar conselhos já recebidos e propor um programa de vida concernente aos homens, às mulheres, aos bispos e aos diáconos (é o primeiro índice histórico que temos de uma hierarquia na igreja). Depois de ter combatido uma falsa concepção de mortificação, ele dá enfim conselhos sobre o procedimento a ser mantido com as diversas categorias de fiéis: as viúvas, os anciãos, os escravos. Tito, é também um grego, colaborador de Paulo. Esse lhe escreve para lhe dar conselhos sobre a organização das comunidades da ilha de Creta. Esses conselhos são semelhantes aos da Primeira Epístola a Timóteo. Enfim, a Segunda a Timóteo é uma carta em que o apóstolo, novamente prisioneiro e pressentindo já o martírio, dá aos seus discípulos suas ultimas recomendações. É quase um adeus; tudo respira uma profunda emoção nesta carta.
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Aos Hebreus
A Epístola aos Hebreus deve ser mencionada à parte. Embora reflita as ideias mestras de São Paulo, ela não parece, entretanto, ter sido escrita por sua mão, tão diferente é seu estilo das outras. A carta é dirigida a uma parte dos judeus convertidos que sofriam por terem de abandonar o culto do templo e da sinagoga, ao se tornarem cristãos. A Epístola aos Hebreus estabelece, mediante uma sólida argumentação, partindo da lei de Moisés, que o Evangelho não somente contém toda a substância do culto israelita, mas que também é a realização efetiva daquilo que esse culto só possuía em imagem: 1) Jesus é Filho na casa de Deus, onde Moisés não passava de servo (cap. 1 a 4); 2) Jesus foi um sacerdote maior que Aarão (cap. 5);
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3) Jesus é maior que Melquisedeque (cap. 6 e 7); 4) O céu que Jesus nos introduz é incomparável ao templo do antigo culto (cap. 8); 5) Jesus, oferecendo-se a Deus em seu sacrifício sangrento, torna inúteis todos os sacrifícios do culto mosaico (cap. 9 e 10); 6) Os heróis do Antigo Testamento não obtiveram de Deus o cumprimento de todas as promessas (cap. 11); nós é que seremos os verdadeiros beneficiários dessas promessas, contanto que sigamos as pisadas de Jesus (cap. 12).
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As Epístolas Católicas
Tal é o nome que se dá aos sete escritos que se apresentam sob a forma de cartas, dirigidas não a uma comunidade particular, mas a um conjunto de Igrejas. A Epístola de Tiago é de fato obra de Tiago, irmão do Senhor, do qual São Paulo fala na Epístola aos Gálatas (cap. 2, 6-12) e que presidia, como bispo de Jerusalém, a importante reunião dos apóstolos em Jerusalém no ano 49 d.C.. Sua carta é toda penetrada do espírito do Sermão da Montanha: ela só contém conselhos para a vida moral: piedade, justiça e caridade. É um verdadeiro guia de virtudes para o cristão fervoroso. A Primeira de Pedro é uma carta escrita em estilo tão semelhante ao de São Paulo, que se supõe redigida por Silvano, discípulo de Paulo, que se tornara colaborador de Pedro, e que é mencionado nesta carta, no cap. 5, 12. Essa carta é notável pelo seu ensinamento sobre a alegria do cristão batizado e a união dos cristãos em Jesus Cristo (cap. 1 e 2). Dirigida a cristãos que sofrem por sua fé, a carta lembra-lhes o exemplo da Paixão de Cristo (cap. 3), exortandoos à santidade e à prática de todas as virtudes correspondentes aos seus estados. A Segunda de Pedro, que parece ter sido redigida por outro secretário do apóstolo, aproximase muito estreitamente da Epístola de Judas. Esses dois escritos têm por principal objeto a refutação de falsas doutrinas que alguns falsos profetas de vida dissoluta começavam a semear. São um encorajamento premente à fidelidade e ao amor de Deus. Restam as Três de João, que datam do fim do primeiro século, e tem por autor o apóstolo que Jesus amava. A ideia central da primeira é: Deus é amor e luz. Em consequência, o cristão deve conduzir-se como filho da luz: fugir da concupiscência, guardar os mandamentos, sobretudo o da caridade, e arrepender-se sinceramente, se lhe acontecer cair no pecado. As duas outras cartas (antes, bilhetes) são dirigidas: a primeira, a uma comunidade da Ásia (velada sob o nome misterioso de Kyria, a eleita); e a outra, a Gaio: tratam ambas de questões mais particulares.
4 - Apocalipse O Apocalipse (palavra grega que significa revelação) é obra do apóstolo João, que o escreveu no fim de sua vida, mais ou menos no ano 100 d.C., sob a forma de uma carta dirigida às Igrejas da Ásia Menor.
