4 minute read

Sara Cabral

Next Article
João Lopes

João Lopes

SARA CABRAL Bióloga marinha vive como um peixe na água

Água e areia, amêijoas e mexilhões. São estes tesouros que animam os dias da jovem doutoranda em Ciências do Mar e que a tornam numa protectora da biodiversidade sadina

Advertisement

Mariana Pombo (Texto) Mário Romão (Fotografi a)

“Tudo o que vem à rede é peixe”, diz-se. Mas Sara Cabral não leva à letra os provérbios portugueses. Desde pequena que trata o mar por ‘tu’ e é na água salgada que descobre as espécies consideradas vulgares ao olho comum, mas que não passam despercebidas ao olhar atento de uma bióloga marinha.

De sorriso fácil e ar ternurento, caminha ao longo da baía com a ligação que sente espelhada no corpo. Traz vestida uma camisola azul com uma embarcação representada, escolhida a dedo para a ocasião.

“Sou sedenta de conhecimento”, confessa Sara. “Desde pequena que gosto de saber o que é cada espécie, onde vive e como age. Nunca deixei morrer essa criança em mim”.

A curiosidade aliada à paixão pelo mar arrastaram-na para o mundo da investigação e actualmente trabalha como investigadora do MARE- Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, onde está também a terminar o Doutoramento em Ciências do Mar.

O seu estudo mais recente, realizado para a tese de Doutoramento, pode ajudar a compreender se as espécies bivalves nativas em Portugal, nomeadamente, amêijoas, ostras e mexilhão, estão em risco de extinção, ameaçadas por espécies exóticas, trazidas nas embarcações.

Os dias são passados entre o trabalho no laboratório e as pesquisas feitas junto da água salgada, da qual não consegue fi car muito tempo longe. “Ando sempre com um fato de banho, uma toalha e uns ‘frasquinhos’ no porta-bagagens do carro”, revela. Não vá dar-se o caso de encontrar um ser vivo digno de registo.

Setúbal, a ponte entre Sara e o mar Vive em Azeitão desde que se recorda, mas reserva a Setúbal as memó-

Apaixonada pelo mar, a jovem, de 30 anos, dedicou a tese de doutoramento aos efeitos das espécies invasoras sobre os bivalves nativos em Portugal

rias especiais do primeiro contacto com a água. Se tivesse de atribuir um responsável pela sua adição ao mar seria o pequeno barco dos pais.

“Cresci ao lado de uma das baías mais belas do mundo [Setúbal], onde costumava passear de barco com os meus pais. Praia, mar e os golfi nhos do Estuário [do Sado]. Era difícil não gostar”, admite.

Sara Cabral à queima-roupa

Idade: 30 anos Naturalidade: Lisboa Residência: Azeitão, Setúbal Área: Biologia Marinha

Uma jovem da ciência que, ao nunca se esquecer de onde vem, ambiciona aproximar a comunidade local da biodiversidade marinha.

A ligação com a região estava criada e é aqui que sonha um dia fazer parte de uma equipa de investigação com sede no Sado que aproveite o melhor que a diversidade sadina tem para oferecer.

Da sua “rede” de investigações académicas, fazem parte pesquisas levadas a cabo em países estrangeiros. Holanda, Irlanda e, mais recentemente, Canadá. Embora admita ser tentador integrar uma equipa internacional, a jovem guarda no coração a cidade berço.

“Por mim, vivia sempre em Azeitão. O melhor dos dois mundos seria ir para fora, adquirir conhecimento e, mais tarde, aplicá-lo cá”.

Uma investigadora que ‘veste a camisola’ Sara sente que nasceu para preservar a vida dos que vivem do oceano e, como tal, a admiração que sente pelo trabalho dos pescadores, “uma profi ssão altamente pesada”, é expressa através dos contributos que o seu trabalho enquanto investigadora pode dar.

“A comunidade piscatória vive o seu dia a dia na lama, de manhã, de noite, durante horas e horas. A classe política não conhece esta realidade e não consegue desenvolver medidas que cheguem até ela. Os investigadores têm o papel importante de fazer a ponte entre os dois”, sublinha.

Grande parte dos projectos que desenvolve são em parceria com pescadores e mariscadores e não se limita a “tirar apontamentos e ir embora”. Gosta de ‘colocar as mãos na massa’, mesmo que isso implique ir para alto mar de madrugada ou afundar os pés na lama, à procura de isco.

“Já fui apanhar isco no Seixal com um pescador. Fui muito giro”, conta. “Fui com ele para o meio da lama, mas tinha umas botas demasiado grandes para o meu número. Quando a bota enterrou e tive de a puxar, o meu pé veio e a bota fi cou no fundo. Se não fosse o senhor a puxar-me, tinha lá fi cado. Devo-lhe a minha vida”, brinca.

Com a proximidade que foi estabelecendo com os ‘homens do mar’, a azeitonense acredita que já é reconhecida no meio. “Calma lá que esta não é uma ‘doutora’ qualquer. Ela não tem medo de vir connosco”, habitou-se a ouvir.

Ainda que se considere uma mulher da ciência, deixar o seu nome associado a um feito grandioso não é o que a motiva. Com a simplicidade que a caracteriza afi rma que quer trabalhar para preservar a biodiversidade da sua terra, aquela que não se cansa de gabar de ser “uma das mais belas baías do mundo”.

“Quero ter um papel activo na comunidade agora”, vinca. “Quero trabalhar no Estuário onde cresci e despertar o interesse das pessoas para o que o mar nos dá”.

This article is from: