Revista Rolimã Edição #6

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CARTA AO LEITOR Cara leitora e caro leitor, Esta é uma edição especial da Rolimã. Esta revista foi integralmente idealizada e produzida por jovens, desde a proposta dos temas até a elaboração das matérias. Os conteúdos refletem as realidades e questões dessas juventudes – negra, branca, periférica, de classe média, metropolitana, do interior de Minas Gerais, secundarista, universitária, em privação de liberdade, heterossexual, homossexual, bissexual... enfim, plural e diversa. Identidades LGBT, criminalização da cultura periférica, obsolescência das metodologias de ensino, falta de oportunidades de formação e trabalho para as/os jovens de municípios de pequeno porte e um olhar a partir de dentro do sistema socioeducativo são alguns dos temas abordados nas páginas a seguir. Textos “baseados em experiências reais”, como expressou Larissa Campos, uma das jovens responsáveis por esta publicação. O protagonismo juvenil dá o tom desta edição. Se queremos discutir os direitos da infância e juventude, bem como atuar a seu favor, é preciso dar voz a este segmento e aprender com o que ele tem a nos dizer, escutando sempre com cuidado e sensibilidade. Construir esta revista de modo coletivo e afetivo com esses jovens foi uma experiência enriquecedora e transformadora para nós. Esperamos que a leitura suscite em você, cara leitora e caro leitor, um pouquinho dessa transformação. Com a palavra, as/os protagonistas: “A construção das matérias foi a desconstrução de pré-conceitos e estigmas estabelecidos” – Larissa Campos, 25 anos. “Serviu como uma maneira de dar voz aos jovens e valorizá-la, voz que na maioria das vezes é banalizada” – Sherlon Peterson, 19 anos. “Uma visão jovem sobre assuntos adultos” – Pedro Martins, 21 anos. “Aqueles que vão se aventurar nesta revista com certeza terão novas concepções sobre assuntos que já estão no nosso dia-a-dia. Nos deparamos com tais temas a todo instante, só que dessa vez os protagonistas e narradores somos nós mesmos” – Luísa Nonato, 22 anos. “A revista serviu para dar voz aos jovens. Nos ajudou a refletir e a conhecer a diversidade” – Talita Silva, 16 anos. “Foi incrível participar deste projeto, em que pude conhecer pessoas fodásticas, trocar experiências, nos emocionarmos e, claro, rir muito. Nos expressamos sem medo de julgamentos, com a liberdade de sermos jovens” – Tatiana Meireles, 21 anos. “A edição tem a voz e a alma das juventudes e o processo mudou um pouco cada um de nós, então eu espero que, através da leitura, cada um sinta uma pequena mudança em si também” – Sofia Dolabela, 16 anos.


QUEM FEZ Esta edição da Rolimã foi feita com a participação de:

Jornalista em formação, cantor de um mesmo refrão, da imagem pela paixão e da palavra por vocação. A música permeia o ser, o viver, o fazer. As palavras são expressão, liberdade. As imagens são tradução, momento, sentido. O sujeito é construção.

MARCOS FILETO 20 anos, de Mariana

Futura jornalista que só sabe falar de cinema e política. Às vezes acha o cinema mais sério que a política e a política mais teatral que o cinema — mas só às vezes. É de esquerda e odeia o Woody Allen.

IAKIMA DELAMARE 19 anos, de Belo Horizonte

1 colher de incerteza 3 xícaras de problematização 1000 gotas de amor E 2 paçocas vencidas. E assim nasceu Ara Gabriele, metade caos e a outra metade ainda em processo de descoberta.

ARA GABRIELE 17 anos, de Belo Horizonte

TATIANA MEIRELES 21 anos, de Belo Horizonte

VITÓRIA MARIA 18 anos, de Belo Horizonte

SOFIA DOLABELA 16 anos, de Belo Horizonte

LUÍSA NONATO 22 anos, de Belo Horizonte

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Alô, alô, vocês sabem quem eu sou? Tatiana, leonina com amor, mas o Vênus em libra acaba comigo. Escrevo por acreditar, para me aliviar, para existir e resistir. Presente!

Quando nasci uma anja torta Dessas que pela subversão já foi quase morta Berrou: Vitória, você é mulher, espécie ainda envergonhada Larga já dessa imposta compostura E vai lá ser mais uma a berrar (e dançar) nessa vida dura Sofia, feminista. Resisto no grito e no papel, sou mais eu lírico que poeta. Gosto de música, cultura, filmes que me fazem chorar e de contar e ouvir histórias. Não simpatizo com exercícios de autodescrição. Geminiana com ascendente em tagarelice. Minha mania de me colocar no lugar do outro é a música que conduz a minha vida. Choro muito. Rio muito. Amo muito! É aquele ditado, né… Simbora fazendo.


Feminista negra periférica, um universo em crise, futura cientista social, extremista.

MILENA BADU 17 anos, de Belo Horizonte

Nasci para ser do mundo. Ser como a terra nua que racha e umedece por humores exagerados. Uma pura impureza. Uma desleal beleza. Um corpo inigualável. Efêmero.

SHERLON PETERSON 19 anos, de Ribeirão das Neves

Menina que procura saber o que é ser adulta. Mulher, as duas metades da laranja. Dançarina de perna torta, escritora prolixa e atriz desastrada. Toda toda, completa e desgovernada.

ÍSIS ALVIM 18 anos, de Belo Horizonte

Menina sonhadora, negra. Nasceu pra semear coisas positivas. Otimismo é seu potencial. “Se eu quero chegar a algum lugar aonde a maioria não chega, preciso fazer o que a maioria não faz”.

TALITA SILVA 16 anos, de Sete Lagoas

Do Vale do Jequitinhonha com muito orgulho. De sorriso fácil, que sorri chorando e chora sorrindo. Ama chocolate e açaí e descobriu há pouco tempo que não gosta de sushi.

EDUARDA DIAS 21 anos, de Almenara

LARISSA CAMPOS

Tem dias que me reservo e me aquieto, mas as palavras insistem em dançar. Sou uma longa história.

Jovem que ama e tem orgulho de ser educador, que procura vencer seus desafios através da persistência.

25 anos, de Sete Lagoas

PEDRO MARTINS 21 anos, de Almenara

Antes era um cara muito levado e esperto. Hoje em dia usa a esperteza para coisas boas, tentando melhorar cada vez mais para dar algum orgulho para sua mãe.

MARCUS VINÍCIUS 18 anos, de Itabira

BÁRBARA PANSARDI Jornalista, 25 anos. Bota muita fé no mundo, nas pessoas e na potência transformadora dos processos de aprendizagem e construção coletiva. Acredita na narrativa como ato de (r)existência. Editora deste número da Rolimã.

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ele ou ela?

NESTA EDIÇÃO

ELE OU ELA?

MULHERES INVISÍVEIS

7

8

13 19

MUITO ALÉM DOS CASTIGOS FÍSICOS

33

MAIS PERTO DO QUE IMAGINAMOS

23

29

41

CRIMINALIZAÇÃO DA CULTURA PERIFÉRICA

ONDE VOCÊ ESTÁ?

42

41

36 JUVENTUDE E TRABALHO

E A ESCOLA NESSE CONTEXTO?

NÃO VAMOS ESQUECER

CANTOU O BONDE

EXPEDIENTE ENTRE EM CONTATO CONOSCO:

Em defesa dos direitos da criança e do adolescente Uma produção da Central de Notícias Oficina de Imagens REDAÇÃO: Marcos Fileto, Iakima Delamare, Ara Gabriele, Tatiana Meireles, Vitória Maria, Sofia Dolabela, Luísa Nonato, Milena Badu, Sherlon Peterson, Ísis Alvim, Talita Silva, Eduarda Dias, Pedro Martins EDIÇÃO: Bárbara Pansardi COLABORADORES: Anna Cláudia Pinheiro e Gabriella Hauber CAPA: Acervo Oficina de Imagens

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PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO: Amí Comunicação & Design ILUSTRAÇÃO: Amí Comunicação & Design REVISÃO: Mariana Di Salvio PARCERIA: KNH Brasil IMPRESSÃO: Rona Editora TIRAGEM: 5.000 exemplares Projeto Centro de Informação em Direitos da Criança e do Adolescente

comunicacaoedireitos@oficinadeimagens.org.br Rua Salinas, 1101, Santa Tereza, Belo Horizonte - MG CEP: 31015-365 | Tel: (31) 3465-6801/6803 Oficina de Imagens – Comunicação e Educação PRESIDENTE: André Hallak COORDENAÇÃO EXECUTIVA: Bernardo Brant ASSESSORIA DE COORDENAÇAO: Simone Guabiroba NÚCLEO DE APOIO A PROJETOS: Vander Maciel e Mariana Fonseca


MULHERES

INVISÍVEIS POR MILENA BADU

sou reflexo de anastácia, perseguida por gênero e raça. sou reflexo de anastácia, violentada e silenciada. sou reflexo de anastácia, objetificada e hiperssexualizada. sou reflexo de anastácia, sem direito a família. não quero ser esquecida pelo estado como cláudia. não quero precisar ser “socorrida’’ como cláudia. não quero ver minha mãe baleada pela pm, como foi cláudia.

Criação: Pabline Felix

não quero ter que lembrar todos os dias pra sociedade que a perseguição por gênero e raça é real e que esses fatos são noticiados na tv, todos os dias.

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É necessário que as escolas se renovem e se tornem mais atraentes para os alunos Fotos: Sofia Dolabela

Novos tempos. Novas exigências. E a escola nesse contexto? Colocar estudantes sentados em carteiras, diante de um quadro negro, parece obsoleto. Se a educação já não funciona sob os mesmos moldes de antigamente, por onde começa a mudança? POR IAKIMA DELAMARE, MARCOS FILETO E SOFIA DOLABELA

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Computadores, smartphones, tablets. Curtidas e compartilhamentos a todo tempo. Dinamicidade e rapidez. Fronteiras encurtadas, integração. O mundo todo parece estar evoluindo e conectando-se. Mas e o sistema educacional, será que ele acompanhou essa transformação? As novas tecnologias, principalmente nas áreas de comunicação e transporte, transformaram de maneira marcante as formas de produção e disseminação de conhecimento, assim como as relações entre as pessoas e destas com seu entorno. Esse cenário exige novos sistemas de compreensão do mundo, de produção de conhecimento e novas formas de se relacionar socialmente. O mundo e a sociedade mudaram, mas nossos métodos de ensino continuam iguais ou, no máximo, superficialmente adaptados. O sistema educacional brasileiro é o mesmo de décadas atrás, embasado numa lógica transmissiva e vertical professor-aluno, em que o primeiro detém o conhecimento que deve ser oralmente repassado ao segundo. Mas essa realidade não condiz mais. Por isso, atualmente, há um amplo debate sobre a necessidade de modernização das metodologias no campo educacional. As sugestões vão desde questionamentos estruturais a mudanças pontuais, passando por caminhos intermediários como a adoção de diretrizes que valorizem não apenas o acúmulo de conteúdos, mas que prepa-


rem os estudantes para que sejam conscientes do mundo em que vivem e das novas relações que dele fazem parte. Flávio Bassi, diretor do programa Empatia e Escolas Transformadoras, da Ashoka (organização mundial no campo da inovação social), defende que as instituições de ensino não só são diretamente afetadas por essa nova dinâmica como também têm papel central na formação de sujeitos adequados a essa realidade emergente. “A nova ordem social pede posturas proativas, busca criatividade e iniciativa e acreditamos que a escola deve refletir essa nova ordem em suas estruturas e práticas. Mais do que isso, deve liderar um processo de transformação social nesse sentido”, argumenta. Porém, de acordo com ele, o modelo atual de ensino negligencia o potencial transformador que cada criança e jovem carrega dentro de si. “É preciso desafiar o paradigma atual de educação, que ainda prepara as novas gerações para um mundo hierárquico, vertical, dividido em áreas e departamentos do saber”, expõe Flávio. Mas isso não significa somente trabalhar na perspectiva da inter ou transdisciplinariedade; é preciso ir além. “Precisamos construir um novo paradigma que prime pela relação dialógica, pelo espaço de autoria e protagonismo, pela solidariedade, pelo espírito crítico e por práticas transformadoras da realidade social. Queremos que todos reconheçam a empatia, o trabalho em equipe, a liderança compartilhada, a criatividade e o protagonismo social como competências tão importantes quanto o ensino da matemática”, acrescenta o diretor do Escolas Transformadoras. Bassi defende que, mais efetivo do que eleger novas abordagens metodológicas ou replicar pedagogias específicas, é repensar a educação com modelos e arranjos mais dialógicos, democráticos e empáticos, capazes de formar crianças e jovens proativos, expressivos, críticos e engajados. As mudanças propostas por Flávio, portanto, não se prendem a questões formais, como grade curricular, conteúdos, recursos didáticos, entre outros. Para ele, antes de tudo, é preciso repensar as formas e a qualidade das relações: entre os educandos, destes com os professores, das equipes entre si e com a gestão do colégio, entre a escola, os pais e a comunidade. É importante criar relações que acolham a ação de todos aqueles envolvidos com a comunidade escolar. Ou seja, a escola deve praticar em suas estruturas e relações as mesmas habilidades e competências que espera cultivar em seus educandos. Formar para a autonomia, para o senso crítico, para o exercício do potencial criativo, para a iniciativa, para o cultivo de relações mais justas, fraternas e democráticas. Promover a transformação social da realidade. “Não seria essa, afinal, a essência da educação?”, questiona.