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Este livro é considerado pela maioria dos leitores como o mais difícil de compreender e o mais misterioso de toda a Bíblia. Ele é, com efeito, bastante enigmático, mas sua interpretação pode tornar-se mais clara, se se levar em conta, de um lado, o gênero literário utilizado pelo autor e, de outro, a circunstância em que a obra foi escrita. A situação dos cristãos da Ásia era, naquela época, das mais críticas. As perseguições já tinham começado. Por outro lado, muitos cristãos, que esperavam uma próxima libertação pelo retorno glorioso de Cristo, verificavam com tristeza que esse retorno demorava e que seu termo era quase indefinidamente adiado. Tomados de angústia, começavam a perder a esperança de encontrar um dia a independência religiosa. O apóstolo João, fazendo de seu livro uma mensagem de reconforto e de encorajamento, e ao mesmo tempo um manifesto contra o paganismo reinante, quer anunciar aos seus leitores a inevitável oposição do mal e do bem sobre a terra, e predizer a vitória de Deus, decisiva e certa, embora realizada no sofrimento e na morte. Para esse fim, ele lança mão de um recurso literário muito usado entre os judeus há dois séculos aproximadamente, do qual se pode ver um exemplo no livro de Daniel. Esse gênero literário foi chamado gênero apocalíptico, porque apresenta aos olhos do leitor uma série de visões, ou revelações muito simbólicas, tendo um sentido oculto. Não se trata de dar uma descrição antecipada de acontecimentos futuros, mas de apresentar uma mesma realidade sob vários símbolos diferentes. Essas visões se supõem outorgadas a um personagem que, dessa maneira, recebe comunicação das intenções divinas sobre os destinos do mundo. Tudo isso é feito numa linguagem intencionalmente figurada e misteriosa, para provocar uma atenção mais viva do leitor. A leitura do Apocalipse será menos desconcertante, se desde o começo for indicado o simbolismo de várias dessas imagens empregadas, por exemplo: o o o o o o o o
O cordeiro, simboliza o Cristo; A mulher, a Igreja; O dragão, as forças hostis ao Reino de Deus; As duas feras (cap. 13), o império romano e o culto imperial; A fera (cap. 17), simboliza Nero; Babilônia, a Roma pagã; As vestes brancas, a vitória; O número 3 ¹/2, coisa nefasta ou caduca
Entretanto esses símbolos não são exclusivos: o Cristo é às vezes mostrado como o Filho do homem ou um cavaleiro. O Apocalipse não deve, portanto, ser tomado como uma história contemporânea escrita no tempo futuro (verbo); ele não é tampouco uma revelação clara e definitiva do futuro: é uma mensagem sobrenatural (velada em símbolos, representando tanto o passado, como o presente e o futuro), concernente a um período indefinido que separa a ascensão de Jesus de sua volta gloriosa. Ele anuncia aos fiéis a impossibilidade de escapar à luta e ao sofrimento, às perseguições e ao fracasso aparente no plano terrestre, à realidade da salvação que lhe será concedida no meio de suas obrigações, e à vitória final, obra de Cristo ressuscitado que venceu a morte.
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Conclusão Final
A revelação de Deus na Bíblia não envolve uma garantia científica de tudo o que nela se encontra. É inútil pedir à Bíblia uma explicação dos seis dias da criação ou da maneira como podiam falar os animais, como por exemplo no caso da jumenta de Balaão. Esses dados não são em si revelações, mas tradições que se contêm. A história mesma, tal como é contida na Bíblia, não é tampouco uma revelação. Mesmo aquele que aprendeu de sua leitura a sucessão dos reinos em Israel, os costumes dos antigos judeus, e até mesmo o cumprimento das profecias do Antigo Testamento no Novo, pode ainda passar ao lado da verdadeira mensagem bíblica. A escolha que se pode fazer de certas passagens favoritas, edificantes ou comoventes, não constitui tampouco uma verdadeira leitura da Bíblia. Essa verdadeira leitura deverá sempre ter em vista a finalidade primária de toda a Escritura Sagrada que é anunciar Jesus Cristo e dar testemunho de sua pessoa. Para aqueles que viviam no Antigo Testamento só se tratava ainda de um Salvador desconhecido, que viria. Para nós trata-se de um Salvador que habitou entre nós, e cuja presença espiritual se perpetuará até o fim dos tempos, isto é, até o seu retorno glorioso. A Bíblia não entrou, pois, em caducidade. Ela diz-nos respeito hoje como para além dos séculos. Entramos em contato com aquele mesmo Senhor que tinha escolhido Abraão, que havia eleito o povo de Israel, livrado os hebreus do Egito, e santificado os homens pela morte de Jesus Cristo. Como Deus não tem mudado em seu modo de proceder, podemos concluir que somos todos nós, tanto individualmente como na Igreja, escolhidos, eleitos, libertados e santificados pelo nome desse mesmo Jesus Cristo, que os dois Testamentos apontam: o Antigo, como sua esperança; o Novo, como seu modelo; ambos, como seu centro. Os quatro evangelhos harmoniosamente relatam a vida e os ensinamentos do Cristo Redentor, seus milagres, os Seus sofrimentos na Cruz, Sua morte e sepultamento, Sua gloriosa ressurreição e ascensão ao céu. Mutuamente complementando-se e esclarecendo, os evangelhos representam um único livro, sem contradições ou variações no que é mais importante e fundamental. A misteriosa carruagem vista pelo profeta Ezequiel no rio Chebar (Ezequiel 1, 1-28), com cinco criaturas, que tinham semelhança com um homem, um leão, um touro e uma águia, serve como símbolo dos quatro evangelhos. Ao início do século V, a arte cristã representa Mateus como um homem ou anjo, Marcos como um leão, Lucas um boi e João como uma águia. Além dos quatro Evangelhos havia mais 50 outras escritas similares durante os primeiros séculos que se apresentavam como "evangelhos" e declaravam origem apostólica. A Igreja chamou estas escritas de Apócrifos - o que significa não credenciados ou livros repudiados. Estes livros contêm narrativas distorcidas e de significado duvidoso. Estes incluem o primeiro evangelho de Jó, a história de José o carpinteiro, o evangelho de Tomás, o evangelho de Nicodemos e outros. Nestes evangelhos podemos encontrar as mais antigas lendas relatando a infância e a juventude de Jesus Cristo.
