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O surgimento do novo sindicalismo

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negociação

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Iniciamos recentemente um trabalho, que denominamos Diagnóstico Sindical, o qual consiste no estudo, através de pesquisas, entrevistas e sem inários com dirigentes sindicais combativos, das causas que têm impedido a democratização dos sindicatos e o avanço da organização por local de trabalho, e na discussão sobre as possibilidades de reverter este quadro. Hoje, este tema está sendo também assumido pela CUT-RS, que, através de suas Secretarias de Formação e Política Sindical, começa a discutir o assunto.

As observações a seguir, de caráter mais geral, contêm algumas idéias -já enriquecidas por contribuições de sindicalistas - que estão servindo de ponto de partida para um estudo mais espec ffico do sindicalismo gaúcho. Entendemos que, mesmo considerando sua provisoriedade e sua característica de apenas levantar problemas, sem a preocupação de desenvolver as questões colocadas, sua publicação neste momento é importante para estimular um debate necessário para o movimento sindical a nível nacional, que acreditamos estar passando por dificuldades semelhantes.

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As greves que paralisaram as grandes montadoras de São Bernardo em maio de 1978, ao mesmo tempo em que anunciavam a volta do movimento operário à condição de protagonista da nossa história, esclareceram que algo havia definitivamente mudado no sindicalismo brasileiro. Com efeito, já não sobrava lugar para o sindicalismo de tipo populista que reinou no período pré-64.

O Brasil era outro. O processo de industrialização e urbanização, que adquirira maior força durante o Governo JK, teve um avanço sem precedentes durante o regime militar instaurado em 1964. Em vinte anos (1960 a 1980), a população urbana cresceu de 31 para 80 milhões de habitantes, enquanto no campo ela permanecia na casa dos 38 milhões. Neste mesmo período, os trabalhadores na indústria da transformação passaram de 2 para 7 milhões, num incremento de 255%.4 Nos anos do milagre, o Produto Interno Bruto cresceu a taxas nunca antes vistas, alçando o Brasil à condição de oitava economia do mundo capitalista. 5 Esta rápida industrialização, com grande investimento nos setores de ponta, forjou uma nova classe operária, cuja vanguarda se concentrou nos setores mais modernos da economia, diminuindo o peso de setores tradicionais, como têxteis e alimentação, e fazendo sair de cena categorias antes tão importantes, como os estivadores e ferroviários.

Assim, o sindicalismo populista, que se constru fra à sombra do Estado, preso à estrutura sindical corporativa, com caracter fsticas ideológicas claras de subordinação ao projeto hegemônico do nacional-desenvolvimentism o e que mantinha uma relação de manipulação com a base, já não tinha razão para existir. Ele, que já estava em crise antes de 64 - veja-se a perda de controle do PTB sobre os sindicatos - sucumbiu após o golpe, alijado dos sindicatos pelas intervenções da ditadura e inviabilizado por uma nova situação histórica , que conjugava, IJO plano estrutural, um grande desenvolvimento industrial, formador de uma moderna classe operária, e, no plano pol ftico, a emerÇJência deprojetas que rompiam com a tradicional prática de colaboração de classes.

Por outro lado, se o quadro pós-64 era de derrota, com o sindicalismo imerso no peleguismo e sem lutas operárias significativas - com exceção das notáveis greves de Contagem e Osasco, elas próprias já bem diferentes das manifestações comandadas pelo sindicalismo populista - sob a superfície as coisas não estavam paradas. Com a açio sindical inviabilizada pelas intervenções da dita· dura, a organização e resistência dos trabalhadores foram se gestando no interior das fábricas, com a constituição de grupos e comissões clandestinos e a ocorrência de movimentos e greves. Se o móvel de suas ações era normalmente a luta por reivindicações salariais, no plano organizativo estes movimen· tos deram origem a Contagem, Osasco e, mesmo nos anos mais negros da ditadura, às oposições sindicais, como a dos metalúrgicos de São Paulo.6

Foi esta caracter fstica de resistência baseada na organização no interior das fábricas, mais forte nos setores de ponta de São Paulo, que deu uma

4 Dados retirados do AnuArio Estatlstico do Brasil, F IBGE, 1986. S Entre 1968 e 1980, o PlD cresceu a uma média de 8, 7% ao ano, o que significou vermos nossa economia triplicada em apenas 13 anos. Para melhor conhecer a evoluçá'o do Brasil nesse perfodo, ver Wanderley Guilherme dos Santos, "A Póa-Revoluçfo Brasileira", em Brasil, Sociedade

Democlitica, Hélio Jaguaribe et alii, José Olympio, Rio de Janeiro, 1986. 6 Para uma descrição do "movimento operário-sindical após o golpe de 1964", ver capftulo com este tftulo em Silvia Maria Manfredi, "Educaçfo

Sindical: Entre o Coliformismo e a Crftica", Edições Loyola, São Paulo, 1986. Um quadro deste perfodo, estendendo-se até meados dos anos 80, está presente também em Margaret E. Keck, "O 'Novo Sindicalismo' na Transição Brasileira", em Democratizando o Brasil, Alfred Stepan org., Paz e

Terra, Rio de Janeiro, 1988.

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