editorial de abertura
agricultura: uma visão de longo prazo ou por que não podemos continuar a mamar nas tetas generosas (sic) do governo...? Até há pouquíssimas gerações, a luta pelo comer foi o principal foco da atividade humana. A procura por segurança alimentar presidiu inconteste a história do Homo sapiens. Muitos de nós não nos damos conta da proximidade – catastrófica para a nossa espécie – em que esse combate esteve por se perder, e desgraçada e efetivamente perdido foi para muitos povos e culturas. Hoje, a abundância relativa faz com que a hipótese de que todos terão algo para comer esteja conscientemente incorporada ao ritmo de nossas vidas. Claro que isso é uma simplificação da realidade: problemas vergonhosos continuam a existir. A subnutrição, prima pobre da fome, atinge, pelo menos, 2 bilhões dos mais de 7,3 bilhões de habitantes da Terra hoje. Mas não por falta de produção e, sim, por entraves em sua distribuição. De qualquer forma, um olhar para o futuro não tão distante – 2050, horizonte razoável para qualquer visão estratégica – mostra-nos com pouco menos de 10 bilhões de pessoas, com crescimento concentrado na África e no sudeste asiático. Relevante é saber que se estima um acréscimo de demanda por comida, fibras naturais e bioenergia de 70%, em pouco mais de uma geração. Seremos capazes de produzir tanto? O economista inglês Thomas Malthus (17661834) dizia que não. É dele a proposição de que o crescimento populacional iria ultrapassar a oferta de alimentos. Um avançava a taxas geométricas; outra, a taxas aritméticas. Não poderia haver cenário mais trágico.
Mas, evidentemente, ele não previu a ocupação econômica das pradarias norte-americanas ou a conquista do cerrado brasileiro, que ampliaram, de maneira extraordinária, a oferta global de comida. Nem imaginou, por igual, a revolução verde. Sabemos que os obstáculos para a ampliação da oferta foram e estão sendo superados pela adoção de políticas públicas sensatas (em especial investimentos em infraestrutura) e pela aplicação e pela disseminação de tecnologia. Tudo o que se disser sobre a importância da contribuição tecnológica para a superação dos obstáculos malthusiânicos é pouco. Desde o enunciado das Leis de Mendel, à seleção e ao melhoramento genético, aos equipamentos e instrumentos agrícolas, aos fertilizantes, defensivos, herbicidas e corretivos, à fantástica engenhosidade daqueles que revolucionaram os modos de gestão e de produção e nos trouxeram até aqui, tudo isso enterrou as profecias de Malthus. Mas, ainda assim, e apesar da incrível revolução nos campos, a verdade é que não faltam argumentos, hoje, aos neomalthusianos, ao apontar problemas relevantes. Há estagnação relativa no crescimento da produtividade de commodities essenciais, como arroz e trigo. Há quase plena ocupação das terras cultiváveis. Há legítimas preocupações quanto à disponibilidade de água. Há o fantasma real das consequências perniciosas à produção agrícola das mudanças climáticas. Há a influência maléfica de políticas equivocadas. Em outras palavras, há preocupações sérias quanto ao aumento necessário da oferta alimentar. Nem tudo são flores. Temos enfrentado problemas importantes aqui no Brasil. Vejamos a cultura da cana-de-açúcar. Objeto de um dos mais acertados programas estratégicos governamentais de todos os tempos, há cerca de 40 anos, o Proálcool trouxe consigo uma bateria de inovações tecnológicas que elevaram a produção do etanol de 2.000 litros por hectare, nos anos de 1970, ;
Longa é a lista de horrores. Várias as explicações, mas a generalização da colheita mecânica no Centro-Sul parece receber a maior parte da culpa. Pobre colhedeira... se ela pudesse falar, apontaria o grande culpado: o absoluto descalabro das políticas públicas em torno do etanol, que feriu tão gravemente um programa de tal envergadura. "
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