O ensino por meio de acúmulo de conteúdos precisa dar lugar a práticas transformadoras da realidade social

conheça o Escolas Transformadoras http://goo.gl/7XpF7A

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O incentivo ao trabalho em equipe é um dos pontos fortes das Escolas Transformadoras

Quem faz No final do ano passado, o Ministério da Educação (MEC) lançou o Mapa de Inovação e Criatividade na Educação Básica, um catálogo com instituições públicas, privadas e organizações não governamentais que possuem propostas arrojadas de educação. Foram selecionadas 178 iniciativas, de todas as regiões do Brasil e todas as etapas de ensino — Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos (EJA). A avaliação levou em conta cinco critérios: gestão, currículo, ambiente, método e articulação com outros agentes. As escolas representam a maior parte das instituições selecionadas (74,3%), entre as quais 52,5% são públicas e 47,5% particulares. Os outros 25,7% correspondem a organizações educativas que atuam na formação de crianças, adolescentes e jovens, muitas vezes com focos específicos em cultura, comunicação, tecnologias digitais ou educação ambiental. Na distribuição por região, mais da metade (50,8%) está no Sudeste, seguida por Nordeste (21,9%), Sul (13,7%), Centro-Oeste (8,7%) e Norte (7,6%). A maior parte desses trabalhos ainda possui pouca visibilidade, mas já está modificando o modo de ensinar, aprender e instruir na vida de crianças e adolescentes de nosso país. Na capital mineira, uma dessas instituições inovadoras reconhecida pelo Ministério da Educação é a Escola da Serra. Em atividade desde 1992, tem como objetivo formar cidadãos éticos, criativos, críticos e autônomos, que detenham não apenas os conhecimentos

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básicos usuais de leitura, escrita e aritmética, mas que dominem outras habilidades sociocognitivas e estejam prontos para os mais diversos desafios que enfrentarão ao longo da vida. “Nossa proposta é baseada em autores construtivistas, que partem do princípio de que o conhecimento está na relação com o outro e não pode ser algo individualista, nem egocêntrico. Está baseado na troca de experiências, no diálogo, e é isso que a gente sempre fez aqui”, explica Luciana Nunes, coordenadora da Educação Infantil. Manter canais abertos de comunicação e proximidade com os estudantes são formas de valorizar, dar vez e voz às individualidades das crianças e adolescentes que ali estudam. Um exemplo disso na prática é a construção do projeto pedagógico anual. Formulado em conjunto com a comunidade escolar, é um momento no qual todos podem participar da definição dos objetivos, interesses e políticas de funcionamento do ano que será iniciado. São decididos, por exemplo, os direitos e deveres dos alunos e tais regras ficam disponíveis para que todos tenham acesso. Além disso, assembleias são realizadas sempre que é preciso discutir algo de interesse comum. Os próprios alunos se unem, organizam comissões de trabalho e elaboram suas pautas e propostas para melhorias no ambiente escolar. Como observa Luciana, isso ajuda na formação humana individual, dando embasamento para o trabalho coletivo, a administração de relacionamentos cotidianos e a habilidade de resolução de conflitos. “Diferentemente de outras instituições de ensino tradicionais, sinto que aqui meus direitos como indivíduo são respeitados. A escola preza muito por isso, respeita o que a gente pensa. Nas escolas tradicionais diminuíam a gente para que não falássemos muito. Nós não tínhamos voz nenhuma. Aqui, qualquer um, em qualquer hora, pode dizer qualquer coisa, contanto que seja formal e sério”, conta o estudante Yuri Bespaloff, de 15 anos. O estímulo para o trabalho em equipe acontece a todo o momento. Nos salões, onde os estudantes se reúnem para a realização de projetos interdisciplinares, eles são divididos em grupos de quatro pessoas, enquanto vários professores, de diferentes formações, ficam à disposição. A grade curricular é outro diferencial e se afasta bastante dos modelos tradicionais. Trabalha-se com um projeto de ensino por ciclos. Assim, os estudantes possuem uma flexibilidade maior para cursar as disciplinas de seus currículos segundo o tempo de aprendizagem de cada um. Eles recebem roteiros de estudo, iniciam suas pesquisas

saiba mais sobre a escola da serra: http://goo.gl/7HjltQ


autonomamente e podem concluir com mais ou menos tempo suas atividades, dependendo do seu desenvolvimento pessoal. O estudante Marcus Vinícius Silva, de 16 anos, aprova o método. “Eu estudo aqui há nove anos e gosto bastante. O respeito dos professores com os alunos e o respeito pelas diferenças de cada um são muito bons”, afirma. Quanto ao conteúdo, tanto há disciplinas que se encaixam nas áreas de Ciências da Natureza, Matemática, Linguagens, Ciências Humanas e Ciências Sociais quanto outras pouco convencionais, como Teatro, Artes Visuais, Dança, Música, Tai Chi Chuan, Aikido, Yoga, Capoeira, Empreendedorismo e Direito. E, se há quem alegue que tais disciplinas desviam o foco dos exames preparatórios, como o Enem, Luciana contra-argumenta: “Os alunos que saem para as universidades, apesar das variações que existem de grupo para grupo, têm conseguido ingressar sem grandes problemas”. De acordo com a coordenadora, as informações compartilhadas não ficam restritas aos muros da escola e o aprendizado é repassado nas mais diversas relações de cada estudante, no ambiente familiar, de lazer e também nas relações educacionais que eles adquirem pós-escola. “Temos tido bons retornos de professores universitários que os recebem, dizendo que são alunos pensadores, críticos e que conseguem ir transformando a realidade imediata que os cerca”. O aluno Yuri Bespaloff faz coro: “Aqui eu sinto que o conhecimento não vai ser só para a escola, fica para a vida toda. Na maioria das matérias, eu sinto que estou aprendendo muito mais do que na escola tradicional”, expõe.

Inovação e criatividade no ensino público A Escola da Serra é uma instituição particular, mas a rede pública de ensino também contempla experiências inspiradoras. Em Belo Horizonte, as escolas municipais Anne Frank e Professor Paulo Freire constam tanto no Mapa de Inovação e Criatividade na Educação Básica, lançado pelo MEC, quanto na comunidade global de Escolas Transformadoras da Ashoka, rede que reúne mais de 200 escolas com práticas inovadoras, espalhadas por 28 países. Dentre as competências valorizadas pelas instituições qualificadas como transformadoras estão: empatia, criatividade, trabalho em equipe e protagonismo social. Entende-se a escola como um espaço privilegiado para formar sujeitos de transformação, com senso de responsabilidade pelo mundo e que buscam torná-lo um lugar melhor. Na Escola Municipal Anne Frank, essa preocupação pela formação sócio-política dos estudantes é bastante evidente numa série de projetos que a instituição desenvolve. Alguns são políticas da rede pública da prefeitura de Belo Horizonte, surgidos a partir de um diagnóstico das demandas da comunidade, que se localiza em região de alta vulnerabilidade social, na regional Pampulha.

Outros são de autoria da própria escola, que tem como diretriz pedagógica a participação ativa da comunidade. O Anne Frank Fashion, por exemplo, é um desfile de moda com o objetivo de valorizar a beleza e identidade da comunidade, na sua maioria negra, por meio do incentivo a uma moda criativa e não reprodutora de padrões de beleza hegemônicos. Os próprios moradores locais são os criadores das roupas e modelos na passarela, fortalecendo a autoestima e identidade da região. Outro exemplo é o Feminicídio NÃO!, projeto no qual estudantes montam uma exposição para chamar atenção sobre o tema da morte de mulheres, discutindo inclusive o recorte étnico e socioeconômico em torno do tema e relacionando-o com a realidade local. Questões de justiça, igualdade, respeito, diversidade étnica-cultural e direitos humanos também são apresentadas às crianças a partir da discussão sobre a história de vida da menina que dá nome à escola: Anne Frank. Os estudantes transpõem muitas das vivências da pequena garota judia, vítima do holocausto, para as particularidades de seus cotidianos, frequentemente marcados por relações de conflito e violência. A escola é um ambiente aberto de acolhimento e articulação de todos os agentes e movimentos de transformação na comunidade, constituindo-se um espaço expressivo de atuação política local. Na praça localizada em frente, o Bosque da Paz, acontecem mensalmente eventos e festas organizados pela instituição de ensino, algo que contribui para a movimentação cultural e incremento das opções de lazer enquanto, simultaneamente, promove a apropriação do espaço e combate a violência local. Além disso, os alunos também podem permanecer após as aulas regulares, no período de contraturno, para oficinas de dança, capoeira, esportes, entre outras atividades lúdicas que, geralmente, são ministradas por jovens da própria comunidade. Envolvimento comunitário, ocupação do espaço e articulação de rede norteiam o programa da Escola Municipal Anne Frank e são a chave de seu êxito.

Inspiração do mestre da educação popular Na Escola Municipal Professor Paulo Freire – locada no bairro Ribeiro de Abreu, região periférica da capital mineira marcada por expressiva vulnerabilidade social –, foi o poder de articulação das lideranças locais que viabilizou a criação da instituição de ensino em 2001 e, desde então, essa articulação se tornou uma marca em seu programa político-pedagógico. Há diálogo com diversas instâncias, como igrejas, secretarias de Educação e Saúde, universidades, o Centro de Referência de Assistência Social (Cras), a Patrulha Escolar (segurança pública) e até mesmo uma Escola de Samba. Esses agen-

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tes colaboram não só na oferta dos serviços, mas também na construção de um saber coletivo, promovendo formações temáticas por meio de palestras, por exemplo. Como a escola estende o tempo no contraturno – período em que há oficinas de dança, artesanato, culinária, capoeira, brincadeiras populares, taekwondo, musicalização, jogos, leitura, teatro, estudo, entre outras –, abriuse espaço para a interlocução com saberes e habilidades da própria comunidade, pois moradores e estagiários das universidades passaram a ser convidados a intermediar essas atividades. Essa teia de relações fortalece a ocupação do ambiente escolar. Desde a fundação, a E.M. Professor Paulo Freire é aberta aos finais de semana, funcionando como um espaço social e cultural para receber famílias, estreitando os laços com a comunidade. Em termos de infraestrutura, o prédio conta com sala audiovisual, biblioteca, informática, laboratório, quadra poliesportiva e horta, e todos são responsáveis pela sua manutenção. Essa responsabilização pelo cultivo da horta e dos alimentos que fazem parte da merenda escolar fez com que os alunos passassem a valorizar uma alimentação mais saudável. Para evitar o desperdício de alimentos, eles foram orientados a se servirem sozinhos, colocando no prato a quantidade suficiente de comida, estimulando, ao mesmo tempo, a autonomia e uma consciência sustentável. Valoriza-se a escola como ambiente produzido e cui-

dado por todos. Além do zelo e da manutenção do espaço, o viés democrático pode ser ilustrado também nas assembleias, que acontecem pelo menos uma vez por mês e nas quais os alunos expõem suas ideias frente às propostas dos professores e sugerem suas demandas para a reflexão coletiva. As deliberações da assembleia guiam o funcionamento da escola e as questões são debatidas entre estudantes, pais, funcionários e professores, em igualdade de direitos e deveres. Posteriormente, as decisões são eleitas em votação. Tal preocupação com o diálogo é no sentido de aproximar as metodologias à pedagogia de Paulo Freire, mestre que inspira e dá nome à escola. Em 2004, as portas foram abertas para a inclusão de pessoas com deficiência. São cerca de 140 alunos, acompanhados diariamente por 12 monitores de inclusão e um intérprete de libras. Desde então, o reconhecimento e o respeito à diversidade ganharam um novo aliado na escola Professor Paulo Freire. A escola é um ambiente com enorme potência de transformação das realidades e comunidades onde se situa, como se nota nos exemplos acima. Por consequência, ela é também capaz de formar sujeitos transformadores, éticos, protagonistas da mudança social. Promover integração e diálogo entre educandos e educadores, repensando a forma e a qualidade dessas relações, parece ser o motor propulsor para a melhoria da qualidade do ensino. Que tal dar o primeiro passo?