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Os 21 Concílios ecumênicos da Igreja
Os Concílios ecumênicos (universais) realizados pela Igreja, em número de 21, foram marcos importantíssimos na sua História, tendo em vista principalmente as definições da doutrina católica ao longo do tempo, vencendo os erros e heresias que comprometiam a sã doutrina da fé. Esses Concílios, bem como a história dos papas, formam como que a coluna vertebral da História da Igreja e o trabalho do Magistério. Disse certa vez o Papa Paulo VI que quem não ama a Igreja, não ama Jesus Cristo; uma vez que a Igreja é o Seu próprio Corpo místico. Falando a respeito dos Concílios da Igreja, disse o Papa João Paulo II, em 7/7/96: Como se sabe, um papel particularmente significativo foi desempenhado pelos primeiros quatro Concílios, celebrados entre os anos 325 e 451 em Nicéia, Constantinopla, Éfeso e Calcedônia. Para além dos acontecimentos históricos, em que cada um deles se coloca e apesar de algumas dificuldades terminológicas, eles foram momentos de graça, através dos qual o Espírito de Deus concedeu luz abundante sobre os mistérios fundamentais da fé cristã. E como se poderia minimizar a sua importância? Neles estava em questão o fundamento, diria o centro mesmo do Cristianismo. Em Nicéia e Constantinopla, determinou-se com clareza a fé da Igreja no mistério da Trindade, com a afirmação da divindade do Verbo e do Espírito Santo. Em Éfeso e Calcedônia discutiu-se a respeito da identidade divino-humana de Cristo. Diante de quem era tentado a exaltar uma dimensão em desvantagem da outra ou de dividi-las em prejuízo da unidade pessoal, foi claramente afirmado que a natureza divina e a natureza humana de Cristo permanecem íntegras e inconfundíveis, indivisas e inseparáveis, na unidade da pessoa divina do Verbo. Cristo é verdadeiro Deus e verdadeiro homem… Não faltaram certamente, tensões na celebração daquelas assembleias conciliares. Mas o sentido vivo da fé, corroborado pela graça divina, no final prevaleceu também nos momentos mais críticos. Emergiu, então, com toda a evidência a fecundidade daquela autêntica sinergia eclesial, que o ministério do Sucessor de Pedro é chamado a assegurar, não certamente a mortificar… Caríssimos Irmãos e Irmãs, naquele tempo, como sempre, o caminho da Igreja foi acompanhado pela intercessão materna da Virgem Santa, à qual o Concílio de Éfeso em 431, reconheceu o título de Theotòkos´, Mãe de Deus, ressaltando assim que a natureza humana, por ela transmitida a Cristo, pertence Àquele que desde sempre é Filho de Deus (L’Osservatore Romano n.28 de 13/7/96).
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01. Concílio de NICEIA I - Data: 20/05 a 25/07 de 325 Papa: Silvestre I (314-335) Decisões principais: o
A confissão de fé contra Ario: igualdade de natureza do Filho com o Pai. Jesus é Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao Pai.
o
Fixação da data da Páscoa a ser celebrada no primeiro domingo após a primeira lua cheia da primavera (hemisfério norte).
o
Estabelecimento da ordem de dignidade dos Patriarcados: Roma, Alexandria, Antioquia, Jerusalém.
02. Concílio de CONSTANTINOPLA I - Data: maio a junho de 381 Papa: Dâmaso I (366-384) Decisões principais: o
A confissão da divindade do Espírito Santo, e a condenação do Macedonismo de Macedônio, patriarca de Constantinopla. Cremos no Espírito Santo, Senhor e fonte de vida, que procede do Pai, que é adorado e glorificado com o Pai e o Filho e que falou pelos profetas. Com o Pai e o Filho ele recebe a mesma adoração e a mesma glória (DS 150). Condenação de todos os defensores do arianismo (de Ário) sob quaisquer das suas modalidades. A sede de Constantinopla ou Bizâncio (segunda Roma), recebeu uma preeminência sobre as sedes de Jerusalém, Alexandria e Antioquia.
03º. Concílio de ÉFESO - Data: 22/06 a 17/07 de 431 Papa: Celestino I (422-432) Decisões principais: o
Cristo é uma só Pessoa e duas naturezas.
o
Definição do dogma da maternidade divina de Maria, contra Nestório, patriarca de Constantinopla, que foi deposto.
o
Maria é mãe de Deus THEOTOKOS.
o
Mãe de Deus não porque o Verbo de Deus tirou dela a sua natureza divina, mas porque é dela que Ele tem o corpo sagrado dotado de uma alma racional, unido ao qual, na sua pessoa, se diz que o Verbo nasceu segundo a carne. (DS 251).
o
Condenou o pelagianismo, de Pelágio, que negava os efeitos do pecado original. Condenou o messalianismo, que apregoava uma total apatia ou uma Moral indiferentista.
