Boletim Novas #2: Educacao Infantil

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BOLETIM INFORMATIVO DO PROJETO NOVAS ALIANÇAS ABRIL DE 2009

n vasALIANÇAS editorial

A HORA E O LUGAR CERTO

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é um ano estratégico para a incidência dos grupos organizados da sociedade civil no âmbito do orçamento público. A elaboração pelos municípios do Plano Plurianual de Ação (PPA) – documento que deve estabelecer de forma clara os objetivos dos programas governamentais, bem como suas metas físicas e financeiras, para um período de quatro anos – constitui um importante momento de participação dos movimentos e organizações sociais. A garantia de atenção prioritária do executivo local à infância e à adolescência depende, em grande medida, da atuação efetiva da sociedade nesse processo. Para isso, os grupos organizados devem estar atentos às responsabilidades de cada esfera de governo em relação ao financiamento das políticas sociais e às oportunidades de participação no processo de elaboração dos PPA’s, de forma a garantir que esses Planos dialoguem com as demandas populares por políticas públicas. Tendo em vista esse momento relevante, o projeto Novas Alianças inaugura, nesta segunda edição do boletim, a série de reportagens “Municípios em pauta”, que problematizará as políticas voltadas a crianças e adolescentes de competência prioritária do executivo municipal. As matérias se dedicam a constituir um mapa o mais claro possível da organização dessas políticas, sobretudo em relação aos recursos financeiros destinados para sua execução, sinalizando para os grupos locais, em especial os Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos Tutelares, possíveis estratégias de intervenção. Partimos da ideia de que quando a incidência se baseia no conhecimento preciso das lacunas e das responsabilidades legais do município, é no mínimo mais difícil às administrações e ao legislativo se esquivarem das reivindicações. Daí a importância de saber o que demandar, a quem e em que momento. Ir direto ao ponto amplia as possibilidades de se obter os resultados esperados. Não raro, as próprias administrações públicas desconhecem as responsabilidades que têm em relação à execução de determinadas políticas. Começamos nossa série pelos programas de financiamento da educação infantil, que ilustram bem o desafio de se incidir sobre as diferentes etapas de implementação de uma política pública, tirando do papel aquilo que já está estabelecido pela legislação. De maneira geral, os municípios têm feito investimentos tímidos nessa política, que é de sua competência, alegando falta de financiamento específico, esquecendo-se, muitas vezes, de que as prefeituras devem aportar recursos próprios na educação. Mesmo levando-se em conta a implantação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento

da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) – que passa também a alcançar a educação infantil, muitas prefeituras continuam investindo pouco recurso nessa etapa da educação. Diante desse cenário, torna-se evidente que a compreensão das especificidades de cada uma das políticas com foco em crianças e adolescentes, como mostra o exemplo da Educação Infantil, representa um passo fundamental no processo de incidência dos movimentos sociais e dos Conselhos junto a gestores e legisladores. Dialogar com o poder público nos momentos decisórios do ciclo orçamentário exige conhecimento aprofundado da realidade e uma visão estratégica das prioridades a serem estabelecidas no âmbito da infância e da adolescência. Isso torna-se ainda mais relevante no processo de elaboração do Plano Plurianual. Tratase de uma das etapas mais importantes de definição das leis orçamentárias, à qual a sociedade civil precisa estar atenta e atuante, sempre tendo como meta a afirmação da prioridade absoluta de crianças e adolescentes nas políticas públicas.

FOTO: ALISSON BAPTISTA / FOTOMINA


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FALTAM VAGAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL Sem fonte de financiamento exclusiva e políticas claras, avanços dependem da mobilização social

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odo início de ano a notícia se repete nos jornais: faltam vagas em creches e pré-escolas. Em Uberaba, no Triângulo Mineiro, por exemplo, o prefeito Anderson Adauto Pereira (PL) anunciou um corte de 10% da verba destinada às instituições conveniadas com a prefeitura. E ainda mais, afirmou que a prefeitura se comprometerá em convênio com os repasses somente até o mês de agosto, totalizando 70% dos valores previstos, segundo relato da coordenadora da Frente de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente do Triângulo Mineiro, Mariângela Camargos. “O município trata o convênio como uma ajuda, não como o financiamento de uma política que é de competência dele”, aponta Mariângela. Todo menino e menina com idade de 0 a 6 anos tem direito à educação infantil gratuita: de 0 a 3 anos em creches e de 4 a 6 em pré-escolas. Compete aos municípios, prioritariamente, oferecer essa etapa da educação, em espaços escolares próprios ou por meio do conveniamento com entidades comunitárias, filantrópicas e con-