ESCOLAS TRANSFORMADORAS em Minas Gerais 1

Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento Pavão

2 Coaching Kids 3 Escola da Serra 4

8

Escola Municipal Anne Frank

Uberlândia 21 22

5 Escola Municipal Prof. Paulo Freire 6

Oi Kabum Escola de Arte e Tecnologia

7

Associação Brasileira de Amigos do Movimento Internacional ATD (Quarto Mundo)

16

Diamantina

Belo Horizonte 9

Poços de Caldas

8 Escola Municipal de Educação Infantil Professor Celio Hugo Alves Pereira

10

Bocaína de Minas 7

Itaguara 15

14

Leopoldina

20 Tiradentes 13

Liberdade 11 12

19

1 2 3 4 5 6

Divinópolis 17 18

São Domingos do Prata

Juiz de Fora

Itanhandu

9 Centro Municipal de Educação Infantil Maria Lucia Gregório

10 Casa de D. Dorica 11 Escola Municipal Ana Carlos da Silva

15 Escola Municipal Augusto Pestana Centro Educacional para a Infância e Adolescência João Batista Becchi (CEIA)

12 Instituto Superação

16

13 Colégio de Aplicação João 23, UFRJ

17 Associação Casa da Árvore

14 Conhecer Educação e Cultura

18 Criativa Idade Sistema Educacional

19 Fundação Monique Leclercq 20 Escola Municipal João Pio 21

Casa da Árvore – Comunidade Democrática de Aprendizagem Livre

22 Centro Educacional Maria de Nazaré

Fonte: http://goo.gl/gYaY7k

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ele ou ela? Criação: Pabline Felix

Desejo e afetividade transbordam padrões sociais. A sexualidade é fluida e desconhece fronteiras de gênero. Que tal aprender um pouquinho dessa multiplicidade de arranjos possíveis? Consideramos justa toda forma de amor! POR ARA GABRIELE, SOFIA DOLABELA, TATIANA MEIRELES E VITÓRIA MARIA Desde que nascemos, somos classificados por nossos pais e pela sociedade como homens ou mulheres de acordo com nossos órgãos genitais e, assim, somos automaticamente submetidos a imposições sociais de gênero e a padrões heteronormativos. Mas há diversas nuances para além do sexo biológico que afetam o exercício da sexualidade. Para tentar dar conta dessa complexidade, surgiram novos termos (nem tão novos assim), que designam orientação sexual, identidade de gênero, desejos afetivos e sexuais. É simples, mas para quem não está acostumado com o assunto das causas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros), tais termos podem parecer confusos e de difícil entendimento. As expressões mais comuns e conhecidas pela grande maioria de nós são heterossexual, indivíduo que se relaciona com alguém do gênero oposto, e homossexual, indivíduo que se relaciona com alguém do mesmo gênero. Mas ainda existe uma ampla variedade de designações que vão além dessas duas orientações. São elas: bissexual, assexual e pansexual. Esses termos, assim como heterossexualidade e homossexualidade, são relacionados a desejos afetivossexuais. Revista Rolimã • Julho de 2016 | 13


A orientação sexual está associada a quem você se relaciona afetiva e sexualmente. Nesse quesito, as pessoas podem ser heterossexuais, homossexuais, bissexuais e pansexuais. Bissexuais são atraídos pelos dois gêneros do sistema binário: homem e mulher. Pansexuais são pessoas que se sentem atraídas por qualquer gênero, incluindo aquelas pessoas que não se encaixam na ideia binária de masculino e feminino, uma vez que existe um enorme espectro entre esses dois gêneros. Já assexuais são aqueles que não sentem necessidade de praticar o contato íntimo de uma relação sexual. Vale lembrar que as pessoas assexuais podem se relacionar com outras, namorar, casar-se etc; o que as diferencia é que o sexo não é prioridade. Já os termos cisgênero, transgênero e identidade não-binária não estão necessariamente ligados a desejos sexuais. Para entendê-los, esqueçamos por um momento o que aprendemos na escola, principalmente nas aulas de biologia. Crescemos aprendendo que homens têm pênis e mulheres têm vagina. Mas não necessariamente uma pessoa precisa ter pênis ou vagina para se identificar como homem ou mulher. Está confuso? Calma, vamos explicar tudo! A identidade de gênero tem a ver, como a própria expressão sugere, com o gênero com o qual uma pessoa se identifica, e isso independe de sua orientação sexual. Cisgênero é uma pessoa que se identifica com o sexo de nascença, o sexo biológico. Por exemplo, um homem cisgênero nasce com um pênis, identifica-se e se comporta de acordo com o sexo que lhe foi designado desde o seu nascimento. A palavra cisgênero surgiu para identificar pessoas não trans. Transgêneros são indivíduos que não se identificam com o gênero ao qual foram designados ao nascer. Por exemplo, uma mulher nasce com vagina, mas não se identifica com o corpo feminino – caso do ativista Chaz Salvatore Bono, filho da cantora Cher, que nasceu menina, mas não se identificava com seu sexo biológico e passou por um processo de adequação, tornando-se menino. Dentro do grupo de transgêneros, existem as travestis, que, mesmo utilizando adereços femininos e passando por algumas transformações (como silicone e uso de hormônios femininos), mantêm a genitália masculina. Para entendermos melhor a questão da orientação sexual e da identidade de gênero, vamos conhecer alguns personagens que podem nos servir de exemplo:

Estratagema da linguagem Muitos ainda utilizam a palavra homossexualismo, o que é um erro, pois o sufixo “ismo” remete a doença. O correto é utilizar homossexualidade que, com o sufixo “ade”, remete a forma de ser.

Transoquê? Atenção! O modo de se referir a pessoas trans é um cuidado importante. Designá-las pelo gênero no qual se reconhecem, usando seu nome social (aquele que foi escolhido por identificação de gênero, e não seu nome de registro) é sinal de respeito.

Orgulho transsexual

(in)visibilidade A palavra gay não dá conta de todas as identidades existentes no mundo LGBT. Usá-la como designação genérica dessas populações é, não apenas impreciso, mas também uma forma de invisibilizar outros segmentos.

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Orgulho pansexual

Orgulho assexual Orgulho genderqueer e não-binário

Orgulho LGBT Orgulho bissexual


Túlio

&

Alessandro

ESTÃO JUNTOS HÁ

2

ANOS.

DURANTE ESSE TEMPO, OUVIRAM

vários COMENTÁRIOS DEPRECIATIVOS AO ANDAREM DE MÃOS DADAS

na rua.

podem devem carinho

TÚLIO E ALÊ, VOCÊS E DEMONSTRAR DA FORMA QUE QUISEREM E ONDE QUISEREM.

Não deixe que a infelicidade dos outros, que ainda não entendem o que é amor, atrapalhe a felicidade de vocês.

Will É BISSEXUAL E NAMORA Camila

CAMILA JÁ OUVIU MUITOS DIZEREM QUE WILL PODE TRAÍ-LA A QUALQUER MOMENTO COM OUTRO HOMEM OU QUE ELE É

gay encubado.

Will, não ligue para os comentários, você sabe quem é e Camila sabe o amor que você tem por ela.

Priscila

É ASSEXUAL. MUITOS ACHAM QUE

ela não sabe o que está perdendo, QUE NÃO ACHOU A PESSOA CERTA.

Priscila, as pessoas não entendem que amar não é só fazer sexo. Você ama com carinho e sentimentos, você apenas ama. Revista Rolimã • Julho de 2016 | 15


Thiago NASCEU MENINA,

MAS NUNCA SE IDENTIFICOU COM O SEXO QUE LHE FOI DESIGNADO AO NASCER. COM MUITA LUTA, PASSOU POR UM

processo de adequação

E HOJE, FINALMENTE, PODE SE SENTIR CONFORTÁVEL EM SEU PRÓPRIO CORPO.

Thiago, você é lindo e ficamos felizes que você possa viver sendo quem sempre foi!

Luiza É BISSEXUAL,

E SEMPRE ESCUTOU DE SUA FAMÍLIA E COLEGAS QUE É

promíscua E QUE SUA ORIENTAÇÃO SEXUAL não existe, QUE UMA HORA ELA DEVERIA escolher “um lado”. Luiza, a atração afetivossexual de cada um é livre e você não precisa e nem deve se orientar por um padrão social. O exercício da sua sexualidade não é da conta de ninguém.

Gisele

É UMA MULHER TRANS HÉTERO. HOJE ELA NAMORA O

Gisele, você é uma mulher! Paulo, não se importe, a pansexualidade não é compreendida. Algumas pessoas não entendem que o amor ultrapassa barreiras.

Paulo

,

QUE SE RELACIONA COM PESSOAS EM GERAL,

independente do gênero,

MAS MUITOS NÃO CONSEGUEM

ENTENDER A RELAÇÃO DOS DOIS. ALGUNS ACHAM QUE GISELE NUNCA SERÁ

uma mulher de verdade E QUE PAULO É gay.

QUANDO

Keyla e Joyce

COMEÇARAM A NAMORAR,

MUITOS DIZIAM QUE ERA

10

apenas uma fase.

ANOS SE PASSARAM, KEYLA E JOYCE SÃO CASADAS E MÃES DE UM CASAL.

Elas vivem uma fase linda há anos!


Bianca É TRAVESTI.

AS PESSOAS VIVEM RELACIONANDO-A À PROSTITUIÇÃO E ÀS DROGAS, E DIZEM QUE ELA É UMA . ALGUNS AINDA SE RECUSAM A RECONHECER SEU NOME SOCIAL E A TRATAM NO .

aberração

masculino

Bianca, você está no caminho certo! Continue estudando, temos certeza que será uma boa advogada.

Gustavo SE ASSUMIU COMO GAY PARA A FAMÍLIA AOS 14 ANOS E ESCUTOU QUE “ ”E QUE “NUNCA HAVIA SE RELACIONADO COM UMA MULHER ”.

era muito novo para saber dessas coisas para ter certeza

Gustavo, não se deixe abalar por esse tipo de afirmação! Sua orientação sexual não precisa de nenhum “teste” para ser válida e não há idade para ter consciência de quem somos. Afinal, ninguém nunca disse ao seu primo hétero que ele era muito novo para ter certeza de que gostava de mulheres!

Carolina É LÉSBICA, E SEMPRE ESCUTA QUE

lésbicas são mais aceitas que gays DENTRO DA SOCIEDADE PATRIARCAL.

CAROL TENTA NÃO SE IRRITAR E EXPLICAR QUE, NA REALIDADE,

fetichização

HÁ UMA ENORME DA LESBIANIDADE PELOS HOMENS HÉTEROS CISGÊNEROS, QUE ENXERGAM AS LÉSBICAS DENTRO DO PADRÃO COMO UM , O QUE NÃO SIGNIFICA QUE ESTAS SÃO MAIS ACEITAS QUE OS HOMENS GAYS.

seu próprio prazer

produto para satisfação de

Revista Rolimã • Julho de 2016 | 17


Rafael É FILHO DE UM

CASAL HOMOAFETIVO,

E ESTÁ ACOSTUMADO A ESCUTAR QUE , QUE SER FRUTO DE UM CASAL NÃO-HÉTERO ATRAPALHA NO DESENVOLVIMENTO DO INDIVÍDUO, ALÉM DE INFLUENCIÁ-LO A SER HOMOSSEXUAL.

seu núcleo familiar não é normal

Rafael se identifica como heterossexual e vive muito feliz com seus dois pais, em uma família que não é nada anormal!

Júlio É UM HOMEM TRANS HÉTERO, Victoria, UMA MULHER TRANS BISSEXUAL. E É CASADO HÁ MAIS DE CINCO ANOS COM AMBOS ESCUTAM QUE JAMAIS SERÃO UM HOMEM OU UMA MULHER “DE VERDADE” E QUE O RELACIONAMENTO DELES É CONFUSO.

Nenhum dos dois liga para o que dizem, pois se amam e são muito felizes e esclarecidos, sem confusão nenhuma!