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04º. Concílio de CALCEDÔNIA - Data: 08/10 a 1º/11 de 451 Papa: Leão I, o Grande (440-461) Decisões principais: o
Confirmação das duas naturezas na única Pessoa de Cristo, contra o monofisismo de Êutiques de Constantinopla. Na linha dos santos Padres, ensinamos unanimemente a confessar um só e mesmo Filho, Nosso Senhor Jesus Cristo, o mesmo perfeito em divindade e perfeito em humanidade, o mesmo verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, composto de uma alma racional e de um corpo, consubstancial ao Pai segundo a divindade, consubstancial a nós segundo a humanidade, semelhante a nós em tudo com exceção do pecado (Hb4,15); gerado do Pai antes de todos os séculos segundo a divindade, e nesses últimos dias, para nós e para nossa salvação, nascido da Virgem Maria, Mãe de Deus, segundo a humanidade. Um só e mesmo Cristo, Senhor, Filho Único que devemos reconhecer em duas naturezas, sem confusão, sem mudanças, sem divisão, sem separação. A diferença das naturezas não é de modo algum suprimida pela sua união, mas antes as propriedades de cada uma são salvaguardadas e reunidas em uma só pessoa e uma só hipóstase. (DS 301-302).
o
Condenação da simonia, dos casamentos mistos e das ordenações absolutas (realizada sem que o novo clérigo tivesse determinada função pastoral).
05º. Concílio de CONSTANTINOPLA II - Data: 05/05 a 02/07 de 553 Papa: Virgílio (537-555) Decisões principais: o
Condenação dos nestorianos Teodoro de Mopsuéstia, Teodoro de Ciro e Ibas de Edessa (Três Capítulos).
o
Não há senão uma única hipóstase [ou pessoa], que é Nosso Senhor Jesus Cristo, Um na Trindade… Aquele que foi crucificado na carne, nosso Senhor Jesus Cristo, é verdadeiro Deus, Senhor da glória e Um na Santíssima Trindade (DS 424)
o
Toda a economia divina é obra comum das três pessoas divinas. Pois da mesma forma que a Trindade não tem senão uma única e mesma natureza, assim também, não tem senão uma única e mesma operação (DS 421).
o
Um Deus e Pai do qual são todas as coisas, um Senhor Jesus Cristo para quem são todas as coisas, um Espírito Santo em quem são todas as coisas (DS 421).
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06º. Concílio de CONSTANTINOPLA III - Data: 07/11 de 680 a 16/09 de 681 Papa: Ágato (678-681) e Leão II (662-663) Decisões principais: o
Condenação do monotelitismo, heresia defendida pelo patriarca Sérgio de Constantinopla que ensinava haver só a vontade divina em Cristo.
o
Este Concílio ensinou que Cristo possui duas vontades e duas operações naturais, divinas e humanas, não opostas, mas cooperantes, de sorte que o Verbo feito carne quis humanamente na obediência a seu Pai tudo o que decidiu divinamente com o Pai e o Espírito Santo para a nossa salvação (DS 556´559). A vontade humana de Cristo segue a vontade divina, sem estar em resistência nem em oposição em relação a ela, mas antes sendo subordinada a esta vontade todo poderosa (DS 556; CIC 475).
07º. Concílio de NICEIA II - Data: 24/09 a 23/10 de 787 Papa: Adriano I (772-795) Decisões principais: o Contra os iconoclastas: há sentido e liceidade na veneração de imagens. o
Para proferir sucintamente a nossa profissão de fé, conservamos todas as tradições da Igreja, escritas ou não escritas, que nos têm sido transmitidas sem alteração. Uma delas é a representação pictórica das imagens, que concorda com a pregação da história evangélica, crendo que, de verdade, e não na aparência, o Verbo de Deus se fez homem, o que é também útil e proveitoso, pois as coisas que se iluminam mutuamente têm sem dúvida um significado recíproco (DOC 111).
o
Nós definimos com todo o rigor e cuidado que, à semelhança da representação da cruz preciosa e vivificante, assim as venerandas e sagradas imagens pintadas querem em mosaico, quer em qualquer outro material adaptado, devem ser expostas nas santas igrejas de Deus, nas alfaias sagradas, nos paramentos sagrados, nas paredes e mesas, nas casas e nas ruas; sejam elas as imagens do Senhor Deus, dos santos anjos, de todos os santos e justos (DS, 600-601).
08º. Concílio de CONSTANTINOPLA IV - Data: 05/10 de 869 a 28/02 de 870 Papa: Nicolau I (858-867) e Adriano II (867-872) Decisões principais: o
Extinção do cisma do patriarca de Constantinopla, Fócio, que foi condenado.
o
O culto das imagens foi confirmado.
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09º. Concílio de LATRÃO I - Data: 18/03 a 06/04 de 1123 Papa: Calixto II (1119-1124) Decisões principais: o
Confirmação da Concordata de Worms, que assegurava à Igreja plena liberdade na escolha e ordenação dos seus bispos. Fortalecimento da disciplina eclesiástica. Confirmação do celibato sacerdotal.