fessionais (que possuem orientação religiosa). É o que determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº 9.394 de 1996. O atendimento em pré-escolas da rede pública avança, mas o que se vê na quase totalidade dos municípios brasileiros é uma rede pública muito aquém de comportar a demanda existente no segmento das creches. Em Minas Gerais, a rede pública recebe 75.400 crianças de 0 a 3 anos em creches de período integral ou parcial. A rede conveniada atende nessas mesmas condições a 46.111 crianças. Os dados se referem às matrículas consideradas pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) 2009, que são baseadas no Censo Escolar de 2008. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2007, a população de 0 a 4 anos do estado – um ano a mais do que a idade considerada para o segmento creche – é estimada em 1.341.000.

CAMINHOS PARA A INCIDÊNCIA POLÍTICA DIAGNÓSTICO

POLÍTICAS PÚBLICAS

A coordenadora do Núcleo Educativo da Pró-reitoria de Extensão da PUC Minas e representante da Universidade no Fórum Mineiro de Educação Infantil (FMEI), Dinéia Domingues, aponta que o primeiro passo para ampliar os investimentos nessa etapa da educação é conhecer a demanda do município, por meio dos conselhos tutelares, dos conselhos dos direitos e de educação, além das promotorias e das listas de espera das escolas, já que a matrícula nessa etapa é facultativa às famílias. Outra referência é o Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelecia, para 2006, a meta de atendimento de 30% das crianças entre 0 e 3, e 60% entre 4 e 6. “Isso não chegou a 10%”, aponta Dinéia.

Dinéia Domingues, da PUC-Minas, também destaca a importância de os municípios constituírem sistemas próprios de ensino, em que a educação infantil seja regulamentada. Ela aponta ser crucial a integração da rede conveniada, por meio de políticas públicas claras de conveniamento, e o investimento na ampliação do atendimento por meio da construção de equipamentos públicos. Têm papel fundamental na estruturação dessas políticas os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos de Educação. A coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude do Ministério Público (MP) de Minas Gerais, Andréa Mismotto Carreli, destaca que o MP pode contribuir para levar esse debate aos Conselhos, atuando preventivamente, mas havendo violações, também é importante que o MP seja acionado.

CONVÊNIO COM A EDUCAÇÃO Também fundamental é garantir que as instituições de educação infantil estejam conveniadas junto às secretarias de educação e respondam ao Censo Escolar, pois é com base nele que os recursos do Fundeb são repassados a estados e municípios. De acordo com a LDB, a transição das instituições de educação infantil conveniadas junto aos órgãos gestores da assistência social para as secretarias de educação já deveria ter sido concluída, mas há municípios que ainda não finalizaram o processo.

INFORMAÇÕES_No site do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) é possível encontrar orientações a esse respeito. Acesse www.mds.gov.br/suas. No menu principal, passe o mouse sobre “Proteção Social Básica”, selecione na lista de opções que se abrirá “Transição da Rede de Educação Infantil”.

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COMO É FINANCIADA A EDUCAÇÃO INFANTIL HOJE? De acordo com a Constituição Federal, 25% de toda a arrecadação dos estados, Distrito Federal e municípios devem ser investidos na educação. Parte desse investimento é feito por meio do Fundeb, da seguinte forma: 20% do que é arrecadado com alguns impostos e receitas é destinado ao Fundeb e os outros 5% desses mesmos impostos e receitas deve ser aplicado diretamente por estados e municípios. Os municípios ainda devem investir diretamente na educação 25% do conjunto de impostos e receitas que ele mesmo arrecada e que não ajudam a compor o Fundeb (ver tabela). Os recursos do Fundeb são repartidos entre os entes governamentais com base nas matrículas informadas no Censo Escolar, considerando a área prioritária de atuação de cada esfera: ensinos infantil e fundamental, no âmbito dos municípios, e ensino médio no âmbito do estado. As matrículas da educação infantil, incluindo as da rede conveniada, são consideradas na hora de compor a verba do Fundo. Entretanto, a administração municipal tem liberdade para escolher em que etapa da educação investir, podendo optar, inclusive, por não aplicar na rede infantil os recursos originados pelas matrículas existentes nesse nível de ensino.