Bruna

que quer feminilidade

SE VESTE E AGE DA FORMA E NÃO SE ENCAIXA NA “ ” ESPERADA PELA SOCIEDADE, IDENTIFICANDO-SE COMO GÊNERO NÃO-BINÁRIO. MUITOS NÃO ENTENDEM ISSO E DIZEM QUE E DECIDIR-SE SE QUER SER MENINO OU MENINA.

ela tem que agir como mulher

Bruna se sente confortável sendo quem é, sem a necessidade de se encaixar no sistema binário. 18 | Revista Rolimã • Julho de 2016


Muito além dos CASTIGOS FÍSICOS POR LARISSA CAMPOS E TALITA DE JESUS SILVA

As cicatrizes que mais doem, às vezes, são aquelas que não se veem. Violência psicológica, negligência e assédio verbal produzem sérios danos à autoestima e à formação de crianças e adolescentes Pais autoritários, que abusam de seus poderes para agredir psicologicamente e castigar seus filhos, que acreditam que, para educar, é necessário gritar, xingar, humilhar e expô-los de maneira vexatória na frente de outras pessoas. Esses são exemplos de pais que, ao invés de educar, estão violando os direitos de crianças e adolescentes. Quando falamos de violência física, de crianças machucadas fisicamente pelos pais ou pessoas próximas, há uma comoção da sociedade em se posicionar contrariamente a essas atitudes. Mas quando se fala em violência nãofísica, não é todo mundo que tem clareza do que se trata e das diversas formas de manifestação desse tipo de agressão. A violência doméstica não-física é um assunto pouco discutido entre as pessoas de um modo geral e também entre famílias que têm em seus lares crianças e adolescentes. O lar deveria ser um local de amparo, amor, carinho e aprendizado, onde crianças e adolescentes aprendessem a respeitar e conviver com outras pessoas. E qual seria o papel de pais e mães nessas famílias? De que maneira educar? Corrigir com gritos, castigar vexatoriamente, ameaçar, ofender ou ridicularizar não são bons caminhos. Quando se xinga a criança como um ato de correção, aí está um problema. Tais comportamentos estão enraizados na sociedade e não são entendidos como uma violação de direitos, mas, na verdade, podem causar danos irreparáveis na identidade e autoestima infantojuvenil.

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A face não-física da violência Violência doméstica contra crianças e adolescentes é qualquer ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis que possam afetar ou causar danos, dor ou irritabilidade à vítima. Ocorre em casa, no âmbito familiar e entre pessoas mais próximas da criança ou do adolescente. A violência doméstica pode se manifestar de diferentes maneiras, como violência sexual, violência física e fatal. Mas há também facetas dessa violação que não afetam diretamente a integridade física da criança. É o caso, por exemplo, de xingamentos, ameaças e humilhações que deixam a vítima em situações de constrangimento ou medo. Ou seja, são diversas as formas de expressão de violência não-física. Nesse tipo de violência, as marcas são internas, afetando o desenvolvimento integral e saudável de meninos e meninas. Para enfrentar a crescente ocorrência desse tipo de violência, a legislação prevê responsabilidades e punições. O artigo 19 da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, que visa à proteção de crianças e adolescentes dos países signatários, define: “Os Estados Partes adotarão todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e educacionais apropriadas para proteger a criança contra todas as formas de violência física ou mental, abuso ou tratamento negligente, maus-tratos ou exploração...”. Em âmbito nacional, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no artigo 5º,

Violações mais recorrentes no Brasil 4%

Negligência Violência Psicológica Violência Física Violência Sexual Outras

13%

37%

21% 25%

Violações mais recorrentes em Minas Gerais 5%

Negligência Violência Psicológica Violência Física Violência Sexual Outras

13%

38%

19% 25%

Fonte: Disque 100

determina que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de violência, crueldade e opressão e que serão punidos aqueles que desrespeitarem seus direitos fundamentais. Apesar de a proteção estar garantida na legislação brasileira, casos de violência praticados por familiares têm sido constantes. De acordo com dados comparativos de 2011 a 2014 do Disque 100, a negligência foi a principal denúncia nos quatro anos do período analisado. A violência não-física acontece todo o tempo, embora as pessoas não deem a ela a mesma importância que dão aos castigos físicos. Isso, aliás, é o que a torna mais danosa, pois ela está entranhada e naturalizada em nossos cotidianos. A falta de paciência de um pai ao escutar o dia letivo de seu filho, a irritabilidade causada pela rotina e até o despreparo na hora de lidar com os problemas em casa são motivos que devem ser problematizados por nós. O psicólogo Josimar, técnico do Centro de Referencia de Assistência Social (Cras) de Sete Lagoas, explica que a violência doméstica está ligada a uma questão cultural, em que algumas pessoas acreditam que, para educar, é preciso repreender com punições severas, como bater, xingar e maltratar. Os impactos da violência não-física são reais e, embora se manifestem de formas diferentes para cada criança, sempre se revelam de maneira negativa. 20 | Revista Rolimã • Julho de 2016


Como esse tipo de violência afeta crianças e adolescentes? “Me sinto frágil. Às vezes, por medo, preciso esconder o que estou sentindo”. Esse é o relato de uma jovem a respeito da violência doméstica. Além de abalar a autoestima, essa violação acarreta outros efeitos psicológicos. A criança ou o adolescente vítima de violência doméstica tem grandes chances de desenvolver traumas profundos, como medo, negatividade e irritabilidade, por exemplo. Os pais que usam os castigos severos para corrigir seus filhos precisam estar cientes de que essa forma de punição pode comprometer a formação da personalidade infantil. Os filhos são reflexos dos pais e estes têm o papel importante de oferecer uma boa educação aos seus descendentes. A educação deve se dar de maneira saudável, com incentivos, diálogos e cuidados para que, no futuro, a criança se torne um adulto emocionalmente sadio. É perceptível que crianças e adolescentes que vivem em local harmonioso, onde as virtudes e valores são respeitados, expressam-se e socializam facilmente, mantêm uma vida afetiva e social mais equilibrada. Já aqueles que vivem em local onde brigas, xingamentos e punições agressivas são constantes costumam se sentir mais retraídos e muitas vezes se isolam. As consequências dessa violação de direitos dentro de casa são inevitavelmente refletidas no convívio social e podem ter repercussões até a vida adulta. A criança ou o adolescente vítima dessa violação tende a apresentar comportamentos suspeitos no ambiente escolar. Além da baixa autoestima já comentada, percebe-se, por exemplo, falta de motivação e agressividade com os colegas. Geralmente, reproduzem com os amigos da escola o que aprendem em casa, colocando apelidos, humilhando e enfatizando que não conseguem nada, que não sabem nada.

Calar ou denunciar? O silêncio que precisa ser quebrado Muitas pessoas, por medo ou ameaça, ficam na dúvida entre silenciar ou denunciar o ato de violência. Manter o silêncio perpetua a corrente de violações e contribui para a naturalização desses casos. Por isso, é importante denunciar aos órgãos especializados. Na escola, principal espaço de sociabilidade de crianças e adolescentes, é possível identificar muitos dos casos de violência. Diante da suspeita, é dever da instituição acionar a rede de proteção, como o Conselho Tutelar e o Ministério Público, se for o caso. “É dever da escola verificar casos de violência contra crianças e adolescentes”, afirma Vaneide Aparecida, professora e diretora da Escola

Exemplos mais comuns de violência doméstica não-física contra crianças e adolescentes NEGLIGÊNCIA ATIVA Ocorre quando os cuidadores têm consciência de estarem maltratando a criança e, mesmo assim, não alteram seu comportamento. Em menor ocorrência, há casos em que a negligência é premeditada e tem a intenção de causar sofrimento à criança ou ao adolescente. NEGLIGÊNCIA PASSIVA Acontece como consequência da incapacidade ou incompetência dos cuidadores na prestação de cuidados. É a forma mais comum de negligência. ABANDONO Considera-se abandono parcial a ausência temporária dos pais, expondo a criança a situação de risco. Entende-se por abandono total o afastamento do grupo familiar, ficando a criança desamparada, sem habitação, exposta a várias formas de perigo. BULLYING Agressões intencionais, geralmente de caráter verbal, praticadas de maneira repetitiva por um indivíduo ou grupo, dentro de uma relação desigual de poder. Pode também acontecer dentro de casa, exercido pela própria família. ASSÉDIO VERBAL Caracteriza-se pelos comportamentos de xingar, ridicularizar, insultar, vaiar, provocar, ameaçar e/ou coagir. VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA Designação genérica para se referir a palavras ou ações dirigidas a envergonhar, censurar e/ou pressionar a criança ou o adolescente de forma permanente, seja com ameaças, humilhações, gritos, injúrias, privação de amor, rejeição, etc.

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Estadual Edith Furst. O educador, aliás, é figura central, uma vez que, fora do ambiente doméstico, é normalmente o adulto de referência para garotos e garotas, com o qual se mantém uma relação de confiança. Muitas das crianças que têm seus direitos violados em casa o procuram para confidenciar as situações de violência. Cabe ao educador escutar a vítima, acolhê-la, transmitir segurança e confiança, efetuar a denúncia e, na medida do possível, trabalhar com a criança ou o adolescente no sentido de tentar restaurar a autoestima e a valorização de si. Profissionais de saúde que acompanham meninos e meninas também têm a responsabilidade de efetuar denúncia em casos de violações de direitos. Por meio da portaria GM/MS 1968/2001, o Ministério da Saúde definiu como obrigatória a notificação de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra crianças e adolescentes aos Conselhos Tutelares. Qualquer um pode denunciar, mesmo anonimamente, por meio do Disque Direitos Humanos (Disque 100), que funciona 24h, é gratuito e sigiloso. Além disso, a denúncia pode ser realizada presencialmente no Conselho Tutelar, que é o órgão responsável por zelar pelos direitos de crianças e adolescentes; em delegacias especializadas, que atuam diretamente em casos de violações de direitos de crianças e adolescentes; e em delegacias comuns, quando não há na região delegacia especializada. Também existem organizações da sociedade civil que atuam nessa área e podem orientar a respeito dos encaminhamentos e serviços mais adequados. Procure saber se há alguma dessas entidades no seu município. Geralmente, as denúncias são encaminhadas ao Conselho Tutelar da região onde a família vive, para que os conselheiros apurem a ocorrência e deem os encaminhamentos adequados. Identificada a violação, o Conselho encaminha a família aos órgãos da rede, como o Centro de Referência de Assistência Social (Cras) ou o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), onde é realizado um trabalho orientado com a família.

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POR ÍSIS ALVIM, SHERLON PETERSON E VITÓRIA MARIA

O que você sabe sobre violência sexual infantil? 1. É correto forçar uma criança a abraçar ou beijar alguém que ela não queira?

SIM

NÃO

2. Caso seja descoberta uma ocorrência de abuso dentro da sua família, deve-se “abafar” o caso?

SIM

NÃO

3. Praticar ato sexual com alguém menor de 14 anos, mesmo se for consentido, é crime?

SIM

NÃO

4. Um menino pode ser considerado vítima de estupro?

SIM

NÃO

5. Mulheres também podem ser consideradas agentes de violência sexual?

SIM

NÃO

6. Existe fiança para o crime de estupro?

SIM

NÃO

7. Um professor que descobre que um aluno sofre violência sexual e não avisa as autoridades legais está cometendo crime?

SIM

NÃO

8. Produzir, compartilhar ou consumir pornografia infantil é crime?

SIM

NÃO

9. Uma pessoa que, pela internet, contacta crianças a fim de se satisfazer sexualmente está cometendo crime?

SIM

NÃO

10. Beijar à força um adolescente, mesmo maior de 14 anos, é crime?

SIM

NÃO

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5 - SIM Mulheres também podem ser abusadoras. O estupro é um crime tipificado como comum, ou seja, pode ser cometido por qualquer pessoa, não havendo nada no tipo penal que traga especificidades a respeito do ator da conduta. Em outras palavras, tanto faz ser homem ou mulher.

1 - NÃO

6 - NÃO

Apesar de ser uma prática comum em boa parte das famílias, por ser considerado “mal educado” por parte da criança não querer abraçar e beijar amigos e familiares, obrigá-la a fazê-lo não é saudável. Além de desrespeitar seu espaço, isso cria no imaginário infantil a impressão de que é aceitável ter que ceder às pressões por afeto, mesmo contra a sua vontade. Tal prática, que à primeira vista parece inocente, pode colaborar para que a criança adquira um comportamento condescendente com relação a eventuais investidas de abuso sexual, já que a/o menina/o naturaliza que é “normal” oferecer carinhos a contragosto. Uma sugestão é propor outros tipos de cumprimentos, como aperto de mão, deixando a criança à vontade para decidir como se sente mais confortável.

Estupro é considerado um crime hediondo, logo o autor do crime não pode ser beneficiado com anistia, graça, indulto ou fiança.

2 - NÃO Mesmo que possa parecer constrangedor expor o caso para terceiros, denunciar é muito importante. E não se preocupe: os órgãos e as pessoas responsáveis por acolher a denúncia têm a obrigação de manter o sigilo, de modo a não expor a vítima e sua família. Abuso sexual infantil é crime e pode levar a detenção de até 15 anos. Não denunciar o abuso quando se descobre que está ocorrendo também é crime, com multa de até 20 salários mínimos e o dobro em caso de reincidência.

3 - SIM Para o Código Penal Brasileiro, menores de 14 anos não têm capacidade de consentir um ato sexual, sendo considerado estupro de vulnerável, com pena de até 15 anos de reclusão.