10º. Concílio de LATRÃO II - Data: abril de 1139 Papa: Inocêncio II (1130-1143) Decisões principais: o
O cisma do antipapa Anacleto II.
o
Vetou o exercício da medicina e da advocacia pelo clero.
o
Rejeitou a usura e o lucro.
11º. Concílio de LATRÃO III - Data: 05 a 19 de março de 1179 Papa: Alexandre III (1159-1181) Decisões principais: o
Fixação da necessidade de dois terços dos votos na eleição do Papa, ficando excluído qualquer recurso às autoridades leigas para dirimir dúvidas do processo eleitoral. Rejeição do acúmulo de benefícios ou funções dentro da Igreja por parte de uma mesma pessoa. Recomendação da disciplina da Regra aos monges e cavaleiros regulares, que interferiam indevidamente no governo da Igreja. Condenação das heresias da época, de fundo dualista (catarismo) ou de pobreza mal-entendida (a Pattária, o movimento dos Pobres de Lião ou Valdenses).
12º. Concílio de LATRÃO IV - Data: 11 a 30 de novembro de 1215 Papa: Inocêncio III (1198-1216) Decisões principais: o
A condenação dos albigenses e valdenses;
o
Condenação dos erros de Joaquim de Fiore, que pregava o fim do mundo para breve, apoiando-se em falsa exegese bíblica; declaração da existência dos demônios como sendo anjos bons que abusaram do seu livre arbítrio pecando;
o
Com efeito, o Diabo e outros demônios foram por Deus criados bons em sua natureza, mas se tornaram maus por sua própria iniciativa (DS 800).
o A realização de mais uma cruzada para libertar o Santo Sepulcro de Cristo, em Jerusalém, que se achava nas mãos dos mulçumanos; o A profissão de fé na Eucaristia, tendo sido então usada a palavra transubstanciação. o
A obrigação da confissão e da comunhão anua.
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o
Fixou normas sobre a disciplina e a Liturgia da Igreja.
13º. Concílio de LYON I - Data: 28/06 a 17/07 de 1245 Papa: Inocêncio IV (1243-1254) Decisões principais: o
Excomunhão e deposição do imperador Frederico II da Alemanha.
14º. Concílio de LYON II - Data: 07/05 a 17/07 de 1274 Papa: Gregório X (1271-1276) Decisões principais: o Procedimentos referentes ao conclave, eleição do Papa em recinto fechado; união da Igreja latina com a Igreja grega (Constantinopla).
15º. Concílio de VIENA FRANÇA - Data: 16/10 de 1311 a 06/05 de 1312 Papa: Clemente V (1305-1314) Decisões principais: o
Supressão da Ordem dos Templários; contra o modo de viver a pobreza dos franciscanos, chamados Espirituais, que adotavam ideias heréticas sobre a pobreza; condenação do franciscano Pedro Olivi, que admitia no ser humano elementos intermediários entre a alma e o corpo.
16º. Concílio de CONSTANÇA - Data: 05/11 de 1414 a 22/04 de 1418. Papas: situação de vários antipapas: Decisões principais: o
Resignação do Papa Romano, Gregório XII (1405-1415), deposição do antiPapa, João XXIII (1410-1415) em 29/05/1415, deposição do antiPapa Avinhense, Benedito XIII (1394-1415) em 26/07/1417, eleição de Martinho V em 11/11/1417, extinção do Grande Cisma do Ocidente (1305-1378); condenação da doutrina de João Hus, João Wiclef e Jerônimo de Praga, precursores de Lutero. Decreto relativo à periodicidade dos Concílios; rejeição do conciliarismo (prevalência da autoridade dos concílios sobre o Papa).
17º. Concílio de BASILEIA - FERRARA - FLORENÇA - Papa: Eugênio IV (1431-1447) Datas e locais: em Basileia de 23/07/1431 a 07/05/1437; em Ferrara de 18/09/1437 a 1º/01/1438; em Florença de 16/07/1439; em Roma, a partir de 25/04/1442. Decisões principais:
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Reunião com os gregos em 06/07/1439, com os armênios em 22/11/1439, com os jacobistas em 04/02/1442 questões doutrinárias sobre a SS. Trindade:
o O Espírito Santo tem sua essência e seu ser subsistente ao mesmo tempo do Pai e do Filho e procede eternamente de ambos como de um só Princípio e por uma única expiração… E uma vez que tudo o que é do Pai, o Pai mesmo o deu ao seu Filho Único ao gerá-lo, excetuando o seu ser de Pai, esta própria procissão do Espírito Santo a partir do Filho, ele a tem eternamente de Seu Pai que o gerou eternamente. (DS 13001301) tudo é uno [neles] lá onde não se encontra oposição de relação (DS 1330). Por causa dessa unidade o Pai está todo inteiro no Filho, todo inteiro no Espírito Santo; o Filho está todo inteiro no Pai, todo inteiro no Espírito Santo; o Espírito Santo todo inteiro no Pai, todo inteiro no Filho. O Pai, o Filho e o Espírito Santo não são três princípios das criaturas, mas um só princípio (DS 1331).