RECEITA

Via Fundeb

Diretamente aplicado

Receitas que ajudam a compor o Fundeb FPE (Fundo de Participação dos Estados)

20%

5%

FPM (Fundo de Participação dos Municípios)

20%

5%

ICMS (Imposto sobre circulação de mercadorias e serviços)

20%

5%

IPIexp (Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional às exportações)

20%

5%

Desoneração Exportações

20%

5%

ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações)

20%

5%

IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores)

20%

5%

ITR (Imposto Territorial Rural)– Cota Municipal

20%

5%

Receitas diretamente arrecadadas pelos municípios IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano)

0%

25%

ISS (Imposto sobre Serviços)

0%

25%

ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Móveis)

0%

25%

Observação: Também compõem o Fundo uma complementação da União, as receitas da dívida ativa e de juros e multas incidentes sobre as fontes que ajudam a compor o Fundo

O coordenador geral de operacionalização do DIFERENÇAS_No caso da Fundeb, do Ministério rede conveniada, as matrículas de 0 a 3 anos são comda Educação (MEC), putadas de acordo com o últiVander Oliveira Borges, mo Censo Escolar. Já as explica que a aplicação matrículas de crianças de 4 e dos recursos não pode 5 anos serão consideradas de ser vinculada: “o acordo com o Censo de 2006, município está atuando já que a proposta é que essa dentro da autonomia etapa seja assumida com pridele”. Por isso, o coororidade pelas administrações denador da Campanha municipais. Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, ressalta que o impacto positivo do Fundeb para a educação infantil depende da cobrança da sociedade. [ CONHEÇA OS VALORES ] Por meio do site do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) é possível acompanhar os valores repassados a cada município. Ainda que a aplicação não seja vinculada, conhecer o montante dos recursos pode contribuir para o processo de incidência. Para isso, acesse o site www.fnde.gov.br. No menu localizado na parte esquerda do site, clique em “Fundeb”. Na página que se abrirá, clique em “Consultas”. A tabela “Matrícula, coeficientes de distribuição de recursos e receita anual prevista 2009” indica o número de matrículas consideradas por município. E a tabela “Valor aluno/ano e receita anual prevista 2009” informa os valores por aluno em cada estado e em cada etapa da educação.

Em Uberaba, por exemplo, o Fundeb considera, para 2009, 788 matrículas em creches de tempo integral e 57 em creches de tempo parcial na rede conveniada. Em Minas Gerais, será considerado neste ano para o aluno da creche integral e parcial da rede conveniada, respectivamente, R$ 1.621,66 e R$ 1.365,61. A prefeitura de Uberaba informou, por meio de sua assessoria, que o valor per capita para as crianças matriculadas na educação infantil da rede conveniada da cidade, independentemente da etapa será de R$ 66,60, o que totaliza, em 12 meses, um valor por aluno de R$ 799,20. Ainda segundo a assessoria da prefeitura, o município oferece suporte às instituições por meio de outras ações. Daniel Cara, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, chama atenção para a importância de se considerar o custo real de uma educação de qualidade, longe de ser alcançado pelos valores atuais. A Campanha realizou estudo em que propõe um Custo Aluno Qualidade (CAQ) inicial, lembrando que o CAQ – ainda no papel – é um indicador previsto desde a Constituição Federal. De acordo com o estudo, o CAQ “representa uma inversão completa da lógica que pauta o financiamento da educação (...), marcado pela subordinação do investimento social à disponibilidade orçamentária imposta pelo ajuste fiscal”. O estudo propõe, por exemplo, para uma creche em tempo integral com condições adequadas de funcionamento, o CAQ de R$ 3.783 por criança-ano, sem considerar despesas com alimentação. ABRIL | 2009