4 - SIM Meninos podem ser vítimas de abuso sexual. Legalmente, o Código Penal foi alterado em 2009 e, desde então, homens também podem ser considerados vítimas de estupro, e não apenas mulheres, como era previsto anteriormente.

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7 - SIM O cuidado com a criança cabe ao Estado, à família e também à sociedade. Educadores são corresponsáveis por esses sujeitos e, portanto, devem denunciar em caso de suspeita de violência sexual. Caso haja omissão, cabe multa de até 20 salários mínimos e o dobro em caso de reincidência.

8 - SIM Está previsto em lei, desde 2008, que não só produzir pornografia infantil é crime, mas também comercializar e mesmo consumir. Até mesmo alterar imagens de crianças e adolescentes simulando ato sexual é crime, com pena de reclusão de até 8 anos e multa.

9 - SIM Ainda que o ato de violência não se concretize, assediar, instigar ou constranger a criança, por qualquer meio de comunicação, com o fim de com ela praticar ato libidinoso é crime, com pena de até 3 anos e multa.

10 - SIM Obrigar alguém a beijar pode se enquadrar nos crimes de constrangimento ilegal ou importunação ofensiva ao pudor, tendo como pena detenção de três meses a um ano ou multa.


, Querido diário

muito feliz. anos e estou 10 o nd ze fa da iversário!!! Tô s do papai, Hoje é meu an o de abraço nt ta um bi s felizes dei, rece am estar mai Quando acor ã. Eles pareci m ir as ha in m da ue coisas bo mamãe e até ersários, porq iv an o or ad ente que eu tanto de pres que eu (e olha !). Ganhei um as di es ss que ne o a tecem já sabi sempre acon na verdade eu r, ze di r ue Q amigos surpresa. tios, primos e e uma festa porque meus , do an nt fingi ro as va ap bolo, m minha mãe ta ãe fazendo o am m a vi eu pra cá e vieram todos o. mais divertid sa. A gente da pra ficar não saber na va aqui em ca ta co Dé o ti O . te le e fazia bastan Hoje brinquei rto da casa de pe a av or m e dia quando eu va com saudad brincava todo e disse que ta El o. ti ti o a vi ndo meus e eu não ira nova. Qua um tempão qu de ca in br a um ia me ensinar tio me chamou de mim e que da festa, meu as is co as o. Eu falei pra buscar car de médic in pais saíram br ia er qu eu e é perguntou se Mas, como el no quarto e a nova, né?”. ir de ca in br é isso não pra ele: “tio, o assim. ado, fui mesm roupa, mas eu muito engraç a que tirar a nh ti e nt ge a e que ico com a Tio Déco diss brinco de méd eu do an qu ue Mas tranho, porq tira a roupa. achei meio es os, ninguém nh ui ig am s os meu examinar e m. Ele foi me mamãe e com bé m ta i re ti stei rado, então eu anho... não go ele já tinha ti bém. Foi estr m ta le ne so fazer is chegando lá me pediu pra o da mamãe lh ru ba o vi ou feliz quando assustado, só muito. Fiquei e o titio ficou qu r po o it re di entendi ir as minhas mandou vest na sala e não e m e o dã pi ra e stiu a roupa ninguém sobr sei que ele ve eu contar pra ra pa a er o nã er sse que ue ele já a também. Ele di secreta, porq a ir de ca in br que era uma a brincadeira, pra ele. na cozinha. r vergonhoso adulto e ia se amou a gente ch ãe am m a lo do quarto e ndo com um bo A gente saiu do me espera un m do to do va os... tu eguei, ta te de docinh Quando eu ch as e um mon es ac s ha lin ve de chocolate, parabéns. undo cantou ersário em m do pronto! To didos de aniv pe s eu m z fi ero velinhas e ue eu nunca qu Assoprei as sempre, porq ra pa a nç ia jei ser cr silêncio. Dese o titio tem. brincar igual de ha on rg ve ter

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Como mudar uma realidade que se encontra diariamente escondida ou silenciada em páginas de diários, na falta de diálogo, no pouco tempo com a família, nas negligências da escola e dos pais? Como perceber os sinais de uma criança, apesar da inocência da idade?

Abuso: o que é, como e por que ocorre O abuso sexual infantojuvenil se caracteriza como qualquer ação de interesse sexual de um ou mais adultos (ou adolescentes mais velhos) em relação a uma criança ou um adolescente. Não é necessário, portanto, haver penetração; podem ser carícias, toques, assédio verbal, incitação libidinosa, exposição a conteúdos pornográficos ou quaisquer outras variações que possam constranger a menina ou o menino. Pode ocorrer tanto entre desconhecidos quanto entre pessoas que tenham laços afetivos, porém é mais recorrente em ciclos de convívio próximos da vítima, sendo que em grande parte dos casos acontece no meio intrafamiliar. A perpetuação da violência sexual infantil tem como aliada a relação de poder e persuasão que o praticante do ato estabelece com a vítima. A inocência da criança acaba por fazer com que ela muitas vezes não perceba que se trata de uma violência ou que tenha medo de contar o ocorrido, fechando-se cada vez mais em suas angústias e no seu medo. Há uma rede de fatores sociais que ajudam a manter escondidos as violências e os abusos cometidos contra crianças e adolescentes: problema ocultado por relações de poder, medo de romper o silêncio, conivência por parte de familiares que querem “manter as aparências”, receio de julgamentos sociais e tabus que envolvem quaisquer temas que tocam a sexualidade.

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Educação é a chave para prevenção Quebrar esse ciclo envolve educar para prevenir. A família deve orientar a criança em relação à autonomia sobre seu próprio corpo e, nesse processo, pequenos gestos cotidianos fazem grande diferença. Obrigá-la a abraçar e beijar parentes e amigos, por exemplo, ou tocá-la sem autorização são atitudes que podem acabar criando a impressão de que ela não manda em si mesma e que pessoas com qualquer relação de poder sobre ela podem se aproximar de seu corpo quando e como quiserem. Por isso, sinalize para a criança que aquele é um espaço que pertence somente a ela. Ao banhá-la, pergunte se pode ensaboá-la antes de simplesmente invadir seu espaço. Caso ela não consinta, sugira que ela mesmo se ensaboe. Dê a ela autonomia no que se refere ao seu corpo. Se as crianças forem empoderadas nesse sentido, estarão mais aptas a impor limites aos outros e a denunciar quando esses limites não forem respeitados. Na escola, a orientação é igualmente importante. Educação sexual deve ser tema desde a infância, obviamente respeitando abordagens adequadas à faixa etária. É preciso ensinar crianças e adolescentes a identificarem os aspectos do seu corpo e a desenvolverem sua sexualidade de forma saudável, inclusive para prevenir uma sexualização demasiadamente precoce. A educação sexual, contudo, ainda é falha no Brasil. O assunto só é pauta já na adolescência e, mesmo então, pouco ou nada se fala sobre violência sexual. Questões como orientação sexual e identidade de gênero [leia mais sobre o tema na página 13] tampouco entram nas discussões. A abordagem fica restrita à anatomia dos órgãos reprodutivos, doenças sexualmente transmissíveis e métodos contraceptivos e, mesmo nesse aspecto, a instrução é deficiente e pouco prática – censo realizado pelo Ministério da Saúde em 2012 revela, por exemplo, que a proporção dos alunos de 8º ano ao fim do Ensino Médio que recebem orientação na escola sobre como adquirir preservativos gratuitamente é de apenas 69,7%. Para romper com essa teia de silenciamento que envolve a violência sexual infantojuvenil, é necessário mudar o jeito com que tratamos do assunto com nossas crianças e nossos adolescentes e isso requer o apoio das famílias e da escola, mas também do Estado e da sociedade, pois implica uma mudança de cultura face a um tema que é tabu e socialmente invisibilizado.


Identificando casos Há situações em que os sinais de violação de direitos da criança são nítidos, como quando há marcas físicas. No caso da violência sexual, esses sinais aparecem muito mais em comportamentos psicológicos. Agressividade, isolamento, depressão, queda no desempenho escolar, vontade de fugir de casa, dificuldade em confiar nas pessoas, insônia ou uso abusivo de drogas podem denotar que algo está errado. No caso de crianças muito novas, também é possível que sinais apareçam sugeridos em brincadeiras, jogos e atividades que as deixem confortáveis para se expressar, seja por meio de diálogo, gesto ou desenhos. Aparecimento de doenças sexualmente transmissíveis ou comportamentos hiperssexualizados precocemente também são indícios. É importante que a família estabeleça sempre um diálogo aberto e franco com a criança, para que ela se sinta segura para compartilhar com os responsáveis caso sofra algum tipo de violência. Nos casos em que há alguma suspeita, a postura mais adequada é tentar obter confiança e estabelecer conversas que não soem como interrogatórios, sem pressão ou intimidação, em ambientes afastados de outras pessoas, para que a privacidade da criança ou do adolescente seja preservada. Como a criança passa boa parte do dia na escola e nesse ambiente costuma estabelecer grande parte de suas relações sociais, professores e profissionais de educação precisam estar atentos. Muitas vezes são eles os responsáveis por descobrir quando uma criança sofre violência sexual. Uma professora de Ciências do 5° ano relata ter descoberto que uma aluna sofria abuso sexual após uma aula de educação sexual. “Eu expliquei como as coisas funcionam e aproveitei para falar que adultos não podem fazer sexo com crianças, que isso é uma violência muito grave e é crime. Citei inclusive o Disque 100, que é um canal no qual se pode fazer denúncia e, no final da aula, quando todos os alunos saíram, essa menina veio me perguntar qual era mesmo o número de telefone. Chamei-a para conversar e então ela contou que o primo abusava dela e os pais não sabiam”. Professores que por qualquer razão suspeitem ou descubram que uma criança ou um adolescente sofre abuso têm a obrigatoriedade de denunciar, conforme descrito no artigo 245 do Estatuto da Criança e do Adolescente: “Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência”.

Como denunciar? Quando há a descoberta ou suspeita de casos de violência sexual, é fundamental que seja feita a denúncia aos órgãos competentes para a proteção da criança ou do adolescente. Nesse sentido, há vários canais onde essa denúncia pode ser feita. Existe o serviço do Disque Direitos Humanos (Disque 100), que é gratuito, sigiloso e permite que o usuário não se identifique. Além de efetuar a denúncia por esse canal, é também possível colher informações sobre a rede de proteção e seus serviços, por exemplo. Pessoalmente, as denúncias podem ser feitas no Conselho Tutelar, nas Varas da Infância e da Juventude, nas Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente ou nas Delegacias da Mulher. Existe ainda um aplicativo disponível no GooglePlay e na AppStore, chamado Proteja Brasil, que indica telefones e endereços dos locais de denúncia mais próximos a partir de onde o usuário está. Ele ainda sugere o melhor caminho para chegar aos órgãos competentes e organizações que ajudam a combater a violência contra crianças e adolescentes nas principais cidades brasileiras. O site do aplicativo é www.protejabrasil.com.br.

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E depois da denúncia, o que acontece? No imaginário popular, muitas vezes ronda a ideia de que, após a denúncia, a criança vítima de violência sexual será imediatamente afastada da família e enviada a uma instituição de acolhimento (abrigo), mas não é bem assim que as coisas acontecem. O trabalho com crianças e adolescentes vítimas de violência sexual não tem como objetivo tirar a criança de seu núcleo familiar, sendo essa a última medida cabível. A criança só é encaminhada para acolhimento institucional quando um conjunto de ações e outras tentativas já foram realizadas, sendo o acolhimento uma medida provisória até que a criança esteja pronta para a reintegração familiar ou, não sendo possível, sua colocação em família substituta. Quando é feita a denúncia ao Conselho Tutelar, primeiramente são encaminhados aos pais a denúncia e um termo de responsabilidade. Se verificada a hipótese de abuso sexual, costuma ser determinada como medida cautelar o afastamento do agressor da moradia comum, sendo que ele, agora afastado, fica obrigado por lei a pagar pensão alimentícia à vítima dependente. No que diz respeito à vítima, a criança e a família têm orientação, apoio e acompanhamento temporários,

ficando o Conselho responsável por fiscalizar o cumprimento obrigatório da matrícula e frequência da criança em estabelecimento oficial de ensino. Além disso, há a inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente e requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, dependendo do caso. Se na família há casos de alcoólatras e toxicômanos, há a inclusão dos mesmos em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento. Se mesmo após todas as medidas acima serem tomadas for verificada a impossibilidade da criança permanecer no convívio familiar, ela será enviada para acolhimento institucional e o processo no Ministério Público deverá decidir pela destituição do poder familiar. O Conselho Tutelar irá buscar entre parentes mais distantes ou terceiros possíveis interessados em tê-la sob sua guarda e incluirá a criança no programa de acolhimento familiar.Somente depois de tudo isso, se esgotadas todas as possibilidades, será feita a colocação em família substituta, que atenda às necessidades da criança e na qual ela esteja protegida de abusos e violências.