18. Concílio de LATRÃO V - Data: 10/05/1512 a 16/03/1517 Papas: Julio II (1503´1513) e Leão X (1513´1521) Decisões principais: o
Contra o concílio sismático de Pisa (1511´1512) decretos de reforma da formação do clero, sobre a pregação, etc. ´ condenou a Sanção de Bourges, declaração que favorecia a criação de uma Igreja Nacional da França. Assinatura de uma Concordata que regulamentava as relações entre a Santa Sé e a França. Condenação da tese segundo a qual a alma humana é mortal e uma só para toda a humanidade, de Pietro Pomponazzi. Exigência do Imprimatur para os livros que versassem sobre a fé ou teologia.
19º. Concílio de TRENTO - Data: 13/12/1545 a 04/12/1563 (em três períodos) Papas: Paulo II (1534-1549); Júlio III (1550-1555) e Pio IV (1559-1565) Decisões principais: o
Contra a Reforma de Lutero; doutrina sobre a Escritura e a Tradição: reafirmação do Cânon das Sagradas Escrituras e declarou a Vulgata isenta de erros teológicos. Doutrina do pecado original, justificação, os sacramentos e a missa, a veneração e invocação dos santos, Eucaristia, purgatório, indulgências, etc. decretos de reforma. Quando Deus toca o coração do homem pela iluminação do Espírito Santo, o homem não é insensível a tal inspiração que pode também rejeitar; e, no entanto, ele não pode tampouco, sem a graça divina, chegar, pela vontade livre à justiça diante dele (DS 1525). Tendo recebido de Cristo o poder de conferir indulgências, já nos tempos antiquíssimos usou a Igreja desse poder, que divinamente lhe fora doado… (DS, 1935). Na Sessão VI, cânon 30, afirmou: Se alguém disser que a todo pecador penitente, que recebeu a graça da justificação, é de tal modo perdoada a ofensa e desfeita e abolida a obrigação à pena eterna, que não lhe fica obrigação alguma de pena temporal a pagar, seja neste mundo ou no outro, purgatório, antes que lhe possam ser abertas às portas para o reino dos céus seja excomungado. (DS 1580, 1689,1693) A Igreja ensina e ordena que o uso das indulgências, particularmente salutar ao povo cristão e aprovado
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pela autoridade dos santos concílios, seja conservado na Igreja, e fere com o anátema aos que afirmam serem inúteis as indulgências e negam à Igreja o poder de concedêlas (Decreto sobre as Indulgências). Fiéis à doutrina das Sagradas Escrituras, às tradições apostólicas. E ao sentimento unânime dos padres, professamos que os sacramentos da nova lei foram todos instituídos por Nosso Senhor Jesus Cristo (DS 1600´1601) No santíssimo Sacramento da Eucaristia, estão contidos verdadeiramente, realmente e substancialmente, o Corpo e o Sangue juntamente com a alma e a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo e, por conseguinte, o Cristo todo (DS 1651).
20º. Concílio VATICANO - Data: 08/12/1869a 18/07/1870 Papa: Pio IX (1846-1878) Decisões principais: o
Constituição dogmática Dei Filius, sobre a fé católica, ´ Constituição Dogmática Pastor Aeternus, sobre o primado e a infalibilidade do Papa quando se pronuncia ex-catedra, em assuntos de fé e de Moral. Questões doutrinárias. Este único e verdadeiro Deus, por sua bondade e por sua virtude onipotente, não para adquirir nova felicidade ou para aumentá-la, mas a fim de manifestar a sua perfeição pelos bens que prodigaliza às criaturas, com vontade plenamente livre, criou simultaneamente no início do tempo ambas as criaturas do nada: a espiritual e a corporal (DS 3002). O mundo foi criado para a glória de Deus (DS 3025). Cremos que Deus não precisa de nada preexistente nem de nenhuma ajuda para criar (DS 3022). A criação também não é uma emanação necessária da substância divina (DS 3023´3024). Deus cria livremente do nada (DS 3025). Deus conserva e governa com sua providência tudo que criou, ela se estende com vigor de um extremo ao outro e governa o universo com suavidade (Sb8,1). (DS 3003). A Santa Igreja, nossa mãe, sustenta e ensina que Deus, princípio e fim de todas as coisas, pode ser conhecido com certeza pela luz natural da razão humana a partir das coisas criadas (DS 3004).
