Album 7:40 – Breve a ilusão que perdemos será realidade

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Album 7:40

Breve a ilusรฃo que perdemos serรก realidade Claudio Ferlauto


Design e edição de Claudio Ferlauto. Textos Susan Sontag, Miguel Gustavo, Décio Pignatari, Oscar Niemeyer, Sándor Marái 26 julho 2020 contatos clauf4455@gmail.com

Cadernos do Olhar ¶ Quarentena 2020

Foto Ilme Ferlauto, 1934

Cadernos do Olhar ¶ Quarentena 2020


The medium is the massage O meio é a massagem O meio é a mensagem ou na versão mais ambígua The medium is the mass age Marshal McLuhan A extensão de qualquer dos sentidos altera a maneira como pensamos e agimos — a maneira como percebemos o mundo. Quando estas relações mudam, os homens mudam.” Esta mudança é um processo contínuo, tudo muda a cada instante. Por isso os estudantes se sentem desconfortáveis na sala de aula, os adultos, diante dos processos digitais, e os jovens ficam perplexos diante do imenso volume de informações — pois informação atrita com informação…— que precisam decifrar para responder a questão “quando a máquina aprender a fazer o seu trabalho, o que você vai fazer?”


Susan Sontag, Sobre fotografia.

Cadernos do Olhar ¶ Quarentena 2020

Em época recente, a fotografia tornou-se um passatempo quase tão difundido quanto o sexo e a dança — o que significa que como toda forma de arte de massa, a fotografia não é praticada pela maioria das pessoas como arte. É sobretudo um rito social, uma proteção contra a ansiedade e um instrumento de poder. ¶ Comemorar as conquistas de indivíduos tidos como membros da família é o uso popular mais antigo da fotografia. Durante pelo menos um século a foto de casamento foi uma parte da cerimônia tanto quanto as fórmulas verbais prescritas. ¶ A maioria das casas [na França] tem uma câmara, mas as casas em que há crianças tem uma probabilidade duas vezes maior de ter pelo menos uma câmara, em comparação com as casas sem crianças. Não tirar fotos dos filhos, sobretudo quando pequenos, é sinal de indiferença paterna, assim como não comparecer à foto de formatura é um gesto de rebeldia juvenil.


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Oscar Niemeyer, Minha experiência em Brasília.



O texto: ‘Preciso ver você’/Interpretação “Vamos analisá-lo? Antes de mais nada, admiro a força da concisão. Nessa ordem, que seria possível gravar sobre mármore, não há uma única palavra desnecessária. Ela principia com o verbo, como as grandes frases em geral se iniciam, principalmente nos dramas e tragédias em versos, como a ação entrasse em cena no palco. ‘Ver você’, ela escreve, e essas palavras têm sentimentos quase sensuais. É um verbo ancestral, tem a mesma idade do homem, é a fonte de todas as vivências humanas, pois é com a visão que o homem principia, dado que até então, em sua fase cega, é um pacote de carne gemente, é com a visão que tem inicio o mundo, e, naturalmente, o amor. É um verbo mágico, tudo cabe nele, o desejo, o segredo ardente, o sentido secreto da vida, porque o mundo só existe até o ponto em que o vemos, e também você só existe, no espírito da carta, no tanto que ela o vê. Com a visão você volta a ela neste mundo, do cego submundo, onde de fato você estava, mas apenas como as sombras, as lembranças e os mortos. Portanto, antes de mais nada ela quer ver você; a percepção, o toque, o cheiro, a audição e o paladar são todos cegos sem a visão secreta do archote. […] Por isso ela começou a carta com esta palavra: ver. O que mais poderia dizer? Poderia ter escrito “falar” ou “estar junto”, mas tudo isso são consequências da visão, e esse verbo confirma como é forte o desejo, aquele que colocou uma pena na mão, esse verbo quase grita porque o coração apaixonado sente que não aguenta mais a escura cegueira, precisa ver o rosto do amado, precisa ver, isto é, necessita que se faça luz no mundo cego e imcompreensível, porque ao contrário nada mais faz sentido. Foi esse o motivo porque ela escolheu, exatamente e de modo expressivo, a palavra ‘ver’. […] Portanto ver, antes de mais nada. Em seguida “preciso”. E não “gostaria”, e não “desejo”, e não “quero”. […] Poderia ter escrito apenas “quero”, o que também seria digno de um rei, porém un pouco arrogante. […] “Preciso”, portanto quem pede esse encontro tem necessidade, já não pode fazer de outro modo, não suporta mais esperar, dirige-se a você com rigor, mas também lhe informa alguma coisa. […] E em seguida […] a palavra ‘você’. Grande palavra. Não sei, pode alguém dizer algo maior e mais significativo a uma pessoa?” Sándor Márai, Jogo de cena em Bolzano.



