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Ricardo Monis
Jovens com deficiência
RICARDO MONIS O sociólogo que pretende criar um mundo inclusivo através da educação
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Autor e protagonista do livro ‘Ricky’, o jovem descreve-se como “uma pessoa que nasceu com características diferentes, mas que nunca se deixou ficar”
À nascença foi-lhe dada uma esperança média de vida de apenas dez anos, mas Ricardo Monis conseguiu mostrar desde cedo resiliência e força de vontade e superou todas as previsões.
O jovem de 23 anos foi diagnosticado, ainda em bebé, com Atrofi a Muscular Espinhal Tipo 2, patologia progressiva neuromuscular que provoca o enfraquecimento dos músculos e o condiciona a uma cadeira de rodas.
Foi no seu primo, Lucas Chipenda, de igual idade, que Ricardo encontrou um dos seus principais pilares e é com quem partilha aventuras e problemas. A partir da cumplicidade de ambos, e da vontade de contar as histórias vividas, surgiu o livro ‘Ricky’, obra que pretende “dar alguma representatividade às pessoas com defi ciência” e sensibilizar as crianças para esta condição.
“Na minha infância reparava que não havia muitas personagens, ou até mesmo nenhumas, em que eu me pudesse identificar com elas”, explica o jovem de Setúbal. Foi esta a principal razão que levou os primos a avançarem com o livro. “É um retrato da minha infância com o Lucas e da adaptação das nossas brincadeiras à minha condição”.
Para o jovem, “é muito importante estar junto das crianças, consciencializá-las sobre isto e deixar que perguntem o que quiserem”. “Muitas vezes, quando vêem a cadeira de rodas, acham engraçado o facto de esta andar sozinha e fazem perguntas aos pais, que fi cam atrapalhados e até dizem ‘não olhes, não interajas’”, confessa.
Este tipo de situações cria, segundo o jovem, "barreiras" nos mais novos, que, na sua visão, acabam por não ser educados a lidar com estas realidades. Por este motivo, o autor do livro lançado no início deste ano pretende visitar
DR
Com o livro ‘Ricky’, Ricardo Monis pretende “dar representatividade às pessoas com deficiência”
“o máximo de escolas e bibliotecas”. “Nós queremos ir ter directamente com estas crianças e mostrar que eu não sou assim tão diferente delas. Acho que o segredo para o mundo inclusivo está na educação”.
A obra, escrita em “encontros semanais, por partes”, contou com a “ajuda de Carlos Luís, que faz parte da direcção da Fundação Gil”. “Tenho fi sioterapia uma vez por semana em casa e ele, numa dessas visitas, acompanhou a fi sioterapeuta e achou muita piada às minhas ideias e características. Tem puxado bastante por mim”.
Mãe é “uma guerreira” e pai o pilar da família A residir em Pinhal Novo, Palmela, Ricardo conta que a recepção do diagnóstico na infância exigiu algumas mudanças por parte da família ao nível da organização. “A minha mãe tomou a decisão de deixar de trabalhar. Abdicou do mundo laboral para me dar as condições necessárias, que, basicamente, era estar comigo 24 horas por dia. Nesse sentido, ela é uma guerreira”.
Já o pai “teve de continuar a trabalhar para sustentar a família”, enquanto os dois irmãos mais velhos de Ricardo nasceram “sem qualquer tipo de patologias semelhantes”. Recentemente, o jovem começou a “tomar um xarope inovador, que tem vindo a travar o progresso da doença”. “Tomo desde Fevereiro e já noto algumas diferenças. Por exemplo, já consigo estar sentado sem apoio”.
No que toca à educação, afirma sempre ter sido “uma pessoa muito sortuda” com as pessoas com quem teve oportunidade de privar na escola. “Uma das grandes paixões que tenho é o futebol, o que é algo engraçado porque nem todos imaginam uma pessoa de cadeira de rodas a jogar à bola”.
Contudo foi, “de facto, possível porque as crianças conseguiram adaptar-se às características” do jovem ao longo do seu percurso. “Apanhei sempre as pessoas certas”, garante.
O primo, a companhia da vida de Ricardo, de quem tem apenas dez dias de diferença de idade, descreve o jovem de Setúbal como alguém “bem-humorado, bastante brincalhão e que procura estar sempre activo.” “Tem o espírito de lutador e, acima de tudo, é muito ambicioso”, revela Lucas.
Ambição leva jovem a licenciar-se em Sociologia É o espírito ambicioso que leva Ricardo a procurar sempre atingir os seus objectivos. Recentemente licenciado em Sociologia pelo ISCTE, o que acabou por se tornar “um azar feliz”, uma vez que a sua primeira opção era Psicologia, o jovem diz ter escolhido a área para poder “perceber de que forma é possível construir uma sociedade mais inclusiva”.
Apesar de ter a intenção de “continuar a estudar e tirar mestrado”, Ricardo quer agora parar “um ou dois anos para decidir o que fazer da vida”.
Ricardo Monis
à queima-roupa
Idade 23 anos Naturalidade Setúbal Residência Pinhal Novo, Palmela Área Escrita e Sociologia
Com um livro já publicado, o objectivo é continuar a escrever e “percorrer todo o país”
No que diz respeito à sua recente obra, escrita em “cerca de quatro meses, fora as ilustrações, que demoraram outros quatro meses”, a opinião tem sido “muito positiva” e as suas expectativas foram excedidas. “Conseguimos vender a primeira edição em cerca de três meses. No fi m desta edição, também tivemos a oportunidade de ir a uma escola em Almada. Estávamos com receio, por serem miúdos do 1.º ao 4.º ano, mas foi incrível. Parecíamos dois heróis, com toda a gente a gritar os nossos nomes”.
Desde o momento em que a ideia passou para o papel, o livro demorou cerca de um ano a ser escrito e colocado à venda. “Vendemos 500 exemplares na primeira edição. Na segunda, que está a ser apoiada pelo grupo Roche, colocámos mais 500 livros à venda”.
Actualmente com actividade aberta como autor, Ricardo tem como objectivo principal “percorrer o país todo”. “Queremos ir ao máximo de escolas possível. O sonho também é pôr o nosso livro lá fora”. Para tal, os primos estão já “em conversações com algumas editoras americanas”.
“Além disso, quero desenvolver a minha competência como narrador e dar palestras a empresas com tópicos como a inclusão e a motivação. Acho que facilmente posso contemplar um futuro nessa área”, assegura.
Em mente, o sociólogo tem a intenção de continuar a escrever livros e, quem sabe, até dedicar-se a algo “mais pessoal”. “Gostava de escrever algo mais direccionado para a minha condição. Uma coisa mais biográfi ca. Criei recentemente um blog para testar este meu lado e, até agora, as respostas têm sido muito positivas”.