21º. Concílio VATICANO II - Data: 11/10/1962 a 07/12/1965 Papas: João XXIII (1958-1963) e Paulo VI (1963-1978) Decisões principais: o
Procuremos apresentar aos homens de nosso tempo, íntegra e pura, a verdade de Deus de tal maneira que eles a possam compreender e a ela espontaneamente
assentir. Pois somos Pastores… ´ (João XXIII aos padres conciliares, na homilia de abertura do concílio). Sobre a importância do Concílio Vaticano II, disse o Papa João Paulo II, em 15/10/1995: Na história dos Concílios, ele reveste uma fisionomia muito singular. Nos Concílios precedentes, com efeito, o tema e a ocasião da celebração tinham sido dados por particulares problemas doutrinais ou pastorais. o Concílio Ecumênico Vaticano II quis ser um momento de reflexão global da Igreja sobre si mesma e sobre as suas relações com o mundo. A essa reflexão impelia a necessidade de uma fidelidade cada vez maior ao seu Senhor. Mas o impulso vinha também das grandes mudanças do mundo contemporâneo, que, como sinais dos tempos, exigiam
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ser decifradas à luz da Palavra de Deus. Foi mérito de João XXIII não só ter convocado o Concílio, mas também ter-lhe dado o tom da esperança, tomando as distâncias dos profetas de desventura e confirmando a própria e indômita confiança na ação de Deus. Graças ao sopro do Espírito Santo, o Concílio lançou as bases de uma nova primavera da Igreja. Ele não marcou a ruptura com o passado, mas soube valorizar o patrimônio da inteira tradição eclesial, para orientar os fiéis na resposta aos desafios da nossa época. À distância de trinta anos, é mais do que nunca necessário retornar àquele momento de graça. Como pedi na Carta Apostólica Tertio milennio adveniente (n.36) entre os pontos de um irrenunciável exame de consciência, que deve envolver todas as componentes da Igreja, não pode deixar de haver a pergunta: quanto da mensagem conciliara passou para a vida, as instituições e o estilo da Igreja. Já no Sínodo dos Bispos de 1985 [sobre o Concílio] foi posto um análogo interrogativo. Ele continua válido ainda hoje, e obriga antes de mais a reler o Concílio, para dele recolher integralmente as indicações e assimilar o seu espírito… A história testemunha que os Concílios tiveram necessidade de tempo para produzir os seus frutos. Contudo, muito depende de nós, com a ajuda da graça de Deus. (L’Osservatore Romano, 15/10/95) Documentos promulgados: 01´ Constituição Dogmática sobre a Igreja (Lumen Gentium) 02 ´ Constituição Dogmática sobre a Revelação Divina (Dei Verbum) 03 ´ Constituição Pastoral sobre a Igreja e o mundo de hoje (Gaudium et Spes) 04 ´ Constituição Dogmática Sobre a Sagrada Liturgia (Sacrosanctum Concilium) 05 ´ Decreto sobre o Ecumenismo ( Unitatis Redintegratio). 06 ´ Decreto sobre as Igrejas Orientais Católicas (Orientalium Ecclesiarum). 07 ´ Decreto sobre a Atividade Missionária da Igreja (Ad Gentes). 08 ´ Decreto sobre o Munus Pastoral dos Bispos na Igreja (Christus Dominus). 09 ´ Decreto sobre o Ministério e a Vida dos Presbíteros (Presbyterorum Ordinis). 10 ´ Decreto sobre a Atualização dos Religiosos (Perfectae Caritatis). 11´ Decreto sobre a Formação Sacerdotal (Optatam Totius). 12 ´ Decreto sobre o Apostolados dos Leigos (Apostolicam Actuositatem) 13 ´ Decreto sobre os Meios de Comunicação Social (Inter Mirifica). 14 ´ Declaração sobre a Educação Cristã (Gravissimum Educationis) 15 ´ Declaração sobre a Liberdade Religiosa (Dignitates Humanae). 16´ Declaração sobre as Relações da Igreja com as Religiões não Cristãs (Nostra Aetate).
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Índice Página 02 03 04 05 06 07 08 09 11 11 12 13 13 14 14 15 16 17 18 19 21 22 23
Data 2011 d.C. 1850 a.C. 1250 a.C. 1200 a.C. 1000 a.C. 930 a.C. 875 a.C. 753 a.C. 722 a.C. 700 a.C. 612 a.C. 600 a.C. 598 a.C. 587 a.C. 538 a.C. 536 a.C. 490 a.C. 450 a.C. 333 a.C. 175 a.C. 63 a.C. 31 a.C. ~05 a.C.
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29
02 a.C.
35 36 39 41
05 d.C. 28 d.C. 28 d.C. 28 d.C.