Como denunciar a violência sexual contra crianças e adolescentes? Disque 100

(gratuito e sigiloso)

Vara da Infância e Juventude

Conselho Tutelar

Aplicativo Proteja Brasil

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Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente

Delegacia da Mulher


Banco de imagens

Onde você se encontra? POR IAKIMA DELAMARE, ÍSIS ALVIM E SHERLON PETERSON

Identificar-se com seus brinquedos é muito importante na construção da autoimagem das crianças. A falta de representatividade no universo lúdico afeta negativamente o desenvolvimento da individualidade durante a infância e adolescência. Uma mulher e um homem negro. Até pouco tempo, seria improvável, quase inimaginável, que uma dupla assim pudesse protagonizar um filme de uma das franquias mais famosas da indústria cinematográfica. Por isso, quando Rey, interpretada por Daisy Ridley, e Finn, interpretado por John Boyega, foram anunciados como estrelas do novo episódio de Star Wars (“Guerra nas Estrelas”, no Brasil), a notícia trouxe à tona uma importante discussão: a representatividade e a diversidade no universo lúdico, que ajuda na construção de nossa visão de mundo desde o início da vida.

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O filme e seus personagens nos permitem vislumbrar como a indústria do entretenimento se comporta quando o assunto é representatividade, seja de gênero, etnia ou orientação sexual. Embora o lugar de destaque conquistado por personagens que até então eram postos em segundo plano represente algum avanço, a linha de produtos da saga estelar não está totalmente aberta a mudanças. Dentre os brinquedos da série, praticamente não há referências à protagonista feminina. E os bonecos de Finn permanecem, em sua maioria, encalhados nas prateleiras. Para a pesquisadora do Núcleo de Cultura, Estudos e Pesquisas do Brincar da PUC-SP, Maria Ângela Carneiro, a baixa procura pelo boneco Finn pode ter várias origens. “A oferta de brinquedos exclui as crianças primeiro do ponto de vista econômico, porque nem todas têm acesso a todos os objetos; segundo, do ponto de vista social e físico, porque eles não representam todas as classes, mas as expectativas de uma classe socioeconômica, racial e cultural privilegiada. A demanda existe, mas os principais consumidores seriam os que se identificam com ela, ou seja, crianças e jovens negros, que historicamente pertencem a uma classe social de baixo poder aquisitivo”, explica. Apesar do percentual de vendas pouco expressivo, houve quem se sentisse muito bem representado. Foi o caso do Matias, de apenas quatro anos. Sua imagem com o boneco viralizou na internet. Embora ele nem sequer conheça a saga Star Wars, apaixonou-se por Finn, pois o

Foto: Iakima Delamare

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personagem se assemelha a ele. Segundo a mãe, Jaciana Melquiades, quando o garoto viu o brinquedo começou a pular, agarrou a caixa e se apegou; quis o boneco de qualquer jeito. “Criar uma criança negra com autoestima elevada é trabalho árduo em uma sociedade racista como a nossa”, desabafa Jaciana. O caminho educativo que ela e o marido encontraram foi, por um lado, falar abertamente sobre racismo com o menino, para que ele não internalize que há algo de errado com sua aparência, que raramente está representada em brinquedos; por outro lado, buscam apresentar a Matias referências positivas, nas quais ele possa se inspirar. “Sempre procuramos elementos nos quais ele consiga se espelhar, brinquedos nos quais ele se veja para que ele forme uma autoimagem também positiva”, expõe.

E elas? Rey, a protagonista mulher de Star Wars, ilustra um avanço na representatividade feminina no cinema. Principalmente em filmes de ação, mulheres costumam ser hipersexualizadas, raramente têm falas, nomes ou existem de modo independente dos personagens masculinos. Isso normalmente é um reflexo das mentes por trás das câmeras. De acordo com um estudo feito pela Universidade do Sul da Califórnia, que analisou o papel das mulheres nos filmes de maiores bilheterias entre 2007 e 2014, menos de


Foto: Potira Caruana

“Comecei a confeccionar bonecas negras após ver uma boneca de pano negra na capa de uma revista”, diz Lúcia Makena, criadora das bonecas que levam seu sobrenome.

2% foram dirigidos e apenas 11,3% foram escritos por mulheres. O resultado disso é que somente 21% dos filmes produzidos nessa época apresentavam uma protagonista feminina. O sucesso da Rey, no entanto, não é motivo de comemoração para todas. No caso das meninas e mulheres negras, a representatividade é ainda mais baixa. A estudante Ana Carolina Pereira, hoje com 20 anos, lembra como essa falta de representatividade afetou sua infância. “Os programas só mostravam crianças brancas, de cabelo loiro e liso, o padrão de beleza eurocentrista. Quando tinha uma personagem negra, ela era a única entre vinte, trinta. A exceção, nunca a regra. Isso fazia parecer forçada a presença dela. É muito difícil nos identificarmos com personagens assim, ninguém queria ser a única menina negra, a diferente, a que quase não tem fala, a que desaparece durante vários episódios”, conta. “Quando eu estava no primário, odiava ter a pele negra e o cabelo cacheado. Eu, menina negra, me via dentro de um sistema que não me representava, e tudo que eu queria era entrar nesse padrão branco, olhos azuis, cabelo liso e loiro. Uma das minhas primeiras formas de resistir foi quando, com uns sete anos, pedi aos meus pais uma boneca negra. Eles ficaram alegres com meu pedido. Ela era negra e tinha cabelo liso, mas não era, nem de longe, a minha favorita. Eu tive vergonha dela e comecei a achar que tinha feito uma escolha horrível”, relata a jovem Ana Carolina. Sua narrativa revela o quanto a prevalência de um padrão estético único pode gerar danosas consequências para a formação da identidade e construção da autoestima das crianças. Mesmo após adquirir uma boneca negra, seu sentimento ainda era ambíguo. A aquisição do brinquedo não bastou para reparar seus juízos negativos a respeito dessa estética, historicamente inculcados no imaginário social. Mudar esse cenário leva tempo, mas iniciativas diversas começam a se destacar. Ciente da sub-representação do segmento negro e da defasagem de mercado, a pedagoga Lúcia Makena decidiu se lançar em um novo nicho de trabalho.“Comecei a confeccionar bonecas negras após ver

uma boneca de pano negra na capa de uma revista. Essa foi a inspiração para iniciar esse trabalho, já que sabia da dificuldade de achá-las em lojas. Esses brinquedos ajudam no processo de fortalecimento da autoestima, afeto, carinho e no processo de formação da identidade negra, já que a boneca se parece muito com a criança. A partir do momento em que essas crianças e jovens estão fortalecidos quanto à sua identidade negra, conseguem ajudar outras pessoas nessa luta”, argumenta. O lúdico é fundamental na formação da autoimagem da criança. Se ela não se vê representada positivamente, internaliza um sentimento de impertinência no mundo. “Não pertencer, achar-se feio, não desejar algumas profissões de destaque, não sonhar com um curso de graduação: são todos efeitos da falta de um espelho positivo”, esclarece Jaciana Melquiades, mãe do Matias. Diversidade para garantir representatividade é, portanto, muito importante. Linhas de brinquedos plurais ilustram nossa variedade étnico-cultural e configuram uma visão de mundo. Jaciana opina: “A boneca negra é importante não só para crianças negras, mas para qualquer criança entender e acessar a diversidade. E isso vale para qualquer outra etnia representada nos brinquedos”. Foto: Jaciana Melquiades

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um show de diversidade

(étnica, cultural, social, afetivossexual)

Diversas iniciativas têm tentado mudar a perspectiva da representatividade no universo infantojuvenil

LENDAS DE DANDARA, DE JARID ARRAES Livro com dez contos sobre a guerreira quilombola Dandara dos Palmares. QUEENS OF AFRICA Bonecas desenvolvidas pelo nigeriano Taofick Okoya para que crianças de descendência africana pudessem se identificar. A PRINCESA E A COSTUREIRA, DE JANAÍ NA LESLÃO Livro que conta a história de uma princesa que se apaixona por sua costureira. VALENTE, DE BRENDA CHAPMAN O filme narra a história de uma princesa que é habilidosa arqueira e, para fugir de um casamento arranjado, pede sua própria mão em casamento. BINO E FINO, DE ADAMU WASIRI Desenho animado que procura educar as crianças afrodescendentes sobre sua cultura e hereditariedade. CADA UM NA SUA CASA, DE TIM JOHNSON Filme infantil que tem como protagonista uma menina negra com cabelos cacheados. MÁRIO, DE LATIFA ALAOUI M. E STÉPHANE POULIN Neste livro, o pequeno Mário conta como é sua relação com o namorado da mãe e o namorado do pai. PEDRO HENRIQUE CORTEZ Vlogger que fala sobre “Meus Heróis Negros Brasileiros”. BARBIE, NOVA LINHA DE PRODUTOS Bonecas com diferentes tipos corporais e tons de pele. MC SOFFIA Rapper negra de 11 anos que usa suas músicas para combater o preconceito e empoderar crianças negras.

FÁBULA DA VÓ ITA, DE JOYCE PRADO E THALLITA OSHIRO Curta-metragem sobre racismo e representatividade na infância. ICAMBIABAS, DE OTONIEL OLIVEIRA Desenho animado inspirado nas guerreiras amazônicas. INAMI, DE FRANÇOISE CHARPIAT Série francesa de desenho animado que conta as várias aventuras vividas por um jovem índio amazônico e seus amigos. A LENDA DE KORRA, DE MICHAEL DANTE DIMARTINO E BRYAN KONIETZKO Desenho animado que retrata as aventuras de uma dedicada, rebelde e destemida adolescente. Korra tem um relacionamento implícito com Asami, sua amiga e companheira de batalhas. 32 | Revista Rolimã • Julho de 2016


JUVENTUDE, FORMAÇÃO E TRABALHO FORA DAS GRANDES CIDADES Desemprego, ofícios precarizados e falta de uma educação qualificada são algumas das questões que dificultam a inserção plena dos jovens no mercado. No interior, a situação se agrava e muitos evadem para grandes centros. Como modificar esse quadro? POR EDUARDA DIAS E PEDRO MARTINS

O que leva a juventude do interior para as grandes cidades? A escassez de oportunidades é um dos fatores de maior peso para que isso aconteça, mas a raiz do problema talvez não esteja no emprego. O que acontece, então? E como gerar oportunidades para a juventude e evitar a evasão? Em Almenara, norte de Minas Gerais, falamos com muitos jovens e percebemos que a realidade vai muito além das ofertas de trabalho. A cidade é um grande polo educacional da região, que fica no Vale do Jequitinhonha, e ganhou mais notoriedade com a chegada do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG) e a instalação de outras universidades, como a Universidade do Norte do Paraná (Unopar), Faculdade de Almenara (Alfa), Universidade Aberta do Brasil (UAB), Universidade de Montes Claros (Unimontes) e com a Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), que oferecem não somente cursos de graduação e pós-graduação, mas também cursos técnicos. Pela concentração universitária, o município recebe estudantes de toda a região. A ampla gama de instituições, contudo, não implica uma oferta de cursos tão diversificada. Há uma grande semelhança nas grades curriculares, de modo que o mercado local tende a sofrer saturação de profissionais, o que gera o deslocamento de pessoas para outras cidades para exercerem suas atividades. Por outro lado, existe defasagem

EMPREGOS

Criação: Pabline Felix

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de profissionais qualificados em outras áreas de atuação. Ou seja, o rol de cursos não é muito bem distribuído. Outro problema diz respeito à falta de garantias materiais e financeiras para que a juventude local de fato estude e conclua o Ensino Superior. Mesmo nas universidades públicas, o estudante esbarra em algumas adversidades. Distância e dificuldade no acesso é uma delas. Josiclênia Alves, jovem de 23 anos formada em Administração, explica: “Nós temos o Instituto Federal no nosso município, que oferta cursos técnicos e superiores. Embora o ensino seja gratuito e de qualidade, nem todos os jovens têm condições financeiras para pagar o transporte até lá, pois está localizado fora do perímetro urbano”. Para o auxílio financeiro, como em toda instituição de ensino público, há assistência estudantil. Porém são muitas as restrições de acesso a esse benefício: o número de bolsas é insuficiente para a quantidade de candidatos, a burocracia dos documentos solicitados leva os interessados à desistência e o valor da bolsa é inferior aos custos de estadia dos alunos de outros municípios na cidade, por exemplo. As bolsas de pesquisa e extensão também são insuficientes.

