Helder finale

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PONTIFICIA UNIVERSITÀ GREGORIANA FACOLTÀ DI DIRITTO CANONICO

Dissertazione per il Dottorato

HÉLDER ALEXANDRE 156693

A FIGURA DO PENITENCIÁRIO NO DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO CANÓNICO DO SACRAMENTO DA PENITÊNCIA

Moderatore: Professor Janusz Kowal Data di consegna: 23/04/2013 Anno Accademico: 2012-2013



A figura do penitenci谩rio no desenvolvimento hist贸rico can贸nico do sacramento da penit锚ncia



INTRODUÇÃO

Habere non potest Deum patrem, qui Ecclesiam non habet matrem, escreveu S. Cipriano de Cartago, no já longínquo século III. A experiência cristã acontece numa natureza marcada pela graça e pelo pecado, na relação com Deus e com os irmãos. Por isso, a penitência e a reconciliação somente se podem entender e viver dentro desta dinâmica. Contudo, a disciplina penitencial nunca foi acolhida por todos do mesmo modo. O sacramento da penitência adapta-se ao concreto, por isso se altera repetidamente no modo de celebrar. A autoridade, ciente desta complexidade, tentou intervir sempre, corrigindo o pecado do fiel e os seus efeitos na comunidade cristã. Por isso, o ministro da penitência tem de ser estudado e enquadrado na fidelidade à Revelação e à Tradição. O estudo do ofício do cónego penitenciário constitui um desafio, não só para se aprofundar melhor o seu lugar e importância na legislação canónica, mas também para estudar a influência da Teologia, do Direito e da pastoral na sua função, como ministro do sacramento da penitência. De entre o cabido dos cónegos da Igreja Diocesana, o penitenciário mantém uma função muito particular e que vai além da própria existência deste instituto. Qual a sua necessidade numa Igreja Particular? Porquê a remissão de censuras no foro interno sacramental? Que necessidade tem a Igreja de reservar estes casos? Ainda tem sentido num sacramento em crise? Eis algumas das questões que podem suscitar interesse por parte dos fiéis, e estudiosos de um modo particular. Este trabalho propõe-se aprofundar estes temas e tentar esclarecer questões, mas sem pretender ser exaustivo. Deste modo, a figura jurídica do cónego penitenciário torna-se muito mais interessante e complexa para um olhar atento. Está em causa o próprio sacramento da penitência e a autoridade da Igreja.


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Os estudos encontrados ao longo desta dissertação, no que se refere ao cónego penitenciário, são geralmente vagos. A maioria refere-se à anterior legislação. Por isso, foi necessário partir de noções mais gerais, em que indirectamente se aprofundava o tema do ministro da penitência, do Direito sacramental e penal, para depois ir ao encontro das fontes. Portanto, pode-se afirmar que o status quaestionis acerca do estudo deste ofício é incipiente. Esperamos que este nosso trabalho seja um contributo enriquecedor neste sentido. Concretamente, é apresentada uma investigação acerca das origens e do porquê deste ofício na história da Igreja Católica Latina, da sua necessidade disciplinar no governo do foro sacramental e da sua importância e lugar na Igreja Particular, tendo presente outros sacerdotes que cumprem as mesmas funções. Conforme apresentamos, e seguindo outros estudos, a própria história da penitência é vasta, complexa e muito variável. Consequentemente, o aparecimento e intervenção do penitenciário não é uniforme em toda a Igreja. Mostra-se pertinente ao estudo a investigação acerca da evolução histórica da disciplina acerca da relação entre o ministro da penitência e os pecados reservados, mas também a normativa acerca do confessor e a sua faculdade ordinária, em razão do ofício para absolver no foro sacramental as censuras latae sententiae não declaradas e não reservadas à Sé Apostólica, segundo a actual normativa. O primeiro capítulo descreve a penitência na Revelação e nos primórdios da Igreja, passando pela reflexão patrística e pelos documentos normativos dos Romanos Pontífices, Concílios e Sínodos Universais e Particulares dos primeiros séculos. Da penitência eclesiástica solene, passa-se à penitência tarifada e finalmente às peregrinações penitenciais, enquanto contextualizam e favorecem o aparecimento de penitenciários. Procurou-se investigar a origem deste ofício, recorrendo aos primeiros testemunhos da sua possível existência no Oriente cristão, durante os séculos IV e V, e no Ocidente. Não existem certezas, mas a referência à sua possível existência faz levantar uma séria possibilidade. Ao longo deste percurso, destaca-se a função proeminente do bispo neste sacramento, paulatinamente ajudado por confessores, aos quais delegava o ministério da reconciliação. No segundo capítulo, parte-se do pensamento escolástico dos grandes mestres, e aprofunda-se o percurso da legislação canónica, em que, cada vez mais, se especifica e esclarece a função do ministro da penitência e, concretamente, do penitenciário. Se a sua existência é uma


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certeza, a sua acção é confusa e embrionária. O problema da jurisdição torna-se complexo e conflituoso, sobretudo entre o clero secular e regular, em que se vê envolvida a função do penitenciário. A abundância de questões teológicas e disciplinares favorece o amadurecimento do tema em estudo. No terceiro capítulo, percorre-se a normativa tridentina, claramente determinante no que respeita ao ministro da penitência, à sua jurisdição e ao cónego penitenciário em concreto. A legislação proveniente da Cúria Romana torna-se então incontornável, ao determinar situações concretas e resolver controvérsias, naquilo que se pode considerar uma verdadeira jurisprudência. A codificação das normas de 1917, por meio de um ingente trabalho das comissões de estudo, permitem então organizar a disciplina, simplificá-la por meio da precisão dos termos e universalizá-la. Após o Concílio Vaticano II, elabora-se na sua continuidade um novo Código, que preside à actual legislação e que procuramos comentar, seguindo diversos autores e à luz do percurso realizado previamente. Os métodos usados são os próprios da ciência canónica: histórico, analítico, sintético, comparativo e prático. O método histórico segue e controla o percurso atrás descrito, por meio de um contacto directo com as fontes e as mais significativas investigações já realizadas. O método analítico e sintético permite um estudo das normas emanadas ao longo da história, sobretudo da codificação do século XX. O método comparativo permite-nos descobrir as diferenças e semelhanças entre as várias disciplinas, mesmo em relação ao Penitenciário Maior, ou mais recentemente em relação à codificação das Igrejas Orientais. O método prático concede-nos perspectivas acerca dos aspectos pastorais deste ofício e das suas aplicações concretas. O limite desta dissertação é constituído pelas faculdades do cónego penitenciário no âmbito da Igreja Católica Latina, e por isso não são estudadas exaustivamente as normas das Igrejas Orientais. Por outro lado, apenas se referem os inícios do Penitenciário Maior e algumas noções acerca da Penitenciaria Apostólica, objectos de outros estudos. Finalmente, dirijo-me com palavras de agradecimento aos docentes da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Gregoriana que me iniciaram e conduziram na aprendizagem do estudo do Direito Canónico, enquanto serviço à Igreja. De um modo muito especial, agradeço ao P. Janusz Kowal que dirigiu esta dissertação, pelo sua competência, incentivo constante e diligente acompanhamento. O meu agradecimento estende-se ao Prof. Sérgio Toste, pela paciente revisão do texto. Recordo com carinho os companheiros da aventura romana. Agradeço ainda


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a colaboração do Pontifício Colégio Português e o apoio da Diocese de Angra e do seu Bispo, D. António de Sousa Braga, da comunidade do Seminário Episcopal de Angra, e da Fundação para a Ciência e Tecnologia do Estado Português, fundamental no apoio material. Dirijo um último, mas não menos importante, agradecimento aos meus pais e irmãos. Sem eles, não teria sido possível realizar e concluir este trabalho.


CAPÍTULO I A Penitência eclesiástica do início ao século X

1. A experiência da penitência na Sagrada Escritura 1.1 Antigo Testamento No Antigo Testamento1, o pecado é considerado em relação à Alianpois é a destruição da mesma, desde a Criação. É uma destruição que conduz à doença, uma falta, culpa ou desvio da recta vida. A história do Povo de Israel é feita de infidelidades e de retorno a Deus. Alguns pecados são particularmente graves e punidos com a morte, porque são cometidos contra a Aliança3. A responsabilidade do pecado é de todos, mas existe também uma responsabilidade pessoal4. O castigo de Deus é um medicamento que corrige o homem5. Mas o seu perdão é uma constante e não tem limites. A condição do perdão é a conversão6, e significa retornar ao Senhor e abandonar o mal, mudando o modo de viver7. O Antigo Testamento fornece-nos já uma liturgia penitencial. Encontramos na expulsão da sinagoga devido à má conduta de um membro do povo judaico um precedente da disciplina da exclusão da comunidade, constatada no Novo Testamento. Realizava-se a excomunhão ça2,

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Cf. A. NOCENT, «Il sacramento della penitenza», 138-139, 150-152; J. RAMOSREGIDOR, Il sacramento della penitenza, 109-112. 2 Cf. Os 2; Jr 3, 13. 3 Cf. Dt 13, 6, 10-11, 15-17; 17, 2-7; 19, 19; Lv 24, 14-16; Js 7, 13, 20, 25. 4 Cf. Jr 32, 18; Nm 27, 3; Dt 24, 16; 2 Rs 14, 6; Jr 31, 30; Ez 18. 5 Cf. Sl 38, 12. 6 São inúmeros os textos, eis apenas algumas indicações: Lv 19, 22; 2 Sm 12, 13; Sl 4, 3; 31, 1; 78, 9; 84, 3; 94, 8; 102, 10; Is 44, 21 ss.; 46, 8; Jr. 18, 11; Os 6, 1. 7 Cf. Ez 36, 31; Sl 50.


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perpétua ou temporânea se o culpável fizesse uma espécie de penitência pública. As liturgias penitenciais celebravam-se em ocasião de alguma calamidade, considerada como consequência da culpa de um indivíduo ou da colectividade8. Posteriormente, fixaram-se os dias da penitência, sendo a mais importante a festa do «Jom Kippur»9. Compreende dois momentos de expiação: alguns ritos de purificação e a confissão pública geral dos pecados. O ritual inclui a abstenção do trabalho, alguns ritos de penitência e jejum, uma assembleia no Templo e a oferta de alguns sacrifícios particulares. Em tudo isso é envolvida toda a comunidade, sacerdotes e povo, que o celebram em conjunto. 1.2 Novo Testamento No Novo Testamento10, o pecado só pode ser compreendido à luz do mistério de Cristo. O vocabulário usado gira à volta dos termos amartano, que indica aquilo que é contrário a Deus e amartia, que indica o pecado do homem. Os termos amartia e amartema, de origem veterotestamentária jurídica em contraposição à Aliança, são colocados na boca de Jesus. No Seu tempo, o pecado é fortemente determinado pela Lei e pela casuística. Contudo, Jesus ultrapassa esta visão indo ao encontro dos pecadores11. O pecado consiste na rejeição da Palavra, do Verbo ou da Luz que é Cristo12. Para São João, a rejeição de Cristo é obra de Satanás. Na iniquidade está a submissão a Satanás13. Em S. Paulo, aparecem expressões variadas: o pecado de Adão é amartia, transgressão; parartoma, culpa. Distingue entre amartia, o pecado, e amartiai, os pecados. Existe no homem uma hostilidade inata nos confrontos com Deus, fruto das obras de Satanás. A génese do pecado deve ser procurada no pecado original, que é desobediência que tornou o homem escravo14. Desse pecado surgem pecados que excluem do Reino de Deus15. ————————

8 Cf. Jz 20, 24 ss.; 1 Rs 21, 26-27. 9 Cf. Nm 29, 7-11; Lv 16. 10 Cf. A. NOCENT, «Il sacramento

della penitenza», 140-150; J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 115-141. 11 Cf. Mt 7, 11; 12, 31; Mc 2, 17. 12 Cf. Mt 13, 22; Jo 3, 19-20; 9, 41. 13 Cf. 1 Jo 3, 8-10; 3, 4; 5, 17; Jo 8, 34-44; 15, 22. 14 Cf. Rm 5, 12-19; 6, 21-23; 8, 20; 2 Cor 4, 4. 15 Cf. 1 Cor 5, 10 ss.; 6, 9 ss.; 2 Cor 12, 20; Gal 5, 19-21; Rm 1, 29-31; Col 3, 5-8; 1 Tm 1, 9; Tt 3, 3; 2 Tm 3, 2-5.


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Todavia, o pecado não tem a última palavra. Cristo anuncia a misericórdia de Deus, é amigo dos pecadores. São várias e ricas de sentido as passagens dos Evangelhos que descrevem a atitude de Jesus16. Em todas essas manifesta-se a arte e a intuição psicológica de Jesus na relação com os pecadores. Ao sinal de arrependimento, Jesus concede o perdão. Esse arrependimento conduz à mudança de vida. A recusa do amor leva no entanto ao desespero, como acontece em Judas. Deus é Pai de misericórdia e os seus filhos são objecto desse amor. Será essa misericórdia que qualificará a razão de ser cristão17. Com o seu exemplo, a sua solicitude constante e de amor para com o pecador, o Senhor indica à Igreja que a libertação do pecado e a cura dos pecadores constituem um elemento essencial da sua missão. A misericórdia de Deus encontra a máxima expressão no envio do Filho e na sua vitória sobre o pecado18. A misericórdia de Deus só se realiza pela conversão do pecador, em relação à escatologia19. Mas isso não nega a autoridade do Messias. Aliás, a remissão dos pecados é um sinal dos tempos messiânicos20. A conversão não é simples, mas é possível por iniciativa da graça divina, à qual deve corresponder uma adesão total a Cristo21. O Novo Testamento não nos fornece uma liturgia penitencial, se exceptuarmos o baptismo de purificação conferido por João Baptista. A teologia penitencial situa-se na linha profética. Nela se podem descobrir alguns elementos: conversão do coração, confissão da culpa e reintegração na comunidade depois de um tempo de emendamento e penitência. Este espaço temporal depende da gravidade da culpa cometida e dos progressos realizados pelo pecador. A exclusão da comunidade é outro elemento importante. S. Paulo decide acerca da exclusão de um membro da vida da comunidade e essa participa de uma tal decisão22. A comunidade, embora sem mancha, santa e imaculada23, é também pe————————

16 Cf. Mt 9, 2-8; Lc 5, 17-26; 7, 36-50; 15, 11-32; 19, 1-10; 22, 54-62; 23, 39-43; Jo 4, 6-42; 8, 1-11. 17 Cf. Lc 5, 27-30; 6, 36; 7, 34; 10, 30-37; 15, 11-32; 19, 7; 2 Cor 1, 3; Jo 5, 11; Mt 5, 7; 18, 23-35; 1 Tm 1, 2; 1 Jo 3, 17. 18 Cf. Jo 1, 29; 12, 31; 14, 30; 16, 33; 1 Jo 2, 2. 19 Cf. Mt 3, 2. 7-8; 10, 12; Lc 5, 32. 20 Cf. Mt 9, 1-8. 21 Cf. Rm 5, 6 ss; Act 28, 21-24. 22 Cf. 1 Cor 5, 3-4; 2 Ts 3, 12-14; 2 Cor 2, 6. 23 Cf. Ef 5, 27; 1 Cor 3, 16-17; 1 Cor 1, 2; 1 Jo 3, 9.


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cadora24. Neste sentido, coloca-se o problema do ministério da reconciliação, do poder da Igreja para perdoar os pecados. 1.2.1 O poder concedido por Jesus Os Evangelhos testemunham que Jesus concede aos apóstolos e aos seus sucessores a faculdade de ligar e desligar, remir e reter os pecados. Um dos textos mais antigos que aludem à faculdade de a Igreja perdoar os pecados é o da cura do paralítico, em Mateus 9, 1-8. Este texto evangélico revela uma leitura e uma interpretação do facto histórico que tem presente a situação concreta da comunidade pós-pascal. Marcos 2, 10 realça esta ideia ao falar do «Filho do Homem que tem na terra o poder de perdoar os pecados», e que a sua acção continua a ser exercitada na terra em virtude da Ressurreição. Quando em Mateus 9, 8 se diz que «a multidão deu glória a Deus por ter dado tal poder aos homens», esta fórmula parece ter sido um acrescento do evangelista para remarcar que Jesus tivesse concedido o poder de perdoar os pecados à comunidade eclesial25. Analisemos os textos clássicos. a) O poder de ligar e desligar presente em Mateus 16, 18-19; 18, 1826 foi objecto de várias interpretações27. 1. Em primeiro lugar, podese falar de uma interpretação jurídica. O poder de ligar e desligar determina a natureza do poder das chaves. Tal é o poder conferido a Pedro e ao Colégio Apostólico, que se torna poder supremo e universal de jurisdição da Igreja em ordem ao fim salvífico. Neste poder universal está o de remir ou não os pecados, como potestas specialis28. 2. Esta in————————

24 Cf. Mt 13, 24-43; 22, 2-14; 25, 1-13; Act 8, 13. 18-24; Rm 8, 12-13; Jd 16-18; Tg 1, 21; 2 Cor 11, 13; 10, 2. 12; 11, 4. 26; 1 Cor 5, 1. 25 J. MURPHY-O’CONNOR, «Péché et communauté», 181-186; J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 130. 26 Mt 16, 18-19: «Também Eu te digo: Tu és Pedro, e sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do Abismo nada poderão contra ela. Dar-te-ei as chaves do Reino do Céu; tudo o que ligares na terra ficará ligado no Céu e tudo o que desligares na terra será desligado no Céu»; Mt 18, 18: «Em verdade vos digo: Tudo o que ligardes na Terra será ligado no Céu, e tudo o que desligardes na Terra será desligado no Céu.». 27 Cf. H. VORGRIMLER, «Matthieu, 16, 18 s.», 55-61; J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 130-136. 28 Os defensores desta doutrina são Bartmann, Billot, Bisping, Dieckmann, González-Rivas, Hugon, Knabennauer, Morin, Palmieri, Pesch, Pohle, Zapalena, Lightfoot, Wetstein, Encyclopedia Biblica, Encyclopedia of Religion and Ethics, Zahn,


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terpretação foi depois modernamente corrigida pela interpretação filológica. A partir da linguagem rabínica, a expressão ligar e desligar significa, de um modo geral, falar com autoridade, proibir ou permitir qualquer coisa, ou declarar uma coisa proibida ou permitida. Deste modo, traduz-se no poder magisterial e disciplinar, pela interpretação autêntica da palavra divina e pela avaliação da liceidade de uma acção. Neste poder inclui-se o poder de excomugar ou de levantar a excomunhão, incluindo a remissão dos pecados. Deste modo, o poder de perdoar ou não os pecados é uma especificação do poder geral de jurisdição29. É difícil de ver nesta visão a relação entre este poder e a remissão dos pecados. 3. Em terceiro lugar, apareceu uma interpretação eclesiológica. O texto é interpretado tendo em conta Mateus 18, 18. Aceita a interpretação rabínica de ligar e desligar, mas enquadra-a no contexto mais amplo da doutrina da Igreja. No texto de Mateus 18, 15-17, a comunidade deve continuar a manifestar o amor misericordioso do Pai, e ela própria excomunga o irmão que não se corrige. Toda a reintegração do pecador na Igreja é para o mesmo uma via de salvação, enquanto que o contrário será perdição. A questão é a de ver a quem foi confiado o poder de ligar e desligar. Certamente foi confiado a Pedro e aos apóstolos ao serviço da Igreja. Contudo, em Mateus 18, 18, significa excluir ou readmitir na comunidade. É um acto que não terá somente repercussões sociais, mas também o seu paralelo no céu. Deste modo, a autoridade de Pedro exercita-se em unidade íntima com a comunidade, que tem a tarefa de excomungar ou de readmitir à comunhão30. Note-se que a excomunhão e a readmissão acontecem em dois momentos sucessivos, tendo o pecador um tempo de penitência entre ambos. Os autores que defendem esta interpretação entendem a excomunhão no sentido teológico e salvífico e não puramente disciplinar31. 4. Mais recentemen————————

Welhausen, Weiss. Cf. H. VORGRIMLER, «Matthieu, 16, 18 s.», 55; J. RAMOSREGIDOR, Il sacramento della penitenza, 131. 29 São deste parecer: Adam, Benoit, Diekamp, Dupont, Lagrange, Lang, LercherLakner, Ott, Pirot-Clamer, Schmid, Schnackenburg, Büchsel, Cullmann, Jeremias, Kümmel, Strack-Billerbeck, Vjscher. Cf. H. VORGRIMLER, «Matthieu, 16, 18 s.», 56; J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 131. 30 Cf. 2 Cor 2, 6; 1 Cor 5, 3-4. 12-13. 31 A interpretação eclesiológica foi defendida pelos Padres da Igreja, continuada na Idade Média pelo tratado anónimo «De vera et falsa poenitentia» e a «Catena Aurea» de S. Tomás de Aquino e recuperada por Xiberta, De la Taille, Cabrol, De Lubac, Poschmann, Mersch, Rahner, Schmaus, Leeming, Riga, Dumont, Schillebeeckx, Courtney, Palmer, Beumer, Anciaux, Alszeghy, Semmelroth, Mörsdorf, Ron-


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te surgiu a chamada interpretação demonológica32. Trata-se de uma reinterpretação das palavras «ligar» e «desligar»33, que significam «proscrever por sortilégio» e «romper por sortilégio». Este sentido seria comum e conhecido no tempo de Jesus34. Associa-se a interpretação rabínica à tradição popular, ligada à magia num sentido demonológico. A Igreja tem o poder de deixar o pecador nas mãos de Satanás e de subtrair o pecador a esse poder. Ligar é excluir da comunidade salvífica. Desligar é romper os laços com Satanás e readmiti-lo à comunidade salvífica. Isso não nega a interpretação rabínica e o poder doutrinal do Magistério. Mateus 18, 17 trata da comunidade à qual é entregue o pecador e Mateus 18, 18 designa o poder dos apóstolos. A expressão «em verdade vos digo» ajuda a fazer esta distinção, assim como as expressões os doze e os discípulos em geral35. A teologia católica encontra aqui uma vantagem ao distinguir os poderes comuns a todos os apóstolos de livrar o pecador do maligno e assim de remir e reter os pecados («ligar» e «desligar» de Mateus 18,18) e o poder exclusivo de Pedro (poder das chaves de João 21, 15-17). Esta interpretação tem ainda a ————————

det, Agnes, Congar, Ratzinger, etc. Cf. H. VORGRIMLER, «Matthieu, 16, 18 s.», 57; J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 133. 32 Defendem a interpretação demonológica H. Vorgrimler, K. Rahner e MurphyO’Connor. Cf. H. VORGRIMLER, «Matthieu, 16, 18 s.», 57-61; J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 133. 33 Eis o sentido de ligar e desligar segundo H. VORGRIMLER, «Matthieu, 16, 18 s.», 60: «1. Être “lié” par le péché, par le mal, et en être “délié”. 2 “Dénouer” le pouvoir démoniaque ou inversement “enchaîner” à lui en livrant le pécheur au diable. 3. “Lier et délier” par une autorité doctrinale, ce qui implique nécessairement un pouvoir venu de Dieu et une déclaration formelle. 4. “Excommunier” et “lever l’excommunication”, ce qui est la manière concrète dont la communauté sainte de Dieu peut se garder pure du mal». 34 Vorgrimler justifica esta solução com os seguintes argumentos: «1. Le mot «lier» est fréquemment associé dans l’Ancien Testament aux forces du mal e du péché [...] 2. Lier e délier ont une signification démonologique dans d’autres passages du Nouveau Testament [...] 3. Il est hors de doute que les démons, quoi qu’il en soit des explications philosophiques et théologiques, tiennent une large place dans le message et dans l’action de Jesus [...] 4. L’exégèse de Mt 16, 19 et 18, 18 est souvent démonologique chez les Peres [...] 5. «Lier et délier» au sens démonologique sont largement attestés dans l’apocalyptique juive et dans le judaïsme rabbinique [...] 6. Un emploi aussi général explique tout à fait pourquoi Jésus a pu employer ce couple sans avoir l’expliquer et comment le rédacteur de l’évangile de Matthieu n’a pas eu à le préciser»; H. VORGRIMLER, «Matthieu, 16, 18 s.», 58-59. 35 Cf. B. RIGAUX, «Lier et délier», 117-119.


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vantagem de associar os dois sacerdócios, distintos mas reunidos no único sacerdócio de Cristo. b) O poder de remitir e reter os pecados em João 20, 21-2336 foi também objecto de duas interpretações fundamentais. 1. A interpretação jurídica medieval vê no «remiseritis» o perdão concedido por Deus para além do contexto eclesial. «Retinueritis» é a recusa da absolvição com a obrigação para o penitente de se apresentar de novo para receber a absolição. Considera-se uma interpretação imprecisa, pois o verbo «retinere» não indica somente «não absolver» mas também uma acção que os apóstolos devem realizar relativamente ao pecado. O ministro do sacramento não deve recusar a absolvição a quem está bem disposto interiormente. Por isso, esta interpretação não é aceite. 2. A interpretação eclesial vê no «remittere» o perdoar o pecado como ofensa feita à Igreja. A expressão «quorum remiseritis peccata» refere-se à ofensa feita à Igreja e a expressão «remittuntur eis» como perdão do pecado como ofensa a Deus. Por isso, quando a Igreja perdoa, é perdoado também o pecado como ofensa a Deus. A acção da Igreja tem assim uma real eficácia salvífica. «Retinere» significa neste caso ligar o penitente, para que este corrija o seu vício para depois ser admitido na comunidade. São assim distinguidas duas fases do processo de reconciliação do pecador. A tendência dos autores é de acordo que as palavras de Jesus se refiram aos cristãos pecadores e não aos que ainda não foram baptizados37. O perdão dos pecados é assim parte essencial da missão da Igreja, que entra no acto de Deus, que envia o seu Filho, e na Sua missão que se aperfeiçoa e actualiza pelo envio do Espírito Santo38. Tendo em conta a riqueza destas interpretações, há que ter presente uma advertência. Não se pode encontrar no sentido literal das expressões «ligar» e «desligar», «remitir» e «reter» a instituição do sacramento da penitência directamente afirmada. Estes textos contêm-na in nuce como um todo39. ———————— 36

Jo 20, 21-23: «E Ele voltou a dizer-lhes: “A paz seja convosco! Assim como o Pai me enviou, também Eu vos envio a vós”. Em seguida, soprou sobre eles e disselhes: “Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ficarão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ficarão retidos”». 37 Cf. J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 136-139; A. NOCENT, «Il sacramento della penitenza», 146-147. 38 Cf. B. RIGAUX, «Lier et délier», 132-133; A. LEFÈVRE, «Péché et pénitence», 15-17. 39 Cf. B. RIGAUX, «Lier et délier», 124,135.


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1.2.2 A prática da penitência nos escritos paulinos Paulo introduz um termo novo relativamente aos Evagelhos: reconciliação. Cristo reconciliou-nos com o Pai, que nos reconcilia consigo em Cristo e com o mundo40. A obra de Cristo é continuada pelo ministério da reconciliação41. Trata-se ainda de uma dimensão espiritual, não uma expressão litúrgica ou sacramental42. Os textos de Paulo permitem-nos ter conhecimento de como as comunidades cristãs se comportam perante o pecador43. Além dos textos que se referem à correcção feita pelo chefe da comunidade ou de quem possui o Espírito Santo44, Paulo indica-nos a prática concreta da exclusão, em que se distinguem três elementos essenciais: a) a exclusão acontece por motivos graves e evidentes45; b) a exclusão é feita por meio de uma espécie de sentença realizada por Paulo ou pela comunidade em nome e com a autoridade do Senhor46; c) a excomunhão é medicinal, porque evita o contágio do mal na comunidade, mas também reserva um espaço para a conversão do pecador47. A expressão «abandonar a Satanás» indica uma espécie de excomunhão ou de exclusão da comunhão plena da vida cultual e social com a comunidade48. A readmissão tem também um carácter oficial. Na segunda carta aos Coríntios 2, 5-11, toda a comunidade inflige a exclusão, mas Paulo exorta-a ao perdão e a receber o irmão na caridade49. 1.2.3 Outros textos do Novo Testamento Outros textos do Novo Testamento testemunham que a reconciliação acontece na Igreja e através da acção dos seus ministros. Essa advém da ———————— 40 41 42 43

Cf. Rm 5, 10-11; 2 Cor 5, 18-19. Cf. 2 Cor 5, 18-20. Cf. PH. ROUILLARD, Storia della penitenza, 22. Cf. J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 121-126; A. NOCENT, «Il sacramento della penitenza», 147-148. 44 Cf. 1 Tm 5, 20; 2 Tm 2, 25-26; Gal 6, 1-2. 45 Cf. 2 Ts 3, 6-15; 1 Cor 5, 9-11: ociosidade que se torna um peso para a comunidade, incesto, fornicação, avareza, furto, idolatria, maledicência, embriaguez. 46 Cf. 1 Cor 5, 3-4, 12-13; 2 Cor 2, 6.10; 13, 2-3.10. 47 Cf. 1 Cor 5, 1-13; 2 Cor 2, 6-11; 7, 8-11; 2 Ts 3, 6-15; 1 Tm 1, 20; J., MURPHYO’CONNOR, «Péché et communauté», 170: «l’insistance sur le valeur médicinale de la punition, si claire dans les lettres pauliniennes, suggère qu’on accordait le retour dans la pleine communion moyennant la preuve d’un repentir sincère». 48 Cf. 1 Cor 5, 5. 49 Cf. J. BERNHARD, «Excommunication et Pénitence-Sacrement», 276-277.


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correcção fraterna e da sentença dos responsáveis da comunidade50, como vimos em Mateus 18, 15-18. O pecador é ajudado pela oração dos irmãos, como acontece em Tiago 5, 16 e na primeira carta de João 5, 16. Acontece ainda por uma não especificada confissão aos irmãos, unida à sua oração e ao seu esforço para reconduzir o pecador pela recta vida51. Não se trata neste caso de pecados graves e públicos, nem do sacramento da penitência em sentido estrito, visto que não é uma função atribuída aos presbíteros, mas aos leigos em geral52. Na primeira carta de São João 1, 9, refere-se a confissão de pecados, mas não é claro de que tipo de confissão se trata. Em Actos dos Apóstolos 19, 18, fala-se da confissão feita por alguns a Paulo, mas talvez se trate de convertidos do paganismo no momento da sua conversão. Note-se ainda a sentença de Pedro sobre Simão Mago, que é convidado ao arrependimento e à oração53. O caso de Ananias e Safira continua um exemplo de como a Igreja não suporta passivamente o pecado e que este caso seria uma advertência para a gravidade dos pecados contra a vida comunitária54. Existem ainda alguns casos em que parece restringir-se o poder da Igreja no perdão de alguns pecados, como no caso da blasfémia contra o Espírito Santo55. A exegese interpreta o texto como sendo a rejeição de Cristo por parte dos fariseus. A remissão é impossível por causa da resistência às moções do Espírito Santo56, e não por causa da limitação do poder. A não remissão da apostasia de Hebreus 6, 4-6 é interpretada no que se refere às disposições subjectivas do sujeito, não que o pecado da apostasia não possa ser perdoado57. São João distingue entre um pecado que conduz à morte e outro que não o faz58. O pecado que conduz ————————

50 Cf. A. LEFÈVRE, «Péché et pénitence dans la Bible», 19: «Dans la communauté unie per la charité, la faute d’un membre atteint tous les autres et les plonge dans la tristesse, mais quand cette tristesse a gagné le pécheur lui-même, elle l’amène à la pénitence, et tous retrouvent la joie. L’absolution sacerdotale exprime efficacement le jugemente de Dieu». 51 Cf. Lc 17, 3; Gal 6, 1; 2 Tm 2, 25; 4, 2; 1 Ts 5, 12-15; Tg 5, 16-20. 52 Cf. W. KASPER, «Confesión fuera del confesonario?», 40; J., MURPHYO’CONNOR, «Péché et communauté», 171. 53 Cf. Act 8, 18-24. 54 Cf. Act 5, 1-11; J., MURPHY-O’CONNOR, «Péché et communauté», 179, nt. 50; J. BERNHARD, «Excommunication et Pénitence-Sacrement», 274-275. 55 Cf. Mt 12, 31-32; Mc 3, 28-29; Lc 12, 10. 56 Cf. J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 139. 57 J., MURPHY-O’CONNOR, «Péché et communauté», 172-173. 58 Cf. 1 Jo 5,16.


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à morte leva consigo a expulsão da comunidade. Não diz que não seja perdoável, mas que é de tal modo grave que coloca o pecador numa situação tal que não terá coragem nem lucidez para reagir. É a situação do pecador que torna impossível a conversão, não que o perdão seja recusado59. 1.3 Síntese Estes são os textos principais nos quais a Igreja fundamenta a teoria e a prática do sacramento da penitência. Distinguem-se duas correntes: existe um poder de remir os pecados dado por Cristo aos homens e confiado solenemente aos Apóstolos (Mt 9, 8; Jo 20, 22); e um poder de ligar e desligar confiado a Pedro e aos Apóstolos (Mt 16, 19; 18, 18). Paulo, ao propor um ministério da reconciliação, põe em prática a doutrina da excomunhão e reintegração. A primeira corrente diz respeito à relação entre Deus e o homem, a segunda às relações entre os fiéis e a comunidade. Neste tempo, o pecado grave cometido depois do baptismo é excepcional. A correcção fraterna é mais aplicada que o poder referido nos Evangelhos de remir os pecados. Coexistem diversas práticas: a remissão dos pecados pelo baptismo, a correcção fraterna e a excomunhão60. 2. Excomunhão e Reconciliação dos séculos II-VI 2.1 Padres Apostólicos No período entre o século II e o século VI, o baptismo permanece para a maior parte dos cristãos como o único meio de remissão dos pecados. Por outro lado, não existe uma legislação uniforme. Cada província elabora um sistema penitencial para os cristãos que depois do baptismo cometeram os pecados mais graves61. A nível judiciário, a Igreja exerce o poder de ligar e desligar somente em relação a pecadores obstinados e culpáveis de uma falta grave e pública. No plano da penitência-sacramento, todos os pecadores eram purificados, em vista da Eucaristia, pela exomolegese dos pecados. Contudo, há que ter em conta que ainda não existe a dicotomia entre foro judicial e sacramental, nem se pode identificar a exomolegese com o sacramento da peni———————— 59 60 61

Cf. J. MURPHY-O’CONNOR, «Péché et communauté», 171-172. Cf. PH. ROUILLARD, Storia della penitenza, 23-25. Cf. PH. ROUILLARD, Storia della penitenza, 27.


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tência. Os movimentos penitenciais exercem-se na assembleia de um modo comunitário e público. As instituições penitenciais judiciárias dizem respeito aos pecadores obstinados e culpáveis de uma falta grave e pública. Existiam então dois critérios determinantes: a gravidade do escândalo e a obstinação. Como consequência, recorre-se à repreensão privada e pública e à excomunhão. A comunidade continha então uma espécie de tribunal constituído por um número reduzido de membros encarregado de julgar os pecadores públicos. O pecado grave separava o pecador de Deus e da Igreja62. A excomunhão tinha um sentido medicinal, pois com a conversão o pecador tornava ao seio da comunidade e dos sacramentos63. A Didaché não trata da penitência nem da excomunhão em forma aprofundada. Somente a repreensão em forma privada e a excomunhão e o seu levantamento são tidas em conta, mas numa dimensão moral. A excomunhão é evocada, mas sem se saber como se realiza o processo64. A exomologese dos pecados é também evocada com a intenção de o pecador participar na Eucaristia, a «fim de que o vosso sacrifício seja puro»65. Consistia na confissão das maravilhas de Deus no contexto de uma celebração cultual e era repetível. Não se trata contudo de uma confissão sacramental, mas de uma oração colectiva semelhante ao confiteor. Não incluiria certamente os pecados graves e públicos66. A carta de Barnabé retoma os mesmos aspectos da Didaché67. As cartas de S. Clemente de Roma aos Coríntios e de S. Policarpo aos Filipenses permitem-nos conhecer o processo disciplinar. No ano 95, em Corinto, alguns cristãos revoltam-se contra os presbíteros que dirigem a ————————

62 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 339-340: «Le cose dunque anche per questo primo gruppo di scritti dei Padri Apostolici stanno così: la prospettiva giuridico-morale ed escatologica delle conseguenze del peccato predomina ancora incontrastata su quella della grazia. I motivi di tale prevalenza devono essere gli stessi che nel N.T». 63 Cf. J. BERNHARD, «Excommunication et Pénitence-Sacrement», 41-46. 64 Cf. Didachè 15, 3: «Corrigi-vos uns aos outros, não com ira, mas com paz, como tendes no Evangelho; e se um homem ofende o seu próximo, que ninguém fale com ele nem oiça uma palavra sua antes de se arrepender». Cf. Didachè 2, 7; 4, 3; J. BERNHARD, «Excommunication et Pénitence-Sacrement», 322. 65 Cf. Didachè 4, 14; 14, 1. 66 Cf. VOGEL, C., Le pécheur et la pénitence, 15; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 30. Bernhard defende que a exomologese tem valor de absolvição sacramental o que nos parece exagerado e não confirmado por outros autores. J. BERNHARD, «Excommunication et Pénitence-Sacrement», 48, 52. 67 Cf. Carta de Barnabé, 19, 2.


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Igreja local. Então intervém Clemente de Roma pedindo-lhes que deixem a cidade e se dirijam para outra Igreja. Concretiza-se a caridade entre Igrejas, parte de um único corpo católico, que se devem ajudar nos casos difíceis68. É interessante notar como esses instigadores não são excomungados, mas são apenas aconselhados a deixar Corinto. Deste modo, os pecados mesmo graves e públicos não implicam a excomunhão69. Contudo, os pecadores devem fazer a exomologese para os reconciliar com Deus e a Igreja70. O mesmo se repete na segunda carta de Clemente71. No ano 115, em Filipos, o presbítero Valente e a sua mulher foram acusados de roubo de dinheiro e de uma irregularidade de conduta. São então excomungados em razão da sua obstinação. Policarpo de Esmirna recomenda aos cristãos uma atitude de misericórdia e solidariedade para com os culpados, realçando a função medicinal da pena. Os excomungados não são inimigos, mas membros doentes e extraviados. A reconciliação ajuda a crescer o corpo eclesial, pela comunhão72. A carta de Inácio de Antioquia aos Esmirnenses menciona a excomunhão dos heréticos. Supõe a excomunhão já pronunciada mas não é possível determinar o processo73. Resta saber o que significa levantar a excomunhão. O excomungado reconciliado pode participar na via sacramentária e com isso na Igreja vivente. A reconciliação com a Igreja é condição indispensável para a remissão sacramental dos pecados e para a reconciliação com Deus. Assim o defendem Clemente Romano aos Coríntios74 e Inácio de Antioquia aos Filadélfios75. ———————— 68 69

327.

70 71

Cf. CLEMENTE DE ROMA, Carta aos Coríntios, 51-58. Cf. J. BERNHARD, «Excommunication et Pénitence-Sacrement», 274-275, 325-

Cf. CLEMENTE DE ROMA, Carta aos Coríntios, 48, 1; 51, 1-2; 52, 1. Cf. CLEMENTE DE ROMA, Segunda Carta aos Coríntios, 8, 1-3; 13,1. Neste contexto, a metanóia parece invocar a exomolegese sacramental. Cf. J. BERNHARD, «Excommunication et Pénitence-Sacrement», 51-52. 72 Cf. POLICARPO DE ESMIRNA, Carta aos Filipenses, 11, 4: «Eu estou profundamente entristecido, pois, irmãos, por ele (Valente) e por sua esposa, a quem o Senhor talvez conceda uma penitência verdadeira (2 Cor 2, 25). E deveis portar-vos com temperança em relação a este assunto, e "não os tenhais como inimigos" (2 Ts 3, 15), mas chamai-os de volta como membros doentes e extraviados, pois deveis salvar todo o corpo. Agindo assim edificai-vos a vós mesmos». 73 Cf. INÁCIO DE ANTIOQUIA, Carta aos Esmirnienses, 4, 1. 74 Cf. CLEMENTE DE ROMA, Carta aos Coríntios, 57, 1. 75 Cf. INÁCIO DE ANTIOQUIA, Carta aos Filadélfios, 3, 2: «E é assim que, quantos são de Deus e de Jesus Cristo, esses são os que estão ao lado do bispo. No mo-


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2.1.1 Pastor de Hermas O Pastor de Hermas representa um marco importante na história da penitência. Também ele ensina que é o baptismo a única via de remissão dos pecados. No entanto, o pecado continua a existir na comunidade cristã. Deste modo, tendo em conta a perspectiva escatológica da iminência do fim do mundo, pode ser oferecido ao pecador uma última porta de acesso à graça. Contudo, a segunda remissão é excepcional. O quarto mandamento faz alusão à penitência e excomunhão76. O exemplo apresentado é o da mulher adúltera acolhida pelo seu marido assim como deve ser o pecador excomungado. Neste caso, não se rompe a relação, mas o marido afastou a mulher para que esta se arrependesse. A partir do momento em que ela se arrependeu, deve ser acolhida, assim como o excomungado na Igreja. Ele é readmitido para exercer os seus direitos de baptizado. Tendo em conta que para o Pastor de Hermas a penitência sacramental não é reiterável77, o acolhimento na comunidade não pode ser renovado um grande número de vezes, não por princípio, mas pela não sinceridade do arrependimento. O princípio de uma penitência única condicionará a evolução da penitência78. Este tipo de penitência estende-se a todos os pecados sem excepção79, a não ser por indisposição do penitente, como o demonstra o exame dos ramos de salgueiro que representam os diversos tipos de pe————————

mento em que, quantos, arrependidos, voltaram à unidade da Igreja, também esses serão de Deus, a fim de viverem conforme a Jesus Cristo». Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 32; J. BERNHARD, «Excommunication et PénitenceSacrement», 329. 76 Cf. PASTOR DE HERMAS, Mandamento, IV, 1, 8: «Se o marido não acolhe a sua mulher, pecado, e grande certamente, é o pecado que carrega sobre si. Sim, há que receber a quem peca mas faz penitência. Contudo, não muitas vezes, pois só uma penitência se dá aos servos de Deus». 77 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 36; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 346-347: «C’è per questo disgraziato ancora un ritorno, una seconda , e a quali condizioni essa è possibile? Questa questione provocò nel secondo e nel terzo secolo tutta una serie di dispute teologiche, portò a scissioni ed eresie, quali prima di tutto il rigorismo penitenziale montanistico di Tertuliano, lo scisma di Ippolito di Roma, il dissenso sul comportamento da tenere coi penitenti all’epoca di Cipriano e dei suoi avversari in questa facenda (Novato, Felicissimo, Fortunato) e finalmente lo scisma di Novaciano a Roma». 78 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 17. 79 Cf. PASTOR DE HERMAS, Comparação, VIII, 6; VIII, 11; Visão, II, 2, 2-4;, 3, 4; Mandamento, IV, 1, 8. Mesmo a apostasia e o adultério são remissíveis. Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 17-18.


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cadores80. A penitência é mais ou menos frutuosa dependendo da sua caminhada. Quando a expiação da falta for cumprida, o pecador realiza a renovação interior e retorna ao estado de inocência81. No caso dos apóstatas e nos outros que romperam o vínculo externo com a Igreja, evita-se o acto externo de excomunhão, mas em outros casos, como no adultério, tal acto é necessário e é realizado82. Deste modo, nem todos os casos eram sujeitos à excomunhão. Portanto, em alguns casos podese pensar somente numa penitência subjectiva, mas não se pode demonstrar que seja uma penitência sacramental83. A intervenção da Igreja não é ausente como pode parecer. Existem diversos indícios dessa actuação. É aos presbíteros e presidentes das assembleias que Hermas deve comunicar a mensagem penitencial84. A pregação de Hermas tende a fazer entrar o pecador na torre que representa a Igreja dos santos, o que, de acordo com a sua eclesiologia, não aconteceria sem a readmissão na Igreja visível85. «É necessário acolher o pecador que faz penitência»86. Esta expressão deve ser entendida como uma reconciliação propriamente dita. Na verdade, Tertuliano acusa Hermas de ser o «pastor dos adúlteros» no Tratado da Castidade, porque na sua perspectiva Hermas terá acolhido pela primeira vez os fornicadores87. A readmissão acontecia através de um acto eclesial, uma penitência com excomunhão, consistente em inserir o pecador na torre só depois de um longo período de penitência. Os pecadores que nunca tinham rompido os laços com a comunidade eram admitidos à penitência ———————— 80 81 82

Cf. PASTOR DE HERMAS, Comparação, VIII, 4-6. Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 17-18. Cf. PASTOR DE HERMAS, Comparação, IX, 26, 3; Mandamento IV, 1, 5; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 427. 83 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 444. 84 Cf. PASTOR DE HERMAS, Visão, I; II, 4. 85 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 18; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 37-39: «Il doit bien exister un rapport de causalitè entre l’Église visible et le Royaume de Dieu auquel conduit la Pénitence. Si la réintégration dans la communauté ecclésiale n’est pas non plus la cause efficiente de la rémission des péchés, elle est nécessairement supposée. L’Église pardonne, afin que Dieu le fasse. La réconciliation procure directement et formellement la paix avec l’Église, indirectement aussi la paix avec Dieu»; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 428: «Perciò non vi può essere alcun dubbio che la Chiesa concreta cerchi di rispondere come può al peccato che separa interiormente l’uomo da lei, scomunicando anche visivelmente il peccatore, e consideri ciò come una reazione naturale ed obbligatoria al peccato». 86 PASTOR DE HERMAS, Mandamento, IV, 1, 8-9. 87 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 18.


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facilmente, enquanto que aqueles que estavam manifestamente separados da comunidade cristã em geral eram só admitidos à penitência depois de um exame aprofundado88. Um princípio fundamental a ter em conta é que não existe a separação entre excomunhão enquanto disciplina canónica e a penitência sacramento. Não se encontra outro tipo de penitência eclesial que não se refira a um pecador considerado como separado da Igreja. Todos os pecadores eram considerados fora da Igreja, ou da torre. Deste modo, Hermas entende a penitência como penitência com excomunhão89. Será a evolução histórica a separar estas duas dimensões. 2.1.2 Segunda metade do século II Os apologistas da segunda metade do século II insistem sobretudo no ideal de santidade dos cristãos. As instituições penitenciais são apenas afloradas. São Justino afirma que para aceder à Eucaristia são necessárias a fé cristã, o baptismo e uma vida conforme è doutrina cristã90. Neste caso, seria o pecado público a excluir da Eucaristia. Noutra passagem, encontra-se o carácter comunitário da penitência que caracterizava a exomologese dos pecados91. A carta de Dionísio de Corinto às Igrejas do Ponto, citada por Eusébio de Cesareia, enuncia o princípio de que todos os pecadores, seja qual for a sua falta, o seu delito ou a sua heresia, se se convertem, devem ser recebidos92. Trata-se de uma reacção contra o montanismo, como veremos. Com isso serlhes-iam restituídos os seus direitos de baptizados e a participação nos sacramentos. 2.2 A disciplina penitencial do século III A Igreja dos primeiros tempos encontra-se de vez em quando pressionada por perseguições que variam de província para província. Entre estas basta apenas recordar as de Nero em Roma, no ano 64, de Domiciano, em 92, ou as esporádicas sob o governo de Adriano (117-138) e de Antonino Pio (138-161). Particularmente violentas são as de Décio em 250, de Valeriano em 257-259, de Diocleciano, entre 284 e 305, ———————— 88 89 90 91 92

Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 438, 462. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 433, 441, 462-463. Cf. JUSTINO, Apologia, 1, 66. Cf. JUSTINO, Apologia,1, 61. Cf. EUSÉBIO DE CESAREIA, Historia Ecclesiastica, IV, 23, in PG 20, 383-386.


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que faz de tudo para abrandar o crescimento do cristianismo, e, por fim, as perseguições locais de Galério, entre 305 e 311. A perseguição de Décio em 250 foi breve mas violenta e provocou um grande número de apostasias mais ou menos graves. Segundo o grau de apostasia, os lapsi foram denominados de vários modos. Os que sacrificam aos deuses ou ao imperador eram os sacrificati. Os que queimam incenso aos ídolos ou ao imperador eram os thurificati. Os que obtêm ou aceitam um certificado de sacrifício sem terem sacrificado eram os libellatici. Entre estes, alguns arrependem-se e reconhecem a própria culpa, outros pensam não terem cometido uma culpa grave, mas terem sido submetidos a uma autoridade política. Outros recusam-se prestar o acto de culto, tendo sido chamados stantes. Os que confessaram a Cristo diante dos magistrados foram apelidados de confessores. Os martyres foram os que sofreram a prisão e a tortura ou a morte93. Com a liberdade de culto das épocas de Constantino e Teodósio aumentam as conversões, nem sempre em razão da fé e de uma vida nova, mas em vista de vantagens sociais. O monaquismo e a penitência canónica aparecem então como resposta à situação privilegiada da Igreja e à superficialidade de tantas conversões. Por outro lado, a Igreja experimenta a necessidade de uma organização mais sólida. Os concílios tratam então das questões dogmáticas e legislam a disciplina, com grande número de cânones dedicados à penitência. Aos cânones conciliares juntam-se no Oriente as Cartas Canónicas, sobretudo de Gregório Taumaturgo, Pedro de Alexandria e Basílio de Cesareia, escritas para responder às circunstâncias e consideradas como normas a seguir. Estas regras tendem a transformar a administração pessoal da penitência num conjunto de regras impessoais. Os bispos são considerados autênticos juízes94. 2.2.1 Padres da Igreja a) O Montanismo e Tertuliano Como vimos, a penitência pública era realizada como segunda hipótese concedida aos fiéis, mas não repetível. Deste facto surgiram duas questões. Que pecadores se podem admitir à penitência? A peni———————— 93 Cf. Ph. ROUILLARD, Storia della penitenza, 33-34; W. FREND, «Persecuciones», 1759-1766; A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 38; B. LLORCA, Historia de la Iglesia Católica, 295-303. 94 Cf. M.–F. BERROUARD, «La penitence publique», 116-118.


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tência a cumprir é suficiente para justificar a reconciliação? O montanismo responde de forma severa e negativa. A sua doutrina está contida no oráculo do Paráclito proferido por Montano e que Tertuliano (†222) nos transmite: «Potest ecclesia donare delicta, sed non faciam, ne et alii delinquant»95. Portanto, a penitência depois do baptismo é possível, mas a Igreja não deve realizá-la para que os fiéis não sejam incitados a pecar. Tertuliano dará um grande impulso a esta corrente, mas devem distinguir-se os seus períodos católico (De poenitentia) e montanista (De pudicitia)96. No período católico, Tertuliano admite que a Igreja receba todos os pecadores sem excepção, desde que passe por uma expiação proporcionada às suas faltas. No período montanista, opõe-se ao «pontifex maximus», «episcopus episcoporum», por admitir à reconciliação os adúlteros e fornicadores97. Tertuliano defende como Hermas a unicidade da reconciliação do pecador. Por analogia com o baptismo, esta penitência não pode ser repetida98. Admite-se que Tertuliano seja o primeiro a apresentar na história da penitência um processo penitencial que se tornaria estável depois da era apostólica99. A expiação para a remissão das faltas graves comporta um tempo de provação severa. Além das disposições interiores, é pedido ao culpável a exomologese, que significa confessar-se diante de Deus, concretizado mediante uma série de actos de mortificação, de modo a ———————— 95 96 97

TERTULIANO, De pudicitia, 21, 7, in PL 2, 1024. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 44. Cf. TERTULIANO, De pudicitia, I, 6, in PL 2, 981. Segundo alguns autores, embora se possa admitir que o pontífice supremo ou bispo dos bispos seja o Papa Zeferino ou o Papa Calisto, a hipótese Agripino, bispo de Cartago, é a mais aceite; C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 55, nt. 15; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 44-46. Carpin defende que Tertuliano queria atingir directamente o Papa Calisto e indirectamente Agripino. Cf. A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 25. 98 Cf. TERTULIANO, De poenitentia, 7, 10, in PL 1, 1352: «Haec igitur venena eius providens deus clausana licet ignoscentiae ianuam et intinctionis sera obstructam aliquid adhuc permisit patere: conlocavit in vestibulo paenitentiam secundam, quae pulsantibus patefaciat, sed iam semel quia iam secundo, sed amplius numquam quia proxime frustra». Afirma Poschmann: «Comme la “janua ignoscentiae” qui s’ouvre au candidat au baptême est fermée au pécheur chrétien, la “deuxiéme pénitence” a pour but d’ouvrir à celui qui se tient sur le parvis et qui frappe à la porte». B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 46. 99 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 48.


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realizar uma mudança de vida para alcançar misericórdia100. Mediante a confissão, o pecador é sujeito a uma «censura divina» que se traduz na recusa da communicatio ecclesiastica101 e é assim excomungado102. O acto de excomunhão era indispensável para a penitência, no qual o bispo era decisivo103. Estes actos acontecem diante da porta de entrada da Igreja ou pro foribus ecclesiae, e depois na própria Igreja104. Fora da Igreja o pecador pede para ser admitido à penitência. Depois de ser admitido, entra na Igreja e aí se realiza a exomologese105. Após este tempo mais ou menos longo e indispensável, realiza-se a reconciliação na e pela Igreja, que este autor identifica com Cristo106. É o bispo que reconcilia o penitente e que lhe dá o perdão, como reconhece mesmo o Tertuliano montanista107. O poder das chaves é um privilégio pessoal ————————

100 Cf. TERTULIANO, De poenitentia, 9, 3, in PL 1, 1354: «exomologesis est, qua delictum Domino nostrum confitemur». Esta atitude reaparece em outra parte do tratado De poenitentia 10, 1-10, in PL 1, 1355-1356. 101 Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 18, 2, in PL 2, 1015. 102 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 536-537: «Con ciò naturalmente non vuol dire che questa scomunica coincida col concetto di scomunica del nostro Codice di diritto canonico, tanto meno poi che essa sia stata a quei tempi l’atto con cui s’iniziava il processo penitenziale. Infatti i peccatori impenitenti venivano espulsi della comunità e dal servizio liturgico, il che si considerava, per tutto il tempo in cui essi rimanevano ostinati nel proprio peccato, una misura puramente disciplinare». 103 Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 14, 16, in PL 2. 1007: «extra Ecclesiam dare praesidentis officium». 104 Cf. TERTULIANO, De poenitentia, 7, 10, in PL 1, 1352; De pudicitia, III, 5, in PL 2, 986. 105 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 537-539. 106 Cf. TERTULIANO, De poenitentia, 10, 6, in PL 1, 1356: «In uno et altero ecclesia est, ecclesia vero Christus. Ergo cum te ad fratum genua protendis, Christum contrectas, Christum exoras. Aeque illi cum super te lacrimas agunt, Christus patitur, Christus patrem deprecatur. Facile impetratur semper quod filius postulat». Convém notar que a reconciliação é expressão da relação do pecador com o Corpo místico e visível da Igreja. Neste sentido, como afirma Rahner, toda a Igreja perdoa, no sentido que contém constantemente uma realidade santificante, que, quando vem conferida ao pecador pelo representante da Igreja para isso deputado por Cristo, é-lhe conferida como realidade santificante da Igreja. A reconciliação com Deus é necessariamente também com a Igreja; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 550-552. Na verdade, afirma Tertuliano: «no potest corpus unius membri vexatione laetum agere»; TERTULIANO, De paenitentia, 10, in PL 1, 1356. 107 Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 18, 18, in PL 2, 1017: «venia ab episcopo». Baseando-se no De pudicitia 13, in PL 2, 1003-1005, Rahner descreve assim a reconciliação: o pecador era introduzido na assembleia reunida para o serviço divino, ou talvez a partir do seu lugar no fundo era conduzido por um presbítero, ajoelhava-se e pedia a


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de Pedro, mas também o poder de ligar e desligar passou à Igreja, embora no contexto montanista se deva entender como sendo a Igreja espiritual108. Contudo, sabe-se que nesta época a penitência e reconciliação requeriam a intervenção da Igreja por meio dos presbíteros e bispos109. Para as faltas graves, exige-se a reconciliação com o bispo. As faltas leves são reparadas pela oração e pelos exercícios de mortificação. No período montanista Tertuliano, nega a remissibilidade das faltas graves110. Esta divisão entre faltas remissíveis e não remissíveis é uma inovação do Tertuliano montanista. Desde então, Tertuliano, não sem algum embaraço, remete à misericórdia de Deus os grandes pecadores a quem ele recusa a reconciliação eclesiástica, e que, em contradição com os mesmos princípios montanistas, reconhece aos bispos o poder de reconciliar, excepto a restringir este poder às faltas de menor importância. Nem antes de Tertuliano nem depois dele, encontramos semelhantes distinções111.

Tertuliano faz uma lista de pecados de menor importância – quotidianos – que ele considera remissíveis, mas que não se podem confundir ————————

intercessão da comunidade e a readmissão. O bispo falava sobre a gravidade dos pecados e a misericórdia de Deus e por fim concedia o perdão; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 540-541. 108 Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 21, 17, in PL 2, 1026: «Ecclesia quidem delicta donabit, sed ecclesia spiritus per spiritalem hominem, non ecclesia numerus episcoporum. Domini, enim, non famuli est ius et arbitrium; Dei ipsius, non sacerdotis». 109 Rahner apresenta 3 argumentos a favor da reconciliação na Igreja no período católico: por relação com o baptismo, é impossível que um pecador permaneça para sempre fora da comunhão eclesial, por já possuir dentro de si a graça baptismal; em segundo lugar, a penitência só pode ser única se é visível por meio de um acto eclesial; em terceiro lugar, se o Tertuliano montanista nega a remissão de alguns pecados é porque a reconciliação se realiza num contexto eclesial. O único motivo pelo qual ele não permite que os impuros sejam admitidos à penitência eclesial é porque esta implica a remissão da parte da Igreja. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 541-545; C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 20-21. 110 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 22; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 51. 111 C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 22: «Remarquons d’ailleurs que Tertullien lui-même, non sans quelque embarras, remet à la miséricorde de Dieu les grands pécheurs à qui il refuse la réconciliation ecclésiastique, et qu’en contradiction avec les principes montanistes eux-mêmes, il reconnaît aux évêques le pouvoir de réconcilier, sauf à restreindre ce pouvoir aux fautes de moindre importance. Ni avant Tertullien, ni après lui, semblables distinctions ne se retrouvent». Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 2, 3, 4, 7, 18, 19, 21, in PL 2, 983-1026. Poschmann confirma este parecer, cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 48-49.


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com a nomenclatura posterior de pecados veniais112. Elabora igualmente listas de pecados graves: idolatria, blasfémia, homicídio, adultério, fornicação, falso testemunho, engano, mentira, espectáculos do circo e do estádio113. A tríade idolatria, assassino e adultério não são exclusivos nos elencos apresentados pelo nosso autor. Contudo, esta esquematização teve uma grande influência nas Igrejas dos séculos IV e V para a regulamentação penitencial, enquanto matéria exclusiva da penitência114. Todos os pecados mortais são irremissíveis para o Tertuliano montanista. Mas esta concepção é uma inovação que não encontramos na Igreja antiga115. Ao concluir, seguimos a opinião de K. Rahner116 no que diz respeito aos efeitos da penitência. Por um lado, a penitência restabelece a paz com a Igreja117. Por outro, remite a culpa para com Deus118. A relação entre ambas explica-se com dois argumentos. Em primeiro lugar, há que ter em conta a eficácia salvífica da oração da Igreja. Se a Igreja implora o perdão de Deus, não deixa de ser atendida119. Em razão da dignidade da oração de Cristo operante na Igreja, esta teoria justifica o ca———————— 112 113

Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 19, in PL 2, 1017-1020. Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 19, in PL 2, 1017-1020; De spectaculis, III, in PL 1, 707-709; XIX, in PL 2, 726-727; Adversus Marcionem, IV, 9, in PL 2, 374-377; De baptismo, IV, in PL 1, 1312. 114 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 48-49. 115 Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 5; 12, in PL 1, 987-989, 1001-1002. Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 23-24; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 526532. Este último autor realiza uma subdivisão da matéria: por um lado, situam-se os pecados graves como os capitais e os mediocria delicta, para os quais é obrigatória a penitência eclesial e, por outro, os delicta cotidianae incursionis que se remitem sem penitência eclesial. É interessante notar, como Rahner, que o elenco de pecados mortais é mais extenso no período católico de Tertuliano, visto que no seu período montanista todos os pecados graves não podem ser remitidos e por isso são naturalmente reduzidos. No entanto, convém ter em conta que, na prática, a celebração da penitência-excomunhão era mais reduzida que em teoria. Muitos tentam evitar a penitência pública ou adiam-na. 116 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 552-571. 117 Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 1, 21, in PL 2, 983; 3, 4-5, in PL 2, 986; 10, 11, in PL 2, 1000; 12, 11, in PL 2, 1002; 13, 11, in PL 2, 1004; 15, 5-6, in PL 2, 10091010. 118 Cf. TERTULIANO, De poenitentia, 7, 14, in PL 1, 1352; 10, 8; De pudicitia, 2, 15, in PL 2, 984; 3, 1, in PL 2, 985; 4, 1, in PL 2, 986; 10, 14, in PL 2, 1000; 12, 10, in PL 2, 1002. 119 Cf. TERTULIANO, De poenitentia 10, 6, in PL 1, 1356; De pudicitia, 5, 14, in PL 2, 988-999; 13, 10, in PL 2, 1004; 18, 13, in PL 2, 1016.


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rácter sacramental da penitência. Em segundo lugar, encontra-se em Tertuliano a teoria da remissão dos pecados. A Igreja, e mais concretamente o bispos, em nome e representação de Deus, remitem os pecados120. Toda a Igreja é envolvida na reconciliação do pecador. O elemento intermédio entre a Igreja e Cristo é o próprio penitente, no qual estão presentes ambas as realidades. Por isso, toda a penitência, no seu aspecto pessoal e comunitário, acto do homem e da Igreja, é um processo unitário. b) Testemunhos extra africanos Santo Ireneu de Lião (†202) não opõe obstáculo à reconciliação dos hereges desde que se arrependam121. Deus dá a paz e a amizade aos que fazem penitência e se convertem122. Contudo, recomenda que não se estabeleçam relações com os pecadores123, uma espécie de excomunhão para o bem dos fiéis. A expressão exomologesis é entendida como um exercício permanente da penitência124. Ainda que não se possam encontrar exemplos de reconciliação, nada prova que não existissem. A prática atestada por outras Igrejas demostra esta readmissão125. O papel da Igreja é indispensável neste processo. Os presbíteros devem educar os costumes e praticar a correptio, para infligir a excomunhão126. Em Hipólito de Roma (†235), manifesta-se esta tendência rigorista que se fazia sentir na cidade eterna. Hipólito lamenta-se de que o Papa Calisto (217-222) admita sem discernimento à reconciliação os adeptos das seitas. Hoje somente se sabe que Calisto era benevolente para com os adversários de Tertuliano. Contudo, é difícil avaliar a medida da se————————

120 Cf. TERTULIANO, De pudicitia, 1, 6, in PL 2, 981; 3, 3, in PL 2, 986; 21, 5, 7, 9, 17, in PL 2, 1023-1026. 121 Cf. IRENEU, Adversus haereses, I, 13, 3, in SCh 264, 192-197. 122 Cf. IRENEU, Adversus haereses, IV, 40, 1, in SCh 100, 974. 123 Cf. IRENEU, Adversus haereses, I, 16, 3, in SCh 264, 260-264. 124 Cf. IRENEU, Adversus haereses, I, 13, 5, in SCh 264, 200. No contexto das mulheres seduzidas pelos gnósticos, mas que permanecem no seio da Igreja, Ireneu não hesita e afirma claramente a necessidade da penitência: «post deinde cum magno labore fratres eam convertissent, omne tempus in exomologesi consumavit, plangens et lamentans ob hanc quam passa est ab hoc mago corruptelam». Casos semelhantes podem ser encontrados em Adversus haereses I, 13, 7, in SCh 264, 204; III, 4, 3, in SCh 211, 50-52. 125 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 51-53. 126 Cf. IRENEU, Adversus haereses, IV, 26, 3-4, in SCh 100, 720-726; 27, 4, in SCh 100, 746-754.


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veridade de Hipólito para com os adúlteros, idólatras e assassinos127. A recusa da doutrina de Calisto mostra que a Igreja acolhia pecadores arrependidos que tinham expiado a sua falta128. Na famosa Traditio Apostolica, o autor admite o princípio de remissão dos pecados. Na oração de consagração episcopal confere-se a potestatem dimittere peccata transmitido aos Apóstolos129. Deste modo, o autor admite e aprova a prática do poder eclesiástico de remissão130. A história da penitência do Confessor Natálio (†202 ou 203), transmitido por Eusébio de Cesareia131, é mais instrutivo. Natálio, depois de ter apostatado e servido a heresia de Teodoto, foi conduzido ao arrependimento de forma miraculosa e reintegrado na comunidade pelo papa Zeferino. Este acontecimento, embora não seja citado por Hipólito, mostra como em Roma era usada a penitência associada à reconciliação de um delito tão grave como a heresia132. c) Cipriano de Cartago Cipriano de Cartago (†258) e o Papa Cornélio (†255) governam a Igreja num momento particularmente difícil, sob a perseguição de Décio em 250. No aspecto penitencial, a questão mais importante a considerar era a de reconciliar ou não os lapsi. Segundo alguns autores, Cipriano e o Papa Cornélio teriam sido os primeiros a reconciliar os apóstatas. Contudo, segundo outros, esta afirmação não é historicamente confirmada. A Igreja nunca conheceu pecados irremissíveis. Esta ideia só se encontra em Tertuliano e no montanismo. Antes de Cipriano, a apostasia não foi tida em princípio como irremissível133. O especí———————— 127 128

Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 53. Cf. HIPÓLITO de Roma, Philosophoumena, IX, 11, in PG 16, 3377-3380. Este tratado também chamado Omnium Haeresum Refutatio, não é obra de Orígenes como aparece em PG 16, III, mas de um clérigo romano que se negou a reconhecer a eleição do Papa Calisto em 217 e que se formou na Igreja rival. Cf. P. NAUTIN, «Hipolito», 1042. 129 Cf. HIPÓLITO de Roma, Traditio Apostolica, 3, in B. BOTTE, La Tradition Apostolique, 8-10: «Da, cordis cognitor pater, super hunc servum tuum, [...] spiritum primatus sacerdotii habere potestatem dimittere peccata secundum mandatum tuum, [...] solvere etiam omnem collegationem secundum potestatem quam dedisti apostolis». 130 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 53. 131 Cf. EUSÉBIO DE CESAREIA, Historia Ecclesiastica, V, 28, in PG 20, 514. 132 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 54-55. 133 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 24-25.


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fico em Cipriano é que instrui as comunidades de Roma e de Cartago contra uma reconciliação apressada134, mas nunca se põe em causa a remissibilidade destes casos. Inclusivamente, no caso limite dos moribundos, a regra era a de lhes dar a reconciliação135. Mais tarde este pretenso laxismo, que não era mais que a indulgência tradicional, serviu de arma aos novacianos contra o Papa Cornélio136. Depois dos primeiros meses de perseguição, alguns cristãos quiseram reentrar na comunhão da Igreja, mas, como Cipriano estava fora de Cartago137, alguns dos que sofreram a tortura e a prisão, martyres, ao recuperarem a liberdade, tornaram-se intercessores a favor da readmissão dos lapsi, elaborando cartas de paz em que se pedia a sua comunhão com a Igreja138. Cipriano repete continuamente nas suas cartas que somente o bispo tem o poder de readmitir os apóstatas à comunhão eclesial, convidando os martyres e confessores à prudência no atribuir cartas de paz a apresentar ao bispo ou, na sua ausência, ao corpo presbiteral. Cipriano escreve então três cartas aos mártires e confessores (Ep. 15), ao clero (Ep. 16) e a toda a comunidade de Cartago (Ep. 16), pretendendo corrigir a situação. Contudo, os presbíteros que governavam a Igreja de Cartago na ausência de Cipriano não foram capazes de controlar os instantes pedidos dos lapsi. Segundo os nossos conhecimentos actuais, seria excessivo estabelecer a origem dos penitenciários menores medievais nos mártires e con———————— 134

Cf. CIPRIANO, Ep. 16, 2, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 170-173; Ep. 17, 3, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 178-179; De lapsis, 16, in PL 4, 493: «ante expiata delicta, ante exomologesim factam criminis». 135 No caso dos doentes, deve-se vir em sua ajuda com a concessão da paz e confiar a Deus quid de talibus faciat et de qualiter iudicii sui examinet pondera, porque a dura credulitas não é menos condenável que a prona facilitas. Cf. CIPRIANO, Ep. 30, 8, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 236-237. 136 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 25. 137 A saída de Cipriano de Cartago tinha surpreendido o clero de Roma, por isso Cipriano teve de justificar a sua ausência, não abandonando o seu ofício. As cartas desta altura ajudam-nos a compreender as relações entre Cartago e Roma e comprovam a existência de uma comum prática penitencial. Cf. CIPRIANO, Ep. 20; 27; 30; 31; 33; 34; 35; 36; 43; A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 66-108. 138 O sofrimento suportado pelos mártires e confessores podia ser entendido como substitutivo da penitência que os lapsi deveriam realizar. Reconhecia-se a força da sua intercessão e a honra adquirida no seio da Igreja, por vezes superior à do próprio bispo. Deste modo, alguns presbíteros, na ausência de Cipriano, admitiam alguns lapsi à comunhão sem que estes tivessem realizado a respectiva penitência. Cf. A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 47.


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fessores que entregavam aos lapsi os libelli pacis. Contudo, existe alguma analogia por defeito entre os lapsi dos primeiros tempos com os peregrinos penitentes da Idade Média139. Em Março de 251, a perseguição de Décio abrandou e, depois de 15 meses de ausência, Cipriano regressou a Cartago e aí celebrou um concílio reportado no seu «De lapsis»140. Reuniu cerca de sessenta bispos e a assembleia confirmou a excomunhão de Felicíssimo. Foram condenados os abusos de concessão do perdão. Distinguiram-se os vários tipos de penitentes. Os casos menos graves fariam uma penitência menor, enquanto que os lapsi deveriam fazer penitência longa e a comunhão com a Igreja só lhes seria concedida em perigo de morte, excepção também feita aos libellatici, desde que nada se opusesse à sua plena reintegração141. Esta poenitentia plena só seria determinada depois de um exame das causae et voluntates et necessitates singulorum142. Esta medida, tida por alguns como demasiadamente rigorista, conduziu ao cisma de Novato e Felicíssimo. As decisões sinodais foram enviadas ao Papa Cornélio, reconhecendo-o como Bispo de Roma e excomungando ———————— 139 140

Cf. F. TAMBURINI, «La Pénitencerie Apostolique», 458-459. Sinteticamente, neste texto podem-se delinear os seguintes elementos: a participação nos sacrifícios idolátricos, a aquisição do libelo, a intenção de cumprir uma e outra coisa são três modalidades do mesmo pecado. A primeira forma tem a agravante do escândalo público. Para cometer o pecado, não se requer o acto externo. Por isso também o pensamento pecaminoso deve ser confessado. Em segundo lugar, as obras penitenciais que o penitente tem de cumprir exprimem a consciência da gravidade da culpa e do bem perdido, uma satisfação para com Deus pelo pecado. Em terceiro lugar, o caminho penitencial é sustentado pela certeza do amor paterno e misericordioso de Deus. A Igreja solicita a conversão dos pecadores anunciando o amor de Deus e concedendo o perdão dos pecados e consequente comunhão. Cf. CIPRIANO, De Lapsis, in PL 4, 477-510; CONC. DE CARTAGO (251), in PL 3, 875-876; A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 130. 141 Cf. CIPRIANO, Ep. 55, 17, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 42-45. 142 Apesar da sua defesa doutrinal da poenitentia plena, encontra-se nas suas cartas grande variedade de duração e publicidade. Por exemplo, prevê-se a imediata restituição da comunhão a um diácono e a uma virgem, que conviveram sem terem relações se-xuais. Tratam-se diversamente os libellatici e sacrificati. Em perigo de morte, os sacrificati são reconciliados imediatamente. Os heréticos são reconciliados imediatamente em alguns casos. Contudo, o esquema de penitência é sempre o mesmo. Cf. CIPRIANO, Ep. 4, 4, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 100-103; Ep. 55, 6, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 32-33; Ep. 55, 11, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 38-39; Ep. 57, 1, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 64-65; Ep. 59, 16, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 112-115; Ep. 64, 1, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 162-163; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 701-705.


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Novaciano. Em Roma, o Papa Cornélio aprovou as decisões de Cipriano143. Contudo, Novaciano, ferido por não ter sido eleito bispo de Roma, endureceu a sua posição não admitindo os lapsi nem sequer em perigo de morte. Esta sua ideia de limpeza nos membros da Igreja – kataroi – fascinava muitos adeptos. Nestas circunstâncias, Novato e Novaciano uniram-se, mas o cisma não teve sucesso. Cipriano e Cornélio prevaleceram sobre os dois cismas. Em 252, difundiu-se por todo o império uma terrível peste. Os cristãos foram acusados de serem a causa e o imperador Gallo ordenou sacrifícios a Apolo Salvador. Perante esta nova perseguição, Cipriano reuniu de novo um concílio com quarenta e dois bispos144. A assembleia decidiu admitir à penitência todos os lapsi que tinham feito penitência pública e não só os enfermos145, porque «nunc non infirmis, sed fortibus pax necessaria est, nec morientibus, sed viventibus comunicatio a nobis danda est»146. A razão era dupla, teológica, porque se baseava em Mateus 16, 19, que confere à Igreja o poder sacramental, e pastoral, para não privar os lapsi da comunhão eclesial. Deste modo, altera-se a prática penitencial a nível disciplinar147. No que diz respeito à prática penitencial, Cipriano segue a penitência pública tradicional com algumas especificações. A partir da sua carta a Pompónio, bispo de Dionysiana, que se lhe tinha dirigido apresentando o caso das virgens subintroductae, pode-se fazer uma reconstituição da prática penitencial. Estas virgens consagradas coabi————————

143 Convém notar que a autoridade episcopal está em comunhão com o bispo de Roma, sinal da unidade das Igrejas. Na verdade, é o Papa Cornélio que aprova a linha penitencial adoptada por Cipriano e dá as indicações a seguir. Cf. A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 172-173; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 84-89. 144 Cf. CONC. DE CARTAGO (252), in PL 3, 877-888; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 90-92. 145 Cf. A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 37-41; B. LLORCA, Historia de la Iglesia Católica, 302-303. Esta aperente contradição de que foi acusado Cipriano é explicada por Poschmann: «Cette nouvelle prescription ne contredit par le conséquent, pour Cyprien, aucunement la precedente, mais, au contraire, ne sort pas du cadre de celle-ci. Ce n’est pas la quaestio juris qui est posée, à savoir s’il est fondé de donner la paix déjà au vivant, mais la quaestio facti, à savoir si, maintenant déjà, il est permis de le faire. Mais, si on peut dispenser les mourants de la paenitentia plena, on peut le faire également pour le vivants dans le cas de situation désespérée». Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 56-57. 146 CONC. DE CARTAGO (252), 2, in PL 3, 883. 147 Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 91-92.


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taram com alguns homens, faltando deste modo à sua consagração148. Cipriano responde então a Pompónio, intervindo com firmeza e proibindo tal coabitação, fundamentando-se na tradição apostólica e evangélica149. A penitência pública segue em Cipriano o mesmo processo da tradição: exclusão do pecador da comunhão eclesial por meio do ministro da penitência, a aceitação da parte do pecador em realizar um período de penitência150, a confissão dos pecados – exomologese151 – e a readmissão pública na Igreja por meio do ministro da penitência que impõe a mão152. Esta prática aplica-se aos casos graves, como a renega———————— 148

Cf. CIPRIANO, Ep. 4, 4, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 100-101: «Et idcirco consulte et cum vigore fecisti, frater carissime, abstinendo diaconum qui cum virgine saepe mansit, sed et ceteros qui cum virginibus dormire consueverant. Quod si paenitentiam huius illiciti concubitus sui egerint et ab se invicem recesserint, inspiciantur interim virgines ab obstetricibus diligenter, et si virgines inventae fuerint, accepta communicatione ad ecclesiam admittantur hac tamen interminatione, ut si ad eosdem masculos postmodum reversae fuerint aut si cum isdem in una domo et sub eodem tecto simul habitaverint, graviore censura eiciantur nec in ecclesiam postmodum tales facile recipiantur. Si autem de eis aliquae corruptae fuerint deprehensae, agant penitentiam plenam, quia quae hoc crimen admisit non mariti sed Christi adultera est, et ideo aestimato iusto tempore postea exomologesi facta ad ecclesiam redeant». Um caso semelhante encontra-se na carta a Rogaciano. Cf. CIPRIANO, Ep. 13, 5, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 154-155. 149 Cf. CIPRIANO, Ep. 4, 1, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 96-97. 150 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 575: «Il paenitentiam agere consiste nelle opere di penitenza [...] cioè nel pregare, digiunare, rivestire l’abito caratteristico dei penitenti, astenersi dai bagni e dai divertimenti, vegliare, dormire su duro letto, fare ellemosine, ecc. Queste opere penitenziali, in quanto eseguite per sollecitazione della Chiesa, per loro natura si manifestano nella vita publica della Chiesa». 151 De um modo estrito, a exomologese significa em Cipriano, como em Tertuliano, o acto litúrgico que se tem de cumprir na presença do bispo, do clero e da comunidade antes da reconciliação, e concluía-se pelo gesto da imposição das mãos, atestado pela primeira vez por Cipriano. Cf. CIPRIANO, Ep. 13, 1, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 164-165; Ep. 16, 2, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 164165; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 59. 152 Cipriano é o primeiro no Ocidente a testemunhar que a reconciliação acontecia por meio da imposição da mão da parte do bispo e do clero. Não é claro sabermos hoje de um modo unitário e claro que significado tem esse gesto no seu tempo. Contudo, esse distinguia-se daquele da confirmação, mas não se sabe se se tratava de um novo conferimento do Espírito Santo ou de uma oração exorcismal. O que é seguro é que assim como na reconciliação é restituído o dom da graça, assim também esta restituição é feita por meio da imposição da mão, porque este gesto significa a transmissão daquilo que possui quem impõe a mão e se realizava quando se conferia a graça pelo baptismo. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 580-606.


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ção da fé e o adultério153. A partir dos textos, manifesta-se como Cipriano nos transmite uma teologia e uma prática penitencial já consolidadas154. A inovação da prática penitencial acontece somente ao nível disciplinar, no sentido em que a administração litúrgica da penitência é regulada por intervenções conciliares155. O bispo de Cartago elabora a teologia da penitência a partir do baptismo, mas, ao contrário deste em que se remite o pecado por um acto de graça, a penitência deve merecer o perdão. Em Cipriano, não existe a distinção nítida entre reatus culpae e reatus poenae, assim como entre pecado e excomunhão156. Deste modo, o arrependimento subjectivo tem de se traduzir em actos concretos de penitência157. Por isso, é necessário realizar a penitência para a reconciliação, senão é uma «irrita et falsa pax, periculosa dantibus et nihil accipientibus profutura»158. O pecado grave é considerado sob o aspecto eclesial porque separa o homem da Igreja, da sua paz e da Eucaristia. A não pertença à Igreja não é um simples acto de excomunhão do bispo. Para Cipriano, a exclusão da Eucaristia é consequência do pecado, mesmo oculto159. Com a reconciliação ———————— 153

Em primeiro lugar, eram submetidos à penitência pública os pecados contra a fé, mesmo ocultos, como a apostasia, o cisma e a insubordinação contra a autoridade eclesiástica. Os casos dos libellatici e sacrificati deviam ser considerados serenamente e julgados com clemência. Em segundo lugar, são também objecto de penitência o concubinato e convivência ilícita dos celibatários, impudicícia, divórcio, frequência de casas equívocas, fraudes. Parece que o ternário idolatria, adultério e fraude são pecados obrigatoriamente submetidos à penitência eclesial. Por vezes, a penitência pública é também aplicada aos peccata minora, para os quais basta uma satisfação ligeira para a reconciliação. Cf. CIPRIANO, Ep. 4, 4, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 100-103; Ep. 16, 2, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 172-173; Ep. 59, 14. 15, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 108-113; Ep. 55, 20. 26, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 46-55; Ep. 66, 9, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 184-185. Os estudiosos confirmam este processo. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 619; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 59-60. 154 Cf. A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 28-37. 155 Cf. A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 172. 156 Por causa disso e também por motivos dogmáticos, litúrgicos e históricos não existe em Cipriano a distinção entre penitência pública e privada. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 683-698. 157 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 631-635. 158 Cf. CIPRIANO, De lapsis, 15, in PL 4, 492. 159 Cf. CIPRIANO, De lapsis, 15, in PL 4, 25-26; Ep. 15, 1, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 164-167; 16, 2, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 170-173; 57, 4, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 68-71; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 616-618: «Perciò per Cipriano è evidente che chi offende lo Spirito della


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eclesiástica, o penitente recebe o Espírito do Pai, penhor de vida160. Deste modo, a Igreja é ministra do perdão dos pecados e age através dos seus bispos161, que remitem o pecado libertando o pecador da morte e readmitem à comunhão da Igreja, fixam os tempos, vigiam e conduzem os penitentes162. O juízo do bispo é a sentença em que é restituída a plena comunhão com a Igreja. Tal poder fundamenta-se no poder de ligar e desligar de Mateus 16 e 18, que em Cipriano consiste na relação do homem com a Igreja163. Numa das suas cartas, Cipriano afirma claramente «nec ad communicationem venire quis possit, nisi prius illi ab episcopo et clero manus fuerit imposita»164. A penitência é necessariamente pessoal e eclesial165. Não se trata de um acto somente jurídico ou exterior, mas um garante do perdão divino e do acesso à vida eterna166. ————————

Chiesa offende anche la Chiesa e si separa ugualmente da ambedue, como sono intimamente connessi il rinovo della pace con la Chiesa e la recezione dello Spirito». 160 Cf. CIPRIANO, Ep. 55, 13, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 38-39; Ep. 57, 4, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 68-69. 161 A paz concedida ao penitente é dom da Igreja e só pode ser conferida com autoridade pelo bispo, seu representante. Na verdade, somente este tem o poder de ligar e desligar (Ep. 57, 1, 64-65; 30, 1, 226-227) e é ad tempus iudex vice Christi (Ep. 59, 5, 94). O bispo é o principal ministro da penitência, mas não se exclui a acção de outros ministros. Deste modo, a penitência é uma acção eclesial, tendo em conta que o bispo conta com a intercessão de confessores e mártires, com o consenso do povo e com a comparticipação do clero. Visto que os presbíteros estavam associados ao bispo na administração do perdão, não foi difícil conceder-lhes esta faculdade. Mais difícil de aceitar é a participação dos diáconos na reconciliação. Contudo, é uma concessão limitada no tempo e não mais reiterada, que se pode explicar pelo carácter arcaico da penitência no século III. Cf. CIPRIANO, Ep. 61 3, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 130-131; Ep. 18, 1, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 180-181; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 622; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 59; A. CARPIN, «La penitenza tra rigore e lassismo», 172-173. 162 Cf. CIPRIANO, Ep. 55, 13, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 38-39; Ep. 64, 1, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 162-163; Ep. 66, 5, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 180-181. 163 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 650-653. 164 CIPRIANO, Ep. 17, 2, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 178. 165 Note-se que Cipriano apresenta a Igreja como necessária para se ser cristão não só no aspecto externo, mas também no seu mistério e escatologia. Frases suas como «salus extra Ecclesiam non est» (Ep. 73, 21, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 270-271), ou «christianus non est, qui in Christi Ecclesia non est» (Ep. 55, 24, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 54-55), ou «habere non potest Deum patrem, qui Ecclesiam non habet matrem» (De unitate ecclesiae, 6, in PL 4, 519) são ilustrativas desta forte eclesiologia. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 664. 166 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 24-25.


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A reconciliação é um acto de toda a Igreja, que colabora com o pecador com a sua própria penitência, oração e a Eucaristia167, e quando é concedida manifesta-se na participação activa do sacrifício e no direito de receber a Eucaristia168. Portanto, a reconciliação, por meio da sentença judicial e da autoridade do bispo, tem uma importância essencial para a salvação e confere a graça e o Espírito Santo. A pax com a Igreja é o meio pelo qual se recebe o Espírito169. O perdere pacem é um perdere salutem170. Podem-se encontrar em Cipriano duas consequências permanentes da penitência. Alguns clérigos são demitidos do seu estado. Por exemplo, o presbítero Trofimo, que se converte do cisma, é readmitido em Roma somente como leigo, «ut laicus communicet»171. Cornélio estabelece que os penitentes não podem ser admitidos à «ordinatio cleri atque sacerdotalis honor»172. A segunda consequência de carácter disciplinar era a não reiteração da reconciliação eclesial173. d) Os Alexandrinos No Oriente, Clemente de Alexandria (†215) retoma a doutrina de Hermas relativa à segunda penitência não reiterável174. A repetição da penitência é rejeitada, porque as «penitências repetidas e alternativamente com novos pecados não são senão aparência de arrependimento»175. Restringe a remissão dos pecados apenas aos casos de ausência de contrição. Na verdade, nenhum pecado está objectivamente excluído ———————— 167

O bispo ora com as suas lágrimas pelo penitente, suplicando cada dia a plenissima pax e oferece o sacrifício pelos caídos. Cf. CIPRIANO, Ep. 43, 6, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 296-299; 59, 18, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 114-117. 168 Cf. CIPRIANO, Ep. 15, 1, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 164-167; 16, 2-3, in MORESCHINI I, 170-173. 169 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 663-666. 170 Cf. CIPRIANO, Ep. 36, 2, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 260-262. 171 Cf. CIPRIANO, Ep. 55, 11, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 38-39. 172 Cf. CIPRIANO, Ep. 67, 6, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 196-197; 72, 2, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 246-247. 173 Cf. CIPRIANO, Ep. 55, 21, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 48-49. 174 Cf. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Stromatum, 2, 13, in PG 8, 993-998; PASTOR DE HERMAS, Mandamento, IV, 3. Os estudos confirmam: B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 61-63; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 93-96; G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 88-89. 175 Cf. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Stromatum, 2, 13, in PG 8, 995.


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do perdão176. A penitência, ao contrário do baptismo, requer uma purificação dolorosa. A libertação do pecado, ou expiação, não se realiza num único acto, mas é um re-educação progressiva. Quem não se esforçou suficientemente deve continuar a sua purificação na eternidade. Os remédios contra o pecado são a oração, o jejum e as obras de caridade177. Clemente não fala expressamente da reconciliação do penitente, mas pode-se deduzir isso do caso da conversão do adolescente pelo qual um certo João se esforça para obter a salvação, com orações e jejuns repetidos, antes de retornar à Igreja178. A praxe eclesiástica que Clemente supõe será presumivelmente a usada na Igreja da época, como se pode aludir: «sunt enim quaedam partiales disciplinae quas vocant castigationes, in quas multi ex nostris qui in delicto fuerunt, ex populo dominico dilabentes incidunt»179. A aplicação desta disciplina eclesiástica é realizada pelos superiores enquanto pastores dos fiéis180. Clemente tem uma concepção médicopsicológica dos guias espirituais que acompanham o penitente no seu esforço de cura. A sua aptidão não advém somente da sua função eclesiástica, mas também da sua perfeição pessoal181. Contudo, o perdão eclesiástico não é total como o perdão divino. A reconciliação com a Igreja é um preâmbulo do perdão divino182. Com isso, Clemente não nega a direcção exterior da comunidade, mas insiste que o fruto do esforço depende da amizade com Deus183. ————————

176 Cf. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Quis dives salvetur, 38, in PG 9, 644-645; 42, in PG 9, 647-652; Stromatum, 2, 23, in PG 8, 1085-1098; 7, 16, in PG 9, 529546. 177 Cf. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Quis dives salvetur, 40, in PG 9, 646; Stromatum, 2, 12, in PG 8, 989-994; 15, in PG 8, 999-1010; 4, in PG 8, 13611364. 178 Cf. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Quis dives salvetur, 42, in PG 9, 647-653. 179 CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Stromatum, 7, 16, in PG 9, 542. Este texto é porém alusivo, porque o discurso fala de castigationes da providência que não são propriamente punições. Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 95-96. 180 Cf. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Paedagogus, 1, 6, in PG 8, 294-295; Stromatum, 2, 15, in PG 8, 1002-1003. 181 Cf. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Quis dives salvetur, 31, in PG 9, 635; 32, in PG 9, 638; 33, in PG 9, 639; 41, in PG 9, 646-647; Stromatum, 7, 12, in PG 9, 510; 13, in PG 9, 512-514. 182 Cf. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Quis dives salvetur, 40, in PG 9, 646. 183 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 62-63.


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Orígenes (†254)184 debruça-se abundantemente sobre a realidade moral do pecado e os meios para obter o perdão185. Embora a sua doutrina seja entendida como extraordinariamente rigorista186, coloca-se na tradição dos Padres que o precedem. A profundidade e extensão da sua reflexão permite-lhe ser considerado o primeiro teólogo sistemático da penitência. Orígenes não põe em causa a possibilidade da remissão dos pecados, mesmo os mais graves, depois do baptismo, através da penitência187. Distingue entre pecados mortais e não mortais188. Estes segundos não destroem a graça, nem separam o cristão da Igreja, ainda que o tornem menos perfeito. O pecado mortal, ao contrário, converte o cristão num membro morto, sem Jesus e o Espírito, excluído do Reino, incurável, o que não significa que não possa ser chamado de novo à vida189. Para os ———————— 184

Cf. É. AMANN, «I. La Pénitence Primitive», 767-769; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 63-69; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 707-876; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 96-107; G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos,

89-93.

185 O processo da penitência tem no seu conjunto uma visibilidade eclesial. Desenvolve-se em todos os sectores da realidade criada, no campo da acção da Igreja hierárquica, na Igreja enquanto comunhão íntima de graça, e na profundidade da liberdade moral do homem. O processo inicia-se com a tomada de consciência da presença de Deus, enquanto juiz fundamental; passa pela mediação da realidade criada da Igreja e da carne do homem, que repara pela punição e torna novamente à presença de Deus, fazendo receber o Espírito. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 856-857. 186 O perdão ou purificação do baptismo – ἄφεσις – opõe-se à expiação do pecado pela penitência. Por isso, as frases em que Orígenes exprime que não existe remissão do pecado depois do baptismo não impedem a penitência para obtenção do perdão. A expressão λαβεῖν ἄφεσιν τῶν ἀμαρτημάτων do baptismo corresponde a ἀπολαμβάνειν τὰ ἀμαρτἠματα, o perdão pelo baptismo pelo Espírito corresponde o baptismo pelo fogo (penitência). Mesmo para os grandes pecadores, a penitência é possível. Cf. ORÍGENES, In Jeremiam homilia, 16, 5, in PG 13, 445; 2, 3, PG 13, 282: «Forsitan et Jesus baptizat Spiritu sancti et igne: non quia eumdem in Spiritu sancto atque baptizet; sed quo sanctus baptizetur Spiritu sanctu, et is qui post fidem et magisterium Dei rursum ad scelera conversus est, cruciatu purgetur incendii». Portanto, Orígenes não aceita o montanismo e a ideia de uma Igreja de puros. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 63; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 97-99; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 833-841. 187 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 63-64. 188 Cf. ORÍGENES, De oratione, 28, in PG 11, 530. Neste texto, Orígenes enumera como pecados que conduzem à morte: idolatria, adultério, impudicícia, morte voluntária ou outro crime grave. 189 Cf. ORÍGENES, Contra Celsum, 3, 65, in PG 11, 1006; In Jesu Nave homilia, 6,


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pecados graves, sujeitos à excomunhão, existe a possibilidade de penitência, mas uma só vez190, ao contrário dos peccata communia191. O perdão é obtido pela penitência que é castigo medicinal, interitus carnis192, com a qual se realiza a purificação. Orígenes indica sete formas para obter o perdão: o baptismo, o martírio, a esmola, o perdão mútuo, a conversão, a caridade e a penitência eclesiástica193. Contudo, para a remissão das faltas graves, só é possível a penitência, com excepção do martírio194. A conversão não é obra humana, mas produz-se em virtude do amor de Deus195. É o Logos que cura, mas o homem deve assumir activamente a sua parte196. O pecado diz respeito a toda a Igreja. O caminho de purificação não é privado, mas toda a Igreja participa e reza por ele197. Embora exteriormente o pecador pertença à Igreja, está dela separado interiormente, e por isso o pecador é apenas expressão exterior da Igreja198, torna-se um «νομιζόμενος εἶναι ἀπὸ τῆς ἐκκλησίας»199. ————————

1, in PG 12, 853; In Leviticum Homilia, 4, 4, in PG 12, 437-438; 8, 7, in PG 12, 500; 11, 12, in PG 12, 531-533. 190 A única impossibilidade de penitência está no endurecimento do coração, não na carência do sacramento. O texto de De Oratione, 28, in PG 11, 530, foi interpretado como prova da não remissibilidade dos pecados capitais, mas na realidade trata-se de uma reacção de Orígenes contra uma prática disciplinar demasiadamente fácil. Na verdade, numerosos presbíteros remitem quer as faltas mais graves quer as mais ligeiras com a oração ou a correptio, evitando a penitência eclesiástica, a interitus carnis. Cf. ORÍGENES, In Leviticum Homilia, 15, 2, in PG 12, 562: «in gravioribus enim criminibus semel tantum paenitentiae locus»; Commentarium in Joannis, 19, 6, in PG 14, 570; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 64, 66-67; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 835-841. 191 No caso das faltas ligeiras, o perdão realiza-se por meio da correptio correctamente praticada, em que o “médico” condivide a expiação com o pecador e o ajuda. Contudo, não se pode provar que se trate da confissão sacramental diante do sacerdote. Cf. ORÍGENES, In Leviticum Homilia, 5, 3, in PG 12, 450-453; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 66. 192 Cf. ORÍGENES, In Leviticum Homilia, 4, 4, in PG 12, 438. 193 Cf. ORÍGENES, In Leviticum Homilia, 2, 4, in PG 12, 418. 194 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 65, nt. 2. 195 Existe em Orígenes uma distinção nítida entre a purgatio, ou remissão dos pecados, e o facto de obter o donum gratiae, com o conferimento do Espírito, per olei imaginem designatur. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 852. 196 Cf. G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 90. 197 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 104. 198 Há que ter em conta a concepção que Orígenes tem de Igreja. Nela distingue um estado exterior, dos sinais, e a dimensão espiritual, presente e operante neles e por meio deles. Estes dois estados estão em relação dinâmica e íntima de tal modo que a


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O processo penitencial do cristão pecador é por sua própria natureza eclesiológico. Queimado pelo fogo interior do Logos, o pecador procura antes de tudo o caminho da salvação, que é por identidade o caminho da Igreja, enquanto que esta se solidariza no Espírito com ele. Um e outro aspecto se visibilizam: o primeiro com o assumir do interitus carnis; o segundo com a admoestação, a oração, e a oferta do sacrifício200.

A excomunhão é o meio de que a Igreja se serve para salvar o pecador201, fundamentado no poder de atar que possui o bispo202, a que estão sujeitos todos os pecados mortais, mesmo os ocultos203. Contudo, ————————

perda da graça coloca em contradição não somente com a comunidade pneumática, dos homens unidos a Cristo, mas também com a Igreja visível. O anjo e o bispo participam da penitência. A hierarquia externa é também uma instituição divina. Nos casos singulares, a hierarquia interna deveria corresponder à externa, mas nem sempre é assim. Cf. ORÍGENES, In Jesu Nave homilia, 5, 6, in PG 12, 851: «in omnen Ecclesiam videtur delinquere, qui corpus suum maculaverit, quia per unum membrum macula in omne corpus diffunditur»; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 712-714, 777-781, 807-825. 199 ORÍGENES, In Jeremiam homilia, 15, 3, in PG 13, 432. 200 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 106: «Il processo penitenziale del cristiano peccatore è per la sua stessa struttura ecclesiologico. Bruciato dal fuoco interiore del Logos, il peccatore ricerca anzitutto infatti la via della salvezza, che è per identità la via della Chiesa, mentre questa solidarizza, nello Spirito, con lui. L’uno e l’ altro aspetto, poi, si visibilizzano: il primo come assunzione dell’interitus carnis; il secondo come ammonizione, preghiera, oferta del sacrificio». 201 O termo excomunhão em Orígenes não é técnico. Inclui tanto o tradere in interitum carnis, como a afflictio corporis. A excomunhão é a forma mais rígida da correptio ou κὀλασις. A expressão mais técnica para indicar a excomunhão é ligare ou δέειν. Cf. ORÍGENES, In Leviticum homilia, III, 2, in PG 12, 424-425; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 782-783. Confirma Poschmann: «outre la monition, la guérison nécessite la punition, qui au besoin, d’après la doctrine évangélique, peut aller jusqu’à l’excommunication»; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 63-64; 202 A exclusão do pecador faz-se «per episcopi sententiam», «per eos qui Ecclesiae praesident et potestatem habent non solum solvendi sed et ligandi». Deste modo, a penitência solene tem em Orígenes um efeito transcendente de reintegração na comunhão da graça e uma dimensão visível e por isso é sacramental. Somente na penitência pública com excomunhão é reconhecível um verdadeiro sacramento. Todos os outros actos da hierarquia em vista da remissão dos pecados não se podem chamar sacramentais, no sentido actual da palavra. Cf. ORÍGENES, In Leviticum Homilia, 14, 2, in PG 12, 553; 12, 6, in PG 12, 542-543; 14, 4, in PG 12, 558; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 65; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 844-876. 203 Também os pecados mortais ocultos estão sujeitos à excomunhão, embora Orígenes saiba que muitos pecadores, por falta de uma confissão espontânea, escapam à sentença do bispo. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 794-797.