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CURTAS

CAO TEM NOVA COORDENAÇÃO

CONHEÇA O NOSSA BH

Desde dezembro de 2008, o Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude do Ministério Público de Minas Gerais passou a ser coordenado pela Promotora de Justiça da comarca de Betim, Andréa Mismotto Carreli. Para a nova coordenadora, o trabalho com as famílias deve ser a base de toda ação voltada à infância e à adolescência. A promotora também acredita no papel do Ministério Público na articulação das políticas locais e na integração da rede de proteção social, indo além de uma ação pontual. Nesse sentido, o CAO pretende investir no estudo e na formulação de metodologias para apoiar a incidência dos promotores no ciclo orçamentário e, sobretudo, na relação com o legislativo. Foi formado um grupo de estudo, do qual o Novas Alianças faz parte, para conduzir esse processo. “Precisamos trabalhar um modelo propositivo e não apenas depois que a violação acontece”, ressalta a promotora. Confira a íntegra da entrevista realizada com a Promotora no blog do Novas Alianças: www.novasaliancas.blogspot.com

Em 11 de dezembro do ano passado foi lançado em Belo Horizonte um movimento social dedicado à discussão e proposição de iniciativas relacionadas à qualidade de vida dos habitantes da capital. A proposta do Movimento Nossa BH é buscar a união de forças entre lideranças comunitárias, organizações sociais, empresas e cidadãos, tendo em vista o comprometimento da sociedade e dos sucessivos governos com uma agenda e um conjunto de metas. Para cumprir esses objetivos, o Nossa BH pretende identificar e monitorar indicadores de qualidade de vida e percepção dos moradores de Belo Horizonte sobre sua cidade. O movimento pretende também desenvolver estratégias de comunicação e mobilização da sociedade em torno de propostas e reivindicações relativas à governança da cidade. A iniciativa é inspirada em experiências semelhantes desenvolvidas em São Paulo e em Bogotá, capital da Colômbia. Conheça a Carta de Princípio do Movimento no site www.nossabh.org.br. Um dos Grupos de Trabalho do Movimento se dedicará ao monitoramento e incidência no orçamento público.

RODRIGO DAI

[ FOTO-LEGENDA ]

Elói Mota, 17 anos, do município de Mata Verde, Norte de Minas, discursou em nome de 40 outros adolescentes da Rede de Jovens Comunicadores do Semi-árido Mineiro no evento de entrega do Selo UNICEF Município Aprovado em Minas Gerais, realizado em dezembro passado. Diante de uma platéia que contou com a presença de prefeitos da região e do vice-governador de Minas, Antônio Augusto Anastasia, o jovem deu o seu recado: “ser criança e adolescente no Semi-árido mineiro é muito mais do que aquilo que dizem de nós: um povo sofrido, sem oportunidades e carente. Na realidade, ser adolescente é ser capaz de integrar, participar, conscientizar e mobilizar a comunidade”. Elói acompanha a elaboração e execução do orçamento de seu município e participou em 2008, a convite do Novas Alianças, das audiências de revisão do PPAG estadual em Belo Horizonte.

Relatos, críticas, sugestões, enfim, todas as formas de manifestações são bem-vindas. Vamos fortalecer nossa atuação em rede e conhecer melhor o trabalho dos diversos grupos vinculados ao NOVAS ALIANÇAS. Sua contribuição pode ser feita por telefone, carta ou e-mail (veja contatos abaixo).

EXPEDIENTE | Projeto Novas Alianças | Coordenação executiva Oficina de Imagens - Comunicação e Educação | Coordenadores do projeto Adriano Guerra e Karla Nunes | Aliados estratégicos ANDI - Agência de Notícias dos Direitos da Infância, Instituto Ágora em Defesa do Eleitor e da Democracia, Frente de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Minas Gerais, Fundação Avina, Fundação Vale e Instituto C&A | Parceiros Assembleia Legislativa de Minas Gerais - Comissão de Participação Popular, Ministério Público de Minas Gerais | BOLETIM Redação e edição Oficina de Imagens - Comunicação e Educação Jornalistas Responsáveis Carolina Silveira (0011162/MG) e Eliziane Lara (12.322/MG) | Revisão Camila Reis | Projeto Gráfico Henrique Milen Apoio Gráfica e Editora O Lutador - Projeto de Editoria Social | Tiragem 2000 exemplares | Informações (31) 3588-5017 e 3482-0217 | novasaliancas@oficinadeimagens.org.br

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ABRIL | 2009

Remetente: Oficina de Imagens | Rua Salinas 1101, Santa Tereza - Belo Horizonte - MG - CEP 31015-190


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