ACHTUNG: não contém cultura, 1971 Porto Alegre

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Cadernos do Olhar #32 Claudio Ferlauto

o final dos anos 1960 e na década de 1970, Porto Alegre tinha uma vida cultural underground bastante ativa. Regina Silveira e Julio Plaza, recém retornados da Universidade de Mayaguez, em Porto Rico, agitavam os jovens artistas gaúchos com performances e workshops, aos quais se juntou o pessoal da Faculdade de Arquitetura, que já atuava na cidade. A informação nova, apesar da ditadura militar, circulava com facilidade: Décio Pignatari trouxe a Porto Alegre Umberto Eco, a teoria da informação, a cibernética e outros conhecimentos nomeados por palavras difíceis que sequer sabíamos pronunciar. Íamos montando um quebra-cabeça em nossas mentes, não por contestações passivas, mas por meio da aplicação dessas ideias nos projetos acadêmicos. Até que de repente


Em Belem Novo, Porto Alegre, RS: Gallina, Zé Mauro ,Flávio e Ferlauto.

Participaram do Achtung, de 1971 a 1973: Cristina Burger, Nilo Soares, Flávio Pajehu Pons, Luiz Paulo Gallina e Claudio Ferlauto, na equipe inicial; mais Betty Wiener, Shirley Blauth, Carminha Machado, Gerson Scherer, Evandro Schebela e José Mauro Netto.

Cadernos do Olhar#32 Inverno 2019 Editor Claudio Ferlauto Tipografia: EHU Sans e Bodoni Contato clauf4455@gmail.com Outras publicações disponíveis em ISSUU.com/olhargrafico


sacamos que, na faculdade, estávamos sendo enganados por uma estrutura totalmente mecânica e, pior, baseada nas verdades únicas da Bauhaus. O currículo era uma linha reta sem atalhos ou alternativas. Daí para brigar por uma reforma curricular foi um tapa e essa luta contra a farsa do ensino entusiasmou muita gente. O terremoto provocado pelos protestos na Faculdade de Arquitetura consolidou grupos dedicados a ações culturais. Três se destacaram nesse cenário: o Urubu Roxo, o Nervo Ótico e o Achtung, não contém cultura, responsáveis por diversos agitos na cidade, que incluíam a construção de geodésicas, publicações alternativas, intervenções na paisagem urbana e a realização de um «nãocongresso» de arquitetura em Fagundes Varela, no interior do Rio Grande do Sul. Na revista Aplauso, em 1998, Paula Ramos e Eduardo Nasi assinalaram: Centro de produção artística e cultural universitária do período, a Faculdade de Arquitetura da UFRGS fervilhava. Ainda em 1967, os estudantes criaram o Arquisamba, […] Em 1968, foi a vez do I Festival Universitário da Música Popular Brasileira e do protesto Nosso Ensino é uma Farsa, que fechou o prédio [e o curso] de arquitetura para balanço. Nessa ocasião sabíamos por que efaziamos tudo aquilo. Estávamos por dentro das manifestações que aconteciam no mundo e queríamos mudar as coisas também em Porto Alegre. Era uma postura cultural transgressiva. Naqueles anos, todos achavam que poderiam mudar o mundo, ­—menos John Cage: Não tente mudar o mundo, você pode piorá-lo—, dizia, ou diziam que ele dizia. Naquele tempo, não imaginávamos alguma mudança —nem vamos falar em revolução— que não começasse dentro de nós. Era uma época em que muitos transgrediam, agrediam e se divertiam: fazíamos política nos diretórios acadêmicos criando campanhas com programação visual inovadora e surpreendente; criamos o cenário do ballet 2001 de Marina Fedossejeva projetando no cenário um filme da NASA; montamos shows de rock com o Liverpool Sound & Sons cantando em inglês a música de José Mendes, Para Pedro/Stop Peter, sucesso desse eventual rival do Teixeirinha; criamos e produzimos o que talvez tenha sido um dos primeiros espetáculos multimídia no Rio Grande: Alice na TV, com ideias de Antonio Aiello, do Signovo e de Isaac Alster, do Clube Social Israelita. Detonamos um happening no VIII Congresso Brasileiro de Arquitetos, com a farsa IABatman: Cada um dos convidados fez a apresentação de sua posição pessoal sobre o assunto, sendo que o arquiteto Claudio Ferlauto fez uma projeção de filmes e slides com som contendo questões sobre a atuação do arquiteto e sua função social. Críticas apareceram ao profissional arquiteto e ao próprio IAB. Ao final, não houve maiores debates. (Folha da Tarde, 15 de outubro de 1969).

Claudio Ferlauto, no livro PatoMacho #16 Quinze semanas que abalaram a Província.


Agosto 1971 Escondendo o jogo, ou Achtung: não contém cultura. Formato 20x15 cm. Serigrafia sobre cartolina, 140 cópias, em folhas soltas, envelopadas em papel kraft.



Publicado por Julio Plaza na Universidade de Mayaguez, em Porto Rico, em 1973. Cristina Burger, Nilo Soares, Flรกvio Pajehu Pons, Luiz Paulo Gallina e Claudio Ferlauto.




Setembro 1971 Garopaba, folha de jornal formato standard. Serigrafia sobre papel kraft, 200 cรณpias, dobrado e envelopado. Cristina Burger, Nilo Soares, Flรกvio Pajehu Pons, Luiz P Gallina e Claudio Ferlauto.



1972 Quando eu vi de longe parecia um guarda-sol gigante da CocaCola Formato 32x32 cm/de um album de vinil Capa e quatro lâminas soltas no miolo. Serigrafia sobre papel offset, 100 cópias, envelopado em plástico transparente. Betty Wiener, Carminha Machado, Nilo Soares, Evandro Schebela, Claudio Ferlauto, Luiz P Gallina, José Mauro Netto, Gerson Scherer.


Em Torres, RS: Gerson Scherer , Carminha Machado, JosĂŠ Mauro Netto, Evandro Schebela (encoberto), Betty Wiener, Luiz P Gallina, Claudio Ferlauto.


Cadernos do Olhar #32 Claudio Ferlauto

o final dos anos 1960 e na década de 1970, Porto Alegre tinha uma vida cultural underground bastante ativa. Regina Silveira e Julio Plaza, recém retornados da Universidade de Mayaguez, em Porto Rico, agitavam os jovens artistas gaúchos com performances e workshops, aos quais se juntou o pessoal da Faculdade de Arquitetura, que já atuava na cidade. A informação nova, apesar da ditadura militar, circulava com facilidade: Décio Pignatari trouxe a Porto Alegre Umberto Eco, a teoria da informação, a cibernética e outros conhecimentos nomeados por palavras difíceis que sequer sabíamos pronunciar. Íamos montando um quebra-cabeça em nossas mentes, não por contestações passivas, mas por meio da aplicação dessas ideias nos projetos acadêmicos. Até que de repente


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