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permanece na Igreja aquele que é excluído por uma sentença injusta204. O procedimento prévio a esta excomunhão era ou o da confissão espontânea ao médico espiritual205, que decidia se a excomunhão se devia impor, ou a admoestação do bispo quando tem conhecimento da falta, na presença de duas testemunhas ou da assembleia: a correptio ou confutatio. O bispo é ajudado por outros membros que advertem o pecador singularmente. Se a sua intervenção não tem efeito, devem denunciá-lo à Igreja206. Quando a admoestação não resulta, aplica-se a excomunhão, ficando o pecador fora da Eucaristia e da comunhão da Igreja207. A mediação da Igreja também se opera pela ajuda dos sacerdotes e de todos os cristãos, que colaboram na correcção e conversão dos irmãos, através da oração, do jejum e da prática das virtudes208. A excomunhão ti———————— 204

Na verdade, mesmo no caso de excomunhão injusta, Orígenes somente admite uma atitude, a de suportá-la com paciência. Por outro lado, a excomunhão que não é justificada não conduz no foro interno a nenhum dano para o excomungado. Cf. ORÍGENES, In Leviticum homilia, 14, 3, in PG 12, 556. «Se il giudizio del vescovo non è rectum, perchè non vi è stato peccato mortale, ne risulta una situazione, di cui Origene ci dà una descrizione molto delicata: Il condannato è in qualche modo “fuori”: depellitur et foras mittitur, però solo aparentemente: videtur expulsus, per cui non è impedito di restare “dentro”: intrus est». Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 789792, especialmente nt. 39. 205 Cf. ORÍGENES, In Psalmos homilia, 37, 2, 6, in PG 12, 1386: «si intellexerit et praeviderit talem esse languorem tuum qui in conventu totius Ecclesiae exponi debeat et curari, ex quo fortassis et caeteri aedificari poterunt, et tu ipse facile sanari, multa hoc deliberatione, et satis perito medici illius consilio procurandum est»; G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 90, nt. 42: «El obispo ejercía una función casi policíaca en relación a la salud espiritual de los fieles, sirviéndose de la ayuda de otros miembros de la comunidad. En casos de duda, debe consultarse a un médico “espiritual” experimentado». 206 Cf. ORÍGENES, In Leviticum homilia, 3, 2, in PG 12, 424. 207 Cf. ORÍGENES, In Leviticum homilia, 14, 2, in PG 12, 553-554: «Peccavit aliquis fidelium, iste etiamsi nondum abjiciatur per episcopi sententiam, jam tamen per ipsum peccatum quod admisit, ejectus est; et quamvis intret ecclesiam, tamen ejectus est, et foris est segregatus a consortio et unanimitate fidelium». 208 Cada cristão, na medida da sua fé inspirada e da sua relativa isenção do pecado, participa nesse acto. Cada cristão deve converter os irmãos e curar as chagas dos vícios e pecados. Partilham as suas lágrimas e sofrimentos com os pecadores: disciplina dos condolenti e compatiendi. Por isso, absolver os pecados é uma acção mais vasta que a absolvição oficial. Toda a Igreja se torna pecadora pelos pecados de um membro e os expia consigo. Cf. ORÍGENES, In Leviticum homilia, 5, 3, in PG 12, 450453; In Psalmos homilia, 37, 2, 6, in PG 12, 1386; Selecta in Psalmos 29, 3, in PG 12, 1292; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 818-819.


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nha assim uma solenidade litúrgica que naturalmente feria a honra do pecador209. A duração da penitência dependia quer da gravidade do pecado, quer da necessidade de provas da parte do pecador da sua conversão perante a comunidade. Normalmente, era um período mais longo que o catecumenado e não reiterável210. Durante este tempo, o pecador era excluído da Eucaristia e do culto religioso. Na verdade, a excomunhão apenas manifesta oficialmente o que já aconteceu aos olhos de Deus: a separação da Igreja no foro interno211. A reconciliação212 – desligar213 – realiza-se depois de cumprida a penitência, sendo o ministro da mesma o bispo214. O rito consta da imposição das mãos e de diversas invocações215. Como efeito, o ministro, cheio do Espírito, perdoa somente o que Deus perdoaria216, desde que a penitência seja cumprida. Mas isso não significa que o perdão sacerdotal não tenha nenhuma influência sobre o perdão divino, visto que Orígenes dá uma grande importância à pertença à Igreja, pois para ele é um opróbio estar separado do povo de Deus e da Igreja217. Portanto, ———————— 209 210

Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 800-801. Segundo Orígenes, um penitente que sai do povo de Deus não pode «rursum per poenitentiam reverti»: ORÍGENES, Contra Celsum, 3, 51, in PG 11, 987; In Ezechielem homilia, 3, 8, in PG 13, 694-695. 211 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 802-807. 212 Cf. ORÍGENES, In Psalmos homilia, 36, 4, 2, in PG 12, 1353: «ad ecclesiam redire». 213 Na função de desligar, há-que distinguir duas funções. Uma diz respeito à actividade pastoral e mediadora que o sacerdote partilha com os leigos, que também podem ser directores espirituais. Outra é o acto do perdão eclesiástico que se realiza na reconciliação em virtude da função específica. Esta é associada em Orígenes à santidade pessoal. Tal elemento permite ver no alexandrino uma alta estima pela função episcopal, que o faz criticar os pontífices indignos. No entanto, ele reconhece como privilégio do bispo a excomunhão e reconciliação. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 67-68. 214 Cf. ORÍGENES, In Judicum homilia, 2, 5, in PG 12, 961. 215 Cf. ORÍGENES, In Leviticum homilia, 2, 4, in PG 12, 419. 216 Cf. ORÍGENES, De Oratione, 28, in PG 11, 528: «ἄφεσιν ἄ ἐὰν ἀφῆ ὀ Θεὸς»; É. AMANN, «I. La Pénitence Primitive», 767. 217 ORÍGENES, In Ezechielem homilia, 10, 1, in PG 13, 740: «Infamia est a populo Dei et Ecclesia separari». Noutra passagem ele acentua esta convicção: «Ego vero quia opto esse ecclesiasticus, et non haeresiarcha aliquo, sed a Christi vocabulo nuncupari, et habere nomen quod benedicitur super terram, et cupio tam opere quam sensu et esse et dici Christianus». Cf. ORÍGENES, In Lucam homilia, XVI, in PG 13, 1841.


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a reconciliação tem um efeito real na remissão dos pecados e com essa o pecador readquire a sua verdade eclesial. O interesse de Orígenes está centrado no esforço interior, moral, em vista da libertação do pecado, por isso insiste na função sacerdotal de médico das almas, ou director espiritual218. Contudo, os reconciliados eram considerados cristãos com direitos diminuídos, pois não podiam assumir já encargos eclesiásticos219. A doutrina de Orígenes apresenta-nos deste modo a penitência como um sacramento relacionado e distinto do baptismo. Excomunhão e reconciliação constituem um mesmo acto de graça ordenado a reconduzir o pecador para o lugar da graça que é a Igreja220. Dionísio de Alexandria (†264), discípulo de Orígenes, confirma a doutrina do mestre e a sua posição em matéria penitencial é muito semelhante à de Cipriano na sua relação com os lapsi e na comunhão com o Papa Cornélio. Readmite igualmente os apóstatas, depois de uma conversão sincera e uma penitência longa de três a seis anos. No caso de perigo de morte, a readmissão é dada a todos. Na carta a Fábio de Antioquia221, conta-se o caso de Serapião, que, depois de renegar a sua fé, se esforçou em vão para ser readmitido à penitência. Em perigo de morte, Serapião enviou de noite o pedido para que fosse absolvido o seu pecado. Encontrando-se o sacerdote também doente, fez levar a Eucaristia por meio de uma criança. Dionísio defende que Serapião vivera muito tempo para que fosse absolvido. Portanto, a absolvição foi produzida pelo dom da Eucaristia, expressão da comunhão e da reconciliação222. Gregório Taumaturgo (†270), também discípulo de Orígenes, atesta a existência de vários degraus de penitentes: os flentes, os audientes, os substrati e os consistentes. Os primeiros permaneciam fora ou ao fundo da Igreja, vestidos de saco, mendigando orações àqueles que entravam. Os segundos tinham acesso à Palavra de Deus e eram despedidos com os catecúmenos no início da liturgia eucarística. Os terceiros podiam participar em toda a liturgia eucarística, de joelhos ou prostrados, mesmo ao domingo. Os últimos participavam na Eucaristia de pé, mas sem ———————— 218 219 220 221 222

Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 68. ORÍGENES, Contra Celsum, 3, 51, in PG 11, 987. Cf. G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 92. Cf. EUSÉBIO DE CESAREIA, Historia Ecclesiastica, VI, 44, in PG 20, 629-634. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 69; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 107-108.


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tomar parte no ofertório ou na comunhão223. Esta Epistola Canonica é de uma grande importância para o desenvolvimento da disciplina canónica no oriente, porque supõe a gradualidade da penitência eclesiástica, desde a exclusão total da assembleia litúrgica até à readmissão completa. As prescrições de Gregório têm em conta as diversas situações: os que comeram comidas pagãs, as mulheres que sofreram violência, os cristãos que se aproveitaram da sua situação para obter vantagens económicas ou colaboraram com os pagãos provocando danos a outros. Deste modo, os responsáveis das comunidades deveriam inquirir os diversos casos e tomar as medidas necessárias224. 2.2.2 Documentos normativos a) Didascalia Apostolorum Este documento provém da Síria dos finais do século III e fornece à penitência elementos preciosos. No livro II, são enumerados os deveres dos bispos e as obrigações e direitos dos pecadores. O capítulo XVI do mesmo apresenta um embrião do ritual penitencial225. A teologia do pecado não é muito precisa, apresentando diversos graus de culpa. O pecado mortal faz perder a vida do Espírito226, e com a sua acção o pecador separa-se da Igreja e também a mancha. Contudo, a remissibilidade de todos os pecados é uma certeza227. Todos os ———————— 223

GREGÓRIO TAUMATURGO, Ep. Canonica, c. 11, in PG 10, 1048: «Fletus seu luctus, est extra portam oratorii, ubi peccatorum stantem oportet fideles ingrediendes orare, ut pro se precentur. Auditio est intra portam in porticu, ubi oportet cum qui peccavit, stare, usque ad cathecumenos, et illinc egredi. Audiens enim, inquit, Scripturas et doctrinam, ejiciatur, et precatione indignus censeatur. Subjectio autem seu substratio est, ut intra temple portam stans, cum catechumenis egrediatur. Congregatio seu consistentia est, ut cum fidelibus consistat, et cum cathecumenis non egrediatur; prostremo est participatio sacramento rum». 224 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 69-70; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 109-110. 225 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 484; P. NAUTIN, «Didascalia de los Apostoles», 595. 226 Cf. Didascalia Apostolorum, 1, 8, 18, 24. 227 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 487: «La Didascalia dichiara esplicitamente la remissibilità di tutti i peccati, quando c’è pentimento. Il peccato mortale incurabile va perciò concepito come in Origene: il peccato che ha indotto l’estinzione della grazia e quindi si presenta incurabile in partenza, cioè tale, che non si puo impedire che causi la morte». Isto é confirmado na fonte: Didascalia Apostolorum, 2, 4, 3, 36; 10, 1, 44; e em outros estudos: G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 112-113.


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pecadores contritos podem ser de novo reconciliados com Deus228. O âmbito dos pecados sujeitos à excomunhão é muito vasto e expresso com normas práticas229. Mesmo os pecados julgados pelas leis civis, como o furto ou o assassínio, devem ser excomungados oficialmente pela Igreja230. Convém notar que a Didascalia é generosa no elenco de casos de excomunhão, visto que ignora a unicidade da reconciliação231. A excomunhão é o meio pedagógico mais forte que o bispo pode aplicar com ponderação aos pecados mais graves e somente quando a admoestação for ineficaz232. A excomunhão é motivada pelo perigo que o comportamento dos pecadores constituem para a moralidade dos fiéis, pela mancha na Igreja e pelo exemplo eficaz para outros cristãos233. Rahner distingue dois tipos de excomunhão na Didascalia: real e litúrgica234. A excomunhão real pode começar quando o pecador se retira da vida litúrgica e social da comunidade por sua própria iniciativa, reconhecendo-se indigno. Quando o pecador não toma iniciativa, o bispo pode expelir um cristão motu proprio, com carácter público, servindose da ajuda dos diáconos235 ou de outros membros da comunidade. De———————— 228 229

Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 12, 1-3, 48; 13, 4, 48-50; 15-16, 58-62. Entre os casos de excomunhão contam-se a heresia, qualquer mala opera, litígios, maldicência, desprezo por um excomungado, tendências cismáticas, mentira e muitos outros pecados. Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 8, 3-4, 44; 39, 5, 126; 42, 5, 134; 46, 4, 140; VI, 14, 1, 340. 230 Cf. Didascalia Apostolorum, 5, 2, 1-2, 238-240. 231 Sob o aspecto litúrgico e disciplinar, a Didascalia não conhece a penitência única, visto que está longe da literatura latina e um pouco afastada do ambiente alexandrino. Igualmente, alguns estudos confirmam que não existe na Didascalia a tríade de pecados mortais, típica da penitência única. Por isso, como a Didascalia apresenta elencos mais vastos de pecados e reforça a possibilidade de remissão dos pecados, não se pode negar, como princípio, uma nova reconciliação. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 490, 513-517. 232 Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 38, 124-126; 41, 3-9, 130-132; 18, 5, 66. 233 Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 10, 1-2, 44-46; 17, 4-5, 62-64; A. NOCENT, «Il sacramento della penitenza e della reconciliazione», 158. 234 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 490-498. 235 Vacandard observa que se trata de um ofício de diácono penitenciário em sentido lato: «Dans un sense large, on pourrait appeler ce servisse des diacres l’office des diacres pénitenciers, en faisant observer que cet exercice n’est pas réservé à un diacre en particulier». É. VACANDARD, «L’origine des prêtres pénitenciers», 375. Leclercq admite igualmente neste caso a existência de um penitenciário delegado do bispo: «Pendant la vacance episcopale produite par la morte du titulaire ou son assistence à quelque convocation conciliaire éloignée, il est probable qu’un prêtre exerçait par délégation l’office de pénitencier». H. LECLERCQ, «Pénitencier», 210.


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pois de acertar o motivo, o bispo deve infligir a excomunhão, por meio de sentença judiciária236. A readmissão dependia da aceitação da mesma da parte do penitente e da sua emenda. A excomunhão litúrgica podia durar entre três e sete semanas até à reconciliação. O procedimento começa pelo bispo que faz introduzir o pecador arrependido na comunidade reunida237. O pecador já fez penitência e continua a fazê-la até provar que é digno de ser readmitido. Confessa então a sua culpa, pede perdão e promete arrepender-se. O bispo dirige-lhe um discurso de admoestação e de exortação e dá-lhe instruções para o período de penitência durante o qual deve rezar, jejuar e permanecer isolado. Depois é despedido e deve ser considerado por todos como estando fora da comunidade. O pecador é agora ligado oficialmente. Durante este período, o bispo deve interessar-se pelo penitente e ajudá-lo238. Esta sentença judiciária não é somente eclesiástica, o pecador é excluído da Igreja por um acto da Igreja hierárquica, em virtude de um poder celeste239. A Didascalia não é coerente no que respeita à sentença injusta se tem ou não eficácia diante de Deus. A reconciliação realiza-se algumas semanas depois da excomunhão litúrgica. O bispo recebe o pecador diante de toda a comunidade, impõe as mãos, enquanto toda a comunidade reza por ele, entrega-lhe o antigo lugar na Igreja onde pode tomar parte na Eucaristia240. O bispo representa Deus e tem o poder de remitir os pecados de acordo com Mateus 18, 18. Esse poder significa na Didascalia a imposição e abolição de um vínculo obrigante e a eliminação de um estado individual de culpa241. A penitência do pecador é apenas condição para ———————— 236 237

Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 10, 3-5, 46; 6, 4.6, 38-40. Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 16, 1-2, 60; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 494-498; A. NOCENT, «Il sacramento della penitenza e della reconciliazione», 158-159, 238 Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 21, 1-2, 76-78. 239 Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 34, 4, 118. 240 Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 18, 7, 66; 41, 2, 130. Nesta última passagem, a Didascalia estabelece um paralelismo entre o baptismo e a penitência: imposição da mão, introdução no templo e admissão ao serviço litúrgico. Com a imposição da mão, não se dá um novo conferimento sacramental do Espírito Santo, mas um idêntico efeito final em relação ao baptismo, a recepção do Espírito. Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 500-508. 241 Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 5, 4, 36-38; 18, 2-3, 64: «Tu ergo, episcope, doce et corripe et solve per remissionem, et cognosce locum tuum quasi locum Dei ominipotentis, et quod accepisti potestatem peccata remittendi; nam vobis, episcopi, dictum est: Quodcunque ligaveritis in terra, erit ligatum in caelis, et quodcunque sol-


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o perdão, mas a culpa implica sempre uma separação da Igreja. O paralelismo com o baptismo e o poder vicário do bispo na reconciliação atestam a sacramentalidade da penitência e da acção episcopal242. O bispo deve ser irreprovável, o que lhe permite exercer sobre os fiéis uma verdadeira autoridade243, mas sem rigorismo, pois o pecador deve ser misericoridosamente acolhido244. A Didascalia dá-nos uma excelente descrição da penitência no Oriente cristão do século III. Aí se encontra uma liturgia penitencial aperfeiçoada, para todos os pecados graves. Não existe uma penitência privada sem excomunhão. Não conhece a unicidade da penitência própria de Hermas. Nega-se deste modo o princípio evolucionista em que na história da penitência se tenha passado de um maior rigorismo a uma maior suavidade245. Finalmente, neste documento não se sublinha tanto o aspecto satisfatório da penitência pessoal, como em Cipriano, porque a excomunhão é usada com particular largueza e não se acentua a dimensão ético-escatológica246. b) Concílios de Roma (250 e 251) A Igreja de Roma ficou vacante depois do martírio do Papa Fabiano a 20 de Janeiro de 250 e o clero de Roma passou a governar colegialmente a cidade. Cipriano escreve então uma carta, em 250, aos presbíteros e diáconos de Roma, defendendo a praxe da disciplina eclesiástica para com os lapsi, excepto em perigo de morte, visto que muitos queriam ser perdoados sem fazerem penitência247. Ao receber a carta, o clero romano reuniu-se juntamente com alguns bispos das regiões vizinhas, e decidiu não introduzir novidades. Contudo, mitiga a penitência eclesiástica no que respeita à reconciliação em perigo de morte. Por razões pastorais, dilata-se o tempo para a reconciliação dos lapsi. As suas de————————

veritis, erit solutum. Sicut ergo potestatem habes solvendi, cognosce te ipsum et mores tuos ac conversationem tuam in hac vita, ut conveniant loco tuo». O mesmo se confirma em outras passagens: Didascalia Apostolorum, 2, 20, 9, 74; 21, 1, 76. 242 Trata-se de uma doutrina semelhante à scotista. Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 16, 2, 60; K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 510-512. 243 Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 7, 42; É. AMANN, «I. La Pénitence Primitive», 771; G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 113-114. 244 Cf. Didascalia Apostolorum, 2, 13, 4-14, 13, 50. 245 Cf. K. RAHNER, La penitenza della Chiesa, 521-522. 246 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 116. 247 Cf. CIPRIANO, Ep. 4, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, I, 96-103.


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cisões foram dirigidas a Cartago, em 250, com o pedido da aprovação de Cipriano. A qualificação como concílio não é, contudo, aceite por todos os autores248. No mês de Maio de 251, o Papa Cornélio reuniu novamente em Roma um concílio para resolver a questão dos lapsi. Participaram vários bispos italianos e um grande número de presbíteros e diáconos. Foi analisada a questão de Novaciano e do seu rigorismo relativo à reconciliação dos lapsi. Novaciano foi então excomungado com os seus seguidores e foram acolhidos os decretos de Cartago que admitiam a reconciliação dos lapsi, uma vez realizada a penitência. Os presbíteros lapsi podiam ser readmitidos aos sacramentos, mas não reintegrados nas suas funções249. 2.3 A disciplina penitencial dos séculos IV-VI 2.3.1 O processo penitencial Com o fim das perseguições e a entrada dos povos bárbaros, aumenta o afluxo de novos convertidos, menos preparados. Consequentemente, a disciplina torna-se cada vez mais rígida250. Assiste-se a uma grande actividade legislativa por parte da autoridade eclesial. Ao manter-se a doutrina da não-reiteração da penitência e um grande número de exigências, essa torna-se inacessível a um grande número de fiéis, ou simplesmente relegada para o leito de morte ou para a velhice251. O processo da disciplina penitencial mantém as mesmas formas de Tertuliano, Cipriano e Orígenes, nomeadamente a entrada na penitência, o estado penitencial de expiação na ordem de penitentes e a reconciliação realizada pelo bispo. Tais momentos são cronologicamente distantes uns dos outros. ————————

248 Cf. Ep. Cleri Romani ad Cyprianum, 4-8, in PL 4, 318-323; CIPRIANO, Ep. LV, 11, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 38-39; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza nei Concili occidentali», 78-84; I. DANIELE, «Concilio di Roma», 123-124. 249 Cf. CONC. DE ROMA (251), in Mansi 1, 865-866; F. BONCOPAGNI, «Concilio di Roma», 124-125; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza nei Concili occidentali», 89. No que diz respeito aos Concílios de Cartago da mesma época, remetemos para a parte dedicada a Cipriano, por uma razão de coerência interna da disciplina apresentada pelo bispo de Cartago. 250 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 27-28. 251 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 50; G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 186-187; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 110.


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a) Entrada na penitência A entrada na penitência acontece por meio de exortação por meio de um rito litúrgico específico, no início da quaresma252. Normalmente, trata-se de um acto livre. Consta que somente nos casos de homicídio e falso testemunho o pecador fosse obrigado a constituir-se penitente253. A entrada na penitência é um acto público na presença dos fiéis reunidos, mesmo quando se trata de pecados ocultos, mas que não implicam uma confissão pública. O objectivo seria o da oração de intercessão dos fiéis254. No fim da celebração, o penitente era simbolicamente expulso da Igreja255, mas isso não significa que fosse excluído de poder frequentar a Igreja ou de ter relações sociais com outros membros da comunidade, à excepção de casos determinados como o dos apóstatas256. Só se admite à penitência os penitentes que dêem provas da sua conversão sincera. Por outro lado, não se admite à penitência os pecadores jovens ou os casados sem o consentimento do outro cônjuge, para que não tornem a cair facilmente. Consequentemente, eram aceites no ordo poenitentium normalmente viúvos, celibatários de mais idade ou anciãos, para que se evitasse que tornassem a cometer faltas graves, onde já não teriam nenhum remédio257. ———————— 252

Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 36: «Le rite liturgique d l’entrée en pénitence est accompli par l’évêque, et par lui seul, par une imposition des mains. Après avoir imposé les mains, le pontife recouvre le pénitent du cilice, vêtement en poils de chèvre, dont le port est obligatoire aussi longtemps que durera le stage d’expiation; le pénitent se revêtira également d’habits spéciaux, de coleur sombre, et négligera les soins de propreté [...]. A la fin de la cérémonie, le pénitent est expulsé de l’église». 253 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 34-35. 254 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 56, nt. 39: «L’aveu dans la pénitence antique n’est pas public dans le sens que le pécheur proclamerait à haute voix devant l’assemblée la liste de ses méfaits. C’est à l’évêque seul que le pécheur s’adresse pour demander l’admission à la pénitence. Mais l’acte d’entrée en pénitence comme tout le déroulement pénitenciel jusqu’à la réconciliation incluse sont publics; la communauté chrétienne est presente tout au long du processus pénitenciel pour souternir les pénitents par l’intercession de tous». 255 Ao entrar no ordo paenitentium, o penitente passa a ocupar um lugar especial no edifício de culto, possivelmente no narthex – vestíbulo antes da entrada na nave – mais que no atrium – pátio precedente à Igreja propriamente dita; Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 36. 256 Cf. CONC. DE ÉPAONE (517), c. 29, in Mansi 8, 562; C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 36. 257 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 44-45; K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 319.


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A excomunhão só é usada em certos casos e consiste essencialmente na exclusão da Eucaristia258. Embora a excomunhão seja parte da penitência pública, no entanto não se confunde com esta, porque é essencialmente um meio disciplinar, usada mesmo para os delitos menos graves, aos quais não se aplica a penitência canónica. A sua aplicação era sujeita à discrição dos bispos. É prova disso a separação progressiva entre excomunhão e penitência259. Somente as faltas graves são sujeitas à penitência canónica. Para as faltas ligeiras, basta cumprir boas obras e mortificar-se260. As penas aplicadas variam temporal e localmente, com mais ou menos intensidade. b) O estado de penitente O ordo poenitentium afirma-se como um estado particular na Igreja, característica da penitência canónica. Durante este estado, existem três tipos de obrigações: gerais, rituais ou litúrgicas e especialmente penitenciais. De um modo geral, os pecadores devem seguir uma vida mortificada com jejuns, esmolas, provas concretas de conversão interior e da virtude da penitência. Entre as diversas formas de mortificação, é especialmente sentida pelos penitentes a privação de carne. Durante o período da penitência, celebrava-se um rito especial, antes da reconciliação, que consistia na oração do bispo com a participação de toda a comunidade e a imposição das mãos, um rito universalmente adoptado. Como sinal de dor, os penitentes permanecem de joelhos nos dias de festa e são encarregados de levar os defuntos à Igreja e de lhes dar sepultura261. No Ocidente somente se usava um grau entre os penitentes, ao contrário do que acontecia no Oriente262. É competência do bispo fixar a medida da penitência, segundo a gravidade das faltas e o zelo e disposições do penitente.263 Excluído da Igreja, o culpável não pode aceder mais à Eucaristia. Assiste-se a um rigor crescente, em que a sanção mais grave – a excomunhão – comporta a menos severa – a proibição da comunhão eucarística –, como se lê nas legislações conciliares e decretos pontifícios. De modo a evitar que ———————— 258 A exclusão da Eucaristia significava a exclusão da oblação das oferendas e da comunhão. Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 36. 259 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 80-83, 103-104. 260 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 28. 261 Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 37. 262 Cf. J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 77. 263 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 76, 85.


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a Eucaristia seja desonrada, a Igreja excomunga os mais indignos entre os pecadores. Aos outros, os bispos recomendavam a abstenção temporária da comunhão eucarística264. Assiste-se igualmente a um processo especial para os pecados secretos, que exigiam uma certa restrição da publicidade, como atestam Agostinho e o Papa Leão Magno, uma espécie de uma penitência semipública265. c) A reconciliação O rito de reconciliação consiste na supplicatio sacerdotalis com a imposição das mãos, associada à oração dos fiéis. A partir do século V, a ceremónia teria lugar na Quinta-feira Santa, excepção feita para os fiéis em perigo de morte. Aqueles que recebem o sacramento tornam-se cristãos de direitos diminuídos, por isso as consequências da penitência são duradoiras266. Não podem entrar no estado eclesiástico e são sujeitos a restrições severas, como a interdição de exercer funções públicas, de retomar o serviço nas forças armadas, de exercer o serviço de comerciante ou de tentar defender os seus direitos fora da jurisdição eclesiástica. Durante o tempo de penitência, o casado é proibido de viver maritalmente com o seu cônjuge. Trata-se de uma rejeição da vida do mundo, uma espécie de estado religioso267. Mesmo depois da reconciliação, aparece a exigência de continência total. Tal acontece nos casos do moribundo, que, recuperado, deve manter a promessa de continência; dos penitentes viúvos que não se podem tornar a casar; e do penitente celibatário, que não pode casar antes da reconciliação. O fiel, mesmo reconciliado, continua a pertencer à classe dos penitentes mesmo até à morte. A reconciliação remite os pecados, mas não suprime todas as interdições. Tais exigências fazem com que a penitência pública se torne cada vez mais uma preparação para a morte. Por isso, essa não se aplica a pessoas jovens, devido ao perigo da incontinência ou da recaída268. No caso da penitência conferida em leito de morte, segue-se imediatamente a reconcilliação, mas, se o enfermo recupera a saúde, deve ———————— 264 265 266 267 268

Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 47-48. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 83-84. Cf. K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 318. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 94, nt. 2. Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 39-40.


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cumprir um tempo de expiação entre os penitentes, a que se segue a reconciliação. Visto que nesta fase se excluía do estado de penitente e das interdições, chegou a ser aconselhado a sua prática por alguns bispos, como Cesário de Arles, apesar da sua irregularidade, visto que não se pratica neste caso nem a expiação nem o esforço pessoal. Deste modo, justifica-se a extrema prudência associada a algumas restrições. No entanto, os penitentes mortos sem a reconciliação eram considerados participantes da comunhão dos santos, visto que em caso de sobrevivência seriam absolvidos se estivessem arrependidos269. Normalmente, os clérigos e religiosos não são sujeitos à penitência pública, tendo em conta a dignidade do sacramento da ordem e do ministro, por uma parte, e, por outra, o facto de que a profissão monástica é como um segundo baptismo pelo qual o professo se insere no Corpo Místico de Cristo e pode participar directamente na Eucaristia. Os clérigos eram simplesmente distituídos do ministério e admitidos à comunhão dos leigos. A entrada no estado de penitência é várias vezes comparada à entrada na vida religiosa ou ao estado de conversus270. Contudo, a penitência eclesiástica é uma irregularidade, enquanto que a segunda é um estado de perfeição, uma maneira de se preparar para a morte271. Assiste-se igualmente a uma particular excepção para os nascidos na heresia, que eram reconciliados com a imposição das mãos sem a prática da penitência272. ———————— 269

Fausto de Riez (†450) nega completamente a eficácia de uma penitência conferida quando a expiação não é possível. Posição que foi negada por Genádio de Marselha (†505) e Avito de Viena (†518). Cf. FAUSTO DE RIEZ, Ep. ad Paulinum, in PL, 58, 847; GENÁDIO DE MARSELHA, De ecclesiasticis dogmaticus, 80, PL 58, 998: «Poenitentia aboleri peccata indubitanter credimus, etiamsi in ultimo vitae spiritu admissorum paeniteat, et publica lamentatione peccata prodantur, quo decrevit salvare quod perierat, stat immobile»; AVITO DE VIENA, Ep. ad Gundobadum, in PL 59, 383. 270 Segundo Vogel, os conversi seriam uma classe de fiéis que vivem um estado de mortificação, inteiramente casto e continente, na sua família ou em qualquer lugar livremente escolhido, uma espécie de ordem terceira. Procuram os mesmos efeitos espirituais da penitência canónica. Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 50. 271 A vida religiosa é equivalente à penitência pública. Confirma esta ideia este texto de FAUSTO DE RIEZ, De eccl. dogm., 53: «sed et secreta satisfactione solvi mortalia crimina non negamus, sed mutato prius saeculari habitu et confesso religionis studio per vitae correctionem et jugi imo perpetuo luctu miserante Deo veniam consequatur»; Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 99-103. 272 Cf. K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 319.


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54 d) O ministro

Somente o bispo é regularmente competente para a reconciliação, visto que somente ele é considerado sacerdote nesta época. Os presbíteros somente podem realizar esta cerimónia por ordem do bispo e em caso de necessidade273. Contudo, devido à assistência dos doentes, os presbíteros passam a colaborar progressivamente no ministério do sacramento. Tal facto é confirmado por duas notas do Liber Pontificalis, escrito pouco depois do ano 514274, em que o Papa Marcelo (†309) divide a comunidade romana em vinte e cinco igrejas titulares ou paróquias propter baptismum et paenitentiam275. E o papa Simplício (†483) introduziu nas três basílicas romanas de S. Pedro, S. Paulo e S. Lourenço o serviço semanal para os padres pelas mesmas razões276. Deste modo, à excepção da reconciliação solene reservada ao bispo, os presbíteros cooperam no processo penitencial ordinário, nas deliberações episcopais, assim como na vigilância e sentido pastoral dos penitentes. Na maior parte dos casos, os penitentes faziam uma confissão preparatória a um presbítero antes de entrarem no ordo paenitentium. Dogmaticamente, nada se oponha à delegação do rito de reconciliação a um presbítero, contudo esta questão não é consensual277. ———————— 273

Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 87. Alguns autores, como Schmitz ou Batiffol, justificam a presença do penitenciário em Roma nos séculos IV e V, basendo-se no Liber Pontificalis. Contudo, outros não concordam, pois não se encontra este ofício de modo explícito. O presbíteros não absolviam em modo delegado, mas preparavam os penitentes para a entrada no ordo paenitentium. Cf. É. VACANDARD, «L’origine des prêtres pénitenciers», 378-381. 275 Cf. Liber Pontificalis, I, 164. Leclercq repete a argumentação de Vacandard servindo-se da segunda edição do Liber Pontificalis (à volta de 540), contemporânea da primeira (entre os anos 520-530) e que, segundo estes autores, é igualmente segura, na qual a expressão citada é modificada por «propter paenitentes et baptismum et paenitentiam multorum qui convertebantur ex paganis», o que faz entender a intencionalidade de que se trata de uma penitência preparatória para a recepção do baptismo. Cf. H. LECLERCQ, «Pénitencier», 212. 276 Cf. Liber Pontificalis, I, 249: «Hic constituit ad sanctum Petrum apostolum et ad sanctum Paulum apostolum et ad sanctum Laurentium martyrem hebdomadas ut presbyteri manerent, propter penitentes et baptismum»; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 88. 277 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 88; É. VACANDARD, «L’origine des prêtres pénitenciers», 374-378. H. LECLERCQ, «Pénitencier», 210-211. 274


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e) Primeiros testemunhos acerca do penitenciário Na Igreja oriental, a delegação episcopal penitencial parece ter sido realizada pela primeira vez por meio um padre penitenciário278. Sócrates279 (†450) conta que, em Constantinopla, depois da perseguição de Décio, os bispos instituíram um padre penitenciário particular que recebia a confissão dos pecadores, impunha-lhes uma satisfação correspondente e absolvia-os – ἀπέλυε –, depois de cumprida a penitência, a fim de os poupar ao rigor da confissão pública280. Sozómeno, seu contemporâneo, defende que o ofício do penitenciário foi estabelecido em Constantinopla desde a origem – εξ ἀρχῆς281. A instituição durou até ao tempo de Nectário de Constantinopla (†397), que a suprimiu devido a um escândalo do padre penitenciário local282. Consequentemente, nas Igrejas do Oriente, o penitenciário e a penitência pública ou um ou outro foram suprimidos. Como tais factos não são confirmados por outras ————————

278 Na Ásia Menor, podem-se encontrar possibilidades da existência do penitenciário, como, por exemplo, na Didascalia Apostolorum, 2, 10, 3-5, 46; 6, 4.6, 38-40. Contudo, não existem provas. De igual modo, nas Igrejas da Gália, Espanha e Itália, a penitência era sujeita ao arbítrio do sacerdote, que era o bispo, como se nota nos textos de Paciano Ep. ad Sympronianum, 6, in PL 13, 1053, do Concílio de Angers (452), c. 12, in Mansi 7, 902, de Agde (506), c. 15, in Mansi 8, 327, de Santo Ambrósio De paenitentia, 1, 2, 7, in PL 16, 468, de Inocêncio I, Ep. 25, 1, 7, in PL 20, 516, e Leão Magno, Ep. 10, 8, in PL 54, 635, conforme se nota ao longo deste estudo. Cf. H. LECLERCQ, «Pénitencier», 210-211; É. VACANDARD, «L’origine des prêtres pénitenciers», 374-378. 279 Sócrates escreveu a sua História Eclesiástica em Constantinopla, por volta do ano 440, e Sozómeno, seu contemporâneo, um pouco mais tarde, na dependência de Sócrates, que ele copia, corrige e amplia. Cf. É. VACANDARD, «L’origine des prêtres pénitenciers», 371. 280 Cf. SÓCRATES, Historia Ecclesiastica, 5, 19, in PG 67, 613-619. 281 SOZÓMENO, Historia Ecclesiastica, 7, 16, in PG 67, 1460. Esta opinião não é historicamente convincente, visto que Sozómeno defende que a existência do penitenciário se deve ao facto de a mesma ser secreta, facto não confirmado pelos documentos da época. Contudo, a sua afirmação pretende afirmar que a instituição do penitenciário é geral e imemorável. Cf. É. VACANDARD, «L’origine des prêtres pénitenciers», 364; H. LECLERCQ, «Pénitencier», 208. 282 Pode-se sintetizar deste modo o facto descrito: uma pecadora confessara os pecados cometidos depois do baptismo ao padre penitenciário. Entre os quais confessa que um diácono da Igreja terá partilhado o seu leito. Por isso, o diácono foi deposto. Por causa da indignação do povo contra o facto e das injúrias contra o clero, um certo Eudémon de Alexandria pediu ao bispo Nectário a supressão deste ofício e de permitir a cada um que se aproximasse dos santos mistérios somente segundo o testemunho da sua consciência. Cf. SÓCRATES, Historia Ecclesiastica, 11, in PG 67, 617-620.


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fontes, convém ter uma certa reserva acerca da origem e multiplicação deste ofício, assim como a supressão do mesmo por parte de Nectário, nem se pode associá-la ao fim da penitência pública283. Contudo, Sozómeno precisa que nas Igrejas do Ocidente, especialmente em Roma, o penitenciário é uma instituição conservada religiosamente284. No entanto, a existência de padres penitenciários na Igreja Romana do século V não é uma questão consensual, visto que os presbíteros eram colaboradores da penitência, mas não seus ministros. Por outro lado, em nenhum texto desta época se pode provar a sua existência285. 2.3.2 Padres da Igreja a) Paciano Na polémica antinovacina, Paciano de Barcelona (finais do séc. IV), influenciado por Cipriano e Tertuliano, coloca o discurso da penitência no contexto eclesiológico-católico286. Embora a Igreja seja esposa de Cristo, sem mácula, também é mãe que cura os seus filhos287. Um pe———————— 283 284

Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 88-89. Cf. SOZÓMENO, Historia Ecclesiastica, 7, 16, in PG 67, 1459; SÓCRATES, Historia Ecclesiastica, 5, 19, in PG 67, 613: «Et in Occidentalibus Ecclesiis, ac praecipue in Ecclesia Romana studiose observatur». 285 A favor da existência, há que ter em conta os estudos de P. BATIFFOL, «Les prêtres pénitenciers romains au Ve siècle», 277-290. Tal opinião não é aceite por É. VACANDARD, «L’origine des prêtres pénitenciers», 385-386: «Le régime en vigueur à Constantinople aux IIIe et IVe siècles ne se laisse constater nulle part ailleurs vers le même temps, ni même dans le cours du Ve siècle. [...] Le sacerdos qui reçoit les aveux des pécheurs et dirige leurs exercices pénitentiels en Afrique, en Espagne, en Gaule, en Italie, c’est l’évêque, toujours l’évêque. [...] L’existence de ces prêtres pénitenciers romains est pour nous fort problématique; disons plus, elle est historiquement indémontrable»; ou por H. LECLERCQ, «Pénitencier», 213-215, referindo-se à análise do texto de Sozómeno, afirma: «Dans tout ce texte on n’aperçoit aucune trace d’un prêtre pénitencier à Rome. On y voit, sans doute, le presbyterium qui assiste tout entier avec les fidèles à la bénédiction qui précéde le renvoi des pénitents, mais c’est l´évêque qui donne la bénédiction et on n’entrevoit nulle part la présence ni l’éxistence d’un prêtre chargé de la surveillance des exercices pénitentiels publics. […] On n’y trouvera pas un mot qui permette de croire à l’existence d’un prêtre pénitencier dans l’Église romaine au milieu du Ve siècle». 286 Cf. PACIANO, Ep. ad Sympronianum, 1, 4, in PL 13, 1055: «Christianus mihi nomen est, Catholicus vero cognomen»; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 158. 287 Cf. PACIANO, Ep. ad Sympronianum, 3, 4, in PL 13, 1066: «magna in filios cura matris istius, et mollis affectus: honorantur boni, castigantur superbi, curantur aegroti: nullus perit, nemo despicitur: securi fetus sub indulgentia matris retinentur».


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cador e penitente não é mancha para a Igreja, porque enquanto não se arrepende está fora dela288. Na verdade, esses pecadores não são abandonados por Cristo, que sofreu por eles289. A penitência eclesiástica que cura e recupera do mal só é necessária para os pecados mortais ou capitais290, visto que as faltas ligeiras meliorum operum compensatione curantur291. Restringe a penitência eclesiástica à tríade de Tertuliano: idolatria, homicídio e adultério. Contudo, admite o seu uso para as faltas ligeiras292. Se o pecador não aceita a penitência, coloca-se fora da comunhão da Igreja. O perdão dos pecados coincide com a paz e comunhão que o pecador recebe da Igreja através dos sacerdotes293. Paciano realça a função primária do bispo, e reinvidica a sua legitimidade, contra os que defendem que o poder sobre o pecado concedido por Cristo aos Apóstolos se aplica somente ao baptismo294. Tal função deve ser vista numa perspectiva eclesiológica total, em conformidade com o discurso sobre a maternidade da Igreja295. b) Ambrósio de Milão Ambrósio de Milão (†397) apresenta, no seu De Paenitentia, uma defesa da penitência contra os novacianos e uma exortação ao recurso da mesma, apesar da sua dureza, que faz com que muitos não a cumpram296. Na verdade, a atitude dos novacianos para com os pecadores não é cristã, visto que o seu conceito de Deus está privado de misericódia. A Igreja não é só o lugar dos santos mas também o lugar de cura ———————— 288 289 290 291 292 293

Cf. PACIANO, Ep. ad Sympronianum, 3, 4, in PL 13, 1066. Cf. PACIANO, Ep. ad Sympronianum, 3, 26, in PL 13, 1080. Cf. PACIANO, Paraenesis, 6, in PL 13, 1084-1085. Cf. PACIANO, Paraenesis, 4, in PL 13, 1084. Cf. PACIANO, Paraenesis, 2, in PL 13, 1082-1083. Cf. PACIANO, Ep. ad Sympronianum, 3, 4, in PL 13, 1066; G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 115. 294 Cf. PACIANO, Ep. ad Sympronianum, 3, 11, in PL 13 1070; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 160. 295 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 160-161. 296 Nem todos têm a mesma disposição para a penitência. «Si vedono certi peccatori indietreggiare davanti alle esigenze della penitenza pubblica. Altri vogliono sopratutto essere ammessi alla communione eucaristica e si mostrano meno desiderosi di convertersi. Altri, invece, accettano di essere privati dell’eucaristia e si immaginano che tutta la penitenza consista in questa privazione». Cf. A. NOCENT, «Il sacramento della penitenza e della reconciliazione», 164.


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para todos297. Tal corresponde à vontade de Cristo que confiou à Igreja um ministério relativo ao pecado, no baptismo e penitência, por meio dos seus sacerdotes298. Admite dois tipos de penitência, a pública, não repetível, e a privada: «Sicut unum baptisma ita una paenitentia, quae tamen publice agitur; nam quotidiani nos debet paenitere peccati, sed haec delictorum leviorum, illa graviora»299. Além das penitências habituais de oração, jejum e esmola, Ambrósio enuncia a redução do sono, a continência e a renúncia às honras temporais300. O bispo de Milão insiste na paenitentia plena et justa, pois uma grande falta requer uma grande penitência301. Essa penitência é irrepetível: «sicut unum baptisma ita una paenitentia»302. Quem passa pela penitência entra no estado de penitente, com exigências e restrições: «qui mortui et sepulti in Christo sunt, non debent iterum velut viventes de hoc mundo decernere»303. Por isso, recusa aos jovens a penitência, aceitando na mesma eo tempore, quo culpae defervescat luxuria304. O penitente público não pode aproximar-se da Eucaristia, a que somente pode aceder depois de uma penitência sincera, e que não pode ser dada apressadamente, segundo a responsabilidade do sacerdote305. Neste processo, todos os membros do povo cristão rezam e choram pela remissão dos pecadores306. Naturalmente, a remissão do pecado é uma graça divina, mas supõe o esforço humano do penitente307. A dimensão interior manifesta-se em gestos concretos, mas não se reduz a esses308. ———————— 297

Cf. AMBRÓSIO, De paenitentia, 1, 6, 28-31 in PL 16, 475-476; G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 162-163. 298 AMBRÓSIO, De paenitentia, 1, 2, 7-8, in PL 16, 468-469: «Ecclesia in utroque servat oboedientiam, ut peccatum et alliget et relaxet [...] qui Spiritum Sanctum accepit, et solvendi peccati potestatem et ligandi accepit». 299 AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 10, 95, in PL 16, 520. 300 Cf. AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 10, 96-97, in PL 16, 520-521. 301 Cf. AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 10, 92-93, in PL 16, 519-520. 302 Cf. AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 10, 95 in PL 16, 520; II, 2, 6-12, in PL 16, 497-499. 303 AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 10, 97, in PL 16, 521. 304 AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 11, 107, in PL 16, 524. 305 Cf. AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 9, 87, in PL 16, 517-518. 306 Cf. AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 10, 92, in PL 16, 519: «Fleat per te mater Ecclesia, et culpam tuam lacrymis lavet [...]. Amat ut pro uno multi rogent». 307 Cf. AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 7, 56, in PL 16, 511. 308 Cf. AMBRÓSIO, De paenitentia, 2, 9, 81, in PL 16, 516-517.


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c) Agostinho de Hipona A obra de Agostinho (†430) representa a contribuição mais significativa para a penitência na sua dimensão prática e teórica, especialmente na sua reflexão acerca da sacramentalidade309. A base teológica da penitência é a íntima ligação entre o Espírito Santo, a Igreja e a remissão dos pecados, três realidades inseparáveis. O Espírito Santo existe onde está a Igreja e onde está o Espírito, que cria a Igreja, aí se encontra a remissão dos pecados310. No contexto da polémica donatista, Agostinho acentua a transcendência da acção do Espírito Santo em relação à santidade dos membros da Igreja, também no perdoar os pecados. Coloca em primeiro plano a Igreja como totalidade, e dentro dessa a função apostólica e consequentemente episcopal. Deste modo, o poder de remir os pecados é entregue à Igreja por meio de Pedro e dos Apóstolos311. Fundamentando-se nos famosos textos de Mateus 16 e 18 e João 20, Pedro é apresentado como personificação da unidade da Igreja, na qual está presente a remissão dos pecados, baseada no poder das chaves de ligar e desligar, e que é dado a toda a Igreja, segundo a exegese de Orígenes312. Agostinho compara também a justificação do pecador à ressurreição de Lázaro. A ressurreição do pecador é o privilégio de Deus por magna gratia. Contudo, o ressuscitado tem ainda as ligaduras e a sua libertação dos vincula ipsius reatus é obra da Igreja313. ———————— 309

Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 77-89; K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 320. 310 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 71, 28, in Opere 31/1, 440: «Peccata quae praeter ecclesiam non dimittuntur, in eo Spiritu dimitti oportebat, quo in unum ecclesia congregatur». Esta ideia é confirmada pelos estudiosos: A.-M. LA BONNARDIÈRE, «Pénitence et réconciliation», I, 34-42; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 175-182. 311 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 99, 9, in Opere 30/2, 224. 312 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 295, 1-3, in Opere 33, 310-314; Tractatus in Iohannis, 124, 7, in Opere 24, 1622-1624: «Omnibus igitur sanctis ad Christi corpus inseparabiliter pertinentibus, propter huius vitae procellosissimae gubernaculum, ad liganda et solvenda peccata claves regni coelorum primus Apostolorum Petrus accepit: eisdemque omnibus sanctis propter vitae illius secretissimae quietissimum sinum, super pectus Christi Ioannes evangelista discubuit. Quoniam nec iste solus, sed universa Ecclesia ligat solvitque peccata: nec ille in principio Verbum Deum apud Deum, et caetera de Christi divinitate, et de totius divinitatis trinitate atque unitate sublimia, quae in illo regno facie ad faciem contemplanda, nunc autem donec veniat Dominus, in speculo atque in aenigmate contuenda sunt, quae praedicando ructaret, de fonte Dominici pectoris solus bibit». 313 Cf. AGOSTINHO, Tractatus in Iohannis, 49, 24, in Opere 24, 992-994; Sermo, 67, 1, 2, in Opere 30/1, 350. Bonnardière especifica em que consiste os vínculos que


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Tal concepção unifica a acção do Espírito e da Igreja na sua raiz314. O reatus peccati é o próprio pecado, na medida em que habita no homem depois da acção cometida e o torna punível315. Portanto, a causa formal pela qual o homem abandona o acto delituoso é o Espírito Santo, enquanto está incorporado na Igreja316. Pertencer vivamente à Igreja é o princípio que permite a absolvição dos pecados e a intervenção da graça. A eficácia sacramental da reconciliação é mais bem evidenciada que em Cipriano. Somente o sacerdote a realiza validamente317. No entanto, ele é somente o executor oficial. O verdadeiro detentor do poder das chaves é a Igreja inteira, os seus membros animados pelo Espírito Santo: «universa ecclesia ligat solvitque peccata»318. O bispo de Hipona distingue três tipos de penitência: antes do baptismo, a penitência pelos pecados quotidianos, e aquela para os pecados graves. Esta última é a penitência propriamente dita: paenitentia maior, insignis, gravior et luctuosior319. Agostinho exclui da penitência todos os pecados por pensamento ou alguns contra o próximo320, e não aceita somente a célebre tríade de Tertuliano e Paciano, mas nas suas enumerações aproxima-se do decálogo321. A gravidade do pecado reside so————————

são tirados pelos ministros da Igreja: «pardonné, le coupable reste «lié», responsable de son action ou de ses habitudes. Il a une peine à payer, une langueur à guêrir. C’est aux ministres du Christ – aux évêques, descendants des Apôtres – que revient le ministère de la discipline ecclésiastique; c’est à eux de fixer la quantité, le mode, la durée des exercices pénitentiels qu’ils soient prébaptismaux, quotidiens, pénitentiels proprement dits; c’est à eux également que revient de présider aus cérémonies de «déliement»: régénération, oraison dominicale, réconciliation. Ce rôle des évêques est d’autant plus éminent qu’il garantit une des conditions capitales de rémission des péchés: l’appartenance à l’unité de l’Église». A.-M. LA BONNARDIÈRE, «Pénitence et réconciliation», III, 203-204. 314 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 181. 315 Cf. AGOSTINHO, De nuptiis et concupiscentia, 1, 29, in Opere 18, 66. 316 Cf. AGOSTINHO, Tractatus in Iohannis, 119, 4, in Opere 24, 1156-1158. 317 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 71, 23, 37, in Opere 30/1, 432, 452-454. 318 Cf. AGOSTINHO, Tractatus in Iohannis, 124, 7, in Opere 24, 1622-1624. 319 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 351, 4, 7, in Opere 34, 172-176, 180-184; 352, 3, 8 in Opere 34, 200-206, 218-220; De symbolo, 8, 16, in PL 40, 636. 320 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 98, 5, in Opere 30/2, 206; 82, 3, 5, in Opere 30/1, 616618; C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 30. 321 Agostinho considera como pecados graves: idolatria, adultério, fornicação, a bestialidade, o engano, ódio, heresia, cisma e espectáculos de circo. Contudo, não se trata de uma lista exaustiva e não se pode aplicar as nossas categorias modernas de pecado mortal e venial. Cf. AGOSTINHO, Sermo, 56, 12, in Opere 30/1, 152-154; 351,


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bretudo na disposição subjectiva, e aí entram os peccata malitiae. Mas a distinção para a apreciação dos pecados reside no julgamento objectivo dado pela Escritura e pelo uso da Igreja322. Agostinho admite uma certa restrição da publicidade do processo penitencial. Baseando-se em Mateus 18, 15-18, defende que, quando uma ofensa é feita contra algum cristão, esse deve repreendê-lo para que este se corrija e não para o revelar aos outros323. Para Agostinho, esse texto poderia contradizer o de Provérbios 10, 10: «quem repreende abertamente traz remédio», confirmado pela carta de S. Paulo a Timóteo324, mas, ao aplicar uma hermenêutica de continuidade, o nosso autor entende que algumas vezes se deve repreender um irmão a tu por tu somente, e outras vezes na presença de todos, de modo que os outros tenham medo325. Por isso, propõe o princípio: «ipsa corripienda sunt coram omnibus, quae peccantur coram omnibus; ipsa corripienda sunt secretius, quae peccantur secretius»326. Ele próprio confessa que não é fácil escolher pastoralmente entre as duas modalidades, numa carta a Paulino de Nola327. No sermão 82, Agostinho ilustra a sua regra com ————————

4, 7, in Opere 34, 172-176, 180-184; De natura et gratia, 38, 45, in Opere, 432-434; C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 29; A.-M. LA BONNARDIÈRE, «Pénitence et réconciliation», II, 257. 322 Cf. AGOSTINHO, De diversis quaestionibus, 83, in Opere 6/1, 258-260; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 77-78; C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 30. 323 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 82, 4, 7 in Opere 30/1, 618-620; 82, 7, 10 in Opere 80/1, 622-624. 324 Cf. 1 Tim. 5, 20. 325 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 82, 6, 9, in Opere 30/1, 618-620; J. CAROLA, «La nascita di un tribunale della coscienza», 56. 326 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 82, 10, in Opere 30/1, 624. A interpretação deste texto divide os estudiosos, visto que Agostinho faz poucas anotações acerca do ordo paenitentium e as práticas penitenciais, mas prevalece a ideia de que esta correptio secreta não seria uma forma de tipo sacramental privada. O problema é o de saber se estas modificações ao procedimento ordinário supõem um outro tipo de instituto penitencial ou somente uma certa maleabilidade em relação às circunstâncias. Afirma Bornnardière: «Il ne s’agit aucunement d’un quatrième type de pénitence qui aurait pris rang entre la pénitence et la pénitence quotidienne. Il s’agit de la première étape de l’iniciative épiscopale dans le “traitement” de ces malades que sont les pécheurs: une correptio secreta, d’homme à homme». Cf. A.-M. LA BONNARDIÈRE, «Pénitence et réconciliation», II, 279-281; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 167-168; K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 318. 327 Cf. AGOSTINHO, Ep. 95, 3 in Opere 21, 894: «Ego in his quotidie peccare me fateor, et ignorare quando, quove modo custodiam id quod scriptum est: peccantes


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dois exemplos: um homicídio conhecido somente pelo bispo e adultérios revelados ao bispo pelas mulheres traídas. Apesar da gravidade das ofensas, a repreensão a cada caso permanece em segredo. Apenas repreende genericamente o seu auditório328. O bispo de Hipona distingue entre correção privada – correctio – e repreensão pública ou privada – correptio329. Enquanto que a correptio pode ser um acto divino ou humano através do qual o pecador é chamado à penitência, a correctio é estritamente um acto divino, realizado pela graça divina que age no coração do homem. A correptio humana serve como instrumento da correctio divina, e não se identifica com a penitência privada. Quer pública quer privada, a correptio dos delitos graves tinha o objectivo de preparar o penitente à penitência pública, que era necessária mesmo para os casos graves confessados em segredo ao bispo. Um colóquio privado com o bispo fazia parte da entrada no locus paenitentium. Enquanto que a repreensão poderia ser privada, a penitência era sempre pública330. A tarefa do bispo de Hipona é a de governar o seu mosteiro e a sua diocese, por isso, trata os casos graves em modo confidencial, tendo em conta a boa fama dos penitentes e o risco de dano que esses podem trazer aos fiéis. O mérito do foro público é o da solidariedade dos fiéis com o bispo na oração para com os suspeitos331. O objectivo da penitência é socorrer os fiéis: «Agite paenitentiam, qualis agitur in ecclesia, ut oret pro vobis ecclesia»332, para os ajudar a emendarem-se, observando a sua conduta e informando o bispo para que os exorte333. O acto de entrada no ordo paenitentium faz-se quer por iniciativa do penitente ou como sanção de excomunhão334. Essa consiste essencial————————

coram omnibus argue, ut caeteri timorem habeant; et quod scriptum est: corripe eum inter te et ipsum solum». 328 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 82, 8, 11 in Opere 30/1, 620-622, 624-626. 329 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 82, 9, 11 in Opere 30/1, 622, 624: «Publica est correptio, sed secreta correctio». 330 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 352, 3, 8 in Opere 34, 200-206, 218-220; 232, 7, 8, in Opere 32/2, 568-570; J. CAROLA, «La nascita di un tribunale della coscienza», 57-58. 331 Cf. J. CAROLA, «La nascita di un tribunale della coscienza: una risposta agostiniana», 59-61: «Si richiede, comunque, anche il giudizio prudenziale del Vescovo che senza usurpare l’autorità divina nel tribunale della coscienza cerca sia privatamente che pubblicamente la salvezza del peccatore e il bene di tutti o fedeli nell’unione della carità». 332 AGOSTINHO, Sermo, 392, 3, 3, in Opere 34, 666. 333 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 79-80. 334 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 232, 8, in Opere 32/2, 568: «Aliqui ipsi paenitentiae locum petierunt; aliqui excommunicati a nobis in paenitentiae locum redacti sunt».


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mente na exclusão da Eucaristia e na tomada de uma certa posição na assembleia litúrgica335. É o bispo que deve controlar os tempora paenitentiae336. Contudo, isso não é arbitrário, pois não é o tempo que se deve controlar, mas a medida do sofrimento337. Agostinho revela várias dificuldades no aplicar a penitência. Aceita a tolerância dolorosamente necessária para certos casos338. Lamentase pelo laxismo prático daqueles que administram a penitência, especialmente para os pecados de ordem sexual339, e pelo facto de muitos não o escutarem340. Apesar destas dificuldades, a educação para a penitência é um ponto importante da sua acção pastoral, quer na preparação do baptismo, quer na disposição a acolher quotidianamente o perdão dos pecados menores ou inevitáveis, e quer como exigência de conversão dos pecados graves que excluem da Eucaristia e que devem ser sujeitos ao poder da Igreja. Agostinho tem uma consciência muito clara da economia cristã como graça concedida aos pecadores por meio da Igreja341: «nesta Igreja reviverá a alma que estava morta pelos pecados, para ser revificada com Cristo, na graça de que fomos salvos de facto»342. A reconciliação é para Agostinho uma necessidade, por isso pede aos seus padres para perseverarem nas suas comunidades no momento ———————— 335

Cf. AGOSTINHO, Sermo, 352, 3, 8, in Opere 34, 218-220: «Remoti etiam a sacramento altaris participando». A característica própria do pecado é a incompatibilidade com a Eucaristia, tendo em conta a ligação profunda entre Eucaristia e Igreja, pelo que aceder à comunhão é comungar o próprio mistério. Não pertencer à Igreja é não receber o Corpo de Cristo. A remissão dos pecados permite aderir ao Corpo de Cristo sacramental e eclesiológico. Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 183. 336 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 232, 8, in Opere 32/2, 568: «Discutio paenitentes et invenio male viventes»; Ep. 95, 3 in Opere 21, 894. 337 Cf. AGOSTINHO, Enchiridion, 17, 65, in Opere 6/1, 550: «In actione autem poenitentiae, ubi tale commissum est, ut is qui commisit a Christi etiam corpore separetur, non tam consideranda est mensura temporis quam doloris. Cor enim contritum et humiliatum Deus non spernit». 338 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 4, 32, 35, in Opere 29, 64-66. 339 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 82, 8, 11, in Opere 30/1, 620, 625: «nescio unde sibi testemonia nulla et vana conquirunt, dicentes, peccata carnis Deus non curat». 340 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 82, 12, 15, in Opere 30/1, 626, 630. 341 Cf. AGOSTINHO, Sermo, 82, 10, 13, in Opere 30/1, 622-624, 626-628; 278, 12, 12, in Opere 33, 70-72; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 172-174. 342 AGOSTINHO, Sermo, 214, 11, in Opere 32, 233: «In hac ecclesia reviviscet anima, quae mortua fuerat peccatis, ut convivificetur Christo, cuius gratia sumus salvi facti».


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da invasão dos Vândalos, para que não faltem aos moribundos nem o baptismo nem a reconciliação343. Trata-se de uma penitência nãoreiterável, assim como uma medicina que não pode ser repetida. No entanto, a Igreja não abandona aqueles que tornam a pecar344. Como para outros Padres, para Agostinho, os eclesiásticos não podem receber a penitência. Aos sacerdotes convertidos da heresia não são impostas as mãos como aos leigos, tendo em conta que o sacramento da ordem não pode ser repetido345. A imposição da penitência é uma degradação do sacramento da ordem346. d) Cesário de Arles Cesário de Arles (†543) convida todos os fiéis a receberem a Penitência, sendo a ordem dos penitentes acessível a todos os que a desejam sinceramente347. Tal facto faz-se na presença de outros fiéis, não para a humilhação do penitente, mas para um apelo solene à oração de intercessão348. Os pecados menos graves não são sujeitos à penitência canónica, desde que não se caia nos pecados graves e se exercite a caridade em todas as suas formas. Para os pecados capitais, mesmo secretos, é necessário recorrer à penitência canónica349. O bispo de Arles apresenta-nos as listas mais completas da penitência antiga. Contudo, os pecados menores acumulados em grande número são equivalentes a pecados graves350. ———————— 343 344

Cf. AGOSTINHO, Sermo, 222, in Opere 32/1, 314-316. Cf. AGOSTINHO, Ep. 153, 3, 7, in Opere 22, 528: «Quamvis ergo caute salubriterque provisum sit ut locus illius humillimae poenitentiae semel in Ecclesia concedatur, ne medicina vilis minus utilis esset aegrotis, quae tanto magis salubris est, quanto minus contemptibilis fuerit». 345 Cf. AGOSTINHO, Contra epistolam Parmeniani, 2, 13, 28, in Opere 15/1, 150: «ideoque non eis in populo manus imponitur, ne non homini, sed ipsi sacramento fiat injuria». Já Optato de Milevi (séc- IV) tinha condenado Donato, que obrigava à penitência os bispos e presbíteros pecadores, tendo em conta a dignidade do sacerdote e do sacramento . Cf. OPTATO DE MILEVI, Adversus Parmenianum Donatistarum, 1, 24 in PL 11, 932-934; 2, 24-25, in PL 11, 979-984. 346 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 99. 347 Cf. CESÁRIO, Sermo, 64, 1, in CCL 103, I, 275; 179, 1, in CCL 103, I, 2, 724; 256, 4, in PL 39, 2219-2220; 257, 2 in PL 39, 2220: «poenitentia omnibus necessaria est». 348 Cf. CESÁRIO, Sermo, 67, in CCL 103, I, 284-288; 179, 7, in CCL 103, I, 2, 727-728; 189, 1, in CCL 103, I, 2, 770-771. 349 Cf. CESÁRIO, Sermo, 60, in CCL 103, I, 263-266; 179, 2, in CCL 103, I, 2, 725. 350 No sermão 179, encontram-se: o sacrilégio, o assassínio, o adultério, o falso


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Na sua perspectiva, a vida militar e o casamento não são impedimentos a uma vida verdadeiramente arrependida. Distingue entre a paenitentiam agere e paenitentiam accipere. A primeira é vivida ao longo da vida, e a segunda é aquela que é desejada formalmente para o fim da vida351. A primeira torna frutuosa a recepção da segunda. Todos querem beneficiar desta em vista da eternidade352. A penitência in extremis é uma graça merecida, mas que exige preparação, precedida de boas obras e com uma finalidade de conversão; trata-se de uma dedicação virtuosa à realização da penitência353. Distingue três casos na vivência da prática da penitência no seu tempo. No primeiro caso, encontram-se os que viveram uma vida culpável, sem escrúpulos, na esperança presunçosa de receberem o perdão. Podem receber a penitência no leito de morte, mas o perdão é mais que duvidoso. À segunda categoria, pertencem os que pecaram por ignorância ou fraqueza. Terão o perdão se se arrependerem sinceramente com a intenção de se converterem. No terceiro caso, estão os que realizaram boas obras e se corrigiram durante a sua conduta. Estes anteciparam já a expiação das suas faltas354. Deste modo, os esforços realizados durante a vida colocamnos na possibilidade da reconciliação final. Cesário de Arles tenta evitar que o abandono da penitência gere um abandono da Eucaristia. Por isso, insiste na participação da mesma, pelo menos no Natal, Páscoa e Pentecostes355, particularmente na sua participação com preparação penitencial356. ————————

testemunho, a avidez, o orgulho, a inveja, a cólera, a embriaguez e a calúnia. Em outro sermão, 150, acrescenta a assistência a espectáculos sangrentos ou imorais, sortilégios, consultação de adivinhos, usos diabólicos e todas as formas de superstição pagã, os bailes e danças, o concubinato, assim como as formas inferiores de matrimónio – inaequale connubium. Contudo, não faz referência à apostasia e rapto, frequentes nos Concílios da época. Cf. CESÁRIO, Sermo, 150, 3, in CCL 103, I, 2, 614-615; 179, 2, in CCL 103, I, 2, 725; C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 30-32. 351 Cf. CESÁRIO, Sermo, 256, 4, in PL 39, 2219-2222; 229, 2, 3, in PL 39, 2166. 352 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 97. 353 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 189: «(Cesario) cerca di tener desto che la vita christiana è e deve essere per tutti, particolarmente per chi più gravemente pecca, una continua conversione». 354 Cf. CESÁRIO, Sermo, 60, 1-3, in CCL 103, I, 263-264. 355 Cf. CONC. DE AGDE (506), c. 18, in Mansi 8, 327: «Saeculares qui Natale Domini, Pascha et Pentecostem non communicaverint, catholici non credantur nec inter catholicos habeantur». 356 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 190.


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2.3.3 Documentos normativos a) Legislação Pontifícia A legislação dos Romanos Pontífices desta época veio atenuar o rigorismo de certas Igrejas Particulares, pautando-se pela firmeza contra a heresia novaciana. A sua disciplina confirma a penitência canónica e reitera a moderação para com os moribundos e proíbe a aplicação da penitência aos clérigos. Numa carta de 392, o Papa Sirício (†399), a propósito de Joviniano e dos seus seguidores, descreve assim a excomunhão: «nostro judicio in perpetuum damnatis extra ecclesiam remanerent»357. Na sua disciplina, inclui entre as penitências a cumprir a interdição de relações conjugais358. Prevê a penitência perpétua para os casos de idolatria e concubinato de monges e religiosos359. O Papa critica os recidivos porque violam as leis penitenciais e tornam a cair na vida de pecado que tinham antes, mas a solução é de moderação, porque podem receber o viático em perigo de morte360. O pecador é excluído da comunhão eucarística, mas não se tomam medidas drásticas contra ele361. A penitência não se deve aplicar aos clérigos, assim como se proíbe aos penitentes o acesso às ordens sacras362. Na carta a Exupério de Toulouse, o Papa Inocêncio I (†417) introduz a disciplina da flexibilidade acerca dos penitentes tardios, atribuindolhes a penitência e a extrema comunhão363. Opõe-se vigorosamente contra o rigorismo novaciano acerca dos moribundos, permitindo-lhes a reconciliação antes de morrer364. Na carta a Decenzio de Gubbio, o Papa afirma que, para a aplicação da penitência, o sacerdote deve ter em conta as disposições do penitente e «tum jubere dimitti, cum viderit ———————— 357 358 359 360

Cf. SIRÍCIO, Ep. 7, 4, in PL 13, 1171. Cf. SIRÍCIO, Ep. 1, 4, 5, in PL 13, 1136-1137. Cf. SIRÍCIO, Ep. 1, 5, 6, in PL 13, 1137. Cf. SIRÍCIO, Ep. 1, 5, 6, in PL 13, 1137: «Quos tamen quoniam carnali fragilitate ceciderunt, viatico munere, cum ad Dominum coeperint proficisci, per communionis gratiam volumus sublevari». 361 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 151. 362 Cf. SIRÍCIO, Ep. 1, 14, in PL 13, 1145: «paenitentiam agere cuiquam non conceditur clericorum». O carácter infamante da penitência manifestava-se no facto de que um antigo penitente, mesmo reconciliado, não pode ser ordenado e um clérigo maior não pode entrar na ordem dos penitentes. Ordem e penitência excluem-se. Cf. C. VOGEL, Le pécheur et la pénitence, 56, nt. 43. 363 Cf. INOCÊNCIO I, Ep. 6, 1, in PL 20, 495-496. 364 Cf. INOCÊNCIO I, Ep. 6, 2, 6, in PL 20, 498-499.


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congruam satisfactionem suam». Para a reconciliação estabelece a Quinta-feira Santa como termo da penitência. O ministro da penitência, Romanae Ecclesiae consuetudo, é o bispo – sacerdos – que avalia as faltas, aprecia a contrição e fixa a penitência365. O Papa Celestino (†432) escreve em 428 uma carta aos bispos de Viena e Narbonne, onde se encontrava resistência à concessão da reconciliação a quem a pedisse sinceramente em perigo de morte. O Papa reage contra uma mentalidade formalística, porque a conversão é um facto espiritual e a eliminação do pecado obra da iniciativa divina366. O papa Leão Magno (†461) atesta a existência de uma penitência pública com confissão secreta dos pecados, criticando o mau hábito de publicar as faltas dos pecadores, bastando «solis presbyteris indicare confessione secreta»367. Deve-se notar a preocupação de manter distinto o procedimento penitencial do penal, porque a publicação da culpa pode fazer desenvolver a sanção penal368. É o bispo que controla o tempo de reconciliação, antecipando ou adiando a reconciliação369. Contudo, o Papa recomenda aos bispos que não apliquem a excomunhão por faltas ligeiras370. A absolvição é considerada uma disposição divina, tendo sido o poder confiado por Cristo aos chefes da Igreja371. Deste modo, a Igreja possui o poder de perdoar os pecados, mas os sacerdotes devem submeter-se ao juízo de Deus, que supera o ministério sacerdotal, para aqueles que morreram. Por isso, apela à responsabilidade de os pecadores se submeterem à penitência: «multum enim utile et necessarium est, ut ———————— 365

Cf. INOCÊNCIO I, Ep. 25, 1, 7, in PL 20, 516: «Qui sive ex gravioribus comissis sive ex levioribus poenitentium gerunt, si nula interveniat aegritudo Vª feria ante pascha eis remittentidum Romanae ecclesiae consuetudo demonstrat. Caeterum de pondere aestimando delictorum sacerdotibus est iudicare, ut attendat ad confessionem paenitentis et ad fletus atque lacrymas corrigendis, ac tum iubere dimitti cum viderit congruam satisfactionem» 366 Cf. CELESTINO, Ep. 4, 2, 3, in PL 50, 432. 367 LEÃO MAGNO, Ep. 168, 2, in PL 54, 1211. Note-se que a palavra sacerdote no magistério desta época refere-se exclusivamente ao bispo. Deste modo, não se descobrem sinais de um penitenciário ainda nesta época. Cf. H. LECLERCQ, «Pénitencier», 214. 368 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 157-158. 369 Cf. LEÃO MAGNO, Ep. 19, 2, in PL 54, 186-187. 370 Cf. LEÃO MAGNO, Ep. 10, 8, in PL 54, 635. 371 Cf. LEÃO MAGNO, Ep. 108, 2 in PL 54, 1011: «Mediator enim Dei et hominum homo Christus Jesus hunc praepositis Ecclesiae tradidit potestatem ut et confitendibus actionem paenitentiae darent».


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peccatorum reatus ante ultimum diem sacerdotali supplicatione solvatur»372. Nestes casos, indica que se conceda o perdão se se encontram indícios de arrependimento sincero, sinal do querer de Deus sobre a salvação do pecador373. Convida à paciência e moderação para o caso de um jovem que, depois de ter recebido a penitência em perigo de morte, se casa após recuperar a saúde374. Na carta a Rústico de Narbonne considera ser da tradição eclesiástica proibir aos clérigos de receberem a penitência375. Para esses, no entanto, está prevista a privata secessio, que deve ser pedida à Igreja como a penitência e que consiste no retirar-se para um lugar para expiar o pecado em privado. Trata-se de uma absolvição antes do cumprimento da satisfação, uso que viria a ser regra muito mais tarde376. Nos escritos do Papa Gelásio (†496), a excomunhão é entendida como exclusão da Igreja, da comunhão dos fiéis e da Eucaristia. No fragmento 49377, esta exclusão é explicada: «ut ejiciatur a communione, id est consortio aliorum fidelium qui intra ecclesiam stant tempore orationis et laudis Dei». O penitente é rejeitado «extra ecclesiam inter audientes, id est catechumenos»; depois de um tempo de penitência pode ter acesso «in ecclesiam, in communionem, id est consortium orationis cum penitentibus», e após um novo tempo de penitência é readmitido «plenius ad communionem, id est consortium ceterorum fidelium et ———————— 372 373

LEÃO MAGNO, Ep. 108, 3, in PL 54, 1012. No entanto, os pecadores que não tiveram intenção de se arrepender, depois de morrer, não podem ser reconciliados, cf. LEÃO MAGNO, Ep. 108, 5, in PL 54, 10131014. 374 Cf. LEÃO MAGNO, Ep. 167, 13, in PL 54, 1207: «In quo tamen non regulam constituimus, sed quid sit tolerabilius aestimamus». 375 Cf. LEÃO MAGNO, Ep. 167, 2, in PL 54, 1203-1204: «Alienum est a consuetudine ecclesiastica, ut qui in presbyterali honore aut in diaconii gradu fuerint consecrati, ii pro crimine aliquo per manus impositionem remedium accipiant paenitendi». Leão pensa atribuir isso à tradição, mas existem testemunhos claros de que nos primeiros séculos os clérigos recebiam a penitência como todos os leigos: CIPRIANO, Ep. 64, 1, in MORESCHINI, ed., Cipriano lettere, II, 162-163; CONC. DE ELVIRA (305), c. 1, in Mansi, 2, 5. Esta opinião é confirmada por um estudo: B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 98, nt 2. 376 O exílio de um clérigo para um mosteiro é entendido como deposição do ofício. Cf. CONC. DE ÉPAONE (517), c. 22, in Mansi 8, 561-562; CONC. DE ORLÉANS (538), c. 7, in Mansi 9, 13-14: «De alduteriis autem honoratorum clericorum id observandum est, ut si quis adulterasse aut confessus fuerit, vel convictus, depositus ab officio, communione concessa, in monasterio toto vitae suae tempore retrudatur»; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 99-100, 102. 377 Cf. GELÁSIO, Fragmenta, 49, in PL 59, 140-142.


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percepcionis sacri corporis et sanguinis Christi». Note-se que a privação da Eucaristia é apenas consequência necessária da exclusão da Igreja. O fragmento 37378, que invoca a autoridade de São Leão Magno, refere-se à interdição de quem comungar com um excomungado. Penaliza o fiel que despreza esta norma, com a privação da Eucaristia379. b) Concílio de Elvira (305 ca.) No início do séc. IV380, reuniu-se em Elvira um Concílio com 19 bispos e 24 presbíteros de cinco províncias eclesiásticas diversas381. Foram promulgados 81 cânones que mostram a situação da Igreja, dos quais 35 se dedicam explicitamente à disciplina penitencial382. A preocupação do Concílio é pastoral, por isso estabelecem-se penitências tendo em vista a privação da comunhão, que constitui o elemento essencial da excomunhão383. Sobressai o rigorismo de certas determinações384 que não aceitam a complacência com o pecado. Exclui da reconciliação 18 crimina, mes———————— 378 379

72-75. 380

Cf. GELÁSIO, Fragmenta, 37, in PL 59, 139. Cf. J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication»,

Não se sabe ao certo a data deste Concílio, a colocar-se entre 295 e 314, provavelmente antes da perseguição de Diocleciano (302-305). Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 116; J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 66. 381 Cf. CONC. DE ELVIRA (305), 5-19; É. AMANN, «I. La Pénitence Primitive», 782-783; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza nei Concili occidentali», 92-103; G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 106-107. 382 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 117: «Il concilio parla di penitenza che si potrae anche per diversi anni: senza dubbio il termine si riferisce all’istituto penitenziale come ci è noto da altri documenti del secolo III; particolarmente – sembra – alla prassi africana». 383 Cf. J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 66: «L’excommunication y tient une place de premier plan (58 mentions). La terminologie en est variée, mais il n’est pas possible, à travers ses fluctuactions, de retrouver la réalité de l’institution [...]. Quant aux plus nombreux de beaucoup, ils ne concernent que la sanction purement religieuse de la privation de la communion. Ils ont peu designer la réception ou la privation de l’Eucharistie une grande variété d’expressions, qui atteste qu’à cette époque, in n’y avait pas encore en cette matière un rigoureux vocabulaire technique». 384 Este rigorismo manifesta-se pela extensão e taxatividade com que é imposto, sem prever a aplicação por parte do bispo da prudência pastoral. Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 117.


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mo em artigo de morte385. A idolatria é definida como crime capital e de máximo delito. Igualmente o homicídio e o adultério são tidos como crimes. A gravidade da culpa é associada à morte espiritual provocada pelo pecado, por isso as culpas graves separam o cristão da comunhão eclesial386. Alguns delitos, como a idolatria, excluem da eucaristia perpetuamente, mesmo no fim da vida387. Outros excluem durante toda a vida, mas não em perigo de morte, como no caso dos flamines388. Para outras culpas de menor gravidade é prevista uma exclusão temporânea variável389. É a primeira vez que um Concílio elenca um conjunto de pecados graves que excluem da comunhão eucarística, mas não se trata de um Penitencial avant la lettre. Por outra parte, a exclusão da comunhão não implica necessariamente a exclusão da comunidade390. O rigorismo de Elvira contradiz a disciplina da Igreja de Roma, de África e da Ásia391. A readmissão à comunhão eucarística acontece depois da legitima poenitentia canónica. O cânon 32 especifica que é o Bispo o ministro da penitência e o cânon 53 afirma que é somente ele que pode reconciliar o penitente que fora excomungado392. ————————

385 Esta recusa da comunhão, mesmo em perigo de morte, foi igualmente decretada por outros Concílios, mesmo não espanhóis: Arles (314), cc 14 e 22, in Mansi 2, 473; Saragoça (380), c. 2, in Mansi 3, 634. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 86. 386 Cf. CONC. DE ELVIRA (305), cc. 1; 2; 18; 32; 53; 59; 63; 65; 74; 75; 76, in Mansi 2, 5-18. 387 Cf. CONC. DE ELVIRA (305), c. 1, in Mansi 2, 5-6: «placuit nec in finem eum communionem accipere». São também irremissíveis a morte por malefício (c. 6), o adultério reiterado (c.7), o divórcio (cc. 8-9); o trabalho de proxeneta (c. 12), a violação do voto de virgindade por uma virgem consagrada (c. 13), o casamento de uma cristã com um sacerdote pagão (c. 17), o adultério de bispos, padres e diáconos (c. 18), adultério com aborto (c. 63), uniões incestuosas (c. 66), pederastia (c. 71). 388 Cf. CONC. DE ELVIRA (305), cc. 3, 6, in Mansi 2, 6-7: «placuit in finem eos praestari communionem». 389 Cf. CONC. DE ELVIRA (305), cc. 5; 7; 14; 22; 31; 37; 40; 46; 50; 55; 57; 70, in Mansi 2, 6-17. 390 Cf. J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 66-67. 391 Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 100-103. 392 Cf. CONC. DE ELVIRA (305), c. 32, in Mansi 2, 11: «Apud presbyterum, si quis gravi lapsu in ruinam mortis inciderit, placuit agere poenitentiam non debere, sed potius apud episcopum»; c. 53, in Mansi 2, 14: «Placuit cunctis, ut ab episcopo quis accipiat ad comunionem, a quo abstentus in crimine aliquo fuerit»; M.-F. BERROUARD, «La penitence publique durant les six premiers siècles», 118.


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Outros concílios espanhóis retomam as mesmas normativas. O Concílio de Saragoça393, celebrado em 380 e dirigido contra as práticas priscilianistas, sanciona principalmente esta heresia. A excomunhão indica a exclusão da Igreja. O concílio de Toledo de 400, em que participaram 19 bispos, reafirmou a fé de Niceia contra as doutrinas priscilianistas e refere-se cinco vezes à excomunhão com o sentido de exclusão da comunidade e uma vez entendida como exclusão da Eucaristia no cânon 19. O termos excommunicatus e abstineri têm aqui o sentido de exclusão da comunidade, diversamente de exclusão da Eucaristia como acontece no Concílio de Elvira394. Prevê a penitência perpétua para o segundo casamento de uma viúva de eclesiástico395. c) Sínodo de Ancyra (314) e Concílio de Niceia (325) O c. 22 do Sínodo de Ancyra prescreve a penitência perpétua para um homicídio premeditado. A penitência varia consoante os casos de idolatria e luxúria, crimes contra a vida, tendo em conta as circunstâncias396. O Concílio Ecuménico de Niceia, de 325, decreta como lei antiga e canónica que um moribundo não seja privado do último e necessário viático. Contudo, deve fazer penitência em caso de cura397. d) Concílios Africanos A actividade conciliar africana foi considerável durante o século IV, mas, devido às invasões vândalas, foi improvisamente interrompida. Os concílios africanos tiveram menos preocupação repressiva que os ————————

393 Cf. CONC. DE SARAGOÇA (380), cc. 5-6, in Mansi 3, 635: «Item dictum est: Ut hi, qui per disciplinam aut sententiam episcopi ab ecclesia fuerint separati, ab aliis episcopis non sint recipiendi. Quod si scientes episcopi fecerint, non habeant communionem. Ab universis episcopis dictum est: Qui hoc commiserit episcoporum, non habeat communionem. VI Item legit: Si quis clericus propter luxum vanitatisque praesumptum de officio sponte discesserit ac velut observatorem legis monachum viderit, si maluerit esse quam clericum, ita de ecclesia repellendum, ut nisi rogando atque obsecrando plurimis temporibus satisfecerit, non recipiatur. Ab universis episcopis dictum est: Ita fiat». 394 Cf. CONC. DE TOLEDO (400), cc. 14-19, in Mansi 3, 1000-1001; J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 68. 395 Cf. CONC. DE TOLEDO (400), c. 18, in Mansi 3, 1001. 396 Cf. SÍNODO DE ANCYRA (314), cc. 7, 16, 17, 20, 21, in P.-P., JOANNOU, ed., Fonti, I, 2, 54-73. 397 Cf. CONC. DE NICEIA (325), c. 13, in Mansi, 2, 690.


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gauleses e hispânicos e sobretudo mais tardiamente. Os concílios de Cartago de 348 e 390 preocuparam-se mais em estabelecer normas que editar penas. A sanção é apenas formulada no final dos cânones e com a mesma penalização para todos as faltas. Tal revela o pouco interesse da mesma para o legislador. A excomunhão é uma excepção nestes concílios. No concílio de Cartago de 348, as expressões a communione separari ou privari aplicam-se à exclusão da comunidade398. O concílio de 390 usa pela primeira vez o termo «excommunicatus» na legislação africana e tem em vista igualmente a exclusão da comunidade399. Nos cânones do concílio de Cartago de 397, entende-se a mesma como exclusão da comunidade, visto que a exclusão da comunhão já está incluída400. O Concílio de Hipona prevê para os pecadores públicos a imposição das mãos ante apsidem. Os bispos são os senhores da reconciliação, e só em caso de necessidade e por ordem do bispo os presbíteros podem colaborar401. e) Concílios Gauleses do Séc. IV-V No dia 1 de Agosto de 314, realizou-se um concílio em Arles com vários delegados das Igrejas da Gália, Itália e África setentrional e com os delegados do Papa Melcíades. O imperador Constantino decidiu convocá-lo para resolver a questão da eleição de Ceciliano para bispo de Cartago, impugnada pelos donatistas. A assembleia confirmou a validade da sua ordenação. A atenção do Concílio também se dirigiu aos problemas pastorais, particularmente aos de carácter penitencial402. No elenco dos pecados sujeitos à penitência canónica, acrescentamse a deserção militar em tempo de paz, a actividade lúdica e teatral403. ———————— 398 399 400

Cf. CONC. DE CARTAGO (348), cc. 3, 14, in Mansi 3, 146, 149. Cf. CONC. DE CARTAGO (390), c. 3, in Mansi 3, 146. Cf. CONC. DE CARTAGO (397), cc. 7-8, in Mansi 3, 881-882, em que a exclusão da comunidade indica a um meio de contrição em matéria judicial; c. 9, in Mansi 3, 882, sanciona a violação do privilégio de foro por parte do clero; c. 42, in Mansi 3, 887-888, reprime o despeito dos direitos do bispo sobre os seus clérigos. 401 Cf. CONC. DE HIPONA (392), c. 32, in Mansi 3, 896: «ut presbyter inconsulto episcopo non reconcilietur poenitentem». 402 Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 103-106. 403 Cf. CONC. DE ARLES (314), cc. 3, 4, 5, in Mansi 2, 471. Neste concílio, a terminologia não é precisa no que se refere à excomunhão, se à privação do sacramento, se à privação da comunidade. Cf. J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 68.


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Somente no cânon 22 se nomeia explicitamente a penitência404, cuja realização era necessária para a readmissão à Eucaristia. O concílio refere-se à excomunhão, mas a terminologia é imprecisa, pois pode ser entendida ou como exclusão da comunidade, ou como exclusão da Eucaristia405. A exclusão vitalícia era prevista para os pecados mais graves, mas só no caso de apostasia se prevê uma exclusão perpétua, se não houver arrependimento406. Este Concílio mantém-se numa linha de moderação, comum a Cartago e Roma. Ninguém está excluído da comunhão senão por culpa própria, mesmo um moribundo que não tenha completado o tempo de penitência407. O Concílio de Valence, realizado em 374, somente no cânon 2 prescreve a sanção communio differatur no que respeita às virgens consagradas. Tal facto faz supor que este concílio não autorizava a recepção da Eucaristia senão depois do cumprimento da penitência que permitia o retorno do fiel à comunidade408. O Concílio de Turim, realizado em 398, refere-se à privação da Eucaristia – dominica communione privatus – no cânon 5 e à exclusão da comunidade nos cânones 6 e 7409. Os cânones do Concílio de Riez de 439 dão a conhecer o estado da excomunhão. No cânon 9, aparece pela primeira vez na legislação conciliar gaulesa o termo «excommunicatus». Depois de realizada a penitência, os penitentes podem ser de novo admitidos à comunhão. Também neste concílio não se aplica a penitência aos clérigos410. O Concílio de Orange foi aberto a 8 de Novembro de 441, sob a presidência de Santo Hilário, bispo de Arles, e participaram dezasseis bispos. Dos trinta cânones emanados alguns dedicam-se à disciplina ecle———————— 404

CONC. DE ARLES (314), c. 22, in Mansi 2, 473: «De his qui apostant, et nunquam se ad Ecclesiam repraesentant, ne quidem poenitentiam agere quaerunt [...] placuit eis non dandam communionem nisi revaluerint, et egerint dignos fructus poenitentiae». 405 Cf. J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 68. 406 Cf. CONC. DE ARLES (314), c. 22, in Mansi 2, 473. 407 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 90. 408 Cf. CONC. DE VALENCE (374), c. 2; J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 68-69. 409 CONC. DE TURIM (398), cc. 5-7, in Mansi 3, 862. 410 CONC. DE RIEZ (439), c. 9, in Mansi 5, 1095: «Placuit omni synodo hos tales ab Ecclesia Dei et a coetu catholicorum segregari ac excommunicatos exilio relegari; ut post correcti satisfactionem poenitentiae, ad sanctam communionem possint idem admitti, non ad clerum».


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sial. O concílio confirma a tradição penitencial da reconciliação dos moribundos411. Ao penitente é administrada a penitência e administrada a comunhão sem o rito de absolvição dos pecados. O concílio distingue a imposição das mãos para a aplicação da penitência e uma outra para a reconciliação dos pecados. Aos moribundos aplica-se a primeira. Em caso de recuperação da saúde, este deve entrar na ordem dos penitentes para obter a absolvição dos pecados. O cânon 4 concede a penitência aos clérigos que a pedem. Tal não implica a entrada na ordem dos penitentes, mas simplesmente a aceitação da penitência pelos pecados cometidos412. O concílio mostra o cuidado pastoral pelos que não podem por si ou directamente realizar a penitência canónica. Para tal, deve-se ter em conta a intenção de recebê-la413. O Concílio de Vaison realizou-se a 13 de Novembro de 442 e emanou 10 cânones. O cânon 2 refere-se aos moribundos que morreram sem terem recebido o viático e a reconciliação canónica. A Igreja temnos como membros, perdoados por Deus e salvos, considerando decisivas as disposições interiores414. Tal posição é menos rigorosa que a de Leão Magno, que considera fora da Igreja os penitentes sem a absolvição sacerdotal. Por volta do ano 450, realizou-se novamente um Concílio em Arles, que retomou alguns cânones do anterior (314), de Niceia (325) e de Vaison (442). Contudo, o cânon 22 apresenta um elemento de novidade415. Aos conjugados não deve ser dada a penitência senão com o consenso do outro cônjuge. Naturalmente, a penitência comportava um ————————

411 Cf. CONC. DE ORANGE (441), c. 3, in Mansi 6, 436-437; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 107-109. 412 Cf. CONC. DE ORANGE (441), c. 4, in Mansi 6, 437: «Poenitentiam desiderantibus clericis non negandum». 413 Cf. CONC. DE ORANGE (441), c. 12, in Mansi 6, 438. 414 Cf. CONC. DE VAISON (442), c. 2, in Mansi 6, 453: «Pro his qui poenitentia accepta, in bonae vitae cursu satisfactoria compunctione viventes, sine communione inopinato nonnunquam transitu, in agris aut itineribus praeveniuntur, oblationem recipiendam, et eorum funera, ac deinceps memoriam ecclesiastico affectu prosequendam; quia nefas est eorum commemorationes excludi a salutaribus sacris, qui ad eadem sacra fideli affectu contendentes, dum se diutius reis statuunt, indignos salutiseris mysteriis judicant, ac dum purgatiores restitui desiderant, absque sacramento rum viatico intercipiuntur: quibus fortasse nec absolutissimam reconciliationem sacerdos denegandam putasset»; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 109-110. 415 Cf. CONC. DE ARLES (450 ca.), c. 22, in Mansi 7, 881: «Poenitentiam conjugatis non nisi ex consensu dandam»; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 110-111.


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conflito de obrigações, como a abstenção perpétua de relações conjugais, que levava a que um cônjuge se recusasse sexualmente ao outro cônjuge. Trata-se de um interessante caso em que prevalece o direito conjugal sobre o direito pessoal. A 4 de Outubro de 453, realizou-se um pequeno Concílio em Angers sob a presidência de Eustóquio, bispo de Tours. O último cânon retoma a prática penitencial da Igreja. O concílio sente a necessidade de reafirmar que não deve haver exclusão do ingresso na penitência e do perdão dos pecados416. Oito anos depois, em Novembro de 461, reuniu-se um Concílio em Tours, sob a presidência de S. Perpétuo, bispo desta cidade. Rebate-se a exclusão da comunhão eucarística para os casos de falta de castidade da parte do clero, de fornicação com uma virgem consagrada e do homicídio417. O Concílio penaliza os recaídos que retornam aos prazeres do mundo, afastando-os da comunhão eucarística e da mesa comum dos fiéis, claramente distintas: «a communione ecclesiae vel a convivium fidelium extraneus habeantur»418. Quatro anos depois, em 465, sob a mesma presidência do mesmo S. Perpétuo, reuniu-se um Concílio em Vannes. Emanaram-se diversos cânones para pecados graves que excluem da comunhão eucarística e da comunidade419: «non solum a communione dominicorum sacramentorum sed etiam a conviviis fidelium submovendos»420. Para outros casos, a exclusão eucarística é temporalmente limitada421. ————————

416 Cf. CONC. DE ANGERS (452), c. 12, in Mansi 7, 902: «Poenitentiae sane locus omnibus pateat, qui conversi errorem suum voluerint confiteri, quibus perspecta qualitate peccati, secundum aestimationem erit venia largienda»; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 111. 417 Cf. CONC. DE TOURS (461), cc. 3, 6 e 7, in Mansi 7, 945-946; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 114. 418 Cf. CONC. DE TOURS (461), c. 8, in Mansi 7, 946; J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 70: «l’exclusion du convivium désigne la mise à l’écart de la communautè et non pas la privation de la communion». 419 Cf. CONC. DE VANNES (461), cc. 1-6, 9, 16, in Mansi 7, 953-955: homicídio e falso testemunho, repúdio não motivado e novo matrimónio, interrupção da penitência e retorno a uma vida desordenada, fornicação com uma virgem consagrada, vagabundagem de clérigos e monges, instituição de processos diante dos tribunais civis da parte do clero, divinização e uso supersticioso da Sagrada Escritura. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 115. 420 CONC. DE VANNES (461), c. 3, in Mansi 7, 953. 421 Cf. CONC. DE VANNES (461), cc. 13, 14, in Mansi 7, 954-955: alcoolismo do clero e ausênsia injustificada do ofício divino.


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Esta abundante disciplina gaulesa reafirma os critérios de penitência canónica, aplicando-a a situações pastorais diferentes. Assiste-se por isso a critérios de moderação e atenção pastoral, especialmente para com os moribundos. Distingue-se a excomunhão da comunidade da exclusão eucarística, mas com algumas imprecisões. f) Sínodo de S. Patrício (457 ca.) Na Irlanda, desenvolve-se outro tipo de disciplina penitencial. Segundo alguns autores, S. Patrício e os seus discípulos não implantam a penitência clássica, mas forjam uma nova, baseada na prática dos antigos monges. O abade seria o director espiritual que remite os pecados422. Segundo outros autores, o sistema penitencial do Sínodo seria, no fundo, o da Igreja antiga423. Relativamente às disposições canónicas da Gália, a prática penitencial é menos rigorosa e os tempos da penitência são notavelmente reduzidos. Contudo, o primeiro Sínodo de S. Patrício usa mais a excomunhão que os Concílios gauleses424. O excomungado não pode ser acolhido pelos crentes e entrar na Igreja, mesmo na noite de Páscoa. Não se pode aceitar a sua oferta425. O clérigo excomungado não pode rezar com os outros clérigos, nem oferecer o Santo Sacrifício426. Tornase verdadeiramente excluído da Igreja, torna-se um alienus427. Pela primeira vez, é fixada a penitência para pecados graves como o homicídio, a fornicação e a adivinhação e não deixada à discrição do sacerdote. Para estes casos é fixada a penitência de um ano. Para o furto, é estabelecida a penitência de seis meses, com vinte dias de jejum a pão428. É o primeiro indício de penitência tarifada429. A exclusão da ———————— 422

Cf. SÍNODO DE S. PATRÍCIO (457), c. 3: «Statuitur ut abbas videat cui a Domino tribuetur potestas alligandi et solvendi; sed aptior est, iuxta Scriptura exempla, veniam. Si vera cum fletu et lamentatione et lugubri cum veste, sub custodia paenitentia brevis, quam longa et remissa cum temperamentis»; M.-B. DE VAUX SAINT-CYR, «Le sacrement de pénitence», 43; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 181-182. 423 Cf. L. BIELER, «Patrizio», 399. 424 Esta legislação não é tanto fruto de um Sínodo celebrado, mas uma carta circular dos Bispos Patrício, Ausilio e Isernino. É datável à volta de 457. Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 37. 425 Cf. SÍNODO DE S. PATRÍCIO (457), cc. 11, 12 e 18, in Mansi 6, 516-517. 426 Cf. SÍNODO DE S. PATRÍCIO (457), c. 28, in Mansi 6, 518. 427 Cf. SÍNODO DE S. PATRÍCIO (457), cc. 6-8, 10, 21, 22 e 24, in Mansi 6, 516-518. 428 Cf. SÍNODO DE S. PATRÍCIO (457), cc. 14-15, in Mansi 6, 516-517: «Christianus qui occiderit, aut fornicationem fecerit, aut more gentilium ad aruspicem


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comunhão permanece durante todo o tempo em que dura a situação de pecado, como por exemplo no caso de matrimónio depois do divórcio430. Pela primeira vez, a bruxaria aparece nos cânones eclesiásticos. A penitência canónica impõe a anulação do eventual efeito maléfico, usando o contrário da mesma fórmula mágica431. Portanto, assiste-se a uma evolução da prática penitencial, sobretudo em dois aspectos: o desaparecimento dos longos tempos penitenciais e a determinação precisa de algumas penitências, a tarifa432. g) Statuta Ecclesiae Antiqua (475 ca.) Trata-se de uma colecção redigida na Gália entre o Concílio de Vaison (442) e o de Agde (506), visto ter sido utilizada pelos padres deste último433. Os cânones disciplinares retomam as Constitutiones Apostolicae, e concretamente os cânones 18-20 visam flexibilizar a disciplina gaulesa penitencial, assim como uma certa indulgência no que diz respeito aos pecadores434. A terminologia usada – excommunicare – é mais firme que nos Concílios anteriores, em vez das perífrases antes empregues. Trata-se de um inegável progresso na técnica jurídica. Ad————————

meaverit; per singula crimina annum poenitentiae agat, impleto cum testibus veniat anno prenitentiae, et postea resolvetur a sacerdote. Et qui furtum fecerit, dimidium poeniteat viginti diebus cum pane; et si fieri potest, rapta repraesentet: sic in Ecclesiam renuetur». 429 A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 113. 430 Cf. SÍNODO DE S. PATRÍCIO (457), c. 19, in Mansi 6, 517: «Mulier Christiana quae acceperit virum honesties nuptiis, et postmodum discesserit a primo, et junxerit se adulterio , quae haec fecit, excommunionis fit». 431 Cf. SÍNODO DE S. PATRÍCIO (457), c. 16, in Mansi 6, 517: «Christianus qui crediderit esse lamiam in speculo, quae interpretatur striga, anathematizandus, quicumque super animam famam istam imposuerit, nec ante in ecclesiam recipiendus, quam ut idem criminis quod fecit sua iterum voce revocat, et sic poenitentiam cum omni deligentia agat». 432 A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 114. 433 Cf. J. GAUDEMET, Les sources du droit de l’èglise, 84. «Ce n’est que’en 1757 que les Ballerini, en donnant une édition qui utilisait six manuscrits anciens, démontrèrent qu’il s’agissait d’une collection composée en Gaule du Sud, dans la seconde moitié du Ve siècle. Maassen, en 1870, proposait, comme lieu d’origine, Arles et datait la collection de la fin du Ve siècle. Reprenant et précisant une hypothèse de Dom Botte, C. Munier est tenté d’attribuer les Statuta Ecclesiae Antiqua à Gennade de Marseille». A mesma opinião é partilhada por C. MUNIER, «Statuta Ecclesiae Antiqua», 2042-2043. 434 Cf. J. GAUDEMET, Les sources du droit de l’èglise, 85-86.


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quire o sentido da exclusão da comunidade, e toda a comunhão com o excomungado torna-se uma pena semelhante435. Os cânones mostram uma certa atenção para com os penitentes moribundos e os que morrem improvisamente sem terem recebido os sacramentos. A Igreja concede ao moribundo a imposição das mãos que absolvem dos pecados e reconciliam, mas, em caso de cura, este deve entrar na ordem dos penitentes e fazer penitência para receber novamente a imposição das mãos. É interessante notar como entre as obras penitenciais se incluem o transporte e sepultura dos mortos ou a oração de joelhos. Repete-se a interdição de excluir o clero dos penitentes436. h) Concílios Gauleses do Séc. VI O Concílio de Agde foi realizado a 11 de Setembro de 506, com a participação de 25 bispos e outros delegados de diversas dioceses do território franco, sob a presidência de S. Cesário de Arles. Dos quarenta e sete cânones autênticos, dois dizem respeito à prática penitencial. O cânon 15 recorda o rito da imposição da penitência, que consiste na imposição das mãos e no cilício na cabeça do penitente, e consequente entrada no ordo paenitentium437. Tal rito é apresentado como comum a todas as Igrejas. O Concílio proíbe aos jovens a penitência (que inclui a abstinência de relações conjugais), pois poderiam violar esta obrigação. O teor desta proibição sugere uma certa benevolência438. Por fim, é estabelecido o dever de não negar o viático a ninguém em ponto de morte. Conjugando estes dois aspectos, a Eucaristia acabava por ser adminis———————— 435

Cf. Statuta Ecclesiae Antiqua, 73, in CCL 148, 173: «qui communicaverit vel oraverit cum excommunicato, excommunicetur, clericus vel laicus»; 79, in CCL 148, 170; 104; J. GAUDEMET, «Notes sur les formes anciennes de l’excommunication», 70-71. 436 Cf. Statuta Ecclesiae Antiqua, 20-22, in CCL 148, 166-168; 65-67, in CCL 148, 171; 84, in CCL 148, 169; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 117-118. 437 Cf. CONC. DE AGDE (506), c. 15, in Mansi 8, 327: «Paenitentes, tempore quo paenitentiam petunt, impositionem manuum et cilicium super caput a sacerdote sicut ubique constitutum est, consequantur; et si aut comas non deposuerint, aut vestimenta non mutuaverint, abiiciantur et nisi digne paenituerint, non recipiantur. Iuvenibus etiam paenitentia non facile committenda est propter aetatis fragilitatem. Viaticum tamen omnibus in morte positis non negandum». 438 Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 114: «Sulla gravità di questa mancanza probabilmente il Concilio si attiene al pensiero precedentemente espresso da papa Leone Magno che considerava la cosa come colpa veniale, sebbene precisasse che non intendeva imporre la sua opinione». Este autor refere-se a esta fonte: LEÃO MAGNO, Ep. 167, in PL 54, 1207.


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trada somente como viático, visto que somente as pessoas de uma certa idade ofereciam garantias de fidelidade aos deveres penitenciais439. Por outra parte, o cânon 43 exclui da penitência os graus superiores do clero e depõe os eclesiásticos superiores, réus de culpas graves440. Esta norma é confirmada por disposições anteriores441. O Concílio de Orléans de 10 de Julho de 511 foi convocado pelo rei Clodoveu, sendo o primeiro dos cinco Concílios merovíngios celebrados nesta cidade. Dois dos seus cânones dizem respeito à prática penitencial. Insiste-se na observância das obrigações penitenciais, o que indica a dificuldade por parte dos fiéis em observar as interdições prescritas. A falta desta implica a suspensão da comunhão com a Igreja. O cânon 12 consente a administração do baptismo, em caso de necessidade, por parte dos clérigos depostos das suas funções por culpas graves442. O Concílio de Épaone de Setembro de 517 foi presidido por Santo Avito, metropolita de Viena, no contexto da reforma contra o arianismo e presenciaram outros 23 bispos e um delegado. Insiste-se na relação entre a penitência e o estado clerical443. Os que forem penitentes não podem aceder ao estado clerical. Um diácono ou sacerdote que tenham cometido um pecado capital serão fechados num mosteiro onde receberão somente a comunhão laical. Por outra parte, quem não observar a penitência só deverá receber a comunhão depois de a cumprir444. Um novo Concílio de Orléans, de 7 de Maio de 538, com a participação de dezanove bispos e sete presbíteros delegados dos bispos dos ———————— 439 440

Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 121. Cf. CONC. DE AGDE (506), c. 43, in Mansi 8, 332: «De paenitentibus id placuit observari, quod sancti patres nostri synodali sententia statuerunt, ut nullus de his clericus ordinetur; et qui iam sunt per ignorantiam ordinati, ut sicut bigami aut internuptarum mariti locum teneant. Ministrare diaconus aut consecrare in altari huiusmodi presbyter non praesumat». 441 Por exemplo, o Papa SIRÍCIO, Ep.1, 14, in PL 13, 1145: «Clerico nulli conceditur poenitentiam agere»; LEÃO MAGNO, Ep. 167, 2, in PL 54, 1203: «Alienum est a consuetudine ecclesiastica ut qui in presbyterali honore aut in diaconii gradu fuerint consecrati, ii pro crimine aliquo suo per manus impositionem remedium accipiant poenitenti [...]. Sacerdos si peccaverit, quis orabit pro illo?». 442 Cf. CONC. DE ORLÉANS (511), c. 12, in in Mansi 8, 353: «Si diaconus aut presbyter pro reatu suo se ab altaris communione sub paenitentis professione submoverit, sic quoque, si alii defuerint et causa certe necessitatis exoritur, poscentem baptismum liceat baptizari»; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 122-123. 443 Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 123-124; VOGEL, C., Le pécheur et la pénitence,193. 444 Cf. CONC. DE ÉPAONE (517), cc. 3, 22, 23, in Mansi 8, 559, 561-562.


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territórios do reino dos Francos, promulgou mais de trinta cânones, alguns pertencentes à prática penitencial445. Dispõe-se a deposição e reclusão de clérigos de grau superior culpados de adultério e pecados graves446. Exclui-se também da penitência as pessoas jovens e os casados, senão com o consenso das partes e em idade avançada447. Evita-se desse modo a recaída no pecado e muitas vezes a reconciliação é dada no leito de morte448. A entrada no estado de penitente é comparada neste Concílio à entrada na vida religiosa – «conversus ex laicis»449. Confirma-se nesta legislação a disciplina anterior, mas revela-se a dificuldade da aplicação da penitência canónica, cada vez mais apenas realizada por poucos fiéis e tardiamente. i) Concílios da Espanha do Séc. VI O Concílio de Barcelona foi convocado por Sérgio, arcebispo de Terragona, por volta do ano 540, que reuniu os sete bispos da sua província. As disposições disciplinares repropõem a praxe penitencial tradicional: imposição das mãos no início do caminho penitencial, separação temporânea da comunhão e observância das obrigações penitenciais. Em caso de doença, impunha-se a penitência e administrava-se o viático450. Depois da sua conversão do arianismo ao catolicismo, o rei dos Visigodos Recaredo convocou, em Toledo, um Concílio com mais de sessenta bispos da Espanha e da Gália Narbonense, que se iniciou a 8 de Maio de 589. Os cânones 11 e 12 revelam particular interesse: XI. Quoniam comperimus per quasdam Hispaniarum ecclesias non secundum canonem sed foedissime pro suis peccatis homines agere poenitentiam, ut quotiescumque peccare voluerint toties a presbytero se reconciliari expostulent, ideo pro coercenda tam exsecrabili praesumptione, id a sancto concilio jubetur, ut secundum formam canonum antiquorum detur poenitentiae, hoc est, ut prius eum quem sui poenitet facti a communione suspensum, faciat inter reliquos poenitentes ad manus impositionem crebro

———————— 445 446 447

Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 125-126. Cf. CONC. DE ORLÉANS (538), cc. 8-9, in Mansi 9, 14. Cf. CONC. DE ORLÉANS (538), c. 24, in Mansi 9, 18: «ut ne quis benedictionem poenitentiae juvenibus personis credere praesumat: certe conjugatis, nisi ex consensu partium, et aetate jam plena, eam dare non audeat». 448 Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 126-127. 449 Cf. CONC. DE ORLÉANS (538), c. 6, in Mansi 9, 13. 450 Cf. CONC. DE BARCELONA (ca. 540), cc. 6-9, in Mansi 9, 13-14; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 123-124


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recurrere; expleto autem satisfactionis tempore, sicuti sacerdotalis contemplatio probaverit, eum communioni restituat: hi vero qui ad priora vitia vel infra poenitentiae tempus, vel post reconciliationem relabuntur, secundum priorum canonum severitatem damnentur. XII. Quicumque ab episcopo vel presbytero sanus vel infirmus poenitentiam postulat, id ante omnia episcopus observet et presbyter ut si vir est, sive sanus, sive infirmus, prius eum tondeat et sic poenitentiam ei tradat: si vero mulier fuerit, non accipiat poenitentiam nisi prius mutaverit habitum; saepius enim laicis tribuendo desidiose poenitentiam, ad lamentanda rursum facinora post acceptam poenitentiam relabuntur451.

Testemunha-se pela primeira vez a presença de uma nova prática penitencial bastante difundida nas Igrejas da Espanha, diversa da penitência canónica tradicional, considerada indigna, vergonhosa e execrável452. A novidade desta nova prática é a reiterabilidade e o carácter juridicamente não público. Por isso, o Concílio insiste na defesa das características da penitência canónica, tentando impedir a difusão da nova prática. O cânon 12 reafirma a publicidade da penitência, com sinais externos. Trata-se talvez da única tomada de posição oficial contra a nova disciplina453. Aquilo que nos apresenta de significativo para o nosso tema é que pela primeira vez se apresenta o presbítero como ministro ordinário da penitência a par do bispo: «ab episcopo vel presbytero [...] episcopus observet et presbyter». 2.4 Síntese No século III, a questão dos lapsi conduz a Igreja a tomar consciência do poder concedido por Cristo de absolver qualquer pecado, assim como o seu ministério sacramental. A disciplina admite uma certa moderação, com a readmissão dos lapsi arrependidos, mas sempre em ponto de morte. A liturgia penitencial fixa-se: confissão dos pecados ao bispo, assistido pelo clero e com a presença da comunidade cristã, imposição das mãos para impor a penitência com obras penitenciais, ingresso na ordem dos penitentes, cumprimento da penitência, imposição da mão para a reconciliação e participação na Eucaristia. Em caso de necessidade, o presbítero substitui o bispo. No século IV, a forma ca———————— 451 452

CONC. DE TOLEDO (589), cc. 11-12, in Mansi 9, 995-996. Esta nova forma penitência identifica-se com a penitência tarifada irlandesa. Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 127-130. 453 Cf. G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 192.


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nónica da penitência estabelece-se, permanecendo imutável a disciplina do século anterior. Portanto, a Igreja tem a consciência de poder remitir todos os pecados, mas tal é reservado aos sacerdotes, bispos primeiramente, e depois os presbíteros, primeiro em colaboração e depois por si mesmos. Contudo, os gestos de exclusão e reconciliação por parte do bispo têm um sentido eclesiológico pleno, que se exprime na estrutura comunitária do processo penitencial. Toda a comunidade participa na separação do pecador, na sua correptio e na reconciliação. Como o pecado separa da comunhão da Igreja e da Eucaristia, assim também a reconciliação com a Igreja possibilita a participação na Eucaristia. Tal reconciliação é obra da Igreja e da missão do Espírito Santo, por isso se apela à santidade dos seus membros. No século V, o cristianismo difunde-se rapidamente com os novos cristãos oriundos do paganismo, mas menos preparados para manter a inocência baptismal. Por isso, dá-se um relaxamento da vivência cristã. Progressivamente, acontece um afastamento da penitência canónica, considerada demasiadamente severa, a que se recorre só em ponto de morte. A metade deste século, surge na Irlanda, por obra dos monges, a penitência tarifada. No século VI, as intervenções disciplinares mostram a dificuldade da realização da penitência canónica. O caminho penitencial é considerado demasiadamente exigente, por isso muitos o abandonam. A difusão da penitência tarifada é contestada. 3. A penitência dos séculos VII-X 3.1 A penitência tarifada O essencial desta nova forma de penitência era a taxa ou tarifa. A confissão era apenas o meio. Somente no século XIII, com o fim da prática solene da expiação, se desloca o centro da penitência para a confissão. Essa confissão penitencial não se pode confundir com a confissão como um meio terapêutico ou ascético454. O aparecimento da penitência tarifada provoca reacções contraditórias. Um exemplo é o dos bispos do Concílio de Toledo de 589, que se opõem a uma nova prática penitencial introduzida nas suas Igrejas455, ———————— 454 455

Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 13. Cf. CONC. DE TOLEDO (589), cc. 11-12, in Mansi 9, 995-996.


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ou, contrariamente, o caso dos bispos do reino de Clodoveu, reunidos em Chalon-sur-Chaône, entre 647-653, que aprovam e aconselham a prática penitencial tarifada: De poenitentia vero peccatorum, quae est medilla animae, utilem omnibus hominibus esse censemus; et ut poenitentibus a sacerdotibus data confessione indicatur poenitentia, universitas sacerdotum nuscetur consentire456.

Reconhecia-se a nova prática pastoral, em que se via a possibilidade de renovar o recurso à penitência, então já em desuso. Jonas de Bobbio (†659) testemunha o mérito de Columbano na evangelização do continente ao trazer consigo a nova prática457. A penitência tarifada terá nascido nos mosteiros celtas e anglo-saxões, que lhe dá o nome de penitência insular458. As fontes desta nova forma de penitência são essencialmente os penitenciais insulares, que determinam de forma casuística as penitências determinadas para todos os tipos de penitência, e emanados de autores privados459. O desenvolvimento desta disciplina no meio insular deve-se ao desconhecimento da penitência pública, conforme o testemunho do Penitencial de Teodoro: «Não existe reconciliação pública nesta província, porque não existe penitência pública»460. Graças aos missionários vin———————— 456

Trata-se do primeiro reconhecimento oficial do sistema penitencial céltico. Aceita-se a ideia da penitência como medicina e da sua necessidade para todos os homens. É interessante que entre os participantes desta assembleia se encontram homens vindos do Convento columbano de Luxeuil, como S. Éloi de Noyon, Donat de Besançon, Chagnoald de Laon, defensores activos do método do mestre. Cf. CONC. DE CHALON-SURSAÔNE (647-653), c. 8, in Mansi 10, 1191; C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 283; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 118. 457 Cf. JONAS DE BOBBIO, Vita Columbani, 11, in PL 87, 1017-1018. 458 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 111: «L’Église celtique occupa, en raison de son isolement, une place à part dans les problèmes du culte et de la discipline, et persista des siècles durant de façon inflexible dans ses usages qui différaient de ceux des autres Églises». 459 A recolha mais antiga e vasta é constituída pelo Paenitentiale Vinniai, irlandês do séc. VI, que terá influenciado o Paenitentiale Cummeani e Paenitentiale Columbani. O mais conhecido é o Paenitentiale Theodori, arcebispo de Cantuária (†690), que influenciará fortemente a disciplina posterior, cujas prescrições serão recolhidas em colecções posteriores. Entre os mais famosos, contam-se ainda o Paenitentiale Bedae (†735) e o Paenitentiale Egberti (†767), compilações confusas que terão aparecido por volta do ano 800. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 111-112. 460 Paenitentiale Theodori, 13, 4, in FINSTERWALDER, Die Canones Theodori Cantauriensis, 306. Este penitencial terá sido redigido entre 690 e 740, na Inglaterra, por um autor desconhecido. Cf. C. VOGEL, Les «Libri Paenitentiales», 69-70.


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dos das ilhas, a começar por S. Columbano (†615), a penitência tarifada passou ao continente, provocando uma ruptura no modo de entender a relação do pecador com Deus. À excepção do Concílio de Toledo, nada se contrapôs à entrada desta nova forma461. Basicamente, a nova disciplina possibilita a reconciliação a todos os pecadores, clérigos ou leigos. O pecador dirigia-se privadamente ao sacerdote, e não somente ao bispo. Entendia-se que a reconciliação era obtida quando as taxas penitenciais eram cumpridas. Depois do jejum penitencial, a reconciliação, agora chamada de absolvição, acontecia sem interdições penitenciais. Todo o processo permanecia secreto. As intervenções de Cesário de Arles e de Avito de Viena a favor da reconciliação concedida aos moribundos criaram um terreno favorável ao novo uso462, porque, na verdade, as dificuldades da penitência antiga criaram um vazio penitencial. A taxação das culpas é o elemento mais original deste tipo de penitência, catalogadas em livros penitenciais de extensão e qualidade diferentes, muitas vezes confusos463. Os pecados e os delitos são elencados em modo muito detalhado464. A cada pecado associa-se uma penitência precisa. A intenção das tarifas é dupla; por um lado, vindicativa, punindo o pecado cometido de modo a impedir as recaídas, corrigindo os vícios e as más disposições interiores; e por outro, medicinal, segundo a tradição monástica465. A tarifa consiste em mortificações mais ou menos longas, jejuns de diferente natureza e de duração variada: jejuns de pão e água, de renúncia à carne, ao vinho, ou jejuns para certos dias da semana ou tempos anuais. Para o derramamento de sangue ou pecados de luxúria, exige-se a proibição temporária de relações conjugais ou a privação do porte de armas. Contam-se ainda multas ou esmolas a pagar a uma igreja ou ———————— 461 462 463

Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 116-117. Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 15-16. Tendo em conta a limitação do nosso trabalho e o objectivo a que nos propomos, não nos é possível fazer uma análise desta abundante literatura, que se revela difícil de sistematizar. Limitar-nos-emos aos resultados doutrinais mais significativos para a história da disciplina da penitência. 464 Nos elencos, ocupam um lugar privilegiado as culpas de teor sexual, juntamente com as violências, homicídios e furtos, sobretudo de bens eclesiais. O seu elenco, em alguns casos, origina uma casuística desenvolvida, realística e, por vezes, desagradável. 465 Cf. Paenitentiale S. Columbani, in BIELER, The Irish Penitentials, 96-98; Paenitentiale Vinniani, in BIELER, The Irish Penitentials, 93-94; J. LAPORTE, Le pénitenciel de S. Colomban, 70; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 202-203.


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mosteiro, peregrinações a lugares santos ou, nos casos mais graves, o exílio temporário ou mesmo definitivo466. 3.1.1 O processo penitencial tarifado De acordo com os próprios penitenciais, é possível reconstituir o processo penitencial tarifado. O pecador dirige-se ao confessor cada vez que peca, realiza uma confissão detalhada e é-lhe imposta a tarifa. A confissão acontece quer espontaneamente quer através de um questionário, a partir do penitencial que possui o confessor. As tarifas aplicam-se segundo o número e gravidade dos pecados cometidos. O perdão era adquirido depois de realizada a penitência. Trata-se de um intercâmbio elementar entre expiação e remissão. Segundo alguns rituais, o pecador retira-se depois de imposta a tarifa, cumpre a penitência e depois retorna para receber a absolvição. Quando o pecador está doente, ou o caminho é longo para retornar, ou existem condições difíceis, o confessor absolve logo depois da confissão467. O acto de reconciliação realiza-se depois da determinação da penitência. Os cânones determinam-na: «et reconcilietur altario» e «recipiatur ad communionem»468. O Sínodo de S. Patrício confirma a fórmula «et postea resolvetur a sacerdote», alusão ao poder das chaves469. 3.1.2 Comutação penitencial A comutação penitencial é o processo pelo qual se substitui os longos períodos de jejum por outros actos menos longos e menos duros para o penitente, ou pelas obras de um terceiro, uma pessoa pia, que substitui vicariamente a penitência que deveria ser realizada pelo pecador. Tal prática difunde-se, porque a soma de tempos de penitência chegava a totais que excediam a duração da própria vida470. Por isso, ———————— 466

Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 17; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 112-113. 467 Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 18. 468 Cf. Paenitentiale Vinniani, 6, 14, 15, 35, 36, in BIELER, The Irish Penitentials, 76, 78, 86; Paenitentiale S. Columbani B, 13, 15, 18, 25, in BIELER, The Irish Penitentials, 102, 106. 469 Cf. SÍNODO DE S. PATRÍCIO (457), c. 14, in Mansi 6, 516. 470 O Penitencial de Teodoro (finais do séc. VII e inícios do séc. VIII) possibilita que um pecador alcance um total de 25 anos de jejum: 4 anos de jejum para um ano de fornicação; para o desejo de fornicação 40 dias; para um homicídio, 10 anos; para um juramento falso 11 anos. O Penitencial de Columbano (finais do séc. VI e inícios


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os penitenciais comportavam, desde o início, em apêndice, listas de comutações471. Além dessas comutações pessoais, aparecem outras. Em primeiro lugar, as redenções, que eram comutações feitas por meio de esmolas472 ou em dinheiro473, em ouro ou com o preço de escravos, ou, em segundo lugar, em forma de missas que o pecador faz celebrar. Os penitentes indicavam as tarifas a pagar por cada missa474. Embora fosse considerada oficialmente como perigosa, a prática persistiu475. Nos penitenciais de Beda e de Egbert, as tarifas apareciam já substituídas por redenções anexas. Uma das razões era a de que a penitência propriamente dita era «ardua et difficilis»476. Os ricos penitentes optavam ainda pela comutação por meio de uma terceira pessoa477. ————————

do séc. VII) indica 2 anos de jejum para uma só confissão: um ano de jejum para um acto auto-erótico; 40 dias para um insulto; 6 meses para um desejo impuro! Cf. Paenitentiale Theodori, in FINSTERWALDER, Die Canones Theodori Cantauriensis, 287311; Paenitentiale S. Columbani, in BIELER, The Irish Penitentials, 96-106; C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 23. 471 Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 23: «Il peccatore potrà riscattare un anno di digiuno con 12 volte 3 giorni di digiuno continuo, o mediante la recita di tre Salteri e con 3000 colpi di flagello o con innumerevoli genuflessioni. Si vedono pratiche ancora più strane: passare alcuni giorni sulla tomba di un santo personaggio defunto, senza bere né mangiare, cantando salmi o macerandosi fino al punto di giungere al suicidio»; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 113: «C’est ainsi qu’est prévu, par exemple, un “triduannum” c’est-à-dire une pénitence intensive de trois jours, dans cet esprit, comme “arreum anni” ou équivalent d’une pénitence normale d’un an». 472 Cf. Paenitentiale Cummeani, 8, 28, in BIELER, The Irish Penitentials, 124: «Alii paenitentiam aegris statuunt ut elemosinam dant, hoc est, praetium viri vel ancillae; sed aptius est si dimedium omnium que possidet unus quisque det, et si quem fraudavit, quadruplum reddat ei». 473 Cf. Paenitentiale Bedae, 10, 8, in F. W., WASSERSCHELEBEN, Die Bussordnungen, 230: «Et qui de psalmis hoc quod superius diximus implere non potest, elegat justum, qui pro illo impleat et de suo precio aut labore hoc redemat». As directivas do rei Edgar do séc. X mostram como se podia realizar esta comutação. 474 As missas com fins penitenciais contribuíram para aumentar o estado religioso durante o séc. IX. O número de missas pedidas fez aumentar a necessidade de clero disponível, sobretudo religioso. A missa penitencial, celebrada várias vezes por dia, torna-se assim fonte de lucro para os confessores. Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 24. 475 Cf. CONC. DE CLOVESHOE (747), cc. 26-27, in Mansi 12, 404-406. 476 Cf. Paenitentiale Bedae, 11, in F. W., WASSERSCHELEBEN, Die Bussordnungen, 230. 477 Cf. Paenitentiale Pseudo-Theodori (séc. IX), in F. W. WASSERSCHELEBEN, Die


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Os penitenciais têm de ser entendidos no seu contexto histórico, num mundo de semi-pagãos conduzidos pela veemência dos instintos. As leis penitenciais eram também leis penais temporais, que procuravam obter um arrependimento verdadeiro e uma conversão efectiva. O sistema penitencial tarifado funda-se num profundo rigor moral e inflexibilidade da intenção, e nos conceitos de falta e reparação, que continua o espírito de rigor da penitência antiga478. Contudo, estes tipos de comutações esvaziaram a expiação do seu sentido. As tarifas penitenciais tornaram-se linhas de conduta para a avaliação arbitrária da pena479. Tal facto fez com que o centro da penitência passasse para a acusação dos pecados. A mudança realizar-se-á no final do séc. XII. A confissão acaba por substituir a expiação, a que se seguirá imediatamente a absolvição480. 3.1.3 Peregrinações penitenciais A peregrinatio, forma específica de comutação, era um meio de penitência em que o penitente abandonava o seu meio para se dirigir a um lugar santo, segundo uma liturgia própria481. Normalmente, os peregrinos transportavam consigo uma carta482 com uma recomendação do ————————

Bussordnungen, 622: «Qui psalmos non novit, et ieiunare, sine vigilare, vel genucleare, vel in cruce stare, aut se saepe prosternere, seu aliter poenitere, pro infirmitate non potest, eligat, qui pro illo hoc impleat, et de suo precio aut labore hoc redimat, quia scriptum est: Alter alterius onera, portare». Um rico podia expiar a sua penitência de sete anos em três dias por meio de um grupo de homens contratados para jejuar. Cf. Leges Regis Edgardi, in Mansi 18, 525-526. 478 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 114: «C’est pourquoi les critiques actuels devraient être réservés dans leur raproche de “laxisme”, car les rédemptions, elles aussi, surpassent ce que l’on peut exiger de l’homme moderne en fait d´expiation». 479 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 132. 480 Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 24-25. 481 «Diverses cérémonies réligieuses consacraient le départ des pèlèrins. Reunis dans l’église, ils assistaient d’abord à la sainte messe dite à leur intention, recevaient souvent la sainte communion et s’inclinaient ensuite sous la main du prêtre chargé de bénir le bourdon et la panetière. [...] Les voyages judiciaires se faisaient ordinairement à pied. [...] A leur retour, les pèlerins se rendaient de nouveau à l’église pour rendre grâce de l’heureux succès de leur voyage». U. BERLIÈRE, «Les pèlegrinages judiciaries», 525. 482 R. Aronstam publicou em 1975 uma colecção de 10 cartas que datam entre 1000 e 1050 e que podem ser consideradas um pequeno corpus de missivas papais e episcopais que dizem respeito à penitência infligida a homens de origem nobre ou ho-


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Bispo, uma espécie de credencial em que se pedia a intercessão do leitor, mediante a oração, e os particulares da penitência a cumprir. Era prevista sobretudo para os casos de homicídio ou pecados da carne especialmente graves cometidos particularmente por eclesiásticos. A sua concretização era, por um lado, um meio de aperfeiçoamento espiritual e, por outra parte, significava a substituição da penitência pública. O valor penitencial associava-se à esperança da intercessão dos santos. Uma eventual recusa a realizar a peregrinação era punida severamente, ou podia ser comutada por uma soma de dinheiro483. O particular interesse desta forma reside na confiança dos penitentes no valor apostólico das chaves do Papa, quando se dirigiam a Roma, de tal modo que por vezes realizavam a peregrinatio por própria iniciativa484. Por outro lado, os bispos enviavam a Roma os seus penitentes com o objectivo de confiar ao Papa a decisão nos casos mais delicados. Tal tinha como consequência a moderação da penitência por causa da mortificação que representava a peregrinação e a oração confiante. De regresso a casa, faziam-se acompanhar das missivas papais dirigidas aos bispos locais que os tinham enviado à cidade santa, em que se descrevia a penitência cumprida pelo pecador485. Em alguns casos, o Papa reenviava o penitente ao seu bispo, recomendando que este reduzisse a pena486, ou mesmo absolvido487. ———————— nesta. O núcleo deverá ter sido compilado por Wulfstan, bispo de Londres, entre 996 e 1002, e arcebispo de York, entre 1002 e 1023. Cf. R. ARONSTAM, «Penitential Pilgrimages», 65-83; J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 24-27. 483 Cf. U. BERLIÈRE, «Les pèlegrinages judiciaries», 525. 484 Uma carta de Alexandre II directamente endereçada a um certo Anne, um homem anglo-saxão que tinha incendiado uma Igreja e casas adjacentes, começa por «Confessus es». Visto que a confissão já acontecia normalmente no país de origem e o Papa apenas aplicava a penitência, esta carta demonstra que neste caso se trata de um recurso directo a Roma: «Confessus es, te per ebrietatem ecclesiam cum contiguis sibi domibus incendisse». R. ARONSTAM, «Penitential Pilgrimages», Ep. A, 82; J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 26. 485 Cf. R. ARONSTAM, «Penitential Pilgrimages», Ep. 4-9, 79-82. Os autores destas cartas são respectivamente os papas Gregório V (996-999), João XVIII (1003-1009), João XIX (1024-1033) e Leão IX (1049-1050). 486 Como exemplo pode-se apontar a carta penitencial de Wulfstan, bispo de Londres em 996: «Lupus londoniensis episcopus cunctis fratribus atque conservis in Christo salutem. Notum vobis esse cupimus qui homo iste diabolica fraude deceptus parricidii reatum incurrit. Quapropter ad nostra concurrit pedum vestigia lacrimabili prece veniam petens, et sic a nobis ammonitus, loca sacra multaque corpora sanctorum atque apostolicum romanum causa tante necessitatis adiit, et ad nos rediens litterarum reportavit quarum penitet iuditio simul et nostro imperio.


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O mesmo acontecia em outros lugares de peregrinação, junto dos bispos locais488. Apesar das diferenças próprias de cada caso, todas estas cartas se revestiam de fórmulas habituais e são prova de uma prática estabelecida na corte episcopal e papal em matéria de penitência489. Os abusos no que respeita à jurisdição do episcopus proprius490 fizeram com que mais tarde alguma legislação proibisse a viagem a Roma sem autorização do bispo, como nos casos do Concílio de Seligenstadt ou de Châlon-sur-Saone491. O modo como receberia o Papa todos estes peregrinos permanece uma questão em aberto. Se tivermos em conta o número dos penitentes, torna-se muito difícil que o Papa os tenha recebido todos pessoalmente. Contudo, na colecção de Wulfstan apresentada por Aronstam, a condição social dos peregrinos era de tal ordem que suscitava o interesse pessoal do Papa. Esse é o caso da carta de João XIX (1024-1032)492. Nessa carta, o Papa exorta o Arcebispo a usar a sua influência junto do Rei de modo a restituir os bens confiscados ao penitente. Nestes docu————————

Ideoque petimus ut pro eo precum iuvamina ad Deum omnipotentem effundere dignemini quatinus quandoque ei tanti sceleris offensam Christus dominus sua largiflua clementia indulgere dignetur». R. ARONSTAM, «Penitential Pilgrimages to Rome», Ep. 1, 79. 487 Uma carta de Leão IX descreve o caso de um sacerdote que se dirigiu a Roma, depois de sete anos de penitência, foi absolvido pelo Papa, o único caso apresentado por Aronstam em que aparece o verbo “absolvere”: «Hunc Andream presbiterum vestrum in homicidii crimine lapsum, et annos VII gravi penitentia agentem, si ita est, remittimus vobis in Dei nomine absolutum suoque sacerdotio restitutum, nom tam considerantes mensuram temporis quam penam doloris». R. ARONSTAM, «Penitential Pilgrimages», Ep. 9, 82. 488 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 132-133. 489 Cf. J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 25. 490 Cf. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), c. 45, in Mansi 14, 102-103. 491 Cf. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), c. 45, in Mansi 14, 102-103; SÍNODO DE SELINGENSTADT (1022), in PL 140, 1061: «Quia multi tanta mentis suae falluntur astutia, ut in aliquo capitali crimine inculpati penitentiam a suis sacerdotibus accipere nolunt, in hoc maxime confisi, ut Romam petentibus apostolicus omnia dimittat peccata, sancto consilium visum est, ut talis indulgentia illis non prosit, sed prius iuxta modum delicti paenitentiam a suis sacerdotibus iniunctam adimpleant, et tunc Romam ire si velint, ab episcopo proprio licentiam et epistolam ad apostolicum ex hisdem rebus deferendam accipiant»; U. BERLIÈRE, «Les pèlegrinages judiciaries», 522-523. 492 Cf. R. ARONSTAM, «Penitential Pilgrimages», Ep. 8, 81: «Visis apostolorum liminibus presentium latorem litterarum illic riperrimus, qui ante nostram presentiam lacrimabiliter fusis precibus penitentiam petiit dicens casu accidente ei evenisse ut proprie sobolis vitam extingueret»


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mentos, não se nota a presença de nenhum penitenciário fixo, mas as condições são propícias ao seu aparecimento493. 3.1.4 O ministro da penitência tarifada O aspecto sacramental e eclesiástico é fundamental no processo tarifado. Pela intervenção do presbítero, a pena era adaptada à importância da falta e às circunstâncias concretas. É frequente a expressão «judice sacerdote»494. Os padres aparecem desde o início como ministros religiosos da penitência ao lado do Bispo495. Só a título excepcional um pecado particularmente grave é reservado ao Bispo, proporcionando, deste modo, os primeiros indícios de reserva episcopal496. A confissão implica a função judiciária do sacerdote, tendo em conta o processo individual de cada falta por si, com uma respectiva penitência. Também as faltas ligeiras entram na confissão, como meio de purificação espiritual, primeiramente para com os monges, depois para com os leigos, tendo em conta a função pastoral destes clérigos no mundo celta497. O penitencial de Teodoro refere-se à penitência pública que era realizada pelo Bispo, depois de terminada a penitência. Se, no entanto, tal era difícil para o Bispo, ele podia delegar por necessidade a faculdade a um presbítero. Mas essa não era uma prática da penitência céltica498. ———————— 493 494

Cf. J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 28-29. Cf. Paenitentiale Vinniani, 9, 23, in BIELER, The Irish Penitentials, 76, 82; Paenitentiale Cumminani 3, 12; 5, 2; 8, 2, 3, 20, in BIELER, The Irish Penitentials, 118, 120, 122. 495 Cf. Paenitentiale Theodori, 2, 2, 15, in FINSTERWALDER, Die Canones Theodori Cantauriensis, 204: «Non licet diacono laico poenitentiam dare, sed episcopi sut presbyteri dare debent». 496 Cf. Paenitentiale Cummeani 10, 18, in BIELER, The Irish Penitentials, 128: «Quidam commedens sui corporis cutem, id est scabiem, sive vermiculos qui pedecle nuncupantur suam nec non bibens urinam stercorave comedens, cum impositione manus episcopi anno integro cum pane et aqua peniteat»; ou no caso de heresia: Paenitentiale S. Columbani B, 25, in BIELER, The Irish Penitentials, 106. 497 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 115. 498 Paenitentiale Theodori, 13, 1-4, in FINSTERWALDER, Die Canones Theodori Cantauriensis, 306: «Romani reconciliant hominem intra absidem, Graeci autem nolunt. Reconciliatio poenitentium in coena Domini tantum est ab episcopo et consummata poenitentia. Si vero episcopo difficile sit presbytero potest necessitatis causa praebere potestatem ut impleat. Reconciliatio ideo in hac provincia publice statuta non est, quia et publica poenitentia non est».


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3.2 A penitência eclesiástica no século VII Durante o século VII, assiste-se somente a qualquer intervenção da autoridade em matéria penitencial. Por volta de 650 reuniu-se um concílio em Rouen que representa uma confirmação da parte da autoridade eclesiástica da nova prática penitencial tarifada499. Tal demonstra como algumas Igrejas fizeram sua a nova prática penitencial tarifada, introduzida por S. Columbano nos países francos500. O Sínodo da Irlanda de 682 ou 684 testemunha o reconhecimento oficial do sistema de comutações penitenciais. Surpreendem as obras substitutivas do jejum. Existem penas específicas, como jejum a pão e água, para particulares pecados sexuais501. 3.2.1 A penitência na Espanha Visigótica No tempo de S. Isidoro de Sevilha (†626), a antiga penitência502 eclesiástica já se sentia ameaçada pela nova prática penitencial, como denuncia o Concílio de Toledo503. Na obra De ecclesiasticis officiis, Isidoro assinala que a sua aplicação tem lugar em casos de pecados graves504. Distingue por outra parte, entre peccata e crimina505. Na obra das Sententiarum, refere a função do sacerdote em ordem à correcção dos pecadores, com a intenção de os preparar para a reconciliação no final da vida506. Tal função deverá ser feita com humildade e compreensão, para que se curem as feridas do pecado. O pastor de ————————

499 Conc. de Rouen (650 ca.), c. 12, in Mansi 10, 1202: «Si quis alium per iram percusserit et sanguinem effuderit: si laicus est, XX. dies poeniteat: clericus XXX. Illi autem qui gradum habent ampliorem, amplius pelli debent. Diaconus sex menses, Presbyter unum annum; Episcopus duos annos et sex menses». 500 Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 130-131. 501 Cf. SÍNODO DE IRLANDA (682/684), in Mansi 11, 1059-1060; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 131. 502 Segundo Isidoro de Sevilha, o termo penitência funda-se em poena. O ordo poenitentium é apresentado com as suas característica humilhantes, situação qualificada como pena. Cf. ISIDORO, De Ecclesiasticis officiis, 2, 17, 2, in PL 83, 802: «poenitentiae nomen sumpsit a poena, qua anima cruciatur et caro mortificatur»; G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 200. 503 Cf. CONC. DE TOLEDO (589), cc. 11-12, in Mansi 9, 995-996 . 504 Cf. ISIDORO, De Ecclesiasticis officiis, 1, 18, 7, in PL 83, 756; G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 124-126. 505 Cf. ISIDORO, Sent. 2, 18, 1, in PL 83, 620: «Multi vitam sine crimine habere possunt, sine peccato non possunt». 506 Cf. ISIDORO, Sent. 3, 7, in PL 83, 671-679.


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almas deve igualmente corrigir os abusos, especialmente da opressão sobre os mais débeis507. Devem ser afastados da Eucaristia somente os que devem fazer penitência por culpas graves508. É possível que se refira à penitência eclesiástica, mas as suas exortações referem-se sobretudo ao pecador, tendo em conta as disposições morais do penitente e a ajuda dos presbíteros da comunidade encarregados dessa função509. Isidoro insiste sobretudo no aspecto interior da conversão, a compunctio cordis, que se verifica pelas lágrimas da mesma e por uma efectiva mudança de vida510. Com o arrependimento dos pecados, vem a certeza da venia divina511. Num outro texto, retoma o discurso agostiniano da correptio publica e secreta, mas não se pode afirmar com certeza qual a prática eclesiástica referida por Isidoro512. Os textos de Isidoro manifestam um estado de evolução, como por exemplo o rito de indulgentia da sexta-feira santa513. A sua doutrina acerca da penitência assume os dados da tradição: universalidade do poder de perdoar os pecados por parte da Igreja, a necessidade de uma verdadeira conversão em ordem à reconciliação e a distinção entre pecados graves e leves, que podem impedir ou permitir o acesso à Eucaristia514. ———————— 507 508 509 510

Cf. F-J. LOZANO SEBASTIÁN, San Isidoro de Sevilla, 197-198. Cf. ISIDORO, De Ecclesiasticis officiis, 1, 18, 7-8, in PL 83, 756. Cf. F-J. LOZANO SEBASTIÁN, San Isidoro de Sevilla, 214. Cf. ISIDORO, Sent. 2, 12, 1-2, in PL 83, 613: «Compunctio cordis est humilitas mentis cum lacrymis, exoriens de recordatione peccati et timore iudicii. Illa est conversis perfectior compunctionis affectio, quae omnes a se carnalium desideriorum affectus repellit et intentionem suam toto mentis studio in Dei contemplatione defigit». 511 Parece que o estado interior da compunção, concebido como graça, remite uniteralmente os pecados. Falta, neste aspecto, uma teologia da penitência em Isidoro. Cf. ISIDORO, Sent. 2, 13, in PL 83, 614-615; G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 200. 512 Cf. ISIDORO, Sent. 3, 46, in PL 83, 714-717; G. MOIOLI, Il quarto sacramento, 193. 513 Cf. CONC. DE SEVILHA (619), c. 7, in PL 84, 368-369: «Oportet eodem die feria sexta Passionis Domini mysterium crucis [...] praedicare, atque indulgentiam criminum clara voce omnem populum postulare, ut poenitentiae compunctione mundati venerabilem diem dominicae ressurrectionis remissis iniquitatibus suscepere mereamur, corporisque eius et sanguinis sacramentum mundi a peccato sumamus». Neste aspecto, o Concílio sanciona uma inovação. Cf G. MOIOLI, Il quarto sacramento , 195. 514 Cf. ISIDORO, Sent., 3, 2, 13 in PL 83, 658; G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 126.


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3.3 A penitência eclesiástica nos séculos VIII e IX Durante o século VIII, assiste-se a uma proliferação imensa dos livros penitenciais, que desordenam a disciplina penitencial. Por outra parte, surge o problema das comutações penitenciais, que serão objecto de abusos e por isso sujeitas à intervenção da autoridade. 3.3.1 Concílio de Cloveshoe (747) Em Setembro de 747, reúne-se em Cloveshoe, na Grã-Bretanha, um Concílio sob a presidência de Cuthbert, arcebispo de Cantuária. Depois de referir a necessidade de esmolas no caminho penitencial, intervém de modo a evitar os abusos das comutações. Pronuncia-se contra esta prática, que considera de hábito perigoso. Visto que a penitência é pessoal, não se pode recorrer a penitências substitutivas do jejum, da abstinência ou da oração, com a oferta de esmolas. Naturalmente, nestas circunstâncias, os mais ricos seriam beneficiados, e nisso recorda a palavras evangélicas acerca da dificuldade de salvação dos ricos515. 3.3.2 Concílios Carolíngios (813) Perante a multiplicidade de penitenciais sem critérios comuns e um relaxamento da disciplina eclesiástica, a reforma carolíngia516 pretendeu disciplinar igualmente a prática penitencial, tentando restaurar a penitência antiga. Uma série de novas prescrições foi elaborada partindo das sententiae Patrum, canones e decretales517. Os capitulares obrigavam os presbíteros a possuírem o próprio penitencial e a serem examinados acerca deste518. ———————— 515

CONC. DE CLOVESHOE (747), cc. 26-27, in Mansi 12, 404-406; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 132-133. 516 Os reformadores carolíngios, clérigos agrupados à volta de Crodegango de Metz (†766), Remigio de Rouen (†722) e Alcuíno (†804), pretenderam reformar a disciplina e a vida religiosa em todos os sectores, incluindo a restauração da penitência. Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 20. 517 Pertencem a este grupo a Collectio Dacheriana, a Collectio Vaticana, a recolha de Halitgário de Cambrai, o Liber Poenitentium e a Epistola ad Heribaldum, de Rabano Mauro, o Capitulare secundum Theodulfi Aureliensis, e as Capitula Rodulfi Bituricensis. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 119, nt. 4. 518 Cf. Capitula presbyterorum, 9, in PL 97, 295: «Ut unusquisque secundum possibilitatem suam certare faciat [...] missale, lectionarium, martyrologium, poenitentiale, psalterium»; Capitula examinationis generalis, 3, in PL 97, 248: «Benitentialem (poenitentialem) quomodo scitis vel intelligitis»; Capitula de doctrina cleri-


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Por isso, em 813, realizaram-se diversos Concílios com a finalidade de se estabelecerem critérios para a tarifação. Pretendeu-se harmonizar a mesma com os cânones penitenciais da tradição eclesiástica, e substituíram-se os livros penitenciais por catálogos canónicos. Tais tentativas conduzirão a uma dicotomia da prática penitencial que permanece durante alguns séculos: aos pecados graves públicos correspondem a penitência pública, aos pecados graves privados a penitência tarifada519. O Concílio de Arles, realizado a 10 de Maio de 813, presidido por João, bispo de Arles, e por Nibridio, arcebispo de Narbonne, enquanto delegados imperiais, estabelece no cânon 26 a penitência pública para pecados públicos de acordo com os cânones eclesiásticos520. O Concílio de Reims, de Maio de 813, sob a presidência do arcebispo Wulfar, prescreve que os sacerdotes deveriam conhecer em maneira mais precisa como receber confissões e como impor as penitências segundo as regras canónicas521. O Concílio de Tours, também de 813, prescreve aos bispos e presbíteros um jejum proporcionado ao pecado cometido, de modo a evitar as sentenças diversificadas e irracionais dadas pelos sacerdotes, de acordo com um necessário livro penitencial antigo, que deveria ser seguido por todos522. Convida a autoridade civil a constranger os pecadores a submeterem-se à penitência pública523. ————————

corum, 7, in PL 97, 249: «Haec sunt quae iussa sunt discere omnes ecclesiasticos:[...] Paenitentialem». «I Capitula venivano dati generalmente dai vescovi nei concili deocesani nei quali si raccoglieva il clero della diocesi. In maniera sintetica e pratica comprendono tutto ciò che è stato stabilito dai vescovi sia in questi sinodi, sia al di fuori di essi, secondo o canoni genuini e la disciplina genuína [...] Di fatto i Capitula sono per i vescovi mezzi per perfezionare la riforma instaurando le sue regole universali e generali nel proprio territorio con lo scopo di rafforzare la potestà gerarchica e di restriturare la vita cristiana»; B.E. FERME, Introduzione alla storia del diritto canonico, 127, 129: 519 Cf. TEODOLFO, Capitulare, in PL 105, 215; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 134-139. 520 Cf. CONC. DE ARLES (813), c. 26, in Mansi 14, 62: «Ut qui pubblico crimine convicti sunt, rei publice judicentur, et pubblicam poenitentiam agant secundum canones». 521 Cf. CONC. DE REIMS (813), c. 12, in Mansi 14, 78: «ut sacerdotes certius intelligerent, quomodo confessiones recipere, et poenitentiam secundum canonicam institutionem poenitentibus deberent indicare». 522 Cf. CONC. DE TOURS (813), c. 22, in Mansi 14, 86: «Episcopis et presbyteris diligenti cautela pertractandum est, qualiter hominibus sua sibi delicta confitentibus tempus abstinendi adscribant, ut iuxta modum peccati poenitentibus abstinentia indicatur: quoniam varie aliquibus sacerdotibus et indiscrete haec judicia proferuntur. Ideo necessarium videbatur nobis, cum omnes epicopi ad sacrum palatium congre-


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O Concílio Chalon-sur-Saône, do mesmo ano, teve a participação de todos os bispos e abades da Gália Lugdunense. Convida a que os pecados públicos sejam sujeitos à penitência pública, que, segundo o mesmo, já não se encontra em uso e apela ao imperador para que a restaure524. Por outra parte admite-se que se possa confessar os pecados directamente a Deus e ao sacerdote525. Confirma-se o uso introduzido na Igreja de confessar o pecado directamente a Deus, sem a acusação dos pecados ao confessor. No entanto, o Concílio aprova a validade de ambos. No segundo caso, a remissão dos pecados é obra da graça invisível de Deus, no primeiro, esta graça passa pela mediação do sacerdote. Contudo, um não exlui o outro. Ambos devem fazer parte de um único processo penitencial, visto que o concílio não pretende mostrar supérflua a confissão sacramental526. Exortam-se os sacerdotes a não fazer acepção de pessoas no determinar a penitência527. Recorda-se que a penitência consiste mais na transformação da vontade do que nas mortificações exteriores528. Reprova-se também os que pensam que as ofertas de esmolas ou as peregrinações absolvem os pecados, proibindo-se o costume da peregrinação a Roma, sem a prévia confissão ou penitência529. Deste modo, pretende-se impor a penitência segundo os antigos cânones, as Sagradas Escrituras ou o costume eclesiástico, evitando os peni————————

gati fuerint, ab eis edoceri, cuius antiquorum liber poenitentialis potissimum sit sequendus». 523 Cf. CONC. DE TOURS (813), c. 25, in Mansi 14, 87. 524 Cf. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), cc. 14, 25, 38, in Mansi 14, 99-101. 525 Cf. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), c. 33, in Mansi 14, 100: «Quidam Deo solummodo confiteri debere dicunt peccata, quidam vero sacerdotibus confitenda esse percensent: quod utrumque non sine magno fructu intra sanctam fit ecclesiam [...]. Confessio itaque quae Deo fit, purgat peccata: ea vero quae sacerdoti fit, docet qualiter ipsa purgentur peccata. Deus namque salutis et sanitatis auctor et largitor, plerumque hanc praebet suae potentiae invisibili administratione, plerumque medicorum operatione». O texto confirma o problema já evidenciado por Alcuíno (†804). A sua carta aos cristãos da Gothia refere que alguns se recusam de fazer penitência segundo o sistema tarifado, por a considerarem anti-cristã, visto que só conheciam a penitência antiga. Por isso Alcuíno vê-se obrigado a justificar teologicamente a acusação das faltas feitas ao sacerdote. Cf. ALCUÍNO, Ep. 112, in PL 100, 337-340; C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 226-233. 526 Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 137-139. 527 Cf. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), c. 34, in Mansi 14, 100. 528 Cf. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), c. 35-36, in Mansi 14, 100-101. 529 Cf. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), c. 45, in Mansi 14, 102-103.


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tenciais que são duvidosos devido aos erros que contêm e aos autores incertos530. 3.3.3 Concílio de Paris (829) O Concílio de Paris realizado a 6 de Junho de 829 foi presidido pelo imperador Ludovico Pio e o filho Lotário, e teve a participação de 24 bispos de quatro províncias eclesiásticas. O cânon 32 retoma as disposições de Chalon-sur-Saône. As suas prescrições são severas quanto aos penitenciais não canónicos. Convida-se os bispos a procurá-los nas suas dioceses e destruí-los, de modo a que os sacerdotes não preparados não induzam em erro os penitentes. Prescreve-se igualmente a preparação dos sacerdotes quer no escutar a confissão quer no impor penitências531. Contudo, como os penitenciais eram indispensáveis para a administração da penitência por causa da sua utilidade prática, era necessário redigi-los em conformidade com os cânones antigos e as sentenças dos Padres. Por isso, foram prescritos por diversos capitulares532. . Ebone (†851), arcebispo de Reims e participante neste Concílio, solicitou a Halitgário, bispo de Cambrai (†831), que redigisse um penitencial canónico. Nessa carta, lamenta a confusão dos penitenciais, nos quais se encontram tarifas tão confusas e contraditórias. Halitgário aceitou o desafio, compondo um penitencial útil para a administração da penitência, com textos extraídos dos Padres e das sentenças canónicas533. 3.3.4 Prática penitencial variada O novo sistema penitencial privado ganha terreno e implanta-se definitivamente. No processo privado, a confissão torna-se a obra satisfa———————— 530

Cf. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), c. 38, in Mansi 14, 101: «Modus autem poenitentiae peccata sua confitentibus, aut per antiquorum canonum institutionem, aut per sanctarum scripturarum auctoritatem, aut per ecclesiasticam consuetudinem, sicut superius dictum est, imponi debet, repudiatis ac penitus eliminatis libellis, quos poenitentiales vocant, quorum sunt certi errores, incerti auctores». 531 Cf. CONC. DE PARIS (829), c. 32, in Mansi 14, 559-560; A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 139-142. 532 Cf. HETTO DE BASILEIA, Capitulare, 6, in PL 105, 763: «Sexto, quae ipsis sacerdotibus necessaria sunt ad discendum, id est [...] canon poenitentialis». 533 Cf. HALITGÁRIO, De poenitentia, in PL 105, 652-654. O mesmo fará Rabano Mauro (†856), arcebispo de Mainz, ao compor um penitencial e um livro de penitentes, redigidos segundo os mesmos critérios: «de canonibus et sanctorum Patrum sententiis». Cf. RABANO MAURO, Poenitentiale, in PL 110, 467-494; Poenitentium liber, in PL 112, 1397-1424.


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tória concreta do pecador, porque tornava possível a fixação da penitência: «interrogare debitum poenitentiam»534. Depois do século VIII, o próprio termo confessio identifica-se com a penitência eclesiástica. Devido à diminuição do rigor primitivo, a confissão tornou-se ela mesma obra de penitência, representada pela humilhação e pelo controlo de si mesmo. Um Concílio bavarese da segunda metade do século VIII introduz a seguinte proposição: «melius est hic in praesenti erubescere in conspectu unius hominis quam in futuro judicio coram cunctis gentibus»535. A partir do século XI, e devido ao forte carácter penitencial subjectivo do tratado pseudo agostiniano De vera et falsa poenitentia, a confissão tornar-se-á causa imediata da remissão dos pecados, verdadeira satisfação536. Como a repetição constituía uma inovação profunda, a confissão tornou-se obrigatória para os pecados graves, em vista da recepção da Eucaristia537. A confissão dos leigos adquire também maior importância, como meio para a remissão dos pecados veniais, sobretudo por influência de Beda538. Contudo, não se sabe ao certo a verdadeira dimensão desta prática539. A penitência pública antiga era rara no séc. VI, e desaparece por volta do ano 800, como lamentam os concílios reformadores540. Depois de ———————— 534 535 536

Cf. COLUMBANO, Regula coenobialis, c. 10, in PL 80, 219. Cf. SÍNODO DE REISBACH (799), c. 2, in Mansi 13, 1026. Cf. De vera et falsa poenitentia, cap. 10, 25, in PL 40, 1122. Esta opinião é partilhada por B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 125. 537 Cf. BONIFÁCIO, sermo, 3, 4, in PL 89, 849: «Ad ecclesias saepius veniant, et maxime diebus festivus [...] et si quis in quolibet peccato lapsus occiderit, citius per confessionem resurgat, et purget se in poenitentiam»; BEDA, Expositio super Jacobi Epistolam, V, in PL 93, 36-42. Crodegang de Metz exigia para os seus cónegos uma confissão bianual: Regula, 14 e 34, in PL 89, 1065-1066; 1073-1074; Teodolfo de Orléans testemunha essa obrigação anual na Gália em 800: Capitula, 36, in PL 105, 203: «Hebdomada una ante initium Quadragesimae confessionis sacerdotibus dandae sunt, paenitentia accipienda, discordantes reconciliandi, et omnia jurgia sedanda, et demittere debent debita invicem de cordibus suis». Será o Concílio de Latrão IV (1215) a exigir a confissão saltem semel in anno (c. 21, in Mansi 22, 1010). 538 Cf. BEDA, Expositio super Jacobi Epistolam, V, in PL 93, 39-40: «In hac sententia illa debet esse discretio, ut quotidiana leviaque peccata alterutrum coaequalibus confiteamur eorumque quotidiana credamus oratione salvari. Porro gravioris leprae immunditiam juxta legem sacerdoti pandamus atque ad eius arbitrium, qualiter et quanto tempore jusserit, purificare curemus». 539 Cf. JONAS DE ORLÉANS, De institutione laicali 1, 16, in PL 106, 152: «Perrari sunt, qui invicem confessionem faciunt, exceptis monachis, qui id cotidie faciunt». 540 Cf. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), c. 25, in Mansi 14, 100: «Paenitentiam agere iuxta antiquam canonum institutionem in plerisque locus ab usu recessit».


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Jonas de Orléans (†843), são muito poucos os que se submetem à penitência antiga541. No entanto, a tentativa carolíngia de restauração da penitência antiga originou uma dicotomia que permanecerá até ao final do século XII. A penitência pública tem cada vez mais o carácter coactivo542, admitida sem reservas para os pecados graves543. Somente com os carolíngios se pode afirmar com segurança: para um pecado grave público, penitência pública, para um pecado grave oculto, penitência secreta tarifada544. É testemunho desta prática a intervenção de Teodolfo (†821), bispo de Orléans545. As duas práticas realizam-se contemporaneamente. Por isso, os representantes da reforma pedem que as penitências da penitência pública sirvam para a penitência privada546. O processo da antiga penitência canónica foi alargado na penitência pública. O sacramentário Gelasianum Vetus547 oferece-nos ————————

541 Cf. JONAS DE ORLÉANS, De institutione laicali 1, 10, in PL 106, 138: «Perrari namque sunt hodie in Ecclesia, qui talem agant paenitentiam, qualem antiquorum Patrum poenitentium exempla, et auctoritas canonica sancit». 542 Cf. CONC. DE TOURS (813), c. 3, in Mansi 14, 84; CONC. DE CHALON-SURSAÔNE (813), c. 25, in Mansi 14, 100; C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 22. 543 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 125-126: «Le rite de la confession faite au prêtre correspondait liturgiquement à celui de la réception de la Pénitence dans la procédure canonique, à la différence près que les actes servant à raprèsenter l’excommunication faisaient défaut. La confession se complètait par l’infliction da la pénitence et s’achevait par la bénédiction du pénitent au moyen d’oraisons identiques ou analogues à celles de la Pénitence publique. Alors la procédure pénitentielle était terminée». 544 Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 21. 545 Cf. TEODOLFO, Capitulare, in PL 105, 215: «Adulterium si quis presbyter perpetravit, si depelatum est et publice cognitum, ab ordine sacerdotii cessabit, et publica poenitencia decem annorum purgabitur. Quod si occulte hoc fecerit, et occulte ad confessionem venerit, occulte ei poenitentia imponatur». 546 Cf. TEODOLFO, Capitulare, in PL 105, 212: «Paenitentiae quippe modus in sacerdotis pendet arbitrio. Qui sacerdos diligentissime sanctorum Patrum instituta discutiens et intelligens secundum eorum auctoritatem confitentibus poenitentiam indicere debet. Est quippe auctoritas canonum et sanctorum Patrum firmissima institutio». 547 O Gelasianum Vetus é um livro misto, realizado a partir da liturgia papal e presbiteral da cidade de Roma e da liturgia galicana. Contém o mais antigo ritual da penitência que nos é conhecido. Mas esse ritual não corresponde exactamente ao desenrolar clássico da penitência antiga, pois prevê a prisão do pecador desde a Quartafeira de Cinzas até à Quinta-feira Santa, o que não é assinalado por nenhuma das fontes anteriores. Pode datar-se entre os anos 628 e 725. Cf. J.L. CORDEIRO, Antologia Litúrgica, 1328.


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pela primeira vez um ritual da reconciliação desta época548. A liturgia tinha início na Quarta-feira de Cinzas e consistia na imposição das mãos acompanhada de orações e exortações à penitência549. O penitente é revestido de cilício e colocado num lugar de penitência cujas características não são descritas. No dia de Quinta-feira Santa, o penitente sai do lugar onde cumpriu penitência, é introduzido na assembleia dos fiéis e prostra-se por terra em atitude humilde e arrependida550. Antes do ofertório, o Diácono dirige a petição ao Bispo para que seja reconciliado e este decide se o admite ou não à reconciliação. Se a decisão for negativa, deve renovar a penitência pública na quaresma seguinte. O Bispo exorta ao penitente para que não volte a cair nos pecados pelos quais fez penitência e depois recita as orações ad reconciliandum poenitentem551. No século IX, a introdução solene do penitente na Igreja torna-se um aperfeiçoamento do rito de exclusão da Quarta-feira de Cinzas, exprimindo claramente o sentido primitivo e o efeito imediato da reconciliação552. Na primeira metade do século XII, a penitência tarifada ainda persiste. Contudo, as penas rapidamente se tornam demasiadamente pesadas e inadaptadas. Os Bispos começam a multiplicar as remissões parciais e insistem que o padre pode adaptar em cada caso a tarifa da penitência553. O último dos penitenciais é o do Médico de Bucardo de Worms († 1025)554. ————————

548 De acordo com Vogel, o pecador é internado durante o período penitencial, com um sentido coactivo em relação aos pecadores escandalosos. Os actos litúrgicos que caracterizavam o tempo de expiação desaparecem. Estamos já na presença da paenitentia solemnis da Idade Média. Cf. C. VOGEL, «Le péché et la penitence», 227. 549 Cf. Sacramentarium Gelasianum, 17-18. 550 Cf. Sacramentarium Gelasianum, n. 83, 18: «Suscipis eum IV feria mane in capite quadragesimae et cooperis eum cilicio, oras pro eo et inclaudis usque ad Coenam Domini. Qui eodem die in gremio praesentatur ecclesiae, et prostrate eo omni corpore, in terram, dat orationem pontifex super eum ad reconciliandum in quinta feria Caenae Domini, sicut ibi continetur». 551 Cf. Sacramentarium Gelasianum, n. 355-363, 57-58. 552 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 120-122. 553 Cf. D. 1 de poen., c. 86: «Mensuram temporis in agenda paenitentia idcirco non satis aperte prefigunt canones pro unoquoque crimine, ut de singulis dicant, qualiter unumquodque emendandumsit, sed magis in arbitrio sacerdotis intelligentis relinquendum statuunt, quia apud Deum non tam valet mensura temporis, quam doloris, nec abstinentia tantum ciborum, quam mortificatio viciorum. Propter quod tempora paenitentiae pro fide et conversatione paenitentium abbrevianda precipiunt, et pro


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Os penitenciais acabam em desuso na segunda metade do século XII cedendo o lugar às Sumas dos Confessores, mas ainda existe um exemplo em S. Vítor de Paris no início do século XIII, no penitencial de Robert de Flamborough (ca. 1207-1215)555. De acordo com este, existia na Igreja um sistema tripartido: penitência pública solene, penitência pública não solene, e a penitência privada556. A primeira é a penitência solemnis que se inicia na Quaresma e é realizada publicamente, cuja administração é reservada ao Bispo, na continuação da penitência antiga557. É imposta para pecados públicos particularmente escandalosos: parricídios, formas graves de luxúria e sacrilégios. A segunda identifica-se com a peregrinação penitencial. Consiste na imposição da mesma por parte de qualquer pároco, entregando-lhes na porta dos peregrinos da igreja os distintivos do seu estado. Essa é repetível e é imposta para pecados públicos cometidos por leigos ou para pecados particularmente escandalosos cometidos por clérigos maiores, que não podiam ser submetidos à penitência solene. Os peregrinos penitentes eram absolvidos ao chegarem aos santuários designados pelos confessores. Depois do século IX, os penitentes peregrinos recorrem à jurisdição papal, sem serem subtraídos à jurisdição episcopal pelo menos até ao Concílio de Latrão de 1139, em que pela primeira vez se encontra uma reserva papal558. Neste contexto, aparece a documentação relativa aos casos reservados por meio da Bula in Coena Domini, lida todos os anos na Quinta-feira Santa a partir de 1364. A terceira é aquela que se realiza diante do confessor, repetível para os pecados ocultos e acessível a ————————

negligentia protelanda existimant. Tamen pro quibusdam culpis modi paenitentiae sunt impositi». 554 Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 26. 555 Cf. ROBERT DE FLAMBOROUGH, Liber poenitentialis; P.-M. GY, «Les Bases de la Pénitence Moderne», 64-65. 556 Cf. ROBERT DE FLAMBOROUGH, Liber poenitentialis, 236, 205: «Poenitentia alia sollemnis, alia publica, alia privata. Sollemnis est quae fit in capite jejunii, quando cum sollemnitate in cinere et cilicio ejiciuntur ab ecclesia poenitentes. Haec etiam esta publica, quia publice fit. Publica et non sollemnis est quae fit in facie ecclesiae sine supra dicta sollemnitate, ut peregrinatio. Privata est illa quae cotidie fit privatim coram sacerdote». 557 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 135. 558 Cf. CONC. DE LATRÃO II (1139), can. 15, in Mansi 21, 530: «Item placuit, ut si quis suadente diabolo huius sacrilegi reatum incurrit, quod in clericum vel monachum violentas manus injecerit, anathematis vinculo subjaceat: et nullus episcoporum illum praesumat absolvere, nisi mortis urgente periculo; donec apostolico conspectui praesentetur, et eius mandatum suscipiat».


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todos. Vogel apresenta um esquema esclarecedor da evolução do sistema penitencial559: Época paleo-cristã (sistema único)

Penitência antiga

Alta Idade-Média Período Carolíngio até ao final séc. XII (sistema bipartido) A partir do séc. XII (sistema tripartido)

Penitência tarifada Penitência púPenitência tarifada blica para as para culpas graves culpas graves ocultas públicas Penitência pública solene

Penitência privada sacramental

Peregrinação penitencial

Com a difusão da penitência privada, realça-se o elemento subjectivo, especialmente o da contrição. Alcuíno acentua a importância do aspecto interior, a dor. Essa manifesta-se na confusão ou erubescentia da acusação, que se torna numa espécie de sacrifício, capaz de atrair sobre o penitente a misericórdia e o perdão de Deus. Uma doutrina semelhante encontra-se em Rabano Mauro e Incmar de Reims, para os quais é na confissão que reside toda a eficácia do sacramento, porque a acusação sincera e salutar supõe a contritio do coração560. 3.4 A reconciliação e o ministro da penitência A reconciliação segundo os rituais celtas somente era concedida depois de realizado o dever penitencial561. Contudo, na prática, concediase a reconciliação logo depois de cumprida uma parte do tempo de expiação562. Para o caso de perigo de morte, concedia-se a reconciliação logo depois da confissão e reduzia-se os tempos nos casos de doença563. Contudo, a prática de uma confissão sem reconciliação imediata não se ———————— 559 560 561

Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 27-28. Cf. M. RIGHETTI, Manuale di Storia liturgica, IV, 301. Paenitentiale Vinniani, c. 53, in BIELER, The Irish Penitentials, 92: «Non intrandum ad altare donec poenitentia impleatur». 562 Cf. Paenitentiale Theodori 1, 12, 4, in FINSTERWALDER, Die Canones Theodori Cantauriensis, 305: «Paenitentes secundum canones non debent communicare ante consumationem paenitentiae nos autem pro misericordia post annum vel menses sex licentiam damus»; TEODOLFO DE ORLÉANS, Capitulare, II, in PL 105, 215. 563 Cf. Decretum Burchardi (ca. 1008-1012), 18, 9, in PL 140, 940.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

manteve muito tempo. A instrução «Praemonere debet», contida em vários penitenciais a partir do século IX, prescreve que aqueles que se confessam no início da Quaresma devem ser reconciliados na Quintafeira Santa564. As duas fases tendem a fundir-se, tendo em conta as dificuldades pastorais de uma tal reconciliação, como demonstram os Statuta Bonifacii, de 745565. Por volta do ano mil, os dois actos unem-se num só. Visto que a penitência privada se tornava frequente, a absolvição da excomunhão era realizada no contexto sacramental. Os pecados graves somente podiam ser absolvidos pelo poder das claves ecclesiae transmitido aos Bispos e Presbíteros por Pedro e os Apóstolos. O ministro da penitência era o Bispo, como na Igreja antiga, e, só com a sua autorização, um presbítero podia absolver tanto na penitência privada como na solene. O can. 59 dos Capitula Herardi, bispo de Tours, de 858, afirma claramente: «ut presbyteri de occultis jussione episcopi poenitentes reconcilient; et sicut supra praemissus, infirmantes absolvant et communicent»566. No entanto, a administração da forma privada era praticada habitualmente pelos presbíteros. Por outra parte, a prescrição de Herard mostra que a distinção entre poder de ordem e de jurisdição encontrava já no princípio a sua aplicação567. A partir do momento em que a excomunhão desapareceu do processo privado, o constrangimento passa para o primeiro plano. Predomina então o carácter judicial do ministro. O ligar toma o sentido de damnare e o desligar o sentido das obrigações penitenciais. O padre absolvit o penitente a timore perpetuae mortis568. Desta maneira, o poder das chaves era identificado com o poder de remissão dos pecados: «In ecclesia, quae habet clavem regnum caelorum, fit remissio peccatorum»569. O perdão eclesiástico identifica-se com a absolvição do pecado570. ———————— 564 565

Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 127. Cf. Statuta Bonifacii, c. 31, in Mansi 12, 386: «Curet unusquisque sacerdos statim post acceptam confessionem paenitentium singulos data occasione reconciliari». 566 Capitula Hierardi, in PL 121, 767. 567 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 128. 568 BEDA, Homiliae, 2, 16, in PL 94, 223. 569 HALITGÁRIO, De Poenitentia, Praefatio, in PL 105, 655. 570 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 128-129: «Les théologiens du Haut Moyen Age [...] n’ont naturellement pas résolu la difficulté: comment restait-il encore une place pour un acte véritable d’absolution si la rémission des péchés est d’abord le résultat de l’expiation personelle? [...] D’après cela (comentário de S. Jerónimo a Mateus 16, 19), il serait attribuer à l’absolution sacerdotale, non une


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Contudo, o acto de absolvere não era usado exclusivamente como absolvição sacramental. Designava também uma oração de intercessão pelo detentor do poder das chaves, particularmente eficaz. Por isso, foi usada como oração de bênção. Portanto, a sua eficácia dependia da persistência da oração e da expiação realizada pelo pecador. A oração de reintegração na Igreja era uma assistência ao penitente na satisfação. Tal provocará uma confusão de teorias na escolástica acerca do sentido da sacramentalidade da reconciliação571. 3.5 Síntese A disciplina penitencial deste período revela elementos de continuidade na passagem entre as várias práticas penitenciais. O instituto penitencial é uma realidade em movimento, em que as circunstâncias históricas e teológicas influenciam fortemente a disciplina penitencial. A comunhão ou não com a Igreja, especialmente no caso dos pecados graves, tem como consequência a comunhão com Deus, aspecto nem sempre bem esclarecido pelos teólogos do primeiro milénio. No século VII, a penitência tarifada encontra pleno acolhimento. Deste modo, compõem-se os livros penitenciais, instrumentos idóneos para a administração da penitência. No século VIII, os penitenciais proliferam, mas, porque são elaborados segundo critérios subjectivos, produzem confusão e desordem na disciplina eclesiástica. A introdução do sistema das comutações provoca graves abusos. No século IX, tenta-se remediar esta situação. Publicam-se penitenciais realizados pela autoridade, em conformidade com a tradição dos Padres e das sentenças canónicas. Contudo, permanecem as duas formas penitenciais: para os pecados graves públicos a penitência pública, e para os pecados graves secretos, a penitência privada, confessada ao sacerdote572. ———————— signification causale, mais uniquement déclarative [...] plusieurs [...] insistent [...] sur l’efficacitè l’au-delà et le caractère indispensable du pouvoir des clès». 571 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 130-131. 572 Cf. A. CARPIN, «Il sacramento della penitenza», 145: «Il mutamento della prassi penitenziale mostra chiaramente come la Chiesa cambi i suoi atteggiamenti pastorali, in seguito alle mutate situazioni umane e una più completa visione teologica del dato rivelato. Il messaggio della misericordia di Dio, l’appello alla conversione, la grandezza del perdono, la serietà della vita Cristiana, la necessità di penitenza, sono realtà che rimangono inalterate. Ciò che cambia è il modo di proporle e di viverle. Di qui la diversità di prassi penitenziali che tendono però ad un unico scopo: riconciliare l’uomo peccatore pentito con Dio, attraverso la potestà divina della Chiesa di perdonare i peccati».


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

No que diz respeito ao ministro, é claro que na penitência pública antiga o Bispo é o único que reconcilia, mas é ajudado pelos presbíteros. A participação destes, contudo, aumenta com o passar dos séculos. Com o aparecimento da penitência privada, o presbítero torna-se o senhor da penitência. Somente em alguns casos excepcionais se notam nos Penitenciais alguns casos reservados ao Bispo. O seu papel é igualmente relevante nas peregrinações penitenciais. Na penitência pública restaurada pela reforma carolíngia, o Bispo continua a ser o ministro da reconciliação. Contudo, aumentam os casos de jurisdição concedida aos presbíteros. Através da nossa leitura da história, realçamos como as peregrinações penitenciais favoreceram o aparecimento das reservas papais posteriores. O peregrino, ao pedir a intervenção do sucessor de Pedro, invoca a dimensão jurisdicional em relação ao Bispo próprio. O terreno está preparado para a entrada em cena dos penitenciários maiores, ainda não presentes. Por outra parte, como ainda se celebrava a penitência pública reservada ao poder episcopal para os pecados graves, essa constituía o caminho penitencial normal para esses casos.


CAPÍTULO II O início do instituto do penitenciário Séculos XI-XV

1. O ministro da penitência na reflexão escolástica A partir do século XI, a confissão e a reconciliação unem-se, adquirindo a forma que conhecemos hoje: confissão, satisfação e absolvição, repetida quantas vezes for necessário e obrigatória para todos. A penitência pública dá lugar à penitência privada1. Dá-se início ao aprofundamento teológico da penitência. Depois dos diferentes pontos de vista doutrinais resultantes das necessidades pastorais e em resposta às concepções erróneas elaborados pelos Padres, colecções canónicas e autores da alta Idade Média, fazia falta um síntese e reflexão acerca desta disciplina. A jovem escolástica encontrava então um vasto campo de acção. Surgiram duas questões fundamentais: a relação interna entre os diversos factores da penitência e a sua inserção na nova concepção de sacramento que então se elaborava. Unem-se a teologia e a dialéctica com o pensamento aristotélico, fornecendo pistas e dificuldades, surgidas de uma multidão de teorias. A par disso, surgia a necessidade de defender a doutrina eclesial das heresias valdenses e cátaras2. Nascem então os tratados De Paenitentia de dois tipos. Uns são o prolongamento dos Penitenciais, espécie de guias práticos para os confessores. Outros dedicam-se à análise dos elementos essenciais da penitência. Contudo, a sua doutrina não é unânime3. ———————— 1 Antes do final do séc. XII e nos primeiros decénios do séc. XIII, a confissão não era o elemento essencial do processo da penitência. Cf. C. VOGEL, Il peccatore e la penitenza nel medioevo, 13. 2 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 139-140. 3 Cf. J. GAUDEMET, «Un débat sur la confession», 246.


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O principal problema não resolvido pelos Padres e teólogos carolíngios na relação entre o elemento pessoal-subjectivo e o eclesiásticoobjectivo era, ao nível do factor pessoal, a passagem da obra satisfatória – poenitentia, satisfatio – ao arrependimento – contritio. Com a fusão da confissão e reconciliação a causa da remissão dos pecados passava a ser a contrição, em vez da poenitentia e satisfatio. Coloca-se o problema da relação entre contrição e absolvição/confissão. A contrição torna-se o centro da doutrina penitencial. Com isso, era importante aprofundar a noção de remissão das penas, de saber se se tratava de pena eterna ou temporal. Ensinava o tratado pré-escolástico que a remissão das penas temporais era o efeito directo da satisfação. A contrição, confissão e absolvição provocam a remissão4. A pena eterna era assim remitida, ou antes convertida, em pena temporal e o pecado torna-se remissível5. No século XII, Abelardo (†1142) chama a atenção para a doutrina da eficácia do arrependimento interior e provoca a reacção da autoridade eclesiástica contra a sua doutrina do poder do ministro na penitência. Surgem daqui numerosas questões acerca do aspecto da sacramentalidade da penitência, necessidade da confissão, poder dos ministros e remissão dos pecados. No início do século, não se considera a penitência como sacramento. Será Roberto Pulleyn (†1146) a reverter essa tendência, e assim já Pedro Lombardo (†1160) nota que a penitência é um sacramento instituído na Sagrada Escritura6. ————————

4 Cf. M. RIGHETTI, Manuale di Storia liturgica, IV, 302: «In conclusione [...] la dottrina penitenziale, pur riconoscendo sempre le tre parti sostanziali dell’actio poenitentiae – confessio, satisfactio, reconciliatio – si è successivamente affermata su l’una o l’altra di esse; dapprima sulla satisfactio, con i rigori degli esercizi penitenziali; poi sulla confessio, espressione della contrizione del cuore; da ultimo sull’absolutio, che rende effettivo il sacramento ». 5 Cf. tratado anónimo: De vera et falsa Poenitentia, cap. 10, 25, in PL 40, 1122: «fit enim per confessionem veniale, quod criminale erat in operatione; et si non statim purgatur, fit tamen veniale, quod commiserat mortale»; cap. 18, 34, in PL 40, 1128: «Quaedam enim peccata sunt, quae sunt mortalia, et in poenitentia fiunt venialia, non tamen statim sanata». Segundo Poschmann, esta distinção não era nova na doutrina tradicional. Os pecadores sinceramente convertidos e reconciliados não incorriam na pena eterna, mesmo quando a sua penitência deveria ser completada na eternidade. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 140, n.1. 6 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 612: «L’abontante littèrature thèologique de cette époque prouve suffisament l’étonante activitè des maîtres du XIIe siècle. La pléiade des théologiens a fourni in travail considèrable e de toute première importance. D’un ensemble désordonné de sentences patristiques, de


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A sacramentalidade é aceite sem discussões, mas resta saber o que significa a intervenção do sacerdote no arrependimento do penitente. São abordadas diversas dimensões do ministério da absolvição. O poder do ministro da penitência inclui tanto a remissão e satisfação como a excomunhão ou reconciliação7. A teologia escolástica aceitou até meados do século XIII que a absolvição do sacerdote age sobre o perdão da culpa como tal, o reatus culpae. Ao mesmo tempo, todos os teólogos do século XII estão convencidos de que o arrependimento obtém o perdão dos pecados antes da confissão. Impõe-se a teoria do votum sacramenti, que extingue os pecados por causa da antecipação da absolvição8. Como conciliar estas dimensões? Será a meditação escolástica a desenvolvê-lo até às formulações amadurecidas da teologia tridentina. 1.1 Os elementos do sacramento da penitência Os escolásticos distinguiam na teologia dos sacramentos três elementos: o sacramentum tantum, sinal visível composto por matéria e forma, a res sacramenti, a graça ou efeito último do sacramento, e a res et sacramentum, uma realidade intermédia, efeito do rito e sinal eficaz da res sacramenti. O carácter é a res et sacramentum próprios do baptismo, crisma e ordem. No caso da penitência, a res sacramenti era a remissão dos pecados pela reconciliação com Deus. O sacramentum tantum consistia nos actos penitenciais visíveis, sinais da contrição interior. No entanto, a res et sacramentum necessita de precisação. Para os Padres da Igreja, essa consistia na pax ecclesiae, a reconciliatio com a Igreja. Contudo, para os primeiros escolásticos, era a paenitentia interior, unida aos actos externos do penitente, verdadeira causa do perdão divino, res sacramenti. No século XIII, quando se afirmava também a acção da Igreja com a absolvição do sacerdote, a doutrina da paenitentia interior como res et sacramentum manteve-se mesmo nos grandes escolásticos, mas com a consciência de que no sacramento da penitência acontece também uma reconciliação com a Igreja9. Pedro Lombardo afirma que a exterior poenitentia é signum interioris, onde se dá a re————————

commentaires scripturaires et de collections canoniques à tendence pratique, ils ont élaboré de véritables Sommes théologiques. Principalement dans le domaines des sacrements, en particulier de la pénitence, ils ont établi les bases de la doctrine scolastique». 7 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 608-612. 8 Cf. K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 323-324. 9 Cf. J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 193-194.


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missão dos pecados10. Esta interpretação fornecia o ponto de partida para a especulação posterior. Os teólogos dos séculos XI e XII coincidem no princípio de que os pecados dos cristãos são sempre uma ofensa à Igreja. Por isso, no sacramento da penitência, o pecador repara também a ofensa à Igreja. A absolvição do sacerdote tem assim o valor de reconciliar com a Igreja e readmitir o pecador aos sacramentos e de ajudar a sua penitência subjectiva com as orações da Igreja, embora não tenha uma eficácia directa na obtenção do perdão divino. Confirma-se deste modo a teoria do significado simplesmente declarativo da penitência. Porém, isso não nega a sacramentalidade da penitência, como o provou Roberto Pulleyn11. 1.2 O ministro e o poder das claves ecclesiae O ministério da penitência está intimamente ligado ao poder das claves ecclesiae, uma expressão equívoca à medida que se percorrem os vários autores. Para começar, indica o poder judicial, que inclui o poder de ligar e de desligar. Convém ter em conta que a maior parte dos autores junta o sacramento da penitência com o direito penal. Na verdade, esta distinção delinear-se-á lentamente. O ligar significava o poder de excomungar ou de impor obras de penitência adequadas. Na forma privada de penitência, era mais frequente o segundo sentido. O desligar ou dissolver significava tanto a libertação da excomunhão como das obras de penitência, da pena eterna e das penas temporais devidas ao pecado. Com o tempo, passou-se do termo reconciliatio ao de absolutio. Esta absolvição significava quer a reconciliação com a Igreja quer o esforço penitencial para obter o perdão de Deus. Na raiz desta absolvição, estava tanto o pecado grave como o delito. Só com a diferenciação da excomunhão teológica da excomunhão jurídica, a reconciliação com a Igreja adquiriu um significado jurídico12. Distinguia-se também entre a clavis scientiae ou discretio, que é a faculdade de discernir o atar ou desatar, e a clavis potentiae ou potes————————

10 Cf. PEDRO LOMBARDO, Libri IV Sent., dist. 22, c. 3, in PL 192, 899: «Interior enim poenitentia, et res est sacramenti, id est, exterioris Poenitentiae; et sacramentum remissionis peccati, quam signat et facit. Exterior quoque Poenitentia et interioris signum est, et remissionis peccatorum». 11 Cf. ROBERTO PULLEYN, Libri VI Sent., c. 61, in PL 186, 910: «Nimirum confitendibus a sacerdote facta a peccatis absolutio remissionem peccatorum, quam antea peperit cordis contritio, designat». 12 Cf. J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 192-193.


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tas iudicandi, o poder de atar ou desatar, que incluía tanto o sacramento da penitência como o poder excomungar ou tirar a excomunhão. Os padres indignos possuem contudo este poder, visto que a eficácia do sacramento não depende dos méritos do ministro. Para poder administrar esse poder, o padre deve ser ordenado e ter o poder de exercer: potestas e executio potestatis. Surge a noção de jurisdição ligada à cura de almas. 1.3 A posição dos autores no Século XI No século XI13, os autores baseiam a necessidade da confissão aos sacerdotes no poder de ligar e desligar concedido por Cristo aos Apóstolos. Assim o fazem Yves de Chartres (†1116), Lanfranc (†1089) e o autor do De vera et falsa poenitentia14. Neste último documento, a confissão é já tida como satisfação, porque depois da confissão já se obtém a remissão dos pecados15. Aqui a força da confissão é tão forte que, quando falta o sacerdote, o penitente pode confessarse ao próximo, ex desiderio sacerdotis. A confissão é o mais importante elemento penitencial, que somente em caso de necessidade a absolvição sacerdotal pode substituir16. Por isso, não existe uma reflexão para determinar em que consiste a parte do sacerdote na remissão dos pecados. Afirmam-se simplesmente a necessidade dos vários elementos da remissão. Recorrem à autoridade dos Padres da Igreja na afirmação dos mesmos. A questão é precisada quando reagem às absolvições gerais na prática penitencial. Baseando-se nos textos de S. Gregório e S. Jerónimo, os autores da época afirmam que só Deus remite os pecados e o padre é apenas seu ministro17. A intervenção sacerdotal compreende o julgamento do pecador arrependido e a imposição da satisfação. Nesta época, havia confusão entre o poder jurídico externo e o poder sobre as al———————— 13 14

Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 36-42. Cf. YVES DE CHARTRES, Epistola 186, in PL 162, 189-190; LANFRANC, Libellus de celanda confessione, in PL 150, 629; De vera et falsa poenitentia, cap. 10, 25, in PL 40, 1122. 15 De vera et falsa poenitentia, cap. 10, 25, in PL 40, 1122: «erubescentia enim ipsa partem habet remissionis [...] fit enim per confessionem veniale, quod criminale erat in operatione [...] qui erubescit pro Christo, fit dignus misericordia». 16 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 125; A. TEETAERT, La Confession aux laïques, 44. 17 Cf. Epistola civis Spirensis ad Heribertum, in PL 151, 695-696.


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mas, entre o foro externo (excomunhão) e interno (penitência). A penitência era considerada como excomunhão, e o fim da satisfação uma reconciliação com a Igreja18. Contudo, Yves de Chartres distingue e faz ver a relação estreita entre estes dois campos. Separa-os em dois livros distintos, nos Decreti 14 e 15, e, na Panormia, são tratados em conjunto em relação ao poder das chaves19. Admite-se, por outro lado, a distinção entre anátema e excomunhão. Yves de Chartres cita uma carta de João VIII (872-882) ao arcebispo Luidbert em que se distinguem estas noções. O anátema é uma excomunhão que separa ontologicamente da Igreja, e a excomunhão designa uma separação com efeitos somente exteriores20. Mas estes termos não têm ainda um sentido bem preciso21. Alguns autores colocam o problema entre a remissão dos pecados operada por Deus e a reconciliação solene do pecador com a Igreja. Bonizo de Sutri (†1095) afirma que a remissão dos pecados que se obtém pela absolvição do padre não está em função da duração da expiação. Os pecados são perdoados por Deus quando o sacerdote julga que o pecador se arrepende verdadeiramente das faltas. As penas impostas são parte da penitência, que permite à Igreja julgar a sinceridade do arrependimento22. Yves de Chartres admite que Deus remite o pecado quando o pecador se arrepende verdadeiramente. No entanto, a Igreja impõe uma satisfação pública que lhe permite conhecer a conversão interior do pecador. Portanto, não existe contradição entre o arrependimento do pecador, que opera a remissão, e a prática da disciplina eclesial23. Os actos exteriores são os sacramenta do arrependimento24. Os autores desta época fazem assim a ponte entre as sentenças patrísticas e os mestres do século XII25. ————————

18 Cf. F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 268, 434. 19 Cf. YVES DE CHARTRES, Decreti, 14-15, in PL 161, 825-902;

Panormia, V, 77136, in PL 161, 1227-1244. 20 Cf. YVES DE CHARTRES, Decreti, 14, c. 51, in PL 161, 838; C. 3, q. 4, c. 12: «Engeltrudem uxorem Bolonis non solum excommunicatione quae a fraterna societate separat, sed anathemate quae ab ipso Corpore Christi, quod est Ecclesia, recidet, crebo percussans». 21 Cf. F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 271. 22 Cf. BONIZO DE SUTRI, Liber de Vita christiana, IX, c. 2, 277-278. 23 Cf. YVES DE CHARTRES, Ep. 228, in PL 162, 231-232. 24 Cf. YVES DE CHARTRES, Sermo 13, In Capite Jejunii, in PL 162, 581. 25 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 51-55.


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1.4 A posição de Abelardo Abelardo (†1142) afirma que a confissão e imposição da penitência pelo padre são remédios indispensáveis prescritos por Deus como resposta a uma contrição verdadeira26, causa da abolição dos pecados. Contudo, nega que a Igreja tenha o poder de perdoar os pecados em virtude da claves ecclesiae de Mateus 16, 18-19; 18, 18. O poder referido nestes textos limita-se ao poder jurisdicional ou disciplinar de excomungar ou de libertar da excomunhão. Referindo-se à Epístola de Tiago 5, 16, Abelardo afirma que a absolvição do sacerdote tem somente o valor de uma oração de intercessão em favor do pecador, para ajudá-lo no seu esforço penitente, e não tem o valor de um acto judiciário27. Abelardo insurge-se violentamente contra os abusos de certos prelados que pediam somas de prata pela remissão de uma parte da satisfação imposta. Por isso, pretende afirmar que Cristo concedeu o poder da remissão dos pecados aos Apóstolos, mas não da mesma forma aos seus sucessores28. Ao comentar alguns textos patrísticos, distingue duas interpretações. O poder de ligar e desligar transmitido aos Apóstolos foi transmitido aos Bispos, mas não é absoluto. Os Bispos não o podem usar de modo arbitrário. Por outro lado, só os Bispos dotados da graça espiritual da ressurreição e da ciência requerida podem pretender ter este poder de remitir os pecados29. A negação do poder episcopal das chaves faz parte dos capitula haeresum Petri Abaelardi, pelos quais ele foi condenado no Concílio de Sens em 1140, por influência de São Bernardo30. Em resposta à posição de Abelardo, os teólogos recorrem a João 20, 22-23, no qual fundam o poder do sacerdote para poder perdoar os pecados em nome e com a autoridade de Deus31. Contudo, a interpretação deste conceito é equívoco e há que fazer justiça a Abelardo. A concepção primitiva em que o efeito formal da absolvição era a pax ecclesiae tinha desaparecido da consciência eclesial. Por isso, para a remissão dos pecados, Abelardo exigia a santidade pessoal para a eficácia da intercessão do sacerdote e não a autoridade sacerdotal, pelo que queria limitar o po———————— 26 Cf. ABELARDO, Ethica, cap. 24, in PL 178, 668-669; B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 140-141. 27 Cf. ABELARDO, Ethica, cap. 26, in PL 178, 673-678. 28 Cf. ABELARDO, Ethica, cap. 25-26, in PL 178, 673-674. 29 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 289-291. 30 Cf. SÍNODO DE SENS (1140), cap. 12, in DS 732. 31 Cf. J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 193.


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der dos Bispos32. Abelardo mostra-se hesitante na sua doutrina. Parece confundir o poder de remitir os pecados com o de remitir as penas33. Por fim, defende que o poder de ligar é próprio dos Bispos, não dos padres34. 1.5 Decreto de Graciano (1140) Graciano tenta responder à questão da necessidade ou não da absolvição. Apresenta aqueles que defendem que o perdão pode ser obtido sem a confissão à Igreja ou julgamento do sacerdote35. A confissão é assim um simples elemento dos actos penitenciais. Outros defendem que o pecado não pode ser remido sem a confissão oral e a satisfação36. Graciano opta por não tomar uma posição37. Uma tal hesitação é rara nos seus Dicta. Tal prova que a questão a meio do século estava em aberto38. Graciano não se dedica ao poder sacerdotal no sacramento da penitência, mas na secção dedicada à excomunhão. Na primeira questão da causa vinte e quatro, defende que a união com a Igreja é indispensável para que um sacerdote possa abolver os pecados. Por isso, um prelado herético não pode excomungar um fiel, porque não possui o poder de ligar ou desligar. Sem esta união, ele não pode receber o Espírito Santo, pelo qual os pecados são remitidos39. Na vigésima sexta causa, Graciano afirma que o poder de excomungar e reconciliar pertence ao Bispo. O padre não pode reconciliar aque———————— 32 33 34 35

B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 141. Cf. ABELARDO, Ethica, cap. 25, in PL 178, 671. Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 292-293. Cf. D. 1 de poen., c. 1-5; D. 1 de poen., c. 30, d.p.: «Luce clarius constat cordis contritione, non oris confessione peccata dimitti». 36 Cf. D. 1 de poen., c. 38-40, 60, 87-90. 37 Cf. D. 1 de poen., c. 89, d.p.: «Quibus auctoritatibus, vel quibus rationum firmamentis utraque sententia confessionis et satisfactionis nitatur, in medium breviter proposuimus. Cui autem harum potius adherendum sit, lectoris iudicio reservatur. Utraque enim fautores habet sapientes et religiosos viros». 38 Cf. J. GAUDEMET, «Un débat sur la confession au milieu du XIIe siècle», 246-248. 39 Cf. C. 24, q. 1, c. 4, d.p: «Cum ergo dimittere peccata vel tenere, excommunicare vel reconciliare opus sit Spiritus Sancti et virtus Christi: apparet, quod hii, qui extra ecclesiam sunt, nec ligare, nec solvere possunt, nec reconciliando ecclesiasticae conmunioni reddere, nec excommunicando eius societate privare, qua ipsi, heresi vel scismate polluti sive sentencia notati penitus carere probantur [...] Hec autem, que de hereticis, atque scismaticis, uel excommunicatis dicta sunt, uidelicet, quod ligandi uel soluendi potestatem non habeant, multorum auctoritatibus probantur»; P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 302-312.


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le que foi excomungado por um prelado. A reconciliação pode ser pública ou privada. Esta última pode ser realizada por um padre. Em caso de necessidade, o padre pode sempre reconciliar40. Inicia-se deste modo a insistência na prática de uma confissão secreta. De acordo com um estudo de Ickx41, Graciano estabelece um novo espaço jurídico na Igreja. A glosa do século XII «Ecclesia de occultis non iudicat» contribui ao nascimento do princípio do foro interno. O carácter medicinal da penitência justifica-se pelo ocultamento de certos erros, evitando o escândalo. Este novo espaço permite a exigência de um tribunal da consciência autónomo, com jurisdição delimitada, que escruta e respeita a autonomia do indivíduo e que tem como objectivo a salvação da alma. Deste modo, valoriza-se a fronteira entre o oculto e o manifesto, visto que todos os pecados, escondidos ou públicos, devem ser confessados secretamente. No que diz respeito à reserva papal, Graciano retoma à letra o texto de Inocêncio II do Concílio de Latrão II, no cânon 15, como veremos adiante42. No entanto, um primeiro exemplo de reserva papal encontrase no Decretum, relativa a Gregório Magno (590-604), que reserva a si, contra João de Larissa, a causa respeitante a Adriano, Bispo de Tebas, em Outubro de 59243. No que diz respeito às Ordens Menores, coloca-se a questão de saber se os frades têm o mesmo poder que os outros sacerdotes. Para resolver isso, o Decreto de Graciano distingue entre potestas e executio potestatis. Portanto, o sacerdote só pode exercer o poder com a autorização do Bispo, que lhe confia o encargo de almas num território determinado44. Surge daqui uma dificuldade. Um texto atribuído a Santo Agostinho afirma que um fiel deve confessar-se ao melhor padre possível. Isso vai contra a regra que proíbe um padre de confessar um fiel de outra paróquia45. Graciano responde que os cânones afirmam que um fiel não ———————— 40 41 42 43 44

Cf. C. 26, q. 6, c. 1, d.p.; c. 3, d.p.; c. 13, d.p. Cf. J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 41-46. Cf. C. 17, q. 4, c. 29. Cf. C. 16, q. 1, c. 52. C. 16, q. 1, c. 40, d.p.: «Sicut ergo in benedictione utrique communem nasciscuntur potestatem, ita in institutione communiter assecuntur potestatis executionem. Ceterum absque episcoporum licentia non solum monachis sed etiam omnibus generaliter clericis potestatis executio interdicitur». Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 309. 45 Cf. D. 6 de poen., c. 3, d.a.


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pode desprezar o seu pároco. Por outro lado, é aconselhado a evitar um sacerdote incapaz de exercer o seu ministério46. Contudo, estas noções são ainda imprecisas47. Começa-se a distinguir entre o domínio da penitência e o da excomunhão. No entanto, entre 1160 e 1220, o vocabulário usado pelos decretistas e decretalistas é incerto. Só com o tempo se clarificarão estas questões48. Os decretistas resumem ordenadamente a matéria dos teólogos. Os primeiros comentadores contentam-se em resumir o pensamento de Graciano. Ugúcio tenta precisar a relação entre a jurisdição e o poder sacerdotal. O autor da Glossa Palatina considera a jurisdição como a chave sacerdotal. No caso dos heréticos, Rufino, Sicard de Cremona e o autor da Summa Lipsiensis ensinam que estes não podem ligar ou desligar e só em caso de necessidade um fiel pode confessar-se a estes. Fazem notar sempre a restrição do poder de um prelado baseado nos limites da sua jurisdição49. No que diz respeito ao ministro da confissão, Rufino defende que o penitente deve confessar-se a um padre católico, pois só esse tem o poder de ligar. O autor da Summa Lipsiensis afirma que um católico deve confessar os seus pecados ao seu sacerdote ou a outro, com licença do seu superior. Ugúcio faz algumas distinções práticas, respeitando os anteriores, e por fim admite a confissão, em caso de necessidade, a um leigo. Simão de Bisiano, Sicard de Cremona e o autor da Summa Lipsiensis admitem a confissão mesmo a um herege, justificando-se com a confissão a um leigo50. ————————

46 Cf. D. 6 de poen., c. 3, d.a: «Quod autem dicitur, ut penitens eligat sacerdotem scientem ligare et solvere, videtur esse contrarium ei, quod in canonibus inuenitur, ut nemo videlicet alterius parrochianum iudicare presumat. Sed aliud est favore vel odio proprium sacerdotem contemnere, quod sacris canonibus prohibetur; aliud cecum vitare, quod hac auctoritate quisque facere monetur, ne, si cecus ceco ducatum prestet, ambo in foveam cadant. Unde Urbanus Papa II. Cuilibet sacerdoti commissum, nisi pro eius ignorantia, alter sacerdos ad poenitentiam non suscipiat. C. III. Placuit, ut deinceps nulli sacerdotum liceat quemlibet commissum alteri sacerdoti ad penitenciam suscipere sine eius consensu, cui se prius conmisit, nisi pro ignorantia illius, cui penitens prius confessus est». 47 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 310-312. Por exemplo, Graciano ainda fala tanto do «sacramento da penitência» como do «sacramento da excomunhão»: C. 1, q. 1, c. 42, d.p.; C. 24, q. 1, c. 39, d.p. 48 Cf. J. GAUDEMET, Storia del diritto canonico, 546. 49 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 545-552. 50 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 587-589.


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1.6 Escola de São Vítor Hugo de São Vítor (†1141) tomou activa posição na defesa do poder das chaves e da eficácia intrínseca da absolvição. Distinguia no pecado um duplo aspecto. O plano interior consistia na impietas ou obduratio cordis, o plano exterior no debitum futurae damnationis. Só o primeiro é suprimido pela contrição, o segundo é-o pela absolvição51. Deste modo, introduz na teologia da penitência a diferença entre culpa e poena52. No fundo, procura-se na absolvição um efeito no além53. No que diz respeito ao ministro, reinvidica o poder directo dos padres na remissão dos pecados na penitência. O padre deve indicar que o perdão foi transmitido por Deus. Foi Deus quem confiou aos padres o poder de remitir os pecados, um não exclui o outro. A confissão e a satisfação são os meios queridos por Deus para obter a remissão dos pecados. Por isso, os padres têm um real poder de ligar e desligar, segundo os méritos do penitente54. Ottone da Lucca (†1146)55 desenvolve o pensamento de Hugo de São Vítor56. Segundo o seu parecer, os padres declaram que o pecador é ligado ou desligado. O poder de remitir os pecados é reservado somente a Deus, mas o padre tem o poder de libertar o pecador da pena eterna57. O poder das chaves consiste no discernimento e no poder que são transmi———————— 51

Cf. HUGO DE SÃO VÍTOR, De sacramentis Christiane fidei, II, pars 14, cap. 8, in PL 176, 565: «Ligatus est obduratione mentis, ligatus est debito futurae damnationis [...] ac sic deinde confitendes per ministerium sacerdotum ab exteriore vinculo, hoc est a debito damnationis absolvit». Encontra-se um texto semelhante atribuído por Migne a Hugo de São Vítor, mas que parece ser de Hugo de Mortagne: PL 176, 147148. Cf. A. TEETAERT, La Confession aux laïques, 95; F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 441, nt. 1. 52 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 142, n. 3: «Cette distinction se trouve dejà chez Augustin (In Jo. tr. 124, 5; De pecc. mer. et rem. I, 32, 61; 2, 34, 56), mais il ne l’exploite pas pour la Pénitence. Richard de Saint-Vítor, élève d’Hugues, parle fréquemment déjà de culpa et de poena au lieu d’obduratio et de damnatio (De potest. lig. et solv. c.4, passim), de même que Pierre Lombard (IV, dist. 18, c. 4)». 53 Esta teoria não teve sucesso, porque não se pode separar a remissão da pena eterna da própria falta. Cf. K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 324. 54 Cf. HUGO DE SÃO VÍTOR, De sacramentis Christiane fidei, II, pars 14, cap. 8, in PL 176, 564-570; P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 295-298. 55 A literatura medieval deixou-nos uma obra anónima intulada «Summa Sententiarum» erradamente atribuída a Hugo de São Vítor (PL 176), mas que estudos recentes provam ser de Ottone da Lucca. Cf. F. GASTALDELLI, «La Summa sententiarum di Ottone da Lucca», 537- 546. 56 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 298-301. 57 Cf. OTTONE DA LUCCA, Summa Sententiarum, VI, c. 11, in PL 176, 147-148.


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tidos ao padre no dia da sua ordenação, mas nem todos o possuem. O discernimento não constitui um poder antes da ordenação, porque o padre não tem ainda um officium, em que possa ligar e desligar. O padre que não tem o discernimento suficiente não recebeu na ordenação o officium de julgar e de exercer o seu poder58. Por isso, os padres indignos não podem servir-se do seu poder59. 1.7 Pedro Lombardo e a sua escola A doutrina de Abelardo exerceu uma influência predominante no pensamento dos autores da sua época. Contribuíram para a sua propagação o Decreto de Graciano (1140) e as Sentenças (1150) de Pedro Lombardo (†1160). Segundo este último, a libertação da corrupção eterna é provocada quando o homem começa a chorar os seus pecados e a amar o seu Deus60. O poder da claves ecclesiae distinguia-se em clavis scientiae (permitia ao sacerdote ter um justo conhecimento do estado de alma do penitente), e em clavis potestatis (dá-lhe o poder de infligir a satisfação pela remissão de uma parte da pena e de admitir aos sacramentos). No exercício do poder das chaves, distinguem-se três modos: o reconhecimento pela Igreja daquilo que Deus operou, a imposição de uma pena temporal, e a excomunhão61. As claves ecclesiae não conduzem à remissão dos pecados propriamente dita. O sacerdote recebeu um verdadeiro poder, mas apenas deve declarar o perdão dado por Deus, para que a Igreja possa reconhecer a conversão do pecador62. Deste modo, somente mostra que os pecados são remitidos63. Esta teoria declaratória já tinha sido ensinada por Santo Anselmo de Cantuária: «Qui jam coram Deo sunt mundati, sacerdotum judicio etiam hominibus ostenduntur mundi»64. Ainda segundo Pedro Lombardo, as chaves são entregues aos padres no dia da sua ordenação, e possuem realmente o poder de ligar e desligar, mas nem todos têm a chave de discernir65. ———————— 58 59 60 61

Cf. OTTONE DA LUCCA, Summa Sententiarum, VI, c. 14, in PL 176, 152. Cf. OTTONE DA LUCCA, Summa Sententiarum, VI, c. 14, in PL 176, 153. Cf. PEDRO LOMBARDO, Libri IV Sent., dist. 18, c. 4, in PL 192, 886-887. Cf. PEDRO LOMBARDO, Libri IV Sent., dist. 18, c. 4-6, in PL 192, 886-887; F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 442. 62 Cf. PEDRO LOMBARDO, Libri IV Sent., dist. 18, c. 6, in PL 192, 887. 63 Cf. PEDRO LOMBARDO, Libri IV Sent., dist. 18, c. 5, in PL 192, 887. 64 ANSELMO DE CANTUÁRIA, Homilia 13, in PL 158, 662. 65 Cf. PEDRO LOMBARDO, Libri IV Sent., dist. 19, c. 5, in PL 192, 889.


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É interessante notar como Pedro Lombardo relaciona na distinção 18 da quarta parte das Sentenças a penitência e a excomunhão. O capítulo 6, que tem por título «Quomodo sacerdotes ligant vel solvunt a peccatis», é dedicado à excomunhão. Deste modo, a excomunhão e a penitência são duas manifestações do exercício do poder das chaves, não claramente distintas. O mesmo sucederá com Guilherme d’Auvergne (†1249) e Alexandre de Halès (†1245)66. Os sucessores de Lombardo precisam a doutrina do poder dos padres e a remissão dos pecados, e quais são os padres que têm o poder de ligar e desligar. Na ordenação, são recebidas as duas chaves sacerdotais, a da ciência e a do poder de ligar e desligar. Nem todos os padres possuem a chave da ciência. Todos têm o poder de ligar e desligar, mas só os padres que seguem o exemplo dos Apóstolos podem exercer dignamente este poder. Não se podem separar estas duas chaves67. Embora considerem o padre como o ministro da penitência, admitem que um pecador possa confessar-se a um leigo. Defendem também que um fiel deva confessar-se ao proprius sacerdos68. 1.8 Soluções intermédias 1.8.1 A metade do século XII Roberto Pulleyn (†1146) provou a sacramentalidade da penitência mesmo com a sua teoria declarativa da absolvição69. A acção sacerdotal é o sinal sacramental da penitência. Cristo transmitiu aos Apóstolos e aos seus sucessores o poder de remitir os pecados e o poder de ligar. Deus intervém no arrependimento e o sacerdote na confissão para dar a absolvição. A absolvição significa a remissão dos pecados operada por Deus na contrição, e também o poder de ligar70. O sacerdote impõe a satisfação quando o penitente se arrepende, e recusa-a quando o penitente é obstinado71. Roberto Pulleyn introduz uma novidade na doutrina ———————— 66 67

Cf. F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 276-277. Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 539-544. Anciaux resume a doutrina dos sucessores de Lombardo, entre os quais figuram Udon, Mestre Badin, Odon d’Ourscamp, Pedro le Mangeur, Gandulfo de Bolonha. 68 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 587. 69 Cf. ROBERTO PULLEYN, Sententiarium libri octo, VI, c. 61, in PL 186, 910: «Nimirum confitentibus a sacerdote facta a peccatis absolutio remissionem peccatorum, quam antea peperit cordis contritio, designat». 70 Cf. ROBERTO PULLEYN, Libri VIII Sent., VI, c. 61, in PL 186, 910. 71 Cf. ROBERTO PULLEYN, Libri VIII Sent., VI, c. 61, in PL 186, 911.


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de Abelardo: a absolvição sacerdotal é o sinal sacramental e pode influenciar as sequências do pecado72. Ricardo de São Vítor (†1173) transforma em absoluto o perdão condicionado de Deus73. Tentou defender o seu mestre Hugo de São Vítor ao distinguir na pena a obligatio ad poenam, o vinculum damnationis, que só pode ser desligado por Deus, e o vinculum expiationis em que existe uma cooperação entre Deus e o sacerdote, ao transformar pela absolvição, em virtude da gratia cooperandi, a pena eterna em pena temporal, poenam non purgatoriam in purgatoriam74. Deus quebra o vinculum damnationis em virtude da contrição, mas conditionaliter, sob reserva da absolvição posterior, até que o sacerdote o livra integraliter pela absolvição75. Esta teoria tem o mérito de ter mantido uma real eficácia do acto sacramental76, e de tentar estabelecer a relação íntima entre a remissão e o poder das chaves77. O poder das chaves acontece quando o sacerdote liga ao impor a satisfação ou ao aplicar o anátema78. Roberto de Melun (†1167) limita-se a fazer uma síntese das diversas opiniões em relação ao problema das chaves e do poder de ligar e desligar79. No que diz respeito à absolvição, afirma que o pecador é remitido no momento da contrição, mas ainda está submetido à satisfação. Só depois de cumprida, ele merece a absolvição e o pecado é totalmente remetido80. Tanto Ricardo de São Vítor como Roberto de Melun ———————— 72 73 74

1162.

Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 337. Cf. K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 324. RICARDO DE SÃO VÍTOR, De potestate ligandi et solvendi, c. 3, in PL 196, 1161-

75 RICARDO DE SÃO VÍTOR, De potestate ligandi et solvendi, c. 19 e 20, in PL 196, 1171-1173; c. 7, in PL 196, 1164: «Ecce ex his quae jam diximus intelligere poterimus in resolutione peccatorum quid Dominus faciat per semetipsum, quid per ministrum suum, quid vero per se simul te officium ministrorum. Per semetipsum sane solvit vinculum obdurationis, per se simul et ministrum debito aeternae damnationis, per ministrum vero debito futurae purgationis»; c. 8, in PL 196, 1165: «Notandum quod vinculum damnationis Dominus solvit conditionaliter, minister vero Domini simpliciter, et, ut sic dicam, integraliter». 76 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 341. 77 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 142-143. 78 RICARDO DE SÃO VÍTOR, De potestate ligandi et solvendi, cap. 6, in PL 196, 1164. 79 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 342-343. 80 Cf. ROBERTO DE MELUN, Questiones de Divina Pagina, q. 72, in R. MARTIN, 38: «Cum primo ingemiscit peccator remittitur ei reatus. Sed adhuc tenetur debito sa-


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consideram a penitência e a remissão dos pecados como um todo em que Deus e o padre tomam uma parte real81. Mestre Simon (ca. 1145) também tenta conciliar o poder dos sacerdotes com as prerrogativas divinas. Apresenta uma solução semelhante à de Roberto de Melun82. Na ordenação, os padres recebem as chaves sacerdotais, o poder e a ciência, em virtude do officium que lhes é confiado83. O poder de ligar e desligar pode-se exercer tanto pela sentença de anátema, como pela imposição da satisfação. Na primeira dimensão, o julgamento de Cristo precede o da Igreja, pelo que a pessoa não pode ser anátema se não é culpável aos olhos de Deus. No caso da remissão dos pecados, Cristo confiou o cuidado de indicar a satisfação necessária para a expiar os pecados. Neste caso, o julgamento da Igreja precede o de Cristo, que o aprova e confirma. Por isso, o fiel deve respeitar sempre a decisão dos prelados, para não ser culpável perante Deus. Se a remissão dos pecados é confiada a Deus, a absolvição da pena é confiada aos padres, pela qual os penitentes obtêm a remissão completa dos pecados84. Deste modo, a acção do sacerdote é puramente exterior. Nele não se distingue bem entre excomunhão e penitência85. 1.8.2 Finais do século XII Depois de Roberto Pulleyn, diferentes mestres reconhecem a absolvição sacerdotal como sinal sacramental da penitência. Contudo, mantém-se a função declarativa do sacerdote ao declarar a remissão dos pecados já realizada por Deus. O sacerdote impõe a satisfação, remite uma parte das penas e reconcilia com a Igreja. Em virtude do poder das chaves, os padres podem realizar a remissão das penas temporais. Contudo, nesse poder incluem-se tanto o poder de excomungar como o de impor a penitência. Exigem, contudo, a jurisdição para que o padre possa exercer esse poder recebido na ordenação. Os monges e padres excomungados não o podem exercer, porque não são cura de almas. A imposição da penitência é reservada ao padre pároco. Contudo, em caso ————————

tisfactionis exterioris; quam si neglexerit facere non absolvitur a reatu. Si vero exteriorem satisfactionem compleverit, absolvi merebitur; et sic omnino demissum fuerit peccatum». 81 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 344. 82 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 346-350. 83 Cf. MESTRE SIMON, De sacramentis, 70-71. 84 Cf. MESTRE SIMON, De sacramentis, 72-73. 85 F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 444.


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de necessidade, o pecador pode dirigir-se a qualquer padre ou mesmo a um leigo86. Pedro de Poitiers (†1205) distingue também nas chaves sacerdotais a ciência e o poder. Defende que a chave da ciência é reservada somente aos padres, mas nem todos a possuem87. No que diz respeito ao poder de ligar e desligar, existem dois tipos de padres que não a possuem: os que estão em pecado mortal e os que não têm paróquia. No entanto, os que não têm paróquia possuem o poder de ligar in habitu, por ser inseparável da ordem, mas não o possuem in actu antes de o Bispo lhes confiar uma paróquia88. Deste modo, Pedro de Poitiers é um dos primeiros que distinguem claramente entre poder de ordem e de jurisdição89. No que diz respeito ao ministro da confissão, defende que qualquer homem pode perdoar os pecados, mesmo sem ser padre90. Pedro o Cantor (†1197) tenta precisar o poder entregue aos diferentes ministros da Igreja. O poder de ligar ou desligar, que se exerce na confissão ou na excomunhão, está ligado à jurisdição, que compreende o encargo de uma paróquia. Contudo, admite que, em caso de necessidade, o pecador possa confessar-se a um leigo91. Raoul l’Ardent92 (segunda metade do séc. XII) afirma que as chaves foram entregues por Cristo a Pedro e por isso quem se separa da Igreja separa-se deste poder. No entanto, nem todos os padres possuem a ciência para ligar e desligar segundo a justiça e outros abusam deste poder. Alain de Lille (†1202) atribui a todos os padres o poder de ligar e desligar. Todos o recebem, mas nem todos o usam dignamente93. 1.9 A remissão dos pecados no século XIII No início do século XIII, era claro que o arrependimento era insuficiente sem o amor de Deus, mas era necessário para a justificação. O ———————— 86 87 88

Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 606-607. Cf. PEDRO DE POITIERS, Libri V Sent., III, c. 16, in PL 211, 1073-1074. Cf. PEDRO DE POITIERS, Libri V Sent., III, c. 17, in PL 211, 1079: «Illam potestatem (clavium) habet (sacerdos) tantum in habitu et non in actu, nisi concedatur ab episcopo». 89 Cf. PEDRO DE POITIERS, Libri V Sent., III, c. 16, in PL 211, 1075. 90 Cf. PEDRO DE POITIERS, Libri V Sent., III, c. 16, in PL 211, 1076-1077. 91 Cf. P. ANCIAUX, La Théologie du Sacrement de Pénitence, 555-558, 591-592. 92 Cf. RAOUL ARDENT, Homilia 23, in PL 155, 1391. 93 Cf. ALAIN DE LILLE, De Fide Catholica, II, in PL 210, 383-384.


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timor servilis deve tornar-se timor filialis ou initialis para a salvação94. Por outro lado, aparece o termo attritio para designar o arrependimento não suficiente para a salvação95. No início, distinguia-se a intensidade do arrependimento para saber se a alma continha em si a intenção suficiente para se confessar e satisfazer96. Depois, passou-se a distinguir, segundo as relações, entre o arrependimento e a graça justificante. A contrição é, para a alta escolástica e teologia prétridentina, a paenitentia per gratiam formata, e a atrição a paenitentia informis97. A remissão dos pecados estava relacionada com a contrição. Contudo, havia que esclarecer esta relação. Pedro de Poitiers distingue no processo de justificação quatro momentos: infusio gratiae (compreende as virtudes teologais), motus surgens ex libero arbitrio (a cooperação activa da fé e da graça no retorno a Deus), contritio e peccatorum remissio98. São Tomás de Aquino (†1274) retoma este esquema, mas junta o motus com a contritio num único duplex motus liberi arbitrii: in Deum et in peccatum99. Resta saber que efeito produz então a absolvição em relação à contrição. Guilherme d’Auvergne (†1249) é o primeiro que atribui à absolvição o efeito da passagem em que ex attritio fit contritio, atribuindo deste modo à absolvição um significado preponderante100. Contudo, a escola franciscana nega à absolvição a sua força sacramental para a remissão dos pecados e para a pena eterna. O poder sacerdotal das chaves manifesta-se per modum deprecantis absolutionem, não per modum impertientis. Alexandre de Halès (†1245) afirma que o sacerdote é um intercessor pelo pecador para pedir a graça. Em seguida, toma a atitude de chefe e juiz101. O seu poder de autoridade judiciária impõe-se ex opere operato para remir uma fracção da pena devida ao pecado102. São Boaventura ———————— 94 95 96 97 98 99

Cf. PEDRO LOMBARDO, Libri IV Sent., III, dist. 34, c. 4-6, in PL 192, 824-825. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 145. Cf. ALAIN DE LILLE, Theologicae Regulae 85, in PL 210, 665-666. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 145. Cf. PEDRO DE POITIERS, Libri V Sent., III, c. 2, in PL 211, 1044. Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh IªIIª, q. 113, a. 5: «Oportet igitur quod in iustificatione impii sit motus liberi arbitrii duplex, unus quo per desiderium tendat in Dei iustitiam; et alius quo detestetur peccatum». 100 Cf. A. TEETAERT, La Confession aux laïques, 261. 101 Cf. ALEXANDRE DE HALÈS, Summa theologica, IV, q. 21, memb. 1. 102 Cf. ALEXANDRE DE HALÈS, Summa theologica, IV, q. 21, memb. 2, a.1, resolutio: «Claves, claviumque potestas ad poenam temporalem utique se extendit, quando


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(†1274) acrescenta que o poder das chaves é justamente a reconciliação com a Igreja, visto que o pecador ofendeu não só Deus mas também a Igreja103. Essa reconciliação tem como causa a absolvição do sacerdote na forma indicativa104. No perdão divino dos pecados, o poder das chaves tem só uma causalidade dispositiva, que, no entanto, é uma verdadeira causalidade sacramental. Contudo, reafirma que a parte deprecativa da fórmula da absolvição é aquela que se refere directamente ao pecado como ofensa a Deus, realizando no penitente a paenitentia interior, que obtém o perdão divino105. Nesta sua concepção, a reconciliação com Deus e com a Igreja são exageradamente distinguidas106. Alberto Magno (†1280) ensina que a absolvição do sacerdote é a declaração autoritativa do perdão já concedido por Deus107. Insiste na mediação sacramental da remissão, mas o poder da justificação é inerente à contrição, sendo a confissão e a satisfação sinais sensíveis do arrependimento. A matéria é a contrição, e a forma é a graça, que informa a contrição. Define o sacramento da penitência como dolor informatus gratia in signis exterioribus manifestatus108. A remissão dos pecados transforma a atrição em contrição. Portanto, a absolvição depende da prévia rejeição do pecado pela contrição, consistindo na remissão de uma parte da pena109. Seguindo o plano das Sentenças de Pedro Lombardo, Alberto Magno é, na verdade, mais preciso e distingue claramente entre a excomunhão e penitência, embora as junte110. Pelo contrário, Hugo de Saint-Cher († 1263) atribui à absolvição uma verdadeira influência na remissão dos pecados. Acredita numa efi————————

quidem sacerdos virtute earum uti arbitrer in huiusmodi causa a Deo constitutus, partem poenae remittere potest». 103 Cf. BOAVENTURA, In IV Sent., dist. 15, pars 2, a. 1, q. 2; dist.17, pars 1, a. 2, q. 4. 104 Cf. BOAVENTURA, In IV Sent., dist. 17, pars 3, a. 2, q. 2, fund. 2: «Confessio ad hoc directe instituta est, ut homo reconcilietur Ecclesiae et ostendatur reconciliatus a Deo»; dist. 18, pars I, a. 2, q. 1, corollarium: «Numquam enim sacerdos absolveret quemquam, de quo non praesumeret, quod esset absolutus a Deo». 105 Cf. J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 194. 106 F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 445. 107 Cf. K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 324. 108 Cf. ALBERTO MAGNO, In IV Sent., IV, dist. 16, a. 1, solutio. 109 Cf. ALBERTO MAGNO, In IV Sent., IV, dist. 18, c. 7, solutio: «Dicendum, quod sacerdos non potest absolvere a culpa et poena aeterna, sed tantum absolvit relaxando partem poenae, nisi illo modo quo supra dictum est, quod votum clavium est in contritione habendo vim quamdam ad remissionem totius peccati». 110 Cf. F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 268.


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cácia propriamente sacramental ex opere operato, mas não explica em que modo a absolvição produz este efeito111. No século XIII, distingue-se entre os efeitos da excomunhão e do pecado. Guilherme d’Auvergne é bem explícito. A excomunhão separa da comunhão exterior, enquanto o pecado da comunhão interior112. O mesmo é dito por Alexandre de Halès113 e por Alberto Magno114. Convém precisar que, quando se trata de uma excomunhão injusta, acontece somente uma separação da comunhão visível dos fiéis, e por isso não é uma verdadeira excomunhão espiritual115. Mais precisamente, a autoridade de uma decretal de Gregório IX estabelece a distinção entre a excomunhão menor, ou penitencial, que separa dos sacramentos, e a excomunhão maior, que separa da comunidade dos fiéis116. Depois de Gregório IX, encontramos em Alexandre de Halès117 e Boaventura118 a mesma distinção que permite, pela primeira vez, a distinção clara entre o foro penitencial e o foro extra-penitencial. A jurisdição penitencial, ainda que possa ser limitada no seu exercício pela hierarquia, era na sua essência indissoluvelmente unida à ordem. A jurisdição extra-penitencial, que se exercia nomeadamente na pronúncia e levantamento das excomunhões, era pelo contrário independente da ordem. Podia-se possuí-la validamente sem ser padre. Explica-se o carácter muito particular da jurisdição penitencial no mostrar que o perdão sacramental das faltas se unia imediatamente à paixão de Cristo. Para qualificar a jurisdição

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111 Cf. HUGO DE SAINT-CHER, Super sententias, IV, in B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 147. 112 F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 271. 113 Cf. ALEXANDRE DE HALÈS, Summa theologica, IV, q. 22, memb. 1, a. 1. 114 Cf. ALBERTO MAGNO, In IV Sent., IV, dist. 18, c. 18: «Peccans mortaliter excommunicatus est quantum ad triunphantem Ecclesiam». 115 Cf. ALEXANDRE DE HALÈS, Summa theologica, IV, q. 23, a. 1: «Injuste excommunicatus separatus est a communione fidelium corporali; sed non a communione spiritualium quae sunt per se a Deo. Unde secundum veritatem et simpliciter loquendo, excommunicatio injusta non est excommunicatio». 116 X. 5, 39, 59: «Si quem, sub hac forma verborum: "Illum excommunico", vel simili, a judice suo excommunicari contigat, dicendum est eum non tantum minori, quae a perceptione sacramentorum, sed etiam maiori excommunicatione, quae a communione fidelium separat esse ligatum». 117 Cf. ALEXANDRE DE HALÈS, Summa theologica, IV, q. 20, memb. 8, a. 2. 118 Cf. BOAVENTURA, In IV Sent., dist. 19, a. 2, q. 2; a. 3, q. 1: «Juridictio est tanquam vis motiva ipsius clavis [...] ideo dico quod, etsi clavis quantum ad esse, ordinem consequatur, tamen, quantum ad exsecutionem, sequitur statum et juridictionem».


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extra-penitencial foram criados os termos de praelatio e de dignitas, assim como a expressão forum judiciale que se opõe ao forum poenitentiale119.

O primeiro autor a fazer esta distinção foi Alexandre de Halès120. Boaventura tratará o tema em termos idênticos121. Alberto Magno fala de forum causarum em vez de forum judiciale, expressão muito próxima. Insiste na ligação entre a ordem e a jurisdição penitencial. Explica que, para ter poder sobre o Corpo Místico de Cristo, é necessário ter poder sobre o seu Corpo verdadeiro122. 1.10 São Tomás de Aquino São Tomás de Aquino associa numa unidade eficaz e orgânica os factores pessoais e eclesiásticos da Penitência para garantir à absolvição a importância causal na remissão da falta123. A penitência pessoal consiste em três partes, a contrição, confissão e satisfação, que são a matéria do sacramento. A absolvição é a forma. Matéria e forma agem em conjunto como causa da remissão dos pecados. A eficácia vem so———————— 119

F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 450: «la juridiction pénitentielle, bien que pouvant être limitée dans son exercice par la hierarchie, était dans son essence indissolublement unie à l’ordre. La juridiction extra pénitentielle, qui s’exerçait notamment dans le prononcé et la levée des excommunications, était au contraire indépendante de l’ordre. On pouvair sans être prêtre la posséder validement. On expliqua le caractere três particulier de la juridiction pénitentielle en montrant que le pardon sacramentel des fautes se rattachait immédiatement à la passion du Christ. Pour qualifier la juridiction extra pénitentielle furent créés les termes de praelatio et de dignitas, ainsi que l’expression forum judiciale que l’on opposa au forum poenitentialle». 120 Cf. ALEXANDRE DE HALÈS, Summa theologica, IV, q. 20, memb. 8, a. 1: «Ad hoc quod minister harum clavium sit reconciliator, oportet quod habeat posse conficiendi Corpus Christi mysticum cujus caput est ipse Christus...ad illud quod objicitur de Archidiaconis et Legatis dicendum quod datur clavis ministris Ecclesiae habentibus ordinem et habentibus dignitatem [...] Unde Mt. XVI, dictum est Petro: Tibi dabo claves [...] Petrus habuit ordinem et dignitatem [...] clavis habet duplex officium; est solvere et ligare in foro poenitentiae et hoc convenit presbyteris tantum; est iterum solvere et ligare in foro judiciali; et sic habentium dignitatem et primo episcoporum et hos in ordine primo illius qui vicem Petri gerit [...] injungere poenitentiam et relaxare aliquid de debita poena non potest alius nisi sacerdos: iste autem usus descendit a passione Christi in sacramentum ordinis sacerdotalis». Em outras partes da Summa, Alexandre de Halès realça mais nitidamente esta distinção e a sua ligação à ordem: Summa theologica, IV, q. 22, memb. 1, a. 4; q. 21, memb. 4. 121 Cf. BOAVENTURA, In IV Sent., dist. 18, q. 3, 2. 122 Cf. ALBERTO MAGNO, In IV Sent., dist. 17, c. 39. 123 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 148-160.


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bretudo da forma, enquanto que a significatio, função do sinal, ex parte materiae principaliter124. A absolvição do sacerdote tem o mesmo poder efectivo de remitir a falta que a fórmula do baptismo125. No processo de justificação, apresenta três momentos: infusio gratiae, duplex motus liberi arbitrii in Deum et in peccatum e a peccatorum remissio. Estes três momentos condicionam-se mutuamente. A graça – causa formal – torna possível o movimento da vontade para Deus e o afastamento do pecado. A fé e a contrição, por sua vez, são a disposição subjectiva para a recepção da graça – causa material. A graça é assim causa formal da remissão dos pecados, mas não pode entrar sem o afastamento do pecado126. A absolvição é causa instrumentalis do motus liberi arbitrii, a contrição. A contrição, como res et sacramentum, paenitentia interior é «res exterior paenitentiae, ut significata tantum per actus paenitentis, ut significata autem et causata per actus eosdem adjuncta absolutione ministri»127. A contrição recebe a efficacia operandi realmente da paenitentia exterior e especialmente da absolvição128. Contudo, a absolvição não substitui a ausência de contrição. O ———————— 124

Cf. TOMÁS DE AQUINO, In IV Sent., dist. 22, q. 2, a. 1, qc. 2, sol. 2: «Praeterea, illud quod immediate causat effectum sacramenti, est res exterioris sacramenti, sicut patet de charactere. Sed poenitentia interior est quae immediate causat remissionem peccatorum, quae est ultima res hujus sacramenti»; STh III, q. 86, a. 6, ad. 3: «Ad tertium dicendum quod ad passionem Christi ordinatur actus poenitentiae virtutis et per fidem et per ordinem ad claves Ecclesiae. Et ideo utroque modo causat remissionem culpae virtute passionis Christi». 125 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh IIIª, q. 84, a.3, ad. 5: «Unde sicut sacerdos, baptizando aliquem, ostendit hominem interius ablutum per verba et facta, non solum significative, sed etiam effective; ita etiam cum dicit, ego te absolvo, ostendit hominem absolutum non solum significative, sed etiam effective». 126 Cf. TOMÁS DE AQUINO, In IV Sent., dist. 17, q. 1, a. 4, qc. 1, sol. 1-2: «Sed contra est, quia causa naturaliter praecedit effectum. Sed infusio gratiae est causa remissionis culpae, quia infundendo gratiam Deus peccata remittit. Ergo infusio gratiae praecedit. Praeterea, Ambrosius dicit, quod perfecta virtus in animam intrans, iniquitatem tollit. Sed prius est unumquodque naturaliter quam agat. Ergo prius est virtus et gratia, quam peccatum tollat». 127 Cf. TOMÁS DE AQUINO, In IV Sent., dist. 22, q. 2, a. 1, qc. 2; K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 326: «Ma allora, contrariamente alle parole, presso Tommaso resta libero il posto di res et sacramentum: o non esiste in quanto realmente distinguibile, oppure dev’essere qualcosa d’altro che la poenitentia interior. E ciò è anche più conforme al fatto che nella Summa Tommaso sembra aver renunciato alla concezione dispositiva dell’efficacia della grazia propria dei sacramenti a favore di una concezione strumentale-effetiva». 128 Cf. TOMÁS DE AQUINO, In IV Sent., dist. 22, q. 2, a. 1, qc. 2, ad 1.


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sacerdote não deve absolver o penitente se não vê os signa contritionis129. Uma absolvição sem contrição é impossível. Tomás de Aquino mantém o princípio do poder eclesiástico de remitir os pecados, e exige absolutamente a versão indicativa da absolvição130. Se, por um lado, o penitente deve ter um tal arrependimento que faz valer o poder das chaves antecipadamente, por outro lado não se exclui a ausência de arrependimento in bona fide. Deve tratar-se de uma aversão ao pecado que não opõe obstáculos e assim pela graça da justificação a attritio fit contritio131. Também para São Tomás, o cristão que pecou gravemente pertence ao Corpo de Cristo só potentialiter, imperfecte, não merito, mas somente numero132. Deste modo, um dos efeitos do sacramento da penitência é a reconciliação do pecador com a Igreja. 1.10.1 O ministro da confissão e os casos reservados A confissão é condição para o exercício do poder das chaves, indispensável para a salvação do pecador culpável de pecados graves ou veniais. O sacerdote é o único ministro da confissão133, mas, além da ordem, deve ter o poder de jurisdição sobre o penitente, a fim de lhe impor os actos necessários para a matéria do sacramento134. O poder das chaves é conferido pela ordenação como potência. Para o usus ou executio desse poder, o sacerdote necessita de uma matéria que é o povo de Deus135. Por isso, os sacerdotes cismáticos ou hereges não podem ———————— 129 130 131

Cf. TOMÁS DE AQUINO, De formula absolutionis, 2, 7 e 3, 8. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 153. Cf. TOMÁS DE AQUINO, In IV Sent., dist. 22, q. 2, a. 1, sol. 3; K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 325-326. 132 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh IIIª, q. 8, a. 3, ad. 2: «Sunt tamen quaedam, scilicet mortalia, quibus carent illi qui sunt membra Christi per actualem unionem caritatis. Qui vero his peccatis subduntur, non sunt membra Christi actualiter, sed potentialiter, nisi forte imperfecte, per fidem informem, quae unit Christo secundum quid et non simpliciter ut scilicet per Christum homo assequatur vitam gratiae». O mesmo se repete em: TOMÁS DE AQUINO, In IV Sent., dist. 16, q. 1, a. 2, qc. 5. 133 Cf. TOMÁS DE AQUINO, In IV Sent., dist. 17, q. 3, a. 3, qc. 1, s.c. 1: «Sed contra, absolutio poenitentis, propter quam fit confessio, non pertinet nisi ad sacerdotes, quibus claves Ecclesiae commissae sunt. Ergo confessio debet fieri sacerdoti». 134 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 8, a. 4. 135 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 17, a. 2, ad 2: «Sed executio clavis indiget materia debita, quae est plebs subdita per iurisditionem. Et ideo, antequam iurisditionem habeat, habeat claves, sed non habet actum clavium»; F. WALKER VICUÑA, La Faculdad para confessar, 23, n. 71.


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exercitar por falta de matéria136. Contudo, em perigo de morte, o sacerdote pode absolver, porque a Igreja lhe dá jurisdição. A necessidade de jurisdição deve-se ao carácter judicial do sacramento137. A jurisdição não é o uso de uma competência que já se tem. Trata-se de um novo poder, um imperium que é dado ao sacerdote138, de regulamentar o uso daquele recebido na ordenação139. Contudo, em caso de necessidade, um leigo pode substituir um padre140. São Tomás apresenta isso como um dever, conforme as circunstâncias. Esta doutrina explica-se pelo contexto da época, é difícil de concordar com a teologia do sacramento, e não é retomada pela teologia posterior141. Portanto, em virtude do poder de ordem, o sacerdote pode confessar todos os pecados. Mas para o exercício desse poder exige-se o poder de jurisdição. Por isso, um superior pode reservar a si alguns casos, mas munido da jurisdição o simples sacerdote pode absolver. São Tomás refere cinco casos em que o sacerdote deve reenviar o penitente a um prelado superior: quando se trata de impor uma penitência solene, visto que o ministro próprio dessa é o Bispo; quando se trata de excomungados, que não podem ser absolvidos por um sacerdote inferior; quando o penitente está sujeito a uma irregularidade cuja dispensa é reservada ao superior; quando se trata de incendiários; e quando numa Diocese existe o costume de reservar ao Bispo os delitos enormes, ad terrorem. Nestes casos, o costume dá ou tira a jurisdição142. São Tomás distingue já entre a jurisdição imediata, que têm o Papa, os Bispos e o proprius sacerdos e a jurisdição conferida. Ao referir-se à jurisdição da cura de almas, afirma que existem dois modos de conferi-la: ou por substituição do superior ou como coadjutor. Distingue nestes casos uma hierarquia de obediência. É interessante notar que o penitenciário é tomado como exemplo de substituição do Bispo ou do Papa, e a este se deve obediência na confissão. Deste modo, o penitenciário ———————— 136

Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 19, a. 6: «clavium potestas quantum ad essentiam, sed usus impeditur ex defectu materiae». 137 Cf. TOMÁS DE AQUINO, In IV Sent., dist. 19, q. 1, a. 3. 138 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 8, a. 4, ad. 2; F. WALKER VICUÑA, La Faculdad para confessar, 24. 139 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 20, a. 1, ad. 1. 140 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 8, a. 4, ad. 5; q. 9, a. 3, ad. 3. 141 Cf. A. TEETAERT, La Confession aux laïques, 325-329. 142 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 20, a. 2.


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do Papa é mais importante no âmbito da confissão que um Bispo, e o penitenciário do Bispo é mais importante que um pároco143. Finalmente, São Tomás distingue o foro penitencial do foro contencioso. Segue o seu mestre sem grandes modificações. No seu comentário das Sentenças, de Pedro Lombardo, ele separa na distinção 18 a excomunhão (q.2) da dimensão penitencial (q.1)144. Na absolvição dos pecados, o sacerdote exerce a clavis ordinis. Na imposição ou absolvição da excomunhão, o superior exerce a clavis iurisdictionis in foro causarum, que é imprópria145. A excomunhão não diz respeito à graça146. São Tomás distingue também entre excomunhão maior e menor. A excomunhão é de ordem disciplinar exterior, mas tem um efeito espiritual, visto que separa da protecção que Deus proporciona aos membros da Igreja, o aditum coeli147. 1.11 A escola tomista Tomás de Aquino teve o mérito de colocar o sacramento da penitência no processo de justificação e de evidenciar que o mesmo é causa indispensável da remissão dos pecados. No entanto, o motivo da unidade do sacramento e da penitência pessoal provocou consideráveis dificuldades. Os seus discípulos colocam-se na linha de uma autêntica evolução. Um primeiro problema coloca-se na questão de como a paenitentia interior, acto subjectivo, possa ser o efeito objectivo do sinal exterior. Bernard de Clermont (†1300), Hervé de Nédellec (†1323), Pierre de la Palou (†1343) tentam a solução ao separar o ornatus, efeito objectivo do sinal exterior, da paenitentia interior. Trata-se de uma disposição física para a remissão dos pecados, intervindo sempre, mesmo quando, com a ausência da disposição interior, a contrição impede a verdadeira ———————— 143 Cf. TOMÁS DE AQUINO, In IV Sent., dist. 17 q. 3 a. 3 qc. 5 ad 3: «Sed si superior committat, qui et principalior est, dupliciter potest committere. Aut ita quod eum vice sui constituat, sicut Papa et episcopus suos poenitentiarios constituunt; et tunc talis est principalior quam inferior praelatus, sicut poenitentiarius Papae quam episcopus, et poenitentiarius episcopi quam sacerdos parochialis; et magis tenetur ei confitens obedire. Alio modo ut eum coadjutorem illius sacerdotis constituat; et quia coadjutor ordinatur ad eum cui coadjutor datur, ideo adjutor est minus principalis; et ideo poenitens non tantum obedire tenetur ei quantum proprio sacerdoti». 144 Cf. F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 277-278. 145 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 19, a. 3; q. 22, a.1. 146 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 22, a. 2. 147 Cf. TOMÁS DE AQUINO, STh., Suppl., q. 21, a. 1-2.


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remissão. Esta teoria manteve-se durante os séculos XIV e XV. Durand de Saint-Pourçain (†1332) define o ornatus como pura adinventio, e no século XV Capreolus como gratia sacramentalis148. Silvestre de Ferrara (†1528) acaba com esta doutrina. Caetano (†1534) foi mais eficaz ao afirmar que São Tomás tinha abandonado a teoria da causalidade dispositiva dos sacramentos, em favor de que estes produziam directamente a graça. A paenitentia interior mantém-se deste modo como res et sacramentum. Todos os tomistas exigiam como São Tomás a contrição para a remissão dos pecados e exigiam ao confessor que não desse a absolvição quando o penitente não estivesse contrito. No entanto, distinguem entre uma atrição superior, que dispõe para a graça, seguida de uma atrição inferior, suficiente para uma confessio informis e uma atrição mínima, mas ineficaz149. Caetano distingue entre uma contritio informis como o grau superior da atrição, que é informada pela graça, e uma contritio formata, que é obra exclusiva de Deus. Deste modo, Caetano distingue, na contrição, o acto e o habitus da caridade e prepara a distinção entre atrição e contrição como actos pessoais não informados pela graça, superando deste modo uma série de complicações da teologia escolástica penitencial. Portanto, não existe perdão sem contrição, sem o arrependimento por amor de Deus, o motus in Deum, segundo a concepção escolástica150. Francisco de Vitória (†1546) defendia a eficácia da absolvição por um pecador só com a atrição. Os seus discípulos, Melchior Cano e Domingos Soto, seguem a mesma ideia. Todos concordam em que a absolvição transforma a atrição em contrição, por habitus da graça. ———————— 148 149 150

Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 157-158. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 158-159. Cf. T. CAJETANUS, Opuscula, I, tr. 4, q. 1, 68-69: «Quaeritur primo an attritio possit fieri contritio. Videtur enim quod non. Tum quia contritio et attritio differunt penes principia: quoniam contritio est a charitate, attritio autem est a voluntate sine charitate. [...] Aliter ego dicendum mihi videtur, quod gratuita Dei motio est, quae huiusmodi acquisitam contritionem efficit ultimam dispositionem ad gratiam seu charitatem: ita quod ex hoc ipso, quod Deus non per aliquod superadditum donum habituale sed per gratuitam dilectionem, qua dignatur uti nostra acquisita contritione: ut dispositione ultima ad suum proprium opus, quod est charitas, quae infunditur, transfertur nostra contritio in fore ultimam dispositionem pro gratia habituali: iuxta illud Hiere. Ad Deum postquam convertisti me, poenitentiam egi. [...] Et propterea sicut actus fidei informis potest in sui prosequutione formari charitate, ita actus acquisitae contritionis potest superveniente charitate imperfectionem suae informitatis deferere et formatus continuari».


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Contudo, para os teólogos espanhóis, a eficácia sacramental dá-se com a contrição, e é incompatível com o sacramento. Paenitentia e contritio são assim uma via de justificação paralela à do sacramento. Tal contradiz os anteriores que defendem que a remissão dos pecados é um efeito sacramental, na fidelidade a Tomás de Aquino151. 1.12 Duns Escoto Em Duns Escoto (†1308) a absolvição realiza-se com a attritio, uma pré-condição puramente moral, a infusão da graça justificante, que não depende da contritio152. Duns Escoto apresenta o conceito de peccatum habituale, estado de alma consecutivo à acção culpável. Trata-se de uma ordinatio ad poenam, uma espécie de reatus153. Portanto, a remissão dos pecatos consiste no levantamento do reatus. Deus remete o pecado por livre amor e pode fazê-lo sem cooperação do pecador. Cada culpa ordinatur per poenam, por isso a penitência é volitio poenae154. No entanto, o que é mais importante é a aflição espiritual, a tristitia155. A contrição, como causa propria tristitiae interioris, é identificada com a penitência. A atrição é o arrependimento sem a informação da graça. O acto de arrependimento é o motus, qui prius fuit attritio, in illo instanti infusionis gratiae fit contritio156. Ao contrário de São Tomás, para o qual a atrição era preparação da penitência, Escoto apresenta-a como verdadeiro arrependimento. Na atrição, o homem pode chegar à perfeição moral, desde que seja suscitado pelo amor de Deus. Portanto, dispõe-se para a justificação e merece-a. A fragilidade desta doutrina está no facto de que Escoto aceita um arrependimento puramente natural, sem o auxílio da graça, um aproximação ao semipelagianismo157. Ao contrário de São Tomás, que integra o arrependimento no sacramento da penitência, Duns Escoto apresenta dois caminhos de salvação: um extra-sacramental, pelo qual a atrição merece, de congruo, a ———————— 151 152 153 154 155

Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 158-160. Cf. K. RAHNER, «Sacramento della Penitenza», 325. Cf. D. ESCOTO, Ordinatio, IV, dist. 14, q. 1, n. 7. Cf. D. ESCOTO, Reportatio, IV, dist. 14, q. 1, n. 8. Cf. D. ESCOTO, Ordinatio, IV, dist. 14, q. 1, n. 2; q. 1, n. 15, 18: «Poenitere est detestari vel odire peccatum a se commissum vel displicentiam habere de hoc peccato a se commisso» 156 Cf. D. ESCOTO, Ordinatio, IV, dist. 14, q. 2, n. 14. 157 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 161-162.


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justificação, e outro sacramental, que produz a justificação ex opere operato. Por isso, o arrependimento age por si mesmo e o sacramento apenas aumenta a graça158. O sacramento é uma via mais fácil e segura, a força do sacramento ex pacto Dei substitui o mérito, não dependendo do nível de arrependimento159. O sacramento da penitência consiste somente na absolvição160. O arrependimento, a confissão e a satisfação são disposições necessárias ao sacramento, mas não parte deste161. Consequentemente, a confissão aos leigos é completamente rejeitada162. O sacramento é causa verdadeira da justificação163. Na separação entre penitência-virtude e penitência-sacramento, a absolvição adquire um campo próprio. Contudo, nesta doutrina Escoto esquece a ideia da doutrina antiga, em que o principal fim do sacramento é a pax Ecclesiae164. A concepção de Duns Escoto favorece uma dimensão individualista do pecado e da justificação. A acentuação da dimensão jurídica levou a esquecer que a reconciliação com a Igreja é um efeito do sacramento da penitência. Na medida em que se realçava que os pecadores são verdadeiros membros da Igreja contra as teorias de Wyclif, Hus e dos reformadores, esqueceu-se de que os pecadores são membros imperfeitos da Igreja e que, por isso, no sacramento da penitência realiza-se a reconciliação com Deus e com a Igreja165. 1.13 As escolas escotista e nominalista Na escola escotista destaca-se Durand de Saint-Pourçain, para o qual pecado e pena coincidem166. A remissão dos pecados é uma não imputação da punição167. A justificação dá-se em dois actos simultâneos: o ———————— 158 159 160

Cf. D. ESCOTO, Ordinatio, IV, dist. 14, q. 4, n. 9. Cf. D. ESCOTO, Ordinatio, IV, dist. 14, q. 4, n. 7. Cf. D. ESCOTO, Ordinatio, IV, dist. 14, q. 4, n. 3: «Paenitentia est absolutio, id est, quaedam sententia definitiva absolvens reum». 161 Cf. D. ESCOTO, Ordinatio,IV, dist. 16, q. 1, n. 7. 162 Cf. D. ESCOTO, Ordinatio,IV, dist. 14, q. 4, n. 5. 163 Cf. D. ESCOTO, Ordinatio,IV, dist. 19, q. 1, n. 23: «Dispositio efficax necessaria ex statuti divino ad gratiae susceptionem». 164 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 164-165. 165 Cf. J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 195. 166 Cf. DURAND DE SAINT-POURÇAIN, Sententias Theologicas, IV, dist. 17, q. 7, n. 5, 10, 14. 167 Cf. DURAND DE SAINT-POURÇAIN, Sententias Theologicas, IV, dist. 14, q. 5, ad 2: «Item peccatum non potest dimitti quantum ad culpam quae transit, sed solum


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motus liberi arbitrii (contrição) e a infusio gratiae168. Distingue atrição e contrição, em relação à graça e segundo os motivos do arrependimento e do amor169. O sacramento da penitência transforma o arrependimento insuficiente em suficiente170. Admite que a justificação intervenha antes da recepção da penitência, como Tomás de Aquino171. Este sacramento é constituído pela matéria, actos visíveis do penitente, e forma, absolvição. Mas o arrependimento e a satisfação não fazem parte do mesmo172. O sacramento é simples conditio sine qua non confertur gratia173. Também a doutrina dos nominalistas, representada por Gabriel Biel e Guilherme de Ockham, é determinada por Duns Escoto. A penitência é exigida por Deus e consiste no detestar o pecado, porque é ofensa a Deus, quer seja contrição ou atrição. A essência do sacramento é a absolvição, mas como a contrição origina já a remissão dos pecados, o sacramento esvazia-se de substância própria174. A absolvição não remite, mas indica o resgate já cumprido, aumenta a graça, mas não a confere175. O poder das chaves dá-se in foro Ecclesiae, e a sacramentalidade é salvaguardada pelo desiderium sacramenti. Contudo, nem todos os nominalistas professam este contricionismo, como Jean Gerson (†1429). Esta doutrina acaba por ser um perigo para a doutrina da necessidade do arrependimento e da eficácia do poder das chaves176. ————————

quantum ad reatum qui remanet. Sed reatus per sacramentum poenitentiae non remittitur, cum poena pro eo iniungatur, ergo effectus poenitentiae non est remissio peccatorum». 168 Cf. DURAND DE SAINT-POURÇAIN, Sententias Theologicas, IV, dist. 17, q. 1, n. 7, 8. 169 Cf. DURAND DE SAINT-POURÇAIN, Sententias Theologicas, IV, dist. 17, q. 2, n. 5. 170 Cf. DURAND DE SAINT-POURÇAIN, Sententias Theologicas, IV, dist. 18, q. 2. 171 Cf. DURAND DE SAINT-POURÇAIN, Sententias Theologicas, IV, dist. 17, q. 2, n. 6; dist. 18, q. 2, n. 6s. 172 Cf. DURAND DE SAINT-POURÇAIN, Sententias Theologicas, IV, dist. 16, q. 1. 173 Cf. DURAND DE SAINT-POURÇAIN, Sententias Theologicas, IV, dist. 17, q. 7, n. 5, 10, 14. 174 Cf. GUILHERME DE OCKHAM, In IV Sent., q. 10, 218, 10 (dist. 9 Q): «Quamvis Deus de potentia sua absoluta posset sic iustificare impium sine omni bono motu voluntatis et sine contritione vel attritione de peccatis»; q. 10, 226, 11 (dist. 9 T): «Praeterea, poenitentia non est nisi ad deletionem culpae, sed absolutio sacramentalis non delet culpam». 175 Cf. GUILHERME DE OCKHAM, In IV Sent., q. 10, 226, 16 (dist. 9 T): «Ad aliud dico quod poenitentia est ad augmentum gratiae per se, non autem ad expulsionem culpae». 176 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 165-168.


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1.14 Síntese A doutrina de Tomás de Aquino em que o sacramento opera a remissão dos pecados impôs-se universalmente. O pleno efeito da absolvição sacramental foi afirmado em absoluto. Duns Escoto acentua ainda mais a sua eficácia sacramental. Em relação à justificação, os tomistas defendem a doutrina da via única da justificação, em que o sacramento da penitência é indispensável, por meio de teorias complexas. Escoto e a respectiva escola distinguem duas vias, em que o sacramento é importante, porque mais fácil e seguro. A atrição é a disposição suficiente para o sacramento. A tendência da evolução afasta-se visivelmente de São Tomás. Toda esta problemática tornou-se terreno fértil para a luta dos reformadores contra o sacramento177. No entanto, a doutrina da escolástica medieval conseguiu estabelecer três dualismos que serão fundamentais no que diz respeito ao ministro do sacramento da penitência: privado e público, ontológico e disciplinar, sacramental e jurisdicional178. Ao aprofundar a questão do poder das chaves, os teólogos medievais conseguiram distinguir duas manifestações: a penitência e a excomunhão, práticas nitidamente distintas, mas inter-relacionadas. Um segundo avanço fundamental foi a distinção entre o poder de ordem e de jurisdição, base importante para a legislação concomitante e sucessiva da celebração do sacramento da penitência. Toda a problemática das Ordens Mendicantes só será solucionada tendo em conta esta distinção. Uma terceira dimensão elaborada foi a da distinção entre o foro penitencial e o foro judicial. Se, para a Igreja primitiva, um pecador era um excomungado, para a Igreja da penitência privada, esse princípio era insustentável. Só a penitência está ligada ao poder de ordem, no sentido forte dos seus efeitos sacramentais e ontológicos. A excomunhão está ligada mais aos efeitos exteriores e disciplinares, de ordem judicial. Somente com estas distinções é possível perceber a função do penitenciário. Note-se que o direito canónico assume plena autonomia em relação à teologia, o que ajudou a estabelecer estas delimitações, embora disciplina e doutrina se influenciem mutuamente.

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Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 168. Cf. F. RUSSO, «Pénitence et excommunication», 456-459.


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2. Legislação dos séculos XI-XII A legislação eclesial não reflecte toda a complexidade da reflexão escolática, mas é por essa influenciada. Destacaremos aquilo que se refere ao ministro da penitência e à sua jurisdição. Neste caso, desenvolve-se a problemática relativa ao proprius sacerdos e aos outros ministros da penitência, especialmente das ordens mendicantes. Chega-se a aceitar a confissão aos leigos e diáconos. Paralelamente, surgem os casos dos pecados reservados. Nesta dinâmica e tensão entre a jurisdição ou faculdade para confessar e os casos reservados ao poder episcopal, começa-se a delinear a figura do penitenciário. 2.1 Concílios de Piacenza e de Clermont (1095) O Concílio de Piacenza, convocado por Urbano II a 7 de Março de 1095, pretendia reafirmar o programa da reforma gregoriana e expor os perigos da Igreja Grega e da Igreja Latina do Oriente. Estabeleceram-se vários cânones para a reforma dos costumes e a luta contra as heresias. No que diz respeito à penitência, proibia-se admitir a este sacramento quem não renunciasse ao concubinato, ao rancor e a qualquer pecado mortal. Os sacerdotes somente podiam confessar os fiéis por encargo do Bispo179. Depois do Concílio de Piacenza, Urbano II decidiu promover a expedição contra os infiéis para libertar o sepulcro de Cristo. O Papa convocou então o Concílio de Clermont, realizado entre 18 e 28 de Novembro de 1095. Foram confirmadas as decisões de Piacenza. Os 33 cânones que chegaram até nós foram reconstruídos180. Confirma-se no cânon 18 que os sacerdotes capelães somente podiam confessar por concessão do Bispo181. 2.2 Concílio de Londres (1102) Este Concílio realiza-se num dos momentos mais cruciais da luta de investiduras em Inglaterra, a 29 de Setembro de 1102. Presidiu-o Santo Anselmo de Cantuária. Foram emanados 29 cânones sobre a reforma interna da Igreja, a moralidade do clero e do povo, e a disciplina ecle————————

179 Cf. CONC. DE PIACENZA (1095), in Mansi 20, 803: «ut nullus presbyter sine licentia episcopi aliquos ad paenitentiam recipiat». 180 Cf. M. BELARDINELLI, «Clermont», 293-295. 181 Cf. CONC. DE CLERMONT (1095), in Mansi 20, 817: «ut nullus presbyter capellanus alicuius laici esse possit in (forte absque concessione) confessione sui episcopi».


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siástica. Alguns destes cânones, que conhecemos sumariamente, não foram aplicados na íntegra182. No que diz respeito à penitência, este Concílio submete o poder dos monges à autorização dos abades e o poder dos abades só às pessoas sobre as quais têm jurisdição183. O mesmo Concílio proclama a competência única do Bispo em absolver o pecado de sodomia cometido publicamente. Enquanto que para os eclesiásticos estava prevista a deposição, para os civis fala-se de exclusão dos direitos civis184. Portanto, trata-se de penitência pública para os pecadores públicos. Segundo Poschmann, é o primeiro caso de uma reserva episcopal185. 2.3 Concílios de Clermont (1130) e de Latrão II (1139) e a reserva papal O Concílio de Clermont celebrado a 18 de Novembro de 1130 foi presidido por Inocêncio II, para condenar o cisma do antipapa Anacleto. Aí encontrou o Pontífice um forte apoio do clero francês. Procurou-se promover a reforma dos costumes e com esse objectivo foram redigidos 13 cânones. De acordo com o cânon 10, é excomungado quem aplicar a violência para com um padre ou uma monja186. Trata-se possivelmente da primeira reserva papal sob o aspecto penal e não sacramental. Parece que foi propriamente para evitar abusos e para não se sobrepor à autoridade episcopal que, nos inícios do século XII, se chega a definir os casos de “reserva directa”, pelos quais o recurso ao papa se torna automático: incesto, homicídio, estupro, sacrilégio, parricídio, sodomia, assassínio de um clérigo, simonia187.

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Cf. G. CERAFOGLI, «Londra», 318-320. Cf. CONC. DE LONDRES (1102), can. 18, in Mansi 20, 1151-1152. Cf. CONC. DE LONDRES (1102), can. 28, in Mansi 20, 1152: «Sodomiticum flagitium facientes, et eos in hoc voluntarie juvantes, in hoc eodem concilio gravi anathemate damnati sunt: donec poenitentia et confessione absolutionem mereantur [...] Et ne huius absolutionem, his qui se sub regula vivere non voverunt, aliquis nisi episcopus deinceps facere praesumat». 185 Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 128. 186 Cf. CONC. DE CLERMONT (1130), can. 10, in Mansi 21, 439. Poschmann afirma que se trata do primeiro caso de uma reserva papal. Contudo, temos dúvidas, visto que essa reserva papal explícita só se encontra no Concílio de Latrão II, can. 15, que retoma o can. 10 de Clermont, mas acrescenta-lhe na parte final a reserva papal (não existente em Clermont). Possivelmente, terá sido o can. 15 de Latrão II o primeiro caso de reserva papal. Cf. B. POSCHMANN, Pénitence et onction des malades, 128; J. GAUDEMET, Storia del diritto canonico, 549. 187 J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 37: «Sembra che fu proprio per evitare gli


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O Concílio ecuménico de Latrão II (1139) insiste no facto de que só faz verdadeira penitência quem se afasta de todos os pecados e não comete mais nenhum188. Retoma no cânon 15 a mesma reserva do Concílio de Clermont a quem tivesse tratado de modo violento um eclesiástico ou religioso189. O culpável devia apresentar-se diante da Corte Papal antes de poder ser admitido, excepto em caso de iminente perigo de morte. Notem-se as semelhanças: Conc. de Clermont (1130), can. 10: Item placuit, ut si quis suadente diabolo huius sacrilegi reatum incurrit, quod in clericum vel monachum violentas manus injecerit, anathemati subjaceat. Quod qui fecerit, excommunicetur. Conc. de Latrão II (1139), can. 15: Item placuit, ut si quis suadente diabolo huius sacrilegi reatum incurrit, quod in clericum vel monachum violentas manus injecerit, anathematis vinculo subjaceat: et nullus episcoporum illum praesumat absolvere, nisi mortis urgente periculo; donec apostolico conspectui praesentetur, et eius mandatum suscipiat.

Este último cânon foi retomado no Decreto de Graciano190. No entanto, segundo um estudo realizado, o alcance de aplicação desta reserva terá sido diminuto. As atenuantes para que não se recorresse ao Papa tornam-se uma prática nos tribunais regionais da Europa, talvez porque o Papa delegava certos poderes aos arcebispos e aos legados a latere. Os tribunais tendiam a não observar certas regras mais severas do direito canónico191. 2.4 Constituições sinodais de Odão de Paris (1197 ca.) As constituições sinodais de Odão, Bispo de Paris, são um documento de fundamental importância, não só porque tratam com relativa amplitude os sacramentos, mas também pela influência em documentos magisteriais análogos. O quarto sacramento a ser tratado é a confissão. O termo penitência é substituído pelo de confissão, uma acen————————

abusi e per non sovrapporsi all’autorità episcopale che, all’inizio del XII secolo, si arriva a definire i casi di “riserva diretta” per i quali il ricorso al papa divenne automatico: incesto, omicidio, stupro, sacrilegio, parricidio, sodomia, assassinio del chierico, simonia». 188 Cf. CONC. DE LATRÃO II (1139), can. 22, in Mansi 21, 531-532. 189 Cf. CONC. DE LATRÃO II (1139), can. 15, in Mansi 21, 530. Este texto é retomado no Decreto de Graciano: C. 17, q. 4, c. 19. 190 Cf. C. 17, q. 4, c. 29. 191 Cf. J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 39; R. HELMHOLZ, «Si quis suadente», 435-438.


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tuação da acusação dos pecados por parte do penitente com a relativa importância da escuta da parte do ministro. A palavra penitência agora é usada mas em sentido estrito. Os primeiros capítulos realçam o carácter pastoral, como as qualidades requeridas no confessor e a sua necessária preparação192. Em seguida, Odão elenca os pecados mais graves: homicídio, sacrilégio, pecado contra a natureza, violação das virgens e das monjas, violência física aos clérigos e aos pais, violação dos votos e outros semelhantes. A absolvição destes era reservada ao bispo ou ao seu penitenciário. Eram exclusivamente absolvidos pelo Romano Pontífice ou pelo seu vigário os pecados de violência física aos clérigos ou religiosos, o incêndio das igrejas e a simonia. Nestes casos, era o Bispo a fazer o pedido de absolvição. Nos casos duvidosos, o confessor consultava o Bispo ou homens sábios, excepto em caso de necessidade; recebido o seu conselho, podia dar ou negar a absolvição193. Odão ateve-se às fontes precedentes, entre as quais o Concílio de Piacenza e Pedro Lombardo, que explica a necessidade de um prévio consenso da parte do próprio sacerdote194. Alain de Lille (1128-1202) confirma este princípio ao declarar que nenhum sacerdote pode confessar um fiel sujeito à jurisdição de um outro pároco, mas deve enviá-lo ao próprio pároco195. ———————— 192 193

Cf. A. CARPIN, «La confessione tra il XII e il XIII secolo», 19-22. Cf. ODÃO DE PARIS, Synodicae Constitutiones, cap. VI, 5-7, in Mansi 22, 678: «Sacerdotes majora resevent majoribus in confessionibus, sicut homicidia, sacrilegia, peccata contra naturam, incestum et stupra virginum, injectiones manuum in parentes, vota fracta, et huiusmodi. Sunt tria in quibus nullus habet potestatem absolvendi, nisi dominus papa vel eius vicarius, nisi in necessitate; scilicet in injectione manuum in clericos vel quosvis religiosos, in incendio, per quam sententiam sunt vocati simoniaci: nihilo minus tamen talium rei remittenti ad episcopum. In dubiis semper confessor consulat episcopum aut sapientes viros, nisi ex necessitate; quorum consilio certificatus, solvat securius aut liget, maxime prelatos suos». 194 Cf. P. LOMBARDO, Libri IV Sent., dist. 21, 7, in PL 192, 897: «Quod verum dictum est, ut poenitens eligat sacerdotem scientem ligare et solvere, videtur contrarium ei quod in canonibus reperitur. ut nemo scilicet, alterius parochianum praesumat. Sed aliud est favore vel odio proprium sacerdotem contemnere, quod canones prohibent; alium caecum vitare, quod Urbanus facere monet, ne si caecus caecum ducat, ambo in foveam cadant. Ait enim Urbanus II, 16, q.1: Placuit ut nulli sacerdotum deinceps liceat quemlibet commissum alteri sacerdoti ad poenitentiam suscipere, sine eius consensu cui se prius commisit, nisi pro ignorantia illius cui prius confessus est. Qui vero contra hoc facere tentaverit, gradus sui periculo subjacebit». 195 Cf. ALAIN DE LILLE, Liber Poenitentialis, in PL 210, 299.


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2.5 Concílio de York (1195) O concílio de York, presidido em 1195 por Hubert Walter, Arcebispo de Cantuária e legado do Papa Celestino III estabeleceu alguns cânones relativos à penitência. Proibiu aos sacerdotes imporem aos leigos como penitência a celebração da missa, para evitar a suspeita de ganho por parte do sacerdote celebrante196. Proíbe os diáconos de administrar a penitência, mas admite que em caso de extrema gravidade e urgência o diácono possa administrar a penitência aos doentes graves197. Dispõe que a absolvição do pecado de perjúrio fosse reservada ao Bispo ou na sua ausência ao confessor geral da diocese. Em perigo de morte, dever-se-ia enunciar ao penitente somente a satisfação sem a impor, relembrando ao penitente a obrigação de em caso de cura se dirigir ao Arcebispo, Bispo ou ao confessor geral da Diocese para receber a penitência que deveria satisfazer imediatamente198. 3. Legislação do início do século XIII 3.1 Concílios anónimos (início do século XIII) Trata-se de um concílio de lugar e data incertos, mas seguramente do início do século XIII199. Depois de especificar que o sacerdote que pecou deverá confessar-se antes de celebrar a Eucaristia, o Concílio estabelece que o sacerdote possa escolher entre vários sacerdotes, alargando a restrição jurisdicional prevista para os leigos, por razões de ordem pastoral e para possibilitar a sua liberdade de escolha. Neste contexto, aparecem os penitenciários: Cada sacerdote, com o consenso do próprio arcebispo ou bispo, tenha o próprio confessor, e que em cada capítulo existam dois sacerdotes constituídos pelo arcebispo ou pelo bispo como confessores dos sacerdotes. No caso em que um sacerdote, por qualquer motivo, não queira confes-

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Cf. CONC. DE YORK (1195), can. 3, in Mansi 22, 653. Cf. CONC. DE YORK (1195), can. 4, in Mansi 22, 653. Cf. CONC. DE YORK (1195), can. 11, in Mansi 22, 655: «Si vero de pejurio poeniteant, ad archiepiscopum vel episcopum, vel generalem dioecesis confessorem absente archiepiscopo vel episcopo transmittantur, ab eo poenitentiam suscepturi. In extremis vero laborantibus, insinuando, non imponenda est poenitentia: eisque firmiter injungatur, ut, si vixerint, archiepiscopum, vel episcopum vel generalem dioecesis confessorem absente archiepiscopo vel episcopo, adeant, ut eis poenitentia competens imponatur». 199 Cf. A. CARPIN, «La confessione tra il XII e il XIII secolo», 29.


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sar-se a estes, recorra aos principais penitenciários do arcebispo ou bispo. Se a nenhum destes queira revelar os seus pecados, venha ao arcebispo ou bispo, ou ao sacerdote designado por estes a quem queira e possa confessar-se200.

O mesmo Concílio proibe aos diáconos a administração da penitência, excepto em caso de perigo de vida201. Para alguns pecados incorrese na excomunhão reservada à autoridade episcopal: sortilégios, perjúrio, incêndio das igrejas, usura, rapto público, contumácia, impedimento malicioso da execução de testamentos. A excomunhão deve ser precedida de uma admonição canónica, e pode ser tirada pelo bispo ou em perigo de morte202. Um outro Concílio anónimo do mesmo período emanou disposições semelhantes, decalcadas das Constituições sinodais de Odão203. No que diz respeito ao nosso assunto, este concílio enumera os pecados reservados à absolvição papal (violência contra os clérigos e religiosos, incêndios e simonia) e episcopal (homicídio, sacrilégios, pecados contra natureza, incesto, violação das virgens, violência sobre os pais, quebra de votos)204. 3.2 Concílios de Paris (1212) e de Rouen (1214) O Concílio de Paris, celebrado sob a presidência do Cardeal Roberto de Courçon, legado apostólico do Papa Inocêncio III, tomou numerosas ———————— 200

CONC. ANÓNIMO (início do século XIII), cap. 16, in Mansi 22, 725: «Quilibet autem sacerdos de consensu domini archiepiscopi vel episcopi suum habeat confessorem, et in quolibet capitulo suo sint confessores, quibus a domino archiepiscopo vel episcopo constitutis, eiusdem capituli sacerdotes possint peccata confiteri. Si qua vero dubia fuerint, quae per eos expediri nequeant; vel si quis de sacerdotibus eis ob aliquam causam noluerit peccata sua confiteri, ad principales poenitentiarios domini archiepiscopi vel episcopi recurrant. Si vero neutri eorum suum voluerit revelare peccatum, ad archiepiscopum vel episcopum veniat, ut vel ei confiteatur, vel ab ipso alius assignatur, cui velit et valeat confiteri». 201 Cf. CONC. ANÓNIMO (início do século XIII), cap. 31, in Mansi 22, 727. 202 Cf. CONC. ANÓNIMO (início do século XIII), cap. 49, in Mansi 49, 729. 203 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 35. 204 Cf. CONC. ANÓNIMO (início do século XIII), cap. 19, in Mansi 22, 732: «Sacerdotes maiora reservent maiori in confessione sicut homicida, sacrilega, peccata contra naturam, incestus et stupra virginum, injectiones manuum in parentes, vota fracta, et huiusmodi. Sunt autem tria in quibus nullus habet potestatem absolvendi, nisi dominus papa vel eius vicarius, scilicet injectio manuum in clericos, vel quoscumque religiosos, incendia, simonia. Nihilominus tamen talium rei remittendi sunt ad episcopum».


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e importantes decisões acerca da disciplina eclesiástica, que foram retomadas sucessivamente no Concílio de Rouen de 1214, sob a presidência do mesmo legado papal. No que diz respeito à jurisdição do sacramento da penitência, estabelece-se a obrigação de os clérigos se confessarem ao próprio prelado e não a outros, senão com o consenso do mesmo prelado ou com a devida licença205. Do mesmo modo, nenhum sacerdote pode receber a confissão de outros fiéis se estes desprezarem o próprio sacerdote206. A violação destas regras comportaria penas para os transgressores. No que diz respeito às monjas, também se prevê um capelão para estas, sendo-lhes proibido confessarem-se a outros sacerdotes. Por isso, os bispos diocesanos deviam garantir-lhes confessores preparados e honestos207. Aconselha-se igualmente aos bispos a exercerem frequentemente em pessoa o ministério da confissão208. A colecção Mansi junta as constituições de Guilherme, Bispo de Paris (1220-1223), às do Cardeal Gallo, de 1208. Aparentemente, seriam posteriores, mas os cânones relativos à penitência parecem anteriores a Latrão IV, porque não o referem209. No que diz respeito ao nosso tema, prescreve-se que os sacerdotes confessem os próprios pecados aos confessores constituídos nos decanados210. Prevê a penitência pública ou solene. Os presbíteros deveriam enviar os seus penitentes ao Bispo, que os excluía solenemente da Igreja, para depois os reconciliar na Quintafeira Santa211. ————————

205 Cf. CONC. DE PARIS (1212), pars I, cap. 5, in Mansi 22, 820; CONC. DE ROUEN (1214), pars I, cap. 5, in Mansi 22, 900. 206 Cf. CONC. DE PARIS (1212), pars I, cap. 12, in Mansi 22, 822; CONC. DE ROUEN (1214), pars I, cap. 14, in Mansi 22, 902. 207 Cf. CONC. DE PARIS (1212), pars III, cap. 7, in Mansi 22, 835; CONC. DE ROUEN (1214), pars II, cap. 37, in Mansi 22, 912-913: «Abbatissae et capellani earum prohibent monialibus, ne aliis quam ipsis confiteantur». 208 Cf. CONC. DE PARIS (1212), pars IV, cap. 6, in Mansi 22, 840; CONC. DE ROUEN (1214), pars III, cap. 6, in Mansi 22, 918: «Et in propria persona frequenter intersint confessionibus audiendis, et poenitentiis injungendis». 209 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 39. 210 Cf. GUILHERME, Bispo de Paris, Additiones, cap. 6, in Mansi 22, 767: «Praecipitur sacerdotibus, quod bis in anno ad minus, videlicet in Adventu Domini, et in Quadragesima, peccata sua confiteantur confessoribus per singulos decanatus constitutis». 211 Cf. GUILHERME, Bispo de Paris, Additiones, cap. 9, in Mansi 22, 767.


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3.3 Concílio de Dublin (1214) O concílio de Dublin, celebrado em 1214, ordena nas suas Constitutiones, no início, que os sacerdotes não enviem penitentes ao penitenciário diocesano por qualquer pecado, mas somente no caso de pecados reservados à autoridade episcopal, excepto em articulo mortis. Prescreve que se entregue ao penitente a carta para se apresentar para a absolvição dos pecados reservados ao Bispo. Recebida a absolvição, o penitente deveria entregá-la ao confessor com a indicação da penitência imposta pelo pecado212. Dispõe-se também que nos decanados sejam escolhidos dois presbíteros para escutar as confissões dos sacerdotes213. Trata-se de uma norma espiritual, que restringia a liberdade pessoal, embora pudessem escolher entre os dois confessores. Por outro lado, proíbe-se aos diáconos de confessarem os doentes214. Por fim, proíbe-se aos presbíteros a administração da confissão aos não paroquianos, sem a licença do próprio pároco. Este deveria indicar ao fiel o sacerdote ao qual deveria confessar-se215. Trata-se de uma legislação rígida no que diz respeito à jurisdição do ministro da confissão. 3.4 Concílio de Latrão IV (1215) O IV Concílio de Latrão, convocado por Inocêncio III a 19 de Abril de 1213, abriu solenemente no dia 11 de Novembro de 1215 na presença de 412 bispos. Depois do dia 11 de Novembro, a assembleia reuniu-se novamente nos dias 20 e 30 de Novembro. Na terceira e última sessão, aprovaram-se definitivamente os setenta capítulos discutidos nas precedentes reuniões de trabalho216. O Concílio não apresenta propriamente uma novidade no que diz respeito à prática penitencial, mas estendeu-a a toda a Igreja. As decisões amadurecidas na sessão conciliar são o fruto de um longo processo teológico e canónico217. ———————— 212

Cf. CONC. DE DUBLIN (1214), in Mansi 22, 926: «Nullus autem ad poenitentiarium nostrum Dublinensis pro aliquo delicto, nisi de quo in iure confessus fuerit, vel convictus; enormia vero delicta nobis vel poenitentiario nostro, praeterquam in articulo mortis, reservamus. Litteras autem decani vel officialis ad poenitentiam gratis concedi praecipimus poenitenti, et ut liqueat, qualis fuerit poenitentia, et pro quo crimine fit injuncta, poenitens litteras poenitentiarias referat ad mittentem». 213 Cf. CONC. DE DUBLIN (1214), in Mansi 22, 926. 214 Cf. CONC. DE DUBLIN (1214), in Mansi 22, 927. 215 Cf. CONC. DE DUBLIN (1214), in Mansi 22, 927. 216 Cf. A. CARPIN, «La confessione tra il XII e il XIII secolo», 43-56. 217 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 48.


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De particular importância para o sacramento da penitência, é a constituição Omnis utriusque sexus fidelius218, em que se impõe o preceito da confissão anual e da comunhão pascal. No que diz respeito à faculdade do ministro da penitência, estabelece que este é o próprio sacerdote, que, para os leigos, é o pároco. Para a escolha de um outro sacerdote, é necessária iusta de causa e prévia licença do próprio sacerdote, distinguindo assim entre o poder de ordem e o de jurisdição219. Recomenda o mesmo Concílio, num capítulo diverso, que os bispos tenham coadjutores quer na pregação quer na confissão e penitência: Do qual prescrevemos que sejam ordenados homens idóneos nas igrejas catedrais, que os bispos possam ter como coadjutores e cooperadores, não só no ofício da pregação, mas também na escuta de confissões e na aplicação de penitências220.

No entanto, Carpin defende que esta norma provocará na história posterior frequentes conflitos de jurisdição entre os párocos, como pastores próprios, e os pregadores religiosos, aos quais se concedia a faculdade para confessar. De igual modo, tornar-se-á difícil regular o recurso ao sacramento da confissão, visto que a confissão ao pregadorconfessor excluía da obrigação ao próprio sacerdote pároco: A disposição conciliar relativa ao ministro da confissão («proprio sacerdoti»), e à consequente faculdade de escutar confissões, provocará o nascer de frequentes conflitos jurisdicionais, em particular entre o clero diocesano e o clero religioso das novas Ordens mendicantes (Ordem Franciscana e Ordem dos Frades Pregadores, chamada simplesmente Ordem Dominicana). A difusão da pregação por obra das novas ordens religiosas e a estreita conexão entre a pregação e a confissão provocará não poucas dificuldades e tensões no âmbito eclesiástico. O próprio concílio lateranense, afrontando a questão da pregação desatendida pelos bispos, prescrevia a instituição de pregadores junto das igrejas catedrais e conventuais que ajudassem os bispos no ministério da prega-

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Cf. CONC. DE LATRÃO IV (1215), can. 21, in Mansi 22, 1007-1010. CONC. DE LATRÃO IV (1215), can. 21, in Mansi 22, 1010: «Si quis autem alieno sacerdoti voluerit iusta de causa sua confiteri peccata, licentia prius postulet et obtineat a proprio sacerdote, cum aliter ille ipse (ipsum) non possit solvere, vel ligare». 220 CONC. DE LATRÃO IV (1215), can. 10, in Mansi 22, 998-1000: «Unde praecipimus tam in catedralibus ecclesiis viros idoneos ordinari, quos episcopi possint coadjutores et cooperatores habere, non solum in praedicationis officio, verum etiam in audiendis confessionibus et poenitentiis injungendis». O mesmo texto é retomado no Corpus Iuris Canonici: X. 1, 31, 15.


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ção. O concílio acrescentava que estes pregadores, culturalmente mais preparados que o clero diocesano, tivessem a faculdade de escutar as confissões e de impor as penitências, dada a inegável conexão entre a pregação e a confissão. Mas não é clara como a disposição conciliar acerca dos pregadores confessores se harmonizasse com a precedente normativa acerca da confissão anual ao próprio sacerdote. Visto que se fala de pregadores nas igrejas catedrais, é óbvio que a faculdade de confessar derivasse para eles directamente do bispo. Em modo análogo, devia acontecer nas igrejas conventuais. Portanto, a estes pregadores era concedido confessar todos os fiéis, não estando para eles a faculdade ligada ao território paroquial. Neste caso não se via a razão pela qual os fiéis pedissem ao próprio sacerdote-pároco a faculdade de se confessarem a estes que ajudavam directamente o bispo no seu ministério de pregação-confissão. Porém, deste modo, os sacerdotespárocos não tinham mais a possibilidade de verificar a exacta actuação do cânone conciliar da parte dos seus fiéis221.

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A. CARPIN, «La confessione», 51-52: «La disposizione conciliare relativa al ministro dela confessione («proprio sacerdoti»), e alla conseguente facoltà di ascoltare le confessioni, provocherà l’insorgere di frequenti conflitti giurisdizionali, in particolare tra il clero curato e il clero religioso dei nuovi Ordini mendicanti (Ordine francescano e Ordine dei frati Predicatori, chiamato semplicemente Ordine dominicano). La diffusione della predicazione ad opera dei nuovi ordini religiosi e la stretta connessione tra predicazione e confessione provocheranno non poche difficoltà e tensioni in ambito ecclesiastico. Lo stesso Concilio Lateranense, affrontando la questione della predicazione disattesa dai vescovi, prescriveva l’istituzione di predicatori presso le chiese cattedrali e conventuali che coadiuvassero i vescovi nel ministero della predicazione. Il Concilio aggiungeva che questi predicatori, culturalmente più preparati del clero curato, avessero anche la facoltà di ascoltare le confessioni e di imporre le penitenze, data l’innegabile connessione tra predicazione e confessione. Ma non è del tutto chiaro come la disposizione conciliare circa i predicatori-confessori si armonizzasse con la precedente normativa circa la confessione annuale al proprio sacerdote. Poiché si parla di predicatori nelle chiese cattedrali è ovvio che la facoltà di confessare derivasse loro diretamente dal vescovo. In modo analogo doveva avvenire per le chiese conventuali. Pertanto, a questi predicatori era concesso di confessare tutti i fedeli, non essendo la loro facoltà legata al territorio parrocchiale. In tal caso non si vedeva la ragione per cui i fedeli chiedessero al proprio sacerdote-parroco la facoltà di confessarsi da costoro che coadiuvavano diretamente il vescovo nel suo ministero di predicazione-confessione. In questo modo, però, i sacerdoti-parroci non avevano più la possibilità di verificare l’esatta attuazione del canone conciliare da parte dei loro fedeli». Um outro autor confirma este problema: «con respecto a la confesión, los frailes son autorizados, sin problemas, a ocupar el puesto – como confesores – del proprio párroco del individuo, para irritación, frecuentemente, de estos últimos». N. TANNER, Los concilios de la Iglesia, 72.


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4. Legislação posterior a Latrão IV (1215) 4.1 Concílios e Sínodos 4.1.1 Constituições sinodais inglesas (1217-1225) Ricardo o pobre, Bispo de Chicester (1215-1217), de Salisbúria (1217-1228) e de Durham (1228-1237), exerceu uma grande influência na renovação da Igreja inglesa, sendo as suas constituições sinodais um instrumento canónico e pastoral importante e eficaz222. No que diz respeito à penitência, impõe-se o termo confissão, realçando-se assim a acusação dos pecados e a conversão interior. Nas suas constituições, reflecte-se a legislação lateranense: modalidade da confissão, obrigação anual da mesma, ministro e sujeito. No entanto, ao referir a normativa acerca dos pregadores, não menciona a sua faculdade de confessar. O confessor deve saber que alguns pecados são reservados à autoridade superior e que por isso não tem a faculdade de os absolver. Os pecados de homicídio, contra natureza, incesto, violação das virgens e monjas, violência física contra os pais, violação dos votos e outros semelhantes são reservados ao bispo ou ao seu penitenciário. A violência física contra os clérigos ou religiosos e o incêndio das igrejas são reservados ao Romano Pontífice ou ao seu delegado, cujo pedido é realizado pelo bispo. Na iminência da morte, não deve ser negada a absolvição, pelo menos condicional. Tal supõe que, em caso de cura o penitente deva pedir ao Papa a absolvição. Os penitentes enviados à autoridade competente devem levar um escrito onde se especificam o pecado cometido e as suas circunstâncias, ou devem ser acompanhados pelo próprio sacerdote; em caso contrário, não poderão ser recebidos pela autoridade competente para obter a absolvição. Em casos dúbios, o confessor é convidado a consultar o bispo ou homens sábios para negar ou dar a absolvição223. Es———————— 222 223

Cf. A. CARPIN «La confessione», 58-84. Cf. RICARDO O POBRE, Constitutiones, cap 26, in Mansi 22, 1116. Existe uma grande semelhança entre estas e as Constituições Sinodais de Odão de Paris. Apenas se nota que os pecados reservados ao Romano Pontífice passam de três (Odão) a dois (Ricardo): violência física sobre clérigos ou religiosos, e incêndio nas igrejas. Não se encontra a simonia. «Sunt autem ista maiora, homicidia, sacrilegia, peccata contra naturam, incestus et stupra virginum et monialum, et injectiones manuum in clericos, in parentes, vota fracta, et huiusmodi. Sunt autem casus quibus nullus solus papa potestatem habet absolvendi vel eius vicarius: videlicet injectio manuum in clericos vel quocumque religiosos, incendia ecclesiarum. Absolutio nulli talium in articulo mortis


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ta prática levanta o problema do sigilo sacramental. Mas naquela época o confessor podia revelar a outros os pecados conhecidos em sigilo sacramental224. Decreta-se igualmente que os sacerdotes se devem confessar anualmente àqueles que são deputados pelo bispo. Em cada cabido da catedral, devem existir dois confessores deputados para escutar as confissões dos sacerdotes, dos clérigos e de outros fiéis. Quem não se quisesse confessar a estes deveria confessar-se ao principal penitenciário episcopal. Se não quisesse fazê-lo, confessar-se-ia ao bispo ou a outro autorizado pelo bispo225. Ainda no que se refere ao ministro da penitência, Ricardo admite a possibilidade de os diáconos também administrarem a penitência na ausência, impossibilidade ou negligência do sacerdote226. De igual modo, Odão de Paris o admite, mas só em caso de extrema necessidade227. Um texto semelhante se pode encontrar no Concílio de Londres (1200)228. O Concílio de Oxford iniciou os trabalhos no mosteiro de Oseney, no dia 11 de Junho de 1222, sob a presidência de Stephen Langton, metropolita de Cantuária. Foi preocupação dos Padres emanar 49 cânones conformes ao Concílio de Latrão IV229. ————————

est deneganda, saltem conditionalis: nihilominus talium rei mittendi ad episcopum, vel ad eius poenitentiarium. Semper autem qui mittuntur, deferant secum litteras, continentes genus peccati et circumstantias sufficienter, vel ipse sacerdos cum eis veniat: alioquin non recipiantur. In dubiis semper confessor consulat episcopum, aut sapientes viros, quorum consilio certificatus, securius solvat vel liget». 224 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 77. Tomás de Aquino responde afirmativamente à pergunta: «Utrum de licentia poenitentis possit sacerdos peccatum quod sub sigillo confessionis habet, alteri prodere». TOMÁS DE AQUINO, Libri IV Sent., dist. 21, q. 3, a. 2. 225 Cf. RICARDO O POBRE, Bispo de Salisbúria, Constitutiones, cap 30, in Mansi 22, 1116. 226 Cf. RICARDO O POBRE, Constitutiones, cap 19, in Mansi 22, 1113: «De baptismate et poenitentia, praecipimus quod diaconi poenitentias dare vel baptizare non praesumant, nisi in casibus, cum sacerdos non potest, vel absens est, vel indiscrete non vult». 227 Cf. ODÃO DE PARIS, Synodicae Constitutiones, cap. 56, in Mansi 22, 684: «Item proibetur districte, ne diaconi ullo modo audiant confessiones, nisi in arctissima necessitate; claves enim non habent, nec possunt absolvere». 228 Cf. CONC. DE LONDRES (1200), cap. 3, in Mansi 22, 714-715: «Et ut non liceat diaconibus baptizare, vel poenitentias dare, nisi duplici necessitate, videlicet quia sacerdos non potest, vel absens est, vel indiscrete non vult». 229 Cf. F. BONCOPAGNI, «Oxford», 270.


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Este Concílio renova o antigo estatuto230, em que os antigos decanos rurais e os outros beneficiários deveriam confessar-se ao bispo. Por outro lado, o bispo devia ter confessores em todos os arquidiaconados para confessarem os decanos rurais, os presbíteros e outras pessoas. Estabelecem-se dois presbíteros por cada decanado para a confissão dos sacerdotes231. Por isso, os sacerdotes também tinham a obrigação de se confessarem a quem tinha essa faculdade. Nos cabidos das catedrais, estabeleram-se penitenciários nomeados pelo bispo ou pelo decano, ou confessores ad hoc constituídos pelo bispo, pelo decano ou pelo cabido232. No que diz respeito à jurisdição, o Concílio proíbe a administração da confissão a quem não fosse paroquiano233. Esta licença era obtida do próprio pároco, mas também podia ser concedida pelo bispo, pela simples razão de que os párocos recebiam esta faculdade do seu bispo. Isto supõe que existiam presbíteros não párocos que tinham esta faculdade não ligada ao território234. Trata-se de uma normativa mais alargada que a do Concílio lateranense235. Por fim, este Concílio estabelece que nenhum religioso podia absolver em toda a Diocese sem a licença do bispo, salva a autoridade da Sé Apostólica.236. O Concílio conhece a intervenção da Sé Apostólica, ———————— 230 231

Cf. L. THOMASSIN, «Pénitencier», 576. Cf. CONC. DE OXFORD (1222), Statuta, in Mansi 22, 1177: «statuimus, quod per singulos archidiaconos duo presbyteri idonei praeficiantur in singulis decanatibus, litteraturae competentis, et probatae omnibus opinionis, ad confessiones talium audiendas, quibus per nos aut vices nostras gerentes ad id exequendum auctoritatem nostram volumus impertiri». 232 Cf. CONC. DE OXFORD (1222), cap. 18, in Mansi 22, 1157: «Quoniam nonnunquam, ob defectum confessorum, vel quia decani rurales et personae erubescunt forte confiteri suo praelato, certum eminet periculum animarum: volentes huic morbo mederi, statuimus ut certi confessores prudentes et discreti per singulos archidiaconatus ab episcopo loci constituantur, qui confessiones audiant decanorum ruralium, presbiterorum et personarum. In cathedralibus autem ecclesiis, ubi sunt canonici saeculares, constituantur ipsi canonici episcopo, vel decano, vel certis personis ad hoc per episcopum, decanum et capitulum constitutis». 233 Cf. CONC. DE OXFORD (1222), Statuta, in Mansi 22, 1176: «Item nullus sacerdos alterius parochianum admittat ad poenitentias, nisi de licentia sui presbyteri aut episcopi». 234 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 91-92. 235 Cf. CONC. DE LATRÃO IV (1215), can. 21, in Mansi 22, 1010. 236 Cf. CONC. DE OXFORD (1222), Statuta, in Mansi 22, 1177: «Item, cum saepe contigit, quod rectores ecclesiarum, et nonnulli sacerdotes et in sacris ordinis constituti, eo quod nullius, ut eis videtur, quoad forum poenitentiale sint filii sujecti, aut om-


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possivelmente a de Honório III. Deste modo, ajuda à autenticidade da Bula Cum recipit prophetam237. Finalmente, concede confessores próprios para os religiosos, deputados pelo bispo238. O Concílio Provincial da Escócia, celebrado em 1225, com a aprovação de Honório III, trata dos sacramentos retomando os estatutos sinodais dos precedentes concílios ingleses, que por sua vez retomam as constituições sinodais de Odão de Paris. A fonte mais directa parece ser a de Ricardo o pobre239. Retomam-se quase literalmente as fontes anteriores, como a licença do próprio sacerdote para se poder confessar a um outro sacerdote, o dever de consultar o bispo nos casos dúbios240. Estabelece a instituição de confessores para o clero nos decanados e confessores gerais nas igrejas catedrais241. 4.1.2 Estatutos do Concílio de Treviri (1227) O Concílio Provincial de Treviri realizou-se em 1227242 e reserva uma parte dos estatutos à celebração dos sacramentos. Estabelece algumas normas relativas à confissão, recebendo as disposições do Concílio lateranense. O ministro da confissão é o sacerdote pároco, mas alarga-se esta faculdade a sacerdotes doutrinalmente preparados243. É ————————

nino non confitentes, aut ad religiosos, vel ad eos accedant, qui nullam habent ipsos ligandi vel absolvendi potestatem; statuimus [...], prohibentes firmiter, ne religiosi monachi, videlicet anachoretae, heremitae, subditum alicujus audeant ad poenitentiam admittere, nisi cum licentia praelati, salva in omnibus apostolicae sedis auctoritate». 237 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 97. 238 Cf. CONC. DE OXFORD (1222), cap. 46, in Mansi 22, 1166. 239 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 98. 240 Cf. CONC. DE ESCÓCIA (1222), cap. 57, in Mansi 22, 1238-1239. 241 Cf. CONC. DE ESCÓCIA (1222), cap. 16, in Mansi 22, 1226: «Quod in quodam concilio statutum est, approbantes statuimus, ut per quoslibet decanatus prudentes viri et fideles constituantur per episcopum confessores, quibus personae vicarii et minores clerici valeant confiteri, qui decanis forsitan erubescant confiteri, et verentur. In ecclesiis vero cathedralibus confessores institui praecipimus generales». 242 Os textos serão literalmente retomados nos estutos do Concílio de Treviri de 1277. Cf. CONC. DE TREVIRI (1277) in Mansi 24, 191-206. 243 Cf. CONC. DE TREVIRI (1227), cap. 3, in Mansi 23, 27: «Sacramentum Eucharistiae ad minus semel in anno suscipiant laici prius contriti, et pure confessi suo proprio Sacerdoti, vel viris literatis habentibus auctoritatem delegatam, et habentibus licentiam a Sacerdote loci ubi volunt, et debent audire confessionem: si qui autem obmisserint sine licentia suorum propriorum Sacerdotum illi nobis, vel officiali nostro denuncientur super hoc, uti justum fuerit corrigendi».


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interessante notar como o texto distingue entre delegação e licença. A licença é dada pelo pároco, enquanto a delegação vem de uma autoridade superior. A delegação precede a licença, que é a permissão de exercitar o poder delegado no âmbito do próprio território244. No capítulo dedicado à confissão, e seguindo o que nos interessa, começa-se por elencar os pecados reservados ao bispo245, mais seis casos reservados à Sé Apostólica, que o sacerdote pode absolver só in articulo mortis. Proíbe-se a absolvição sem a devida licença, respeitando a normativa lateranense relativa ao ministro próprio da confissão, tendo em conta as Bulas relativas às Ordens dos Pregadores e Menores. É transcrita, pela primeira vez, a forma da absolvição da excomunhão num documento conciliar. Proíbe-se aos confessores de escrever em cartas abertas os pecados confessados pelo penitente quando recorre à autoridade superior246. 4.1.3 Instituições Sinodais de Rouen e de Le Mans (1235) As instituições sinodais da Diocese de Rouen do ano 1235 aproximadamente247 apresentam a modalidade da confissão, os casos de excomunhão ipso facto, os casos de excomunhão reservados ao ar———————— 244 245

Cf. A. CARPIN, «La confessione tra il XII e il XIII secolo», 113. Cf. CONC. DE TREVIRI (1227), cap. 4, in Mansi 23, 28-29: «Sacerdotes remittant ad nos, vel nostrum primarium peccata graviora, scilicet homicidia, sacrilegia, et maxime de corpore Domini nostri Jesu Christi, de Chrismate, et de Oleo Sancto, de aqua Baptismi, et Perjuria, et falsa testimonia, et peccata, quae sunt contra naturam, Simoniam, incestum Monialium, consanguineorum, et deflorationem Virginum, Beneficia, injectores manuum in parentes, Vota fracta, incendiarios, usuarios, etiam et illos, qui parvulos pueros suos opprimunt, etiam in illos, qui pueros suos sine Baptismo permittunt, item nullus Sacerdos praesumat absolvere aliquem existentem Deum in casibus pertinentibus ad Dominum, vel eius Legatos, nisi cautione idonea, vel satisfatione praecedente, vel in articulo mortis». Repete-se em CONC. DE TREVIRI (1277), cap. 4, in Mansi 24, 195. 246 Cf. CONC. DE TREVIRI (1227), cap. 4, in Mansi 23, 29: «nullus Sacerdos non sibi subditum recipere praesumat in confessione ligare vel absolvere; nisi de licentia nostra, vel Presbyteri sui, et ex causa rationabili, et honesta; item Sacerdos in casibus, in quibus absolvere possunt, iis verbis utantur in absolutionibus suis auctoritate, qua fungor ego te absolvo a vinculo excommunicationis, et restituo te unitate Ecclesiae Sanctae in nomine Patris, et Filii, et Spiritus Sancti amen. Item inhibemus firmiter, et districte, ne aliquis Sacerdos scribat peccata confitentium in litteris apertis, sed tatummodo clausis». Tal norma foi repetida no CONC. DE TREVIRI (1277), cap. 4, in Mansi 24, 195-196. 247 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 117.


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cebispo248, a absolvição de qualquer excomunhão no ponto de morte, mesmo papal, da parte de qualquer sacerdote249. Se o doente recuperar, deve dirigir-se ao sacerdote e então ser-lhe-á imposta uma penitência adequada250. A figura do penitenciário aparece na confissão dos sacerdotes. Os estatutos obrigam-nos a confessarem-se todos os anos ao arcebispo ou ao penitenciário, ou, com a sua permissão, a outros padres, todas as vezes que quiserem. Antes de receberem as ordens, os clérigos devem-se confessar ao arcebispo ou a um hábil penitenciário, para que não sejam irregularmente ordenados por causa de um confessor mal preparado251. O livro sinodal da Diocese de Le Mans segue-se à de Rouen e apresenta o sacramento da parte do penitente em três momentos: confissão, contrição e satisfação252. Contém um elenco dos pecados reservados ao Bispo253. 4.1.4 Concílio de Londres e Estatutos Sinodais Ingleses (1236-1240) O Concílio de Londres, celebrado em 1237 sob a presidência do Bispo Otão, legado de Gregório IX, estabelecia que os bispos constitu———————— 248 249

Cf. SÍNODO DE ROUEN (1235), cap. 60-63, in Mansi 23, 382-383. Cf. SÍNODO DE ROUEN (1235), cap. 77, in Mansi 23, 386: «Pium videtur et tutum, ut quilibet Sacerdos infirmum in extremis laborantem absolvat de omnibus, quibus eum absolvere potest». Deste modo, qualquer sacerdote pode absolver em perigo de morte de qualquer pecado ou censura «de omnibus». No entanto, a última parte faz entender um certo limite jurisdicional do sacerdote, possivelmente no que diz respeito à autoridade da Sé Apostólica. Cf. A. CARPIN, «La confessione», 118-119. 250 Cf. SÍNODO DE ROUEN (1235), cap. 79, in Mansi 23, 386: «Si autem convaluerint statim ad Sacerdotem accedere debent, et tunc eis poenitentia competens injungatur». 251 Cf. L. THOMASSIN, «Pénitencier», 578; SÍNODO DE ROUEN (1235), cap. 81, in Mansi 23, 386-387: «Praecipitur quod Sacerdotes Archiepiscopo vel Poenitentiariis suis saltem semel in anno confiteantur: permittit autem Archiepiscopus quod possint interim quotiens opus fuerit etiam aliis Sacerdotibus confiteri. Clerici antequam Ordines recipiant Archiepiscopo vel Poenitentiariis discretis confiteantur, ne forte pro simplicitate indiscreti Confessoris, irretiti irregulariter ordinentur». 252 Cf. SÍNODO DE LE MANS (1235), cap. 30, in Mansi 23, 397. 253 Cf. SÍNODO DE LE MANS (1235), cap. 122, in Mansi 23, 395: «Sacerdotes in confessione majora majoribus reservantes, mittant ad Episcopum poenitentes propter homicidia, perjuria, injectionem manuum in parentes, sive in clericos, vel quocumque religiosos; propter incendia, simoniam, propter factam litterarum Domini Papae falsitatem, propter incestum, propter lapsum cum masculis, cum brutis animalibus, cum monialibus, propter violationem coemeteriorum et ecclesiarum. Item mittendi sunt ad Episcopum Haeretici, Schismatici, Sortilegi, qui de sacris Ecclesiae sortilegia commiserunt, vel ad hoc concilium, vel auxilium impenderunt, et clerici qui furtum commiserunt».


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íssem confessores em cada decanado e nas igrejas catedrais, sem precisar o número254. Por volta de 1236, Edmond Rich, Arcebispo de Cantuária, redigiu e promulgou as Constituições provinciais, retomando em grande parte as Constituições Sinodais de Ricardo o pobre255. Deste modo, retoma-se a norma que proibia os diáconos de administrarem a penitência, excepto em caso de necessidade256. Recolhem-se também os casos reservados à autoridade episcopal ou papal, recordando a possiblidade de absolver qualquer fiel de qualquer censura in articulo mortis. Edmond Rich acrescenta, em relação a Ricardo o pobre, que em caso de cura o penitente é obrigado a apresentar-se ao Papa para absolvição dos pecados reservados à sua autoridade257. Também o confessor deveria entregar ao penitente uma carta que indicasse o género de pecado cometido e as suas circunstâncias para a absolvição dos pecados reservados, ou acompanhá-lo pessoalmente ao bispo258. As Constituições de Alexandre, bispo de Conventry-Lichfield, diocese sufragânea de Cantuária, foram redigidas por volta de 1237. Estabelece-se que em cada decanado exista um confessor para os sacerdotes, ou pelo menos um sacerdote por cada dois decanados259. Na última parte do texto, acena-se brevemente aos casos reservados260. No entanto, estas constituições não se detêm nos aspectos jurídicos, desenvolvem-se sobretudo na dimensão pastoral do sacramento da penitência, ————————

254 Cf. CONC. DE LONDRES (1237), cap. 5, in Mansi 23, 449-450: «Quod in quodam concilio statutum invenimus approbantes, statuimus, ut per quoslibet decanatus prudentes viri et fideles constituantur per episcopum confessores, quibus personae et minores clerici confiteri valeant, qui decanatis erubescunt confiteri, forsitan et verentur. In ecclesiis vero cathedralibus confessores institui praecipimus generales». 255 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 122-127. 256 Cf. EDMOND RICH, Constitutiones Provinciales, cap. 2, in Mansi, 23, 417. 257 Cf. EDMOND RICH, Constitutiones Provinciales, cap. 28, in Mansi, 23, 424: «Absolutio tamen talium in articulo mortis nulli deneganda est, saltem conditionalis, videlicet quod si convalescant, apostolico conspectui se praesentem». 258 Cf. EDMOND RICH, Constitutiones Provinciales, cap. 20, 28, in Mansi, 23, 422, 424. 259 Cf. ALEXANDRE, Constitutiones, in Mansi, 23, 432: «Item in quolibet decanatu sit unus, qui audiat confessionem sacerdotum, vel ad minus unus confessor, in duobus decanatibu». Esta norma retoma algumas legislações conciliares anteriores, como por exemplo as dos Concílios de Dublin (1214), Concílio de Oxford (1222) e de Londres (1237), a que já nos referimos. 260 Cf. ALEXANDRE, Constitutiones, in Mansi, 23, 440.


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nos seus vários momentos, especialmente na relação entre confessor e penitente261. O Sínodo de Worcester realizou-se em 1240, sob a presidência do Bispo Walter Cantilupe, e promulgou diversas normas relativas à administração dos sacramentos. Na formulação dos capítulos, prevalece o aspecto teológico e bíblico na consideração da realidade do pecado e do perdão sacramental262. No plano disciplinar, o Sínodo dispõe que haja confessores próprios dos clérigos em cada decanado, que serão eleitos no próprio sínodo, e refere-se à licença para a confissão por parte de outro sacerdote263. Proíbe-se aos capelães dos nobres de os confessar ou aos seus familiares, sem a permissão especial do bispo. Se algum se tem por isento da jurisdição do bispo deve fazer ver os seus privilégios264. Richard Wich foi Bispo de Wicester de 1245-1253, na mesma sede que tinha sido de Ricardo o pobre. O actos sinodais foram publicados por ele em 1246 e apresentam uma grande clareza conceptual no que diz respeito à penitência. Descreve a modalidade de absolvição dos casos reservados ao bispo265. Nos casos dúbios, os sacerdotes devem con———————— 261 262

Cf. A. CARPIN, «La confessione», 128-134. Cf. A. CARPIN, «La confessione», 135-137. O mesmo autor nota que este sínodo marca a passagem do liber poenitentiale, em que vigorava a penitência tarifada, à summa confessorum, que seguia uma ordem que indicava o percurso na acusação dos pecados, segundo a ordem dos vícios capitais e das suas espécies, passando-se posteriormente ao esquema dos dez mandamentos mais simplificado. Cf. SÍNODO DE WORCESTER (1240), cap. 18, in Mansi 23, 531-532; R. RUSCONI, L’ordine dei peccati, 83103. 263 Cf. SÍNODO DE WORCESTER (1240), cap. 16, in Mansi 23, 531: «Volumus autem, ut ad audiendas clericorum confessiones, certi deputentur in singulis decanatibus confessores, quos in praesenti synodo, per ipsos electos volumus nominari [...]. Quod si forte voluerit aliquis alii confiteri, quam proprio sacerdoti, petita ab eodem modeste licentia, non negetur». 264 Cf. SÍNODO DE WORCESTER (1240), cap. 39, in Mansi 23, 539: «Prohibemus etiam, ne aliquis sacerdos, in capellis magnatum, quantumcumque sit, libere Divina celebrare praesumant, nisi nobis praesentatus, et admissus, nec ipse confessiones dictorum magnatum audiat, aut familiae eorumdem, sine nostra licentia speciali. Et, si qui fortassis exemptos se dicant a jurisdictione nostra, privilegium exemptionis suae, quo serventur, nobis exhibeant incunctanter». 265 Cf. RICHARD WICH, Statuta Synodalia, in Mansi 23, 706: «Sacerdotes publice poenitentes cum litteris suis veritatem continentibus, ad poenitentiarium episcopi transmittunt; vel in propriis personis cum illis veniant, nec revertentes poenitentes tanquam absolutos recipiant, nisi de poenitentia eis injuncta constituerit per litteras episcopi, vel poenitentiarii sui patentes: et nisi illam perficiant, ab ecclesia excludantur, et ad poenitentiarium remittantur».


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sultar os superiores. Os cabidos são os que deputam sacerdotes a confessar outros sacerdotes. Estes não se poderão confessar a outros senão por justa causa e com a sua licença. Proíbe-se qualquer sacerdote de negar a um paroquiano de se confessar a outro sacerdote, se tem uma justa causa, desde que saiba que o penitente o faça em boa fé266. No ano de 1289, e na mesma Diocese, foi celebrado um Sínodo presidido pelo Bispo Gilberto. Permitia ao cabido a nomeação de dois padres que deviam confessar todos os eclesiásticos do decanado267. «Este cabido, na minha opinião, não é outro senão a assembleia de todos os párocos do decanado, ao qual se dava também o nome de cabido»268. Chama a atenção de que só se deveria enviar o penitente ao bispo ou ao penitenciário nos enormia delicta. Para tal, o penitente far-se-ia acompanhar de uma carta do arquidiácono, do decano ou dos oficiais. No regresso, o penitente apresentava ao confessor a penitência aplicada269. Portanto, o penitenciário reenviava o penitente ao pároco, com uma carta que continha quer a ordem da penitência que ele imponha, quer o poder de absolver, porque era justo que a penitência pública se fizesse no mesmo lugar onde foi cometido o crime.

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Cf. RICHARD WICH, Statuta Synodalia, in Mansi 23, 706: «Sacerdotes in dubiis consulant superiores et majora majoribus reservent, ut homicidia, sortilegia, peccata contra naturam, vota fracta, et perjura, de assisis, vel aliis causis, partus suppositionem, et testamenti immutationem, et similia, nisi sint occulta, et ad poenitentiam imponendam sufficiat discretio sacerdotis. Sacerdotes in capitulis ad audiendum aliorum sacerdotum confessiones deputentur, nec alii sacerdotes relictis confessoribus aliis confiteantur, nisi ob justam causam, petitam ab altero ipsorum licentia [...]. Nullus sacerdos deneget parochiano suo licentiam confitendi alio sacerdoti, si justam habuerit causam, dummodo sciat cui confiteatur, et dicat se hoc bona fide petere». 267 Cf. SÍNODO DE CHICESTER (1289), cap. 12, in Mansi 24, 1058: «In singulis autem decanatibus, per capitulum duo eligantur presbyteri, qui moribus et scientia praediti, confessiones audiant sacerdotum». 268 L. THOMASSIN, «Pénitencier», 577: «Ce chapitre n’est autre à mon avis que l’assemblée de tous les cures du doyenne, à laquelle on donnait aussi le nom de chapitre». 269 Cf. SÍNODO DE CHICESTER (1289), cap. 12, in Mansi 24, 1058: «Nullus autem ad poenitentiarios nostros pro aliquo mittatur, de quo interim confessus fuerit, vel convictus. Enormia vero delicta nobis, vel poenitentiario nostro ad hoc specialiter deputato, praeterquam in articulo mortis, reservamus. Litteras autem archidiaconi, decani, vel officiariorum, ad poenitentiarium, gratis concedi volumus et praecipimus poenitenti. Et ut liqueat, qualis fuerit poenitentia, et pro quo crimine specialiter injuncta: poenitens, litteras poenitentiarii referat ad mittentem».


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Por fim, o bispo dava o poder ao grande penitenciário de pedir ajuda no início da Quaresma, se tivesse uma multidão muito grande de penitentes para receber e reconciliar publicamente270.

4.1.5 Concílio Provincial de Fritzlar (1243) e de Mainz (1261) A 30 de Maio de 1243 realizou-se um Concílio em Fritzlar, na Baviera, sob a presidência de Sigfrido III, Arcebispo Metropolita de Mainz271. No capítulo IV, acerca da penitência, o Concílio retoma precedentes disposições canónicas, sobretudo as de Odão de Paris. Depois de algumas disposições canónicas, enumeram-se os casos reservados. São três os casos reservados à Sé Apostólica: violência física contra os clérigos ou religiosos, incêndio doloso das igrejas e lugares sacros; simonia na administração da ordem sacra. A série dos casos reservados ao bispo é longa272. Fora do perigo de morte, ninguém pode absolver estes pecados sem ter esta faculdade, senão o bispo do lugar, ou o seu penitenciário ou quem recebeu do bispo tal licença273. O Concílio de Mainz foi celebrado em 1261, sob a presidência do Arcebispo Wernher von Epenstein. Foram emanados 54 cânones, com alguns dedicados à penitência. Retomam-se as precedentes disposições do Concílio de Fritzlar de 1243274. Enumeram-se os casos reservados à Sé Apostólica, tendo em conta também os casos reser————————

270 L. THOMASSIN, «Pénitencier», 578: «Le pénitencier renvoyait donc le pénitent au curé, avec une lettre qui contenait et l’ordre de la pénitence qu’il fallait lui imposer, et le pouvoir de l’absoudre, parce qu’il était juste que la pénitence publique se fit dans le lieu même où le crime avait été commis. Enfin, l’évêque donnait le pouvoir au grand pénitencier de prendre des aides au commencement du Carême, s’il y avait une multitude trop grande de pénitents à recevoir et à réconcilier publiquement». 271 Sigfrido era defensor do Papa, abandonando o partido do Imperador Frederico II da Suécia (1194-1250), sendo a cidade de Erfurt favorável ao Imperador. Por isso, o Arcebispo publicou a excomunhão contra o Imperador e a interdição contra os habitantes de Erfurt. Esta sentença foi confirmada por este Concílio e outros 14 cânones. Mansi apresenta a realização deste Concílio em 1246, mas os outros autores não concordam. Cf. S. ZOLLO, «Fritzlar», 98; Cf. A. CARPIN, «La confessione», 137-138. 272 Cf. CONCÍLIO PROVINCIAL DE FRITZLAR (1243), cap. 4, in Mansi 23, 726-727. 273 Cf. CONCÍLIO PROVINCIAL DE FRITZLAR (1243), cap. 4, in Mansi 23, 727: «maiori excommunicatione in huius modi peccatis vel similibus detendo, mittant Sacerdotes ad Episcopos, vel eorum poenitentiarios, absolvendos, nec absolvant, praeterquam in mortis periculo, absque loci Episcopi licentia speciali, declarantes quod illis quibus hoc committitur, potestatem non haberent illud aliis personis committendi». 274 Cf. A. CARPIN, «La confessione tra il XII e il XIII secolo», 163-165.


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vados ao bispo275. Para a absolvição dos casos reservados ou difíceis, institui-se o penitenciário episcopal ou o penitenciário na igreja catedral276. É interessante notar como os penitenciários são instituídos para proporcionar um melhor acesso ao sacramento nos casos reservados, por causa das múltiplas ocupações do bispo, do qual dependem. 4.1.6 Constituições Sinodais de Valência (1255) As constituições sinodais de Valência foram publicadas em 1255 por vontade do bispo dominicano André de Albalacio. No que diz respeito à penitência, afirma-se que o ministro próprio é o sacerdote próprio ou um outro com a devida licença, assim como os franciscanos e dominicanos com a necessária licença episcopal, não já do pároco277. Esta normativa está na linha das bulas emanadas de Alexandre IV. São retomados os pontos habituais no que diz respeito à nossa matéria. Para além dos habituais casos reservados à jurisdição episcopal, junta-se a venda de armas aos serracenos. Por outro lado, precisa-se que, para os pecados públicos reservados à absolvição episcopal, os penitentes devem ser enviados ao penitenciário episcopal para o rito público da expulsão da igreja na Quarta-feira de Cinzas e a sua admissão na igreja na Quinta-feira Santa. É uma liturgia que reflecte a penitência solene278. ———————— 275 276

Cf. SÍNODO DE MAINZ (1261), cap. 8, in Mansi 23, 1082-1083. Cf. SÍNODO DE MAINZ (1261), cap. 33, in Mansi 23, 1092: «Quia frequenter in poenitentiis injungendis quidam casus emergent, qui propter Sacerdotum ignorantiam expediri non possunt, et quod etiam dispensationem Episcopalem requirant; ideo salubriter duximus statuendum, quod Episcopus, eo quod propter occupationes multiplices eius copia quandoque haberi non potest, unum poenitentiarium penes se habeat honestum providum, et discretum: et nihilominus alium instituat in Ecclesia sua Cathedrali; ut saltem ad ipsorum alterutrum recursus in iis casibus habeatur, qui etiam in illis casibus, in quibus Episcopi dispensandi obtinent facultatem, ipsorum auctoritate dispensent. Archidiaconi quoque et Archipresbyteri, et Plebani, suis subditis Presbyteris in Provinciali judicio districte injungant; ut in casibus memoratis, sive occulti, sive manifesti existant, recursum habeant ad poenitentiarios supradictos, opportunum ab eis consilium requirentes». 277 Cf. SÍNODO DE VALÊNCIA (1255), in Mansi 23, 888. 278 Cf. SÍNODO DE VALÊNCIA (1255), in Mansi 23, 888: «Proviso tamen, quod si peccata enormia fuerint publica, transmittant huiusmodi poenitentes Poenitentiario episcopi, et in die Cineris an ecclesia expellantur, et in die sancto Jovis introducantur, secundum quod in ecclesiis cathedralibus dignoscitur observari».


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4.1.7 Estatutos Sinodais de Clermont (1268) Os estatutos sinodais de Clermont de 1268 foram promulgados sendo bispo o dominicano Guido de la Tour. Retoma em grande parte os estatutos sinodais de Le Mans (1235, 1247) e o IV Concílio Lateranense (1215)279. No que diz respeito ao nosso tema, nota-se que a noção de sacerdote próprio é alargada. Não se trata somente do pároco, mas também de outros sacerdotes. Distingue-se no conceito de sacerdote próprio entre poder ordinário, ligado ao ofício, e delegado por meio de uma concessão episcopal ou papal. A autoridade competente para conferir o poder delegado não é o pároco, mas o bispo. Entre os ministros que a podem receber, contam-se os Frades Pregadores e Menores280. Desta jurisdição paroquial excluem-se igualmente os mendigos, peregrinos, doentes e casos semelhantes281. Proíbe-se igualmente os diáconos de confessar todos os fiéis, inclusive as crianças282. Por fim, faz-se um elenco longo dos casos reservados à autoridade episcopal. Nesses, os sacerdotes devem enviar o penitente ao bispo ou ao seu penitenciário, que os devem admitir283. 4.1.8 Concílios Franceses (1273-1280) O Concílio de Arles, celebrado em 1273, realizou-se sob a presidência do Arcebispo Metropolita Bertrand de Saint Martin284. Entre os vários capítulos, alguns são dedicados à penitência. São enumerados os habituais casos reservados ao bispo ou ao Papa. Entre os colaboradores do bispo, contam-se os penitenciários. Proíbe-se a confissão destes ca———————— 279 280

Cf. A. CARPIN, «La confessione», 170-175. Cf. SÍNODO DE CLERMONT (1268), cap. 7, in Mansi 23, 1193: «Proprium autem sacerdotem dicimus duobis modis: Ex officio, utpote Papam, Episcopum, Curatos, vel ex commissione, sicut Fratres Praedicatores et Minores, et quibus episcopus commisit vices suas. Si quis autem alieno sacerdoti, iusta de causa, sua voluerit confiteri peccata, licentiam prius postulet et obtineat a proprio sacerdote: cum aliter ille eum non posset solvere vel ligare nisi hoc faciat de licentia superioris». Esta noção de sacerdote próprio reflecte a doutrina tomista. Cf. TOMÁS DE AQUINO, Contra impugnantes, cap. 4, § 13, n. 4; 281 Cf. SÍNODO DE CLERMONT (1268), cap. 7, in Mansi 23, 1193. 282 Cf. SÍNODO DE CLERMONT (1268), cap. 7, in Mansi 23, 1193, 1200. 283 Cf. SÍNODO DE CLERMONT (1268), cap. 7, in Mansi 23, 1199: «Sacerdotes autem in confessione maiora maioribus reservantes, mittant ad episcopum vel eius poenitentiarium poenitentes de homicidio, perjurio seu fide mentita [...]; ad praedictos, videlicet episcopum, vel eius poenitentiarium, sunt amittendi». 284 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 176-177.


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sos, excepto no caso de velhice, doença ou impossibilidade de deslocação. Igualmente pode-se absolver em articulo mortis. Mas se o penitente recuperar, deve apresentar-se ao bispo285. Igualmente prescreve-se que cada pároco registrasse os penitentes confessados respeitando-se a normativa lateranense de confissão anual. Para um maior controlo os confessores deveriam comunicar aos párocos os nomes dos penitentes não sujeitos à própria jurisdição. O incumprimento da parte do pároco tinha como pena a exclusão da sepultura eclesiástica286. O Concílio de Avinhão foi celebrado a 27 de Maio de 1279, sob a presidência de Bernard de Languissel, Arcebispo Metropolita de Arles287. Alguns prelados não negam aos religiosos o privilégio de confessar, mas pede-se que mostrem a documentação e que deixem cópia ao ordinário do lugar ou ao seu vigário. A licença é dada pelos prelados, mas os religiosos deviam sempre pedir ao bispo do lugar ou ao seu vigário a faculdade de confessar. Esta faculdade não é geral, mas especial, restringida no tempo e nos lugares. Consente-se aos bispos em conceder a um religioso, estimado pelas suas qualidades morais e intelectuais, a especial faculdade de absolver os casos reservados pelos estatutos conciliares à absolvição episcopal288. O Sínodo de Poitiers foi realizado em 1280, sob a presidência de Gautier de Bruges, Bispo da mesma Diocese. Conhecem-se doze decisões que regulam os problemas sociais da época. Ordena aos abades e abadessas e às suas comunidades e a todos os seus beneficiários que se confessem somente ao bispo, aos seus penitenciários e àqueles que daria como confessores. Proíbe de absolver a quem não tivesse o poder do Papa, do seu legado ou do bispo. O mesmo se aplica aos cónegos seculares ou religiosos289. ————————

285 Cf. CONC. DE ARLES (1273), cap. 12-13, in Mansi 286 Cf. CONC. DE ARLES (1273), cap. 19-20, in Mansi 287 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 178-179. 288 Cf. CONC. DE AVINHÃO (1279), in Mansi 24, 244:

24, 150-152. 24, 152-153.

«Quod insuper iidem praelati retineant illos in causis, qui retenti sunt ipsis praelatis per provincialium conciliorum statuta. Si tamen inter religiosos eosdem aliquae sint personae, per quas praelati senserint tali gratia speciali hic aliquid deesse videtur meritos, sive dignos: ipsi praelati faciant super his erga personas huiusmodi, quod viderint expedire». 289 Cf. SÍNODO DE POITIERS (1280), cap. 4, in Mansi 24, 383: «praecipimus, quod abbates, abbatissae, priores, et alii praelati, qui pro suis conventibus, vel capitulis, tam saecularibus quam regularibus, immediate nobis subjectis, archipresbyteri, decani, et sacerdotes curati, nobis vel poenitentiariis nostris confiteantur, vel illis quos speciali-


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Por fim, proíbe-se aos abades e a todos aqueles que têm cura de almas de absolver os casos reservados pelo direito, e é-lhes ordenado que os enviem ao bispo ou aos seus penitenciários290. O mesmo sínodo proíbe a fortiori os diáconos de absolver, porque não têm o poder das chaves conferido pelo sacramento da ordem291. 4.1.9 Concílio de Münster (1279) e Sínodo de Colónia (1280) Os estatutos do Concílio de Münster, celebrado em 1279, desenvolvem bastante os temas relativos à confissão. O Sínodo de Colónia de 1280 retoma à letra os mesmos estatutos292. Nesta legislação, encontramos um profundo sentido pastoral dado ao sacramento. Insiste-se nas disposições preparatórias da confissão, no aspecto judicial e sacramentalidade, e qualidades do sacerdote confessor. Depois de uma atenção ao aspecto litúrgico e visibilidade da confissão, proíbe-se a confissão do cúmplice directo ou indirecto, em pecado impuro externo, enviandoo a honestos confessores. Enumeram-se igualmente os casos reservados ao bispo. Não se referem explicitamente os penitenciários, senão de uma forma indirecta, como «cui vices nostras in spiritualibus pro tempore committimus, peccata et injunctionem poenitentiae pro eisdem reservent»293. 4.1.10 Concílio de Lambeth (1281) O concílio de Lambeth foi celebrado em Outubro de 1281 pelos Bispos da província eclesiástica de Cantuária sob a presidência do Arcebispo John Peckham. Nos capítulos dedicados à confissão, o Concílio condena aqueles que absolvem os excomungados sem a faculdade para tal294. Depois, proíbe aqueles que, sob o pretexto de um privilégio ge————————

ter dederimus confessores: et inhibemus, ne aliquis eos absolvat, nisi super hoc a sede apostolica vel legatis eiusdem, vel a nobis, habuerit potestatem». 290 Cf. SÍNODO DE POITIERS (1280), cap. 4, in Mansi 24, 383: «Item interdicimus dictis abbatibus et prioribus, curam habentibus animarum, ne subditos suos attentent absolvere in causis, in quibus est a iure absolutio specialiter reservata, sed ipsos ad nos vel poenitentiarios nostros remittant: nisi eis in casibus praedictis absolvendi licentiam dederimus specialem». 291 CF. SÍNODO DE POITIERS (1280), cap. 5, in Mansi 24, 383-384. 292 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 180-183. 293 Cf. CONC. DE MÜNSTER (1279), cap. 15, in Mansi 24, 316-317; SÍNODO DE COLÓNIA (1280), cap. 8, in Mansi 24, 353-354. 294 Cf. CONC. DE LAMBETH (1281), cap. 6, in Mansi 24, 409.


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ral, confessam, excluindo-se da jurisdição episcopal295. Por isso, sob pena de excomunhão, nenhum ministro poderá confessar sem a licença do bispo, pelo menos presumida, a não ser que o seu privilégio os exclua da jurisdição ordinária do bispo ou metropolita296. Portanto, se não têm uma isenção explícita, esses confessores são submetidos à jurisdição episcopal na administração da penitência. No capítulo oitavo, o Concílio recorda os casos reservados à absolvição episcopal. Esses casos serão absolvidos por meio da penitência solene. Indica-se igualmente a instituição de um confessor para cada decanado, para a confissão dos sacerdotes, mas permite-se igualmente aos eclesiásticos que se confessem a outros penitenciários297. 4.1.11 Sínodo de Exeter (1287) e de Chicester (1289) O Sínodo de Exeter, realizado em 1287, sob a presidência do Bispo Peter Quivil, publicou um Livro Sinodal, que trata primeiramente dos vários sacramentos em geral e depois em particular. A confissão é feita ao próprio sacerdote pároco ou a um outro com a devida licença. Se o penitente quer confessar-se a um outro sacerdote, não deve ser negada a licença. Mas um sacerdote não pode absolver sem a devida licença, a não ser que a tenha recebido de uma autoridade superior. Não é necessária a licença para a confissão de um peregrino, encarcerado, ou em iminente perigo de morte. O sacerdote que confessou sob licença do pároco deve comunicar-lhe isso. Os fiéis que não cumpram estas prescrições incorrem nas mesmas sanções lateranenses: interdição de entrar na igreja e privação de sepultura eclesiástica298. Aos confessores religiosos é dada liberdade de confessar em toda a Diocese. Contudo, quem se lhes quisesse confessar deveria pedir a licença ao pároco e entregar ofertas estabelecidas à igreja299. ————————

295 Não existem dúvidas de que os autores destes abusos são os religiosos, visto que são esses que gozam dos privilégios papais. Cf. A. CARPIN, «La confessione», 187. 296 Cf. CONC. DE LAMBETH (1281), cap. 7, in Mansi 24, 409. 297 Cf. CONC. DE LAMBETH (1281), cap. 8-9, in Mansi 24, 409-410: «ut in quolibet decanatu unus sit rector, aut vicarius, litteraturae sufficientis illustratus, gratiae famaeque laudabilis assignatus, ad confessorem rectorem, vicariorum, aliorumque sacerdotum, ac ministrorum ecclesiae audiendam, injungendasque poenitentias [...]. Ex hoc minime inhibere intendimus quin possint, si voluerint, ad alios communes poenitentiarios, dum tamen constet, pro sacramento poenitentiae, convolare». 298 Cf. SÍNODO DE EXETER (1287), in Mansi 24, 790. 299 Cf. SÍNODO DE EXETER (1287), in Mansi 24, 792.


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No final dos capítulos sinodais, o Bispo de Exeter juntou uma sintética exposição sobre o modo de confessar e impor penitências. Elencam-se em seguida os casos reservados à autoridade do bispo ou do Papa. Nos casos de dificuldades importantes, os confessores deveriam recorrer ao penitenciário geral ou ao bispo300. O mesmo Sínodo acrescenta que os clérigos suspensos por qualquer crime submeter-se-iam ao tribunal do penitenciário, para expiar a sua falta por uma penitência salutar301. 4.1.12 Estatutos Sinodais francófonos (1284-1289) Em 1284, foi celebrado um Sínodo em Nîmes, sob a presidência do Bispo Bertrando II de Languisel. O livro sinodal foi redigido para suprir as carências culturais e pastorais do clero, desenvolvendo bastante a penitência e a prática penitencial. O texto acerca da penitência manifesta as influências das Sentenças, de Pedro Lombardo, no início e sucessivamente do capítulo XXI, omnis utriusque sexus, do Quarto Concílio Lateranense302. O Sínodo evidencia claramente a sacramentalidade da confissão. Recomenda-se a confissão anual do penitente ao próprio pároco, excepto nas seguintes situações: por especial delegação do bispo; se o pecado cometido numa outra paróquia foi confessado ao pároco daquela paróquia; se o penitente transferiu o seu domicílio para outra paróquia; se o penitente é vagabundo; se existe perigo de morte e não foi possível ter o próprio sacerdote. Neste último caso é possível confessar-se também a um leigo303. Da parte do ministro, prescreve-se que nenhum sa————————

300 Cf. SÍNODO DE EXETER (1287), in Mansi 24, 841-842: «Quia tamen quaedam sun peccata, propter quae debet simplex sacerdos ad papam vel episcopum mittere poenitentem: ea praesenti tractatui utique duximus inserenda: ut auditis talibus mittat sacerdos poenitentem ad episcopum, vel eius poenitentiarium, ut ipse, audito poenitente, discernat utrum ad episcopum absolutio pertineat, vel ad papam debeat ipsum destinare. Sunt autem hi ad papam mittendi, ad absolutionem suscipiendam scilicet». 301 Cf. SÍNODO DE EXETER (1287), in Mansi 24, 818: «Quia vero clerici eam subire non debent: statuimus, ut si tale crimen commiserint, et de eo convicti fuerint judicialiter, propter quod esset laicis solemnis poenitentia injungenda: ab executione sui officii suspendantur, donec per nos, vel superiorem nostrum, secum fuerit dispensatum: huiusmodi autem criminosi clerici, sive laici, ad nostrum poenitentiarium transmittantur: ut praeter poenam in foro iudiciali eis inflictam, propter scandalum, in foro poenitentiali ob ipsum delictum poenitentiam recipiant salutarem». 302 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 189-190. 303 Cf. SÍNODO DE NÎMES (1284), in Mansi 24, 525-526.


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cerdote, regular ou secular, pode absolver um penitente sem a licença do respectivo sacerdote pároco, excepto por licença da parte do bispo, ou iminente necessidade, ou doença do pároco, ou uma grande afluência de fiéis com a relativa impossibilidade de administrar o sacramento304. No caso dos Frades Menores e Pregadores, o concílio concede-lhes a licença de confessar em concomitância com a pregação, mas com a obrigação de comunicar aos párocos os nomes dos penitentes pelo menos na Quaresma e Advento305. Note-se que o sacerdote, antes de confessar um penitente sujeito a uma censura, deve pedir que o mesmo seja absolvido da mesma306. Na acusação dos pecados, o confessor deve verificar se existem alguns reservados ao bispo, e se, assim for, deve enviar o penitente ao mesmo307. No perigo de morte, o sacerdote pode absolver dos casos de excomunhão e interdição, usando a forma da absolvição308. Em todos os casos, o sacerdote deve recordar a obrigação de reparar eventuais injustiças no que é possível. Em caso de cura, e nos casos reservados ao Papa, permanece a obrigação de recorrer pessoalmente ao Papa ou ao seu delegado ou, em caso de dificuldade, ao bispo309. Os Estatutos Sinodais de Liège, redigidos pelo Bispo Johannes IV de Flandres, dedicam um longo capítulo à confissão. Baseia-se sobretudo nos Estatutos Sinodais de Münster (1279)310. Afirmam a necessidade de enviar o penitente ao bispo para os casos reservados, excepto em caso de especial licença ou em iminência de morte311. Não fazem referência à existência de um penitenciário. Os Estatutos Sinodais de Cahors, Rodez e Tulle, dioceses sufragâneas de de Bruges, foram promulgados em 1289 por Raimundo de Calmont, Bispo de Rodez. Posteriormente, foram retomados pelo Sínodo de Cahors, em 1320, presidido pelo Bispo Guilherme V de Broue, como pelo sínodo de Tulle no mesmo ano312. ———————— 304 305 306 307 308 309 310 311

Cf. SÍNODO DE NÎMES (1284), in Mansi 24, 526-527. Cf. SÍNODO DE NÎMES (1284), in Mansi 24, 533. Cf. SÍNODO DE NÎMES (1284), in Mansi 24, 527. Cf. SÍNODO DE NÎMES (1284), in Mansi 24, 529-530, 533-534. Cf. SÍNODO DE NÎMES (1284), in Mansi 24, 558-559. Cf. SÍNODO DE NÎMES (1284), in Mansi 24, 559-560. Cf. A. CARPIN, «La confessione», 209-211. Cf. SÍNODO DE LIÈGE (1287), cap. 21, in Mansi 24, 891: «In his autem mittant presbyteri ad episcopum absolvendos, nec absolvant eos, nisi de nostra speciali licentia, vel nisi in articulo mortis». 312 Cf. SÍNODO DE CAHORS, RODEZ E TULLE (1289), in Mansi 24, 963-1056; A. CARPIN, «La confessione», 211-228.


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O ministro do sacramento da penitência é quem, por vontade e autoridade de Cristo, tem o poder das chaves de absolver os pecados. O poder de absolver os pecados é sujeito no seu exercício à autoridade episcopal. Por isso, para confessar, é necessário o poder sacramental e a legítima jurisdição. Esta jurisdição deriva quer do direito canónico quer por delegação. Em caso de necessidade, admitia-se a confissão a um leigo em comunhão com a Igreja, não como sacramento, mas por obra da fé do sujeito no sacramento. Nesta circunstância, o penitente manifestava assim a sua vontade de confessar-se ao sacerdote313. Os Frades Pregadores e Menores, escolhidos pelos seus superiores e apresentados ao bispo ou ao seu oficial, devem ser livres para a pregação e confissão, mas não podem absolver os casos reservados ao bispo sem especial licença314. Em seguida, desenvolve-se a questão dos casos reservados ao bispo315. Não se fala de penitenciário, mas a referência a um oficial faz entender a presença de alguém que ajude o bispo nestas funções. Contudo, não se explicita como e que poderes tem. São enumerados os casos em que é possível confessar-se sem licença do próprio sacerdote316. Se entre os pecados confessados alguns entram nos casos reservados, o confessor é obrigado a avisar o penitente que não tem faculdade para absolvê-los. Também o confessor deve saber a que pecados se estende a sua faculdade e quais os casos reservados ao bispo, ao qual deve enviar o penitente317. Na parte relativa à confissão dos doentes, estes estatutos retomam quase à letra as normas do Sínodo de Nîmes (1284). O mesmo acontece nas normas relativas à absolvição das censuras eclesiásticas em perigo de morte318. 4.1.13 Estatutos Sinodais de Würsburg (1298) Os Estatutos Sinodais de Würsburg foram redigidos em 1298 pelo Bispo Mangold von Neuenburg. As primeiras indicações relativas à ———————— 313 314 315

992.

316 317 318

Cf. SÍNODO DE CAHORS, RODEZ E TULLE (1289), cap. 8, in Mansi 24, 979. Cf. SÍNODO DE CAHORS, RODEZ E TULLE (1289), cap. 8, in Mansi 24, 980-981. Cf. SÍNODO DE CAHORS, RODEZ E TULLE (1289), cap. 14, in Mansi 24, 984-

Cf. SÍNODO DE CAHORS, RODEZ E TULLE (1289), cap. 14, in Mansi 24, 985. Cf. SÍNODO DE CAHORS, RODEZ E TULLE (1289), cap. 14, in Mansi 24, 985. Cf. SÍNODO DE CAHORS, RODEZ E TULLE (1289), cap. 14, in Mansi 24, 10401041; SÍNODO DE NÎMES (1284), in Mansi 24, 558-559.


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confissão aparecem na parte dedicada à extrema-unção e cura dos doentes, visto que se fala da faculdade concedida a qualquer sacerdote de absolver de tudo aquilo que pode quem está moribundo319. Na parte dedicada à confissão, retoma-se a norma lateranense que estabelece a obrigação da confissão anual ao próprio sacerdote ou a outro com licença do próprio. Quando se prescreve a salvaguarda do segredo confessional, precisa-se melhor a modalidade relativa aos casos reservados à competência episcopal320. Aqui aparece o texto exacto com o qual se devia escrever a carta para a absolvição dos casos reservados ao bispo. Este sínodo representa um avanço nesta prática, porque proíbe de se fazer qualquer menção directa aos pecados confessados na carta que acompanha o penitente, impondo, pelo contrário, o uso de uma fórmula genérica. Pretendia-se a protecção do segredo confessional em modo absoluto. A sanção canónica atribuída era a mesma que aquela indicada para a violação do sigilo sacramental. Deste modo, a Igreja alemã exige uma prática diversa da igreja inglesa321. Por fim, referem-se os casos reservados à autoridade episcopal e a possível licença especial. Proíbem-se os sacerdotes, seculares ou religiosos, de confessarem os casos reservados ao bispo ou ao Papa, a não ser por dispensa especial322. ————————

319 Cf. SÍNODO DE WÜRSBURG (1298), cap. 19, in Mansi 24, 1195. Retomam-se as normas emanadas pelo SÍNODO DE ROUEN (1235), cap. 77, in Mansi 23, 386; A. CARPIN, «La confessione», 228-233. 320 Cf. SÍNODO DE WÜRSBURG (1298), cap. 21, in Mansi 24, 1196: «Sunt tamen nonnulli, qui ignorantiae caecitate seducti, cum ad nos in illis articulis, in quibus nobis tanquam episcopo ius dispensandi competit, parochianos illorum cum litteris suis transmittunt, et nude scribere non verentur: tales ad vos mittimus, qui nobis talia crimina sunt confessi in quibus vobis ius competit dispensandi, unde petimus, etc. quod sub praemissa poena fieri de caetero prohibemus, cum per hoc confessiones certissime prodere videantur, sed sic in genere scribant: talem ad vos mittimus, qui perpretravit quemdam casum, cuius ad vos dispensatio dignoscitur pertinere etc. et ex tunc ille missus ad nos veniens illum casum nobis vel poenitentiario nostro non desinat confiteri». 321 A prática usada nos sínodos ingleses era a de escrever na carta que acompanhava o penitente os pecados cometidos e as suas circunstâncias para se obter a absolvição do bispo ou do seu penitenciário. Tal prática não era tida como violação do segredo confessional. Cf. EDMOND RICH, Constitutiones Provinciales, cap. 20, 28, in Mansi, 23, 422, 424; RICHARD WICH, Statuta Synodalia, in Mansi 23, 706; A. CARPIN, «La confessione», 230-232. 322 Cf. SÍNODO DE WÜRSBURG (1298), cap. 21, in Mansi 24, 1200-1202.


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4.2 Magistério pontifício e a jurisdição da penitência 4.2.1 Penitenciários Papais De acordo com a opinião de Göller, antes que se organizasse um órgão com poderes especiais, os penitenciários já existiam há muito tempo em Roma, como demonstra a prática penitencial da alta Idade Média, embora seja impossível encontrar um nome de um penitenciário desta época323. Existem testemunhos conciliares do início do século XI, como a do Concílio de Limoges, em que os bispos enviavam os penitentes culpados de delitos particulares à Sé Apostólica, sem que isso lhes retirasse a jurisdição324. Neste caso, não se pode confundir a peregrinação devocional com a penitencial, também chamadas de judiciárias ou expiatórias. A influência histórica dos peregrinos sobre a origem da Penitenciaria é conhecida e já desenvolvemos previamente. Os documentos daí resultantes, datados entre 996 e 1030, seriam respondidos e redigidos por um colaborador do Papa «in audiendis confessionibus et penitentiis iniungendis», como estabeleceria o Concílio de Latrão IV para os bispos325. De igual modo, as Constituições Sinodais de Odão de Paris (1197 ca.) referem-se claramente a um vigário do Papa para a absolvição das faltas reservadas ao mesmo326. Portanto, pode-se afirmar com certeza que o penitenciário do Papa existia já nos séculos X-XI. Redigia em nome do Papa as cartas penitenciais e judiciais que seriam entregues pelo próprio e munidas do próprio selo de cera: «sigillo de cera rubea pendenti parvo laqueo de filo nigro et croceo torto more penitentiarum Romane Curie»327. ———————— 323 324

Cf. E. GÖLLER, Die päpstliche Pöenitentiarie, 129. Cf. CONC. DE LIMOGES II (1031), sessio II, in Mansi 19, 546-547: «De peregrinationibus paenitentium ad Sedem romanam pro absolutionem delictorum, episcopi potius culpabiles sunt, nisi litteris suis papae notum faciant». 325 Cf. CONC. DE LATRÃO IV (1215), can. 10, in Mansi 22, 999; F. TAMBURINI, «La Pénitencerie Apostolique», 455. 326 Cf. ODÃO DE PARIS, Synodicae Constitutiones, cap. VI, 6, in Mansi 22, 678: «Sunt tria in quibus nullus habet potestatem absolvendi, nisi dominus papa vel eius vicarius, nisi in necessitate; scilicet in injectione manuum in clericos vel quosvis religiosos, in incendio, per quam sententiam sunt vocati simoniaci: nihilo minus tamen talium rei remittenti ad episcopum». 327 Esta descrição advém de uma cópia notariada de uma carta do irmão Galfridus, penitenciário oficial de Martinho IV, expedida de Orvieto a 15 de Setembro de 1282 e recebida em Cantuária a 3 de Dezembro de 1282. Cf. C. CHENEY, Notaries Public in England, 166-167.


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No entanto, somente no século XI se conhecem alguns dos primeiros penitenciários. Pode-se apontar como primeiro exemplo o caso do Cardeal Eudes de Châtillon ou Lagery, Bispo de Óstia, legado de Gregório VII em Constância e futuro papa Urbano I, que promoveu alguns sacerdotes em 1084 a escutar confissões segundo a autoridade apostólica328. Mais tarde, um clérigo inglês, Walter Map, relata como no Concílio de Latrão III (1179) recebeu o encargo de interrogar dois valdenses acerca de questões de fé, segundo a delegação dada por um cardeal anónimo, a que Alexandre III tinha confiado o cuidado das confissões «cui etiam ille maximus papa confessionem curam iniunxerat»329. No pontificado de Celestino III (1191-1198) encontramos o Cardeal Giovanni de S. Paulo tituli S. Priscae, que, conforme relata Geraldo Cambrensis, «confessiones pro papa recipiebat»330. Mais tarde, surge o caso da carta de absolvição do cisterciense Nicola da Casamari, penitenciário de Honório III, assinada por ele como «Frater Nicolaus domini papae penitentiarius». Um outro documento contém a comunicação feita por ele, em nome do Cardeal Giacomo Guala Bicchieri (†1227), da absolvição concedida aos clérigos partidários do príncipe Luís, filho do Rei de França Filipe II, que tinham celebrado os ofícios apesar da interdição, incorrendo deste modo em excomunhão e suspensão a divinis331. Bento XII (†1342) testemunha ————————

328 Cf. «Bernoldi Chronicon A. 1084», 441: «Kal. Ianuarii consecravit, quem predie, id est in festivitate sancti Thomae, cum aliis clericis fecit; inter quos et horum chronicorum scriptorem in eadem solemnitate ad presbiterium promovit, eique potestatem ad suscipiendam penitentes ex apostolica auctoritate concessit». 329 W. MAP, «De nugis curialium», 60. Tratar-se-ia do Cardeal Pietro, beneditino, Cardeal Bispo de França em 1179 e Metropolita de Bruges em 1180, enviado diversas vezes a França entre 1178 e 1179 como cardeal a latere . Cf. J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 30. 330 G. CAMBRENSIS, «De invectionibus», 228: «Erat autem cardinalis qui confessionibus pro papa tunc recipiebat, responsio talis: Iohannes a S. Paulo, tit. S. Priscae cardinalis nobili viro Philippo de Barri, salutem». 331 No final da carta, escreve assim: «Ego frater Nicolaus (penitentiarius domini papae) dedi et scripsi manu propria et proprio sigilo sigilavi». Daqui se deduz que os penitenciários menores tinham os próprios selos e redigiam os próprios documentos sem depender de outra instituição. Cf. Regesta Honorii papae III, 151, nt. 893: «I. quodam Abbati Latinacensi. Confirmat absolutionem ab excommunicationis sententia quam prior conventus Latiniacensis in eum promulgaverat, quae absolutio a Nycholao monacho Casemarii tunc Papae poenitentiario concessa fuit»; F. TAMBURINI, «La Pénitencerie Apostolique», 453-454.


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igualmente que leu em qualquer livro que o ofício dos penitenciários era exercida na antiguidade por presbíteros cardeais332. No séc. XIII, a documentação confirma a existência de privilégios associados aos penitenciários – como o primeiro lugar no cortejo papal, precedendo o vice-chanceler e o pessoal da chancelaria, igualmente eram eles que escreviam a data nas cartas confessionais durante o período precedente à consagração episcopal do novo Papa eleito, acompanhavam os legados pontifícios munidos de faculdades especiais – o que pressupõe um longo período de desenvolvimento e evolução dos penitenciários pontificais até ao ponto em que foram agrupados em colégio e parte integrante da Cúria Romana333. É certo que o título poenitentiarius não foi usado antes de 1200, embora já existisse como instituição. A função posterior da Penitenciaria era realizada, nesta época, ad actum por um sacerdote que recebia a função de resolver os casos complicados334. Note-se que a Penitenciaria terá nascido por volta de 1250, como ofício burocrático para a resolução de casos reservados à Sé Apostólica no foro externo, e de outros delitos entendidos como graves da parte dos bispos, para os quais existia a reserva episcopal e a prática das peregrinações penitenciais a Roma335. A instituição primitiva dos padres penitenciários nos primeiros séculos da Roma cristã passou durante a Alta Idade Média – existe aqui uma continuidade do discurso histórico – à figura do penitenciário menor pontifício (a partir do século XIII sempre um cisterciense ou um membro de uma ordem mendicante até a que os penitenciários fossem constituídos em colégio por causa do aumento do seu número) e, em seguida, nos séculos XII e XIII, à formação do órgão burocrático da Penitenciaria Apostólica, tendo à sua frente o cardeal penitenciário maior336.

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332 Esse testemunho é transcrito por E. GÖLLER, Die päpstliche Pöenitentiarie, I/II, 178: «officium penitentiarorum exercebatur antiquitus per presbiteros cardinales». 333 Cf. F. TAMBURINI, «La Pénitencerie Apostolique», 453. 334 Cf. J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 31. 335 Cf. J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 48. 336 Cf. F. TAMBURINI, «La Pénitencerie Apostolique», 459: «On peut ainsi conclure cette brève étude en affirmant que de l’institution primitive des prêtres pénitenciers dans les premiers siècles de la Rome chrétienne, on est passé dans de haut Moyen âge – mais il existe ici une continuité dans le discours historique – à la figure du pénitencier mineur pontifical (à partir du XIIIe siècle toujours un cistercien ou un membre d’un ordre mendiant jusqu’à ce que les pénitenciers soient constitués en collège à cause de l’augmentation de leur nombre) et ensuite, aux XIIe et XIIIe siècles, à la forma-


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Em 1204, faz-se referência pela primeira vez a um penitenciário do Papa Inocêncio III337, provavelmente o Cardeal Hugo de S. Martinho, possivelmente o célebre Ugúcio, que teve a faculdade do Pontífice de absolver os assassinos de Konrad, Bispo de Würsburg, vindos a Roma para obter a absolvição338. O primeiro cardeal penitenciário é seguramente Nicolò de Romanis, Bispo de Frascati339. Foi legado a latere na Inglaterra, em 1213, como Romanae curiae poenitentiarius e numa carta escrita entre 1212 e 1219 pode-se ler como ele absolveu o assassino do Bispo Berengário de Tarragona, morto em 1194340. Numa carta de 1230, Gregório IX (12271249) trata o mesmo como «poenitentiarius felicis recordationis Honorii papae predecessoris nostri», o que faz entender a sua estabilidade no ofício341. O primeiro cardeal que se pode conceber como penitenciário geral foi Hugo de Saint-Cher (†1263)342. Numa Bula de Clemente IV, o Papa chama-o paenitentiarius generalis do seu predecessor Urbano IV, porque «a sententiis posset absolvere generalis, si aliud non obstaret», que teria faculdades mais alargadas que os outros343. A partir de 1230, este Cardeal possuía o mandato de tratar certos casos sem consulta prévia do Papa344. O lema «maior» somente se torna usual nos finais do século XIII. A partir de Gregório X (1271-1276), o cardeal penitenciário começou a ocupar uma posição de realce, e com Nicolau III (1277-1280) os penitenciários menores eram reunidos numa casa comum na Praça de S. Pedro e colocados sob a autoridade do penitenciário maior345. A figura do cardeal penitenciário nasce no contexto da reforma gregoriana e da evolução do direito canónico. O penitenciário era um ma————————

tion de l’organe bureaucratique de la Pénitencerie apostolique, ayant à sa tête le cardinal pénitencier majeur». 337 Cf. INOCÊNCIO III, Regestorum, VI, in PL 215, 10: «verum idem W., in poenitentiarii nostri praesentia constitutus, paupertatem nimiam allegavit, asserens quod non posset Jerosolimitanam provinciam visitare». 338 Cf. INOCÊNCIO III, Regestorum, VI, in PL 215, 54-55; J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 32. 339 Cf. C. EUBEL, Hierarchia Catholica, 38. 340 Cf. E. GÖLLER, Die päpstliche Pöenitentiarie, 82. 341 Cf. E. GÖLLER, Die päpstliche Pöenitentiarie, 83. 342 Cf. C. EUBEL, Hierarchia Catholica, 7. 343 CLEMENTE IV, Bula A via rectitudinis, 19 Dezembro 1267, 274; 344 Cf. E. GÖLLER, Die päpstliche Pöenitentiarie, 121-122. 345 Cf. J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 34.


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gistrado e não um confessor. Com o nascimento do direito canónico como ciência autónoma em Graciano, aparecem na Cúria juízes profissionais. Devido ao impacto social dos enormia, esses pecados crimes eram tirados do foro interno. Por isso se justifica o nascimento de um Tribunal da Consciência, no qual era fundamental o comportamento do penitente perante a comunidade e diante de Deus346. 4.2.2 Papa Inocêncio III (1198-1216) O aparecimento de um cardeal penitenciário no pontificado de Inocêncio III constitui uma possibilidade, tendo em conta as mudanças na concepção da jurisdição episcopal e papal durante o seu pontificado, sobretudo no que diz respeito à libertação da ingerência laica, por meio da centralização. A ele se deve sobretudo a definição dos conceitos de plenitudo potestatis, reservada unicamente ao Romano Pontífice, e de pars sollicitudinis, por meio da qual se concede a outros a participação no poder da Sé Apostólica, mas em modo restrito. O próprio Papa justifica que estaria humanamente sobrecarregado se devesse tratar de todos os casos pessoalmente. As delegações concedidas a latere por Inocêncio III não pretenderam interferir minimamente com a jurisdição episcopal. Mais precisamente, os autores são do parecer que concedia aos delegados a latere uma função especial, porque estava convencido de que a jurisdição episcopal normal já funcionasse como representação do papa para todos os efeitos e em todo o mundo347. 4.2.3 Papa Honório III (1216-1227) A 4 de Fevereiro de 1221, o Papa Honório III escreveu a Bula Cum qui recipit prophetam, com a qual recomenda aos arcebispos, bispos e prelados consentirem em que os frades da Ordem dos Pregadores exercessem livremente o ministério da pregação nas suas dioceses e de lhes confiar também a administração do sacramento da penitência348. Apesar ———————— 346 347

J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 48-50. Cf. J. ICKX, «Ipsa vero officii maioris», 35-36; K. Schatz, «Papsttum und partikularkirchliche Gewalt bei Innozenz III», 86-89. 348 Cf. HONÓRIO III, Bula Cum qui recipit prophetam, 4 Fevereiro 1221, 145-146: «Hinc est quod dilectos filios fratres ordinis Predicatorum qui paupertatem et vitam regularem professi verbi Dei sunt evangelizationi totaliter deputati vobis duximus propensius commendandos, universitatem vestram rogantes et hortantes attentius ac per apostolica vobis scripta mandantes quatenus, cum ad patres vestras accesserint, ad predicandi officium ad quod deputati sunt caritative recipiatis eosdem, et populos


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das dúvidas, o documento parece autêntico. O Papa não conferia à Ordem esta faculdade, mas dirigia-se aos bispos para que lha concedessem dentro do seu território diocesano. Contudo, permanecia o problema da amplitude desta faculdade. Na prática, isso não dispensava os fiéis de pedir a licença ao próprio sacerdote-pároco, como estabelecia o Concílio Lateranense. Apenas se abre a faculdade, superando a jurisdição paroquial. O documento reveste-se de importância, porque envolve todas as dioceses, reconhecendo à Ordem dos Pregadores uma missão reservada aos bispos. Na verdade, trata-se de uma cooperação no ministério episcopal, e, como consequência, uma aplicação concreta do Concílio Lateranense349. 4.2.4 Papa Gregório IX (1227-1241) Gregório IX, ao incentivar o ministério pastoral de franciscanos e dominicanos com os quais mantém uma forte ligação de amizade, defende com energia o ministério penitencial dos religiosos. Não é por acaso que a recolha das suas Decretales seja entregue a um jurista da Ordem dos Pregadores, Raimundo de Penhaforte, e que nessas apareçam dois capítulos, no título XXXI, contra os absusos dos prelados em relação aos religiosos em geral350 e aos Frades Menores e Pregadores em particular351. A 21 de Abril de 1227, Gregório IX352 escreve uma carta ao Bispo e aos Prelados de Olmütz, na Morávia, recomendando-lhes os Frades Pregadores para que exercessem livremente o seu ministério da pregação e confissão353. A faculdade de escutar confissões e absolver é con————————

vobis commissos ut ex ore ipsorem verbi Dei semen devote suscipiant sedulo admonentes pro divina et nostra reverentia in suis eis necessitatibus liberaliter assistatis, benigne permittentes presbiteris eorumde, cum expedierit penitentium confessiones audire et consilium eis iniungere salutare, cum iidem fratres animarum intendentes profectibus discretos et cautos dirigant sacerdotes per quos salutare potest consilium preberi et remedium adhiberi et propter occasiones multiplices partiri expediat interdum in alios sollicitudinem pastoralem, illum autem super hiis studentes eis exhibere favorem ut, per cooperationem vestram suscepti ministerii cursum feliciter consummando optatum reportent sui laboris fructum et finem, salutem vidilicet animarum». 349 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 84-88. 350 X. 5, 31, 16. 351 X. 5, 31, 17. 352 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 102-111. 353 Cf. GREGÓRIO IX, Bula Quoniam abundavit iniquitas, 6 Abril 1237, in BF, I, 4142: «Nos igitur, sanctum eorum propositum et necessarium ministerium favore benevo-


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cedida directamente pelo Papa, superando a jurisdição territorial. A sua faculdade é, assim, quase igual à dos bispos, ao menos como fructuosa colaboração com o ministério episcopal. Existe grande semelhança com a Bula Cum qui recipit prophetam, de Honório III. A diferença está no facto de que Honório III concedia a faculdade aos bispos para que a concedessem aos Frades Pregadores, enquanto que Gregório IX a concede directamente. A 8 de Março de 1233, o mesmo Pontífice concede aos frades dominicanos, por meio do prior provincial da Polónia, a faculdade de absolver alguns pecados reservados à Sé Apostólica, como o incêndio das igrejas, e a violência física contra o clero secular e religioso, que implicavam excomunhão latae sententiae354. A 5 de Agosto de 1233, Gregório IX concede ao dominicano Giovanni da Vicenza a faculdade de absolver, em determinadas condições, quem incorresse na excomunhão papal nos casos de limitação da liberdade eclesiástica e violência física. Tal não era concedido nos casos de mutilação ou de morte, mantendo-se o recurso à Sé Apostólica355. A 16 de Maio de 1237, Gregório IX concede a Jordão de Saxónia, Mestre da mesma Ordem, a especial faculdade de pregar e de confessar em toda a parte os penitentes, à excepção de alguns pecados graves reservados à Sé Apostólica ou ao bispo diocesano356. ————————

lo prosequentes, universitati vestri ipsos affectuose duximus commendandos, caritatem vestram rogantes et exhortantes in Domino ac per apostolica vobis scripta mandantes quatinus dilectos filios fratres ordinis memorati pro reverentia divina ad officium predicandi ad quod deputati sunt, recipiatis benigne, ac populos vobis commissos, ut ex ore ipsorum verbi Dei semen devote suscipiant et confiteantur eisdem, cum ipsis auctoritate nostra liceat confessiones audire ac poenitentias iniungere, sedulo ammonentes por nostra et apostolica Sedis reverentia in suis eis necessitatibus assistatis [...], et dicti fratres per cooperationem vestram suscepti ministerii cursum felicius consumando optatum reportent sui laboris fructum et finem, salutem videlicet animarum». 354 Cf. GREGÓRIO IX, Bula Ut fidei vestrae puritas, 8 Março 1233, in BP, I, 44-45. 355 Cf. GREGÓRIO IX, Bula Mirificantes, 5 Agosto 1233, in BP, I, 58. No mesmo dia, o Papa concedia ao mesmo frade a faculdade de absolver da excomunhão Ezzelino III da Romano, senhor de Verona, e os seus seguidores, depois de ter recebido suficientes garantias para concluir a paz com a Igreja, instaurada em Paquara a 23 de Agosto, mas mantida apenas 10 dias. A mesma faculdade será concedida a 8 de Fevereiro de 1236 a Raimundo de Penhaforte, confessor e capelão papal, a favor de Tiago, Rei de Aragão, e de 8 de Fevereiro a 2 de Abril de 1237 a favor do Conde Roberto do Castel Rossilone (Gallia Norbonense). Cf. Bullarium Ordinis FF. Praedicatorum, I, 59, 83, 91-92. A. CARPIN, «La confessione tra il XII e il XIII secolo», 111. 356 Cf. GREGÓRIO IX, Bula «Descendentes olim, 16 Maio 1233, in BP, I 19: «Ut autem commissum tibi officium utilius prosequaris, licentiam tibi concedimus, ut cum


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A 6 de Abril de 1237, com uma réplica da Bula Quoniam abundavit iniquitas, Gregório IX concede a mesma faculdade de confessar à Ordem dos Frades Menores357. Nesta concessão, o Pontífice limita-se a endereçar aos bispos a recomendação e o não impedimento da realização deste ministério. Esta concessão tardia deve-se ao carácter prevalentemente laical do movimento franciscano358. 4.2.5 Papa Inocêncio IV (1243-1254) A 24 de Março de 1244, o Papa Inocêncio IV enviou uma Bula a todos os arcebispos, bispos e prelados eclesiásticos em que recomendava os frades dominicanos para o ministério da pregação e confissão. A Bula reprende, com qualquer modificação, a Bula Quoniam abundavit iniquitas de Gregório IX359. Diversamente do Papa Gregório IX, que concedia directamente a jurisdição de confessar aos dominicanos da sua autoridade, o Papa Inocêncio IV limita-se a recomendar aos bispos e outros prelados que não impeçam os fiéis que escutaram a pregação dos frades dominicanos de se confessarem a eles. Tal normativa proporcionou um conflito entre clero secular e religioso360. No entanto, o próprio Papa concedeu a faculdade geral de confessar todos os fiéis a alguns frades, na Bula de 26 de Março de 1247 dirigida ao Mestre e Priores da Ordem dos Pregadores, exceptuando os frades da Ordem, sem a licença dos seus superiores361. ————————

expedire videri, confessiones penitentium possis audire, ac eis satisfactionem pro commissis injungere salutarem, nisi forsitam aliquorum ita graves fuerint et enormes excessus, quod sint merito ad Sedem Apostolicam, vel Dioecesanum Episcopum remittendi». 357 Cf. GREGÓRIO IX, Bula Quoniam abundavit iniquitas, 6 Abril 1233, in BF, I, 214-215. 358 Cf. R. RUSCONI, L’ordine dei peccati, 120-131. O processo de transformação culmina com a deposição em 1239 de frei Elias e com ascensão ao geral dos ministros provinciais de Inglaterra de Alberto de Pisa e depois Haym de Facersham (12401244) que proíbe então os leigos de assumirem encargos no governo de Ordem. Dá-se então uma crescente sacerdotalização dos Frades Menores, e com isso a intensificação do ministério da pregação e confissão. Surgem então problemas de jurisdição em relação ao clero secular. Como solução, constroem-se igrejas conventuais nos centros urbanos para acolher os fiéis na pregação e nas confissões. G.G. MEERSSEMAN, L’architecture dominicaine au XIIIe siècle, 158-190. 359 Cf. INOCÊNCIO IV, Bula Quoniam abundavit iniquitas, 24 Março 1244, in Arquivum fratrum Praedicatorum 34 (1964) 41-42. 360 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 141-142. 361 Cf. INOCÊNCIO IV, Bula Cum Supernae lucis, 26 Março 1247, in BP, I, 173.


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A 23 de Julho de 1253, o mesmo Pontífice escreveu uma Bula362 aos frades da Ordem dos Pregadores que trabalhavam em terras de missão, concedendo-lhes vários privilégios, entre os quais, a faculdade de confessar e absolver as censuras eclesiásticas. Contudo, a 21 de Novembro de 1254363, Inocêncio IV privou os frades dominicanos e menores destes privilégios, por causa de supostos abusos cometidos por parte destes, proibindo os religiosos de pregar e confessar os fiéis sem a licença da parte dos respectivos párocos. 4.2.6 Papa Alexandre IV (1254-1261) Um dos primeiros actos de governo de Alexandre IV foi a revogação da Bula Etsi animarum do seu predecessor, por meio da Bula Nec insolitum est de 31 de Dezembro de 1254364. Nesta se afirma que a faculdade de confessar dos religiosos não estava sujeita à licença prévia do sacerdote do lugar. Supera-se assim claramente a norma lateranense. No entanto, os conflitos entre clero secular e religioso acentuam-se. A 14 de Abril de 1255, com a Bula Quasi lignum vitae365, Alexandre IV anulou todas as proibições relativas aos dominicanos na lecionação universitária. A 2 de Outubro de 1255, os professores seculares ameaçaram abandonarem Paris se o Papa não recuasse, o que não aconteceu. Guilherme do Santo Amor recusou-se aceitar as decisões papais, alimentando a polémica contra os dominicanos. Em defesa destes, surge São Tomás de Aquino com o opúsculo Contra impugnantes Dei cultum et religionem366, em que recusa a incompatibilidade da vida religiosa com ———————— 362

Cf. INOCÊNCIO IV, Bula Cum hora undicesima, 23 Julho 1253, in BP, I, 237: «Sit etiam vobis licitum omnium fidelium in terris praedictis confessiones audire, ac ipsis injungere poenitentias salutares, et excommunicatos a Canone, vel alio modo, iuxta formam Ecclesiae, absolvere; dummodo injuriam, et damna passis satisfaciant competenter». 363 Cf. INOCÊNCIO IV, Bula Etsi animarum affectantes, 21 Novembro 1253, in Regesta Pontificum Romanorum, 1280: «Religiosis cuiuscumque professionis vel ordinis mandat, ne alienos parochianos diebus dominicis et festivis in suis ecclesiis recipiant nec ipsos sine licentia parochi ad confessionem admittant». 364 Cf. ALEXANDRE IV, Bula Nec insolitum est, 31 Dezembro 1254, in BP, I, 267. 365 Cf. ALEXANDRE IV, Bula Quasi lignum vitae, 14 Abril 1255, BR, 3, 602-607. 366 Cf. TOMÁS DE AQUINO, Contra impugnantes, 4, § 13, n. 4. Contra os religiosos argumentava-se com razões históricas (Decretum Gratiani, Concílio de Latrão IV, cap. 21), e nega-se que possam confessar em qualquer parte, pois teriam uma jurisdição superior à dos bispos. Por outro lado, a responsabilidade pastoral de uma paróquia pertence ao seu pároco, pelo que os bispos não poderiam conceder esta faculdade. Não pode ser um privilégio da Sé Apostólica, pois prejudica os di-


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o ensino universitário, da vida conventual com a pregação e confissão, com o abandono do ministério laboral, por meio da prática da pobreza radical e da mendicidade. O papa acabou por condenar Guilherme do Santo Amor a 5 de Outubro de 1256. Na tentativa de acalmar as contendas, o Mestre da Ordem Dominicana, Humbert de Romans, recomendou aos frades que se abstivessem de contendas e que respeitassem os direitos de bispos e párocos. Pediu que solicitassem igualmente as eventuais autorizações dos bispos e párocos, apesar da aprovação papal367. Alexandre IV precisa a questão por meio da Bula Cum olim quidam, de 18 de Maio de 1259368, endereçada ao mesmo Mestre Geral. Declara-se que, para o ministério de pregação e confissão, é suficiente a licença do bispo do lugar, por concessão papal. Trata-se de um privilégio papal, mas sujeito à jurisdição territorial episcopal. Por outro lado, reconheciam-se às Ordens Mendicantes as exigências apostólicas, uma faculdade que não derivava de cada bispo. Supera-se a normativa lateranense, porque a licença concedida aos religiosos não depende do pároco do fiel, mas do bispo por causa do privilégio papal. Doravante, será o religioso a pedir ao bispo do lugar e não o fiel ao próprio pároco. Mais tarde e na mesma linha de acção, a 18 de Março de 1261, Alexandre IV escreve ao episcopado da Alemanha, Boémia, Morávia e Polónia, permitindo aos dominicanos pregar e confessar sem a proibição arbitrária de algum bispo369. ————————

reitos dos outros. Por fim, não é lícito pedir este poder de confessar aos párocos e bispos, pois tal seria um acto de ambição. Em resposta, Tomás de Aquino defende a faculdade dos religiosos. Em primeiro lugar, são os bispos que têm poder pleno nas suas dioceses e todo o poder dos párocos é conferido pelos bispos. Em segundo lugar, os religiosos são idóneos em força da sua ordenação e pela preparação espiritual. Em terceiro lugar, os religiosos estão livres para pregar e confessar, podendo ajudar os párocos nesta missão, para a qual nem sempre têm disponibilidade e preparação. Por fim, os religiosos são de grande ajuda ao bem de toda a Igreja e à cooperação com os bispos. Cf. A. CARPIN, «La confessione tra il XII e il XIII secolo», 149-154. 367 Cf. HUMBERTO DE ROMANS, Ep. 7, 24. 368 Cf. ALEXANDRE IV, Bula Cum olim quidam, 18 Maio 1259, in BP, I, 369. Cf. A. CARPIN, «La confessione», 154-156. 369 Cf. ALEXANDRE IV, Bula Plantatus olim in agro, 18 Março 1261, in BP, I, 405. Também Urbano IV confirmou os privilégios concedidos pelos seus predecessores. Cf. URBANO IV, Bula Cum a nobis petitur, 12 Setembro 1263, in Bullarium Cherubini, I, 152.


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4.2.7 Papa Clemente IV (1265-1268) A 20 de Junho de 1265, o Papa Clemente IV enviou a Giovanni da Vercelli, Mestre Geral da Ordem dos Pregadores a Bula Quidam temere370, que retomava a Bula Cum olim quidam, de Alexandre IV, com algumas modificações. A situação conflituosa entre o clero secular e religioso mantinha-se. Os párocos exigiam agora que os religiosos pedissem licença não só para confessar, como também para pregar. Clemente IV reafirma que a licença requerida aos religiosos é exclusivamente a episcopal. Todavia, precisa-se que a faculdade concedida aos religiosos não compreende os casos reservados à Sé Apostólica, aos Legados Pontifícios ou aos Ordinários do lugar. Para a absolvição dos casos reservados, requer-se uma especial concessão371. 4.2.8 Papa Martinho IV (1281-1285) A 10 de Janeiro de 1282, o Papa Martinho IV escreveu ao Mestre Geral e Mestres Provinciais da Ordem dos Pregadores e aos Ministros Provinciais da Ordem dos Menores, concedendo aos frades teologicamente preparados a mais ampla liberdade no âmbito pastoral do exercício da pregação e confissão372. Trata-se de uma faculdade que subtrai os frades à jurisdição episcopal. Proíbe-se igualmente de interditar aos frades o exercício do ministério da pregação e confissão, desde que tenham legítima concessão. Contudo, respeita-se a normativa lateranense em que se obriga os fiéis a confessarem-se anualmente aos próprios párocos, mas liberta-se os frades dos limites de jurisdição. Nada se afirma acerca dos casos reservados à autoridade episcopal373. ———————— 370

Cf. CLEMENTE IV, Bula Quidam temere, 20 Junho 1265, in A. CARPIN, «La confessione», 166-169. 371 Cf. CLEMENTE IV, Bula Quidam temere, 20 Junho 1265, in A. CARPIN, «La confessione», 168: «libere praedicare potestis, audire confessiones, et absolvere vobis confintentes, ac paenitentias vobis confitentibus injungere salutares, aliorum inferiorum Prelatorum, et Rectorum Ecclesiarum, Sacerdotum Parochialium assensu nullatenus requisito, illis casis exceptis, qui de iure, consuetudine, seu retentione, ab eis specialiter facta, Sedi, Legatis, et Ordinariis praedictis, specialiter relinquuntur, ad quos non licet vos manus extendere, nisi vobis specialiter committantur» 372 Cf. A. CARPIN, «La confessione», 183-186. 373 Martinho IV, Ep. I ad Fratres Minores, 10 Janeiro 1280, in Mansi 24, 388-389: «ut fratres eiusdem ordinis, praedicationis et audiendi confessiones officia eo liberius et efficacius exequi valeant... commitendi auctoritate apostolica fratribus eiusdem ordinis sacra pagina eruditis, examinatis et approbatis a vobis, praedicationis officium,


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As Ordens Mendicantes acederam com cautela a esta tão grande concessão pontifícia. Os capítulos gerais das duas Ordens realizados em 1282 decidiram-se por uma série de limitações penitenciais. Convida-se a respeitar as disposições papais, a não generalizar tal faculdade. Os frades com essa faculdade não deviam confessar os casos reservados à autoridade episcopal, senão com o seu consenso. Os frades deveriam igualmente aconselhar os penitentes a confessarem-se pelo menos uma vez por ano aos seus párocos374. 5. A prática penitencial anterior a Trento 5.1 Magistério Pontifício 5.1.1 A questão das Ordens Mendicantes O Papa Bonifácio VIII emanou a 18 de Fevereiro de 1300 a Bula Super Cathedram375, com a qual abrogou os privilégios concedidos às Ordens Mendicantes por Martinho IV relativos à pregação e confissão. Trata-se de uma disciplina penitencial destinada a durar até Trento, se se exclui o período entre a Inter Cunctas376, de Bento XI, de 17 de Fevereiro de 1304 e a Dudum a Bonifacio377, de Clemente V, de 6 de Maio de 1312. A administração da penitência é limitada a um sistema de autorizações. Os frades confessores deveriam ser apresentados pelos seus superiores aos bispos e receber destes uma permissão formal. Por outro lado, a Super Cathedram precisava que o número dos confessores pertencentes às Ordens Mendicantes devia ser proporcionado às efecti————————

audiendi vero confessiones, absolvendi poenitentes, salutares eis injungendi poenitentias, et fratribus alias idoneis concedendi [...] plenam damus et concedamus auctoritate praesentium facultatem: districtius inhibentes, ne quis fratres ipsius ordinis, quibus dicta officia taliter concedenda duxeritis, ut praemittitur, sive etiam committenda in exercitio sive in executione officiorum ipsorum, audeat quomodolibet impedire. Volumus autem quod hi, qui fratribus confitebuntur eisdem, suis parochialibus presbyteris confiteri saltem semel in anno, prout generale concilium statuit, teneantur: quodque iidem fratres eosdem ad hoc dilingenter et efficaciter secundum datam eis gratiam a Domino exhortentur. Nulli ergo omnino hominum liceat hanc paginam nostrae concessionis et inhibitionis infringere, vel ei ausu temerario contraire». 374 Cf. R. RUSCONI, L’ordine dei peccati, 136-140. 375 Cf. BONIFACIO VIII, Bula Super Cathedram, 18 Fevereiro 1300, in BF, IV, 498-500; Clem. 3, 7, 2. 376 Cf. BENTO XI, Inter Cunctas, 17 Fevereiro 1304, in BF, IV, 498-500. Extrav. com. 5, 7, 1. 377 Cf. CLEMENTE V, Dudum a Bonifacio, 6 Maio 1312, in BF, V, 87.


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vas necessidades das populações. Estas autorizações variavam no espaço e no número e tendiam a limitar, pelo menos no espiscopado inglês, o número de frades autorizados a escutar confissões em cada convento e a unir a autorização de confessar à de pregar, andando além das disposições da própria Super Cathedram378. Pelo contrário, Bento XI concede às Ordens Mendicantes a faculdade de confessar sem sujeição à jurisdição do Ordinário. Interpretando a norma conciliar lateranense acerca da obrigação da confissão anual, o Papa afirmou que tal disposição se cumpria na confissão a qualquer sacerdote autorizado. Na verdade, considerava absurdo a obrigação de confessar ao próprio sacerdote os pecados já perdoados por um outro sacerdote. Só por razões espirituais, e para não se opor aos seus predecessores, recomendava a repetição da confissão aos próprios sacerdotes379. Pouco tempo depois e por iniciativa do Concílio Ecuménico de Viena Clemente V380 recoloca em vigor a Super Cathedram, de Bonifácio VIII, abrogando assim os privilégios concedidos aos religiosos em matéria de jurisdição penitencial. O mesmo fará João XXII, em 1327381. A condenação das teses do mestre secular Jean de Poulli por meio da Vas electionis382, de João XXII, de 24 de Julho de 1321, fecha a questão relativa ao ministério penitencial dos Frades Mendicantes no plano teológico. Contudo, no plano disciplinar, os Papas continuaram a conceder às diversas Ordens privilégios de autonomia de jurisdição em relação aos bispos diocesanos383. Em 1474, Sixto IV concedia esse privilégio aos eremitas de São Francisco de Paula, por meio da Constituição Sedes Apostolica384, e aos Menores e Pregadores, com a Constituição Regimini385, no mesmo ano. A constituição Sedes Apostolica foi confirmada ———————— 378 379

Cf. R. RUSCONI, L’ordine dei peccati, 140-142. Cf. BENTO XI, Inter Cunctas, 17 Fevereiro 1304, in BF, IV, 498-500; Extrav. com. 5, 7, 1. 380 Cf. CLEMENTE V, Dudum a Bonifacio, 6 Maio 1312, in BF, V, 87. 381 Extrav. com. 2, 1, 1. 382 Cf. JOÃO XXII, Vas electionis, in BF, V, 208-209. 383 Cf. F.X. WERNZ – P. VIDAL, Ius Canonicum, IV, 153, n.16. 384 Cf. SIXTO IV, Const. Sedes Apostolica, 27 Maio 1474, in BR, 5, 213-217. 385 Cf. SIXTO IV, Const. Regimini, 31 Agosto 1474, in BR, 5, 220, § 10: «Praeterea, quia parochialium Ecclesiarum rectores praefati, erga illos, qui dictis fratribus Ordinis Minorum eorum peccata confiteantur, persaepe se reddunt in exhibitione Eucharistiae et Extremae Unctionis difficiles, concedimus ipsis fratribus Ordinis Mino-


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por Júlio II, em 1506, com a Constituição Dudum386. Júlio II concede os mesmos privilégios aos Olivetanos, em 1507, com a Constituição Etsi387. Inclusivamente, é-lhes concedida a faculdade de remitir todas as censuras e penas não reservadas à Sé Apostólica, mesmo as censuras a iure vel ab homine. Leão X, por meio da Constituição Dudum intra, de 1516, quis moderar os privilégios dos Mendicantes e outros religiosos. Por isso, no parágrafo sexto, estabeleceu que os confessores escolhidos pelos superiores fossem apresentados ao bispo ou ao seu vigário, com o direito de os examinar388. Esta jurisdição episcopal era aceite pelo Papa. ————————

rum, ut eisdem personis eis confessis, quibus rectores praefati, sine rationabili causa, denegaverint seu malitiose distulerint Eucharistiae seu Extremae Unctionis sacramenta ministrare, super quo eorumdem confessorum assertioni stari debaet, illa petentibus possint impune exhibere». 386 Cf. JÚLIO II, Const. Dudum, 28 Julho 1506, in RB, 5, 432, § 34: «Necnon confessiones quarumcumque personarum, tam religiosarum quam ecclesiasticarum et saecularium, ubilibet audire et, illis auditis, personas ipsas et earum quamlibet iuxta formam et tenorem privilegii per praefatum Sixtum praedecessorem Ordini Minimorum huiusmodi ac illius personis et fratribus dudum concessi et confermari, absolvere, ac poenitentiam salutarem illis iniungere valeant». 387 Cf. JÚLIO II, Const. Etsi, 4 Junho 1507, in BR, 5, 452, § 32: «Et cum saepe contigat quod, ob singularem devotionem quam nonnullae personae ad monacos huiusmodi congregationis habent, ad eosdem monacos pro eorum salute animarum recurrant, eiusdem congregationis praelatis sive monacis a suis superioribus ad audiendum huiusmodi personarum confessiones deputatis, quod personas ipsas accedentes audirent, ad personar ipsae eis, absque alia suorum superiorum licentia, confiteri; necnon dictis praelatis sive monacis confessiones huiusmodi audientibus, poenitentia et satisfactione praemissis, quotiens opus fuerit, ab omnibus et singulis peccatis Sedi Apostolicae non reservatis, et quibuscumque suspensionum, excommunicationum et interdicti sententiis, aliisque ecclesiasticis censuris et poenis, quas a iure vel a homine latas incurrisse quomodolibet constituerit, absolvere, et vota per eos pro tempora emissa in omnibus et singulis casibus locorum ordinariis etiam per synodales seu provinciales constitutiones reservatis, in alia pietatis opera commutare, et desuper cum eis voventibus dispensare, exceptis tamen censuris, poenis, votis et casibus super quibus esset Sedes praefata merito consulenda; ipsisque confitentibus ac aliis omnibus, qui ad praefatos monacos ob huiusmodi devotionem recurrent, Eucharistiae sacramentum ministrare libere possint». 388 Cf. LEÃO X, Const. Dum intra (in Conc. Lateranen. V), 19 Dezembro 1516, §6 in CICFontes, I, n. 72, 126; Mansi 32, 972: «Necnon Superiores eorumdem Fratrum, Fratres, quos ad audiendas confessiones subditorum eorumdem Praelatorum tempore elegerint, eisdem Praelatis personaliter exhibere, ac praesentare (si eos sibi exhiberi, et praesentare petierint) alioquin eorum Vicariis (dummodo ad Praelatos ultra duas dietas accedere non cogantur) omnino teneantur. Possintque illi per eosdem Episco-


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Contudo, os sucessores de Leão X não aceitaram esta norma e prescreveram aos bispos concederem aos religiosos a jurisdição de confessar sem limitação e submissão mesmo aos fiéis seculares. É o caso de Paulo III, que concede este privilégio por meio da Constituição Licet debitum389, em 1549, a favor dos alunos da Companhia de Jesus. Estas constituições apostólicas estabeleceram o princípio de comunicação de privilégios das diversas Ordens Mendicantes, visto que o que era concedido a uma se partilhava com as outras390. 5.2 Concílios e Sínodos 5.2.1 Estatutos Sinodais de Constança e Bayeux Os preceitos sinodais de Constança são constituídos por uma recolha dos cânones emanados dos diversos sínodos do final do século XIII391. Importante é a norma relativa à absolvição em ponto de morte, visto que concede a qualquer sacerdote a faculdade de absolver todas as censuras, mesmo as papais. Trata-se de uma concessão certamente aprovada pela Sé Apostólica, a única que pode conferir tal faculdade392. Retomam-se igualmente as normas habituais acerca do próprio sacerdote e licença a outro sacerdote, assim como outras normas acerca da modalidade da confissão393. O Sínodo de Bayeux, da mesma data, repete a norma acerca da confissão in articulo mortis nos casos reservados à Sé Apostólica394. Prescreve-se, em seguida, a absolvição do pecador em perigo de morte de qualquer pecado ou censura por qualquer sacerdote395. ————————

pos, et Praelatos super sufficienti literatura, et aliqua saltem huiusmodi Sacramenti peritia dumtaxat examinari». 389 Cf. PAULO III, Const. Licet debitum, 18 Novembro 1549, in BR, 6, 394-401. 390 Cf. F.X. WERNZ – P. VIDAL, Ius Canonicum, III, 405-406. F. WALKER VICUÑA, La Faculdad para confessar, 34. 391 Cf. A. CARPIN, «La confessione tra il XII e il XIII secolo», 233-237. 392 Cf. SÍNODO DE CONSTANÇA (finais do sec. XIII), cap. 32, in Mansi 25, 37: «Potest autem sacerdos absolvere in articulo mortis quemlibet excommunicatum a quolibet, etiam a Domino Papa; prius juramento ab eo recepto, si inciderit in canone latae sententiae, quod sanitate recuperata, et opportunitate concessa Romanam Ecclesiam visitabit, vel eum adibit qui super hoc potestatem a sede Apostolica habeat». 393 Cf. SÍNODO DE CONSTANÇA (finais do sec. XIII), cap. 33-44, in Mansi 25, 37-46. 394 Cf. SÍNODO DE BAYEUX (1300), cap. 64, in Mansi 25, 71. 395 Cf. SÍNODO DE BAYEUX (1300), cap. 65, in Mansi 25, 71: «Pium videtur et tutum, ut quilibet sacerdos infirmum in extremis laborantem absolvat de omnibus, de quibus absolvere eum potest».


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O mesmo Sínodo convida os párocos, capelães e vigários perpétuos a se confessarem pelo menos uma vez por ano ao bispo ou ao penitenciário. No entanto, em caso de necessidade, permite-lhes que se confessem a outros sacerdotes hábeis, mas com a mesma obrigação de se apresentarem uma vez por ano ao próprio bispo ou ao penitenciário396. 5.2.2 Concílios de Tarragona (1329, 1391) O Concílio de Tarragona celebrado a 26 de Fevereiro de 1329 foi presidido pelo Patriarca de Alexandria, titular da diocese. Trata-se de um conjunto de aplicações retomadas de outros concílios397. Permite-se a todos os padres que se confessem uns aos outros, quando querem celebrar a Missa, se o confessor próprio não está presente398. Do mesmo modo, permite-se a absolvição da excomunhão dos sacerdotes uns aos outros399. O Concílio de Tarragona, celebrado a 12 de Abril de 1391, foi presidido por Inácio, Arcebispo da mesma diocese. Foram promulgados 16 cânones. Concede a mesma liberdade a todos os sacerdotes de se confessarem uns aos outros para celebrarem a Missa, mesmo se o sacerdote próprio estiver presente400. Deste modo, ao dar-se importância à liberdade necessária na confissão, o uso de se confessarem uns aos outros introduziu-se entre os padres, sem uma ulterior aprovação do bispo401. Tal prática será mudada pelo Concílio de Trento, como veremos. 5.2.3 Concílio de Lavaur (1368) e de Narbonne (1374) Este Concílio das três províncias de Narbonne, Toulouse e Auch foi realizado entre 18 de Maio e 6 de Junho de 1368 e autorizado pelo Papa Urbano V. Foi presidido por Pièrre de la Jugie, Arcebispo de Narbonne, Joffré de Vayroles, Arcebispo de Toulouse e Philippe, Abade de Sorèze, Vigário Geral e delegado de Arnaud-Aubert, Arcebispo de ———————— 396 397 398 399

Cf. SÍNODO DE BAYEUX (1300), cap. 108, in Mansi 25, 80. Cf. G. PALAZZINI, «Tarragona», 247. Cf. CONC. DE TARRAGONA (1329), cap. 86, in Mansi 25, 878. Cf. CONC. DE TARRAGONA (1329), cap. 28, in Mansi 25, 848: «Item, sacro approbante concilio, damus universis nostrae provinciae presbyteris potestatem, quod ad invicem unus alii possit super excommunicationis sententia beneficium absolutionis impertiri». 400 Cf. CONC. DE TARRAGONA (1391), can. 2, in Hefele-Leclercq, VI/2, 1435. 401 L. THOMASSIN, «Pénitencier», 580.


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Auch. Foi elaborado um código legislativo muito aprofundado, que representava um sério esforço para a reforma da Igreja em Languedoc402. Neste Concílio, permite-se aos sacerdotes que se confessem, antes de celebrarem a Missa, a qualquer padre presente e idóneo403. Eis os degraus por que se relaxa a antiga severidade, que reservava as confissões dos eclesiásticos ao bispo ou aos seus penitenciários. Permite-se a confissão a outros, desde que uma vez por ano descobrissem os recessos da sua consciência ao seu prelado. Por fim, permite-se que se confessem a qualquer sacerdote presente404.

Estabelece-se igualmente que os bispos da província nomeiem confessores idóneos para os casos reservados, segundo as necessidades das suas cidades e dioceses. Precisa-se que a estes se dê pleno poder405. O Concílio de Narbonne, convocado pelo Arcebispo Pièrre de la Jugie, por ordem de Gregório XI, foi celebrado a 15 de Abril de 1374. Foram promulgados 28 cânones, dos quais 17 são do Concílio de Lavaur (1368)406. Este Concílio repete a norma de Lavaur em se permite a qualquer padre confessar-se a qualquer outro sacerdote presente, mesmo não sendo cura de almas, antes da celebração da Missa. Mas precisa que não o faça nos casos reservados407. ———————— 402 403

Cf. J.M. MARILLIER, «Lavaur», 239. Cf. CONC. DE LAVAUR (1368), cap. 81, in Mansi 26, 520: «Ut Missae cum puritate conscientiae celebrentur, et ne propter defectum confessoris eas omitti contigat: indulgemus, quod quilibet presbyter, volens Missam celebrare, licite possit cuilibet presbytero idoneo sua confiteri peccata, et absolutionis beneficium recipere ab eodem». 404 Cf. L. THOMASSIN, «Pénitencier», 579-580: «Voilà les dégrés par lesquels on se relâcha de l’ancienne sévérité, qui réservait les confessions des ecclésiastiques à l´évêque ou à ses pénitenciers. On leur permit de se confesser à d’autres, pourvu qu’une fois chaque année ils découvrissent l’état et les replis de leur conscience à leur prélat; enfin on leur permit de se confesser à quelque prêtre que ce fût». 405 CONC. DE LAVAUR (1368), cap. 106, in Mansi 26, 541: «statuimus, quod quilibet episcopus provinciarum nostrarum, in casibus sibi reservatis tot confessores discretos instituat, quot secundum statum suarum civitatis et dioecesis necessarios noverit, quibus super ipsis committat plenariam potestatem». 406 Cf. P.G. VENTAS, «Narbonne», 170. 407 Cf. CONC. DE NARBONNE (1374), cap. 18, in Mansi 26, 603. Igual ao cap. 81 do Concílio de Lavaur, mas acrescenta: «praeterquam de casibus ordinariis reservatis». Tal precisação faz supor a existência de algum abuso na matéria depois do Concílio de Lavaur, em 1368. Este costume da confissão dos clérigos é assim explicado por Thomassin: «De là on peut à peu près conclure le temps des ordonnances synodales de Paris attribuées à l’évêque Guilhaume. Car puisqu’il y est ordonné que les curés


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5.2.4 Concílio de Freising (1440) O Concílio de Freising, de 1440, foi presidido por Nicodemos de Scala, conselheiro do Rei Frederico III de Áustria. Retoma os decretos precedentes dos Concílios Provinciais de Salzburg. Publica 26 capítulos disciplinares. Este Concílio ordena aos abades, decanos, reitores (prévôts), arquidiáconos não isentos que se confessem ao bispo ou ao vigário, os menores ao seu abade, os curas ao seu decano; se o bispo não tiver dado algum privilégio particular408. 5.2.5 Concílio Ecuménico de Ferrara-Florença (1431-1445) No Concílio de Florença, conseguiram-se uniões aparentes com as Igrejas arménia, copta e siríaca, entre outras. Contudo, os acordos só se conseguiram com pequenos grupos dessas Igrejas e não existem dúvidas de que os seus efeitos não foram duradoiros. Contudo, foram importantes no seio da Igreja, porque continham afirmações muito completas sobre a fé e a disciplina. A influência destes decretos no pensamento e prática da Igreja Católica Romana, até no Concílio de Trento, foi mais profunda do que normalmente se admite409. No famoso decreto de união com os arménios, o sacramento da penitência é apresentada em quarto lugar. Descreve os três momentos clássicos da penitência. No que diz respeito ao ministro, afirma-se claramente os dois tipos de autoridade: «Minister huius sacramenti est sacerdos habens auctoritatem absolvendi vel ordinariam vel ex commissione superioris»410. 6. Síntese A legislação do período entre os séculos XII e XV é muito abundante e variada. Manifesta a vitalidade do pensamento e da disciplina do ————————

se confesseront au moins deux fois l’an, savoir en Avent et en Carême, aux confesseurs qu’on avait nommés dans chaque doyenné; cette coutume convient fort justement au temps de Guilhaume de Clermont, qui fut évêque de Paris en 1230». L. THOMASSIN, «Pénitencier», 580. 408 Cf. CONC. DE FREISING (1440), can. 24, in Hefele-Leclercq, VII/2, 1156; L. THOMASSIN, «Pénitencier», 580. 409 Cf. N.P. TANNER, Los concilios de la Iglesia, 84-85. 410 CONC. DE FERRARA-FLORENÇA, Decr. Eugenii Papae IV Exsultate Deo, 22 Novembro 1439, in Mansi 31/A, 1057-1058. É interessante notar que esta colecção afirma, incluindo o sacramento da penitência: «Quae sequuntur usque ad sexto, desumpta sunt ex opusculo V. D. Thomae Aquinatis de Sacramentis». O que prova influência tomista na elaboração deste decreto e na sistematização dos sacramentos.


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homem cristão medieval, que influenciou enormemente a prática que hoje celebramos. Naturalmente, não podemos restringirmo-nos somente à figura do penitenciário, mas este é um ponto chave relativo à jurisdição do ministro. A partir do século XII, assistiu-se a uma progressiva limitação da faculdade de confessar, reservando-a ao próprio sacerdote. A codificação lateranense obriga todos os fiéis à confissão anual ao próprio sacerdote pároco ou a um outro, com licença do primeiro. Contudo, com o aparecimento das Ordens Mendicantes levantou-se o problema da jurisdição. As faculdades concedidas a estes colocavam em causa o cânone lateranense. Os conflitos crescentes entre clero secular e religioso conduziram a repetidas intervenções dos Romanos Pontífices. A norma lateranense é então modificada. Os religiosos podiam confessar em qualquer parte, mas estavam sujeitos à jurisdição episcopal e limitados pelos casos reservados à absolvição episcopal e do seu penitenciário. Acabou por se chegar a uma solução de compromisso. Os fiéis podiam confessar-se aos religiosos desde que se confessassem uma vez por ano ao próprio sacerdote. Inicialmente, para o clero secular, estabeleceram-se nos decanados sacerdotes dedicados à confissão dos mesmos, sem tirar a faculdade de se dirigirem ao penitenciário episcopal ou ao próprio bispo. Contudo, nos últimos tempos, os sacerdotes procuravam outros sacerdotes não propositadamente nomeados para tal. O penitenciário começa a impor-se como uma longa manus do poder episcopal no que diz respeito à disciplina penitencial. Para os casos reservados ao bispo ou censuras, era necessário seguir uma certa modalidade. Era o confessor que fazia dirigir o penitente ao bispo, suspendendo a confissão. Podia acompanhar o penitente ou redigir uma carta que este levava ao bispo. A intervenção de alguns sínodos acabou por restringir a descrição dos pecados nessa carta para respeitar o sigilo sacramental. Em perigo de morte, qualquer sacerdote podia absolver qualquer penitente de qualquer pecado ou censura. A função principal do penitenciário é a de verdadeiro juiz da penitência no que diz respeito aos casos mais graves, reservados quer ao bispo diocesano quer ao Papa. Contudo, tem uma função cada vez mais presente e universal. A sua ligação a um cabido ou decanado é secundária e não universal. Tal revela que a função do penitenciário é anterior à da sua presença num cabido, com funções específicas mais profundas, pois age nos confins entre o sacramento da penitência e a disciplina referente à comunhão com a Igreja.



CAPÍTULO III Do Concílio de Trento à actual legislação

1. O Concílio de Trento O Concílio de Trento dedica à penitência a Sessão XIV, cujos primeiros três capítulos tratam do sacramento de um modo geral, seguindo-se a ordem clássica: absolvição, confissão e a satisfação. Como no resto, o contexto é o da polémica protestante. Deste modo, pretende-se afirmar a existência do sacramento, distinto do baptismo, assim como o poder da absolvição sacramental. Interessa-nos analisar a matéria relacionada com a absolvição sacramental e o caso especial dos pecados reservados, do qual surge o ofício do cónego penitenciário. 1.1 O ministro e a absolvição sacramental Os Reformadores negavam a existência de um poder de ordem ou de jurisdição no ministro da penitência. Em resposta, o Concílio ensina nos capítulos VI-VII que o ministerium clavium supõe o sacramento da Ordem e a sua eficácia não está conexa com a santidade subjectiva1. A absolvição sacramental não só declara a remissão dos pecados, mas também a realiza. A sua validade supõe igualmente a jurisdição2. Isso significa que não basta a ordenação sacerdotal para poder celebrar o sacramento da penitência e perdoar os pecados, mas é necessário ter jurisdição, ser o Ordinário do penitente ou ter recebido do Ordinário a delegação. Deste modo, é Cristo que perdoa os pecados, mas corresponde à Igreja o poder de ligar ou desligar confiado por Jesus Cristo. Por isso, ———————— 1

Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 14, Dec. De paenitentia, c. 6, in DS 1684; G. MOIIl quarto sacramento, 361-362. 2 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 14, Dec. De paenitentia, c. 7, in DS 1686.

OLI,


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o ministério da penitência sacramental é exercitado desde a origem pelos sucessores dos Apóstolos, os bispos, e, devido ao crescimento da Igreja, foi concedido também aos presbíteros que presidem às novas comunidades. Portanto, o ministro da penitência tem o seu poder articulado no seio do universal e orgânico poder de ligar e desligar3. A doutrina dos Reformadores ensinava igualmente que a absolvição do sacerdote não é um acto judicial, mas o simples ministério de declarar e proclamar a quem se confessa que os seus pecados são remitidos. O sacerdote podia absolver mesmo sem a confissão do pecador4. Em resposta, o Concílio reafirmou o carácter judiciário da penitência, pelo que o ministro não pode absolver quem não é súbdito5. Os sacerdotes são, deste modo, comparados a juízes, porque a absolvição é eficaz para a remissão dos pecados, o efeito do poder é comparado a uma sentença, e o acto humano que administram é um juízo, porque exige o conhecimento do estado do pecador e inclui o poder de aplicar uma satisfação6. Esse acto judicial pode ser entendido, segundo a mentalidade dos Padres Conciliares, como um acto com eficácia directa em relação à remissão dos pecados, como exercício do poder das chaves e do poder de jurisdição da Igreja e como não arbitrário, no sentido em que se funda no conhecimento da causa mediante a confissão7. Convém ter em conta que parece claro que o Concílio não pretende identificar o que realiza o sacerdote com um juízo em sentido estrito, mas como analogia, visto que o poder judicial da época forma———————— 3 4

Cf. P. RODRÍGUEZ, «La riforma della Penitenzieria Apostolica», 138-140. CT 7, 1960, 236: «Absolutionem sacerdotis non esse atum iudicialem, sed nudum ministerium pronunciandi et declarandi, remissa esse peccata confitendi, modo credat se esse absolutum, etiam si non sit contritus aut sacerdos non serio, sed ioco absolvat. Imo etiam sine confessione peccatoris sacerdotem eum absolvere posse». 5 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 14, Dec. De paenitentia, in DS 1671, 1679, 1685, 1686, 1709. 6 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 14, Dec. De paenitentia, c. 6, in DS 1679; A. AMATO, I pronunciamenti, 306: «Il sacramento della penitenza viene chiamato tribunale, il sacerdote giudice, il penitente reo, il peccato crimine, l’assoluzione sentenza o atto giudiziale»; RAMOS-REGIDOR, J., Il sacramento della penitenza, 225-226. 7 Cf. A. AMATO, I pronunciamenti, 309: «Come actus iudicialis, infatti, l’assoluzione ha un’efficacia diretta nei confronti della remissione dei peccati [...]. Come actus iudicialis, inoltre l’assoluzione è anche esercizio del potere delle chiavi e del potere di giurisdizone della Chiesa [...]. Come actus iudicialis, infine, l’assoluzione non può essere arbitraria, ma deve fondarsi sulla conoscenza della causa, mediante la confessione».


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va parte do poder administrativo ou de governo e não estritamente do foro judicial8. Não se pode negar à absolvição uma certa ambivalência de conteúdo, no momento em que, embora permanecendo acto judicial, essa é sobretudo um iudicium salutare. Essa, mais que punir ou vingar a ordem conturbada, é essencialmente aberta a salvar, remindo completamente a culpa. Daqui nasce também a dificuldade de a definir adequadamente9.

Além de ser um acto judicial, a absolvição é também considerada como alieni beneficii dispensatio. Não existe contradição, mas complementariedade entre estas duas dimensões. Deste modo, o sacerdote é um verdadeiro e próprio juiz, mas também dispensador de uma graça, com pleno conhecimento da causa. A absolvição considera-se, portanto, um iudicium salutare10. 1.2 Pecados reservados e satisfação sacramental Os Reformadores também negavam que o bispo tivesse o poder de reservar a si casos especiais. Por diversas vicissitudes históricas que vimos ao longo deste estudo, a autoridade eclesial decretou a conveni————————

8 Cf. F. GIL DE LAS HERAS, «Carácter judicial de la absolución sacramental», 144; G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 205-206; F. WALKER VICUÑA, La Faculdad para confessar, 208: «el mismo Concilio nos da a entender que está utilizando la expresión en un sentido analógico a los juicios humanos, al decir que la absolución es dada por el sacerdote como [velut] por un juez, el modo de [ad instar] un acto judicial»; CONC. DE TRENTO, Sess. 14, Dec. De paenitentia, in DS 1685. 9 Cf. A. AMATO, I pronunciamenti, 305: «Conseguentemente, non si può del tutto negare all’assoluzione una certa ambivalenza di contenuto, dal momento che, pur rimanendo un atto giudiziale, essa è sopratutto un iudicium salutare. Essa, cioè, più che a punire o vendicare l’ordine turbato, è essenzialmente aperta a salvare, rimettendo completamente la colpa. Di qui nasce anche la difficoltà di definirla adeguatamente». 10 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 14, Dec. De paenitentia, c. 6, in DS 1685. De acordo com alguns autores, deve-se ter em conta algumas premissas para compreender o sentido judicial da penitência: esse depende da noção do poder judicial, diversa da moderna ciência jurídica, e do sentido dado pelos reformadores. O sentido tridentino de um acto judicial incluía quer a sentença com a qual se aplica uma ordem a um acusado, quer a concessão de um benefício por indulto. Na verdade, os autores entendem recentemente o sentido do acto judicial tridentino como concessão de um indulto, porque nasce do sentido do perdão dado por Cristo. “Ligar” tem, em Trento, o sentido de impor uma satisfação, uma dispensatio beneficii alieni, um poder concedido por Cristo com algumas condições. Cf. A. AMATO, I pronunciamenti, 311-313; F. GIL DE LAS HERAS, «Carácter judicial de la absolución sacramental», 155-159; J. RAMOSREGIDOR, Il sacramento della penitenza, 225-229.


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ência e necessidade pastoral de reservar ao bispo da diocese ou ao Papa o juízo acerca de certos pecados. No capítulo VII do decreto De paenitentia, foi definida a disciplina em que o bispo pode reservar certos casos, visto que são esses que transmitem aos sacerdotes de grau inferior a jurisdição ou a autoridade de absolver. Tendo em conta o carácter medicinal e judicial da penitência, requeria-se a absolvição dos pecados somente pela autoridade superior, devido à gravidade do pecado, ao impacto e ao escândalo que provocava na comunidade. Visto que a natureza e índole do juízo requer que a sentença seja pronunciada somente em ordem àqueles que lhe estão sujeitos, a Igreja de Deus sempre expressou a convicção, que este sínodo confirma ser veríssima, que não deve ter nenhum valor a absolvição que o sacerdote pronuncia a favor de uma pessoa sobre a qual não tenha jurisdição ordinária ou delegada. Aos nosso santíssimos Padres pareceu ser de máxima importância, para a boa ordem do povo cristão, que alguns pecados, entre os mais horríveis e mais graves, não fossem absolvidos por qualquer um, mas somente pelos sacerdotes de grau superior. Justamente, portanto, os sumos pontífices, em força do supremo poder que lhes foi conferido sobre toda a Igreja, puderam reservar ao seu particular juízo algumas causas relativas às culpas mais graves. Nem deve colocar-se em dúvida [...] que, em força da autoridade que lhes foi conferida sobre os fiéis, os bispos, cada um na sua Diocese, possam fazer o mesmo [...] em relação aos sacerdotes de grau inferior, especialmente para aquelas culpas às quais é conexa a censura da excomunhão. É também conforme à autoridade divina que esta reserva das culpas tenha força não somente para o governo externo, mas também diante de Deus. Todavia, para que ninguém deva morrer por causa disso, a Igreja de Deus, com suma clemência, sempre cuidou que nenhuma reserva tenha valor em ponto de morte e, portanto, todos os sacerdotes podem absolver qualquer penitente de qualquer pecado e de qualquer censura. Mas visto que, fora deste caso, os sacerdotes não têm nenhum poder nos casos reservados, deverão empenhar-se em persuadir os penitentes desta única coisa: que pela graça da absolvição se apresentem aos superiores e legítimos juízes11.

————————

11 CONC. DE TRENTO, Sess. 14, Dec. De paenitentia, c. 7, in DS 1685-1688: «Quoniam igitur natura et ratio judicii illud exposcit, ut sententia in subditos duntaxat feratur; a persuasum semper in Ecclesia Dei fuit, et verissimum esse, Synodus haec confirmat, nullius momenti absolutionem eam esse debere, quam Sacerdos in eum profert, in quem ordinariam aut subdelegatam non habet jurisdictionem. Magnopere vero ad Christiani populi disciplinam pertinere, sanctissimis Patribus nostris visum est, ut atrociora quaedam et graviora crimina non a quibusvis, sed a summis duntaxat Sacerdotibus absolverentur; unde merito Pontifices Max. pro suprema Potestate, sibi


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A redacção definitiva deste texto suprimiu certas considerações relativas à utilidade dos casos reservados, como o exemplo de certas jurisdições reservadas à sociedade civil. A primeira redacção justificava com muitos detalhes esta reserva dos casos, tendo em conta que a dificuldade do perdão mantinha o culpável no caminho do crime. A redacção final simplesmente justifica de um modo lacónico a razão de ser desta reserva: «pareceu ser de máxima importância – magnopere – para a boa ordem do povo cristão»12. Portanto, certos pecados – atrociora et graviora crimina – permaneciam reservados ao bispo ou ao Papa para serem julgados por si ou pelos seus penitenciários e receberem a penitência ou a satisfação adequada ou exemplar. O fundamento do acto de reservar os pecados era em boa parte a correcta aplicação da satisfação canónica ou sacramental13. Por outro lado, a questão da reserva dos pecados tocava o problema da jurisdição. Embora permanecesse em aberto o âmbito da competência da Penitenciaria Apostólica, pretendia-se precaver os abusos na administração do sacramento da penitência14. ————————

in Ecclesia universal tradita, causas aliquas criminum graviores suo potuerunt peculiari judicio reservare. Neque dubitandum est, quando omnia, quae a Deo sunt, ordinata sunt, quin hoc idem a Episcopis omnibus in sua cuique dioecesi in aedificationem tamen, non in destructionem liceat, pro illis in subditos tradita supra reliquos inferiores Sacerdotes auctoritate, praesertim, quoad illa quibus excommunicationis censura annexa est. Hanc autem delictorum reservationem, consonum est divina auctoritati, non tantum in externa politia; sed etiam coram Deo vim habere. Verumtamen pie admodum, ne hac ipsa occasione aliquis pereat, in Ecclesia Dei custoditum semper fuit, ut nulla fit reservatio in articulo mortis; atque ideo omnes Sacerdotes quoslibet Poenitentes a quibusvis peccatis et censuris absolvere possunt: extra quem articulum Sacerdotes, eum, nihil possint in casibus reservatis, id unum Poenitentibus persuadere nitantur, ut ad Superiores et legitimos judices pro beneficio absolutionis accedant». 12 Cf. A. MICHEL, «La Pénitence de la Réforme», 1101. 13 Cf. P. RODRÍGUEZ, «La riforma della Penitenzieria Apostolica», 142. 14 Cf. R. RUSCONI, L’ordine dei peccati, 309-310: «Di nuovo un problema di giurisdizione rimandava la questione dei casi riservati alla Penitenzieria apostolica, che aveva costituito sino ai decenni precedenti l’apertura del concilio di Trento un argomento di rilievo all’interno delle polemiche nei confronti della curia romana […]. Sarà solo nel 1569 che Pio V interverrà nel limitarne la competenza al solo foro interno, molti anni dopo che nella sessione XIV, il 25 novembre 1551, era stata approvata la disciplina in materia “De casuum reservatione” […]. Dalla disciplina dettata dai decreti conciliari di riforma, ripresa nel decreto generale di riforma della sessione XXIV, discendeva un ragguardevole rafforzamento della giurisdizione episcopale […] rispetto al dibattito che si era aperto in sede conciliare nel 1547, quando dei “casi riservati” alla giurisdizione papale e alla giurisdizione episcopale si era trattato piutto-


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Este direito de reserva tem como finalidade a edificação e não a destruição da Igreja, pelo que, em ponto de morte, não existe nenhuma reserva15. 1.3 Ofício de Penitenciário Diversamente da legislação do Concílio de Tarragona de 139116, o Concílio de Trento revoga o uso que tinha sido introduzido entre os padres de se confessarem uns aos outros, mas não obriga a confessaremse ao bispo, ou a um dos seus penitenciários, ou a um confessor geral, delegado para a confissão dos padres. Limita-se a decretar que se confessem a um sacerdote aprovado pelo bispo, depois de obtido um benefício paroquial ou julgado idóneo após um exame17. No que se refere ao ofício do penitenciário, o Concílio insere-o no cabido da catedral ou colegiada. Procurando a reforma do clero, estabelece que os clérigos que se dedicam ao ensino e interpretação da Sagrada Escritura o cumpram realmente, fazendo depender da sua real dedicação as prebendas, dotações ou estipêndios. Deste modo, nas Igrejas Metropolitanas ou Catedrais, as primeiras prebendas, dotações ou estipêndios são destinadas para esta finalidade pelo bispo, com o consentimento do cabido18. Esta preocupação conciliar será retomada na legislação posterior de modo a organizar as prebendas capitulares, nomeadamente a do penitenciário. Quem fizer parte do cabido tem de receber, pelo menos, a ordem do subdiaconado, para que tenha voz no mesmo. De igual modo, os que detiverem dignidades, ofícios, prebendas, porções ou outro benefício, assim como certas obrigações, como dizer ou cantar a missa, o Evangelho ou as Epístolas, são obrigados a receberem as ordens requeridas, salvo legítimo impedimento19. ————————

sto nel contesti della Provisiones contro gli abusi nell’amministrazione del sacramento della penitenza». 15 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 14, Dec. De paenitentia, c. 7, in DS 1688: «Verumtamen pie admodum, ne hac ipsa occasione aliquis pereat, in eadem Ecclesia Dei custoditum semper fuit, ut nulla reservatio in articulo mortis, atque ideo omnes sacerdotes quoslibet paenitentes a quibusvis peccatis et censuris absolvere possunt». J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 224. 16 Cf. CONC. DE TARRAGONA (1391), c. 2, in Hefele-Leclercq, VI/2, 1435. 17 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 23, Dec. super reformatione, c. 15, in COD 749; L. THOMASSIN, «Pénitencier», 580-581. 18 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 5, Dec. De reformatione, c. 1, in COD 667-669. 19 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 22, Dec. De reformatione, c. 4, in COD 739.


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O Concílio de Trento favoreceu o ministério do penitenciário com o título de benefício e de dignidade. Por isso, ordena que a primeira prebenda vacante lhe seja conferida. No cânon 8 da sessão XXIV, obriga-se à sua instituição em todas as igrejas catedrais. Note-se que o penitenciário é referido depois da questão da penitência pública, que poderá ser comutada por uma penitência realizada em segredo. Seguramente, a matéria será a dos atrociora et graviora crimina, o que esclarece a razão de ser deste ofício. Por outro lado, o penitenciário deverá ser um doutor ou licenciado em Teologia ou Direito Canónico, com idade de quarenta anos. A sua função principal será a de ouvir confissões e, quando realizar este ofício, será considerado presente no coro20. Este cânon começou a ser objecto de discusssão das Congregações no dia 5 de Setembro de 156321, no conjunto dos 21 cânones de reformatione. Após o exame dos Padres Conciliares, finalmente o cânon foi formulado no dia 2 de Novembro de 1563: in omnibus etiam cathedralibus ecclesiis, ubi id commode fieri poterit, poenitentiarius aliquis cum unione praebendae proximae vacaturae instituatur, qui magister sit vel doctor aut licenciatus in iure canonico, seu alias, qui aptior pro loci qualitate reperiatur, qui, dum confessiones in ecclesia audiet, interim praesens in choro censeatur22.

Como se nota nesta fase, ainda não se diz que deve ser instituído pelo bispo, nem se dá a possibilidade da sua formação em Teologia além do Direito Canónico. Não se estabelece ainda a idade de quarenta anos para a sua nomeação. Estes aspectos irão aparecendo durante a discussão que se inicia no mesmo dia. Note-se o Votum do Bispo Guadiscensis do dia 7 de Novembro de 1563: «In octavo poenitentiarius doctor vel licenciatus in theologia vel in iure canonico assumatur ab episcopo, tam in cathedralibus quam in collegiatis ecclesiis»23. No dia seguinte, foi proposta a ———————— 20

Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 24, Dec. De reformatione, c. 8, in COD 764: «In omnibus cathedralibus ecclesiis, ubi id commode fieri poterit, poenitentiarius aliquis cum unione praebendae proximae vacaturae ab episcopo instituatur, qui magister sit vel doctor aut licenciatus in theologia vel iure canonico, annorum quadraginta, seu alius, qui aptior pro loci qualitate reperiatur, qui, dum confessiones in ecclesia audiet, interim praesens in choro censeatur». 21 Cf. CT IX, 795. 22 Cf. CT IX, 909. 23 Cf. CT IX, 949


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idade de quarenta anos24. Finalmente, o decreto, tal como o conhecemos, foi assinado no dia 11 de Novembro de 156325. 2. A legislação posterior a Trento 2.1 Magistério Pontifício 2.1.1 Papa Bento XIII (1724-1730) A Constituição Pastoralis Officii, de 19 de Maio de 1725, de Bento XIII,26 pretendeu cuidar da aplicação dos Decretos de Trento ubique inviolabiliter27, especialmente no que se refere à doutrina e disciplina dos ofícios de Teólogo e Penitenciário. No que respeita ao primeiro ofício, o Papa reafirmou a necessidade de os mestres da Sagrada Teologia se consagrarem ao ensino e interpretação da Sagrada Escritura ao clero e ao povo, fazendo depender disso a respectiva prebenda. No caso de essa não existir, deve dedicar-se a isso a primeira prebenda vacante, ou benefício simples. Se o cónego faltasse ao seu dever e, mantendo-se a sua contumácia, o seu ofício deveria ser entregue a outro. Deste modo, o Pontífice instituiu a prebenda teologal sobretudo para a Itália e ilhas adjacentes. No que respeita às qualidades, os possuidores de prebenda teologal deveriam ser doutores em Sagrada Teologia, ou pelo menos com um ano iniciado na láurea e, além disso, deveriam ser examinados coram Episcopo por quatro examinadores. A 5 de Maio de 1844, Gregório XVI recordou precisamente este esforço do seu predecessor com o intuito de instruir o povo de Deus na Sagrada Escritura por meio do cónego teólogo, como resposta à afirmação de que a Igreja nada fizera para instruir o povo na Sagrada Escritura, aquando da proliferação das sociedades bíblicas e traduções vernáculas da mesma28. Bento XIII mandou igualmente aplicar ao cónego penitenciário as mesmas condições do cónego teólogo e instituí-lo nas Igrejas Catedrais onde ainda não fora instituído com o honesto sustento, concurso e deputação, de acordo com as normas resultantes do Concílio de ———————— 24 25 26

Cf. CT IX, 952. Cf. CT IX, 958-964. Cf. BENTO XIII, Const. Pastoralis Officii, 19 Maio 1725, in Gasparri I, 622-623, n. 289. 27 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 5, Dec. De reformatione, c. 1, in COD 667-669. 28 Cf. GREGÓRIO XVI, ep. encycl. Inter praecipuas, 5 Maio 1848, in Gasparri I, 799-800, §3, n. 502.


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Trento29, incluindo as suas qualidades, a idade e isenção do serviço de coro30. 2.2 Congregações da Cúria Romana 2.2.1 Sagrada Congregação do Concílio A Sagrada Congregação do Concílio – Congregatione pro executione et interpretatione concilii Tridentini – foi fundada por Pio IV (15591565) no dia 2 de Agosto de 1564, por meio da Constituição Alias Nos, com o intuito de aplicar e interpretar os cânones do Concílio de Trento e resolver as questões controversas. Com o passar do tempo, dedicou-se principalmente à disciplina do clero, aumentando significativamente o âmbito das suas competências31. Elencamos as intervenções mais significativas no que respeita ao penitenciário. a) Instituição e demissão No dia 24 de Junho de 1594, a Sagrada Congregação do Concílio decretou que a instituição do ofício do penitenciário pertencesse somente ao bispo, sem o consentimento do cabido. No entanto, a atribuição da prebenda dizia respeito a quem o fizesse primeiramente32. Mais tarde, numa emanação de 1596, a Congregação precisou que se a colação fosse comum entre o bispo e o cabido e a vagatura da prebenda do penitenciário acontecesse nos quatro meses das primeiras colações, então a escolha da pessoa do penitenciário dizia respeito ao cabido e ao bispo em conjunto33. ———————— 29 30

Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 24, Dec. De reformatione, c. 8, in COD 764. Cf. BENTO XIII, Const. Pastoralis Officii, 19 Maio 1725, in Gasparri I, 623, n. 289, §5: «Postremo quaecumque hactenus de Praebenda Theologali, et Sacrae Scripturae Lectione sancivimus, extendemus etiam, ac adamussim observari volumus, et mandamus quoad institutionem Canonici Poenitentiarii in illis Cathedralibus, in quibus nondum fuerit institutus, eiusque honestam substentationem, concursum, deputationem, omniaque alia ad illius officium pertinentia; ac praeter illa, quae a nobis superius disposita sunt, ea insuper, quae Tridentina Synodus Cap. 8, Sess. 24, de Reformat. de huius ministri qualitate, aetate, ac exemptione a servitio Chori constituit, exacte decernimus, praecipimus, et mandamus». 31 Cf. J. GAUDEMET, Storia del diritto canonico, 706; P. ERDÖ, Storia delle Fonti, 145-146. 32 Cf. S.C.C., Nullius, 23 Junho 1594, in Gasparri V, 179, n. 2271. 33 Cf. S.C.C., 31 Maio 1596, in G. DE LUISE, ed., Codex Canonum Ecclesiae, 252.


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A mesma Congregação decidiu, no dia 6 de Setembro de 1687, para a arquidiocese de Urbino, que a eleição do cónego penitenciário respeitava ao arcebispo e não ao cabido34. No dia 31 de Maio de 1705, foi realizado um Sínodo em Cariati, na Reggio Calabria, no qual se recusaram a participar os cónegos de Cerenzia, co-catedral situada a trinta quilómetros, juntamente com o restante clero, alegando a preeminência de Cerenzia. Por isso, o bispo suspendeu os ofícios e benefícios dos cónegos que não participaram no Sínodo, não respeitando o recurso entretanto apresentado por estes contra o bispo à Congregação no dia da abertura do Sínodo. A Congregação suspendeu as censuras no dia 11 de Setembro e no dia 2 de Outubro de 1706 respondeu ao bispo, que entretanto tinha alegado a tradição de outros Sínodos no mesmo local, aprovando o dito Sínodo. Decretou igualmente que na Catedral de Cerenzia se instituísse a prebenda penitencial ou ao menos um cónego com faculdades de penitenciário35. Esta mesma decisão foi confirmada no dia 11 de Fevereiro de 170836. Em 1737, a pia senhora Theresia instituiu, com os seus bens, na Igreja Colegiada da Ilha de Gozo (Malta), o cónego penitenciário, com a aprovação do bispo. Porém, o cónego da Igreja Catedral de Malta não concordou com esta instituição, afirmando que seria prejudicado nos seus direitos e que somente poderia existir este ofício na Igreja Catedral. O bispo manteve-se contra o penitenciário e este recorreu à Congregação. Esta respondeu afirmativamente à instituição deste canonicato, desde que as leis emanadas da fundação «turpes et bonis moribus non sint contrariae»37. Em 1753, a Congregação do Concílio respondeu a uma controvérsia entre o cabido e o arcebispo, na Igreja Metropolitana de Salerno, acerca da instituição e atribuição das prebendas vacantes dos cónegos teólogo e penitenciário. Recordou que em 1565 o cabido tinha instituído um estipêndio perpértuo para ambos. Em 1608, essas prebendas vagaram e o arcebispo instituiu-as de novo. Deste modo, as eleições do cónego penitenciário passaram a ser feitas pelo cabido e pelo arcebispo. Após a morte do penitenciário, em 1751, surgiu de novo a controvérsia. Final———————— 34 35

Cf. S.C.C., Urbinaten., 6 Setembro 1587, in Gasparri V, 406, n. 2902. Cf. S.C.C., Geruntinen. et Cariaten., 11 Setembro e 2 Outubro 1706, in Gasparri V, 505-506, n. 3042. 36 Cf. S.C.C., Geruntinen. et Cariaten., 11 Fevereiro 1708, in Gasparri V, 521, n. 3061. 37 Cf. S.C.C., Milevitana, 20 Dezembro 1749, in Gasparri V, 1033, n. 3607.


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mente, no dia 21 de Julho de 1753, a Congregação decidiu que a eleição deveria ser feita pelo arcebispo a favor da pessoa mais idónea, e a apresentação deveria ser realizada pelo cabido. Por isso, confirmou a nomeação do cónego diácono Giuseppe Viaggiani, que foi reconfirmada no dia 1 de Setembro do mesmo ano38. No ano de 1755, vagou o ofício de penitenciário da Igreja Metropolitana de Benevento. Por decisão do Arcebispo Pacca, foi realizado um concursu, do qual resultou a apresentação do sacerdote Felice Sbordone, mansionário da Igreja Metropolitana. O cabido não aceitou essa eleição, argumentando que o penitenciário deveria ser eleito pelos cónegos e recordou a lei tridentina em que não se refere esse procedimento, e em que o ofício do penitenciário é escolhido somente entre os cónegos e não por meio de um concursu. Em resposta, a Congregação decidiu que a escolha do penitenciário podia ser feita por meio do referido concursu, mas a selecção seria somente entre o cabido da Igreja Metropolitana e não entre todo o clero secular39. Concluindo, a Congregação sempre tentou defender que a instituição do penitenciário fosse um direito do bispo diocesano, embora admitisse a colaboração do cabido. Permitiu igualmente a instituição do penitenciário fora da Igreja catedral. b) Qualidades No mês de Dezembro de 1585, este Dicastério respondeu afirmativamente ao cónego penitenciário da Igreja de Cádis, que não podia residir naquela cidade, e que, por isso, pretendeu resignar do ofício em favor de Bernardo Negrone, clérigo de Sevilha, com todas as qualidades requeridas para o ofício, excepto a idade de quarenta anos40. No mês de Julho de 1587, a Congregação autorizou a Diocese de Liège a nomear um cónego penitenciário com menos de quarenta anos. Por outro lado, decidiu que bastava que o penitenciário falasse a língua francesa em uso no lugar onde está a Catedral, apesar de se falar alemão em grande parte da jurisdição diocesana, não exigindo que este soubesse falar as duas línguas41. ————————

38 Cf. S.C.C., Salernitana, 23 Junho, 21 Julho 1753, in Gasparri V, 1052-1053, n. 3631; 1 Setembro 1753, in Gasparri V, 1056, n. 3636. 39 Cf. S.C.C., Beneventana, 22 Maio 1784, in Gasparri VI, 125-126, n. 3836. 40 Cf. S.C.C., Hispalen., Dezembro 1585, in Gasparri V, 123-124, n. 2148. 41 Cf. S.C.C., Leodien., Dezembro 1587, in Gasparri V, 143, n. 2182.


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Após a vagatura do ofício de penitenciário da Igreja Catedral da Arquidiocese de Cápua, o cardeal Belarmino solicitou à Congregação do Concílio se podia conferir este ofício a um doutor, que apesar disso era incompetente – valde ignarum. A Congregação respondeu no dia 20 de Março de 1623 que se o referido cónego não fosse doutor que se escolhesse outro42. No mesmo ano, a Congregação determinou para a Diocese de Évora que se podia retirar a prebenda penitenciária a favor daquele que fosse douto e hábil, mesmo que não fosse doutor ou licencialicenciado, desde que possuísse a idoneidade para o efeito, segundo a atestação do Ordinário, do cabido e da academia43. Portanto, a Congregação permitiu que se nomeassem penitenciários com idade inferior à requerida pelo Concílio de Trento e permitiu que se escolhessem alguns sem o título académico, desde que fossem idóneos. c) Funções e tempos estabelecidos Antes da aplicação dos cânones tridentinos, existia o hábito aprovado pelo decano e pelo cabido, em Sigüenza, na Espanha, de que os cónegos penitenciários gozassem de períodos de ausência e repouso prolongados. Deste modo, em 1585, o cónego penitenciário Velazquez pediu à Congregação do Concílio que lhe concedesse a graça da ausência como os seus predecessores. Esta respondeu que esta ausência não podia acontecer nos tempos de maior frequência dos fiéis, e nos tempos de festas solenes e de jejum44. No mês de Abril de 1587, o cónego penitenciário de Ávila colocou duas questões à Congregação do Concílio. Primeiramente, se o penitenciário deveria escutar as confissões indiferentemente dos casos reservados ou não, porque este somente pretendia confessar os casos reservados. No entanto, essa restrição conduziu a que muitos se deixassem de confessar a ele, porque deste modo se revelavam. Por isso, a Congregação respondeu que o penitenciário deveria confessar todos os casos. Em segundo lugar, requeria-se que o penitenciário confessasse antes e de———————— 42 43

109.

Cf. S.C.C., 20 Março 1623, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, 109. Cf. S.C.C., Elbor., 12 Março 1623, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica,

44 Cf. S.C.C., Seguntina, Novembro 1585, in Gasparri V, 123, n. 2147: «Congregatio Concilii censuit non posse cogi, sed abesse non debere eo tempore quo frequentius poenitentes accedunt, et diebus festis solemnibus, veluti tempore ieiunii Quattuor temporum, Quadragesimae, Adventus, Resurrectionis, Ascensionis, Pentecostes, Corporis Christi, Assumptionis B. Mariae, Omnium Sanctorum, Nativitatis Domini».


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pois do meio dia nas horas estabelecidas na sede confessional. No entanto, este penitenciário afirmou que era suficiente estar no coro ou em outro lugar da Igreja, onde quem quisesse confessar-se podia procurálo, mas foi obrigado a estar na sede confessional pelo menos algum tempo, como determinava a prescrição tridentina, e devido ao número de peregrinos que acorriam a esta Igreja Catedral. A Congregação respondeu que deveria confessar nas horas oportunas segundo a vontade do bispo45. A 4 de Setembro de 1591, a Sagrada Congregação do Concílio decretou para a Arquidiocese de Génova que o penitenciário, enquanto escutasse confissões, não só fosse considerado como presente no coro do cabido para que recebesse as distribuições quotidianas, mas que também recebesse as esmolas que se distribuíam nos ritos fúnebres ou nas procissões e orações que se realizam na cidade46. No dia 22 de Fevereiro de 1620, esta Sagrada Congregação decretou para a Diocese de Anagni que o penitenciário, enquanto confessasse, quer na Igreja ou na sede para isso deputada, quer fora dela, fosse considerado presente no coro do cabido, e dispensado das outras funções47. A mesma decisão foi repetida para a Diocese de Velletri a 12 de Agosto de 163448. No dia 24 de Janeiro de 1642, esta Congregação estabeleceu para a Diocese de Fano, Itália, que, quando o penitenciário não estivesse impedido pelo serviço das confissões, deveria estar presente nos ofícios divinos49. Em 1647, o Bispo da Diocese de Veroli decretou, com um especial decreto penal, que o penitenciário da Catedral confessasse nos dias das festas solenes, Quaresma e Advento, tendo em conta a pública comodidade dos fiéis. Visto que o penitenciário não aceitou confessar senão quando era convocado, o referido Bispo pediu à Congregação que avaliasse e confirmasse o preceito. A Sagrada Congregação confirmou no ———————— 45 46

111.

47 48

Cf. S.C.C., Abulen., Abril 1587, in Gasparri V, 138-139, n. 2173. Cf. S.C.C., Ianuen., 4 Setembro 1591, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica,

Cf. S.C.C., Anagnina, 22 Fevereiro 1620, in Gasparri V, 221, n. 2420. Cf. S.C.C., Veliterna, 12 Agosto 1634, in Gasparri V, 273, n. 2565: «Sacra, etc., respondit Poenitentiarium, dum confessiones audit in Ecclesia ex suo munere, ab aliis oneribus esse exemptum». 49 Cf. S.C.C., Fanen., 24 Janeiro 1642, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, 345.


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dia 19 de Janeiro o preceito episcopal50. No ano seguinte, a mesma Congregação concretizou os tempos em que o cónego penitenciário deveria estar presente na Catedral, nomeadamente nos períodos de maior frequência dos fiéis, para que não fosse obrigado a maior residência que os outros cónegos51. Embora o penitenciário não seja em geral admitido à confissão das monjas, por causa da dificuldade de satisfazer as duas funções, foi autorizado num caso a realizar ambas52. Em 1671, um penitenciário foi proibido de assumir a administração dos bens como os outros cónegos, ou o ofício de punctator do cabido53. No dia 3 de Fevereiro de 1685, este Dicastério respondeu negativamente às funções simultâneas de cónego da catedral com cura de almas e do ofício de vigário episcopal54. Em 1729, foi estipulado pela mesma Congregação, que o penitenciário não fosse obrigado a assumir os deveres e ofícios do cabido, especialmente de procurador geral55. Em 1761, o cónego penitenciário da Catedral de Pesaro defendeu que era impossível escutar as confissões e dar a absolvição dos casos reservados publicados em grande número no último sínodo diocesano, por causa do sua crescente idade e doença. Por isso, tentou recusar a faculdade de absolver os pecados reservados. O bispo não aceitou esta tentativa sob pena de suspensão a divinis. Daqui nasceu a controvérsia. O cónego penitenciário argumentou então que a jurisdição no foro penitencial, proveniente do seu canonicado, não comprendia os pecados reservados ao bispo, porque não era obrigado a receber esta faculdade contra a sua vontade. Por outro lado, o bispo não podia aplicar uma pena sem as provas de negligência e de indolência do mesmo, cuja diligência e solicitude atestaram quatro cónegos e dois presbíteros inferio———————— 50 51

Cf. S.C.C., Verulana, 19 Janeiro 1647, in Gasparri V, 304, n. 2670. Cf. S.C.C., Verulana, 2 Maio 1648, in Gasparri V, 308, n. 2684: «nimirum tempore Quadragesimae, Adventus, et diebus festis solemnibus, praecipue Resurrectionis, Ascensionis, Pentecostes, Corporis Christi, Assumptionis B. Mariae Virginis, Omnium Sanctorum et Nativitatis D. Nostri Iesu Christi». 52 Cf. S.C.C., Ianuen., 11 Setembro 1666, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, 112. 53 Cf. S.C.C., 3 Outubro 1671, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, 345. 54 Cf. S.C.C., Nullius, 3 Fevereiro 1685, in Gasparri V, 397, n. 2884. 55 Cf. S.C.C., Conversana., 19 Novembro 1729, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, 345.


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res. Propôs também que se deveria constituir um outro confessor na Catedral com a faculdade de absolver os casos reservados, com o qual colaboraria quando este não pudesse escutar sozinho todas as confissões. Em resposta, o bispo considerou desprezível a recusa do penitenciário sob o pretexto de velhice e de doença. Determinou ainda que o penitenciário não podia rejeitar o poder delegado no foro penitencial e a faculdade de absolver dos casos reservados, quer porque ninguém pode negar um ofício público com jurisdição, quer em razão da obediência a si devida pelo clero da sua diocese. Por isso, podia obrigar os sacerdotes a confessar por grave e legítima causa. Considerou como causa grave e legítima aquela que obrigava o penitenciário a aceitar a faculdade delegada de absolver os casos reservados, ratione oficii de penitenciário. Deste modo, o Bispo afirmou que a aplicação da pena de suspensão era justa, porque o penitenciário pode ser punido quando recusa cumprir o seu ofício, dado que não absolveu muitos penitentes com pecados reservados. O Bispo decidiu ainda que o penitenciário deveria ser mais solícito, para que não aumentasse o trabalho, e que devia confessar na sua sede confessional da Catedral nos dias e horas estabelecidos. Às questões colocadas, a Congregação confirmou a argumentação do Bispo. Decidiu que o Bispo pode obrigar o cónego penitenciário a aceitar a delegação de absolver os penitentes dos casos reservados. Não aceitou a proposta de um outro sacerdote com esta faculdade e confirmou a suspensão a divinis ipso facto56. No 30 de Julho de 1831, esta Congregação respondeu afirmativamente à questão colocada pela Diocese de Albano se o cónego penitenciário deveria servir como diácono ou subdiácono nos dias mais solenes, se não tivesse de confessar57. Em conclusão, a Congregação teve como princípio o bem dos fiéis nas funções assumidas pelo penitenciário. Deste modo, este deve confessar nos tempos estabelecidos pelo bispo e quando a afluência dos fiéis justifique. Deve confessar todos os casos e não somente os casos re———————— 56

Cf. S.C.C., Pisauren., 21 Novembro 1761, in Gasparri VI, 9-11, n. 3714: «1. An Episcopus cogere possit Canonicum Poenitentiarium ad acceptandam delegationem facultatis absolvendi poenitentes a casibus reservatis? Et quatenus affirmative: 2. An teneatur Episcopus deputare sumptibus propriis alium Sacerdotem dicta facultate praeditum? 3. An comminatio suspentionis a divinis ipso facto incurrendae substineatur? Die, etc. Sacra, etc. respondit ad 1. Affirmative, et amplius. Ad 2. Negative, et ad mentem. Ad 3. Affirmative». 57 Cf. S.C.C., Alban., 30 Julho 1831, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, 345-346.


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servados, para que se preserve o segredo do sacramento e a boa fama dos fiéis. Enquanto confessa, o penitenciário deve ser considerado presente no coro, conforme o decreto conciliar. Manifestou-se igualmente acerca da incompatibilidade deste ofício com a confissão das monjas e impediu que o penitenciário assumisse as funções de administração económica, procurador geral do cabido e de vigário geral diocesano. d) Delegação Na Diocese de Montefeltro, existia em 1587 o hábito da subdelegação por parte do penitenciário da absolvição dos casos reservados. Em Agosto, foi eleito o penitenciário Fr. Agabitus, monge camaldulense, perito e professor das Sagradas Letras, que defendeu junto do clero este poder. Reunido em Sínodo, o clero recusou em parte a sua argumentação. O problema foi apresentado à Congregação, que decidiu que o penitenciário não podia fazer-se substituir quando se requerem as qualidades de doutoramento ou licenciatura, decretadas pelo Concílio58. No dia 7 de Dezembro de 1675, a Congregação negou novamente que o cónego penitenciário da Catedral pudesse subdelegar a outros a sua autoridade, quer em particular, quer em geral, por viva voz ou por escrito59. e) Prebendas No dia 23 de Setembro de 1596, foi decidido para a Diocese de Sarno que a prebenda do penitenciário deveria ser instituída conjuntamente com a primeira prebenda vacante, de acordo com o decreto do Bispo. Enquanto se esperava essa vacância, não deveria ser atribuído ao penitenciário nenhum outro estipêndio pelo cabido ou pelo clero. Permitiu igualmente que se nomeasse um penitenciário com menos de quarenta anos, se não se encontrasse outro mais apto60. Sessenta anos depois da fundação do cabido, o Bispo Di Matteo instituiu o ofício de penitenciário, libertando-o do encargo das missas com o consentimento do cabido. Após a nomeação de um novo penitenciário, o anterior recusou o encargo do ofício. Por isso, a Congregação foi questionada acerca das obrigações a realizar pelo antigo penitenciário, a qual respondeu que o mesmo não era obrigado ao encargo de penitenciário nem aos emolu———————— 58 59 60

Cf. S.C.C., Feretrana, Setembro 1587, in Gasparri V, 147, n. 2188. Cf. S.C.C., 7 Dezembro 1675, in Gasparri V, 374, n. 2839. Cf. S.C.C., Sarnen., 23 Setembro 1596, in P. Gasparri V, 188, n. 2302, ad. 3.


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mentos correspondentes61. Num outro decreto, a Congregação decidiu que o penitenciário instituído pelo Bispo deveria exercer o ofício, mesmo depois da vagatura da prebenda que lhe estava associada62. Numa decisão de 1602, para a Diocese de Coimbra, a Congregação decretou que a prebenda do ofício de penitenciário deveria ser íntegra e canonical. Se não existissem prebendas, os frutos das distribuições quotidianas deveriam ser considerados como prebendas63. Uma decisão de 1601 proibiu o cónego penitenciário de escolher outra prebenda para a qual fora escolhido64. No mesmo ano, dirigindo-se à Diocese de Vercerlli, Itália, este Dicastério proibiu o penitenciário de não só optar por outra prebenda, mas também de adquirir o título e a ordem. No entanto, podia resignar em favor de outro com outra prebenda, desde que tivesse as qualidades requeridas65. De acordo com o decreto do Concílio de Trento66, a primeira prebenda vacante deve ser conferida ao teólogo, e não ao penitenciário. Contudo, a Congregação autorizou novamente a Diocese da Cività Castellana que concedesse a primeira prebenda ao penitenciário67. A 26 de Abril de 1636, esta Congregação mandou ao arcebispo que constituísse as prebendas de teólogo e penitenciário na sua Igreja Catedral de S. Angelo e em Bisaccia, dioceses da Campanha que somente em 1921 viriam a unir-se68. Em algumas Igrejas Catedrais foi concedido ao cónego penitenciário a opção pela prebenda mais rica, mantendo-se para o futuro esta prerrogativa69. Em 1656, a mesma Congregação respondeu negativamente à ———————— 61

Cf. S.C.C., Sarnen., 1657, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, 344-345. 62 Cf. S.C.C., 1 Março 1598, in G. DE LUISE, ed., Codex Canonum Ecclesiae, 252. 63 Cf. S.C.C., Conimbrien., 31 Março 1602, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, 110. 64 Cf. S.C.C., 12 Fevereiro 1601, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, 110: «Poenitentiarii praebenda, etiam postquam est effectum sortita non subiacere opioni». 65 Cf. S.C.C., Vercellen., 7 Julho 1601, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, 110. 66 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 5, Dec. De reformatione, c. 1, in COD 667-669. 67 Cf. S.C.C., Castellanae, 17 Novembro 1629, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, 110. 68 Cf. S.C.C., S. Angeli Longobardorum, 26 Abril 1636, in Gasparri V, 278, n. 2580: «Insuper praebendas Theologalem et Poenitentialem constituire debere tam in Cathedrali Ecclesia S. Angeli, quam Bisacciensi». 69 Cf. S.C.C., Pisauren., 23 Maio 1648; Sebenicen., 1662; Melevitana, 23 Fevereiro 1726 e 10 Julho 1728, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, 345.


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dúvida acerca da possibilidade do afastamento do penitenciário dos negócios e controvérsias do cabido70. Portanto, a Congregação do Concílio teve a preocupação de instituir a prebenda associada ao ofício do penitenciário, sem deixar de privilegiar a principal finalidade do mesmo, admitindo igualmente a atribuição da primeira prebenda vacante. Por isso, tentou controlar os exageros, proibindo a acumulação de benefícios e prebendas. 2.2.2 Sagrada Congregação dos Bispos e Religiosos A Congregação dos Bispos e Religiosos foi criada em 1601, resultante da unificação da Congregação dos Bispos (1587) e dos Religiosos (1586) e regulou de facto somente o episcopado italiano71. As suas emanações são geralmente concordes com a Congregação do Concílio. a) Instituição No dia 22 de Agosto de 1581, a Congregação respondeu ao Bispo de Reggio, após a morte do penitenciário e de muitos terem requerido o seu canonicado, e decretou que fosse realizado um concurso para homens aptos a serem penitenciários de acordo com as qualidades requeridas pelo Concílio de Trento, que seriam examinados pelo cardeal Savello72. Na cidade de Rutigliano, Diocese de Conversano, província de Bari, o Bispo instituiu na colegiada, loci iuris-patronatus regii, as prebendas de cónego teólogo e penitenciário provenientes dos rendimentos de duas prebendas vacantes e de outros recursos da massa comum. O decreto permitia, praevio regio assensu, ao penitenciário «audire confessiones fidelium utriusque sexus nostrae iurisdictionem subiectorum». A este decreto opôs-se acriter o cabido da Igreja Catedral, considerando-se lesado sobretudo pela instituição do cónego penitenciário e pela respectiva prebenda. Depois de vários recursos e pedidos, finalmente recorreram a esta Congregação. Na sua resposta, o Dicastério citou o decreto de Inocêncio III, no Concílio de Latrão IV, de 121573, e confirmou o decreto do Bispo no que respeita à constuição do penitenciário ad ins————————

70 Cf. S.C.C., Anagnina, 12 Dezembro 1656, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, 345. 71 Cf. J. GAUDEMET, Storia del diritto canonico, 707, nt. 20. 72 Cf. S.C. EP. ET REG., Regien., 22 Agosto 1581, in Gasparri VII, 601, n. 1388. 73 Cf. CONC. DE LATRÃO IV (1215), can. 10, in Mansi 22, 998-1000.


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tar poenitentiariae Ecclesiae Cathedralis, aprovado e confirmado pela autoridade de Pio IX no dia 25 de Setembro de 184674. b) Delegação Numa decisão de 2 de Outubro de 1584, esta Congregação decidiu que o penitenciário não pode delegar a sua autoridade e não pode absolver os casos que o bispo reserve expressamente a si mesmo, a não ser que ele conceda expressamente esta faculdade especial75. c) Incompatibilidade de ofícios No dia 13 de Maio de 1611, esta mesma Congregação opõe-se pela segunda vez à nomeação do vigário geral que já era penitenciário da Catedral, por parte do Bispo de Rimini. Deste modo, afirma, evita-se que o foro externo se possa valer dos excessos do foro interno, tendo como finalidade o bom governo da Diocese76. No dia 5 de Fevereiro de 1706, proibiu a nomeação do penitenciário para vigário geral da Diocese de Squillace, «para não tirar a liberdade dos penitentes nas confissões, sabendo que o mesmo sujeito, exercitando o ofício de juiz espiritual e temporal, pode facilmente abusar das notícias recebidas no sacramento da penitência ao julgar as causas no foro temporal»77. d) Funções A Congregação decidiu, em 1607, que o penitenciário aprovado e estabelecido pelo delegado apostólico que considere suspeitos o vigário e o tribunal do ordinário pode escutar confissões, mesmo sem autorização do ordinário78. ———————— 74

1947.

S.C. EP. ET REG., Conversanen., 19 Setembro 1846, in Gasparri IV, 922-923, n.

75 Cf. S.C. EP. ET REG., Reginen, 2 de Outubro 1584, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, 111. 76 Cf. S.C. EP. ET REG., Ariminen., 13 Maio 1611, in Gasparri VII, 718, n. 1649: «Si scrisse a V.S. sotto li 28 Gennaro passato, che stato bene, ch’Ella avesse fatto provisione d’altro Vicario nella sua Chiesa di Rimini per essere il presente penitenziero di quella Cattedrale, acciò si levi via ogni occasione di suspezione, che il foro esteriore possa valersi nella notizia degli eccessi del foro interiore». 77 S.C. EP. ET REG., Squillacen., 5 Fevereiro 1706, in Gasparri VII, 800, n. 1823. 78 Cf. S.C. EP. ET REG., 25 Fevereiro 1607, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, 112.


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No dia 18 de Setembro de 1637, a mesma Congregação proibiu um bispo de forçar o penitenciário a estar na sua sede para escutar confissões durante o tempo em que não estão presentes penitentes que queiram confessar-se a ele79. 2.2.3 Sagrada Congregação dos Ritos A Sagrada Congregação dos Ritos foi fundada em 1588 e as suas competências referiam-se à liturgia, administração dos sacramentos, ao ceremonial, às festas e aos processos de canonização80. Tendo surgido algumas controvérsias entre o Bispo de Termoli e os cónegos da Catedral, entre os quais o penitenciário, acerca da assistência a prestar ao Bispo durante as celebrações solenes, foram dirigidas a esta Sagrada Congregação algumas questões. A mesma decidiu então que a assistência a prestar ao Bispo nas celebrações solenes compete ao diácono conforme o Cerimonial dos Bispos, sendo o penitenciário dispensado desta assistência. A primeira decisão foi tomada no dia 21 de Junho de 1766, e foi confirmada no dia 12 de Julho de 176681. 2.2.4 Sagrada Congregação do Santo Ofício Criada em 1542 por Paulo III para defender a Igreja da heresia, a «Sagrada Congregação da Universal Inquisição», passou a ocupar o primeiro lugar entre as várias Congregações na Bula Immensa aeterni Dei (1588) de Sisto V. Commumente denominada como Santo Ofício, só em 1908, na Constituição Sapienti Consilio, assumiu oficialmente esta denominação82. No dia 13 de Julho de 1916, enquanto se elaborava o novo Código, a Sagrada Congregação do Santo Ofício emanou uma instrução dedicada aos casos reservados da consciência, dividida em 8 parágrafos, por mandato expresso do Papa Bento XV83. A preocupação da Congregação refere-se ao número de casos que podem tornar-se mais em ruína do que em utilidade, se superarem a medida e o modo. Por isso, pretende-se organizar esta disciplina. ———————— 79 Cf. S.C. EP. ET REG., 18 Setembro 1637, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, 111. 80 Cf. J. GAUDEMET, Storia del diritto canonico, 707, nt. 20. 81 Cf. S.R.C., Thermularum, 21 Junho, 12 Julho 1766, in Gasparri VII, 1054, n. 5810. 82 Cf. J. GAUDEMET, Storia del diritto canonico, 706. 83 Cf. S.C.S. OFF., Instructio, 13 Julho 1916, AAS 8 (1916) 313-315.


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No primeiro parágrafo, afirma-se que os casos reservados da consciência devem ter como finalidade a remoção dos obstáculos que são impedimento não comum à salvação das almas. Por isso, este remédio só se deve aplicar, depois de discutido no sínodo diocesano, ou fora do sínodo, escutado o cabido da Catedral e alguns clérigos com cura de almas, se estiverem convencidos da verdadeira necessidade da reserva ou da sua utilidade. Restringe-se, por outro lado, o número de casos, que devem ser poucos, três ou no máximo quatro, para os mais graves e atrozes crimes, que se devem determinar especificamente. Esta reserva não deve vigorar para além do necessário, de modo a extirpar o vício público e instaurar a disciplina cristã. Os casos reservados não se devem aplicar aos pecados meramente internos, segundo a praxe, tendo em conta o perigo para as almas, nem àqueles que, por causa da fragilidade humana, não têm especial malícia. Devem ser dispensados da reserva episcopal os que são reservados à Sé Apostólica e aqueles que têm censura ipso iure, revogando-se deste modo a instrução de 26 de Novembro de 1602 da Congregação dos Bispos e Religiosos84, que não permitia que os bispos reservassem os casos de excomunhão ipso iure, senão em casos de escândalo ou causa necessária. Os que querem reforçar as suas reservas sejam cautelosos e moderados no que diz respeito às sanções penais, especialmente às excomunhões, como ensinara o Concílio de Trento, que decretava que se deveriam usar com muita cautela e medida, tendo como finalidade a salvação e não a ruína85. Na intenção da Congregação, como se afirma no parágrafo sexto, a faculdade de absolver destes casos é concedida pelo menos ao cónego penitenciário habitualmente, mesmo da Igreja colegial, e aos vigários forâneos que agem no seu lugar, especialmente nos lugares mais longíquos da sede episcopal, também com a faculdade de subdelegar aos confessores do seu distrito, se e quando os penitentes recorrerem a estes em algum caso mais urgente86. ———————— 84 85

Cf. S.C. EP. ET REG., 26 Novembro 1602, in Gasparri VII, 704-706, n. 1616. Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 25, Dec. de reformatione generali, c. 3, in COD 785-786: «Quamvis excommunicationis gladius nervus sit ecclesiasticae disciplinae et ad continendos in officio populos valde salutaris: sobrie tamen magnaque circumspectione exercendus est, cum experientia doceat, si temere aut levibus ex rebus incutiatur, magis contemni quam formidari, et perniciem potius parere quam salutem». 86 S.C.S. OFF., Instructio, 13 Julho 1916, AAS 8 (1916) 314: «Mens tamen est S.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

No parágrafo sete, delimita-se o uso dos casos reservados. De modo a evitar graves inconvenientes que possam surgir em peculiares circunstâncias, o Santo Ofício determina que a reserva ipso iure cessa quer para os doentes desejosos de se confessarem mas que não podem sair de casa, quer no caso dos nubentes que vão para o matrimónio, quer todas as vezes que, a juízo do confessor, os penitentes não podem recorrer ao legítimo superior sem grave incómodo ou sem perigo da violação do sigilo sacramental. A reserva cessa igualmente uma só vez quando foi negada a absolvição, tendo sido pedida para um determinado caso pelo legítimo superior. Cessa também durante o preceito pascal nos casos reservados ao Ordinário, sendo absolvida pelo pároco e equiparados pelo direito. Os missionários gozam igualmente desta faculdade para as Missões. Os pecados reservados numa diocese podem ser absolvidos por qualquer confessor noutra diocese em que não são reservados87. Finalmente, o Santo Ofício apela a que os Ordinários se esforcem por formar confessores doutos, pios e prudentes em toda a Diocese e afastem as inevitáveis moléstias dos casos reservados entre penitentes e confessores. Depois do Concílio de Trento, este documento do Santo Ofício apresenta-se como a instrução mais inovadora e organizada nesta matéria. Como se nota no texto, tem um alcance pastoral extraordinário, tendo em conta a salvação das almas, ao estipular a redução do número dos casos reservados e as situações em que estes cessam. Descreve-se o ofício do penitenciário com faculdade habitual, mas este não é o único que pode absolver os casos reservados a nível diocesano, tendo em conta os lugares mais longíquos da sede episcopal e os casos mais urgentes e necessários. 3. O Concílio Vaticano I Convocado por Pio IX com a Bula Aeterni Patris, de 29 de Junho de 1868, o Concílio Vaticano I foi inaugurado no dia 8 de Dezembro de 1869 e suspenso no dia 18 de Dezembro de 1870, sem nunca ter sido ————————

Congregationis ut huiusmodi absolvendi facultas habitualiter impertiatur saltem Canonico Poenitentiario, etiam Ecclesiae Collegiatae, et Vicariis Foraneis eorumve vices gerentibus, addita his ultimis, praesertim in locis dioecesis a sede episcopali remotioribus, etiam facultate subdelegandi toties quoties confessarios sui districtus, si et quando pro urgentiori aliquo determinato casu ad eos recurrant». 87 Cf. S.C.S. OFF., Instructio, 13 Julho 1916, AAS 8 (1916) 315.


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retomado nem formalmente encerrado88. As Constiuições emanadas ao longo das suas três sessões não dizem respeito ao nosso tema, mas nas actas deste concílio encontram-se alguns elementos que convém referir. Por um lado, reconhece-se entre os estudiosos a importância deste Concílio no processo de elaboração do Codex89. Por outro, no que diz respeito aos clérigos, encontram-se nas actas pré-sinodais algumas questões particulares. O questionário relativo à vida eclesiástica do clero inclui vários aspectos, como a sua formação, sede vacante, ofício de pároco ou a encardinação90. Num apêndice à respostas a essas questões enviadas pelos bispos, encontram-se algumas referentes ao cabido dos cónegos, nomeadamente a necessidade da reforma da sua disciplina. Contudo, nada se refere ao penitenciário91. No decorrer do Concílio, chegaram a Roma vários postulata acerca desta matéria. Contudo, a 12 de Dezembro de 1869, os Postulata Episcoporum Neapolitanorum referiram-se ao cabido da Catedral, nomeadamente aos seus ofícios, às suas normas, às qualidades necessárias, à sua função paroquial, à relação com o Bispo, às prebendas e privilégios. Contudo, nunca se faz referência ao penitenciário92. Finalmente, os esquemas De Disciplina Ecclesiastica distribuídos aos Padres do Concílio no dia 22 de Fevereiro de 1870, incluem um esquema De Capitulis Canonicorum, dividido em quatro capítulos93. Exactamente no terceiro capítulo, depois de se definir a função do cónego teólogo, descreve-se o penitenciário: Insuper unus e canonicis ecclesiae cathedralis poenitentiarii munus, propriae eius praebendae adiunctum, deputetur, servatis quoad eius provisionem iis omnibus quae ea de re per Tridentinam synodum (Sess. XXIV, cap. 8, De Reform.) et supra a nobis pro theologi officio praescripta sunt; et is quoque dum statis per episcopum diebus et horis sua in sede confessionali assistit, vel alias actu confessiones ibidem audit, praesens in choro

———————— 88 89 90 91

Cf. CONC. VATICANO I, in COD, 801. Cf. F. FALCHI, I Chierici nel processo, 2, nt. 6. Cf. CONC. VATICANO I, Nonnula quaesita, 6 Junho 1867, in Mansi 49, 243. Cf. CONC. VATICANO I, Episcoporum responsa, Appendice, cap. I, Del clero secolare, 1865, in Mansi 49, 430-431; F. FALCHI, I Chierici nel processo, 2. 92 Cf. CONC. VATICANO I, Postulata Episcoporum Neapol., 12 Dezembro 1869, in Acta et Decreta Sacrosancti Oecumenici Concilii Vaticani, Friburgi Brisgoviae 1892, 803-806. 93 Este esquema foi examinado e melhorado nas reuniões da Comissão pro rebus disciplinae, nos dias 3 e 7 de Março e 13 de Abril de 1870. CONC. VATICANO I, Schema decreti de capitulis canonicorum, 22 Fevereiro 1870, in Mansi 53, 729-731; 730, nt. 1.


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habeatur. In iis vero locis, ubi canonici theologi et poenitentiarii officia cum ipsis praebendis perpetuo coniungi nequeant, officia saltem praefata duobus canonicis, dum nominantur, ita committi volumus, ut quandiu praebendam retinent, eiusmodi onus huic adnexum censeatur, aut saltem operam dari ab episcopis ut numquam desit qui sacras lectiones ad instar theologi habeat, et qui ad instar poenitentiarii confessiones excipiat. Ceterum constitutionem f.r. Benedicti XIII, quae incipit Pastoralis officii, iis in locis, pro quibus lata est, in suo robore manere volumus94.

Deste modo, retomam-se as mesmas normas da legislação precedente: o exercício do ofício de penitenciário na Igreja Catedral, anexo a uma prebenda, e as qualidades necessárias para o mesmo, como a submissão a um exame e a formação em Teologia. Além disso, o penitenciário é considerado presente no coro do cabido enquanto está no confessionário. A segunda parte do parágrafo decreta que, nos lugares onde não existir este ofício com a sua prebenda, o mesmo seja entregue a outro cónego para que nunca falte quem realize confissões ad instar poenitentiarii. Cita a Constituição Pastoralis officii, de Bento XIII, de 1725, que pretende manter95. Embora este esquema nunca tenha sido promulgado, por causa da suspensão do Concílio, não deixa de ser importante, pois estabelece a ponte entre a anterior tradição legislativa e o futuro código. Tal confirma a influência do Vaticano I no Codex. 4. O Código Pio-Beneditino de 1917 4.1 Iter da codificação O processo de elaboração da codificação do Codex 1917 permite-nos entender melhor o sentido da legislação acerca do penitenciário como ofício96. Os trabalhos iniciaram-se com o convite de S. Pio X enviado ao episcopado latino, para que apresentasse os postulata e desiderata em mérito97. As respostas foram organizadas por Klumper num volume ———————— 94

CONC. VATICANO I, Schema decreti de capitulis canonicorum, 22 Fevereiro 1870, cap. III, in Mansi 53, 730-731. 95 Cf. BENTO XIII, Const. Pastoralis Officii, 19 Maio 1725, in Gasparri I, 622-623, n. 289. 96 Cf. P. GASPARRI, «Storia della codificazione», 1-10; J. LLOBBEL – E. DE LEÓN – J. NAVARRETE, Il libro “De processibus”, 46-86; C. FANTAPPIÈ, Chiesa romana, 691-804; G. FELICIANI, Presentazione, 3-23; J. KOWAL, «Error Simplex», 669-686. 97 Cf. PIO X, m.p. Arduum sane munus, 19 Março 1904, ASS 36 (1903-1904) 551: «Volumus autem universum episcopatum, iuxta normas opportune tradendas, in gra-


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de quase trezentas páginas, em 1905, e num Apêndice de 190898. Mais tarde Gasparri desabafou: O nosso Código de Direito Canónico foi composto em Roma principalmente por mim, mas teve a colaboração de todo o episcopado da Igreja Latina, o que ocupa com vantagem o lugar de um Concílio Ecuménico e explica como o Código foi tão bem acolhido pelo próprio episcopado99.

Posteriormente, S. Pio X nomeou os membros da comissão cardinalícia e o primeiro grupo de consultores. Depois, procedeu-se à divisão e discussão da matéria do Código100 e à entrega dos argumentos aos diversos consultores e colaboradores101. O Index materiarum Codicis Iuris Canonici foi finalmente aprovado pela Comissão Cardinalícia no dia 26 de Junho de 1904102. Em seguida, cada parte ou título da futura legislação foi entregue a dois ou mais consultores e colaboradores, que deveriam estudar e formular os cânones e artigos. Para esses, foram fixadas datas precisas. Para os cânones iniciais do Livro I, a data de Outubro de 1904, e para os últimos cânones do Livro V, a data de Maio de 1909103. Posteriormente, entregaram esse trabalho às Comissões de consultores, que se reuniram sob a presidência do próprio Gasparri104. ————————

vissimum hoc opus conspirare atque concurrere»; Litt. circ. Pergratum mihi, 25 Março 1904, ASS 36 (1903-1904) 603-604. 98 Cf. Postulata Episcoporum in ordinem digesta, Romae 1908: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 4; Appendix ad Postulata Episcoporum, Romae 1908: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 6. 99 P. GASPARRI, «Storia della codificazione», 9. 100 Feliciani sintetiza muito claramente o debate interno e as concepções em confronto: a existência do próprio código, a relação com os modelos civis, a escolha na divisão da matéria, a possibilidade de uma Constituição na Igreja, antecipando a mais recente problemática da Lex Ecclesiae Fundamentalis, o direito consuetudinário, a dispensa, opções de carácter eclesiológico, como a divisão entre clérigos, religiosos e leigos, os poucos cânones dedicados aos fiéis em geral. Cf. G. FELICIANI, Presentazione, 10-16. 101 Cf. C. FANTAPPIÈ, Chiesa romana, 752-789; P. GASPARRI, «Storia della codificazione», 6-7: «A questo proposito devo dire che una Commissione di scelti canonisti discusse innanzi tutto l’indice del Codice che poi venne in parte modificato secondo che lo svolgimento del lavoro suggeriva». 102 Cf. ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 1. 103 Cf. G. FELICIANI, Presentazione, 18. 104 Cf. Regolamento per la Commissione Pontificia istituita dal Santo Padre per la Codificazione del diritto canonico (11 aprile 1904, n. 5): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 3; P. GASPARRI, «Storia della codificazione», 6-7: «Sotto la mia presidenza una Commissione si radunava nelle ore antimeridiane del giovedi, ed


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

Finalmente, os esquemas foram enviados aos 25 membros da Grande Comissão, e, depois de revistos, enviados à Comissão Cardinalícia, que os analisou várias vezes. Entre 1912 e 1914, os esquemas foram novamente enviados aos bispos, para que cada um consultasse três especialistas em Direito, clérigos religiosos e seculares, e, sob segredo pontifício, manifestassem as suas observações105. O Livro I e II foram enviados a 20 de Março de 1912, e o Livro III a 1 de Abril de 1913. Depois desta consulta, muitos cânones foram acrescentados e modificados. Entre 1915 e 1917, desde o envio dos schemata aos bispos até à promulgação, intervieram de novo a Comissão Cardinalícia, alguns colaboradores de Gasparri e as Congregações romanas106. 4.2 Postulata Os Postulata Episcoporum in ordinem digesta, de B. Kumpler, estão divididos em 46 títulos107. O Tit. XIV trata De Capitulis Canonicorum et de ecclesiis receptitiis. No que respeita ao penitenciário, somente os bispos da região da Úmbria postularam: «ad excipiendas confessiones, signantur canonicum poenitentiarium; diebus ac horis quibus expedire in Domino iudicaverit». No âmbito do ministro da penitência, cap. II, Tit. IV, De Poenitentia, nada foi proposto no que concerne ao penitenciário. No entanto, foram apresentadas várias propostas acerca dos casos reservados, no caput IV, De reservatione casuum, e que abrem novas perspectivas quanto a este ofício. Transcrevemos as mais significativas: Restringatur numerus casuum R. Pontifici reservatorum (Postulant Episcopus Anagninus; Partes Prov. de Montreal; Prov. Bituricensis). Lege generali confirmetur S. Officii decretum diei 23 Iun. 1886 cum subsequentibus responsis circa absolutionem quorumlibet peccatorum S. Sedi

————————

una nelle ore antimeridiane della domenica, prendendo in esame i canoni preparati dai Consultori nelle diverse materie [...]. Se la domenica seguente fossimo tornati in seduta con gli stessi elementi, si sarebbe avuto lo stesso risultato; quindi per avanzare, era necessario che io facessi una redazione unica, tenendo conto degli schemi rimessi ai Consultori, e della discussione; ma in verità questa redazione unica io la facevo a mio modo ed era necessario che la facessi subito cioè la domenica stessa nelle ore pomeridiane e il lunedì affinchè la tipografia potesse stamparla, io corregerla e il mercoledì rimetterla ai membri della Commissione per la discussione della futura domenica». 105 Cf. P. GASPARRI, «Storia della codificazione», 8. 106 Cf. J. LLOBBEL – E. DE LEÓN – J. NAVARRETE, Il libro “De processibus”, 8186; J. KOWAL, «Error Simplex», 681-682. 107 Cf. B. KUMPLER, Postulata Episcoporum, Romae 1908.


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cum vel sine censura reservatorum. (Postulant Partes Prov. Parsiensis; Prov. Bisuntinae) Habeat episcopus facultates oportunas absolvendi a casibus reservatis (praesertim in casu urgenti). (Postulant Episcopi regionis Subalpinae; Patres Prov. Bituriensis). Reservationes peccatorum et censurarum sive S. Pontifici sive episcopo reducantur ad pauciores casus, eosque gravissimos et rariores. (Postulant Patres Prov. Aquensis) Restringantur quantum fieri potest numerus casuum reservatorum et augeatur episcopi facultas quasi-ordinaria in casus R. Pontifici reservatos. (Postulant Episcopus Montalbanensis; Patres Prov. Westmonasteriensis). Valeant omnes sacerdotes qui habent curam animarum, absolvere a casibus reservatis. (Postulant Patres Prov. Senonensis). Valeat episcopus sacerdotibus sibi bene visis communicare facultatem absolvendi a casibus R.P. reservatis (Postulat Episcopus Claramontensis). Simpliciori modo proponatus legislatio canonica circa absolutionem casuum S. Sedi reservatorum, postremis temporibus evoluta; eaque, confusionis vitandae et disciplinae uniformis instituendae causa, extendatur ad casus episcopales cum vel sine censura reservatos. (Postulant Episcopi Hiberniae)108.

Nota-se nestes postulata o pedido de organização e simplificação da matéria, ad pauciores casus. Conjuntamente, solicitou-se a concessão de maiores faculdades aos bispos em relação ao Romano Pontífice e até mesmo a proposta de conceder a todos os sacerdotes com cura de almas a faculdade de absolver os casos reservados. O simples facto de nunca se referir explicitamente o ofício de penitenciário é em si mesmo elucidativo, dado que a preocupação dos bispos acerca da absolvição dos casos reservados é mais abrangente que este ofício. 4.3 Os Vota Os votos relativos ao Livro II, De clericis in specie (tit. V-XX), foram entregues a Laurenti e Sägmüller. Os votos acerca do sacramento da penitência, no Livro III, De Rebus, foram entregues a Bucceroni e Müller. 4.3.1 O votum de Laurenti O jesuíta Joseph Laurentius (†1927) foi professor de direito canónico em Valkenburg, nomeado consultor da Pontifícia Comissão para a ———————— 108

Cf. B. KUMPLER, Postulata Episcoporum, 121-123.


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codificação do Direito Canónico a 22 de Outubro de 1906. Colaborou na elaboração do Epitome Instituti Societatis Iesu. Escreveu as Institutiones iuris ecclesiastici. Orientou a nova edição do título III e IV do Ius Decretalium por encargo do seu mestre, P. Wernz, e publicou um Conspectus Codicis iuris canonici, em 1919. Foram-lhe entregues os votos De Capitulis Canonicorum et de Ecclesiis receptis e De clericis in specie (1907)109. O seu voto, no que se refere ao penitenciário, insere-se no Liber Secundus de Personis, Pars I, De clericis, Titulus XIV, mais concretamente no De capitulis canonicorum et de ecclesiis receptiis. No can. 5, descreve a necessidade e a função do penitenciário: Eodem modo canonicus poenitentiarius in capitulis cathedralibus adsit, qui tempore ad Episcopo statuto in cathedrali ecclesia officio audiendarum confessionum fungatur atque ipso iure in casus ab Episcopo habitualiter reservatos absolvendi habeat per se et non per alium facultatem (Cfr. Trid. XXIV, 8 de ref). Poenitentiarium iuxta normam ad Episcopo statutam quaestiones approbat pro conferentiis sacerdotum moralibus in singulis decanatis habendis110.

No can. 6, estabelece-se que o penitenciário deve estar presente no coro do cabido. Do mesmo modo, se exercer um ministério de cura de almas fora da cidade por todo o tempo em que residir ou administrar o seu ministério, seja considerado como presente na Igreja Catedral ou Colegiada111. No can. 9, descrevem-se as condições para a nomeação do penitenciário: «ordine presbyteratus insigniti, promovendi ad dignitatem vel ad officium theologi aut poenitentiarii quadragesimum aetatis annum attingerint»112. E acrescenta-se que a mesma função deve ser exercida por quem for mestre, doutor ou licenciado em Teologia ou Direito Canónico, referindo como fonte o Concílio de Trento113. Nos can. 11-14, apre———————— 109 110 111

Cf. C. FANTAPPIÈ, Chiesa romana, 1192. Cf. J. LAURENTIUS, Votum, 5. Cf. J. LAURENTIUS, Votum, 5: «Canonicus curatus, theologus, poenitentiarius, officiis suis actu incumbentes, ut praesentes in choro habentur (Trid. Sess. 22, c. 3, de ref., et ex praxi vigenti). Similiter si cui ex canonicis cathedralibus seu collegialis extra civitatem in dioecesi cura animarum imminera, pro tempore quo in curata ecclesia resederit ac ministraverit, tamquam praesens sit ac si divinis intersit, in ecclesiis cathedralibus ac collegiatis habeatur (Trid. 1. c. Sess. 22, c. 3, de ref.)». 112 Cf. J. LAURENTIUS, Votum, 6-7. 113 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 24, Dec. De reformatione, c. 12.


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sentam-se as questões referentes ao direitos dos cónegos, como o de sufrágio, prebendas e deveres, o de celebrarem a missa conventual e o ofício divino in choro per se et non per substitutos persolvere, com a respectiva fonte114. 4.3.2 O votum de Sägmüller Johannes Baptist Sägmüller (†1942) foi professor de História Medieval, Direito Canónico e Pedagogia na Universidade Católica de Tubinga (1893-1928). Publicou numerosas obras de História do Direito Canónico, escritos sobre problemas da política, e interveio no debate acerca da codificação canónica. Colaborou no Codex com o voto De clericis in specie (tit. V-XX). São-lhe atribuídos igualmente os votos: De Romano Pontifice, De synodo dioecesano115. No seu voto De clericis in specie, Sägmüller dedica o Tit. XIV ao cabido dos cónegos. No can. 2, coloca o penitenciário entre os ofícios do mesmo116. O can. 3 estabelece: «Ad dignitates, quibus adnexa et cura animarum vel non, et ad officium Canonici Theologi et Poenitentiarii requiritus annis quadragesimus inchoatus»117. Continua que o teólogo, o penitenciário e pelo menos metade dos cónegos das Igrejas Catedrais e Colegiadas devem ser mestres, ou doutores, ou licenciados em Teologia ou em Direito Canónico118. Os restantes cânones são dedicados aos direitos e deveres dos cónegos em geral, sem nenhuma outra referência específica ao penitenciário. 4.3.3 O votum de Bucceroni O jesuíta Gennaro Bucceroni († 1918) foi professor nas Canárias, Laval, Ilha de Jersey, Lovaina e Universidade Gregoriana. A sua obra Institutiones theologiae moralis teve dez edições, e Casus Conscientiae sete. O seu Enchiridion morale estava actualizado até à sua morte com as decisões das Congregações Romanas. Foi membro de vários Dicastérios e nomeado consultor da Comissão do Codex, a 15 de Abril de 1904. Colaborou com dois vota: De poenitentia (1904) e De abstinentia et jeiunio119. ————————

114 Cf. J. LAURENTIUS, Votum, 7-11. Neste caso, o votum cita a seguinte fonte: CONC. DE TRENTO, Sess. 21, Dec. De reformatione, c. 3. 115 Cf. C. FANTAPPIÈ, Chiesa romana, 1232. 116 Cf. J. SÄGMÜLLER, Votum, 57. 117 J. SÄGMÜLLER, Votum, 58. 118 Cf. J. SÄGMÜLLER, Votum, 58. 119 Cf. C. FANTAPPIÈ, Chiesa romana, 1183.


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O seu votum De Poenitentia organiza a matéria em 9 capítulos, dedicando o cap. III ao ministro da penitência em geral, com 12 cânones, o cap. IV, De casuum reservatione, com 4 cânones, e o cap. V, De casuum reservatione absolutione, com 6 cânones. Somente neste último capítulo é mencionado o penitenciário no can. 2: Ordinarii per totam suam dioecesim, ac praesertim in iis locis, qui a civitate et cathedrali sede longius remoti sunt, poenitentiarios aliosque sacerdotes constituant ac delegent, quibus facultatem absolvendi a casibus sibi reservatis concedant, ita ut his quoque liceat eamdem aliis confessariis, si opus sit, etiam viva voce impertiti. Dec. S.C.EE. et RR. 26 Nov. 1602120.

Apresenta igualmente outros ofícios em que o presbítero pode absolver dos casos reservados: confessores delegados pelos superiores religiosos (cap. V, can. 5, 6); difícil acesso ao Papa (cap. V, can. 4); in articulo mortis (cap. IV, can. 4). A consulta parcial de 4 de Junho de 1905 acerca do sacramento da penitência e indulgências começou por analisar este votum. Aprovou simplesmente a única referência ao penitenciário, no can. 2 do cap. V. De casuum reservatorum abolutione. 4.3.4 O votum de Müller August Müller (†1922) foi professor no Seminário de Treviri, oficial e proposto da Catedral de Treviri. Publicou a tese De placito regio: dissertatio historico-canonica e Ist die katholische Moraltheologie reformbedürftig? Colaborou na elaboração do Codex com o votum De paenitentia (1905)121. O votum de Müller, dividido em 5 capítulos, apresenta o ministro da penitência no cap. II, em 2 parágrafos. Estabelece no segundo parágrafo a célebre distinção entre poder de ordem e de jurisdição. Segue-se o cap. III, De approbatione et iurisdictione, com 19 parágrafos. Apenas no parágrafo 8, faz referência ao penitenciário, dentro do elenco dos ministros ordinários da confissão: o Romano Pontífice e o Penitenciário Maior, o Bispo, o Vigário Geral, o Penitenciário da Catedral, o Pároco, e o Prelado regular122. O cap. IV, De reservatione casuum, é dividido em 9 parágrafos. No primeiro parágrafo, defende o direito da reserva dos atrociora quaedam et graviora crimina por parte da Igreja, ———————— 120 121 122

Cf. G. BUCCERONI, Votum, 11. Cf. C. FANTAPPIÈ, Chiesa romana, 1229. Cf. A. MÜLLER, Votum, 10.


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e, no terceiro parágrafo, explica o seu sentido: in aedificationem et non in destructionem123. Descreve igualmente, no parágrafo 7, que essa reserva cessa em artigo de morte, ou, que se pode recorrer ao Bispo ou ao Penitenciário Maior no caso de impossibilidade de acesso ao Papa, nos casos urgentes, de grave escândalo ou infâmia, ou por longo tempo de espera. Contudo, nada mais menciona acerca do penitenciário diocesano. 4.4 Os Esquemas do Livro II 4.4.1 Os primeiros esquemas Um primeiro esquema intitulado cap. IV, De Capitulis canonicorum, do can. 126 ao can. 161, foi proposto aos Consultores no dia 2 de Março de 1907124. O can. 137 era assim formulado: §1. Poenitentiarii canonici est audire confessiones quandocumque a fidelibus requiritur; eo ipso quod institutus est, obtinet a iure iurisdictionem per tota dioecesi absolvendi etiam a casibus reservatis. §2. Etiam non vocatus debet de mane assistere et residere in sede confessionali ab episcopo ipsi destinata tempore ienuiorum quadragesimae, adventus et quatuor temporum, et in diebus festis Ressurrectionis, Ascensionis, Pentecostes, Corporis Christi, Assumptionis B. M. V., omnium Sanctorum et Nativitatis, nec non vespere in vigiliis eorumdem festorum. §3. Urgente necessitate, episcopus statuere potest ut canonicus poenitentiarius, loco confessionum audiendarum, theologiam moralem in seminario explicet125.

Relativamente ao segundo parágrafo, alguns consultores anotaram que se deveria fixar o tempo de mane, e pretenderam determinar a disposição relativa à obrigação de confessar, durante o ofício. De igual modo, defenderam a autoridade do bispo na fixação das horas e dias de confissão. Contudo, esta opção não foi aceite por todos126. ———————— 123 124

Cf. A. MÜLLER, Votum,15. Presidente: Gasparri. Consultores: Sebastianelli, Scapinelli, Many, Pezzani, Klumper, Vital, Laurentius, Bucceroni. 125 Cf. Animadversiones in Lib. II. Codicis, can. 137: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27, 7. 126 Cf. Animadversiones in Lib. II. Codicis: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27: «Alcuni fisserebbero anche l’ora di quel de mane, ed osservano la disposizione relativa all’obbligo di confessare durante la officiatura. Li conviene dire: diebus et horis ab Episcopo determinandis. Poi si completa ancora: matutinis horis quibus fidelium confessiones audire solent, allisque diebus ab Episcopo determinatis.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

O can. 139 §1 determina assim: Canonicus theologus vel licenciatus in sacra theologia; poenitentiarius doctor vel licenciatus in sacra theologia aut in iure canonico, iurisdictionem in foro externo non obtinens; seu alias qui aptiores pro loci qualitate ad propria munera adimplenda reperiantur127.

Many, um dos consultores, pretendia fundir este parágrafo com o can. 143, deste modo: «In canonicatus, presertim theologi et poenitentiarii requiritur». Outros mantiveram-no como está. Gasparri queria que o penitenciário fosse doutor em Teologia128. Por outro lado, o can. 141 estabelece: Canonicus theologus per totam diem qua suo munere fungitur, poenitentiarius, dum actu in confessionali sedet pro confessionis audiendis, vicarius parochialis dum parochialis officiis vacat, tamquam praesentes in choro censeatur129.

Os consultores propuseram que o penitenciário fosse dispensado do coro, com algumas condições130. Um segundo esquema intitulado cap. IV De Capitulis canonicorum, do can. 132 ao can. 165, foi proposto aos consultores no dia 19 de Março de 1907131. Transcrevemos as propostas concernentes ao penitenciário. O can. 144 determina: ————————

Many comincerebbe così questo paragrafo: Si ita statuerit Episcopus, canonicus poenitentiarius, etiam non vocatus, ecc. §3 Bucceroni è contrario». As propostas dos consultores são manuscritas e sem número de página. 127 Cf. Animadversiones in Lib. II. Codicis, can. 139: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27, 7-8. 128 Cf. Animadversiones in Lib. II. Codicis: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27: «Many fonderebbe questo paragrafo col c. 143 , cosi: ecc. Altri lo mantengono così. Presidente (Gasparri) vorrebbe, quanto al penitenziere, che ceteris paribus si preferisse il dottore in theologia». 129 Cf. Animadversiones in Lib. II. Codicis, can. 141: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27, 8. 130 Cf. Animadversiones in Lib. II. Codicis: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27: «Scapinelli si domanda se debba essere esonerato dal coro, anche quando abbia già confessato. Klumper, per questo caso, lascia al Vescovo di dispensarlo dalla officiatura. Presidente propone che si dispensi dal coro, se abbia seduto al confessionale per 3 ore. Si conviene». 131 Presidente: Gasparri. Consultores: Sebastianelli, Scapinelli, Many, Pezzani, Klumper, Vital, Laurentius, Bucceroni. Cf. Animadversiones in Lib. II. Codicis: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27.


CAP. III: DE TRENTO À ACTUAL LEGISLAÇÃO

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§1. Canonicus theologus et poententiarius eligantur qui aptiores pro loci qualitate ad propria munere adimplenda reperiuntur; sed, ceteris paribus, praeferantur doctores in sacra theologia, si agatur de canonico theologo, in sacra theologia vel iure canonico, si de poenitentiario. §2. Praebenda theologalis et poenitentiaria non conferatur, nisi prius candidati de vita, moribus et scientia examinati et approbati fuerint ab episcopo cum examinatoribus synodalibus. §3. Canonicus poenitentiarius nequit simul munus poenitentiarii ac iurisdictionem in foro externo exercere.

Os consultores propuseram que se estabelecesse a idade mínima para o penitenciário, entre 30 ou 40 anos. Por outro lado, modificaram a redacção do terceiro parágrafo132. O can. 146 estabelece: Canonicus theologus per totam diem qua suo munere fungitur, poenitentiarius diebus quibus per duas vel tres horas in confessionali, vicarius parochialis dum parochialis officiis vacat, tamquam praesentes in choro censeantur.

Os consultores propuseram que se esclarecesse a expressão tanquam praesentes, devendo-se estabelecer os princípios que determinam as distribuições quotidianas, e as inter praesentes. Discutiu-se muito acerca do tempo em que o penitenciário deveria estar no confessionário, de que resultaram algumas propostas de redacção133. O esquema foi submetido ao exame da Congregação plenária de Cardeais no dia 27 de Maio de 1907134, posteriormente revisto e proposto à mesma no dia 22 de Julho de 1907135. No esquema do Livro II, ————————

132 Cf. Animadversiones in Lib. II. Codicis, can, 144: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27, 7: «Per l’età del Penitenziere, Pezzani vorrebbe 40 anni, Bucceroni soltanto 30 come per i Vescovi. §3. Si modifica: Canonicus Poenitentiarius iurisdictionem in foro externo exercere nequit». 133 Cf. Animadversiones in Lib. II. Codicis, can. 146: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27, 7-8: «Scapinelli osserva che la espressione tanquam praesentes è alquanto oscura, devendosi stabilire il principio che i detti canonici precepiscono le distribuzioni quotidiane ed anche le inter praesentes. Sulla prima parte del c. si discute molto, per convenire nel tempo che il penitenziere deve sedere al confessionale. Alcuni propongono dire: Poenitentiarius dum actu confessiones audit vel sedet in confessionali, diebus et horis ab Episcopo designatis... Altri propongono: Poenitentiarius dum actu et per totam diem si per duas vel tres horas in confessionali sederit ecc». 134 Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (De Clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 19. 135 Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 20.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

De Personis (De clericis), na Pars I de clericis, é dedicado o cap. V ao De capitulis canonicorum, do can. 132 ao can. 165, que apresenta elementos mais precisos acerca do penitenciário e da definição da sua função. O can. 139 afirma: §1. In omnibus ecclesiis cathedralibus sit officium canonici theologi et, ubi id commode fieri potest, officium canonici poenitentiarii §2. Etiam in collegiatis, praesertim insignibus, officium canonici theologi et poenitentiarii constitui potest. §3. Si in capitulo cathedrali praebenda pro his officii deputata non fuerit, episcopus praebendam quomodocumque, praeterquam ex causa resignationis, primo vacaturam, ad eum perpetua constituat et deputet136.

O esquema revisto foi modificado conforme a proposta dos consultores: «Can. 139 §1. In omnibus ecclesiis cathedralibus sit officium canonici theologi et canonici poenitentiarii»137. O can. 140 descreve as condições para este ofício: §1. Canonicus theologus et poenitentiarius eligantur qui aptiores pro loci qualitate ad propria munera adimplenda reperiuntur; sed, ceteris paribus, praeferantur doctores in sacra theologia, si agatur de canonico theologo, in sacra theologia vel iure canonico, si de penitentiaria, qui insuper debet, esse 40 saltem annos natus. §2. Praebenda theologalis et poenitentiaria non conferatur, nisi prius candidati de vita, moribus et scientia examinati et approbati fuerint ab episcopo cum examinatoribus synodalibus [et salva lege concursus, ubi adsit]138. §3. Canonicus poenitentiarius nequit simul aliud officium in dioecesi habere cui adnexa sit iurisdictio in foro externo139.

Este cânon introduz no terceiro parágrafo a advertência que impossibilita o penitenciário de exercer um ofício diocesano com jurisdição ————————

136 Cf. Indica-se a fonte: «CONC. DE TRENTO, Sess. 5, Dec. De reformatione, c. 1; Sess. 24, Dec. De reformatione, c.18» e acrescenta-se «alcuni renderebbero obligatorio anche il canonico penitenziere». Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 19, 7, nt. 1. 137 Schemi del Lib. II, De Personis (De Clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 20, 7. 138 Na nota 1 afirma-se: «Cosi il Conc. di Trento cit sess. V, cap. 1 per la prebenda teologale. Per alcuni luoghi è prescrito il dottorato ed il concorso per ambedue le prebende». Deste modo, foi acrescentada a incisão final no esquema revisto. Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 19, 7-8. 139 Schemi del Lib. II, De Personis (De Clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 20, 7-8.


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no foro externo. Definem-se igualmente as condições para a concessão da prebenda penitenciária. O can. 142 explica em que consiste o ofício do penitenciário. §1. Poenitentiarius canonicus obtinet a iure iurisdictionem pro tota dioecesi absolvendi a casibus episcopo simpliciter reservatis140. §2. Ipse debet in ecclesia audire confessiones quandocumque a fidelibus requiratur141. § 3. Etiam non vocatus debet in sede confessionale ab episcopo ipsi destinata residere diebus ab eodem episcopo pro maiori fidelium commoditate designatis142.

A comissão pontifícia para a codificação, reunida a 24 de Fevereiro de 1908 e formada por Ferrata, Martinelli, Gennari, Cavicchioni, Gasparri, Vive y Couto e De Lai, pronunciou-se acerca do can. 142 §1. Colocaram dúvidas acerca da oportunidade de conceder ao cónego penitenciário a jurisdição sobre toda a diocese e sobre a interpretação da expressão etiam a casibus episcopo reservatis. Tentaram conciliar este parágrafo com o que é estabelecido na parte acerca da penitência143. O can. 143 determina que os cónegos teólogo ou penitenciário que forem negligentes no seu ofício, sejam punidos pelo bispo144. O can. 145 ———————— 140

A formulação posterior do esquema revisto afirma com pouca diferença: «Poenitentiarius canonicus cathedralibus obtinet a iure iurisdictionem pro tota dioecesi absolvendi etiam a casibus episcopo reservatis». Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 20. 141 Na nota 4, descreve-se: «Alcuni soprimono le parole: in ecclesia». Por isso, esta expressão desapareceu no esquema seguinte: «Can. 142 §2. Ipse debet audire confessiones quandocumque a fidelibus requiratur». Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Comissione cod. Diritto Canonico, scat. 20. 142 Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Comissione cod. Diritto Canonico, scat. 20, 8-9. 143 Cf. Verbali delle Consulte parziali e Congregazioni particolari per il Lib. II. De Personis: ASV, Comissione cod. Diritto Canonico, scat. 26: «Gli Eminentissimi sollevano parecchi dubbi sulla opportunità di concedere al canonico penitenziere, anche d’una Collegiata, la giurisdizione pro tota Diocesi e sulla interpretazione delle parole: etiam a casibus episcopo reservatis. Li conviene di riscartrare questo paragrafo con quel che si è stabilito nella parte de poenitentia». 144 Cf. can. 143: «Canonicum theologum aut poenitentiarium in suo munere explendo negligentes, episcopus compellat monitionibus, comminatione poenarum, sequestratione fructuum ac assignatione portionis eorumdem alteri [no esquema revisto: sequestratione fructuum ac portionis eorumdem assignatione in favorem alterius] qui eos suppleat et, crescente contumacia per integrum annum, suspensione ab officio et beneficio, ac, perdurante contumacia per aliud semestre, privatione eiusdem benefici-


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

chega ao ponto de precisar as horas em que o penitenciário deve passar no confessionário: «poenitentiarius, dum, durante choro, audit confessiones, et per totam dies, si per tres horas in confessionali ex mandato episcopo sedet»145. A nota 2 referente ao mesmo ajusta para duas horas. Contudo, a mesma Comissão Cardinalícia deliberou que se conservasse o Direito vigente, pelo que se deveria suprimir a expressão: «et per totam diem, si per tres horas in confessionali ex mandato Episcopi sedet»146. Deste modo, na revisão do esquema, o can. 142 §3 foi alterado para: «Etiam non vocatus debet in sede confessionale ab episcopo ipsi destinata residere diebus et horis ab eodem episcopo pro maiori fidelium commoditate designatis»147. Consequentemente, a referência às horas foi retirada do can. 145 na revisão do esquema148. O can. 157 exclui o penitenciário dos turnos no serviço do altar como diácono e subdiácono149, respeitando a norma do can. 147 §1, que determina o presbiterado para o ofício do canonicato, de acordo com a norma tridentina que requeria que pelo menos a metade dos cónegos fossem presbíteros150. Referindo-se aos ofícios com cura de almas, o can. 161 relembra a exclusão do coro também por parte do penitenciário, enquanto exerce o seu múnus151. ————————

um». A nota 1 referente ao mesmo precisa: «Alcuni sopprimerebbero le parole: ac, perdurante...». No entanto, a expressão permaneceu no esquema revisto. Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Comissione cod. Diritto Canonico, scat. 19 e 20, 9. 145 Schemi del Lib. II, De Personis (De Clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 20, 9. 146 Cf. Verbali delle Consulte parziali e Congregazioni particolari per il Lib. II. De Personis: ASV, Comissione cod. Diritto Canonico, scat. 26: «Gli Eminentissimi deliberano di conservare in proposito il diritto vigente, il quale non ha prodotto alcun nottevole incoveniente. Li sopprimono le parole: et per totam diem, si per tres horas in confessionali ex mandato Episcopi sedet». 147 Schemi del Lib. II, De Personis (De Clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 20, 9. 148 Cf. can. 145: «Canonicus theologus per totam diem qua suo munere fungitur, poenitentiarius, dum, durante choro, audit confessiones, vicarius parochialis dum parochialibus officiis vacat, tanquam presentes in choro censeatur ita ut etiam quotidianas distributiones lucrentur». Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 20. 149 Schemi del Lib. II, De Personis (De Clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 20, 14. 150 Cf. CONC. DE TRENTO, Sess. 24, Dec. De reformatione, c. 12, in COD 766. 151 Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Comissione cod. Diritto Canonico, scat. 20, 15.


CAP. III: DE TRENTO À ACTUAL LEGISLAÇÃO

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4.4.2 O esquema de 1909 O esquema de 1909152, Liber Secundus, De Personis, possui uma introdução com 18 cânones, seguindo-se a Pars I De Clericis, Sectio I, dedicada a De Clericis in genere do can. 19 ao can. 119. Segue-se a Sectio II, De Clericis in specie, do can. 120 ao can. 337, divididos em 10 capítulos. Conforme os esquemas precedentes, o penitenciário encontra-se no Cap. V De Capitulis canonicarum, do can. 250 ao can. 283. A maior alteração do texto está na introdução das fontes referentes aos cânones do esquema de 1907, que aqui citamos em rodapé, e na alteração da numeração. O can. 139 §1 corresponde ao can. 257 §1, com as respectivas anotações153. Do mesmo modo, o can. 140 corresponde ao can. 258, com as seguintes alterações estilísticas e notas154: §1. Canonicus theologus et poenitentiarius eligantur qui aptiores pro loci qualitate ad propria munera adimplenda reperiuntur; sed, ceteris paribus, praeferantur doctores in sacra theologia, si agatur de canonico theologo, in sacra theologia vel iure canonico, si de penitentiario; insuper convenit ut canonicus poenitentiarius aetatis annum 40 attigerit155. §2. Praebenda theologalis et poenitentiaria non conferatur, nisi prius candidati de vita, moribus et scientia examinati et approbati fuerint ab episcopo cum examinatoribus synodalibus et salva lege concursus, ubi adsit156. §3. Canonicus poenitentiarius nequit simul aliud officium in dioecesi habere cui adnexa sit iurisdictio in foro externo157.

———————— 152

Cf. Schemi del Lib. II (1909): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22 e 86. 153 «C. 15, X, de off. iud. ordin. I, 31; c. 4, X, de magistris, V, 5; Conc. Trid., sess. V. de ref., c. 1; sess. XXIV, de ref., c. 8; S.C.C., S. Angeli Longobard., 26 apr. 1636; Geruntin. et Cariaten., 2 oct. 1706 et 11 febr. 1708». Schemi del Lib. II (1909), can. 257: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22 e 86, 111. 154 Para melhor compreensão das alterações ao texto anterior, colocamos em itálico as mudanças do texto. 155 «Conc. Trid. sess. XXIV, de ref., c. 8; S.C.C. Hispalen., 1585; Leodien., mense iulii 1587; Viterbien., 3 dec. 1592; Sarnen., 23 sept. 1596; Aquilein., 14 nov. 1626». Schemi del Lib. II (1909), can. 258: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22 e 86, 112, nt. 2. 156 «Conc. Trid., sess. V. de ref., c. 1; S.C.Ep. et Reg., Derthonen., 2 aug. 1581; Sebenicen., 20 aug. 1596; Aquileien., 9 ian. 1602; S.C.C., Nullius, 1594; Urbinaten., 6 sept. 1687; Valentin., 31 ian. 1723; Casertan., 17 dec. 1729; Salernit., 21 iul. et 1 sept. 1753; Beneventana, 22 maii 1789; Aversana, 21 nov. 1829». Schemi del Lib. II (1909), can. 258: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22 e 86, 112, nt. 3.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

O can. 142 dos esquemas de 1907 tem o seu correspondente no can. 260, com as seguintes alterações e a eliminação do terceiro parágrafo: §1. Poenitentiarius canonicus tum ecclesiae cathedralis tum ecclesiae collegiatae obtinet a iure potestatem ordinariam pro tota dioecesi absolvendi etiam a peccatis episcopo reservatis. §2. Pro fidelium commoditate debet in sede confessionali ipsi designata residere tempore divinorum officiorum158.

Note-se a simplificação do cânon anterior e maior precisão de linguagem, nomeadamente o uso da expressão potestatem ordinariam. O anterior can. 143 do último esquema de 1907 permanece inalterado no novo can. 261, enriquecido somente com as respectivas fontes159. O can. 145 de 1907 tem o seu correspondente no can. 263 de 1909. Foi alterado, adequando-se à nova numeração e com maior precisão das funções do penitenciário: «Canonicus theologus per totam diem qua suo munere fungitur, poenitentiarius, dum, durante choro, sedet in confessionali ad normam can. 260 §2»160. Os can. 157 e 161 correspondem aos can. 275 e 279 do actual esquema, e, visto que o penitenciário é excepção àquelas normas, não são prioridade no nosso estudo. Apenas o can. 275 foi enriquecido com as respectivas fontes161. 4.4.3 O esquema de 1912 O esquema de 1912162, Liber Secundus, De Personis (1912), mantém a mesma divisão do esquema anterior. Inclui os Livros I e II com o ———————— 157

«S.C.Ep. et Reg., Ariminen., 13 maii 1611». Schemi del Lib. II (1909), can. 258: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22 e 86, 112, nt. 4. 158 «S.C.C., Seguntin., mense nov. 1585; Abulen., 21 apr. 1587; Anagnina, 22 febr. 1620; Veliterna, 12 aug. 1634; Verulan., 2 maii 1648; Conversana, 24 sept. 1729». Schemi del Lib. II (1909), can. 260: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22 e 86, 113, nt. 3. 159 «S.C.C., Reatina, 15 febr. 1582; Bellun., 27 febr. 1630; Verulan., 19 ian. 1646; Casalen., 12 nov. 1661; Civitatis Ducalis, 18 iun. 1757». Schemi del Lib. II (1909), can. 263: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22 e 86, 114, nt. 2. 160 «S.C.Ep. et Reg., Ferentin., 27 iul. 1604; Ianuen., mense oct. 1585; Avenion., 15 oct. 1586, ad 15, 16, 17, 18; Hispaniar., mense dec. 1587; Viterbien., 15 mart. 1631; Anagnina, 16 dec. 1645; Tranen., 15 sept. 1750, 13 mart. 1751 et 17 iun 1752; Piscien., 23 mart. 1839». Schemi del Lib. II (1909), can. 263: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22 e 86, 114, nt. 3. 161 «S.R.C., 21 gen. 1673; 13 apr. 1867». Schemi del Lib. II (1909), can. 275: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22 e 86, 121, nt. 1. 162 Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (1912): ASV, Commissione cod. Diritto


CAP. III: DE TRENTO À ACTUAL LEGISLAÇÃO

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subtítulo: «Sanctissimi Domini Nostri Pii PP. X, cum notis Petri Card. Gasparri». Por isso, a numeração dos cânones foi alterada. Este esquema foi enviado à consulta de todo o episcopado no dia 20 de Março de 1912, contendo instruções acerca do modo de proceder no exame dos cânones163. O título V, igual ao anterior esquema, engloba os mesmos 33 cânones, do can. 268 ao can. 301. As notas de referência às fontes mantêmse inalteradas na sua maioria. Corresponde ao anterior can. 257 §1 o novo can. 275, formulado de modo diverso e negativo, reforçando deste modo a necessidade do penitenciário: §1. In nulla ecclesia cathedrali desit officium canonici theologi et164 canonici poenitentiarii. §2. Etiam in collegialibus, praesertim insignibus, officium canonici theologi et poenitentiarii constituti potest. §3. Si in Capitulo cathedrali praebenda pro his officiis deputata non fuerit, episcopus praebendam primo in eodem Capitulo vacaturam ad eum usum perpetuo constituat ac deputet165.

Nas observações recebidas, um certo abade Gregório propôs que se acrescentasse o seguinte para uma Igreja Catedral regular: In Ecclesia cathedrali regulari non desit officium canonici theologi et canonici poenitentiarii, qui tamen, salvo praescripto can. 276 §1, a Praelato nullius deputentur, et, quatenus opus fuerit, removeantur ad normam constitutionum proprii Ordinis166.

Augustinum, Bispo de Franenberg, propôs, no dia 5 de Dezembro de 1912, a constituição de prebendas para estes ofícios: «Si in capitulo cathedrali praebenda pro his officiis deputata non fuerit, Episcopum cum consensum Capituli ex Canonicis idoneum Canonicum theologum et poenitentiarium constituat ac deputet»167. ————————

Canonico, scat. 23 e 86. 163 Cf. P. GASPARRI, «Storia della codificazione», 8; Animadversiones in C.J.C: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 83. 164 Gasparri acrescenta nesta parte: «ubi id commode fieri poterit». Schemi del Lib. II, De Personis (1912): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86, 141. 165 Gasparri retira o último parágrafo. Schemi del Lib. II, De Personis (1912), can. 275: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86, 141-142. 166 Animadversiones in C.J.C: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 83. 167 Animadversiones in C.J.C: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 83.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

O can. 258 foi alterado de acordo com a seguinte proposta do can. 276: §1. Canonicus theologus et poenitentiarius eligantur qui aptiores pro loci qualitate ad propria munera adimplenda reperiantur; sed, ceteris paribus, praeferantur doctores in sacra theologia, si agatur de canonico theologo, in sacra theologia vel iure canonico, si de penitentiario; expedit praeterea ut canonicus poenitentiarius aetatis annum trigesimum quintum expleverit. §2. Praebenda theologalis et poenitentiaria non conferatur, nisi prius candidati de vita, moribus, doctrina candidatorum plane constituerit, facto ab ipsis periculo coram episcopo et examinatoribus synodalibus et salva lege concursus, ad normam can. 339, ubi sit constituta. §3. Canonicus poenitentiarius inhibetur aliud simul officium in dioecesi suscipere aut exercere cui adnexa sit iurisdictio in foro externo168.

Note-se que foi alterada a idade mínima do penitenciário para os 35 anos. O novo texto apresenta melhorias no estilo e na precisão. Nas animadversiones, o Bispo Giovanni Battista de Bosa propôs, no dia 2 de Setembro de 1912, a seguinte alteração: Can. 276 eiusdem lib.II, meo iudicio, ita immutandus esset: §2...Praebenda theologalis et poenitentiaria ne conferatur, nisi prius de vita, moribus, doctrina candidatorum plane constituerit, facto ab ipsis periculo coram episcopo et quatuor examinatoribus et salva lege concursus, ad normam can. 339, ubi sit constituta». §3. Idoneus ille habeatur, qui suffragiorum numerum absolutem maiorem retulerit: et ubi paria suffragia sint, paritatem dirimat Ordinarius. §4. Canonicus poenitentiarius inhibetur etc169.

Um outro Bispo, Adolfo Fritzen da Argentina, propôs retirar o can. 276 §2, no dia 11 de Dezembro: 276 §2. Expurgatur totaliter. Ratio: omnino impossibile est ut qui deputatur ad praebendam theologalem vel poenitentiariam prius examini coram

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168 O can. 339 trata das condições pessoais dos candidatos para um paróquia vacante. Igualmente foram alteradas as fontes deste cânon: «Conc. Trid., sess. V. de ref., c. 1; Bened. XIII, const. “Pastoralis officii”, 19 maii 1725; S.C.Ep. et Reg., Regien., 22 aug. 1581; S.C.C., Nullius, 1594; Urbinaten., 6 sept. 1687; Valentin., 31 ian. 1723; Salernit., 21 iul. et 1 sept. 1753; Pinnen., 25 apr. 1761; Beneventana, 22 maii 1784. Gasparri retira no §2 quintum e no §3 as expressões: «facto ab ipsis periculo coram episcopo et examinatoribus synodalibus [...] ad normam can. 339». Schemi del Lib. II, De Personis (1912), can. 276: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86, 142. 169 Animadversiones in C.J.C: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 83.


CAP. III: DE TRENTO À ACTUAL LEGISLAÇÃO

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examinatoribus synodalibus subjiciatur. Si haec lex conservari debet addatur: “Nisi Episcopo qualitatibus requisitis constet”170.

Adolf, Bispo de Hildesheim, propôs, de modo semelhante, acrescentar ao can. 276 §2: «nisi Episcopo aliunde de qualitatibus requisitis jam satis constituerit». O Bispo de Luçon advertiu: «can. 276, 339 et 340. Tres isti Canones tribuunt examinatoribus synodalibus, in nominandis Canonicis theologali et poenitentiario atque parochis, auctoritatem quae nimia esse videtur». Acerca das qualidades requeridas, o Arcebispo de Vercelli propôs o seguinte: «can. 276 §1. Clarius dicendum doctores in S. Theologia vel iure canonico qua tales ius raelationis minime habere, sed tantum ceteris paribus. Concedendum insuper ut lauream infra annum electus consequi valeat». Os bispos da Província de Veneza perguntaram se não seria melhor estabelecer as matérias de exame171. O anterior can. 260 foi alterado segundo a proposta do can. 278: §1. Poenitentiarius canonicus tum ecclesiae cathedralis tum ecclesiae collegiatae obtinet a iure potestatem ordinariam in tota dioecesi absolvendi etiam a peccatis et censuris episcopo reservatis. §2. Debet in sede excipiendis confessionibus sibi destinata residere tempore pro fidelium commoditate, iudicio episcopi, oportuno et praesto esse iis qui ad confitenda sua peccata accedunt ipso quoque divinorum officiorum tempore172.

No primeiro parágrafo, foram acrescentadas as censuras reservadas ao bispo. O segundo parágrafo foi completamente alterado na sua formulação, tendo-se introduzido que o tempo dedicado às confissões é iudicio episcopi e que deve escutar as confissões opportuno et praesto, mesmo durante o ofício divino. No que respeita ao can. 278 §1, o Bispo William de Dublin perguntou no dia 12 de Dezembro de 1912: «Quaeritur an obtineat haec regula iis in locis ubi canonicus poenitentiarius ex officio nulla recipit emolumenta?»173. Acerca do can. 278 §2, um certo Bispo Septímio pediu que o bispo pudesse adequar os tempos de serviço do penitenciário em tempos e ho———————— 170 171

Animadversiones in C.J.C: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 83. «can. 276. Nonne videretur opportunum, statuere materias examinis?». Animadversiones in C.J.C: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 83. 172 Foi retirada a fonte: «Conversana, 24 sept. 1729». Nas suas anotações Gasparri acrescenta no §1, depois de sibi: «in capitulari ecclesia». Schemi del Lib. II, De Personis (1912), can. 278: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86, 144. 173 Animadversiones in C.J.C: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 83.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

ras mais cómodas para os fiéis: Si canonici tenentur choro inservire per mediariam vel tertiariam, potest Episcopus canonico poenitentiario praescribere ut confessiones excipiat etiam diebus extra hebdomadam sui servitii, praesertim sit in illis fideles solent frequentius ad confessionem accedere, uti in privilegios majorem festorum, tempore spiritualium exercitiorum, et extra tempus divinorum officiorum, sit populo magis comodum? Hoc, licet videatur insinuare, tamen non clare patet, unde videretur clare declarandum. Si id judicabitur explicandum in sensu affirmativo, videretur declarandum etiamsi liceat a choro abesse tot diebus et horis, quot fuerunt illae quibus extra tempus divinorum officiorum fidelium confessiones excepit174.

Os Bispos latinos e arménios da Província de Lviv propuseram acrescentar ao can. 278 §2: «Addantur ad finem: debet insuper invigilare, ut confessarii ab Ordinario in ecclesia cathedrali constituti munere suo diligenter fungantur»175. Após a descrição do poder e funções do penitenciário, o esquema especifica a relação deste com o coro do cabido. O can. 263 do esquema de 1909 corresponde à nova proposta descrita no can. 280. Naquilo que diz respeito ao penitenciário, afirma: «Canonicus theologus per totam diem qua suo munere fungitur, poenitentiarius, dum tempori chori in sacro tribunali sedet...tamquam praesentes in choro censeatur»176. Foi retirada a referência ao anterior can. 260 §2 e acrescentada a expressão em que o penitenciário está sentado in sacro tribunali, uma referência explícita ao carácter judicial da penitência do Concílio Tridentino177. As referências ao penitenciário dos anteriores can. 275 e 279 foram simplesmente retiradas nas propostas dos can. 292 e 296178. ———————— 174 175 176

Animadversiones in C.J.C: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 83. Animadversiones in C.J.C: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 83. Este cânon encontra-se muito rasurado por Gasparri, o que faz antever uma grande mudança. Schemi del Lib. II, De Personis (1912), can. 280: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86, 144-145. 177 Deste modo foram retiradas as notas «Tranen., 15 sept. 1750, 13 mart. 1751 et 17 iun 1752; Piscien., 23 mart. 1839» e acrescentadas as seguintes: «Conc. Trid. sess. XXIV, de ref., c. 8; Mediolanen., 29 apr. 1593; Perusina, 30 iul. 1859»; Schemi del Lib. II, De Personis (1912), can. 280: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86, 145, nt. 1. 178 Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (1912), can. 292 e 296: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 23 e 86, 150, 152-153.


CAP. III: DE TRENTO À ACTUAL LEGISLAÇÃO

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4.4.4 Os esquemas de 1914 e 1916 O esquema de 1914179, com 725 cânones, contém o Livro I, Normae Generales, e o Livro II, De Personis, que, por sua vez, tem duas partes, uma De Clericis e outra De Religiosis. A parte I subdivide-se em duas secções, sendo a segunda De clericis in specie, dividida em tit. VII, De suprema potestate iisque qui eiusdem sunt ecclesiastico iure participes e tit. VIII., De potestate episcopali iisque qui de eadem participant, que, por sua vez, é dividida em 8 capítulos, sendo o cap. V De capitulis canonicorum. Contém 32 cânones: can. 391-422. Por isso, a numeração do esquema de 1912 foi alterada, de acordo com as propostas do episcopado. Corresponde ao can. 275 a nova proposta do can. 398: §1. In nulla ecclesia cathedrali desit officium canonici theologi et, ubi id commode fieri poterit, canonici poenitentiarii. §2. Etiam in collegialibus, praesertim insignibus, officium canonici theologi et poenitentiarii constituti potest180.

Note-se que se retira a obrigatoriedade do esquema anterior, voltando deste modo aos primeiros esquemas. A proposta do novo can. 399 corresponde ao anterior can. 276: §1. Canonicus theologus et poenitentiarius eligantur qui aptiores pro loci qualitate ad propria munera adimplenda reperiantur; sed, ceteris paribus, praeferantur doctores in sacra theologia, si agatur de canonico theologo, in sacra theologia vel iure canonico, si de penitentiario; expedit praeterea ut canonicus poenitentiarius aetatis annum trigesimum expleverit. §2. Praebenda theologalis et poenitentiaria non conferatur, nisi prius candidati de vita, moribus, doctrina candidatorum plane constituerit, salva lege concursus, ubi sit constituta. §3. Canonicus poenitentiarius inhibetur aliud simul officium in dioecesi suscipere aut exercere cui adnexa sit iurisdictio in foro externo181.

———————— 179

Cf. Schemi del Lib. II, De Personis (1914-1916): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86. 180 Schemi del Lib. II, De Personis (1914), can. 398: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86, 158. 181 Schemi del Lib. II, De Personis (1914), can. 399: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86, 158-159. Deve-se notar que a incompatibilidade deste ofício com outros com jurisdição no foro externo é concretizado no can. 367 §3: «Vicarii Generalis munus ne committatur canonico poenitentiario, aut Episcopi consanguineis praesertim in primo gradu vel in secundo mixto cum primo, aut, exclusa


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

No primeiro parágrafo, foi alterada a idade mínima do penitenciário para 30 anos. No segundo parágrafo, foi retirada a referência ao can. 339 do esquema anterior e toda a expressão: «facto ab ipsis periculo coram episcopo et examinatoribus synodalibus (et salva lege concursus), ad normam can. 339». O can. 278 corresponde à proposta do can. 401: §1. Poenitentiarius canonicus tum ecclesiae cathedralis tum ecclesiae collegiatae obtinet a iure potestatem ordinariam in tota dioecesi absolvendi etiam a peccatis et censuris episcopo reservatis182. §2. Debet in sede excipiendis confessionibus sibi in capitulari ecclesia destinata residere tempore pro fidelium commoditate, iudicio episcopi, oportuno et praesto esse iis qui ad confitenda sua peccata accedunt ipso quoque divinorum officiorum tempore183.

Apenas se precisa o lugar no segundo parágrafo: in capitulari ecclesia. De resto o cânon permanece inalterado. O can. 280 foi inserido na proposta do novo can. 420, que enumera um elenco de 12 números dos cónegos isentos do coro: §1 Ita excusantur a choro ut percipiant fructus praebendae ac distributiones quotidianas (...). 3.º Canonicus poenitentiarius dum tempore chori in sacro tribunali sedet184.

Trata-se essencialmente de uma alteração do esquema do texto, sem mudanças no que diz respeito ao penitenciário. Os esquemas de 1916 e 1917185 mantêm a mesma estrutura, numeração e texto do esquema de 1914, pelo menos naquilo que nos respeita. ————————

necessitate, parocho ceterisque curam animarum habentibus; sed non prohibetur Episcopus Vicarium ex ipsa dioecesi assumere». 182 Numa nota manuscrita, Gasparri escreve depois de reservatis: «in dioecesi etiam extraneos et dioecesanos extra quoque territorium dioecesis». Schemi del Lib. II, De Personis (1914): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86, 160. 183 Schemi del Lib. II, De Personis (1914), can. 401: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86, 159-160. 184 Schemi del Lib. II, De Personis (1914), can. 420: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24 e 86, 170. Uma última nota escrita por Gasparri substitui a expressão «in sacro tribunali», por «vocat confessionibus audiendis». Schemi del Lib. I-II (1917), can. 420: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86, 86. 185 Schemi del Lib. II, De Personis (1914-1916): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24, 86; Schema completo, Codex Iuris Canonici (1916): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87 e 88; Schemi del Lib. I-II (1917): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86.


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No entanto, em 1916, o can. 401 §1 regista uma grande alteração, conforme as notas do esquema anterior: §1. Poenitentiarius canonicus tum ecclesiae cathedralis tum ecclesiae collegiatae obtinet a iure potestatem ordinariam in tota dioecesi absolvendi etiam a peccatis et censuris episcopo reservatis in dioecesi etiam extraneos et dioecesanos extra quoque territorium dioecesis. §2. Debet in sede excipiendis confessionibus sibi in capitulari ecclesia destinata residere tempore pro fidelium commoditate, iudicio Episcopi, opportuno et praesto esse iis qui ad confitenda sua peccata accedunt ipso quoque divinorum officiorum tempore186.

Definiram-se melhor os seus penitentes: os fiéis diocesanos mesmo fora do território da Diocese e os extraneos na Diocese. 4.5 Evolução dos esquemas do Livro III Nesta parte do nosso estudo, analisamos a evolução do iter de formulação acerca da função do penitenciário em relação ao sacramento da penitência, nomeadamente a absolvição dos casos reservados. 4.5.1 O esquema I O esquema I, realizado entre 4 e 11 de Junho de 1905, dedica o tit IV ao sacramento da penitência e divide-o em 49 cânones187. O cap. I, De ministro sacramenti poenitentiae, está dividido em 4 artigos. Por sua vez, o art. 1, De persona ministri, inclui os can. 2-12. Concretamente, o can. 5 elenca os ministros do sacramento com poder ordinário: Ordinaria iurisdictione ad confessiones excipiendas patiuntur: Romanus Pontifex et ex eius concessione Maior Poenitentiarius pro universa Ecclesia; Ordinarius pro suo territorio; poenitentiarius cathedralis pro dioecesi, parochus actualis pro sua parochia; praelatus regularis pro suis subditis; sacerdotes aliud officium habentes cui animarum cura adnexa est188.

———————— 186

Gasparri ainda acrescenta depois de potestatem ordinariam: «quam tamen aliis delegare non poterit». Schema completo, Codex Iuris Canonici (1916) can. 401: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87, 88 e 89, 160. 187 Cf. Schemi del Lib. III, De Rebus. De Sacramentis: Poenitentia, Ordine: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 44; Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53. 188 Cf. Schemi del Lib. III, De Rebus. De Sacramentis: Poenitentia, Ordine, can. 5: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 44, 2; Verbali delle Consulte per il


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O art. II., De extensione potestatis absolvendi (can. 13-17), elenca os casos em que é alargado o poder de jurisdição para a absolvição. O art. III, De casuum reservatione (can. 18-25), inclui o can. 21 §1, que afirma que o bispo somente reserve os atrocioribus et gravioribus criminibus, remoto scandalorum periculo e continua: §2. Per totam suam dioecesim ac praesertim in iis locis qui a civitate et cathedrali sede longius remoti sunt, poenitentiarios aliosque sacerdotes constituant ac delegent, quibus facultatem absolvendi a casibus sibi reservatis concedant, ita ut iis quoque liceat eamdem aliis confessariis, si opus sit, etiam viva voce, impertiri189.

A consulta parcial de 11 de Junho de 1905 examinou a redacção resultante da consulta anterior. Porém, nada refere no que diz respeito ao can. 5 e 21190. 4.5.2 O esquema II O esquema II foi elaborado 18 e 25 de Junho de 1905 e possui 47 cânones, organizados do mesmo modo do esquema I191. A proposta do can. 4 corresponde ao anterior can. 5: Ordinaria iurisdictione ad confessiones excipiendas patiuntur: Romanus Pontifex et ex eius concessione Maior Poenitentiarius pro universa Ecclesia; Ordinarius pro suo territorio; canonicus poenitentiarius ecclesiae cathedralis pro dioecesi, parochus actualis pro sua parochia; praelatus regularis pro suis subditis; alii sacerdotes aliud officium habentes, cui animarum cura adnexa est192.

O can. 21 mantém-se no can. 20 sem alterações193. Durante a consulta parcial, de 25 de Junho de 1905, o presidente propôs introduzir o seguinte parágrafo: «Poenitentiarius tamen et parochus nequeunt valide ————————

Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53, 2. 189 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia, can. 21: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53, 6. 190 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53. 191 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53. 192 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia,can. 4: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53, 2. 193 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53, 7.


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hanc jurisdictionem delegare nisi id expresse eisdem commissum fuerit». Contudo, os outros membros não o aceitaram, porque normalmente os bispos costumam conceder a jurisdição aos párocos e porque se trata sobretudo de uma parte respeitante ao direito penal194. 4.5.3 O esquema III O esquema III foi elaborado entre 25 de Junho e 2 de Julho de 1905 e possui 48 cânones195. Ao anterior can. 4 §1 corresponde a proposta do novo can. 3 §1: Ordinaria iurisdictione ad confessiones excipiendas patiuntur: Romanus Pontifex et ex eius concessione Maior Poenitentiarius pro universa Ecclesia; Ordinarius pro suo territorio; canonicus poenitentiarius ecclesiae cathedralis pro dioecesi, praelatus regularis pro suis subditis; parochus pro sua parochia; alii sacerdotes aliud officium habentes, cui animarum cura adnexa est196.

As notas ao primeiro parágrafo propõem que se defina quem são os ordinários e propõem a supressão da perícopa «de alii...», porque estes sacerdotes incluem-se entre os ordinários e párocos. O anterior can. 20 §2 é semelhante à proposta do can. 19 §2: §2. Per totum territorium ac praesertim in iis locis qui ab Episcopi vel Praelatis sede longius remoti sunt, poenitentiarios aliosque sacerdotes constituant ac delegent, quibus facultatem absolvendi a casibus sibi reser-

————————

194 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53: «Mons. Presidente propone di aggiungere il seguente paragrafo "Poenitentiarius tamen et parochus nequeunt valide hanc jurisdictionem delegare nisi id expresse eisdem commissum fuerit". Bucceroni non metterebbe il proposto paragrafo. Osserva come nessuno nega che il parroco possa delegare la giurisdizione, e difatti, prima del Concilio di Trento, non essendo allora necessaria l’approvazione del Vescovo, la giurisdizione comumente si concedeva dai parroci; ma attualmente siccome i Vescovi insieme colla approvazione sogliono sempre concedere la giurisdizione, questa facoltà dei parroci è divenuta pressochè inutile. Melata toglierebbe il par. 2, giacchè la prima parte è inutile e la seconda riguarda piuttosto il diritto penale». 195 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53. 196 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia, can. 3: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53, 2. As notas ao can. 3 §1 descrevem: «Nel libro de personis deve definirsi accuratamente quinam veniant nomine Ordinariorum»; «Il P. Wernz con altri soprimerebbe l’ultimo inciso: alii..., perchè questi sacerdoti sono compresi fra gli Ordinari o fra i parrochi».


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vatis concedant, ita ut iis quoque liceat eamdem aliis confessariis, si opus sit, etiam viva voce, impertiri197.

Durante a consulta parcial do esquema III, realizada a 9 de Julho de 1905, P. Wernz observou que existem dificuldades na expressão «alii sacerdotes aliud officium habentes, cui animarum cura adnexa est» do can. 3, porque a cura de almas pode ser anexa a um ofício, não só ordinário, mas também delegado. Por isso, o Presidente propôs a seguinte redacção: «parochus aliique sacerdotes qui loco parochi sunt pro sua parochia vel suis subditis»198. 4.5.4 O esquema IV O esquema IV, formulado depois da consulta de 9 de Julho199, dedica o tit. IV ao sacramento da penitência, com 85 cânones. O cap. I, De ministro sacramenti poenitentiae, está dividido em 3 artigos. O art. 1, De potestate ministri, inclui os cânones 2-15. O proposto can. 4 corresponde ao anterior can. 3: §1. Ordinaria iurisdictione ad confessiones excipiendas potiuntur: Romanus Pontifex, et, ex eius concessione, Maior Poenitentiarius pro universa Ecclesia; Ordinarius pro suo territorio; canonicus poenitentiarius ecclesiae cathedralis pro dioecesi, parochus aliique sacerdotes qui loco parochi sunt pro sua parochia vel suis subditis. §2. Haec iurisdictio cessat per amissionem officii, per excommunicationem nominatim denuntiatam, per suspensionem ab oficio vel iurisdictione200.

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197 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia, can. 19: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53, 8. 198 Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53: «Wernz trova difficoltà nell’inciso "alli sacerdotes aliud officium habentes cui animarum cura adnexa est", perchè la cura delle anime può essere annessa a un officio in modo non solo ordinario, ma anche delegato; per es. nei viceparroci. Mons. Presidente propone la redazione: "parochus aliique sacerdotes qui loco parochi sunt pro sua parochia vel suis subditis", per es., i cappelani militari, i missionari». 199 Cf. Schemi del Lib. III, De Rebus. De Sacramentis: Poenitentia, Ordine: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 44. Este esquema apresenta no início as seguintes indicações temporais: «Animadversiones mittantur non ultram diem 1.am Octobris». E a manuscrito pode-se ler: «incontri 24 lugli 05». Possivelmente terá sido enviado à Comissão de Consultores antes de Outubro de 1905. 200 Cf. Schemi del Lib. III, De Rebus. De Sacramentis: Poenitentia, Ordine, can. 4: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 44, 2; Verbali delle Consulte per il


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O can. 8 §3 repete o anterior can. 7 §2: «Ordinarius, ob prudens de idoneitate dubium, potest examini submittere etiam parochum aut canonicum poenitentiarium»201. O art. II., De reservatione peccatorum, começa pela indicação de que se trata aqui somente da reserva dos pecados202. A proposta do can. 20 §2 é semelhante ao anterior can. 21: §2. Per totum territorium ac praesertim in iis locis qui ab Episcopi vel Prelati sede longius remoti sunt, poenitentiarios aliosque sacerdotes constituant ac delegent, quibus facultatem absolvendi a casibus sibi reservatis concedant, atque ita ut iis quoque liceat eamdem aliis confessariis, si opus sit, etiam viva voce, impertiri203.

4.5.5 Os esquemas intermédios O esquema da scat. 49, Liber Tertius, De Rebus, sem data, contém 449 cânones relativos aos sacramentos em geral, a que se seguem os sete títulos correspondentes exactamente aos sete sacramentos204. O sacramento da penitência está incluído no Titulus IV, do can. 141 ao can. 217. O ministro do sacramento está localizado no cap. I, do can. 142 ao can. 164. O anterior can. 5 corresponde à presente proposta do can. 144, com as seguintes alterações: ————————

Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia,can. 4: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53, 2. 201 Cf. Schemi del Lib. III, De Rebus. De Sacramentis: Poenitentia, Ordine, can. 8: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 44, 4; Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia, can. 8: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53, 4. O consultor S. H. Eschbach propõe a seguinte formulação: «Si post concessam jurisdictionem Ordinarius prudenter dubitet de debita idoneitate confessarii, potest ab eodem rursus examen exigere etiamsi hic sit parochus vel canonicus Poenitentiarius». Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53. 202 Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53: «Qui si tratta della riserva dei soli peccati. Della riserva delle censure e indirettamente dei peccati si tratterà nel De censuris». 203 Cf. Schemi del Lib. III, De Rebus. De Sacramentis: Poenitentia, Ordine, can. 20: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 44, 9; Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia, can. 20: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53, 9. 204 Cf. Schemi del Libro III, De Rebus: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 49.


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§1. Praeter Romanus Pontifex, ordinaria iurisdictione ad confessiones excipiendas potiuntur: Maior Poenitentiarius, pro universa Ecclesia; Ordinarius loci, pro suo territorio; canonicus poenitentiarius etiam ecclesiae collegiatae pro dioecesi, parochus aliique sacerdotes qui loco parochi sunt205, pro sua parochia vel quasi-parochia206. §2. Haec iurisdictio cessat per amissionem officii, per excommunicationem nominatim denuntiatam, per suspensionem ab oficio207.

O anterior can. 8 §3 foi alterado e reescrito na proposta do can. 152 §2: «At ob graves causas Ordinarius potest etiam parochum aut poenitentiarium a confessionibus audiendis suspendere»208. O cap. II, De reservatione peccatorum, inclui os can. 165-173. O anterior can. §2 corresponde à proposta do can. 169 §2, com as seguintes alterações: §2. Per totum territorium ac praesertim in locis qui ab episcopi vel prelati sede remotioribus, poenitentiarios aliosque sacerdotes constituant ac delegent, quibus facultatem absolvendi a casibus sibi reservatis concedant, cum potestate eam subdelegandi, si opus sit, etiam viva voce, aliis quoque confessariis209.

A expressão remotioribus é um melhoramento estilístico relativamente à expressão anterior. Note-se a maior precisão de linguagem, sobretudo naquilo que se refere à possibilidade de subdelegação, termo usado pela primeira vez. Esta mudança segue quase à letra uma proposta de um consultor210. ————————

205 Este parágrafo é enriquecido com a seguintes nota: «Ciò dovrà esser meglio determinato dopochè sarà stato esposto il libro de personis». 206 Aparece a seguinte nota: «Conc. Trid., sess. XXIII, de ref. c. 15; S.C.C. 19 iul. 1732, 1 april. 1876; 6 mart. 1694, 19 ian. 1707». 207 Cf. Schemi del Libro III, De Rebus, can. 144: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 49, 58. 208 Cf. Schemi del Libro III, De Rebus, can. 152: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 49, 60. 209 A este parágrafo foi acrescentada a nota: «S.C. Ep. et Reg., 26 nov. 1602».Cf. Schemi del Libro III, De Rebus, can. 169: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 49, 68. 210 O consultor O. Giorgio propõe a seguinte redacção: «Per totum territorium ac praesertim in locis ab Episcopi vel Praelati sede remotioribus, concedant poenitentiariis aliisque prudentioribus sacerdotibus facultatem absolvendi a peccatis sibi reservatis cum potestate eam subdelegandi, si opus sit, etiam viva voce aliis confessariis». Esta proposta mudou efectivamente o cânon. Cf. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53.


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O cap. III, De subiecto sacramenti poenitentiae, compreende os can. 174-181. O cap. IV, De variis normis servandis in confessionibus recipiendis, contém os can. 182-186, e o cap. V., De indulgentiis, os can. 187-217. O esquema da scat. 50211, Liber Tertius, De Rebus, sem indicação de data, integra já todo o livro III, dividido em 6 partes. Compõe-se de 850 cânones. O Sacramento da penitência está incluído no tit. IV da Pars I, entre o can. 141 e o can. 216, dividido em 5 capítulos: De ministro poenitentiae, De reservatione peccatorum, De subiecto Sacramenti poenitentiae, De variis normis servandis in confessionibus recipiendis e De indulgentiis. Mais especificamente, o cap. I, De ministro poenitentiae, inclui os cânones 142 a 164. Deste modo, a numeração corresponde ao esquema anterior e as alterações aos cânones são mínimas. Assim propõe o can. 144: §1. Praeter Romanus Pontifex, ordinaria iurisdictione ad confessiones excipiendas potiuntur: Maior Poenitentiarius, pro universa Ecclesia; Ordinarius loci, pro suo territorio; canonicus poenitentiarius etiam ecclesiae collegiatae, pro dioecesi; superior regularis, pro suis subditis; parochus vel quasiparochus qui loco parochi sunt, pro sua parochia vel quasi-parochia212.

As notas de referência são as mesmas. Acrescenta-se ao cânon anterior a referência aos superiores religiosos e explicita-se o quasiparochus. O anterior can. 152 §2 permanece igual. O cap. II, De reservatione peccatorum, inclui os can. 165-173. O anterior can. 169 §2 mantém-se na proposta do can. 168 §2, sem alterações no texto. Apenas se alteraram completamente as notas de referência213. 4.5.6 O esquema de 1913 O esquema do Liber Tertius, De Rebus, do ano de 1913, cum notis Petri Card. Gasparri, tem a mesma divisão do esquema anterior, mas ————————

211 Cf. Schemi del Libro III, De Rebus: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 50. 212 Cf. Schemi del Libro III, De Rebus, can. 144: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 50, 58. 213 Assim descreve a respectiva nota: «Decret. S.C. Ep. et Reg. 7 ian. 1617; Clemens X, cit. const.; Bened. XIV const. "Pias Christifidelium", §3, 21 aug. 1752». Cf. Schemi del Libro III, De Rebus, can. 168: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 50, 68.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

compõe-se de 831 cânones214. Possui a seguinte indicação: «Sedes Apostolica sibi vindicat Codicis proprietatem et Petrus Card. Gasparri Proprietatem notarum et, si quae dederit, commentariorum»215. Este esquema foi enviado a todo o episcopado e superiores religiosos, para que realizassem as suas animadversiones216. O sacramento da penitência está estruturado do mesmo modo do anterior esquema, mas inclui os can. 142-212. O cap. I, De ministro poenitentiae inclui os cânones 142 a 165. O anterior can. 144 corresponde ao novo can. 145, sem alteração, mas com grandes mudanças na nota de referência217. As observações dos bispos e superiores religiosos fazem notar: «Displicet provincia Montis Regalis iurisdictio Ordinaria asserta canonico poenitentiario ecclesiae collegiatae pro universa dioecesi»218. O anterior can. 152 §2 corresponde à proposta do can. 153 §2: «At graves ob causas Ordinarius potest etiam parochum aut poenitentiarium confessionibus interdicere»219. Note-se a alteração de suspendere para interdicere. Foi-lhe acrescentado também uma referência de fonte220. O cap. II, De reservatione peccatorum, inclui os can. 166-173. O anterior can. 168 §2 mantém a mesma numeração, mas foi-lhe retirada a referência explícita ao penitenciário: §2. Per totum territorium ac praesertim in locis qui ab episcopi vel prelati sede remotioribus, confessarios constituant ac delegent, quibus facultatem

———————— 214

Cf. Schemi del Libro III, De Rebus: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 51. 215 Cf. Schemi del Libro III, De Rebus: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 51, contracapa. 216 Cf. Animadversiones in Lib. III Codicis: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 60. 217 Assim recita: «Conc. Trid., sess. XXIII, de ref., c. 15; Clem. X, const. "Superna", 22 iun. 1670; Bened. XIV, const "Pastor bonus", 13 apr. 1744; const. "Apostolicum ministerium", 30 maii 1753; S.C.C., Parisien., a. 1594; 1 apr. 1876»; Cf. Schemi del Libro III, De Rebus, can. 145: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 51 e 86, 61. 218 Cf. Animadversiones in Lib. III Codicis, Riassunto delle Osservazioni dei Vescovi e Superiori Religiosi, can. 145: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 60, 69. 219 Gasparri rescreve deste modo: «At ob causas Ordinarius potest etiam parocho aut poenitentiario confessarii munus interdicere». Schemi del Libro III, (1913): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86, 66. 220 «S.C. de Prop. Fide, 11 dec. 1838, ad 5; 11 dec. 1839, ad 4». Cf. Schemi del Libro III, De Rebus: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 51, 66, nt. 3.


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absolvendi a casibus sibi reservatis concedant, cum potestate eam subdelegandi, si opus sit, etiam viva voce, aliis quoque confessariis221.

As observações dos bispos e superiores religiosos fazem notar: Provincia Auxitan. petit «quod episcopi possint sibi reservare, sicut antea, duodecim casus. Ubi reservatio casuum pro omnibus dioecesibus alicuius regionis ad maiorem uniformitatem obtinendam fiat ab episcopis totius regionis simul congregatis, praetermittendum videretur Episcopo Cortonensi consilium Capituli Cathedralis222.

4.5.7 O esquema de 1914 O esquema do Livro III, de 1914223, foi alterado profundamente, mesmo na numeração dos cânones, possivelmente como resultado das respostas do episcopado. Contém 6 partes com 1557 cânones. A parte I, com 1156 cânones, inclui os sacramentos e sacramentais divididos em 8 títulos. Insere a penitência no tit. IV entre os cânones 870 e 937. O ministro da penitência localiza-se no cap. I., onde se encontra o penitenciário. O can. 873 §1, correspondente do anterior can. 145, refere: §1. Praeter Romanum Pontificem, ordinaria iurisdictione ad confessiones excipiendas potiuntur: Maior Poenitentiarius et S.R.E. Cardinalibus, pro universa Ecclesia; Ordinarius loci, pro suo territorio canonicus poenitentiarius etiam ecclesiae collegiatae, pro dioecesi, Superior regularis, pro suis subditis ad normam constitutionum; parochus vel quasi-parochus aliique sacerdotes qui loco parochi sunt, pro suo territorio, salvo praescripto can. 881-883224.

O can. 877 refere-se, no primeiro parágrafo, às condições para a concessão da jurisdição e, no segundo parágrafo, determina: ————————

221 Gasparri retira a expressão ac delegent e depois de cum potestate eam acrescenta in casibus particularibus. Possui a seguinte nota: «S.C.Ep. et Reg. 26 nov. 1602». Schemi del Libro III, De Rebus (1913), can. 168: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 51 e 86, 73, nt. 3. 222 Cf. Animadversiones in Lib. III Codicis, Riassunto delle Osservazioni dei Vescovi e Superiori Religiosi, can. 168: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 60, 83. 223 Lib. III, De Rebus (1914): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87. 224 Gasparri substitui a expressão «pro suo territorio» por «in dioecesi pro omnibus, extra eam pro fidelibus dioecesis» e a expressão «pro suo territorio, salvo praescripto can. 881-883» por «in paroecia pro omnibus, extra eam pro suis subditis». Lib. III, De Rebus (1914): can. 873: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87, 60-61.


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Si post concessam iurisdictionem aut licentiam prudenter dubitent num probatus a se antea sacerdos pergat adhuc idoneus esse, eum ad novum doctrinae periculum adigere possunt, etsi agatur de parocho aut canonico poenitentiario225.

A proibição de confessar é mencionada no can. 880, correspondente ao anterior 153. No parágrafo segundo, estabelece-se: «At graves ob causas Ordinarius potest etiam parocho aut poenitentiario confessarii munus interdicere»226. A proposta do can. 896 §2 corresponde ao anterior can. 168 §2: §2. Per totum territorium ac praesertim in locis qui ab episcopi vel prelati sede remotioribus, confessarios constituant ac delegent, quibus facultatem absolvendi a casibus sibi reservatis concedant, cum potestate eam in casibus particularibus subdelegandi, si opus sit, etiam viva voce, aliis quoque confessariis227.

4.5.8 Os esquemas de 1916 e 1917 O esquema completo de 1916 regista algumas alterações, respeitando as anotações de Gasparri228. O can. 873 legisla conforme as versões anteriores: §1. Praeter Romanum Pontificem, ordinaria iurisdictione ad confessiones excipiendas potiuntur: Maior Poenitentiarius, pro universa Ecclesia; Ordinarius loci; canonicus poenitentiarius etiam ecclesiae collegialis, in dioecesi pro omnibus, extra eam pro fidelibus dioecesis; Superior regularis, pro suis subditis ad normam constitutionum; parochus vel quasi-parochus alii-

————————

225 Lib. III, De Rebus (1914), can. 877: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87, 64-65. 226 Lib. III, De Rebus (1914), can. 880: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87, 65. Não se pode esquecer a punição maior a que estava sujeito o penitenciário em caso de negligência, como refere o can. 2384 CIC/17: «Canonicum theologum et poenitentiarium in suis muneribus obeundis negligentes, Episcopus gradatim compellat monitionibus, comminatione poenarum, subtractione portionis fructuum iis assignandae qui illorum vices suppleant; et perdurante per integrum annum negligentia post monitionem, suspensione a beneficio plectat; negligentia vero producta per aliud semestre, ipso beneficio privet.» Excluímos este cânon deste estudo por razões metodológicas, visto que o estudo da evolução o Lib. V, De delictis et poenis, levar-nos-ia para além do ofício do cónego penitenciário em si mesmo. 227 Gasparri substituiu a expressão «ab Episcopi vel praelati» por «a sua». Lib. III, De Rebus (1914), can. 896: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87, 72. 228 Schema completo (1916): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87.


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que sacerdotes qui loco parochi sunt, in paroecia pro omnibus, extra eam pro suis subditis229.

Note-se a alteração na precisão dos fiéis sujeitos ao cónego peni-

tenciário: todos os da diocese e fora dela para os fiéis da mesma. Os can. 877 e 880 permanecem inalterados230. Um outro esquema, possivelmente anterior, refere ainda os Cardeais e termina pro suis paroecianis231. No cap. II, De reservatione peccatorum, o penitenciário é mencionado na proposta do novo can. 899 §2 e tem a faculdade de absolver habitualiter os pecados reservados: Can. 899 §2: At huiusmodi absolvendi facultas habitualiter impertiatur saltem Canonico Poenitentiario, etiam ecclesiae Vicariis foraneis eorumque vicesgerentibus addita his ultimis, praesertim in locis dioecesis a sede episcopali remotioribus, etiam facultate subdelegandi toties quoties confessarios sui districtus, si et quando pro urgentiore aliquo determinato casu ad eos recurrant232.

No esquema de 1917233, o can. 873, totalmente alterado, refere-se ao poder ordinário para confessar e no segundo parágrafo afirma: Hac eadem iurisdictione gaudeant etiam canonicus poenitentiarius ecclesiae quoque collegiatae pro diocesi Superiores religiosi exempti pro suis subditis ad normam constitutionis234.

O can. 877235 permanece inalterado, mas foi acrescentada a expressão «salvo recursu in devolutivo ad Sedem Apostolicam» ao can. ————————

229 Schema completo (1916), can. 873: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87, 368. 230 Schema completo (1916), can. 880: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87, 372-373. 231 Schema completo del C.J.C.: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 88-89, 368-369. Este esquema não foi retomado na redacção final de 1917, mas sim o esquema completo de 1916. 232 Gasparri altera a expressão «Canonico Poenitentiario, etiam ecclesiae collegiatae», por «ipso iure competit Canonico Poenitentiario ad normam can. 401 et». Retira as expressões: «eorumque vicesgerentibus» e «his ultimis». Foi-lhe introduzida igualmente a seguinte nota: «S.C. Ep. et Reg. 26 nov. 1602; Placentina, 19 aug. 1603; S.C.C. Pisauren. 21 nov. 1761». Schema completo, Codex Iuris Canonici (1916), can. 899: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87, 380-381, nt. 1. 233 Lib. III (1917): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86. 234 Gasparri substitui a expressão «pro dioecesi» por «ad normam can. 401 §1». Lib. III (1917), can. 873: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86, 182.


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880236. No cap. II, De reservatione peccatorum, o texto do can. 899 §2 foi alterado consoante as anotações anteriores de Gasparri: At huiusmodi absolvendi facultas ipso iure competit Canonico Poenitentiario ad normam can. 401 et habitualiter impertiatur saltem Vicariis foraneis, addita, praesertim in locis dioecesis a sede episcopali remotioribus, facultate subdelegandi toties quoties confessarios sui districtus, si et quando pro urgentiore aliquo determinato casu ad eos recurrant237.

No último momento, foi atribuído ao cónego penitenciário a faculdade de absolver ipso iure dos pecados reservados, por obra do próprio Gasparri, enquanto que, para os vigários forâneos, foi habitualiter, ambos com possibilidade de subdelegar. 4.6 Conclusão A longa e ingente elaboração dos cânones do Codex de 1917 revela um trabalho imenso realizado por Gasparri, colaboradores, consultores e o episcopado, sob o impulso de S. Pio X, que merece um estudo exaustivo alargado a toda a matéria do código. A nossa preocupação foi a de entender apenas e aprofundadamente o ofício do penitenciário. Para isso, foi necessário percorrer a evolução dos cânones nos livros II e III. A concepção do cónego penitenciário precedente ao Código baseava-se nos cânones do Concílio Tridentino e nas várias emanações das Congregações Romanas. Contudo, como no resto da legislação, havia necessidade de organização da disciplina. A primeira consulta ao episcopado solicitou a organização e simplificação da matéria dos casos reservados da penitência, assim como a explicitação concreta do ofício do penitenciário. Os votos dos consultores Laurenti, Sägmüller, Bucceroni e Müller resumiram a disciplina proveniente da tradição legislativa. O penitenciário, ministro ordinário da penitência, aparece no contexto da distinção entre poder de ordem e jurisdição. Deste modo, deve exercer o seu ————————

235 Gasparri substitui em notas manuscritas a expressão «adigere possunt» por «adigant», reforçando deste modo esta obrigação. Lib. III (1917), can. 877: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86, 183. 236 Gasparri acrescenta a expressão em manuscrito «salvo recursu in devolutivo ad Sedem Apostolicam». Schemi del Lib. III (1917), can. 880: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86, 183. 237 Gasparri acrescenta «§1» ao can. 401. Lib. III (1917), can. 899: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86, 186.


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múnus na Igreja Catedral e cabe-lhe absolver os casos reservados ao bispo, atrociora et graviora crimina in aedificationem et non in destructionem. Esse ofício não podia ser delegado pelo mesmo. Enquanto exerce o seu ofício pro fidelium commoditate, é considerado como presente no coro do cabido. Para que fosse nomeado, o penitenciário deveria ser presbítero, ter 40 anos, e ser mestre, doutor ou licenciado em Teologia ou Direito Canónico. Este ofício deveria ser instituído pelo bispo mesmo fora da catedral, para toda a diocese, sobretudo nos lugares mais longíquos. Os primeiros esquemas do livro II eram bastante minuciosos quanto aos detalhes deste ofício. Tentaram definir-se os tempos e as horas do seu exercício, a incompatibilidade com outros ofícios de foro externo, como o vigário geral, a presença do mesmo no coro do cabido. Debateu-se igualmente a sua obrigatoriedade, assim como as condições para a concessão da prebenda penitenciária, ou a penalização do mesmo em caso de incumprimento do ofício. Com o desenvolver da codificação, abandonaram-se aspectos demasiado detalhados, como o das horas em que o penitenciário deveria sentar-se no confessionário. O esquema do livro II, de 1909, precisou que o poder do ofício do penitenciário é ordinário. O esquema do livro II, de 1912, definiu que a primeira prebenda vacante fosse entregue ao penitenciário se esse ainda não a possuísse, de acordo com o cânon tridentino; reduziu a idade mínima do penitenciário para 35 anos; introduziu o poder da absolvição não só dos pecados reservados, mas também das censuras reservadas ao bispo. O tempo dedicado às confissões passou a ser iudicio episcopi. Considerou o confessionário como sagrado tribunal, referência clara ao carácter judicial da penitência. O seu envio a todo o episcopado deu origem a algumas alterações. Finalmente, nos esquemas finais de 1914 e 1916, retirou-se novamente a obrigatoriedade do penitenciário, ubi id commode fieri poterit. Foi reduzida a idade mínima deste ofício para os 30 anos. Definiram-se melhor os penitentes: os fiéis diocesanos mesmo fora do território da Diocese e os extraneos na Diocese. Os primeiros esquemas do livro III atribuíram ao cónego penitenciário da catedral a jurisdição ordinária do Sacramento da penitência. Definiu-se igualmente que os bispos deveriam constituir e delegar penitenciários e outros sacerdotes com a faculdade de absolver os casos reservados para toda a sua diocese, especialmente nos lugares mais remotos. Esses poderiam, por sua vez, partilhar – impertiri – com outros


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esse poder. O bispo poderia submeter a exame o cónego penitenciário, ob prudens de idoneitate dubium. Durante o desenvolvimento da legislação, fixou-se também que o ordinário poderia suspender o penitenciário das confissões ob graves causas. Introduziu-se também o termo jurídico de subdelegação, como possibilidade dada ao penitenciário, si opus sit, etiam viva voce. O esquema de 1913 modificou somente a possibilidade de suspensão para interdição e foi enviado a todo o episcopado. No esquema de 1914, profundamente alterado em relação aos anteriores, o bispo deveria constituir e delegar confessores dos casos reservados para toda a Diocese, mas deixou de se mencionar os penitenciários. Finalmente, nos esquemas de 1916 e 1917, foi dada a possibilidade de recurso in devolutivo à Sé Apostólica, no caso da interdição do ofício. Por outro lado, foi novamente realçado o ofício do cónego penitenciário, não só com a faculdade ordinária da absolvição, mas ipso iure, para a absolvição dos pecados reservados, como aparece no texto final. Deste modo, o seu ofício ganhou uma importância particular no âmbito diocesano, que até então não era muito clara. 4.7 Interpretações da Cúria Romana De acordo com o can. 416 do Código de 1917, nos estatutos do Cabido deve-se estabelecer por turno, no serviço do altar, os ofícios de celebrante e do ministério de diácono e subdiácono, excluídos os cónegos teólogo, penitenciário e, se têm prebendas distintas, os cónegos da ordem presbiteral. Surgiu a dúvida, numa causa de Boiano, se o disposto no referido cânon isenta o cónego teólogo e o penitenciário do ministério de diácono e subdiácono, mesmo quando o bispo preside ao Pontifical. A Congregação do Concílio, citando o Cerimonial dos Bispos238, decidiu que, em força do can. 416, os cónegos penitenciário e teólogo estão isentos do ofício de diácono e subdiácono nas celebrações litúrgicas, mas não nos pontificais solenemente presididos pelo bispo239. Se————————

238 Cf. BENTO XIV – LEÃO XIII, Caeremoniale Episcoporum, 1886, VIII, 1: «Episcopo sive missam celebret vel ad Vesperas officium faciat, vel si illis tantummodo sit praesens, convenit suos adsistere canonicos, qui, si in ecclesia sint distincti ordines, seu praebendae presbyterales et diaconales, erunt duo primi canonici ex ordine diaconali. Quod si forte in aliqua ecclesia nec dignitates neque ordines distincti essent, tunc erunt duo primi canonici, vel dignitates, immediate sedentes post dignitatem, vel post primum canonicum». 239 Cf. S.C.C., Boianen., 14 Fevereiro 1920, AAS 12 (1920) 117-119.


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melhante resposta procedeu da mesma Congregação numa causa de Cuenca, de 1923240. 4.8 Comentadores A doutrina tridentina, actualizada pelas Congregações Romanas e organizada no Código Pio-Beneditino, foi sucessivamente objecto de ensino e sistematização. Grande parte dos autores limita-se a organizar a matéria, expondo o conteúdo do código de 1917, sem comentários relevantes241. P. Cappello refere que existe na legislação do can. 398 uma distinção entre o cónego da Igreja Catedral e o da Igreja Colegial, visto que enquanto o primeiro é obrigatório, ubi fieri potest, o segundo não. Por outro lado, enquanto o cónego teólogo é absolutamente obrigatório em qualquer Igreja Catedral, o penitenciário é somente ubi id fieri poterit242. Blat justifica esta possibilidade porque existem muitos outros confessores243. O cónego penitenciário é comparado a um pároco de toda a Diocese para o foro sacramental, exercendo as vezes do bispo; por isso participa do poder ordinário do Bispo neste foro244. O seu poder diz respeito quer aos casos reservados por direito, quer aos casos reservados por lei ou decreto diocesano, conforme os sujeitos descritos no can. 401 §1, tratando-se por isso de um poder de jurisdição ordinária e não delegável245. Deve ser eleito o mais apto e deve ser doutor em Direito Canónico ou Teologia, mas precisa que é conveniente – expedit – que tenha 40 anos, sem ser absolutamente requerido. Acrescenta este autor que o Direito particular em vigor na Itália abrogou a necessidade de doutoramento. No que se refere ao conferimento da prebenda, Cappello refere a normativa do can. 399 §2, que explica que esta só é conferida depois de avaliada a vida, os costumes e a doutrina do candidato, salva lege con————————

240 Cf. S.C.C., Conchen., 10 Março 1923, AAS 15 (1923) 588-590; C. SARTORI, Enchiridion Canonicum, 92. 241 Cf. J. FERRERES, Institutiones Canonicae, I, 273-274. 242 Cf. F. CAPPELLO, Summa Iuris Canonici, I, 425-427. 243 Cf. A. BLAT, Commentarium, II, 429: «fortassis quia multi alii sacerdotes audiendis confessionibus incumbunt». 244 Cf. A. BLAT, Commentarium, II, 431. 245 Cf. F. CAPPELLO, De Poenitentia, II, 319.


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cursus ubi lata est. De acordo com este autor, a lei particular vigente na Itália e Espanha é a Constituição Pastoralis Officii, de Bento XIII246. Cita e aplica ao penitenciário a declaração da Dataria Apostólica, que aponta como requisitos para assumir o canonicato o doutoramento em Sagrada Teologia (can. 399 §1), mas, em primeiro lugar, a láurea ou a licenciatura em Sagrada Escritura247, citando o Motu Proprio de Pio XI «Bibliorum scientiam»248. O mesmo autor descreve o poder do cónego penitenciário ordinário e anexo a um ofício ipso iure. Ao comentar o can. 401 §1, este autor precisa que o poder do penitenciário se refere aos pecados reservados ao bispo, com ou sem censura, quer as censuras reservadas ao Ordinário do lugar ipso iure, quer aquelas que o bispo reserve a si mesmo. Blat precisa que a disciplina deste cânon segue a jurisprudência da Santa Sé e communi Doctorum sententia, e que a proibição de delegação do poder ordinário do penitenciário é uma excepção do can. 199 §1249. Estes autores ajudam-nos a perceber mais claramente o que significa a reserva de casos ou pecados. Cappello define-o como acto em que o superior competente advoga ao próprio juízo alguns pecados, limitando o poder de absolver os mesmos aos confessores inferiores. Por isso, o caso reservado é o pecado advogado ao tribunal superior, porque o juiz inferior não pode absolver, por defeito de jurisdição250. Deste modo, a reserva afecta directa e imediatamente o confessor, não o penitente. ———————— 246

Cf. BENTO XIII, Const. Pastoralis Officii, 19 Maio 1725, in Gasparri I, Romae 1923, 622-623, n. 289, §2. 247 Decl. De conditionibus in conferendo canonicati theologali requisitis, 8 Abril 1940, AAS 32 (1940) 162: «Quae in Motu Proprio Pii fel. rec. Pp. XI «Bibliorum scientiam» diei 27 Aprilis 1924 sub II statute sunt, de requisitis in eo cui conferendum sit Beneficium in quo canonice insit onus Sacrae Scripturae populo explanandae, ita sunt interpretanda, ut, ceteris paribus, ille, etiam Doctori in Sacra Theologia (de quo in Canone 399 §1), praeferatur, qui Laurea aut Licentia in Re Biblica insignitus sit». 248 Cf. PIO XI, Motu proprio Bibliorum Scientiam, II, 27 Abril 1924, AAS 16 (1924) 181. 249 Can. 199 §1 CIC/17: «Qui iurisdictionis potestatem habet ordinariam, potest eam alteri ex toto vel ex parte delegare, nisi aliud expresse iure caveatur». 250 Cf. F. CAPPELLO, De Poenitentia, II, 319: «Proinde genuinus conceptus reservationis duo includit: limitationem potestatis in inferiore circa casuum reservatum, et eius avocationem ad iudicium Superius. Reservatio non est lex irritans aut inhabilitans proprie dicta; licet considerari queat ad instar huiusmodi legis, a qua iuxta can. 16 §1 nulla ignorantia excusat. Quare limitationes, in concessione potestatis delegatae, quoad locum, tempus, etc., non sunt reservationes; item privatio iurisdictionis in sacerdote complice non est avocatio ad Superiorem».


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De igual modo, distingue-se entre a reserva de censuras e a reserva dos pecados, distinção essa que desapareceu na legislação posterior, mas que se encontra no Código Pio-Beneditino nos can. 2245-2247 e nos can. 893-900, respectivamente. No entanto, existe entre elas uma relação, e em muitos casos equiparam-se. Cappello especifica oito dimensões que as distinguem251. A obrigação em que o penitenciário deve permanecer na sede confessional é considerada grave, tendo em conta a comodidade dos fiéis e o juízo do bispo252. Por isso, o dever de escutar os penitentes é mais importante que o próprio ofício divino253. Cappello afirma que o penitenciário tem de escutar confissões não só na Igreja Capitular, mas também em casa, se os penitentes doentes não podem aceder à Igreja, desde que o peçam espontaneamente. Trata-se de uma nota inédita nesta matéria, que este autor justifica com uma declaração da Congregação do Concílio de 1667254. Cappello confirma igualmente a disciplina pela qual, enquanto confessa, é considerado presente no ————————

251 Cf. F. CAPPELLO, De Poenitentia, II, 320: «1º Illa respicit vinculum iuris divini, quale est peccatum; haec respicit vinculum iuris ecclesiastici. 2º Ille attinguit directe peccatum; altera indirecte tantum peccatum, directe poenam ecclesiasticam. 3º In illa reservatio est aliquid principalem in ista reservatio est quid accessorii. 4º Absolutio a peccatis facilius concedenda est, conditionibus requisitis exsistentibus, quia peccatum impedit iustificationem; difficilius reservatio censurae cessat, quia solum indirecte iustificationem impedit. 5º Ignorantia non excusat a reservatione peccatorum, dum e contra excusat a censura eiusque reservatione. 6º Quoad peccata, attenditur locus absolutionis; quoad censuras respiciendus est locus ubi censura contracta fuit. 7º Potestas remittendi peccata inest ordini sacerdotali; potestas absolvendi a censuris cohaeret potestati iurisdictionis, independenter a charactere presbyterali, ita ut cuilibet clerico competere possit. 8º Potestas remittendi peccata exercetur dumtaxat in foro interno sacramentali; alia per se spectat ad forum externum; sed propter animarum bonum exercetur etiam in foro interno sive sacramentali sive non sacrametali». 252 Cf. F. CAPPELLO, Summa Iuris Canonici, I, 427: «Tempus muneris explendi non arbitrio ipsius canonici poenitentiarii determinandum relinquitur, sed iudicio Episcopi. Qua in determinatione facienda, non commodum privatum canonici, sed fidelium, attendi debet, pro locorum temporum ac personarum adiunctis. Non solum dum celebrantur in choro divina officia, sed aliis etiam temporibus, mane et sero, pro commoditate fidelium, canonicus poenitentiarius promptus paratusque sit oportet confessionibus excipiendis». 253 Cf. A. BLAT, Commentarium, II, 431: «Debet [...] et praesto esse, seu paratus ad ibi residendum, iis qui ad confitenda sua peccata accedunt ad eum in ecclesia eius praebendae ipso quoque divinorum officiorum tempore, quae proinde sui muneris exercitio postponere debet». 254 Cf. S.C.C., Lamacen., 31 Maio 1667, 427.


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coro, de tal modo que receba os frutos das prebendas ou das distribuições quotidianas. A principal razão pela qual o penitenciário não pode assumir um ofício com jurisdição no foro externo, nomeadamente a de vigário geral, vigário capitular ou oficial, é que, no exercício do ofício no foro externo, exista o perigo ou a suspeita do uso de notícia obtida na confissão255. Se estiver impedido, mesmo além de seis meses, não tem a obrigação de se fazer substituir, mas a prudente juízo do bispo deve ser consultado para comodidade dos fiéis. O incumprimento do ofício de penitenciário deve ser penalizado com especial sanção (can. 2384). Conte A Coronata precisa que o poder do penitenciário não pode ser limitado ou retirado pelo bispo, senão por um processo judicial ou extrajudicial, em modo penal ou administrativo, de acordo com os can. 1933 §3, 1956, 1958 e 2222256. 5. O Concílio Vaticano II O Concílio Vaticano II não se debruçou acerca do ofício do penitenciário em concreto, nem das questões jurídicas que nos ocupam. Contudo, convém ter presente toda a reflexão conciliar que determinou a elaboração, a estrutura e matéria do novo Código. Aliás, como afirmou o Papa João Paulo II, o Código de 1983 «corresponde plenamente à natureza da Igreja, especialmente como é proposta pelo magistério do Concílio Vaticano II em geral, e em particular modo pela sua doutrina eclesiológica». Por isso, «o que constitui a novidade fundamental do Concílio Vaticano II, na linha da continuidade com a tradição legislativa da Igreja, no que diz respeito especialmente à eclesiologia, constitui a razão de novidade no novo código». Deste modo, este «deve tornar manifesta a nota de fidelidade na novidade, e de novidade na fidelidade, e conformar-se com essa no próprio campo e no seu particular modo de se exprimir»257. A Constituição Dogmática Lumen gentium apresenta uma renovada concepção de Igreja, que altera o entendimento acerca dos sacramentos, incluindo a penitência, ao questionar o seu aspecto simplesmente pri————————

255 Cf. J. FERRERES, Institutiones Canonicae, I, 274. 256 Cf. M. CONTE A CORONATA, Institutiones Iuris Canonici, 433. 257 JOÃO PAULO II, Const. Ap. Sacrae disciplina leges, XI-XII.


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vado258. Na verdade, «a Igreja, recebendo no seu seio os pecadores, santa ao mesmo tempo em que necessita de uma purificação constante, procura sem cessar a penitência e a renovação»259. Toda a Igreja colabora na obtenção da conversão do pecador, por meio da caridade, do exemplo e da oração. Por isso, realça-se uma clara consciência eclesial do pecado, pois o pecado não afecta somente a relação com Deus, mas também com a própria Igreja260. Por outro lado, a reconciliação constitui o sinal da graça que reconhece a condição pecadora dos membros da Igreja, ajuda o pecador a recuperar a sua condição verdadeira e devolve ao corpo da Igreja a santidade perdida. Deste modo, o perdão da ofensa feita a Deus e a reconciliação com a Igreja são dois efeitos simultâneos da reconciliação, que não se podem separar. Nisto reside a dimensão eclesial deste sacramento que o Concílio procurou acentuar, atribuindo à reconciliação um valor de destaque261. Por isso, o convite ao renovamento da pertença à Igreja realiza-se verdadeiramente com o coração: São plenamente incorporados à sociedade que é a Igreja aqueles que, tendo o Espírito de Cristo, aceitam toda a sua organização e os meios de salvação nela instituídos, e que, pelos laços da profissão da fé, dos sacramentos, do governo eclesiástico e da comunhão, se unem, na sua estrutura visível, com Cristo, que a governa por meio do Sumo Pontífice e dos Bispos. Não se salva, porém, embora incorporado à Igreja, quem não persevera na caridade: permanecendo na Igreja pelo «corpo», não está nela com o coração262.

Deste modo, a mudança no modo de entender a pertença à Igreja, baseia-se não somente nos direitos e deveres, mas na partilha da mesma missão. Por isso, o confessor deve discernir os vínculos de comunhão para que o penitente restabeleça esta verdadeira pertença à Igreja. A Constituição Lumen Gentium afirma ainda que os sacerdotes são os ministros do sacramento da penitência e que os bispos são os moderadores de toda a disciplina penitencial263. Em conformidade com esta imagem de Igreja, a Constituição Sacrosanctum Concilium requereu uma renovação do sacramento da penitên————————

258 A. NOCENT, «Il sacramento della penitenza e della reconcilazione», 194-195; J. RAMOS-REGIDOR, Il sacramento della penitenza, 244-245; G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 222-234. 259 LG 8. 260 Cf. LG 8, 11, 65. 261 Cf. G. FLÓREZ, Penitencia y Unción de enfermos, 227-234. 262 LG 14a. 263 Cf. LG 26.


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cia a fim de corresponder melhor ao seu verdadeiro significado264. A dimensão eclesiológica teve como consequência a insistência na participação activa dos fiéis nas celebrações litúrgicas, referida em vários números da Sacrosanctum Concilium265 e, mais concretamente, nas três formas de celebração do novo Ritual da Penitência de 1974. O princípio de que o pecador fere o Corpo da Igreja de que é membro e que toda a Igreja colabora na sua reconciliação, recuperado na reflexão conciliar, permite-nos enquadrar melhor o sacramento da penitência e as suas dimensões jurídicas. 6. O Código de 1983 6.1 Iter da codificação 6.1.1 Sínodo de 1967 O Sínodo dos Bispos de 1967 propôs dez princípios para a revisão do Código, de acordo com os decretos do Concílio Vaticano II e com os princípios gerais do Direito. Não poderemos rever o íter de codificação da matéria que nos ocupa, sem considerarmos ao menos dois desses princípios. O segundo princípio pediu que se fizessem normas acerca do foro interno e externo e acrescentou: É necessário que no CIC se tenha uma melhor coordenação do foro externo e interno, a fim de que qualquer conflito entre os dois seja retirado e reduzido ao mínimo. Isto deve ser tido presente em particular no direito sacramental e penal266.

Os autores esclarecem que este princípio foi fixado porque alguns duvidavam da juridicidade do foro interno, numa Igreja entendida como sociedade visível. «Foro» passa a significar o âmbito e a extensão dos efeitos do exercício do poder de governo, que é externo, quando regula a vida externa da comunidade, ou interno, quando em certas situações, reguladas pelo ordenamento canónico, tem efeitos no foro externo. O foro interno deixa de se confundir com o âmbito da consciência, como acontecia no antigo Código267. Na verdade, o exercício de poder de governo é o mesmo. Aliás, o critério para distinguir o exercí———————— 264 265 266 267

Cf. SC 72. Cf. SC 27, 31, 35. SÍNODO DOS BISPOS (1967), Relatio, n. 2, 79. Cf. can. 196 CIC/17.


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cio de poder relaciona-se, para o foro externo, com o reconhecimento público, enquanto a comunidade tem um conhecimento legítimo do mesmo, ou, para o foro interno, sacramental ou não, se o exercício do poder e os seus efeitos permanecem ocultos à comunidade por falta de provas legítimas. O mesmo acto pode pertencer primeiramente ao foro interno, por causa do seu carácter secreto, e depois tornar-se um acto no foro externo, porque se tornou público e legitimamente comprovado. O foro interno é algo que pertence ao ordenamento canónico, tendo em conta a peculiaridade da Igreja e a sua missão, que atinge a intimidade da pessoa. O exercício deste poder concretiza a solicitude pastoral da Igreja, a caridade, enquanto lei suprema, em favor dos problemas pessoais dos fiéis para o seu bem privado, no que se refere ao foro interno, e para o bem comum, enquanto afecta o foro externo. Os conflitos entre os foros são eliminados quando o exercício do poder no foro interno é reconhecido pelo ordenamento no foro externo, ou melhor, quando se elimina o conflito entre duas normas canónicas, uma pública e outra oculta. Deste modo, o novo Código já não usa a nomenclatura de poder de jurisdição ou de governo, além de ordem sagrada, para a absolvição sacramental, mas de faculdade, como poder único. Contudo, a remissão de penas no foro interno sacramental não advém da faculdade de confessar, mas de um poder jurisdicional delegado pelo ordenamento jurídico268. Esta coordenação entre os dois foros concretiza-se no ofício do penitenciário, visto que o poder de governo, delegado ipso iure, se traduz na remissão das penas latae sententiae no âmbito sacramental. O poder de jurisdição de remissão das penas aplica-se ao foro interno. Trata-se de um caso concreto em que os foros se cruzam num único acto de governo, sem se perder a distinção de foros. Por outro lado, o exercício do penitenciário constitui uma das intervenções mais pastorais dos ministros da Igreja, ao permitir que a remissão sacramental da pena não seja sujeita a um juízo puramente externo, respeitando deste modo o mais sagrado da consciência. O nono princípio proposto por este Sínodo pediu a revisão do direito penal. Solicitou-se a redução das penas, e a orientação é que as penas sejam geralmente ferendae sententiae e sejam infligidas e remitidas somente no foro externo. No que se refere às penas

———————— 268

Cf. can. 130 CIC/83; G. GHIRLANDA, Introducción al Derecho Eclesial, 96-99; V. DE PAOLIS, «La potestà di governo (cann. 129-144)», 427-430; F. URRUTIA, «Foro giuridico», 536-539.


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latae sententiae, ainda que de não poucos fosse proposta a abolição, a orientação é que sejam limitadas a poucos casos, e sobretudo a pouquíssimos e gravíssimos delitos269.

Uma análise atenta ao novo código, partilhada por diversos autores, conclui que este princípio se traduziu numa notável redução de penas e delitos, com o convite ao recurso a instrumentos pastorais e jurídicos. As censuras latae sententiae reduziram-se a treze, para delitos muito graves, sendo cinco reservadas à Santa Sé. Alguns pretendiam a abolição total destas censuras, mas tal teria sido nocivo para a Igreja, visto que a coactividade se baseia não só na lei ou na sentença do juiz, mas também na vontade salvífica de Deus. Grande parte das penas são deixadas à discricionalidade da autoridade, no que se refere à sua aplicação. Muitas tornaram-se facultativas e genéricas. As penas maiores são medicinais, tendo como finalidade a conversão do réu. Contudo, as poucas penas expiatórias não privam dos bens espirituais fundamentais270. O sentido pastoral do sistema penal concretiza-se igualmente na aplicação das penas, dominado pela caridade e espírito de misericórdia, em que se destaca a admoestação fraterna e repreensão271. A punição passa a ser prevista só para o delito doloso. Introduziu-se a normativa da aplicação da lei mais favorável ao réu272. Proíbe-se acrescentar à lei universal outras penas, senão por necessidade gravíssima273. O princípio do cânon 1399 impede que se aplique outra pena além das estabelecidas, somente «quando a especial gravidade da violação da lei exige uma punição e urge a necessidade de prevenir ou reparar os escândalos». Deste modo, a autoridade não pode agir por simples arbítrio e protege-se o bem do indivíduo e da comunidade274. Este princípio tem efeitos no ofício do penitenciário, visto que que este somente pode agir ———————— 269 270

SÍNODO DOS BISPOS (1967), Relatio, n. 9, 84-85. Cf. G. GHIRLANDA, Introducción al Derecho Eclesial, 116-119; V. DE PAOLIS, «Il cammino di preparazione», 38-43. 271 Cf. can. 1341 CIC/83. 272 Cf. can. 1313§1 CIC/83. 273 Cf. can. 1315 §3 CIC/83: «Lex particularis potest etiam poenis universali lege constitutis in aliquod delictum alias addere; id autem ne faciat, nisi ex gravissima necessitate. Quod si lex universalis indeterminatam vel facultativam poenam comminetur, lex particularis potest etiam in illius locum poenam determinatam vel obligatoriam constituere». 274 Cf. G. GHIRLANDA, Introducción al Derecho Eclesial, 116-119; V. DE PAOLIS, «Il cammino di preparazione», 38-43.


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nos dois casos previstos pelo direito universal, como veremos adiante. O espírito de misericórdia e de sentido pastoral está presente no uso do sacramento da penitência, enquanto permite a remissão da pena latae sententiae no foro sacramental e solicita a conversão do fiel. Aliás, o recurso ao penitenciário faz entender ao fiel a gravidade do seu delito, sem, no entanto, colocar em causa a sua boa fama e intimidade. 6.1.2 Livro II O esquema de revisão de 1977 do Livro II, De Populo Dei, apresenta o can. 322, relativamente diverso do can. 401 §1 CIC/17. Insere-se o mesmo no art. VI, De canonicorum capitulis, can. 317-325, do Tit. II, De Ecclesiis particularibus deque earumdem coetibus, da secção II, De Ecclesiae constitutione hierarchica: §1. Poenitentiarius canonicus tum ecclesiae cathedralis tum ecclesiae collegiatae obtinet a iure facultatem ordinariam, quam tamen aliis delegare non potest, absolvendi in foro sacramentali a censuris latae sententiae non declaratis, Apostolicae Sedi non reservatis, in dioecesi extraneos quoque, et dioecesanos extra territorium quoque dioecesis275.

Em vez de potestas, utiliza-se o termo facultas. Torna-se explícito que a sua faculdade se deve exercer no foro sacramental. Esta mudança terminológica exprime com maior precisão técnica que para a absolvição são necessários o poder de ordem e a autorização a exercitá-la. Não se utiliza os termos de poder de governo ou jurisdição, como se exprimia o Código de 1917. Deste modo, a jurisdição para a confissão é mais claramente chamada faculdade de escutar as confissões, porque «a absolvição não é um acto do poder de governo ou de jurisdição, que actualmente fica bem diferenciada do poder que se refere ao âmbito da consciência»276. Esta terminologia não distingue entre poder ordinário e delegado, mas uma faculdade que se obtém por concessão do próprio Direito ou da autoridade competente. Contudo, esta diferente terminologia não comporta um modo diverso de regulamentar a disciplina, porque a substância permanece inalterada. Para a válida confissão, é necessária a ordenação sacerdotal e a intervenção da autoridade que regulamenta e autoriza a celebração do sacramento da penitência. O uso ———————— 275 276

PCCICR, Schema Canonum Libri II, 1977, 183. PCCICR, Comm. 10 (1978) 56: «absolutio enim non est actus potestatis regiminis seu iurisdictionis, quae hodie bene distinguitur a potestate quae conscientiam respicit».


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do termo faculdade indica que o ministro não tem o poder de governo, por isso não é possível afirmar que o ministro tem o poder judicial. Somente se verifica esse poder de governo em casos particulares, como no caso da remissão das censuras latae sententiae. De igual modo, o Código não identifica o sacramento da confissão com o foro interno, porque o ministro do sacramento não exerce o poder judicial em sentido estrito, que lhe permita exercer um juízo ao mesmo nível de um juiz em tribunal277. Desaparece o instituto de pecados reservados. Um dos consultores do coetus studiorum, reunido entre 8 a13 de Novembro de 1971, colocou em questão a sua existência, nomeadamente da sua utilidade, enquanto reservas ratione sui, visto que não são penais, e porque são mais odiosas que aquelas que procedem das censuras. Por outro lado, os can. 899 §3 e can. 900 limitam-nas, e existem critérios contraditórios de severidade e clemência278. O Secretário do mesmo coetus recordou a discussão de 1970, em que o direito penal deveria ser limitado ao foro externo, a sua severidade deveria ser mitigada, visto que as censuras dizem respeito somente ao foro externo, e se absolvem somente os pecados no foro da consciência279. Na Relatio da Pontifícia Comissão de 1981, a secretaria responde a um Padre que a reserva dos pecados foi suprimida especialmente pelo pedido da Sagrada Penitenciaria, porque se considerava menos últil e era suficiente providenciar à reserva somente pelas censuras280. O objecto da absolvição são as censuras latae sententiae, não declaradas e não reservadas à Sé Apostólica, em consonância com as inovações introduzidas nos can. 1355 §2 e 1357281. Des————————

277 Cf. G. TREVISAN, «La facoltà di confessare», 91-93; F. LOZA, «Comentario al can. 966», 779. 278 Cf. PCCICR, «Coetus studiorum “De Sacramentis”», Comm. 31 (1999) 273. 279 Cf. PCCICR, «Coetus studiorum “De Sacramentis”», Comm. 31 (1999) 273274. 280 PCCICR, Relatio, Comm. 15 (1983) 209: «4. Affirmetur principium reservationis peccatorum (Quidam Pater). R. Reservatio peccatorum suppressa fuit, rogante praesertim Sacra Poenitentiaria, cum minus utilis videatur et sufficiens provideri possit per censuras. Huiusmodi suppressio amplium invenit favorem in consultatione. Reservatio non debet proinde iterum introduci». 281 Can 1355 § 2 CIC/83: «Poenam latae sententiae nondum declaratam lege constitutam, si Sedi Apostolicae non sit reservata, potest Ordinarius remittere suis subditis et iis qui in ipsius territorio versantur vel ibi deliquerint, et etiam quilibet Episcopus in actu tamen sacramentalis confessionis». Can. 1357 CIC/83: «§1. «Firmis praescriptis cann. 508 et 976, censuram latae sententiae excommunicationis vel interdicti non declaratam confessarius remittere potest in foro interno sacramentali, si pae-


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te modo, desaparece a referência explícita à reserva episcopal, como disponha o CIC 17. Mantêm-se os mesmos sujeitos da absolvição. Este cânon é retomado de modo igual no can. 428 do esquema de 1980282. No entanto, sofre algumas alterações no can. 508 do esquema de 1982: §1. Paenitentiarius canonicus tum ecclesiae cathedralis tum ecclesiae collegialis vi officii habet facultatem ordinariam, quam tamen aliis delegare non potest, absolvendi in foro sacramentali a censuris latae sententiae non declaratis, Apostolicae Sedi non reservatis, in dioecesi extraneos quoque, dioecesanos autem extra territorium dioecesis. §2. Ubi deficit capitulum, Episcopus dioecesanus sacerdotem constituat ad idem munus implendum283.

A expressão obtinet a iure foi substituída por vi officii habet, e fezse uma melhoria de estilo na última perícopa. Deste modo, o ofício do penitenciário insere-se nos ofícios dos ministros da penitência. O segundo parágrafo é uma novidade, que tem como razão a facultatividade do cabido. Contudo, o bispo deve constituir um sacerdote com este ofício284. No mesmo esquema de 1977, apresenta-se a incompatibilidade entre o ofício de vigário geral e episcopal com o ofício de penitenciário no can. 291 §4285. Trata-se de uma norma já presente em parte no can. 367 §3 do CIC/17286. A grande diferença está no ofício de vigário episcopal, ————————

nitenti durum sit in statu gravis peccati permanere per tempus necessarium ut Superior competens provideat. §2. «In remissione concedenda confessarius paenitenti onus iniungat recurrendi intra mensem sub poena reincidentiae ad Superiorem competentem vel ad sacerdotem facultate praeditum, et standi huius mandatis; interim imponat congruam paenitentiam et, quatenus urgeat, scandali et damni reparationem; recursus autem fieri potest etiam per confessarium, sine nominis mentione. §3. Eodem onere recurrendi tenentur, postquam convaluerint, ii quibus ad normam can. 976 remissa est censura irrogata vel declarata vel Sedi Apostolicae reservata». 282 Cf. PCCICR, Schema Codicis Iuris Canonici, 1980, 103-104. 283 PCCICR, Codex Iuris Canonici Schema novissimum, 1982, 94. 284 Cf. P. SOUSA COSTA, «Commento al can. 508», 307: «Da rilevare pure l’introduzione del §2 che appare la prima volta nello schema del 1982. La ragione è chiara, perché essendo molte le Diocesi prive del capitolo cattedrale, si profila evidente la necessità o almeno l’utilità che il munus del canonico penitenziere nel foro sacramentale venga affidato ad un altro sacerdote». 285 PCCICR, Schema Canonum Libri II, 1977, 174: «can. 291 §4. Vicarii generalis et episcopalis munus componi non potest cum munere canonici poenitentiarii». 286 Can. 367 §3 CIC/17: «Vicarii Generalis munus ne committatur canonico poenitentiario».


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uma instituição conciliar287. A mesma norma repete-se no can. 398 do esquema de 1980288, no can. 478 §2 do esquema de 1982289e de igual modo no Código de 1983290. 6.1.3 Livro IV O primeiro esquema do Livro IV, De Sacramentis, foi composto por três grupos de estudo, na primeira fase, no período de 1966-1977, e foi enviado aos órgãos consultivos em datas diversas291. Na discussão do coetus studiorum de sacramentis, realizada de 13 a 17 de Maio de 1972, o can. 5, do esquema preparado pelo secretário, não inclui o cónego penitenciário, pois era formulado do seguinte modo: «§1. Vi officii pro suo quisque territorio facultate ad confessiones excipiendas gaudent loci Ordinarius itemque parochis aliique qui loco parochi sunt; parochus vero aliique qui parochi loco sunt eamdem aliis delegare nequeunt»292. A última perícopa «parochus vero... nequeunt» foi retirada, por proposta de um consultor, porque incluiria os cardeais e bispos não diocesanos293. Num novo esquema de cânones, preparado pelo secretário, o can. 5 §1 foi então elaborado assim: «Vi officii pro sua quisque territorio facultate ad confessiones excipiendas gaudent Ordinarius, Canonicus paenitentiarius, itemque parochus aliique qui loco parochi sunt»294. O cónego penitenciário é introduzido pela primeira vez neste cânon, mas sem nenhuma justificação registada nos autos, seguramente para completar o número de confessores em razão do ofício. Na discussão posterior o secretário verificou um problema da redacção, porque o penitenciário não tem território e propôs que se alterasse para «pro sua quisque dicione» em vez de «pro suo quisque territorio», proposta aceite por todos295. Num ulterior grupo de estudo, ———————— 287 288 289 290

Cf. CONC. VATICANO II, Dec. Christus Dominus, 27, in COD 931. Cf. PCCICR, Schema Codicis Iuris Canonici, 1980, 96. Cf. PCCICR, Codex Iuris Canonici Schema novissimum, 1982, 88. Cf. can. 478 §2 CIC/83: «Vicarii generalis et episcopalis munus componi non potest cum munere canonici poenitentiarii». 291 Cf. F. D’OSTILLO, La storia del nuovo codice, 56. 292 PCCICR, «Coetus studiorum “De Sacramentis”», Comm. 31 (1999) 291. 293 PCCICR, «Coetus studiorum “De Sacramentis”», Comm. 31 (1999) 300. 294 PCCICR, «Coetus studiorum “De Sacramentis”», Comm. 31 (1999) 304. 295 PCCICR, «Coetus studiorum “De Sacramentis”», Comm. 31 (1999) 305-306: «Ad §1: Rev. mus Secretarius ad. videt difficultatem in hoc quod canonicus poenitenciarius non habet territorium et proponit ut dicatur “pro sua quisque dicione” loco “pro suo quisque territorio”. Textus cum hac emendatione placet omnibus».


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reunido entre 23 e 28 de Outubro de 1972, um dos consultores propôs que se fizesse menção de qualquer sacerdote que tivesse especial faculdade onde faltasse o cónego penitenciário. Contudo, a proposta não foi aceite, porque isso não se prevê no Código, como respondeu o secretário296. O can. 138 §1 do esquema de 1977 apresenta a seguinte redacção: «Vi officii pro sua quisque dicione facultate ad confessiones excipiendas gaudent Ordinarius, Canonicus paenitentiarius, itemque parochus aliique qui loco parochi sunt»297. O grupo de estudo dos sacramentos, reunido entre 20 e 25 de Junho de 1977, rejeitou a objeção acerca deste cânon segundo a qual os presbíteros teriam a faculdade de confessar somente em razão da ordenação. Discutiu-se acerca daqueles que em razão do ofício se deveriam conceder a faculdade de confessar e especialmente daqueles que fazem as vezes de pároco. Contudo, após votação, o cânon manteve-se inalterado298. O mesmo texto repete-se sem alterações no can. 922 do esquema de 1980299 e novamente no can. 968 §1 do esquema novissimum de 1982300, e consequentemente no Código de 1983. 6.2 Comentário à actual legislação Os comentadores da legislação do Código de 1983 explicitam a particularidade do ofício do penitenciário, um dos ministros que tem a faculdade de remitir as censuras latae sententiae no foro interno sacramental, à semelhança de qualquer bispo (can. 1355), do capelão do hospital, do cárcere e das viagens no mar (can. 566 §2), qualquer sacerdote em perigo de morte do penitente (can. 976), ou no «casus urgentior» (can. 1357)301. ————————

296 Cf. PCCICR, «Coetus studiorum “De Sacramentis”», Comm. 32 (2000) 41-42: «Ad. par. 1: Rev. mus septimus Consultor proponit ut in texto mentio fiat de aliquo sacerdote qui specialem facultatem habeat ubi desit canonicus poenitentiarius. Respondet Rev. mus Secretarius ad, quod hoc non praevidetur in Codice. Concordant omnes ut textus maneat ut est». 297 PCCICR, Novi Canones De Sacramentis, 48. 298 Cf. PCCICR, «Coetus Studiorum de Sacramentis», Comm. 10 (1978) 60. 299 Cf. PCCICR, Schema Codicis Iuris Canonici, 1980, 215. 300 Cf. PCCICR, Codex Iuris Canonici Schema novissimum, 1982, 175. 301 Cf. P. URSO, «La strutura interna delle Chiese Particolari», 383; P. PAVANELLO, «Commento al can. 508», 458-459; P. SOUSA COSTA, «Commento al can. 508», 307; F. LOZA, «Comentario al can. 508», 1182-1183.


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Neste sentido, é importante realçar que a remissão das penas no foro interno tem como objectivo a mitigação do rigor das censuras. De Paolis esclarece: O problema da remissão das penas no foro interno, especialmente sacramental, coloca-se somente para as penas medicinais. Na verdade, estas penas privam dos sacramentos, mesmo da penitência. Isto pode resultar particularmente duro para a sensibilidade da consciência cristã e portanto ser mais um dano que uma utilidade, se não estivesse prevista a mitigação da norma. De facto, a Igreja confere a não poucas pessoas, em razão do ordenamento, a faculdade de remitir a pena no foro interno sacramental, quer no poder ordinário anexo ao ofício, quer no poder delegado pelo próprio direito. Prevê depois que o Superior competente possa delegar a jurisdição para remitir as penas, segundo as circunstâncias e a oportunidade302.

Como sucede no ofício de confessor, o penitenciário é designado pelo bispo303. Tem de se ter em conta a sua idoneidade, conforme o prescrito pelo can. 970304. Conforme o can. 508, o cónego penitenciário possui a faculdade ordinária de absolver no foro sacramental as censuras latae sententiae não declaradas e não reservadas à Sé Apostólica305. Trata-se de uma faculdade que o penitenciário não possui no foro externo, mas no foro interno, sem que o réu se encontre em determinadas condições. Por outro lado, não é necessário recorrer ao superior nestes ———————— 302

V. DE PAOLIS, «Le sanzioni nella Chiesa», 511: «Il problema della remissione delle pene in foro interno, specialmente sacramentale, si pone solo per le pene medicinali. Queste pene infatti privano tra l’altro dei sacramenti, anche di quello della penitenza. Questo può risultare particularmente duro alla sensibilità della coscienza cristiana e quindi essere più di danno che di utilità, se non fosse prevista la mitigazione della norma. Di fatto la Chiesa conferisce a non poche persone, in forza dello stesso ordinamento, la facoltà di poter rimettere la pena in foro interno sacramentale, sia con potestà ordinaria annesso all’ufficio, sia con potestà delegata dallo stesso diritto. Prevede poi che il Superiore competente possa delegare la giurisdizione per rimettere le pene, secondo le circostanze e l’opportunità». 303 Cf. can. 147, 157, 508, 966 e 968 §1 CIC/83. 304 Cf. F. LOZA, «Comentario al can. 508», 1182: «esta exigencia es mayor tratandose del penitenciario: convendrá elegir un sacerdote ejemplar, experimentado y prudente, con buena formación teológica y canónica». 305 Cf. F. LOZA, «Comentario al can. 508», 1182-1183: «Dichas censuras son: excomunión, suspensión y entredicho (cc. 1331-1333). Pero con la condición de no hayan sido declaradas mediante sentencia o decreto (cc. 1334 §1, §341-1342) ni estén reservadas a la Santa Sede (cc. 1354 §3, 1367, 1370 §1, 1378 §1, 1382, 1388 §1, 1358)».


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casos306. Diferentemente da faculdade atribuída aos bispos307, não se consente a remissão das penas expiatórias, mas somente das censuras, incluindo a suspensão, ainda que esta não comporte a proibição dos sacramentos308. O penitenciário exercita uma faculdade ordinária não delegável, que se pode exercitar na Diocese, mesmo para com os estranhos, e fora da Diocese, para com os diocesanos. Por isso, exerce o seu ofício no âmbito da sua circunscrição, de acordo com o can. 968 §1, e pode exercitá-la em qualquer parte a não ser que o Ordinário do lugar o proíba em casos particulares, como afirma o can. 967 §2309. Atribui-se ao cónego penitenciário um papel particular entre o cabido, de tal modo que, mesmo quando não existe o cabido, o bispo tem a obrigação de confiar a um sacerdote este ofício, de modo a facilitar e garantir aos fiéis o recurso à remissão sacramental, com a limitação do can. 478 §2. Evita-se, deste modo, a perigosa confusão entre o governo no foro externo e o foro interno sacramental. Loza defende que, pela mesma razão, o seu ofício não é compatível com o do ofício de vigário judicial, valendo-se da incompatibilidade de ofícios do can. 152310. Tendo em conta o estudo histórico realizado, a legislação canónica nunca impediu a compatibilidade entre os ofícios de vigário judicial e o de penitenciário. Tenha-se em conta que o exercício do poder judicial não é tão problemático no que respeita ao uso indevido do foro interno. O carácter de público não se deve confundir com o de notório. Por outro lado, o exercício deste ofício está sujeito à disciplina de segredo dos Tribunais de um modo mais estrito, podendo ser penalizado (can. 1457). O poder judicial possui, aliás, semelhanças com o do confessor, como defendiam os cânones tridentinos. Se o Legislador não o proibiu, não faz sentido uma interpretação praeter legem neste caso. ———————— 306 307

Cf. D. CITO, «La cessazione delle pene», 268. Cf. can. 1355 §2 CIC/83: «Poenam latae sententiae nondum declaratam lege constitutam, si Sedi Apostolicae non sit reservata, potest Ordinarius remittere suis subditis et iis qui in ipsius territorio versantur vel ibi deliquerint, et etiam quilibet Episcopus in actu tamen sacramentalis confessionis». 308 Cf. D. CITO, «La cessazione delle pene», 268; DE PAOLIS, V., «Le sanzioni nella Chiesa», 511-512. 309 «Qui facultate confessiones habitualiter excipiendi gaudent sive vi officii sive vi concessionis Ordinarii loci incardinationis aut loci in quo domicilium habent, eadem facultatem ubique exercere possunt, nisi loci Ordinarius in casu particulari renuerit, firmis praescriptis can. 974, §§ 2 et 3». 310 Cf. F. LOZA, «Comentario al can. 508», 1183.


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Ao comentar o ofício do penitenciário, S. Haering afirma que a sua importância é reduzida em relação às faculdades que têm os outros sacerdotes confessores, mas o seu ofício pode constituir um ponto de partida para a renovação da pastoral penitencial311. Tendo em conta o can. 401 §2 CIC/17312 e o can. 986 §1 CIC/83313, Loza aconselha a que o penitenciário tenha uma sede fixa conhecida, acessível em dias e horas oportunos314. 6.3 Aplicações A intervenção do penitenciário, no que diz respeito à remissão das penas no foro interno sacramental, não se aplica aos casos de excomunhão latae sententiae reservados à Sé Apostólica, como a profanação das espécies eucarísticas (can. 1367), a violência física contra o Romano Pontífice (can. 1370), a absolvição do cúmplice no pecado contra o sexto mandamento (can. 1378 §1), a consagração episcopal sem mandato pontifício (1382) a violação do sigilo sacramental da parte do confessor (can. 1388 §1), a violação do segredo do conclave315 e da atentata ordenação de uma mulher316. O mesmo se entende no que respeita ao Decreto da Congregação para a Doutrina da Fé, mediante o qual se aplica a mesma excomunhão a quem regista por meio de instrumentos técnicos, ou divulga, por meio de instrumentos de comunicação social, o que é dito pelo confessor ou pelo penitente317. O recurso ao penitenciário não é necessário, enquanto ministro da remissão das penas latae sententiae não declaradas e não reservadas à Sé Apostólica, nos casos de perigo de morte (can. 976 §1); de grave incómodo, segundo as disposições do can. 1357 §1; e de suplência (can. 144). ———————— 311 312

Cf. S. HAERING, «Penitenciario», 656. Can. 401 §2: «Debet in sede excipiendis confessionibus sibi in capitulari ecclesia destinata residere tempore pro fidelium commoditate, iudicio Episcopi, opportuno et praesto esse iis qui ad confitenda sua peccata accedunt ipso quoque divinorum officiorum tempore». 313 Can. 986 §1: «Omnis cui animarum cura vi muneris est demandata, obligatione tenetur providendi ut audiantur confessiones fidelium sibi commissorum, qui rationabiliter audiri petant, utque iisdem opportunitas praebeatur ad confessionem individualem, diebus ac horis in eorum commodum statutis, accedendi». 314 Cf. F. LOZA, «Comentario al can. 508», 1183. 315 Cf. JOÃO PAULO II, Const. Ap. Universi Dominici Gregis, 58, 330. 316 Cf. CDF, Decretum generale, 19 Dezembro 2007, AAS 100 (2008) 403. 317 Cf. CDF, Decretum, 23 Setembro 1988, AAS 80 (1988) 1367; L. LORUSSO, Gli orientali cattolici, 197.


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Na realização do seu ofício, o penitenciário deve verificar algumas condições essenciais, respeitantes às normas da aplicação do direito penal318. Na verdade, a remissão da pena significa que esta cumpriu a sua função em ordem à reparação do escândalo, restauração da justiça e emenda do réu (can. 1341). Por isso, quando o fiel se dirige para o sacramento da penitência, deve ser verificado o seu arrependimento e o abandono de uma possível contumácia319. Por outro lado, para que a remissão seja concedida validamente, deve ser realizada sem temor grave, violência e erro320. Além das condições previstas nos cânones 976 e 1357, não tem sentido que se coloquem condições durante a remissão sacramental, como absolver o pecado, em modo absoluto, e, em modo condicionado, a pena321. O princípio do can. 1363 §3 prevê que não se divulgue a remissão da pena, mas o mesmo não se aplica ao sacramento da penitência, porque o segredo é fortemente tutelado. Na aplicação da pena, devem-se ter em conta igualmente as condições de punibilidade (can. 1321): baptizado na Igreja Católica ou nessa acolhido (can. 11), que tem suficiente uso de razão e dezasseis anos (can. 11; 1322; 1323, 1º) e as outras circunstâncias excludentes, atenuantes e agravantes (cann. 1323-1326). 6.3.1 Cânon 1364 §1 A legislação universal prevê a intervenção do penitenciário em dois delitos, a fim de remitir as penas no foro interno sacramental. O primeiro aplica-se à heresia, apostasia e cisma: «can. 1364 § 1. Apostata a fide, haereticus vel schismaticus in excommunicationem latae sententiae incurrit, firmo praescripto can. 194, § 1, n. 2; clericus praeterea potest poenis, de quibus in can. 1336, § 1, nn. 1, 2 et 3, puniri»322. A apostasia consiste num acto deliberado que comporta a rejeição dos mistérios centrais da fé, da Trindade e da Encarnação, que são o seu fundamento, ————————

318 Neste momento, apenas enunciamos alguns princípios da aplicação das normas do direito penal. Por razões metodológicas, não as aprofundamos. 319 Cf. cann. 1347 §2, 1358 §1 CIC/83. 320 Cf. cann. 125 §2, 126, 1360 CIC/83. 321 Cf. D. CITO, «La cessazione delle pene», 272-273. 322 As definições dos conceitos de heresia, apostasia e cisma encontram-se no can. 751: «Dicitur haeresis, pertinax, post receptum baptismum, alicuius veritatis divina et catholica credendae denegatio, aut de eadem pertinax dubitatio; apostasia, fidei christianae ex toto repudiatio; schisma, subiectionis Summo Pontifici aut communionis cum Ecclesiae membris eidem subditis detrectatio».


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e não necessariamente um abandono prático da religião. Como se trata de um acto de manifestação da vontade, o delito deve ser percebido por outros, por meio de uma declaração ou manifestação323. A heresia, definida, no can. 751, como pertinaz negação ou dúvida de alguma verdade da fé divina e católica, inclui todas as coisas contidas na Palavra de Deus escrita ou transmitida pelo único depósito da fé confiado à Igreja e que são propostas como divinamente reveladas quer pelo magistério solene, quer pelo magistério ordinário e universal, ou aquilo que é manifestado pela comum adesão dos fiéis orientados pelo sagrado magistério324. O facto de ser pertinaz significa que a atitude é consciente e obstinada. Por isso, excluem-se os casos de ignorância ou de insuficiente compreensão do depósito da fé. É necessário, igualmente, que a negação ou a dúvida seja percebida por outros, para que o delito seja consumado325. O cisma configura-se como delito doloso de rejeição à submissão ao Sumo Pontífice ou a manter a comunhão com os membros da Igreja a ele sujeitos. Não se identifica com a simples desobediência, que reconhece a autoridade, mas como corte com a mesma. Além das condições de punibilidade referidas anteriormente, é necessário que exista deliberada intenção de posições cismáticas e que se manifeste com sinais inequívocos. Não se deve ainda confundir este delito com a aversão ou antipatia, que nem sempre são quebra de comunhão326. A qualificação destes delitos com penas latae sententiae não foi consensual e suscitou sérias dúvidas nos trabalhos de elaboração do Código. Os esquemas de 1973327, 1977328 e 1980329 prevêem a aplica————————

323 Cf. V. DE PAOLIS, «Apostata», 34-35; D. CITO, «Le pene per i singoli deliti», 292-293; can. 1330 CIC/83. 324 Cf. can. 750 §1: «Fide divina et catholica ea omnia credenda sunt quae verbo Dei scripto vel tradito, uno scilicet fidei deposito Ecclesiae commisso, continentur, et insimul ut divinitus revelata proponuntur sive ab Ecclesiae magisterio sollemni, sive ab eius magisterio ordinario et universali, quod quidem communi adhaesione christifidelium sub ductu sacri magisterii manifestatur; tenentur igitur omnes quascumque devitare doctrinas iisdem contrarias». 325 Cf. can. 1330 CIC/83; D. CITO, «Le pene per i singoli deliti», 293-295. 326 Cf. D. CITO, «Le pene per i singoli deliti», 295-297; Á. MARZOA, «Comentario al can. 1364», 475-476. 327 Cf. PCCICR, Schema documenti, 1973, can. 48, 27. 328 Cf. PCCICR, Comm. 9 (1977) 305: «post aliquam discussionem Consultores concordant de statuenda poena excommunicationis ferendae sententiae. Excluditur poena l.s. quia perdifficilis est in hanc implexa materia ut habeatur necessaria certitudo iuridica de delicto commisso sine interventu iudicis vel superioris».


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ção das censuras ferendae sententiae, devido à dificuldade de haver certeza jurídica do delito consumado sem a intervenção do juiz ou superior. Na Plenária de 1981330, foi levantada a questão a favor da aplicação das censuras latae sententiae, porque quem pratica tais delitos, por isso mesmo, perde a comunhão com a Igreja, e para evitar a diversidade de comportamento da parte dos bispos nesta matéria. Esta argumentação não foi aceite por causa do seguinte: só se pode aplicar a sanção latae sententiae a delitos certos, consistentes em factos concretos e determinados, em que não há lugar para a dúvida; existe uma distinção entre a realidade objectiva da falta de plena comunhão e a sanção penal legitimamente infligida; a certeza jurídica do delito de excomunhão, neste caso, deve ser provada por um juiz ou superior; se a existência do delito é incerta, não se pode exigir a auto-aplicação. Por isso, a aplicação da excomunhão ferendae sententiae manteve-se no esquema de 1982331. No entanto, o legislador optou pela pena latae sententiae, como se determina no actual Código. Contudo, os autores mantêm a opinião de que esta opção não é a mais adequada. Argumentam que a mesma não facilita a distinção entre delito e pecado, e não produz efeito prático naqueles que a cometem. Na verdade, os apóstatas, heréticos e cismáticos tendem a apresentar as suas doutrinas como concordes com o Evangelho, e não como contrárias à comunhão eclesial. Nestes casos, é difícil que os próprios fiéis reconheçam a certeza do delito e a imputabilidade grave e plena. A punibilidade é, assim, mais segura por meio da realização de um processo. Por outro lado, a apostasia, heresia e cisma têm de ser públicas para que sejam factos de delito, pelo que requerem também da parte da Igreja uma resposta pública. Embora a perda de comunhão seja ipso iure, isso não significa que a pena deva ser latae sententiae. Por isso, na prática, é difícil que se aplique a remissão destas censuras ao foro sacramental332. Como prescreve o cânon, o clérigo pode ainda ser punido com as penas ferendae sententiae indicadas no can. 1336 §1, 1º-3º, e também a irregularidade a receber as ordens ————————

329 Cf. PCCICR, Schema Codicis Iuris Canonici, 1980, can. 1316 §1, 296: «apostata a fide, haereticus vel schismaticus excommunicetur». 330 Cf. PCCICR, Comm. 16 (1984) 46-47. 331 Cf. PCCICR, Codex Iuris Canonici Schema novissimum, 1982, can. 1364 §1, 241. 332 Cf. D. CITO, «Le pene per i singoli deliti», 297-299; Á. MARZOA, «Comentario al can. 1364», 470-474.


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e a exercitá-las, conforme os can. 1041, 2º, 1044 §1, 1º-3º, se o delito é público. Neste caso não se aplica a remissão sacramental. Finalmente, convém recordar que este delito prescreve depois de três anos, conforme determina o can. 1362 §1333. 6.3.2 Cânon 1398 O outro caso diz respeito ao delito de aborto: «can. 1398. Qui abortum procurat, effectu secuto, in excommunicationem latae sententiae incurrit». Esta normativa implica que existe aborto quando o feto é imaturo, isto é, dentro dos primeiros 180 dias, depois da concepção. Distingue-se igualmente do homicídio. A interpretação autêntica de 1988 clarificou que, por aborto, se deve entender não somente a expulsão do feto imaturo, mas também a morte do feto procurada por qualquer modo, ou em qualquer momento da concepção334. O delito do aborto acontece, por isso, quando se suprime um feto imaturo, por qualquer modo ou meio, mesmo no seio materno, e independentemente do tempo da concepção. Para a avaliação do mesmo, é necessário que seja um acto effectu secuto. Por isso, não bastam as tentativas falhadas, mas que haja certeza moral de que tenha havido aborto depois, e como consequência, da acção realizada. Segundo os autores, as práticas de fecundação artificial, com supressão de vários embriões, ou embriotomia, não se podem incluir na matéria deste cânon, dado que o legislador não as considerou e as leis penais são de interpretação estrita335. A remissão desta pena no foro sacramental constitui o único caso previsto na legislação universal em que, de facto, o penitenciário intervém normalmente, tendo em conta as questões apontadas anteriormente ao can. 1364 §1. Contudo, ele não é o único ministro. Na verdade, podem remitir a pena, através do sacramento da penitência: qualquer bispo (can. 1355 §2); os capelães dos hospitais, cárceres, e viagens marítimas, somente nestes lugares (can. 566 §2); qualquer sacerdote em perigo de morte (can. 976); e no caso determinado pelo can. 1357. No ———————— 333 334

Can. 1362 §1: «Actio criminalis praescriptione extinguitur triennio». PCLTI, Resp. 1, 19 Janeiro 1988, AAS 81 (1989) 1818: «D. Utrum abortus, de quo in can. 1398, intellegatur tantum de eiectione fetus immaturi, an etiam de eiusdem fetus occisione quocumque modo et quocumque tempore a momento conceptionis procuretur. R. Negative ad primam partem: affirmative ad secundam». 335 Cf. can. 18 CIC/83; D. CITO, «Le pene per i singoli deliti», 365-366; F. PÉREZMADRID, «Comentario al can. 1398», 590-593; V. DE PAOLIS, «Le sanzioni nella Chiesa», 553-554.


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caso particular da Diocese de Roma, qualquer sacerdote, com faculdade para confessar, pode absolver desta censura336. Os cúmplices necessários contraem também a excomunhão, de acordo com a norma do can. 1329 §2337. Convém ponderar igualmente se existem circunstâncias excludentes ou atenuantes, aquando da identificação do acto doloso grave338. Finalmente, é necessário avaliar o tempo da prescrição da acção criminal do aborto de cinco anos, de acordo com a norma do cân. 1362 §1, 2º339. 7. O Código dos Cânones das Igrejas Orientais O Código das Igrejas Orientais, promulgado no dia 18 de Outubro 1990 por João Paulo II, não prevê o ofício do cónego penitenciário. De igual modo, não integra o instituto de penas latae sententiae, mas conserva o da reserva dos pecados340. O código oriental conserva apenas as penas ferendae sententiae, aplicadas mediante sentença judicial ou decreto administrativo341. As penas latae sententiae foram abolidas, porque, segundo as comissões de preparação, «não correspondem às genuínas tradições orientais, ————————

336 O Cardeal Vigário de Roma, por mandato do Romano Pontífice, delegou a faculdade de absolver esta censura, no foro interno sacramental, a qualquer sacerdote que tenha a faculdade de confessar na Diocese de Roma, com a obrigação de impor uma penitência correspondente. Cf. U. POLETTI, «Speciale facoltà», 22 Abril 1984, 637. 337 Can. 1329 §2: «In poenam latae sententiae delicto adnexam incurrunt complices, qui in lege vel praecepto non nominantur, si sine eorum opera delictum patratum non esset, et poena sit talis naturae, ut ipsos afficere possit; secus poenis ferendae sententiae puniri possunt». 338 Cf. cann. 1323-1324 CIC/83. 339 Can. 1362 §1, 2º: «Actio criminalis praescriptione extinguitur triennio, nisi agatur: […] de actione ob delicta de quibus in cann. 1394, 1395, 1397, 1398, quae quinquennio praescribitur». 340 Cf. cann. 727-729 CCEO; PCCICOR, «Le osservazioni», Nuntia 28 (1989) 97: «Per quanto riguarda l’istituto della riserva dei peccati, da stabilirsi dalle autorità inferiori alla Santa Sede, pur reconoscendo che nel contesto del diritto canonico attuale esso può essere poco efficace, tuttavia sembra oportuno conservarlo»; «Schema canonum», Nuntia 20 (1985) 8-11: ritenendola in sostanza consona con le più genuine tradizioni orientali e anche veramente efficace ad assicurare per i fedeli orientali nel mondo moderno quel deterrent che si spera di ottenere per i fedeli latini con le scomuniche riservate latae sententiae». 341 Cf. can. 1408 CCEO; D. SALACHAS, Teologia e disciplina dei sacramenti, 260, nt. 33.


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são desconhecidas das Igrejas Ortodoxas e não parecem necessárias à adaptação do código oriental às exigências modernas da disciplina das Igrejas Orientais»342. Esta decisão de Março de 1974 da plenária dos membros da Comissão foi retomada pela maioria dos órgãos de consulta, que pediu, com um voto formal, que todas as penas latae sententiae fossem abolidas do Código Oriental Católico. O grupo de estudo não se convenceu do argumento de um órgão de consulta que defendia que as penas latae sententiae poderiam conseguir melhor a emenda do réu. Por outro lado, reafirmou-se a genuína tradição oriental, segundo a qual, a própria absolvição é diferida até que o dano social seja suficientemente reparado, de acordo com o juízo do bispo, e o réu verdadeiramente emendado. Para a mentalidade oriental, uma absolvição do pecado depois do cumprimento da penitência é natural343. Este é, por exemplo, o caso do can. 731344. Portanto, a legislação oriental exige uma sentença ou decreto penal para a aplicação de uma pena. Os pecados reservados são punidos com a excomunhão maior345, mediante o juízo penal346. Apesar de, ao longo dos trabalhos, se ter levantado a questão de existirem duas disciplinas diversas na Igreja, o Código Oriental conservou o instituto dos pecados reservados. Por isso, optou-se por não tornar a reserva muito pesada, ao excluir, desde modo, as penas latae sententiae. ———————— 342

PCCICOR, «Principi direttivi», Nuntia 3 (1976) 9;. O mesmo se pode confirmar em outras partes da elaboração do Código Oriental: PCCICOR, «Lo schema dei canoni», Nuntia 4 (1977) 80: «Nel CICO, infatti, abolite, come si propone, le poenae latae setentiae, non vi è alcuna necessità di definire in un senso o nell’altro quali pene sono latae e quali ferendae sententiae»; PCCICOR, «Schema canonum», Nuntia 13 (1981) 62: «Hoc principium prae oculis habito atque, ut omne dubium in re amoveatur, denuo perpensis orientalibus fontibus, canon 8 schematis exaratus est, qui statuit poena reum non teneri nisi postquam irrogata est, salvo iure Romani Pontificis vel Concilii Ecumenici poenas latae sententiae in Ecclesias Orientales introducendi». 343 Cf. PCCICOR, «Schema canonum», Nuntia 20 (1985) 8-11. 344 Can. 731 CCEO: «Qui confitetur se falso confessarium innocentem apud auctoritatem ecclesiasticam denuntiavisse de delicto sollicitationis ad peccatum contra castitatem, ne absolvatur, nisi antea falsam denuntiationem formaliter retractavit et paratus est damna, si quae habentur, reparare». 345 A excomunhão menor consiste na privação da comunhão eucarística (can. 1431 CCEO); a excomunhão maior proíbe a recepção de todos os sacramentos, o exercício do ministérios, ofícios e outros encargos eclesiásticos (can. 1434 CCEO). Cf. L. LORUSSO, Gli orientali cattolici, 198, nt. 135. 346 Cf. can. 1468-1482 CCEO.


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Portanto, entende-se que este ponto, que não implica a doutrina, é um daqueles nos quais se pode «ad avitas traditiones redire» (OE 6) em conformidade com o que foi expresso por S.S. João Paulo II na Basílica de S. Maria in Trastevere, a 21 de Novembro de 1987 e na Basílica de S. Pedro a 6 de Dezembro de 1987347.

Entende-se igualmente que esta reserva obtém os mesmos efeitos disciplinares dos obtidos pelas latae sententiae, visto que se recorre à Santa Sé, ou, no caso do aborto, ao bispo eparquial348. Existe, deste modo, uma grande semelhança entre os pecados reservados ratione sui e a reservatio ratione censurae, presente na legislação latina349. O conceito de pecados reservados tem um sentido pastoral, porque o objectivo de limitar a faculdade de abolver os pecados e reservá-la a uma autoridade superior é essencialnete medicinal, tendo como finalidade a salvação das almas350. Tal se pode verificar no seguinte: In nonnullis casibus ad salutem animarum providendam opportunum esse potest facultatem a peccatis absolvendi limitare atque determinatae auctoritati reservare; hoc tamen fieri non potest nisi de consensu Synodi Episcoporum Ecclesiae patriarchalis vel Consilii Hierarcharum vel Sedis Apostolicae351.

Estes pecados são reservados devido à sua gravidade, mas o bispo não pode reservar sem o consentimento do sínodo dos bispos da Igreja Patriarcal, ou da Igreja Arquidiocesana Maior, ou do conselho de hierarcas, ou da Sé Apostólica352. O Código Oriental elenca como pecados reservados à Sé Apostólica: absolver dos pecados de violação do sigilo sacramental e de absolvição do cúmplice contra a castidade; e é reservada ao Romano Pontífice a absolvição do delito de violência e grave injúria contra o mesmo353. O pecado reservado ao bispo eparquial é o de aborto procurado, seguindose o efeito, que é penalizado com a excomunhão maior. Esse bispo pode ser, quer aquele da eparquia onde foi cometido o aborto, quer aquele de outra, e pode delegar a remissão a um outro confessor354. ———————— 347 348 349 350 351 352

PCCICOR, «Le osservazioni», Nuntia 28 (1989) 97. Cf. PCCICOR, «Le osservazioni», Nuntia 28 (1989) 97-98. Cf. L. LORUSSO, Gli orientali cattolici, 196. Cf. PCCICOR, «Le osservazioni», Nuntia 28 (1989) 98. Can. 727 CCEO. Cf. D. SALACHAS, Teologia e disciplina dei sacramenti, 261. Cf. PCCICOR, «Le osservazioni», Nuntia 28 (1989) 98; L. LORUSSO, Gli orientali cattolici, 195-196. 353 Cf. can. 728; 1445 §1 CCEO. 354 Cf. can. 728 §2; 1450 §3; 1456 § 2; 1457 CCEO.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

A reserva dos pecados afecta directamente a jurisdição do sacerdote, pelo que a limitação da faculdade está em relação com o lugar onde se realiza a confissão, e não onde foi cometido o pecado. A limitação é um acto da jurisdição que tem efeito somente no território daquele que reserva355. A questão da remissão entre as Igrejas Latina e Oriental não é consensual entre os autores. De acordo com D. Salachas, se um fiel oriental, sujeito ao pecado reservado, se apresenta a um presbítero latino, ou um fiel ocidental, sujeito a censura latae sententiae, se apresenta a um presbítero oriental, os presbíteros absolvem lícita e validamente. Dado que a proibição que as «censuras reservadas» ou os «pecados reservados» comportam de receber os sacramentos diz respeito como tal à liceidade e não à validade, e, além disso, se trata de salvaguardar o bem espiritual do fiel, os presbíteros absolvem lícita e validamente, visto que a Igreja não pode ou pelo menos não pretende atrasar o perdão e remissão da pena ao fiel arrependido356.

Tal é confirmado pelo caso urgente previsto na legislação que obriga ao recurso, mas, como é uma lei eclesiástica, não comporta a obrigação da sua observância se existir um grave incómodo357. Esta opinião não é partilhada por Lorusso, que defende que um ministro oriental absolve ilicitamente o fiel latino que confessa pecados com censuras latae sententiae. No entanto, o confessor latino pode absolver licitamente o fiel oriental que confessa os pecados reservados358. 8. Síntese O Concílio de Trento clarificou e organizou a doutrina acerca do ministro do sacramento da penitência e da noção essencial de jurisdição para a validade da absolvição. Defendeu o poder de remissão dos pecados por parte dos ministros da Igreja, como participação do poder cla———————— 355 356

Cf. can. 739, 3º CCEO. D. SALACHAS, Teologia e disciplina dei sacramenti, 262: «Poiché la proibizione che le “censure riservate” o i “peccati riservati” comportano di ricevere i sacramenti riguarda come tale la liceità e non la validità, e inoltre si trata di salvaguardare il bene spirituale del fedele, entrambi i presbiteri assolveranno lecitamente e validamente, poiché al fedele pentito la Chiesa non può o per lo meno non vuole ritardare il perdono e quindi anche la remissione della pena». 357 Cf. can. 1357 CIC/83, can. 729 CCEO; D. SALACHAS, Teologia e disciplina dei sacramenti, 261-262. 358 Cf. L. LORUSSO, Gli orientali cattolici, 199-200.


CAP. III: DE TRENTO À ACTUAL LEGISLAÇÃO

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vium, e associou a função do sacerdote confessor à função judicial, na dupla dimensão de sentença e de concessão da graça divina. A noção de jurisdição foi igualmente defendida e clarificada, permitindo, deste modo, a reserva à autoridade dos pecados mais horríveis e graves. Neste contexto, é reforçado o ofício do cónego penitenciário, que passa a ser integrado no cabido catedralício ou de uma colegiada. A sua instituição torna-se obrigatória e dignifica-se com o título de benefício, associado à primeira prebenda vacante. Definem-se as qualidades para a sua escolha, como os títulos de mestre, licenciado ou doutor em Teologia ou Direito Canónico e a idade de quarenta anos. A sua função de confessor dá-lhe o privilégio, no seio de cabido, de se ausentar das funções do mesmo, sendo considerado como presente. Os Romanos Pontífices, sobretudo Bento XIII e Gregório XVI, fizeram com que estas normas fossem respeitadas e aplicadas. As Congregações da Cúria Romana do Concílio, dos Bispos e Religiosos e dos Ritos assumiram paulatinamente este encargo ao mandarem aplicar estas mesmas normas, explicitá-las e resolverem questões controversas. Determinaram a obrigação da instituição do ofício de penitenciário, assim como as modalidades e sujeitos instituintes. Permitiram excepções no que respeita às qualidades requeridas para a nomeação deste ofício, nomeadamente os títulos académicos e a idade de quarenta anos. Determinaram as funções do mesmo, a presença no confessionário, dispensando-o da presença no coro do cabido, de acordo com as normas particulares e o bem dos fiéis. Proibiram a compatibilidade deste com outros ofícios de cura de almas, de administração e com o de vigário geral, com o fim de se evitar a confusão de foros e o uso indevido no foro externo. Começaram a proibir a subdelegação, para impedirem o exercício por outros sem as qualidades requeridas. Associaram ao ofício as prebendas necessárias, proibindo abusos. A Instrução do Santo Ofício de 13 de Julho de 1916, emanada na etapa final da elaboração do Código Pio-Beneditino, apresenta-se como o documento mais organizado antes da codificação acerca desta matéria. Determina com clareza a redução dos pecados reservados, tendo como finalidade a salvação das almas, a sua verdadeira necessidade e utilidade. O penitenciário é considerado confessor habitual destes casos, mas o seu ofício não é exclusivo, pois a sua faculdade pode ser exercida por outros confessores em circunstâncias especiais. Determina detalhadamente os casos de cessação da reserva. Por fim, apela à formação dos confessores.


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Nas actas do Concílio Vaticano I, encontramos referências e propostas referentes aos clérigos em geral, e ao ofício de cónego penitenciário em particular. Retomam-se as normas da tradição legislativa, e o esforço de consulta e propostas prepara a futura codificação. Surge, pela primeira vez, a proposta de que, em caso de falta do penitenciário, o seu ofício seja entregue a outro cónego confessor ad instar poenitentiarii. O íter de codificação do Código de 1917 permitiu recapitular a legislação precedente e organizar a matéria acerca do ofício de cónego penitenciário. Durante uma década de um grandioso trabalho, esta matéria sofreu várias alterações realizadas pelos consultores e comissões de estudo, atendendo às propostas provenientes de grande parte da Igreja universal. A minuciosidade dos esquemas iniciais deu lugar a uma maturada elaboração. O poder do ofício do penitenciário foi considerado ordinário ipso iure, com a faculdade habitual de absolver não só os pecados reservados como as censuras. A sua instituição passou a ser facultativa, ubi id commode fieri poterit. Reduziu-se a idade mínima para trinta anos, ficando sujeito a um exame por parte do bispo. Definiramse os fiéis da sua jurisdição: diocesanos, mesmo fora da Diocese, e não diocesanos, presentes na Diocese. Determina-se, pela primeira vez, a possibilidade de subdelegação para casos mais urgentes. Em caso de incumprimento do ofício, passou a ser possível interdi-lo, com possibilidade de recurso in devolutivo à Sé Apostólica. Esta legislação teve ainda o mérito de precisar os termos e desfazer equívocos, permitindo determinar os parâmetros disciplinares deste ofício, claramente reforçado no seio da Igreja Diocesana. Em 1920 e 1923, a Congregação do Concílio decidiu que o cónego penitenciário está isento do ofício de diácono e subdiácono nas celebrações litúrgicas, mas não nos pontificais solenemente presididos pelo bispo. Os comentadores e professores da legislação de 1917 esclarecem a não obrigatoriedade do cónego penitenciário da Igreja Catedral, dada a presença de outros confessores. O seu poder é considerado como participação do poder ordinário do bispo no foro sacramental, mas não delegável, e aplica-se aos casos ipso iure universal ou particular de pecados e censuras reservadas. Notam que esta reserva corresponde ao ministro e não ao sujeito da penitência. Precisam as qualidades necessárias para a sua instituição. Explicam alguns casos particulares em territórios como Itália e Espanha. Aconselha-se a idade mínima de 40 anos e dispensa-se da necessidade de doutoramento. Esclarece-se que a impossibilidade de subdelegação do seu poder é uma excepção à norma


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geral do can. 199 §1. Explicam-se os conceitos de pecados reservados e reserva de censuras. A obrigação de permanecer no confessionário é considerada mais importante que o próprio ofício divino, para o bem dos fiéis. Admite-se a realização da confissão mesmo em casa de penitentes doentes. Justifica-se a incompatibilidade deste ofício com outros com jurisdição no foro externo. Finalmente, os autores explicam que o processo de limitação ou retirada do seu ofício só pode ser realizado por meio de um processo judicial ou extrajudicial. Os pressupostos eclesiológicos do Concílio Vaticano II e os princípios de revisão propostos pelo Sínodo dos Bispos de 1967 viabilizaram a renovação do Código. Esclareceu-se a relação e as noções de foro interno e externo e alterou-se significativamente o direito penal. No Código de 1983, o penitenciário é inserido no livro II, De Populo Dei, e no livro IV, De Ecclesiae Munere Sanctificandi. Opta-se pelo uso do termo faculdade, aplicado ao sacramento da penitência, concedido ipso iure ou pela autoridade. O poder de governo apenas se verifica na remissão das censuras latae sententiae. Desaparece o instituto de pecados reservados. Por isso, o objecto da remissão realizada pelo penitenciário são as censuras latae sententiae, não declaradas e não reservadas à Sé Apostólica. Após a nova sistematização dos ministros da penitência, a faculdade do penitenciário passou a ser vi officii, nos can. 508 e 968 §1, e não somente ipso iure, uma noção mais abrangente. Neste último cânon, refere-se dicione, tendo em conta que o penitenciário não tem território. A importância do ofício do penitenciário é de tal ordem que, onde falta o cabido, o seu munus deve ser exercido por outro sacerdote. Esta determinação leva-nos a concluir que é mais correcto usar a expressão penitenciário, em vez de cónego penitenciário. Na verdade, este é o único dos cónegos que mantém funções de governo, quando o cabido não é colégio de consultores. Por fim, determina-se que o seu ofício é incompatível com o de vigário geral ou vigário episcopal, sendo este último uma inovação conciliar. Os autores esclarecem que a remissão das penas no foro interno sacramental somente se aplica às penas medicinais, porque são essas que privam dos sacramentos. Clarificam as qualidades necessárias para a sua designação, na linha da tradição canónica, e o âmbito das suas funções, sujeitos, e condições do exercício, e comparam o seu ofício com outros casos previstos pelo Direito. A intervenção do penitenciário está prevista pelo Direito universal para os casos dos can. 1364 §1 e 1398. A sua intervenção não se aplica às censuras declaradas, ou reservadas à Sé Apostólica, e não é necessária nos casos previstos pelos cân. 976 §1, 1357 §1 e 144.


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A disciplina das Igrejas Orientais não prevê o ofício do cónego penitenciário, não integra o instituto de penas latae sententiae, mas conserva o da reserva dos pecados. Isso justifica-se porque a mentalidade oriental somente prevê a absolvição do pecado depois de cumprida a penitência, e não se encontra o instituto de latae sententiae nas suas antigas tradições. O modo de remissão dos pecados reservados na disciplina oriental é semelhante ao da remissão das censuras latae sententiae da codificação latina. Estas diferenças não significam contradição, mas complementariedade entre as duas tradições, visto que as finalidades que se pretendem são as mesmas. O ofício de cónego penitenciário não existe na codificação oriental, mas a delegação como tal para a remissão dos pecados reservados está prevista.


CONCLUSÃO

O estudo do ofício do cónego penitenciário conduziu-nos, por meio da doutrina e da legislação, ao conhecimento da relação existencial e concreta entre o pecado e o delito, entre o direito sacramental e o penal, variáveis constantes da história bimilenar da Igreja. Como todos os homens, o fiel cristão é pecador, mas o seu pecado repercute-se na comunidade cristã, que, por meio da autoridade, intervém constantemente para corrigir o penitente e proteger o bem comum. Por um lado, a razão de ser deste ofício deve-se ao facto da gravidade do pecado ou crime em questão. O seu desaparecimento seria uma perda deste sentido, visto que o recurso ao penitenciário é uma tomada de consciência pedagógica da gravidade do acto cometido. Por outro lado, por meio deste ofício, a Igreja estende o seu braço materno ao corrigir o penitente e impedir que tais actos se tornem públicos, protegendo, deste modo, a boa fama do fiel, o bem comum, e prevenindo o escândalo que perturba gravemente os mais frágeis na fé. Como escreveu Santo Agostinho, a certeza da reconciliação é um acto da graça divina, e somente nessa se compreende o poder concedido à Igreja ao longo dos séculos: «In hac ecclesia reviviscet anima, quae mortua fuerat peccatis, ut convivificetur Christo, cuius gratia sumus salvi facti». O poder de remissão dos pecados e o poder de ligar e desligar confiado por Cristo aos Apóstolos constituem o fundamento da doutrina acerca do sacramento da penitência e da respectiva disciplina. Desde o início, a Igreja Apostólica colocou em prática a excomunhão e reintegração na comunidade cristã, não suportando passivamente o pecado que afecta a vida dos irmãos na fé. Surge, deste modo, a correcção fraterna, associada à remissão dos pecados pelo baptismo e à excomunhão e reconciliação. Deste modo, o poder de absolver os pecados torna-se uma prática admitida pela comunidade cristã. No século III, a questão dos lapsi


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acentua esta tomada de consciência e a certeza da absolvição sacramental. Cipriano repete continuamente nas suas cartas que somente o bispo tem o poder de readmitir os apóstatas à comunhão eclesial, convidando os martyres e confessores à prudência no atribuir cartas de paz a apresentar ao bispo ou, na sua ausência, ao corpo presbiteral. Segundo os nossos conhecimentos actuais, seria excessivo estabelecer a origem dos penitenciários menores medievais nos mártires e confessores que entregavam aos lapsi os libelli pacis, mas esta prática proporciona e favorece o seu aparecimento posterior. O bispo é o protagonista da reconciliação. A penitência solene fixase no século IV: confissão dos pecados ao bispo, assistido pelo clero e com a presença da comunidade cristã, imposição das mãos para a realização da penitência com obras penitenciais, ingresso na ordem dos penitentes, cumprimento da penitência, imposição das mãos para a reconciliação e participação na Eucaristia. O presbítero é apenas um colaborador deste processo, mas substitui o bispo em caso de necessidade. Os gestos de exclusão e reconciliação possuem um sentido eclesiológico forte, expresso na celebração comunitária. Toda a comunidade participa, por meio da penitência, da oração e das lágrimas, na separação do pecador, na sua correptio e na reconciliação. A Eucaristia constitui o centro à volta do qual se qualifica a comunhão e a separação da comunidade. Este processo incentiva claramente a santidade dos membros da Igreja, sob a acção do Espírito Santo. É competência do bispo fixar a medida da penitência, segundo a gravidade das faltas e o zelo e disposições do penitente. Excluído da Igreja, o culpável não pode aceder à Eucaristia. Assiste-se a um rigor crescente, em que a sanção mais grave – a excomunhão – comporta a menos severa – a proibição da comunhão eucarística -, como se lê nas legislações conciliares e decretos pontifícios. De modo a evitar que a Eucaristia seja desonrada, a Igreja excomunga os mais indignos entre os pecadores. Os bispos recomendavam a abstenção temporária da comunhão eucarística para os outros. Na Igreja Oriental, a delegação episcopal penitencial parece ter sido realizada por meio de um padre penitenciário, a primeira vez em que se refere este ofício. Os historiadores contemporâneos Sócrates e Sozómeno descrevem que o ofício do penitenciário foi estabelecido em Constantinopla desde a origem. A instituição durou até ao tempo de Nectário de Constantinopla, que a suprimiu devido a um escândalo do padre penitenciário local. Contudo, convém ter uma certa reserva acer-


CONCLUSÃO

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ca da origem e multiplicação deste ofício, assim como a supressão do mesmo por parte de Nectário. Sozómeno precisa que nas Igrejas do Ocidente, especialmente em Roma, o penitenciário é uma instituição conservada religiosamente. No entanto, a existência de padres penitenciários na Igreja Romana do século V não é uma questão consensual, visto que os presbíteros eram colaboradores da penitência, mas não seus ministros. Por outro lado, em nenhum texto desta época se pode provar a sua existência. No século V, com o fim das perseguições, relaxa-se a disciplina da vivência cristã. A antiga penitência canónica passa a ser considerada demasiadamente severa e, por isso, é relegada para o fim da vida. Surge então, a partir do século VI, por obra dos monges irlandeses, a penitência tarifada, que se impõe plenamente no século VII, dada a falência da antiga disciplina. Os livros penitenciais aparecem e a partir do século VIII proliferam, mas a sua disciplina é realizada com critérios subjectivos, confusos e desordenados. As comutações provocam abusos graves. Por isso, durante o século IX, publicam-se penitenciais realizados pela autoridade. Contudo, os dois tipos de penitência coexistem. Para os pecados graves públicos, recorre-se à penitência pública, e, para os pecados graves secretos, à penitência privada. O ministro da primeira é por excelência o bispo, mas não de modo exclusivo, enquanto que o ministro da segunda é o presbítero. Excepcionalmente, nos penitenciais, reservam-se ao bispo certos casos. A reforma carolíngia tentou restaurar a penitência pública solene, em que o bispo é o único ministro. No entanto, aumentaram os casos de jurisdição concedida aos presbíteros. Nesta época, surgem igualmente as peregrinações penitenciais. Esta prática proporciona o recurso ao Papa por parte do peregrino penitente, enviado pelo próprio bispo ou respeitando a sua jurisdição, para obter a absolvição de pecados e crimes mais graves. Favorece-se deste modo o aparecimento dos Penitenciários Maiores e da Penitenciaria, visto que se torna impossível ao Papa atender todos os casos. A partir do século XI, a confissão e a reconciliação unem-se, adquirindo a forma que conhecemos hoje: confissão, satisfação e absolvição, repetida quantas vezes for necessária e obrigatória para todos. A penitência pública dá lugar à penitência privada. Dá-se início ao aprofundamento teológico da penitência. Surgiram duas questões fundamentais: a relação interna entre os diversos factores da penitência e a sua inserção na nova concepção de sacramento que então se elaborava. Após um período de incertezas acerca da eficácia sacramental e do ministério eclesial, especialmente por parte de Abelardo e Pedro Lombar-


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do, S. Tomás de Aquino clarificou a doutrina da efectividade da remissão ontológica dos pecados no sacramento. O sacerdote é o único ministro da confissão, mas, além da Ordem, deve ter o poder de jurisdição sobre o penitente, a fim de lhe impor os actos necessários para a matéria do sacramento. Possui, deste modo, um poder em potência, que somente se torna acto quando ao sacerdote lhe é confiada a matéria, o povo de Deus. Portanto, em virtude do poder de Ordem, o sacerdote pode confessar todos os pecados, mas para o exercício desse poder exige-se o poder de jurisdição. Por isso, um superior pode reservar a si alguns casos. São Tomás distingue já entre a jurisdição imediata, que têm o Papa, os bispos e o proprius sacerdos, e a jurisdição conferida. Ao referir-se à jurisdição da cura de almas, afirma que existem dois modos de conferi-la: ou por substituição do superior ou como coadjutor. Distingue nestes casos uma hierarquia de obediência. Deste modo, o penitenciário do Papa é mais importante no âmbito da confissão que um bispo, e o penitenciário do bispo é mais importante que um pároco. A glosa do século XII «Ecclesia de occultis non iudicat», presente em Graciano, contribui para o nascimento do princípio do foro interno. O carácter medicinal da penitência justifica-se pelo ocultamento de certos erros, evitando o escândalo. Este novo espaço permite a exigência de um tribunal da consciência autónomo, com jurisdição delimitada, que escruta e respeita a autonomia do indivíduo e que tem como objectivo a salvação das almas. Defende igualmente que a união com a Igreja é indispensável para que um sacerdote possa abolver os pecados. Por isso, um prelado herético não pode excomungar um fiel, porque não possui o poder de ligar ou desligar. Duns Escoto afirma que o arrependimento age por si mesmo e o sacramento apenas aumenta a graça e consiste somente na absolvição. O arrependimento, a confissão e a satisfação são disposições necessárias ao sacramento , mas não parte deste. Esta concepção favorece uma dimensão individualista do pecado e da justificação. A acentuação da dimensão jurídica fez diminuir a consciência de que a reconciliação com a Igreja é um efeito do sacramento da penitência. As escolas tomista e escotista degeneraram as doutrinas dos seus mestres, proporcionando um terreno fértil aos reformadores, por meio de doutrinas complexas e contraditórias. Contudo, a doutrina da escolástica medieval conseguiu estabelecer três dualismos que serão fundamentais no que diz respeito ao ministro do sacramento da penitência: privado e público, ontológico e disciplinar, sacramental e jurisdicional. Ao aprofundar a questão do poder das chaves, os teólogos medievais


CONCLUSÃO

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conseguiram distinguir duas dimensões: a penitência e a excomunhão, práticas nitidamente distintas, mas inter-relacionadas. Um segundo avanço fundamental situa-se na distinção entre o poder de Ordem e de jurisdição. Uma terceira dimensão elaborada foi a da distinção entre o foro penitencial e o foro judicial. Se, para a Igreja primitiva, um pecador era um excomungado, para a Igreja da penitência privada, esse princípio era insustentável. Só a penitência está ligada ao poder de Ordem, no sentido forte dos seus efeitos sacramentais e ontológicos. A excomunhão diz respeito aos efeitos exteriores e disciplinares, de ordem judicial. Somente a partir destas distinções é possível perceber a função do penitenciário. Note-se que o direito canónico assume plena autonomia em relação à Teologia, embora disciplina e doutrina se influenciem mutuamente. Por exemplo, devido a estas distinções, se regista, em 1130, a primeira reserva papal, no cânon 10 do Concílio de Clermont. A partir do século XII, restringiu-se a faculdade de confessar. O penitente teria de recorrer somente ao próprio sacerdote, normalmente o pároco, de acordo com a ordem dos cânones do Concílio de Latrão IV. Contudo, esta norma foi colocada em causa a partir do momento em que as Ordens Mendicantes afectam esta jurisdição. Após um longo debate e controvérsias, os religiosos passam a poder confessar em qualquer parte, mas estão sujeitos à jurisdição episcopal e limitados pelos casos reservados à absolvição episcopal e do seu penitenciário. Acabou por se chegar a uma solução de compromisso. Os fiéis podiam confessar-se aos religiosos desde que se confessassem uma vez por ano ao próprio sacerdote. Nos decanados do clero secular, surgem sacerdotes nomeados para a sua confissão. Contudo, a faculdade de se dirigirem ao próprio bispo ou ao seu penitenciário permanece intacta. Nesta época, a sua função é um dado de facto, constantemente referida nas várias legislações. Os conflitos de jurisdição com as Ordens Mendicantes e o recurso dos sacerdotes seculares ao penitenciário demonstram como este se impõe, como uma longa manus do poder episcopal no que diz respeito à disciplina penitencial. Para os casos reservados ao bispo ou censuras, era necessário seguir uma certa modalidade. Era o confessor que fazia dirigir o penitente ao bispo, suspendendo a confissão. Podia acompanhar o penitente ou redigir uma carta que este levava ao bispo. A intervenção de alguns sínodos acabou por restringir a descrição dos pecados nessa carta para respeitar o sigilo sacramental. Em perigo de morte,


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qualquer sacerdote podia absolver qualquer penitente de qualquer pecado ou censura. Por exemplo, nas Constituições de Ricardo o pobre, Bispo de Chicester (1215-1217), o confessor deve saber que alguns pecados são reservados à autoridade superior e que, por isso, não tem a faculdade de os absolver. Os pecados de homicídio, contra natureza, incesto, violação das virgens e monjas, violência física contra os pais, violação dos votos e outros semelhantes são reservados ao bispo ou ao seu penitenciário. A violência física contra os clérigos ou religiosos e o incêndio das igrejas são reservados ao Romano Pontífice ou ao seu delegado, cujo pedido é realizado pelo bispo. Na iminência da morte, não deve ser negada a absolvição, pelo menos condicional. Num outro caso, o Concílio de Arles, celebrado em 1273, enumera os habituais casos reservados ao bispo ou ao Papa. Entre os colaboradores do bispo, contam-se os penitenciários. Proíbe-se a confissão a outros destes casos, excepto no caso de velhice, doença ou impossibilidade de deslocação. A função principal do penitenciário é a de verdadeiro juiz da penitência no que diz respeito aos casos mais graves, reservados quer ao bispo diocesano, quer ao Papa. Contudo, tem uma função cada vez mais presente e universal. A sua integração num cabido ou decanado é secundária e não universal, e isso confirma que a função do penitenciário é anterior à da sua presença nesses institutos. A legislação tridentina constituiu-se como determinante na organização e clarificação da doutrina e disciplina do tema que nos ocupa, sobretudo no estabelecer a sua universalidade. O poder da remissão dos pecados por parte dos sacerdotes foi reafirmado. Para a validade da absolvição, requer-se a ordenação e a jurisdição conferida pela autoridade. A função do sacerdote é análoga ao poder judicial, no sentido em que determina uma sentença e concede a graça sacramental. Este é o contexto que permite a noção da reserva à autoridade dos pecados mais graves e horríveis. O penitenciário é integrado no instituto do cabido dos cónegos da catedral e da colegiada, enquanto ministro da remissão destes pecados. A sua instituição, associada à primeira prebenda vacante, passa a ser necessária. Determinam-se os títulos académicos de mestre, licenciado ou doutor para a escolha dos candidatos, a idade mínima de quarenta anos, assim como as suas funções de confessor, dispensando-o da sua presença nos actos do cabido enquanto exerce o ministério. A legislação que se seguiu continuou a aplicar destas normas, especificando-as para casos concretos e resolvendo controvérsias particulares. Destaca-se, neste sentido, as intervenções dos Romanos Pontífices,


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assim como dos dicastérios da Cúria Romana. Mantém-se, contudo, um denominador comum: o respeito pelas normas do Concílio de Trento. Concretiza-se melhor as circunstâncias da instituição do cónego penitenciário. O bispo diocesano continua a ser o sujeito instituinte, mas em alguns casos pode ter a participação do cabido na escolha do penitenciário. Em muitos casos, dispensaram-se os títulos académicos, assim como a idade mínima. Concretizaram-se melhor os tempos da confissão, respeitando a autoridade episcopal e tendo em conta, sobretudo, a utilidade e o bem dos fiéis. Proibiram-se abusos económicos, especialmente no que se refere à acumulação de prebendas. Com o intuito de evitar a confusão entre o foro interno e externo, impediu-se a nomeação de penitenciários que fossem administradores económicos ou vigários gerais. Determinou-se igualmente a proibição da subdelegação deste ofício, de modo a controlar a qualidade dos penitenciários. Concomitante aos trabalhos da elaboração da codificação, a Instrução do Santo Ofício, de 1916, determinou a redução do número de pecados reservados, de acordo com a sua verdadeira necessidade e utilidade para a salvação das almas. O penitenciário é reafirmado como confessor habitual destes casos ao nível diocesano, mas não exclusivo, e considerando o elenco dos casos de cessação de reserva. As actas do Concílio Vaticano I propõem, pela primeira vez, que, no caso de falta do penitenciário, o seu ofício seja entregue a outro cónego ad instar poenitentiarii. O ingente trabalho de elaboração do Código de 1917 permitiu recapitular a tradição legislativa e reorganizar esta matéria, precisando minuciosamente os termos jurídicos. O ofício do penitenciário, claramente reforçado no seio da Igreja Diocesana e no cabido dos cónegos, passou a ser considerado ordinário ipso iure, com a faculdade habitual de absolver não somente os pecados reservados, mas também as censuras. A sua instituição tornou-se facultativa, ubi id commode fieri poterit. Reduziu-se a idade mínima para trinta anos. A sua jurisdição inclui todos os diocesanos, mesmo ausentes da Diocese, e os não-diocesanos presentes na mesma. A subdelegação do ofício passou a ser permitida para casos mais urgentes. Prevê-se igualmente a suspensão do mesmo, com possibilidade de recurso in devolutivo à Sé Apostólica. Os estudos e a legislação subsequentes justificaram a não obrigatoriedade deste ofício, devido à existência de outros confessores com as mesmas faculdades, enquanto participação do poder ordinário do bispo no foro sacramental. Aconselha-se, novamente, o aumento da idade mínima para quarenta anos. Esclarecem-se os conceitos de delegação,


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de pecados reservados e censuras, foro interno e externo e identifica-se o primeiro com o sacramento da penitência. Atribui-se, no entanto, enorme importância à absolvição de pecados reservados e remissão de censuras no foro sacramental, de tal modo que esta função é prioritária relativamente ao ofício divino, e tendo em conta que o penitenciário pode dirigir-se à casa dos penitentes doentes. O Concílio Vaticano II e os princípios de revisão propostos pelo Sínodo de 1967 alteraram a estrutura, fundamentação eclesiológica e a terminologia jurídica do novo Código, como as noções e relação entre o foro interno e externo, o termo faculdade, o direito sacramental e penal. O ofício do cónego penitenciário é referido no livro II, De Populo Dei, e no livro IV, De Ecclesiae Munere Sanctificandi, do Código de 1983, nos cânones 478 §1, 508 e 968 §1. O poder do ministro do sacramento da penitência advém do sacramento da Ordem e da faculdade, que indica que o ministro não tem propriamente o poder de governo, mas especificamente sacramental, evitando-se, deste modo, as limitações da distinção entre poder de ordem e de jurisdição. Somente se verifica esse poder de governo em casos particulares, como no caso da remissão das censuras latae sententiae. Por isso, o exercício do poder de governo é concedido vi officii ao penitenciário. A sua função já não inclui a absolvição dos pecados reservados, instituto entretanto suprimido durante os trabalhos de revisão do Código. A sua instituição é facultativa, dependendo da existência do cabido dos cónegos, mas, na sua falta, esta função deve ser exercida por outro sacerdote constituído pelo bispo diocesano (can. 508 §2). Deste modo, assegura-se o seu ministério. Portanto, pode-se considerar o cónego penitenciário como o único dos cónegos cuja função é necessária numa Diocese. A sua nomeação é incompatível com os ofícios de vigário geral e vigário episcopal. A remissão das penas operada pelo cónego penitenciário apenas se aplicam na presente legislação às censuras previstas no cânon 1364 §1, de difícil aplicação, e no cânon 1398. Por outro lado, o seu múnus não é exclusivo, tendo em conta os casos configurados nos cânones 144, 566 §2; 976 §1, 1355 §2, 1357 §1. Deste modo, a intervenção do cónego penitenciário é claramente reduzida, na actual legislação. O Código das Igrejas Orientais, de 1990, não prevê este ofício. Na verdade, a sua disciplina mantém o instituto de pecados reservados, e não integrou o das censuras latae sententiae. Para os orientais, toda a pena é ferendae sententiae, tendo em conta as suas veneráveis tradições. Por outro lado, o confessor somente deve absolver depois de cumprida a penitência. Contudo, o modo de remissão dos pecados re-


CONCLUSÃO

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servados é semelhante ao da remissão das censuras latae sententiae da Igreja Latina, porque se aplica aos mesmos casos e recorre-se à autoridade do bispo, que delega a absolvição ao ministro da penitência. A continuidade e valorização deste ofício in facto dependerá da própria noção que os fiéis tiverem do pecado e da pena, e da remissão de um e de outra na Igreja. Compreender o seu alcance significa valorizar o próprio sacramento da penitência e a remissão no foro sacramental, talvez aquilo que de mais original se apresenta no direito penal da Igreja, completamente alheio ao direito penal civil. Por isso, a dimensão de graça só é possível numa comunidade que é muito mais que o seu aspecto visível.



SIGLAS E ABREVIATURAS

§ AAS ASS ASV Act. BF

Parágrafo Acta Apostolicae Sedis Acta Sanctae Sedis Archivio Secreto Vaticano, Città del Vaticano Actos dos Apóstolos SBARAGLIA, G.G., ed., Bullarium Franciscanum Romanorum Pontificum, Roma 1759-1768 BP RIPOLL, T. – BREMOND, A., ed., Bullarium Ordinis FF. Praedicatorum, Roma 1729-1740 BR Bullarium diplomatum et privilegiorum sanctorum romanorum pontificum: collectione novissima plurium brevium, epistolarum, decretorum actorumque S. Sedis a S. Leone Magno usque ad praesens, Turim 1857-1872 Bullarium Cherubini CHERUBINI, L., ed., Magnum Bullarium Romanum, a Clemente VIII usque ad Gregorium XV, Lugduni 16922 ca. Circa Cf. conferir can.; cann. Cânon; cânones Capítulo cap. CCEO Codex Canonum Ecclesiarum Orientalium 1990 CDF Congregatio pro Doctrina Fidei CIC/17 Codex Iuris Canonici 1917 CIC/83 Codex Iuris Canonici 1983 COD Conciliorum Oecumenicorum Decreta, ed. G. Alberigo – G. Dossetti – P. Joannou, Bologna 20022 Conc. Concílio Const. Constituição Apostólica CCL Corpus Christianorum. Series latina, Turnhout – Paris 1954


280 CD Col Comm. Cor CT Decr. dist. DS Dt ed. Ef Ep. Ez Gasparri Gal Hardouin

Hefele-Leclercq In IV Sent. IS Jd Jo Jr Js Jz LG Lc Libri Sent. Litt. circ.

O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

Christus Dominus, Decreto do Concílio Vaticano II (1965) Epístola aos Colossenses Communicationes Epístola aos Coríntios Concilium Tridentinum, Diarorum, Actorum, Epistolarum, Nova Collectio, ed. Societas Goerresiana, Friburgi Brisgoviae 1930-2001 Decretum distinction DENZINGER, H. – HÜNERMANN, P., ed., Enchiridion symbolorum definitionum et declarationum de rebus fidei et morum, Bologna 20034 Livro do Deutoronómio Obra sob a direcção de Epístola aos Efésios Epistula Livro do Profeta Ezequiel GASPARRI, P. – SERÉDI, I., ed., Codicis Iuris Canonici Fontes, 1923-1939 Epístola aos Gálatas HARDOUIN, J., Conciliorum collectio regia maxima ad p. Phlilippi Labbei et p. Gabrielis Cossarti e Societate Jesu labores haud modica accessione facta et emendationibus pluribus additis, Paris 1714-1715 HEFELE, C.J. – LECLERCQ, H., ed., Histoire des conciles d’après les documents originaux, Paris 1907-19522 Commentum in Quatuor Libros Sententiarum magistri Petri Lombardi de São Tomás de Aquino Livro do Profeta Isaías Epístola de Judas Evangelho segundo São João ou Epístola de São João Livro do Profeta Jeremias Livro de Josué Livro dos Juízes Lumen gentium, Constituição dogmática do Concílio Vaticano II sobre a Igreja (1964) Evangelho segundo São Lucas Sententiarum libri Litterae circulares


SIGLAS E ABREVIATURAS

Lv Mansi Mc MD MGH Mt n. Nm nn. nt. OR Os Palazzini PCCCAI PCCICR PCCICOR PCLTI PG PL RDC Resp. Rm Rs SC S.C.C. S.R.C. Scat. SCh S.C.EP. ET REG. S.C.S. OFF.

281

Livro do Levítico MANSI, J.D., ed., Sacrorum Conciliorum nova et amplíssima collectio, 1-53, Florentiae – Venetiis –Arnhem – Leipzig 1907-1927 Evangelho segundo São Marcos La Maison-Dieu Monumenta Germaniae Historica Evangelho segundo São Mateus número Livro dos Números números nota L’Osservatore Romano Livro de Oseias PALAZZINI, P., ed., Dizionario dei Concili, I-V, Roma 1963-1966 Pontificia Commissio ad Codicis Canones Authentice Interpretandos Pontificia Commissio Codici Iuris Canonici Recognoscendo Pontificia Commissio Codici Iuris Canonici Orientalis Recognoscendo Pontificium Consilium de Legum Textibus Interpretandis J.P. MIGNE, ed., Patrologiae cursus completus. Series Graeca et Orientalis, 1-161, Parisiis 1857-1866 J.-P. MIGNE, ed., Patrologiae cursus completus. Series Latina, 1-222, Parisiis 1844-1855 Revue de Droit Canonique Responsiones ad proposita dubia Epístola aos Romanos Livro dos Reis Sacrossanctum Concilium, Constituição do Concílio Vaticano II sobre a sagrada liturgia (1963) Sacra Congregatio Concilii Sacrum Rituum Congregatio Scatola Sources Chrétiennes, Paris Sacra Congregatio Episcoporum et Regularium Sacra Congregatio Sancti Officii


282 Sent. Sm Sl S.R.C. STh Suppl. Tg Tit. Tm Ts Tt vol.

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Sententiarum Livro de Samuel Salmo Sacra Rituum Congregatio Summa Theologica de São Tomás de Aquino Supplementum à Summa Theologica de São Tomás de Aquino Epístola de Tiago Titulus Epístola a Timóteo Epístola aos Tessalonicenses Epístola a Tito volume


BIBLIOGRAFIA

1. Fontes e Documentos 1.1 Conciliares e Sinodais (por ordem cronológica) CONC. DE ROMA (251), in Mansi 1, 865-866. CONC. DE CARTAGO (251), in PL 3, 875-876. CONC. DE CARTAGO (252), in PL 3, 877-888. CONC. DE ELVIRA (305), in Mansi 2, 5-19. CONC. DE ARLES (314), in Mansi 2, 463-512. SÍNODO DE ANCYRA (314), in P.-P. JOANNOU, ed., Fonti, I, 2, 54-73. CONC. DE NICEIA (325), in Mansi, 2, 685-692. CONC. DE CARTAGO (348), in Mansi 3, 143-150. CONC. DE VALENCE (374), in Mansi 3, 491-494. CONC. DE SARAGOÇA (380), in Mansi 3, 633-636. CONC. DE CARTAGO (390), in Mansi 3, 691-697. CONC. DE HIPONA (393), in Mansi 3, 894-896. CONC. DE CARTAGO (397), in Mansi 3, 875-894. CONC. DE TURIM (398), in Mansi 3, 859-862. CONC. DE TOLEDO (400), in Mansi 3, 997-1002. CONC. DE RIEZ (439), in Mansi 5, 1089-1095. CONC. DE ORANGE (441), in Mansi 6, 433-452. CONC. DE VAISON (442), in Mansi 6, 451-460. CONC. DE ARLES (450 ca.), in Mansi 7, 875-885. CONC. DE ANGERS (453), in Mansi 7, 899-902. SÍNODO DE S. PATRÍCIO (457 ca.), in Mansi 6, 513-520. CONC. DE TOURS (461), in Mansi 7, 943-947. CONC. DE VANNES (465), in Mansi 7, 951-955.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

CONC. DE AGDE (506), in Mansi 8, 319-338. CONC. DE ORLÉANS (511), in Mansi 8, 350-356. CONC. DE ÉPAONE (517), in Mansi 8, 555-564. CONC. DE ORLÉANS (538), in Mansi 9, 9-19. CONC. DE BARCELONA (540 ca.), in Mansi 9, 109-110. CONC. DE TOLEDO (589), in Mansi 9, 992-999. CONC. DE SEVILHA (619), in PL 84, 363-386. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (647-653), in Mansi 10, 1189-1193. CONC. DE ROUEN (650 ca.), in Mansi 10, 1199-1203. SÍNODO DA IRLANDA (682/684), in Mansi 11, 1059-1060. CONC. DE CLOVESHOE (747), in Mansi 12, 395-408. SÍNODO DE REISBACH (799), in Mansi 13, 1025-1028. CONC. DE ARLES (813), in Mansi 14, 55-64. CONC. DE REIMS (813), in Mansi 14, 75-82. CONC. DE TOURS (813), in Mansi 14, 81-92. CONC. DE CHALON-SUR-SAÔNE (813), in Mansi 14, 91-108. CONC. DE PARIS (829), in Mansi 14, 529-574. SÍNODO DE SELINGENSTADT (1022), in PL 140, 1061. CONC. DE LIMOGES II (1031), sessio II, in Mansi 19, 546-547. CONC. DE PIACENZA (1095), in Mansi 20, 801-810. CONC. DE CLERMONT (1095), in Mansi 20, 815-827. CONC. DE LONDRES (1102), in Mansi 20, 1149-1156. CONC. DE CLERMONT (1130), in Mansi 21, 438-439. CONC. DE LATRÃO (1139), in Mansi 21, 523-540. SÍNODO DE SENS (1140), cap. 12, in DS 732. CONC. DE YORK (1195), in Mansi 22, 653-655. CONC. DE LONDRES (1200), in Mansi 22, 714-715. CONC. ANÓNIMO (início do século XIII), in Mansi 22, 725-729. CONC. ANÓNIMO (início do século XIII), in Mansi 22, 732. CONC. DE PARIS (1212), in Mansi 22, 820-840. CONC. DE ROUEN (1214), in Mansi 22, 900-918. CONC. DE DUBLIN (1214), in Mansi 22, 926. CONC. DE LATRÃO (1215), in Mansi 22, 998-1010. CONC. DE OXFORD (1222), in Mansi 22, 1147-1180. CONC. DE ESCÓCIA (1225), in Mansi 22, 1221-1248.


BIBLIOGRAFIA

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CONC. DE TREVIRI (1227), in Mansi 23, 25-38. SÍNODO DE ROUEN (1235), in Mansi 23, 372-388. SÍNODO DE LE MANS (1235), in Mansi 23, 389-395. CONC. DE LONDRES (1237), in Mansi 23, 441-464. SÍNODO DE WORCESTER (1240), in Mansi 23, 523-548. CONC. PROVINCIAL DE FRITZLAR (1243), in Mansi 23, 725-730. SÍNODO DE VALÊNCIA (1255), in Mansi 23, 885-894. SÍNODO DE MAINZ (1261), in Mansi 23, 1079-1106. SÍNODO DE CLERMONT (1268), in Mansi 23, 1185-1214. CONC. DE ARLES (1273), in Mansi 24, 147-154. CONC. DE TREVIRI (1277), in Mansi 24, 191-206. CONC. DE AVINHÃO (1279), in Mansi 24, 231-244. CONC. DE MÜNSTER (1279), in Mansi 24, 311-322. SÍNODO DE COLÓNIA (1280), in Mansi 24, 343-362. SÍNODO DE POITIERS (1280), in Mansi 24, 381-388. CONC. DE LAMBETH (1281), in Mansi 24, 403-420. SÍNODO DE NÎMES (1284), in Mansi 24, 521-566. SÍNODO DE EXETER (1287), in Mansi 24, 783-848. SÍNODO DE LIÈGE (1287), in Mansi 24, 885-944. SÍNODO DE CAHORS, RODEZ E TULLE (1289), in Mansi 24, 963-1056. SÍNODO DE CHICESTER (1289), in Mansi 24, 1055-1064. SÍNODO DE WÜRSBURG (1298), in Mansi 24, 1187-1202. SÍNODO DE CONSTANÇA (finais do sec. XIII), in Mansi 25, 25-58. CONC. DE TARRAGONA (1329), in Mansi 25, 837-878. CONC. DE LAVAUR (1368), in Mansi 26, 473-548. CONC. DE NARBONNE (1374), in Mansi 26, 587-608. CONC. DE TARRAGONA (1391), in Hefele-Leclercq, VI/2, 1435-1436. CONC. DE FREISING (1440), in Hefele-Leclercq, VII/2, 1156. CONC. DE FERRARA-FLORENÇA, Decr. Exsultate Deo, 22 Novembro 1439, in Mansi 31/A, 1047-1060; DS 1323. CONC. DE TRENTO, Sess. 5, Dec. De reformatione, c. 1, 17 Junho 1546, in COD 667-669. _______, Sess. 14, Decr. De paenitentia et unctione extrema, 25 Novembro 1551, in DS 1667-1719. _______, Sess. 21, Dec. De reformatione, c. 3, 16 Julho 1562, in COD 729.


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CONC. DE TRENTO, Sess. 22, Dec. De reformatione, cc. 3-4, 17 Setembro 1562, in COD 738-739. _______, Sess. 23, Dec. Super reformatione, 15 Julho 1563, c. 15, in COD 749. _______, Sess. 24, Dec. De reformatione, 11 Novembro 1563, cc. 8, 12, 18 in COD 764, 766, 770-772. _______, Sess. 25, Dec. de reformatione generali, 3-4 Dezembro 1563, c. 3, in COD 785-786. _______, Canones et Decreta Concilii Tridentini ex Editione Romana A. MDCCCXXXIV repetiti. Accedunt S. Congr. Card. Conc. Trid. Interpretum Declarationes ac Resolutiones ex ipso Resolutionum Thesauro Bullario Romano et Benedicti XIV. S. P. Operibus et Constitutiones Pontificiae Recentiores ad Ius Commune Spectantes e Bullario Romano Selectae, ed. H. De Andrea, Neapoli 18592. CONC. VATICANO I, 1869-1870, in COD 801-816. _______, Episcoporum responsa super gravioribus disciplinae capitibus, Appendice, cap. I, Del clero secolare, 1865, in Mansi 49, 430-431. _______, Nonnula quaesita circa disciplinam ecclesiasticam quae episcopis per eam occasionem Romae praesentibus proponuntur, 6 Junho 1867, in Mansi 49, 242-243. _______, Postulata Episcoporum Neapol. Cap. III. § 3 XII-XVIII, 12 Dezembro 1869, in Acta et Decreta Sacrosancti Oecumenici Concilii Vaticani. Cum permultis aliis documentis ad Concilium eiusque historiam spectantibus, Friburgi Brisgoviae 1892, 803-806. _______, Schema decreti de capitulis canonicorum, 22 Fevereiro 1870, in Mansi 53, 729-731. CONC. VATICANO II, Sess. V, Const. Dogmática Lumen Gentium, 21 Novembro 1964, in COD 849-898. _______, Sess. III, Const. Sacrosanctum Concilium, 4 Dezembro 1963, in COD 820-843. _______, Sess. VII, Dec. Christus Dominus, 28 Outubro 1965, in COD 921-939. SÍNODO DOS BISPOS, Relatio quae pro Codicis Iuris Canonici recocpgnitione proponuntur a Synodo Episcoporum approvantur, 7 Outubro 1967, Communicationes 1 (1969) 77-85.

1.2 Romanos Pontífices ALEXANDRE IV, Bula Nec insolitum est, 31 Dezembro 1254, in BP, I, 267; BR, 3, 594-595.


BIBLIOGRAFIA

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ALEXANDRE IV, Bula Cum olim quidam, 18 Maio 1259, in BP, I, 369. _______, Bula Plantatus olim in agro, 18 Março 1261, in BP, I, 405. _______, Bula Quasi lignum vitae, 14 Abril 1255, in BR, 3, 602-607. BENTO XI, Inter Cunctas, 17 Fevereiro 1304, in BF, IV, 498-500. BENTO XIII, Const. Pastoralis Officii, 19 Maio 1725, in Gasparri, I, Romae 1923, 622-623, n. 289. BENTO XIV, Const. Apostolicum ministerium, 30 Maio 1753, in Gasparri, II, Romae 1924, 390-404, n. 425, §9. BENTO XIV – LEÃO XIII, Caeremoniale Episcoporum, Romae 1886. BONIFACIO VIII, Bula Super Cathedram, 18 Fevereiro 1300, in BF, IV, 498500. CELESTINO, Ep. IV ad Episcopos provinciae Viennensis et Narbonensis, in PL 50, 429-436. CLEMENTE DE ROMA, Carta aos Coríntios, 51-58, in JAUBERT, A., ed., Clément de Rome. Épitre aux Corinthiens, Paris 20002, 183-191. _______, Segunda Carta aos Coríntios, in Padres Apostólicos, Edición bilingüe completa, ed. D. Ruiz Bueno, Madrid 1993, 355-372. CLEMENTE IV, Bula Quidam temere, 20 Junho 1265, in A. CARPIN, «La confessione tra il XII e il XIII secolo», 166-169. _______, Bula A via rectitudinis, 19 Dezembro 1267, in Epistole et dictamina Clementis Papae quarti, ed. M. Thumser, [acesso: 13.12.2011], http://userpage.fu-berlin.de/~sekrethu/pdf/clemens.pdf. CLEMENTE V, Dudum a Bonifacio, 6 Maio 1312, in BF, V, 87. CLEMENTE VIII, Decr. Sanctissimus, 26 Maio 1593, in Gasparri I, Romae 1923, 338-339, n. 177, §2. CLEMENTE X, Const. Superna, 21 Junho 1670, in Gasparri I, Romae 1923, 472-475, n. 246, §5. CLEMENTE XII, Const. Admonet Nos, 11 Agosto 1735, in Gasparri I, Romae 1923, 652-654, n. 297,§§1, 2, 3. GELÁSIO, Fragmenta, 37, in PL 59, 139; _______, Fragmenta, 49, in PL 59, 140-142. GREGÓRIO IX, Bula Quoniam abundavit, 21 Abril 1227, in V. J. KOUDELA, «Notes sur le cartulaire de S. Dominique. Troisième série: Bulles de recommandation», in Archivum Fratum Praedicatorum 34 (1964) 41-42. _______, Bula Ut fidei vestrae puritas, 8 Março 1233, in BP, I, 44-45. _______, Bula Mirificantes, 5 Agosto 1233, in BP, I, 58. _______, Bula Quoniam abundavit iniquitas, 6 Abril 1237, in BF, I, 214-215.


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GREGÓRIO IX, Bula Descendentes olim, 16 Maio 1237, in BP, I, 19. GREGÓRIO XV, Const. Inscrutabili, 5 Fevereiro 1622, in Gasparri I, Romae 1923, 379-381, n. 199, §5. GREGÓRIO XVI, ep. encycl. Inter praecipuas, 5 Maio 1848, in Gasparri I, Romae 1923, 797-804 ,n. 502. HONÓRIO III, Bula Cum qui recipit prophetam, 4 Fevereiro 1221, in V.J. KOUDELKA – R.J. LÖNERTZ, «Monumenta diplomatica S. Dominici», in Monumenta Ordinis Fratum Praedicatorum historica 143 (1966) 145-146. INOCÊNCIO I, Ep. VI ad Exsuperio, in PL 20, 495-502. _______, Ep. XXV ad Decentio, in PL 20, 551-564. INOCÊNCIO III, Regestorum sive Epistolarum, VI, in PL 215, 10-54. INOCÊNCIO IV, Bula Quoniam abundavit iniquitas, 24 Março 1244, in V. J. KOUDELA, «Notes sur le cartulaire de S. Dominique. Troisième série: Bulles de recommandation», in Archivum fratum Praedicatorum 34 (1964) 41-42. _______, Bula Cum Supernae lucis, 26 Março 1247, in BP, I, 173. _______, Bula Cum hora undicesima, 23 Julho 1253, in BP, I, 237. _______, Bula Etsi animarum affectantes, 21 Novembro 1254, in Regesta Pontificum Romanorum inde ab a. post Christum natum MCXCVII ad a. MCCCIV, ed. A. Potthast, II, Berlim 1874, 1280. INOCÊNCIO XII, Const. Emanavit, 6 Setembro 1698, in Gasparri I, Romae 1923, 518-519, n. 261, §1. JOÃO PAULO II, Const. Ap. Sacrae disciplina leges, AAS 75/2 (1983) VIIXIV. _______, Const. Ap. Universi Dominici Gregis, 22 Fevereiro 1996, AAS 88 (1996) 305-343. JOÃO XXII, Vas electionis, 24 Julho 1321, in BF 5, 208-209. JÚLIO II, Const. Dudum, 28 Julho 1506, in BR 5, 422-434. _______, Const. Etsi, 4 Junho 1507, in BR 5, 444-445. LEÃO MAGNO, Ep. X ad Episcopos per Provinciam Viennensem Constitutos, in PL 54, 628-636. _______, Ep. XIX ad Dorum Beneventanum Episcopum, in PL 54, 709-714. _______, Ep. CVIII ad Theodorum Forojuliensem Episcopum, in PL 54, 1011-1014. _______, Ep. CLXVII ad Rusticum Narbonensem episcopum, in PL 54, 11971209.


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289

LEÃO MAGNO, Ep. CLXVIII ad Universos Episcopos per Campaniam, Sammium et Picenum Constitutos, in PL 54, 1209-1211. LEÃO X, Const. Dum intra (in Conc. Lateranen. V), 19 Dezembro 1516, in Gasparri I, Romae 1923, 125-126, n. 72; Mansi 32, 970-974. MARTINHO IV, Ep. Ad fructus uberes, 10 Janeiro 1280, in Mansi 24, 388-389. PAULO III, Const. Licet debitum, 18 Outubro 1549, in BR, 6, 394-401. PIO X, m.p. Arduum sane munus, 19 Março 1904, ASS 36 (1903-1904) 549551. PIO XI, Motu proprio Bibliorum Scientiam, II, 27 Abril 1924, AAS 16 (1924) 181. SIRÍCIO, Ep. I ad Himerium, in PL 13, 1131-1147. _______, Ep. VII adversus Jovanianum, in PL 13, 1168-1176. SIXTO IV, Const. Sedes Apostolica, 27 Maio 1474, in BR, 5, 213-217. _______, Const. Regimini, 31 Agosto 1474, in BR, 5, 217-223. URBANO IV, Bula Cum a nobis petitur, 12 Setembro 1263, in Bullarium Cherubini, I, 152.

1.3 Organismos da Cúria Romana CONGREGATIO PRO DOCTRINA FIDEI, Decretum, 23 Setembro 1988, in AAS 80 (1988) 1367. CONGREGATIO PRO DOCTRINA FIDEI, Decretum generale de delicto attentatae sacrae ordinationis mulieris, 19 Dezembro 2007, AAS 100 (2008) 403 DATARIA APOSTÓLICA, Decl. De conditionibus in conferendo canonicati theologali requisitis, 8 Abril 1940, AAS 32 (1940) 162. SACRA CONGREGATIO CONCILII, Seguntina, Novembro 1585, in Gasparri V, Romae 1930, 123, n. 2147. _______, Hispalen., Dezembro 1585, in Gasparri V, Romae 1930, 123-124, n. 2148. _______, Abulen., Abril 1587, in Gasparri V, Romae 1930, 138-139, n. 2173. _______, Feretrana, Setembro 1587, in Gasparri V, Romae 1930, 147, n. 2188. _______, Leodien., Dezembro 1587, in Gasparri V, Romae 1930, 143, n. 2182. _______, Ianuen., 4 Setembro 1591, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 111. _______, Nullius, 23 Junho 1594, in Gasparri V, Romae 1930, 179, n. 2271.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

SACRA CONGREGATIO CONCILII, 31 Maio 1596, in G. DE LUISE, ed., Codex Canonum Ecclesiae, Neapoli 1873, 252. _______, Sarnen., 23 Setembro 1596, in Gasparri V, Romae 1930, 188, n. 2302, ad. 3. _______, 1 Março 1598, in G. DE LUISE, ed., Codex Canonum Ecclesiae, Neapoli 1873, 252. _______, 12 Fevereiro 1601, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 110. _______, Vercellen., 7 Julho 1601, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 110. _______, Conimbrien., 31 Março 1602, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 110. _______, Anagnina, 22 Fevereiro 1620, in Gasparri V, Romae 1930, 221, n. 2420. _______, Elbor., 12 Março 1623, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 109. _______, 20 Março 1623, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 109. _______, Castellanae, 17 Novembro 1629, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 110. _______, Veliterna, 12 Agosto 1634, in Gasparri V, Romae 1930, 273, n. 2565. _______, S. Angeli Longobardorum, 26 Abril 1636, in Gasparri V, Romae 1930, 278, n. 2580. _______, Fanen., 24 Janeiro 1642, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, Neapoli 1859, 345. _______, Verulana, 19 Janeiro 1647, in Gasparri V, Romae 1930, 304, n. 2670. _______, Verulana, 2 Maio 1648, in Gasparri V, Romae 1930, 308, n. 2684. _______, Pisauren., 23 Maio 1648, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, Neapoli 1859, 345. _______, Anagnina, 12 Dezembro 1656, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, Neapoli 1859, 345. _______, Sebenicen., 1662, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, Neapoli 1859, 345. _______, Ianuen., 11 Setembro 1666, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 112. _______, Lamacen., 31 Maio 1667, in F. CAPPELLO, Summa Iuris Canonici, I, 427.


BIBLIOGRAFIA

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SACRA CONGREGATIO CONCILII, 3 Outubro 1671, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, Neapoli 1859, 345. _______, 7 Dezembro 1675, in Gasparri V, Romae 1930, 374, n. 2839. _______, Nullius, 3 Fevereiro 1685, in Gasparri V, Romae 1930, 397, n. 2884. _______, Urbinaten., 6 Setembro 1687, in Gasparri V, Romae 1930, 406, n. 2902. _______, Geruntinen. et Cariaten., 11 Setembro e 2 Outubro 1706, in Gasparri V, Romae 1930, 505, n. 3042. _______, Geruntinen. et Cariaten., 11 Fevereiro 1708, in Gasparri V, Romae 1930, 521, n. 3061. _______, Melevitana, 23 Fevereiro 1726 e 10 Julho 1728, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, Neapoli 1859, 345. _______, Conversana., 19 Novembro 1729, in H. DE ANDREA, ed., Canones et Decreta Concilli Tridentini, Neapoli 1859, 345. _______, Melevitana, 20 Dezembro 1749, in Gasparri V, Romae 1930, 1033, n. 3607. _______, Salernitana, 23 Junho, 21 Julho 1753, in Gasparri V, Romae 1930, 1052-1053, n. 3631. _______, Salernitana, 1 Setembro 1753, in Gasparri V, Romae 1930, 1056, n. 3636. _______, Pisauren., 21 Novembro 1761, in Gasparri VI, Romae 1932, 9-11, n. 3714. _______, Beneventana, 22 Maio 1784, in Gasparri V, Romae 1930, 125-126, n. 3836. _______, Boianen., 14 Fevereiro 1920, AAS 12 (1920) 117-119. _______, Conchen., 10 Marรงo 1920, AAS 15 (1923) 588-590. SACRA CONGREGATIO SANCTI OFFICII, Instructio, 13 Julho 1916, AAS 8 (1916) 313-315. SACRA CONGREGATIO EPISCOPORUM ET REGULARIUM, Regien., 22 Agosto 1581, in Gasparri VII, Romae 1935, 601, n. 1388. _______, Reginen, 2 de Outubro 1584, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 111. _______, 26 Novembro 1602, in Gasparri VII, Romae 1935, 704-706, n. 1616. _______, 25 Fevereiro 1607, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 112. _______, 18 Setembro 1637, in F.L. FERRARIS, Bibliotheca Canonica, II, Romae 18862, 111.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

SACRA CONGREGATIO EPISCOPORUM ET REGULARIUM, Ariminen., 13 Maio 1611, in Gasparri VII, Romae 1935, 718, n. 1649. _______, Squillacen., 5 Fevereiro 1706, in Gasparri VII, Romae 1935, 800, n. 1823. _______, Conversanen., 19 Setembro 1846, in Gasparri IV, Romae 1926, 922-923, n. 1947. SECRETARIA DE ESTADO, Litt. circ. Pergratum mihi, 25 Março 1904, ASS 36 (1903-1904) 603-604.VII, Romae 1935, 1054, n. 5810. SACRUM RITUUM CONGREGATIO, Thermularum, 21 Junho, 12 Julho 1766, in Gasparri VII, 1054, n. 5810.

1.4 Documentos codificadores e legislativos Bernoldi Chronicon A. 1084, in Monumenta Germaniae Historica, ed. G, Pertz, Hannover 1844, 441. Bullarium diplomatum et privilegiorum sanctorum romanorum pontificum: collectione novissima plurium brevium, epistolarum, decretorum actorumque S. Sedis a S. Leone Magno usque ad praesens, Turim 1857-1872. Bullarium Ordinis FF. Praedicatorum, ed. T. Ripoll – A. Bremond, I, Roma 1729. Capitula de doctrina clericorum, in PL 97, 249. Capitula examinationis generalis, in PL 97, 248. Capitula Hierardi, in PL 121, 763-774. Capitula presbyterorum, in PL 97, 295-296. Concilium Tridentinum, Diarorum, Actorum, Epistolarum, Nova Collectio, ed. Societas Goerresiana, IX, Friburgi Brisgoviae 1924. Constitutiones Alexandri Coventrensis episcopi, in Mansi 23, 429-442. Constitutiones Provinciales S. Edmundi Cantuariensis archiepiscopi, in Mansi, 23, 415-428. DENZINGER, H., Enchiridion symbolorum, definitionum et declarationum de rebus fidei et morum, ed. P. Hünermann, Bologna 20034. Decretum Burchardi, 18, in PL 140, 933-944. Didascalia et Constitutiones Apostolorum, ed. F.X. Funk, I, Paderborn 1905. GASPARRI, P. – SERÉDI, I., ed., Codicis Iuris Canonici Fontes, 1-9, 1923-1939. GUILHERME, Bispo de Paris, Additiones ad Constitutiones Gallonis, cap. 6, 9, in Mansi 22, 767.


BIBLIOGRAFIA

293

HARDOUIN, J., Conciliorum collectio regia maxima ad p. Phlilippi Labbei et p. Gabrielis Cossarti e Societate Jesu labores haud modica accessione facta et emendationibus pluribus additis, Paris 1714-1715. HEFELE, C.J. – LECLERCQ, H., ed., Histoire des conciles d’après les documents originaux, Paris 1907-19522. JOANNOU, P.-P., ed., Fonti, Fascicolo IX, Discipline Generale Antique (IIeIXes.), Roma 1962, I, 1-2. Leges Ecclesiasticae Regis Edgardi, in Mansi 18, 511-526. Le Liber Pontificalis, I, ed. L. Duchesne, Paris 1955. MANSI, J.D., ed., Sacrorum Conciliorum nova et amplissima collectio, 1-53, Florentiae – Venetiis – Arnhem – Leipzig 1907-1927. MIGNE, J.P., ed., Patrologiae cursus completus. Series Graeca et Orientalis, 1-161, Parisiis 1857-1866. MIGNE, J.P., ed., Patrologiae cursus completus. Series Latina, 1-222, Parisiis 1844-1855. Regesta Honorii Papae III, ed. P. Pressutti, I, Roma 1888, 151, n. 893. Sacramentarium Gelasianum, in L. MOHLBERG – L. EIZENHÖFER – P. SIF3 FRIN, ed., Liber Sacramento rum Romanae Aecclesiae, Roma 1981 . SBARAGLIA, G.G., ed., Bullarium Franciscanum Romanorum Pontificum, I, Roma 1759. Statuta Bonifacii, in Mansi 12, 384v-388. Statuta Ecclesiae Antiqua, in CCL 148, 169-180. Statuta Synodalia Richardi Cicestrensi episcopi, in Mansi 23, 703-715.

1.4.1 Corpus Iuris Canonici GRATIANUS, Decretum [Magistri Gratiani] , in Corpus Iuris Canonici, ed. Ae. Friedberg, I, Graz 1955. Decretales Gregorii IX [=Decretalium D. Gregorii Papae IX. Compilatio], in Corpus Iuris Canonici, ed. Ae. Friedberg, II, Graz 1955, 1-928. Clementinae [=Clementis Papae V. Constitutiones], Corpus Iuris Canonici, ed. Ae. Friedberg, II, Graz 1955, 1125-1200. Extravagantes communes, Corpus Iuris Canonici, ed. Ae. Friedberg, II, Graz 1955, 1237-1312.

1.4.2 Codex Iuris Canonici 1917 Animadversiones in Lib. II. Codicis: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 27.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

Appendix ad Postulata Episcoporum, Romae 1908: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 6. BUCCERONI, G., Votum De Poenitentia, Romae 1904: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 32. Codex Iuris Canonici Pii X Pontificis Maximi iussu digestus, Benedicti Papae XV auctoritate promulgatus, AAS 9/II (1917) 2-593. KUMPLER, B., Postulata Episcoporum in ordinem digesta, Romae 1908: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 44. LAURENTIUS, J., Votum De Clericis in specie, Romae 1907: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 16 e 26. Lib. II (1909), Bozze del C.I.C con note manoscritte del Card. P. Gasparri: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86 e 87. Lib. II (1912), Bozze del C.I.C con note manoscritte del Card. P. Gasparri: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, 86. Lib. III (1909): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87. Lib. III (1913), Bozze del C.I.C con note manoscritte del Card. P. Gasparri: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, 86. Lib. III (1914): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87. Lib. III (1917), Bozze del C.I.C con note manoscritte del Card. P. Gasparri: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 86. MÜLLER, A. Votum De Poenitentia, Romae 1905: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 32. Regolamento per la Commissione Pontificia istituita dal Santo Padre per la Codificazione del diritto canonico (11 aprile 1904, n. 5): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 3. SÄGMÜLLER, J., Votum De Clericis in specie, Tübingae 1906: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 26. Schema completo, (1916): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 87. Schema completo del C.J.C.: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 88. Schemi del Lib. II, De Personis (De Clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 19. Schemi del Lib. II, De Personis (De clericis): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 20. Schemi del Lib. II, De Personis (1909): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 22. Schemi del Lib. II, De Personis (1912): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 23.


BIBLIOGRAFIA

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Schemi del Lib. II, De Personis (1914-1916): ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 24. Schemi del Lib. III, De Rebus. De Sacramentis: Poenitentia, Ordine: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 44. Schemi del Libro III, De Rebus: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 49-51. Verbali delle Consulte parziali e Congregazioni particolari per il Lib. II. De Personis: ASV, Comissione cod. Diritto Canonico, scat. 26. Verbali delle Consulte per il Libro III. De Rebus. De Poenitentia et indulgentia: ASV, Commissione cod. Diritto Canonico, scat. 53.

1.4.3 Codex Iuris Canonici 1983 Codex Iuris Canonici auctoritate Ioannis Pauli PP. II promulgatus, AAS 75/2 (1983) 1-317. POLETTI, U., «Speciale facoltà di assoluzione dalla scomunica per l’aborto procurato», 22 Abril 1984, in Rivista diocesana di Roma 25/1 (1984) 637. PCCICR, Codex Iuris Canonici Schema Novissimum post consultationem S.R.E. Cardinalium, Episcoporum Conferentiarum, Discateriorum Curiae Romanae, Universitatum Facultatumque ecclesiasticarum necnon Superiorum Institutorum vitae consecrate recognitum, iuxta placita Patrum Commiccionis deinde emendatum atque Summo Pontifici praesentatum, Civitate Vaticana 1982. _______, «Coetus studiorum de iure poenali», Comm. 9 (1977) 304-322. _______, «Coetus Studiorum de Sacramentis», Comm. 10 (1978) 47-127. _______, «Coetus studiorum “De Sacramentis”. Sessio VIII», Comm. 31 (1999) 273-306. _______, «Coetus studiorum “De Sacramentis”. Sessio X», Comm. 32 (2000) 26-83. _______, Relatio complectens Synthesim animadversionum ab Em.mis atque Exc.mis Patribus Commissionis ad Novissimum Schema Codicis Iuris Canonici Exhibitarum, cum responsionibus a Secretaria et Consultoribus datis, Comm. 16 (1984) 27-90. _______, Novi Canones De Sacramentis. Pro Studio Privato, Roma 19661977. _______, Relatio complectens Synthesim animadversionum ab Em.mis Patribus Commissionis ad Novissimum Schema Codicis Iuris Canonici Exhibitarum, cum responsionibus a Secretaria et Consultoribus data, Comm. 15 (1983) 170-253.


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PCCICR, Schema Canonum Libri II De Populo Dei, Città del Vaticano 1977. _______, Schema Codicis Iuris Canonici iuxta animadversiones S.R.E. Cardinalium, Episcoporum Conferentiarum, Discateriorum Curiae Romanae, Universitatum Facultatumque ecclesiasticarum necnon Superiorum Institutorum vitae consecrate recognitum, Città del Vaticano 1980. _______, Schema documenti quo disciplina sanctionum seu poenarum in Ecclesia latina denuo ordinantur, Città del Vaticano 1973.

1.4.4 Codex Canonum Ecclesiarum Orientalium 1990 Codex Canonum Ecclesiarum Orientalium auctoritate Ioannis Pauli PP. II promulgatus, AAS 82 (1990) 1047-1363. PCCICOR, «Principi direttivi per la revisione del codice di diritto canonico orientle», Nuntia 3 (1976) 3-10. _______, «Lo schema dei canoni riguardanti le sanzioni penali», Nuntia 4 (1977) 72-96. _______, «Schema canonum de sanctionibus poenalibus in Ecclesia», Nuntia 13 (1981) 59-80. _______, «Schema canonum de sanctionibus poenalibus in Ecclesia nella nuova revisione», Nuntia 20 (1985) 3-58. _______, «Le osservazioni dei membri della Commissione allo “schema Codicis Iuris Canonici Orientalis” e le risposte del “coetus de expensione observationum», Nuntia 28 (1989) 3-138.

1.5 Padres da Igreja e Autores Medievais ABELARDO, Ethica seu scito te ipsum, cap. 24, 26, in PL 178, 668-669, 673678. AGOSTINHO, Contra epistolam Parmeniani, 2, in Opere di Sant’Agostino. Polemica con i Donatisti, ed. A. Lombardi, 15/1, Roma 1998, 62-241. _______, De diversis quaestionibus, in Opere di Sant’Agostino. La vera religione, ed. G. Ceriotti – L. Alici – A. Pieretti, 6/1, Roma 1995, 32260. _______, De natura et gratia, in Opere di Sant’Agostino. Natura e grazia, ed. A. Trapè, 17/1, Roma 1981, 380-485. _______, De nuptiis et concupiscentia, in Opere di Sant’Agostino. Polemica con Giuliano,ed. N. Cipriani, 18, Roma 1985, 18-171. _______, De symbolo ad catechumenos, in PL 40, 627-668. _______, Enchiridion ad Laurentium, in Opere di Sant’Agostino. La vera religione, ed. L. Alici, 6/1, Roma 1995, 470-622.


BIBLIOGRAFIA

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AGOSTINHO, Epistola, 95, in Opere di Sant’Agostino. Le Lettere, ed. L. Carrozzi, 21, Roma 1969, 890-903. _______, Epistola, 153, in Opere di Sant’Agostino. Le Lettere, ed. L. Carrozzi, 22, Roma 1971, 522-555. _______, Sermo, 4, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. P. Bellini, 21, Roma 1979, 28-73. _______, Sermo, 56, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. L. Carrozzi, 30/1, Roma 1982, 140-163. _______, Sermo, 67, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. L. Carrozzi, 30/1, Roma 1982, 348-359. _______, Sermo, 71, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. L. Carrozzi, 30/1, Roma 1982, 401-455. _______, Sermo, 82, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. L. Carrozzi, 30/1, Roma 1982, 612-631. _______, Sermo, 98, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. L. Carrozzi, 30/2, Roma 1983, 200-211. _______, Sermo, 99, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. L. Carrozzi, 30/2, Roma 1983, 212-228. _______, Sermo, 214, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. F. Cruciani, 32/1, Roma 1984, 218-234. _______, Sermo, 222, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. F. Cruciani, 32/1, Roma 1984, 314-316. _______, Sermo, 232, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. F. Cruciani, 32/2, Roma 1984, 560-579. _______, Sermo, 278, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. V. Tarulli, 33, Roma 1986, 60-75. _______, Sermo, 295, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. M. Recchia, 33, Roma 1986, 311-320. _______, Sermo, 351, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. V. Paronetto – A. Quartiroli, 34, Roma 1989, 166-197. _______, Sermo, 352, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. V. Paronetto – A. Quartiroli, 34, Roma 1989, 198-222. _______, Sermo, 392, in Opere di Sant’Agostino. Discorsi, ed. V. Paronetto – A. Quartiroli, 34, Roma 1989, 664-673. _______, Tractatus in Iohannis, in Opere di Sant’Agostino. Commento al Vangelo di S. Giovanni, ed. G. Madurini – L. Muscolino, 24, Roma 1968, 2-1624. ALAIN DE LILLE, Liber Poenitentialis, in PL 210, 281-304.


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

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ÍNDICE DE AUTORES

Abelardo: 106, 111, 112, 116, 118 Agostinho: 59, 60-64, 113 Alain de Lille: 120, 121, 137 Alberto Magno: 122-124 Alcuíno: 95, 101 Alexandre: 150 Alexandre de Halès: 121, 123, 124 Alexandre IV: 154, 171-173 Amann: 39, 48, 69 Amato: 184, 185 Ambrósio: 57, 58 Anciaux: 106, 107, 109, 110-115, 117-120 Anselmo de Cantuária: 116, 134 Aronstam: 87-89 Avito de Viena: 53 Batiffol: 56 Beda: 86, 97, 102 Bento XI: 174, 175 Bento XIII: 190 Bento XV: 202 Berlière: 87-89 Bernhard: 16, 17, 19-21 Berrouard: 24, 70 Bieler: 76, 84-86 Blat: 241, 243 Boaventura: 121-124 Boncopagni: 49, 145 Bonifácio: 97 Bonifácio VIII: 174, 175 Bonizo de Sutri: 110

Bucardo: 99 Bucceroni: 212 Cajetanus: 129 Cambrensis: 164 Cappello: 241-243 Carola: 61, 62 Carpin: 24, 25, 31-33, 35, 36, 49, 69, 70, 72, 74, 75, 77-81, 91, 9396, 103, 137-151, 153, 155-160, 162, 168-170, 172, 173, 177 Celestino: 67, 138 Cesário: 64, 78 Cheney: 163 Cipriano: 21, 30-37, 44, 48, 49 Cito: 255, 257-260 Clemente de Alexandria: 37, 38 Clemente de Roma: 20 Clemente IV: 166, 173 Clemente V: 174, 175 Columbano: 84, 85, 91, 97 Conte a Coronata: 244 Cordeiro: 98 Crodegang: 97 D’Ostillo: 252 Daniele: 49 De Andrea: 195-197, 199, 200 De las Heras: 185 De León: 206, 208 De Luise: 191, 199 De Paolis: 247, 248, 254, 258 De Vaux Saint-Cyr: 76


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

Dionísio de Alexandria: 44 Duns Escoto: 131 Durand de Saint-Pourçain: 129, 131, 132 Edmond Rich: 150, 162 Erdö: 191 Escoto: 130-133, 272 Eubel: 166 Eusébio de Cesareia: 23, 30, 44 Falchi: 205 Fantappiè: 206, 207, 210, 212 Fausto de Riez: 53 Feliciani: 206, 207 Ferme: 94 Ferraris: 194-196, 199, 201, 202 Ferreres: 241, 244 Finsterwalder: 83, 86 Flórez: 37, 39, 40, 42, 44, 57, 69, 91, 92, 185, 245 Frend: 24 Gasparri: 206-208, 213, 214, 217, 221-224, 226, 227, 233-238 Gastaldelli: 115 Gaudemet: 51, 69-73, 75, 77, 78, 105, 112, 114, 135, 191, 200, 202 Gelásio: 68, 69 Genádio de Marselha: 53 Ghirlanda: 247, 248 Göller: 163, 165, 166 Graciano: 112, 113, 116, 136 Gregório IX: 123, 149, 168, 169, 170 Gregório Taumaturgo: 44 Guilherme d’Auvergne: 117, 121, 123 Guilherme de Ockham: 132 Gy: 100 Haering: 256 Halitgário: 96, 102 Hefele-Leclercq: 178, 180, 188 Helmholz: 136 Herard: 102 Hetto: 96

Hipólito: 29, 30 Honório III: 147, 167, 169 Hugo de Saint-Cher: 122 Hugo de São Vítor: 115 Humberto de Romans: 172 Ickx: 88, 89, 90, 113, 135, 136, 164167 Inácio de Antioquia: 20 Incmar de Reims: 101 Inocêncio I: 66, 67 Inocêncio II: 135 Inocêncio III: 139, 141, 166 Inocêncio IV: 170, 171 Ireneu: 29 Isidoro: 91, 92 João Paulo II: 244, 261, 263 João XXII: 175 Jonas de Bobbio: 83 Jonas de Orléans: 97, 98 Júlio II: 176 Justino: 23 Kasper: 17 Kowal: 206, 208 Kumpler: 208, 209 La Bonnardière: 59-61 Lanfranc: 109 Laporte: 84 Laurentius: 210, 211 Leão Magno: 52, 67-69, 74, 78, 79 Leão X: 176 Leão XIII: 240 Leclercq: 46, 54-56, 67 Lefèvre: 15, 17 Llobbel: 206, 208 Llorca: 24, 33 Lorusso: 256, 262-264 Loza: 250, 253-256 Lozano Sebastián: 92 Mansi: 137-142, 144-163, 173 Map: 164 Marillier: 179 Martinho IV: 173, 174


ÍNDICE DE AUTORES

Marzoa: 258, 259 Meersseman: 170 Mestre Simon: 119 Michel: 187 Moioli: 37-41, 44, 45, 48, 49, 5661, 63, 65-67, 69, 76, 81, 84, 91, 92, 183 Müller: 212, 213 Munier: 77 Murphy-O’Connor: 12, 14, 16-18 Nautin: 30, 45 Navarrete: 206, 208 Nocent: 9, 10, 15, 16, 46, 47, 57, 245 Odão: 139, 147 Odão de Paris: 136, 137, 145, 163 Optato de Milevi: 64 Orígenes: 30, 39-44 Ottone da Lucca: 115 Paciano: 56, 57 Pastor de Hermas: 21, 22, 37 Paulo III: 177 Pavanello: 253 Pedro de Poitiers: 120, 121 Pedro Lombardo: 106-108, 116, 117, 121, 122, 128, 137, 159 Pedro o Cantor: 120 Pérez-Madrid: 260 Pinto: 251, 253 Pio XI: 242 Poletti: 261 Policarpo de Esmirna: 20 Poschmann: 19, 21, 22, 25, 27-30, 33-41, 43-45, 49, 51-54, 56, 59, 61, 62, 64, 65, 68, 70, 73, 8387, 89, 90, 93, 97-100, 102, 103, 105, 106, 109, 111, 112, 115, 118, 121, 123, 124, 126, 129-133, 135 Rabano Mauro: 93, 96, 101 Rahner: 13, 14, 19, 21-23, 26-28, 32, 34-37, 39-43, 45-48, 52, 107, 115, 118, 122, 125, 126, 130

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Raimundo de Penhaforte: 168, 169 Ramos-Regidor: 9, 10, 12-17, 107, 108, 111, 122, 131, 188, 245 Raoul l’Ardent: 120 Ricardo de São Vítor: 118 Ricardo “o pobre”: 144, 145, 147, 150, 274 Richard Wich: 151, 152, 162 Rigaux: 14, 15 Righetti: 101, 106 Robert de Flamborough: 100 Roberto de Melun: 118 Roberto Pulleyn: 106, 108, 117, 119 Rodríguez: 184, 187 Rouillard: 16, 18, 24 Rusconi: 151, 170, 174, 175, 187 Russo: 110, 115-117, 119, 122-124, 128, 133 Sägmüller: 211 Salachas: 261, 263, 264 Sartori: 241 Schatz: 167 Sirício: 66, 79 Sixto IV: 175 Sócrates: 55, 56 Sozómeno: 55, 56 Tamburini: 32, 163-165 Tanner: 143, 180 Teetaert: 109, 115, 121, 127 Teodolfo: 94, 98 Teodolfo de Orléans: 97, 101 Tertuliano: 21, 22, 25-29 Thomassin: 146, 149, 152, 153, 178-180, 188 Tomás de Aquino: 13, 121, 124-128, 130, 132, 133, 145, 155, 171 Trevisan: 250 Urbano II: 134 Urbano IV: 172 Urbano V: 178 Urrutia,: 247 Urso: 253


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

Vacandard: 46, 54-56 Ventas: 179 Vogel: 19, 21, 22, 25, 27, 28, 30, 31, 36, 49-53, 60, 61, 65, 66, 76, 79, 82-87, 93, 95, 98, 100, 101, 105 Vorgrimler: 12-14

Walker Vicuña: 126, 127, 177, 185 Wasserschleben: 86 Wernz: 210 Wernz – Vidal: 175, 177 Yves de Chartres: 109, 110 Zollo: 153


ÍNDICE GERAL

INTRODUÇÃO...............................................................................................

5

CAPÍTULO I: A Penitência eclesiástica do início ao século X .....................

9

1. A experiência da penitência na Sagrada Escritura .................................. 1.1 Antigo Testamento .......................................................................... 1.2 Novo Testamento ............................................................................ 1.2.1 O poder concedido por Jesus ................................................. 1.2.2 A prática da penitência nos escritos paulinos ........................ 1.2.3 Outros textos do Novo Testamento ....................................... 1.3 Síntese ............................................................................................. 2. Excomunhão e Reconciliação dos séculos II-VI..................................... 2.1 Padres Apostólicos .......................................................................... 2.1.1 Pastor de Hermas ................................................................... 2.1.2 Segunda metade do século II ................................................. 2.2 A disciplina penitencial do século III .............................................. 2.2.1 Padres da Igreja ..................................................................... a) O Montanismo e Tertuliano ............................................. b) Testemunhos extra africanos............................................ c) Cipriano de Cartago ......................................................... d) Os Alexandrinos............................................................... 2.2.2 Documentos normativos ........................................................ a) Didascalia Apostolorum ................................................... b) Concílios de Roma (250 e 251) ....................................... 2.3 A disciplina penitencial dos séculos IV-VI ..................................... 2.3.1 O processo penitencial ........................................................... a) Entrada na penitência ....................................................... b) O estado de penitente ....................................................... c) A reconciliação................................................................. d) O ministro ........................................................................ e) Primeiros testemunhos acerca do penitenciário ...............

9 9 10 12 16 16 18 18 18 21 23 23 24 24 29 30 37 45 45 48 49 49 50 51 52 54 55


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O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

2.3.2 Padres da Igreja ..................................................................... 56 a) Paciano ............................................................................. 56 b) Ambrósio de Milão .......................................................... 57 c) Agostinho de Hipona........................................................ 59 d) Cesário de Arles ............................................................... 64 2.3.3 Documentos normativos ........................................................ 66 a) Legislação Pontifícia ........................................................ 66 b) Concílio de Elvira (305 ca.) ............................................. 69 c) Sínodo de Ancyra (314) e Concílio de Niceia (325) ........ 71 d) Concílios Africanos ......................................................... 71 e) Concílios Gauleses do Séc. IV-V ..................................... 72 f) Sínodo de S. Patrício (457 ca.) ......................................... 76 g) Statuta Ecclesiae Antiqua (475 ca.) ................................. 77 h) Concílios Gauleses do Séc. VI ......................................... 78 i) Concílios da Espanha do Séc. VI ...................................... 80 2.4 Síntese ............................................................................................. 81 3. A penitência dos séculos VII-X .............................................................. 82 3.1 A penitência tarifada ....................................................................... 82 3.1.1 O processo penitencial tarifado ............................................. 85 3.1.2 Comutação penitencial .......................................................... 85 3.1.3 Peregrinações penitenciais ..................................................... 87 3.1.4 O ministro da penitência tarifada........................................... 90 3.2 A penitência eclesiástica no século VII ........................................... 91 3.2.1 A penitência na Espanha Visigótica ....................................... 91 3.3 A penitência eclesiástica nos séculos VIII e IX .............................. 93 3.3.1 Concílio de Cloveshoe (747) ................................................. 93 3.3.2 Concílios Carolíngios (813)................................................... 93 3.3.3 Concílio de Paris (829) .......................................................... 96 3.3.4 Prática penitencial variada ..................................................... 96 3.4 A reconciliação e o ministro da penitência ..................................... 101 3.5 Síntese ............................................................................................. 103 CAPÍTULO II: O início do instituto do penitenciário. Séculos XI-XV ......... 105 1. O ministro da penitência na reflexão escolástica .................................... 1.1 Os elementos do sacramento da penitência ..................................... 1.2 O ministro e o poder das claves ecclesiae ....................................... 1.3 A posição dos autores no Século XI................................................ 1.4 A posição de Abelardo .................................................................... 1.5 Decreto de Graciano (1140) ............................................................ 1.6 Escola de São Vítor ......................................................................... 1.7 Pedro Lombardo e a sua escola .......................................................

105 107 108 109 111 112 115 116


ÍNDICE GERAL

1.8 Soluções intermédias ....................................................................... 1.8.1 A metade do século XII ......................................................... 1.8.2 Finais do século XII............................................................... 1.9 A remissão dos pecados no século XIII ......................................... 1.10 São Tomás de Aquino .................................................................... 1.10.1 O ministro da confissão e os casos reservados ................... 1.11 A escola tomista ............................................................................. 1.12 Duns Escoto ................................................................................... 1.13 As escolas escotista e nominalista .................................................. 1.14 Síntese ............................................................................................ 2. Legislação dos séculos XI-XII ................................................................ 2.1 Concílios de Piacenza e de Clermont (1095) .................................. 2.2 Concílio de Londres (1102)............................................................. 2.3 Concílios de Clermont (1130) e de Latrão II (1139) ....................... 2.4 Constituições sinodais de Odão de Paris (1197 ca.) ....................... 2.5 Concílio de York (1195) ................................................................. 3. Legislação do início do século XIII ........................................................ 3.1 Concílios anónimos (início do século XIII) .................................... 3.2 Concílios de Paris (1212) e de Rouen (1214).................................. 3.3 Concílio de Dublin (1214)............................................................... 3.4 Concílio de Latrão IV (1215) .......................................................... 4. Legislação posterior a Latrão IV (1215) ................................................. 4.1 Concílios e Sínodos ......................................................................... 4.1.1 Constituições sinodais inglesas (1217-1225)......................... 4.1.2 Estatutos do Concílio de Treviri (1227) ................................ 4.1.3 Instituições Sinodais de Rouen e de Le Mans (1235)............ 4.1.4 Concílio de Londres e Estatutos Sinodais Ingleses (1236-1240) 4.1.5 Concílio Provincial de Fritzlar (1243) e de Mainz (1261)..... 4.1.6 Constituições Sinodais de Valência (1255) ........................... 4.1.7 Estatutos Sinodais de Clermont (1268) ................................. 4.1.8 Concílios Franceses (1273-1280) .......................................... 4.1.9 Concílio de Münster (1279) e Sínodo de Colónia (1280)...... 4.1.10 Concílio de Lambeth (1281) ................................................ 4.1.11 Sínodo de Exeter (1287) e de Chicester (1289) ................... 4.1.12 Estatutos Sinodais francófonos (1284-1289) ....................... 4.1.13 Estatutos Sinodais de Würsburg (1298) .............................. 4.2 Magistério pontifício e a jurisdição da penitência........................... 4.2.1 Penitenciários Papais ............................................................. 4.2.2 Papa Inocêncio III (1198-1216) ............................................. 4.2.3 Papa Honório III (1216-1227) ............................................... 4.2.4 Papa Gregório IX (1227-1241) .............................................. 4.2.5 Papa Inocêncio IV (1243-1254) ............................................

317 117 117 119 120 124 126 128 130 131 133 134 134 134 135 136 138 138 138 139 141 141 144 144 144 147 148 149 153 154 155 155 157 157 158 159 161 163 163 167 167 168 170


318

O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

4.2.6 Papa Alexandre IV (1254-1261)............................................ 4.2.7 Papa Clemente IV (1265-1268) ............................................. 4.2.8 Papa Martinho IV (1281-1285) ............................................. 5. A prática penitencial anterior a Trento ................................................... 5.1 Magistério Pontifício ....................................................................... 5.1.1 A questão das Ordens Mendicantes ....................................... 5.2 Concílios e Sínodos ......................................................................... 5.2.1 Estatutos Sinodais de Constança e Bayeux ........................... 5.2.2 Concílios de Tarragona (1329, 1391) .................................... 5.2.3 Concílio de Lavaur (1368) e de Narbonne (1374) ................. 5.2.4 Concílio de Freising (1440) ................................................... 5.2.5 Concílio Ecuménico de Ferrara-Florença (1431-1445) ......... 6. Síntese .....................................................................................................

171 173 173 174 174 174 177 177 178 178 180 180 180

CAPÍTULO III: Do Concílio de Trento à actual legislação.......................... 183 1. O Concílio de Trento .............................................................................. 1.1 O ministro e a absolvição sacramental ............................................ 1.2 Pecados reservados e satisfação sacramental .................................. 1.3 Ofício de Penitenciário .................................................................... 2. A legislação posterior a Trento ............................................................... 2.1 Magistério Pontifício ....................................................................... 2.1.1 Papa Bento XIII (1724-1730) ................................................ 2.2 Congregações da Cúria Romana ..................................................... 2.2.1 Sagrada Congregação do Concílio ........................................ a) Instituição e demissão ...................................................... b) Qualidades ....................................................................... c) Funções e tempos estabelecidos ....................................... d) Delegação ......................................................................... e) Prebendas ......................................................................... 2.2.2 Sagrada Congregação dos Bispos e Religiosos ..................... a) Instituição ......................................................................... b) Delegação ......................................................................... c) Incompatibilidade de ofícios ............................................ d) Funções ............................................................................ 2.2.3 Sagrada Congregação dos Ritos ............................................ 2.2.4 Sagrada Congregação do Santo Ofício .................................. 3. O Concílio Vaticano I ............................................................................. 4. O Código Pio-Beneditino de 1917 .......................................................... 4.1 Iter da codificação ........................................................................... 4.2 Postulata .......................................................................................... 4.3 Os Vota............................................................................................

183 183 185 188 190 190 190 191 191 191 193 194 198 198 200 200 201 201 201 202 202 204 206 206 208 209


ÍNDICE GERAL

4.3.1 O votum de Laurenti .............................................................. 4.3.2 O votum de Sägmüller ........................................................... 4.3.3 O votum de Bucceroni ........................................................... 4.3.4 O votum de Müller ................................................................ 4.4 Os Esquemas do Livro II ................................................................. 4.4.1 Os primeiros esquemas .......................................................... 4.4.2 O esquema de 1909 ............................................................... 4.4.3 O esquema de 1912 ............................................................... 4.4.4 Os esquemas de 1914 e 1916 ................................................. 4.5 Evolução dos esquemas do Livro III ............................................... 4.5.1 O esquema I ........................................................................... 4.5.2 O esquema II.......................................................................... 4.5.3 O esquema III ........................................................................ 4.5.4 O esquema IV ........................................................................ 4.5.5 Os esquemas intermédios ...................................................... 4.5.6 O esquema de 1913 ............................................................... 4.5.7 O esquema de 1914 ............................................................... 4.5.8 Os esquemas de 1916 e 1917 ................................................. 4.6 Conclusão ........................................................................................ 4.7 Interpretações da Cúria Romana ..................................................... 4.8 Comentadores .................................................................................. 5. O Concílio Vaticano II ............................................................................ 6. O Código de 1983 ................................................................................... 6.1 Iter da codificação ........................................................................... 6.1.1 Sínodo de 1967 ...................................................................... 6.1.2 Livro II................................................................................... 6.1.3 Livro IV ................................................................................. 6.2 Comentário à actual legislação ........................................................ 6.3 Aplicações ....................................................................................... 6.3.1 Cânon 1364 §1 ....................................................................... 6.3.2 Cânon 1398 ............................................................................ 7. O Código dos Cânones das Igrejas Orientais .......................................... 8. Síntese .....................................................................................................

319 209 211 211 212 213 213 219 220 225 227 227 228 229 230 231 233 235 236 238 240 241 244 246 246 246 249 252 253 256 257 260 261 264

CONCLUSÃO ................................................................................................ 269 SIGLAS E ABREVIATURAS ............................................................................ 279 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................. 283 1. Fontes e Documentos .............................................................................. 283 1.1 Conciliares e Sinodais (por ordem cronológica) ............................. 283 1.2 Romanos Pontífices ......................................................................... 286


320

O OFÍCIO DE PENITENCIÁRIO

1.3 Organismos da Cúria Romana......................................................... 1.4 Documentos codificadores e legislativos ........................................ 1.4.1 Corpus Iuris Canonici ............................................................ 1.4.2 Codex Iuris Canonici 1917 .................................................... 1.4.3 Codex Iuris Canonici 1983 .................................................... 1.4.4 Codex Canonum Ecclesiarum Orientalium 1990 .................. 1.5 Padres da Igreja e Autores Medievais ............................................. 2. Livros e artigos .......................................................................................

289 292 293 293 295 296 296 302

ÍNDICE DE AUTORES .................................................................................... 311 ÍNDICE GERAL ............................................................................................. 315


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