Descrição Prefácio Abraão em Canaã Moisés (passagem do mar vermelho, os hebreus no deserto) Josué (tomada de Jericó, Conquista da Palestina, Juízes, guerra de Tróia) Saul, Rei Davi, Rei Salomão Divisão do reino Judá (Elias, Eliseu, Amós, Oséias) Fundação de Roma (Itália) Isaías, Miquéias (queda de Samaria) Jeremias, Sofonias Naum, Habacuc (queda do império assírio) Ezequiel Primeiro cerco a Jerusalém (Nabucodonosor/Babilônia) Queda de Jerusalém e a 1ª destruição do Templo Exílio dos hebreus em Babilônia (Ciro conquista Babilônia) Retorno dos Judeus à Palestina Ageu, Zacarias, Abdias (batalha de Maratona/Grécia) Malaquias, Neemias, Esdras Alexandre Magno/Macedônia (dominação Grega) Antíoco Epífanes (revolta de Judas Macabeu) Pompeu conquista a Palestina Período romano (batalha de Actium, César Augusto imperador) Nascimento de Jesus Fatos bíblicos que antecederam o nascimento de Jesus A notícia do anjo Gabriel O Nascimento de Jesus Nascimento em uma manjedoura A visita dos magos do Oriente Data exata do nascimento de Jesus A infância de Jesus Circuncisão O nome de Jesus Purificação de Maria e apresentação de Jesus no Templo Matança dos inocentes Fuga para o Egito Infância Apócrifa do Menino Jesus Importância dos Evangelhos Apócrifos A infância de Jesus Cristo Segundo Tomé O Menino Jesus no Templo João Batista O Batismo de Jesus O Ministério de Jesus O Primeiro Milagre Jesus, O Mestre dos Mestres A Autoridade dos ensinos de Jesus O novo mandamento de Jesus Descendência de Jesus Cristo
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30 d.C. Morte de Jesus (sob Pôncio Pilatos) Um dia no tribunal Diz a história Uma amizade misteriosa O grande veredicto Data exata da morte de Jesus Lavando as mãos Sábado Santo Domingo da Ressurreição Ascensão de Jesus Como era a pessoa de Jesus Cristo 70 d.C. 2ª destruição de Jerusalém e 2ª destruição do Templo A revolta O cerco de Jerusalém O golpe final A questão do "Porquê" 2013 d.C. O Terceiro Templo Um pouco de geografia Galiléia, Samaria e Judéia As duas esferas da sociedade judaica Herodes I, Pôncio Pilatos e Sinédrio Templo, Festas judaicas e Sinagoga A pirâmide social Saduceus, Fariseus, Essênios, Zelotas e marginalizados sociais A vida social e econômica Nazaré, Carfanaum, Betsaida, Betânia e Jerusalém A terra, o seu povo e a sua história A Bíblia em geral 1400 a.C. Antigo Testamento - O Pentateuco Gênese Êxodo Os Dez Mandamentos 1000 a.C. Levítico Números Deuteronômio Conclusão 1200 a.C. Antigo Testamento - Livros Históricos Josué 1100 a.C. Juízes 1100 a.C. Rute 1040 a.C. Os dois livros de Samuel Davi 970 a.C. Os dois livros dos Reis O Grande Profeta Elias O Profeta Eliseu 300 a.C. Crônicas 250 a.C. Esdras - Neemias 200 a.C. Tobias - Judite - Ester 175 a.C. Os dois livros dos Macabeus 500 a.C. Antigo Testamento - Livros Sapenciais Jó
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1440 a.C. 950 a.C. 300 a.C. 400 a.C. 100 a.C. 200 a.C.
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740 a.C. 622 a.C. 586 a.C. 100 a.C. 593 a.C. 200 a.C. 735 a.C. 500 a.C. 750 a.C. 587 a.C. 700 a.C. 722 a.C. 608 a.C. 625 a.C. 605 a.C. 520 a.C. 500 a.C. 444 a.C.
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50 d.C.
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56 d.C. 57 d.C. 55 d.C. 60 d.C. 62 d.C. 67 d.C.
60 d.C. 64 d.C. 65 d.C. 95 d.C. 65 d.C.
Salmos Provérbios O Eclesiastes O Cântico dos Cânticos A Sabedoria O Eclesiástico Antigo Testamento - Livros Proféticos Os Profetas Isaías Jeremias Lamentações Baruc Ezequiel Daniel Oséias Joel Amós Abdias Jonas Miquéias Naum Sofonias Habacuc Ageu Zacarias Malaquias O Novo Testamento - Os Evangelhos Mateus Marcos Lucas João Conclusão O Novo Testamento - Os Atos dos Apóstolos Fatos importantes O Evangelho chega aos gentios A primeira viagem de Paulo Concílio de Jerusalém A segunda viagem de Paulo A terceira viagem de Paulo A prisão de Paulo A viagem de Paulo a Roma Um pouco sobre Paulo O Novo Testamento - As Epístolas de São Paulo Aos Tessalonicenses Aos Gálatas Aos Romanos Aos Coríntios Aos Efésios, Filipenses e Colossenses A Timóteo e Tito Aos Hebreus
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49 d.C. O Novo Testamento - As Epístolas Católicas 100 d.C. Apocalipse Conclusão Os 21 Concílios ecumênicos da Igreja 325 d.C. 1º Concílio de Nicéia 381 d.C. 2º Concílio de Constantinopla I 431 d.C. 3º Concílio de Éfeso 451 d.C. 4º Concílio de Calcedônia 553 d.C. 5º Concílio de Constantinopla II 681 d.C. 6º Concílio de Constantinopla III 787 d.C. 7º Concílio de Nicéia II 870 d.C. 8º Concílio de Constantinopla IV 1123 d.C. 9º Concílio de Latrão I 1139 d.C. 10º Concílio de Latrão II 1179 d.C. 11º Concílio de Latrão III 1215 d.C. 12º Concílio de Latrão IV 1245 d.C. 13º Concílio de Lyon I 1274 d.C. 14º Concílio de Lyon II 1312 d.C. 15º Concílio de Viena França 1418 d.C. 16º Concílio de Constança 1431 d.C. 17º Concílio de Basiléia - Ferrara - Florença 1517 d.C. 18º Concílio de Latrão V 1563 d.C. 19º Concílio de Trento 1870 d.C. 20º Concílio Vaticano 1965 d.C. 21º Concílio Vaticano II 2011 d.C. Contato Índice
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Fontes de pesquisa: Bíblia Ave Maria Artigos religiosos diversos Contato: JPaulo e-mail: jpaulo_821@hotmail.com Distribuição gratuita, sem fins lucrativos. 2011 - Vila Velha / ES / Brasil
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