Emprego: onde buscar? Os desafios não estão só na formação. A procura por um posto de trabalho também tem seus obstáculos. O Sistema Nacional de Emprego (Sine) é um serviço que atua como um classificado de vagas de emprego em todo o Brasil. Através de agências espalhadas pelo território nacional, faz a intermediação do contato entre empresas e mão-de-obra. Para concorrer às oportunidades ofertadas, é necessário o cadastramento do currículo do candidato. O sistema, porém, não é muito bem apropriado em municípios do interior. Em Almenara, por exemplo, o posto onde o Sine se encontra é reconhecido apenas como um local para a retirada da carteira de trabalho ou recebimento do seguro desemprego. Poucas pessoas têm seus currículos cadastrados no banco de dados e as empresas não mantêm um vínculo consolidado para que as oportunidades possam ser divulgadas e preenchidas por esse meio. Sujeitos que possuem o currículo cadastrado relatam que nunca participaram de seleção para vaga de trabalho feita pelo sistema, nem tampouco o órgão entrou em contato para informar a respeito de oportunidades de cursos ou demais iniciativas. A falta de um mecanismo eficiente de divulgação de postos de trabalho levou a comunidade a buscar outros meios, como a divulgação boca a boca, anúncios em rádio e redes sociais. Pensando nisso, Gil Gobira, morador da cidade, criou o grupo de Facebook “Almenara Oportunidades”, viabilizando um canal para a publicização das vagas que aparecem na região, bem como cursos e palestras. O grupo criado conta com quase 1.400 pessoas e já intermediou muitas contratações.

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Profissionalização, trabalho e renda: um direito do jovem Face a tantas dificuldades, fica difícil acreditar que a profissionalização é um direito constitucionalmente previsto e que, portanto, deveria ser garantido. O artigo 227 da Constituição Federal cita a profissionalização entre diversos outros direitos que devem ser assegurados “com absoluta prioridade” aos adolescentes e jovens. O Estatuto da Juventude é outros dispositivo legal no qual consta essa garantia. O artigo 14 estipula: “O jovem tem direito à profissionalização, ao trabalho e à renda, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, adequadamente remunerado e com proteção social”. Para a efetivação desse direito, a legislação prevê que a ação do poder público deve se orientar pela adoção de políticas públicas voltadas para a promoção de estágio, aprendizagem e trabalho para a juventude. A aprendizagem está regulamentada pela lei federal nº 10.097/00. Aprendiz é o jovem entre 14 e 24 anos que estuda, trabalha e recebe formação técnico-profissional a fim de exercer adequadamente sua função na empresa ou entidade responsável por sua contratação. Ou seja, a formação profissional não fica restrita ao exercício das atividades do emprego, vem também acompanhada de bases educacionais. A aprendizagem é um tipo especial de trabalho, que deve durar no máximo dois anos e precisa ser compatível com o desenvolvimento físico, moral e psicológico do adolescente ou jovem. A jornada não deve ser superior a seis horas diárias, admitindose oito horas para aqueles que já tiverem completado o ensino médio. O aprendiz tem direito a 13º salário, férias e todos os benefícios garantidos aos outros trabalhadores. O artigo 429 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê que as empresas devem empregar e matricular nos cursos de aprendizagem número de aprendizes equivalente a 5%, no mínimo, e 15%, no máximo, dos trabalhadores existentes cujas funções demandem formação profissional no estabelecimento. A aplicação dessa determinação, contudo, ainda permanece restrita às capitais e aos grandes centros. O Programa Jovem Aprendiz – principal política pública voltada à


profissionalização de jovens – chega ao interior de forma gradativa e insuficiente. Na cidade de Almenara, são ofertadas oportunidades para jovens aprendizes através do Centro de Integração Empresa Escola (CIEE), em instituições públicas e privadas de grande porte, como a Previdência Social, Caixa Econômica Federal e Itaú Unibanco. A juventude, porém, acaba não tendo conhecimento desses serviços, pois as oportunidades não são bem divulgadas. As políticas de promoção da profissionalização, trabalho e renda do município são bastante deficientes. O próprio Secretário de Cultura e Turismo de Almenara, Fernando Lima, reconhece: “Quando olhamos para as pessoas do interior, vemos que é possível ter uma economia criativa, uma economia solidária, em que a tecnologia pode ser de grande ajuda, tendo em vista que já existe internet até nas zonas rurais. É necessário, então, que sejam implantadas políticas e condições, especialmente pelos nossos governantes municipais, junto com as políticas estaduais e federais, para a criação de bancos de trabalho, valorizando nosso interior que é muito rico, inclusive o Vale do Jequitinhonha”. No intuito de melhorar o quadro, há algumas medidas que a gestão municipal pode tomar, como por exemplo absorver aprendizes diretamente na administração pública; articular-se com ONGs, conselhos da juventude e dos direitos da criança e do adolescente, Ministério Público do Trabalho (MPT) e empresas, fomentando e divulgando a política da aprendizagem; fiscalizar os estabelecimentos para verificar o cumprimento das cotas; e incentivar micro e pequenas empresas a contratarem aprendizes, mesmo que não sejam obrigadas por lei. É importante pensar, ainda, uma formação para aprendizes que esteja em consonância com o contexto econômico do município, para que tenham maiores chances de inserção no mercado de trabalho local após a aprendizagem. Reconhecer a cultura local, valorizá-la e estimulá-la é um passo importante. O Vale do Jequitinhonha, por exemplo, possui uma cultura riquíssima. Apropriar-se disso é um caminho para que essas políticas cheguem ao município levando em conta sua realidade e características locais.

Conhecer seus direitos é o primeiro passo para a mudança “Não dá pra negar que nos últimos dez anos tivemos avanços nas políticas de juventude. Embora elas tenham avançado, a grade dificuldade é fazer com que elas cheguem aos jovens do interior, sobretudo dos pequenos municípios. Esse é o grande desafio atual: expandir o acesso para a juventude do interior do país”, afirma Maria Zenaide Alves, professora da Universidade Federal de Goiás que trabalha com educação no campo. As dificuldades são várias e vão desde questões práticas, como a infraestrutura deficiente de municípios muito pequenos, que não dá conta de acolher políticas de profissionalização porque lhes faltam equipamentos públicos e uma rede de serviços, até questões culturais de não compreensão dos jovens como um segmento que, por estar em formação e desenvolvimento, merece atenção especial no campo das políticas públicas. Apesar de os resultados da aprendizagem serem muito positivos, ainda é preciso avançar na sensibilização da sociedade e dos gestores públicos em torno do tema. A despeito das diretrizes federais e estaduais, muitas vezes a gestão do município não adere aos programas de trabalho e renda para jovens por não entender a juventude como um público prioritário. Ora, os jovens são uma parcela particularmente afetada pelos problemas que atravessam o mundo do trabalho: desemprego, superexploração, precarização, terceirização e informalização das relações salariais. Irônico, já que a eles está garantido por lei o direito à profissionalização. Reconhecer os seus direitos é o primeiro passo para a conquista das garantias. É importante que o jovem se informe a respeito de seus direitos, organize-se e fomente essa iniciativa no meio em que vive, pressionando o poder público e implantando uma cultura participativa, de controle social.

OPORTUNIDADES

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CRIMINALIZAÇÃO DAS CULTURAS PERIFÉRICAS A polícia reprime, a sociedade julga, a mídia estereotipa. Mas a favela resiste e faz da sua arte uma forma de protesto POR ARA GABRIELE, LUÍSA NONATO E TATIANA MEIRELES O trecho da música do rapper Emicida nos apresenta com clareza a luta diária enfrentada por quem vive nas periferias do Brasil. A repressão policial é uma realidade cotidiana que afeta sobretudo jovens negros e pobres. Relatório divulgado pela Secretaria Nacional de Juventude no ano passado revelou que, no nosso país, o jovem negro tem 2,5 mais chances de ser morto do que o jovem branco. O Mapa da Violência 2014 – pesquisa realizada pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) – corrobora: das 56 mil pessoas assassinadas, 30 mil eram jovens entre 15 a 29 anos, dos quais 77% eram negros. As razões disso remontam a outros tempos. Apesar do fim da escravidão, o racismo prevalece; a estrutura de opressão apenas atualizou suas formas: a senzala deu lugar à favela, chicotes e pelourinhos foram substituídos por cassetetes e revólveres, capitães do mato se converteram em policiais.

Acervo Oficina de Imagens

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POR MAIS QUE VOCÊ CORRA, IRMÃO PRA SUA GUERRA VÃO NEM SE LIXAR ESSE É O XIS DA QUESTÃO JÁ VIU ELES CHORAR PELA COR DO ORIXÁ? E OS CAMBURÃO O QUE SÃO? NEGREIROS A RETRAFICAR FAVELA AINDA É SENZALA, JÃO BOMBA RELÓGIO PRESTES A ESTOURAR (EMICIDA, BOA ESPERANÇA)

A vulnerabilidade social da população negra é um fenômeno de raízes históricas. Após a abolição da escravatura, os negros libertos, que não tinham qualquer posse ou status social, tiveram que recomeçar suas vidas do zero, totalmente desamparados de qualquer auxílio do Estado, de seus antigos senhores ou das instituições de então. Relegados à margem, tinham que se deslocar para as zonas periféricas das cidades em busca de um território onde pudessem levantar suas casas e obter algum tipo de subsistência. Assim surgiam, embrionariamente, o que hoje chamamos de favelas. Em seu livro A construção da subcidadania: para uma sociologia política da modernidade periférica, o sociólogo Jessé de Souza explica: “Os antigos senhores, o Estado e a igreja jamais se interessaram pelo destino do liberto. Este, imediatamente depois da abolição, viuse responsável por si e seus familiares, sem que dispusesse dos meios materiais e morais para sobreviver numa nascente economia competitiva do tipo capitalista e burguês. (...) O abandono dos libertos pelos antigos donos e pela sociedade como um todo estava, de certo modo, prefigurando o destino da marginalidade social e da pobreza econômica”.

A FACE MÚLTIPLA DA OPRESSÃO Marginalizar, subjugar, oprimir — há muitas formas de fazê-lo. A subalternização de um povo ou uma cultura não se dá apenas por meio da repressão violenta; ela é principalmente ideológica, simbólica e opera no imaginário social. Além do confronto direto, da violência física e letal, existem terrenos mais sutis de dominação. Eles são tão mais eficientes quanto mais naturalizados. Quando enraizados nas nossas práticas, não se fazem perceber como opressão, parecem “normais” e, por isso, são amplamente aceitos.

"ESPORTE" POÉTICO-PERFOMÁTICO O slam é um encontro de poesia falada e performática, geralmente em forma de competição, em que um júri popular avalia o desempenho dos autores/poetas.

Assim é o tratamento social conferido às manifestações artísticas da periferia, como funk, rap, hip-hop, grafite, pixo, sarau, slam, entre outras. Movimentos como esses constantemente são vistos por grande parte da população e apresentados pela grande mídia de forma negativa e pejorativa. “Culturas urbanas de origem negra sempre foram perseguidas pelo Estado, sempre foram assunto de polícia. A criminalização da cultura periférica é parte de um processo mais antigo de criminalização das culturas da diáspora negra”, esclarece Adriana Facina, pesquisadora e professora de História da Universidade Federal Fluminense (UFF). Desde os tempos do Brasil Colônia, há uma tentativa de controle das práticas, culturas, festas e até mesmo crenças do povo africano. Seus rituais nativos, sejam folclóricos ou religiosos, eram proibidos; a capoeira e os batuques eram considerados pelas autoridades uma forma obscena de insurgência e incitação ao crime. Tal estigma de desordeiros e propagadores de violência não se dissolveu com o fim da escravidão e, de certa forma, arrasta-se até os dias de hoje. O controle, a vigilância e a repressão das autoridades sobre as manifestações da cultura periférica ainda se ancoram na justificativa de manutenção da ordem. “Há um histórico de leis que respaldam esse processo de criminalização [da cultura periférica]. A lei mais famosa é a “Lei da Vadiagem”, de 1890, que perseguia formas de sociabilidade, de organização e de lazer da classe trabalhadora, sobretudo negra, no pós-abolição. Havia prisão por capoeiragem, por exemplo, e os sambistas também eram reprimidos com base nisso”, contextualiza a professora de História.

