Album 8:40 – Uma inexplicável vontade de poder
sentir isto doutra 
maneira…

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Claudio Ferlauto

UMA INEXPLICÁVEL VONTADE DE PODER SENTIR ISTO DOUTRA MANEIRA: UMA SAUDADE A QUALQUER COISA Album 8:40 da quarentena 2020


Cadernos do Olhar ¶ Quarentena 2020

Album 8:40 Edição e desenhos Claudio Ferlauto clauf4455@g,ail.com • issuu.com/olhargrafico


UMA INEXPLICÁVEL VONTADE DE PODER SENTIR ISTO DOUTRA MANEIRA: UMA SAUDADE A QUALQUER COISA

Álvaro de Campos



«Não vai durar muito. Seria idiota. E sem dúvida uma guerra \é uma tolice, o que não a impede de durar. A tolice insiste sempre, e compreendê-la-íamos se não pensássemos sempre em nós. Nossos concidadãos, a esse respeito, eram como todo mundo: pensavam em si próprios. Em outras palavras, eram humanistas: não acreditavam nos flagelos. O flagelo não está à altura do homem; diz-se então que o flagelo é irreal, que é um sonho mau que vai passar. Mas nem sempre ele passa, e de sonho mau em sonho mau, são os homens que passam e os humanistas em primeiro lugar, pois não tomaram as suas precauções. Nossos concidadãos não eram mais culpados que os outros. Apenas se esqueciam de ser modestos e pensavam que tudo ainda era possível para eles, o que pressupunha que os flagelos eram impossíveis. Continuavam a fazer negócios, preparavam viagens e tinham opiniões. Como poderiam ter pensado na peste que suprime o futuro os deslocamentos e as discussões? Julgavam-se livres, e jamais alguém será livre enquanto houver flagelos.» A Peste, Marcel Camus, 1947.


Viatges i flors Mercè Rodoreda 1980–1984

Cadernos do Olhar ¶ Quarentena 2020

«Escolta, vianant, en aquest poble, els nois, així que neixen, no paren. Al primer dia ja s’aguanten drets i al tercer corren d’una banda a l’altra arrencant herbetes, apilotant fulles seques, ficant’les en sacs. Tots, sempre, neixen a la tardor. A cinc anys van al bosc a tallar arbres i arrosseguen les soques fins a la vora del poble ajudats pels nois més grandes.»


O Leopardo, Lampedusa, 1956

São coisas que, sabe-se lá bem por quê, não se confessam; deixam-se que sejam os outros a intuí-las, mas que ninguém, à sua volta, as intuíra: nenhuma das filhas que sonhavam com um além-túmulo idêntico a esta vida, repleto de tudo, de magistrados, cozinheiros e conventos; nem Stella, que, apesar de devorada pela gangrena do diabetes, se aferrava mesquinhamente a esta vida de padecimentos. Talvez apenas Tancredi o tivesse compreendido, por um momento, quando lhe dissera com a sua ironia esquiva: «Tu, meu tio, cortejas a morte». Agora a corte chegara ao fim: a bela tinha dado o «sim», a fuga estava decidida, o compartimento do trem reservado.


Cadernos do Olhar Âś Quarentena 2020


Vaig tornar a travessar el riu per sota perquè l’abella em seguia i l’hauria matada si hagués pogut. La volia deixar sola i perduda amb les roses de gos plenes d’aranyes que l’esperaven. A l’altra banda del riu vaig deixar la pudor de fulla menjada d’eruga e vaig trobar l’olor de les glicines e la pudor dels fems. La mort i la primavera. I vaig caure estirat a terra, damunt dels palets, amb el cor buit de sang i les mans gelades. Perquè jo tenia catorze anys i l’home que s’havia ficat a l’arbre per morir, era el meu padre. La mort i la primavera, Mercè Rodoreda, 1986


Texto fundador da língua italiana, súmula da cosmovisão de toda uma época, monumento poético de rigor e beleza, obra magna da literatura universal. É fato que a "Comédia" merece esses e muitos outros adjetivos de louvor, incluindo o "divina" que Boccaccio lhe deu já no século XIV. Mas também é certo que, como bom clássico, este livro reserva a cada novo leitor a prazerosa surpresa de renascer revigorado, como vem fazendo de geração em geração há quase setecentos anos. A longa jornada dantesca através do Inferno, Purgatório e Paraíso é aqui oferecida na íntegra— com seus mais de 14 mil decassílabos divididos em cem cantos e três partes — na rigorosa tradução de Italo Eugenio Mauro, vencedora do Prêmio Jabuti e celebrada por sua fidelidade à métrica e à rima originais. A edição traz ainda, como prefácio, um inspirado ensaio de Otto Maria Carpeaux. Blog editora 34

Cadernos do Olhar ¶ Quarentena 2020

A Divina Comédia Dante Alghieri



O toldo vermelho de Bolonha John Berger, 2007 em ‘Serrote’ #31

Cadernos do Olhar ¶ Quarentena 2020

Dizer qualquer uma dessas coisas teria sido uma impertinência, de modo que me limitei a insistir várias vezes para que visse as pinturas de Morandi quando fosse a Bolonha. — Esse Morandi é um sujeito muito quieto, disse meu tio ao voltar. — Como assim? Ele está morto. Morreu no ano passado. — Eu sei. Só vi seus quadros de vasos e conchas e flores. Muito minuciosos e muito quietos. Também podia ser arquiteto, não acha? — Arquiteto, claro. Ou alfaiate! — Alfaiate, claro. Gostou da cidade? — É vermelha, nunca vi um vermelho como o de Bolonha. Ah se nós soubéssemos o segredo daquele vermelho…


Camilo Mortágua, 1980 No romance, Josué Guimarães nos dá um painel inédito de sua ficção, contando a decadência de uma família de pecuaristas da fronteira gaúcha, com todas as suas misérias e grandezas. A história de Camilo Mortágua reproduz, de certa forma, o drama de dezenas de famílias gaúchas que, baseando seus rendimentos na exploração de rebanhos na fronteira, levaram suas vidas luxuosas na capital do Estado, num fausto que fez época e que, com o passar do tempo, terminou por arruiná-las.


Cadernos do Olhar Âś Quarentena 2020


Felícia A mucama é negra, magra, frágil. Toda de branco – com a saia de roda, a bata folgada e um pano enrolado na cabeça –, ela tremula entre as roupas lavadas postas a secar no varal sob o qual como que flutua com seus pés de sola cor-de-rosa. Leva um grande cesto de vime enfiado no braço esquerdo; escolhe e recolhe com a mão direita uma a uma as peças secas, depois de verificar-lhes a umidade no breve e carinhoso festo de fazê-las resvalar suavemente pela face. Enche de roupa o cesto, atravessa o pátio por baixo da parreira, e entra em casa pela latada das glicínias.

Os limites do impossível – Contos Gardelianos Aldyr Garcia Schlee, 2009


Claudio Ferlauto por Waldemar Zaidler Fissurado colecionista, Claudio Ferlauto está sempre, pelo uso que fazdas coisas que guarda, a renovar seu espírito e o espírito das próprias wcoisas. Pragmatista, diverte-se resignificando seus brinquedos; generoso, compartilha as invenções destiladas nessas brincadeiras.Ferlauto é sujeito de seus objetos, e seus livros são objetos diretíssimos. De uns tempos para cá, viciou-se em desenhá-los: uma nova lida com sua relida biblioteca. Essa atividade, ao que parece, tem como pano de fundo o relativismo com que ele percebe a obsolescência das coisas e dos meios. “Plaqueta de argila, rolo de papiro, pergaminho, códice, livro, e-book, nuvem... ou fumaça? o importante é a leitura”.

Album 8:40


Claudio Ferlauto

UMA INEXPLICÁVEL VONTADE DE PODER SENTIR ISTO DOUTRA MANEIRA: UMA SAUDADE A QUALQUER COISA Album 8:40 da quarentena 2020


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