Cadernos do Olhar Âś Quarentena 2020

A morte anunciada da poesia concreta, parte 1


Décio Pignatari ¶ Folha de S.Paulo, outubro, 1994. O cubismo morreu. Viva o cubismo! ¶ Dada não é dadaísmo, poesia não é concretismo. ¶ Morreu Mondrian. Viva Mondrian. ¶ O Picasso de 1948 não é o mesmo de 1908, mas aquele não poderia ser sem este. ¶ O figurativismo voltou. Viva o figurativismo. ¶ Picasso e Mondrian jamais foram obstáculo à qualidade de um Klee ou de um Pollock. O rigorismo dodecafônico e serial não “limou” a obra de um Stravinsky, um Messian, um Scelsi, um Cage. ¶ Eisenstein não “corta” Chaplin, Welles não anula o Fellini de A estrada da vida ou Amarcord. Kubrrick não exclui Altman. ¶ Vanguarda responde como vanguarda, até que o fluxo inseminador impregne o mainstream sanguíneo do corpo cultural, distribuindo-se por inúmeras veias e artérias. Aconteceu com os modernistas, com João Cabral de Melo Neto, com Guimarães Rosa (a poesia concreta e o Grande Sertão nasceram juntos, 1956) e —agora— começa a acontecer com ela. ¶ Uma poesia que só começou a ter edições comerciais 20 anos depois de seu lançamento, uma poesia que mereceu duas páginas do The Times Literary Supplement, de Londres há exatos 30 anos —e vem merecendo, há 40 anos, um ódio vitriólico por parte de todos quantos nada inventaram, nem mestres foram de nenhum sistema de signos artísticos, especialmente nos acadêmicos departamentos de letras. ¶ A poesia concreta foi a perestroika poética brasileira. Os patrulheiros arrivistas nivelaram a cultura por baixo. Por exemplo, traduziam Maiakovyski diretamente… do castelhano. As primeiras traduções do russo (elogiadas por Jakobson) foram obra dos irmãos Campos e de Boris Schnaidermann —e não de qualquer bolha, rolha ou trolha do partidão ou do lúmpen cultural brasileiro. ¶ Eu estava ausente [do Brasil] quando teve início a polêmica provocada por um suspeitíssimo ataque do poeta Bruno Tolentino a Augusto de Campos, a propósito de uma tradução deste, e por este respondida com desprezo e ira (mais do que justificados). ¶ Mas acompanhei os desdobramentos. ¶ Continua, um dia qualquer da quarentena.


Cadernos do Olhar ¶ Quarentena 2020

The medium is the mass age Depois de 51 anos sai no Brasil a obra emblemática de Marshall McLuhan e Quentin Fiore. Mesmo cinquentona se mostra quase atualizada, tendo em vista que foi escrita muito antes da existência da Web e de outras redes contemporâneas, mas com um pouco de imaginação pode-se substituir as referências à TV, por internet ou por www que a obra se atualiza automáticamente, como esses terríveis corretores de digitação presentes em nossos equipamentos. No trecho a seguir substitua “xerografia” por “sampler” e o sentido cai de maduro nas práticas usuais da internet: “A xerografia/o sampler — captura da inteligência de qualquer homem — prenuncia o tempo da publicação instantânea [na Web]. Hoje qualquer um pode se converter em autor e, ao mesmo tempo, editor. Basta pegar livros [imagens, sons, videos] quaisquer sobre qualquer assunto e produzir sua própria obra sob medida (on demand) simplesmente xerocando/sampleando um capítulo/ parte deste, uma parte daquele — um roubo instantâneo. A parte mais interessante onde o autor trata dos ambientes culturais e tecnológicos, que dominam o dia a dia, desde as crianças até os adultos mais vividos: o mundo virtual, instantâneo e global. Claudio Ferlauto


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