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A mídia traz uma grande contribuição para a constituição desse imaginário negativo e deturpado, pois a periferia é frequentemente representada em contextos violentos. “As manifestações culturais da favela são apresentadas como perigosas, ameaçadoras. Se a gente fizer uma busca nos jornais relacionada à palavra funk, por exemplo, normalmente vamos achá-la nas páginas policiais, [em meio a] alguma coisa que tenha a ver com tráfico, com crime”, exemplifica a pesquisadora da Federal Fluminense. Essa associação entre as práticas da periferia e o tráfico de drogas é o que justifica as constantes e arbitrárias batidas policiais, muitas vezes com extrema truculência e abuso de poder. “A periferias são territórios alvo de intervenções militares, seja da polícia, seja, como a gente experimentou aqui no Rio, de Forças Armadas. Entendem esses territórios como territórios do mal, de exceção, de guerra, de confronto, onde as regras do Estado de Direito não valem”, pondera Adriana. E, nessa visão, as manifestações de arte e cultura da periferia são identificadas como problema de segurança pública. “É uma questão de autoritarismo e, em última análise, de racismo, porque não é apenas a cultura periférica que é criminalizada, mas os próprios moradores de favelas e periferias. A criminalização da cultura periférica é um ato de racismo institucional”, avalia Carlos Palombini, professor de Música da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que se dedicou a estudar o ‘funk proibidão’. A criminalização da cultura da periferia se confunde com a própria criminalização do negro da periferia. Nas palavras de Facina, “a forma com que o Estado lida com a cultura periférica é um reflexo de como ele lida com a população periférica: um esforço tremendo de subalternização, de controle, de repressão”.

CULTURA: UMA ETIQUETA SELETIVA A cultura da periferia é discriminada, como seus habitantes também o são. Muitas vezes, suas manifestações sequer são consideradas arte ou são desqualificadas, tidas como baixas e precárias. Isso não tem a ver apenas com a estética (se rudimentar ou refinada), está intimamente ligado com os agentes produtores.

Por exporem o dia a dia conflituoso dos moradores das quebradas e trazerem à tona a realidade violenta em que vivem, tais discursos, segundo argumentam os críticos, fazem apologia ao crime. Com relação a isso, Adriana Facina rebate: “Muito do que é considerado como apologia ao crime em determinados contextos é entendido como arte em outros. Muitas coisas que o funk proibidão narra em suas músicas são também relatadas em filmes como o Tropa de Elite. Eles estão falando a mesma coisa, mas de pontos de vista diferentes. Uma está narrando a ótica do policial e a outra está narrando o ponto de vista do criminoso. O crime de apologia é usado de forma muito seletiva, é mais um dispositivo de criminalização”. Para serem assimiladas e bem aceitas, as manifestações periféricas precisam passar pelo filtro da indústria cultural e dos grandes meios de comunicação. O samba, o tecnobrega e até mesmo o funk, por exemplo, são ritmos populares exaustivamente explorados pelo mercado hoje. Mas passa(ra)m por um processo de pasteurização – algo que vai desde um refinamento da estética e controle de conteúdo até um embranquecimento dos artistas. “Essas manifestações são aceitas quando passam pela indústria cultural porque são higienizadas. Perdem muito da sua potência e assim passam a ser mais palatáveis”, comenta Facina.

RECONHECIMENTO E RESISTÊNCIA A potência da arte de periferia está em sua autenticidade, expressão genuína de um contexto que revela condições peculiares de moradia, classe e etnia. É uma forma de existência/resistência, “um modo de vida e uma reação à segregação”, segundo Carlos Palombini. Vai muito além de um final de semana no baile, dançando e se divertindo com os amigos. As expressões artísticas periféricas misturam entretenimento com denúncia e empoderamento do povo negro e pobre, realocando esses sujeitos como autores e produtores de cultura, não apenas consumidores. Com isso, possibilitam a construção de um contra-discurso e configuram um novo espaço de representação para o morador de periferia.

QUEM VÊ DE LONGE PODE NÃO GOSTAR NÃO ENTENDER E ATÉ CENSURAR QUEM TÁ DE PERTO DIZ QUE APENAS É CULTURA, CRENÇA, TRADIÇÃO E FÉ (CRIOLO, DIFERENÇAS)

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“O GIROFLEX PISCA E BRILHA NA PUPILA A IMAGEM OFUSCA UMA QUADRADA E UMA MACAQUINHA MIRA EM MIM COM ÓDIO E FÚRIA OS BOTA PRETA DIZ QUE ATUAM PELA MINHA SEGURANÇA TIRA O MEU ABA RETA E ME TRATAM COM IGNORÂNCIA AGRIDEM E DEPOIS PERGUNTAM AGEM COM BRUTALIDADE DESRESPEITAM MEU ESTILO, QUEREM SABER SE EU TENHO PASSAGEM NÃO EXISTE BOA TARDE, BOA NOITE OU BOM DIA SE O ESTILO É DE FAVELA ACABOU MINHA ALEGRIA POBRE DE CARRO ZERO PRA AUTORIDADE É SUSPEITO QUER SABER DE ONDE EU VENHO, PRA ONDE EU VOU, QUEM EU CONHEÇO SE EU TRABALHO, SE EU ESTUDO COMO GANHO A MINHA VIDA REVISTA MEU CARANGO, MINHA CARTEIRA, MINHA MOCHILA BATE A LANTERNA NA PUPILA ME REVISTA O CORPO INTEIRO QUEREM SABER CADÊ A DROGA QUEREM SABER SE TENHO DINHEIRO SE DIZ AUTORIDADE PODE FAZER O QUE QUER MAS AÍ EU TO LIGADO E SEI BEM COMO É QUE É” (SEGURANÇA PÚBLICA - RUSSO APR, RAPPER DE IBIRITÉ/RMBH)

Foto: Elizabeth Faustina

LÍNGUA PROPRIA Na rua, “quadrada” e “macaquinha” são expressões sinônimas para identificar armas.

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TE APRESENTO EM VERSOS - A MAIOR LUTA ARMADA NEGRA DOMINANDO A FALA E A PALAVRA POR ESSA EU SEI QUE CÊ NÃO ESPERAVA ( FEZ DE MIM ESCRAVA ) FILHA DA... EMPREGADA! QUE PROCURAVA VAGA NA ESCOLA “FRACA” QUE NÃO ERA PAGA VIM DIZER QUE VOCÊ FRAQUEJOU NO PLANO DE OPRIMIR A NEGRADA LÁ NA MINHA QUEBRADA A GENTE RIMA “FAVELADA” COM” EMPODERADA” (SEM MEDIR FALA - NÍVEA SABINO, POETA DE NOVA LIMA/RMBH)

Acervo Oficina de Imagens

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“Quando a periferia se dá conta de que as informações da mídia não são as únicas que apresentam acesso à cultura, à formação, ao entendimento sobre o mundo e sobre si mesma, começa a (re)inventar atividades culturais, como saraus e encontros de literatura”, conta o grafiteiro Vander Clementino Guedes. Nesse movimento, se o discurso hegemônico coloca a periferia como um espaço de violência, o contra-discurso positiva e valoriza esse lugar. É aí que a arte local emerge. O que essas populações materializam em expressões culturais artísticas é a dimensão simbólica da qual lançam mão para construir suas próprias identidades. No rap, funk, hip-hop, grafite, pixo ou slam, falam de si, de suas realidades, e expressam aquilo que lhes concerne; constituem-se sujeitos a partir dessas produções. Juarez Dayrell, cientista social e professor da Faculdade de Educação da UFMG que se dedica ao estudo das juventudes e culturas juvenis, elucida: “Eles têm um produto através do qual se veem e isso interfere muito no processo de produção de identidades. Eu posso ser um lixeiro durante o dia, mas de noite eu sou um cantor de rap. Se de dia eu estou numa profissão socialmente desqualificada, de noite eu estou no palco, mandando minha música. Isso faz com que eu crie possibilidades de me afirmar numa sociedade que tende o tempo todo a me desqualificar. Então, as expressões culturais, sejam elas as mais variadas, tornam-se uma forma de reconhecimento. Isso possibilita ampliar a dimensão humana, de desenvolvimento de potencialidades, de pertencimento. E, em muitos casos, de ampliação da compreensão de si mesmo e do mundo”. A arte e a cultura, portanto, têm importância central na vida desses jovens de periferia e colaboram de modo edificante para o seu processo de construção social, contribuindo significativamente para a produção de subjetividades mais positivas.


NÃO VA MOS ES QUE CER POR TATIANA MEIRELES

e gritaram “direitos humanos para humanos direitos” se deixar, segue esse pensamento até matarem a favela inteira já que a única mão que nos foi estendida segurava uma arma carregada de ódio, descaso e balas. e sugeriram “redução como solução” solução para quem nunca pensou em solucionar com educação e gritaram “aborto é crime” legalizar? “nem por cima do meu cadáver” já foi dito quantos ainda vamos precisar? e sugeriram discurso de ódio “é minha opinião” no dia em que um cuspe de basta foi mais criticado do que a homenagem a um torturador de 64 e gritaram “isso é uma aberração, deus não fez isso” negaram seu nome sua história, seus sonhos, sua vida assim como jesus foi crucificado... mas todos os dias exploraram, privaram, violaram exploraram sua inocência privaram de sua infância violaram seus direitos trabalho liberta? não uma criança não vamos esquecer estará em nossos versos em forma de protesto vou falar das que foram arrastadas: claudias dos que sumiram: amarildos das que foram espancadas: luanas dos que foram fuzilados: roberto, wesley, wilton, cleiton, carlos eduardo dos que não foram lembrados dos que foram silenciados das vidas perdidas. desfeitas. ignoradas que se tornaram estatísticas

não vamos esquecer os descasos, o ódio, as balas Criação: Pabline Felix e Ronei Sampaio

Revista Rolimã • Julho de 2016 | 41


CANTOU O BONDE

Um olhar sobre o sistema socioeducativo a partir do relato de um jovem autor de ato infracional e o seu cumprimento de medida em semiliberdade POR MARCUS VINÍCIUS Cantou o bonde [transferência para unidade socioeducativa de semiliberdade]. Alívio por causa dos meus 60 dias atrás das grades [período em que esteve na internação provisória]. Fiquei muito pensativo no futuro, para não continuar no mesmo ato. Só não esquecia nenhum instante da minha família que estava lá fora! Dormir em uma cama normal: alívio. Uma televisão, que traz aconchego. A semiliberdade tem várias opções pra você cumprir sua medida sem problema. Pode ajudar em muitas coisas, tipo escolaridade e cursos profissionalizantes. Atividades internas e externas, além da obrigação do regimento escolar [obrigatoriedade de frequentar a escola]. Também temos que ter higiene e manter a casa limpa. Cada um tem seu copo com seu número, cada um tem sua cama, toalha, colchão, travesseiro, tudo numerado. Tem normas de convivência – hora de acordar, tomar café, almoçar, jantar e dormir, de acordo com as regras. Lá você tem horário pra escola, pra sair, hora pra tudo. Aí muitas vezes você pensa: ‘poxa, podia estar ali na rua ou na casa de algum parente meu, só que eu tenho obrigação de ficar aqui pagando o meu erro’. Não pode se deixar levar por essas coisas da cabeça, senão não consegue ter uma boa expectativa de ir embora de lá um dia com um novo futuro pela frente, fazendo coisas diferentes e aproveitando o máximo possível. É uma sensação horrível [voltar pro mesmo lugar, em privação de liberdade], mas você vai acostumando. Aí que batem várias reflexões na vida: mãe e pai decepcionados e eu tenho que continuar porque quero mudar. Tem que ter muita força de vontade. Não são muitos, só os que querem parar. Muda o dia a dia da gente, nossa trajetória. Bom não é, porque ninguém quer ser obrigado a seguir regras e leis, ainda mais na adolescência. Mas é questão de se adaptar. Se o jovem puder perceber, talvez possa mudar a trajetória de vida dele enquanto há tempo. O socioeducativo é para jovens, que estão começando ainda a vida, que podem se empregar no mercado de trabalho. Tem mil e uma oportunidades. O socioeducativo não é aquilo de ‘ah, eu tô preso na cadeia’, não é isso. Lá as pessoas estão pra ajudar. E eu sei que eu não vou ficar lá a vida toda, mas, durante o tempo em que eu estiver lá, tenho certeza que eu vou aproveitar bastante, fazer muitas coisas boas. O que eu mais sinto falta é da namorada. Lá todo dia dormem seis homens num quarto, soltando gases. Ninguém quer. Bom é estar no seu quarto, feliz, escutando uma música, vendo uma tevê. Mas, tirando isso, dá pra ter um convívio legal. O que mais toca mesmo é a família. Quando a gente tá tranquilo, não vem esse pensamento. Depois que a gente tá longe, bate essa saudade, batem uns arrependimentos. Eu me sinto bem estando lá no socioeducativo. Lá dá novas melhorias pra minha vida, novas oportunidades, como cursos, emprego, escolaridade, diversão, alimentação. Abre várias portas, que eu sozinho não conseguia ter, não tinha vontade de correr atrás. Lá tem pessoas que se preocupam com o bem-estar da gente e o futuro, fazem planos pra gente se envolver na sociedade.

Fotos: Acervo Oficina de Imagens

42 | Revista Rolimã • Julho de 2016




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