COLECÇÃO
PRAZERES POÉTICOS
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Um livro vai para além de um objecto. É um encontro entre duas pessoas através da palavra escrita. É esse encontro entre autores e leitores que a Chiado Editora procura todos os dias, trabalhando cada livro com a dedicação de uma obra única e derradeira, seguindo a máxima pessoana “põe tudo quanto és no mínimo que fazes”. Queremos que este livro seja um desafio para si. O nosso desafio é merecer que este livro faça parte da sua vida.
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Título: Cem Pensamentos Sem Sentido Editor: Afonso Oliveira Rodrigues Coordenação editorial: Afonso Oliveira Rodrigues Composição gráfica: Ricardo Heleno – Departamento Gráfico Capa: XXXXXXXXX – Departamento Gráfico Revisão: XXXXXXXXXX Impressão e acabamento: Chiado Print 1.ª edição: Junho, 2014 ISBN: XXXXXXXXXXX Depósito Legal n.º XXXXXXXXXX
ant贸nio martins
Cem Pensamentos sem sentido
Chiado Editora
Portugal | Brasil | Angola | Cabo Verde
Para a minha família, a minha âncora, o meu porto seguro de abrigo! Para o “meu príncipe” Duarte! Para os amigos.
N.B. Possíveis lucros desta publicação reverterão integralmente para obras sociais!
Eu
........................................, considero-te, ........................................, uma pessoa especial. Admiro-te e estimo-te. Partilho contigo este livro. Gostaria que sentisses as palavras e vibrasses com os valores que aqui se promovem. Aquele nosso abraรงo!
Prefácio
por Pedro Chagas Freitas*
olhemos, irmãos Há obras literárias que nascem sem querer – obras literárias que não eram para ser obras literárias. Mas que o são de pleno direito. Esta é uma delas.
António Martins, um sacerdote mas antes de mais nada uma pessoa na mais profunda acepção da palavra, em textos simples, diretos, claros, consegue viajar por aquilo que é o Homem em todas as suas vertentes – ou em quase todas as suas vertentes. E o que daí resulta é uma obra lúcida, coerente, interessante – sem qualquer tipo de pretensão mas com todos os tipos de leituras.
Delicie-se, pense, revisite-se, procure em redor, viaje com as palavras que aí vêm, escritas por uma voz que sabe olhar para além do que os olhos vêem e encontrar em tudo aquilo que escreve um caminho – e nunca um final sem reversão possível. É sempre essa – a humildade perante a dimensão do todo que nos deixa existir – a melhor solução para viver melhor. António Martins sabe-o – e quer que todos o queiram saber também. Não é coisa pouca, convenhamos. 9
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Olhar melhor para viver melhor: eis então a receita absoluta, talvez, que este livro nos entrega. Olhemos, Irmãos.
* escritor 10
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1. Lema de vida
Nas tuas mãos, ó Pai;
Entrego a minha vida! Eu quero o que Tu queres, Meu Deus, minha guarida! Amar, confiar e partir Para sonhar e viver.
Caminharei a sorrir Por saber que estou “In manus Tuas, Pater!”
A Tua mão protetora Sempre me há-de acompanhar! Seguir-Te-ei, pois me chamas… Eu sei quem quero amar!
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2. “Pseudopsíco-filo-teologia” – os meus diferentes “eus”!
Todos temos um “eu” superficial, aparente ou social: o eu
corpo, o eu emprego, o eu aquilo que faço, tenho, experimento ou vivo. Todos temos também um “eu” psicológico: eu e os meus princípios, valores, eu e a minha religião, eu e a minha forma de amar. Todos estes “eus” constituem a minha personalidade. A soma de todos estes “eus” serão o mais completo Bilhete de Identidade que de mim próprio poderei apresentar. Falta ainda aquele que considero o “eu” mais importante: o “eu místico”. Isto é: o eu da minha relação com Deus (o tempo e lugar que dou a Deus; o tempo e o lugar que vivo em e para Deus). Para mim depende deste “eu místico” a realização mais profunda dos diversos “eus”. O “eu místico”, isto é, unifica e realiza todos os outros “eus”. “Todas as coisas encobrem algum mistério. Um mistério é um véu que encobre Deus.” Pascal
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3. Qual é o meu abrigo seguro?
É uma das questões que mais vezes me coloco a mim
mesmo. Neste caminhar de esperança que é a minha vida, semeando a boa semente que espero que Jesus ajude a fazer frutificar, onde posso eu verdadeiramente descansar, enquanto peregrino, nos caminhos atribulados da minha existência?
A família... sem dúvida. É porto e abrigo seguro onde consigo ancorar a minha existência e sentir que estou bem e humanamente protegido.
Os amigos... sem reserva. Aqueles que estão atentos e são comigo generosos. São porto de abrigo que sabe bem ter. Conhecem-me, partilham o que são e têm – e partilhar a amizade é o abrigo mais seguro.
O Deus... em quem acredito. Que envia o seu Espírito que constantemente me envolve, motiva e envia. Para que me sinta bem quando preciso de abrigo seguro ou quando tenho de partir e correr riscos.
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4. definitivo?
Nada é definitivo...
Absolutamente nada; nem esta vida! Então, se nada permanece para sempre, porquê tanto orgulho? Porquê tanta disputa sem objetividade? Porquê tanta ganância estúpida e tantas mágoas sem sentido? Só Deus é o horizonte definitivo porque é o horizonte primeiro. Só Deus é definitivo porque é eterno e nos quer oferecer essa eternidade.
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5. “C’um Catrino!”
Era a expressão que mais caraterizava o meu bisavô.
Utilizava-a de forma desmedida, a torto e a direito. “C’um catrino“para tudo! Zangava-se e não dizia asneiras. Um “c’um catrino” ou dois chegava para desabafar. Alguém dizia mal de alguém. Um “c’um catrino” dizia todos os seus sentimentos. Estava alegre, a vida sorria-lhe e dizia, com brilho nos olhos, um “c’um catrino” bem sentido. Hoje, como ele, quero eu dizer “c’um catrino”... não tentem adivinhar o motivo. É por tudo e por nada.
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6. Coração de criança!
Hoje quero pedir-Te
A inocência das crianças O seu sorriso sincero A sua confiança desmedida Ensina-me a sua pureza A alegria verdadeira O seu amor total.
Hoje quero aprender A maravilhar-me com as coisas mais simples A brincar com tudo e todos A sorrir intensamente A doar o coração.
Dá-me, Senhor, a inocência de uma criança Nunca corrompida pela “sabedoria” de um adulto!
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7. Folha seca
Medo de envelhecer? Não tenho.
Reparem nas folhas que nascem e morrem tão depressa, num ritmo anual. A vida das folhas passa a correr. Mas envelhecem com uma beleza incomparável. A nossa vida, felizmente, é sempre maior que a vida de uma folha. Por isso, ao envelhecer, fruto da sabedoria acumulada, a nossa vida há de continuar a ser bela.
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8. onde estão?
A vida fica mais fácil quando sabemos:
Onde estão os beijos de que precisamos; Onde estão os abraços que, mesmo invisíveis, nos [arrebatam. A vida fica mais bela quando sabemos: Onde estão os olhos que nos encantam; Onde estão os sorrisos que dão sentido à nossa vida. A vida fica com mais sentido quando sabemos: Onde estão as verdades e os valores; Onde está a família da fé que connosco quer caminhar. Eu vou sempre procurando saber. Deus vai comigo!
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9. o meu carro
Tenho de deixar de pensar que a marca do meu carro é
“Ford” e passar a dar conta que a marca do carro que uso é “vida”. Tenho de deixar de pensar que ando habitualmente em estradas nacionais e na A23 e A25. A estrada que eu percorro com o meu carro de marca “vida” é a estrada dos meus sonhos: dos que concretizo e daqueles que busco constantemente. Tenho de pensar que habitualmente no meu carro não ando sozinho; ando com os meus amores que dão sentido à minha vida – a minha Família e o “Amigo maior” que é o próprio Deus. Mais ainda: tenho de deixar de pensar que sou eu que conduzo o meu carro. Jesus é o motorista e só com Ele ao volante poderei chegar ao meu destino; o sucesso e a realização na santidade de cada dia bem vivido. Com Jesus ao volante, com o GPS que é o Espírito Santo, hei de chegar à prosperidade se usar os quatro pneus da marca “amei”, “lutei”, “renovei” e “venci”.
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10. não são números... são pessoas!
Às vezes os números são somente números.
Escutamos tantos números com frequência na comunicação social que nem reparamos: “Morreram 200 pessoas no Iraque”; “A percentagem de desempregados aumentou dez por cento este semestre”; “Faleceram 100 pessoas num atentado bombista na Palestina”; “Neste fim-de-semana perderam a vida sete pessoas nas estradas portuguesas”. Há tempos li, num jornal diário, que uma certa empresa da região iria despedir 700 pessoas. Neste caso, para mim, o número é muito mais que um número. São pessoas! Pessoas que conheço! O Paulo, a Joana, a minha prima, o Nuno e a esposa… e tantos outros. Os números não podem mesmo ser apenas números quando falamos de pessoas.
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11. Carta de demissão
Quero hoje apresentar a minha carta de demissão.
Venho por este meio apresentar oficialmente o meu pedido de demissão da categoria dos adultos. Resolvi que quero voltar a ter as mesmas ideias e possibilidades de uma criança de oito anos no máximo. Quero acreditar que o mundo é justo e que todas as pessoas são honestas e boas. Quero acreditar que tudo é possível. Quero que as complexidades da vida passem despercebidas por mim porque quero apenas ficar encantado com as pequenas maravilhas deste mundo que acontecem a todos os momentos, todos os dias. Demito-me de adulto porque quero uma vida simples e sem complicações desnecessárias. Cansei-me de dias cheios de computadores que falham, montanhas de papelada, notícias sempre deprimentes e alarmistas, contas a pagar, o disse que disse, doenças; mas principalmente cansei-me de atribuir um valor monetário a tudo o que existe. Chega de fazer contas para ver se o vencimento chega para todo o mês. Quero acreditar que as pastilhas e as gomas são a melhor coisa do mundo e que as moedas de chocolate são melhores que as outras porque se podem comer e ficar com a cara toda lambuzada. Também não quero dizer adeus às pessoas que me são queridas e que fazem parte da minha vida. Por isso demito21
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-me de ser adulto. Porque quero ter a certeza de que Deus está no céu e de que é Ele que orienta todas as coisas. Quero deitar pedrinhas na água e dar a volta ao mundo no sonho de um barco de papel. Demito-me de adulto porque quero continuar a sonhar. Quero poder passar as tardes de verão numa bela praia, construindo castelos na areia e dividindo-os com os meus amigos. Quero ficar feliz quando amadurecer o primeiro morango, a primeira maçã ou quando a cerejeira ficar totalmente florida. Quero que as maiores competições em que eu tenha de entrar sejam um jogo de futebol ou uma corrida ao “sprint”. Demito-me de ser adulto porque quero voltar ao tempo em que eu aprendia o nome das cores, a tabuada, as cantigas de roda e rezava com os olhos fechados, cheio de vontade de ser escutado. Quero voltar ao tempo em que se era feliz, simplesmente porque se vivia na bendita ignorância de coisas que podiam preocupar ou aborrecer e que isso nada me incomodava, porque agora mesmo que saiba muito nunca sei o mínimo suficiente. Demito-me de adulto porque quero poder acreditar no poder dos sorrisos, dos abraços, das palavras gentis e alegres. Quero acreditar no poder da verdade, da justiça, da paz, dos sonhos e da imaginação, dos castelos no ar e na areia. Demito-me de adulto porque ser grande é chato e eu quero ser feliz porque sei que ser feliz é mais que ter dinheiro ou ter muita influência. Ser feliz é confiar em Deus. É saber que o Deus em quem acreditamos é um Deus de vivos e não um Deus de mortos. Porque para Deus todos estão vivos. 22
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12. sob a capa...
Sob a capa da eliminação de tabus e preconceitos parece
que tudo vale. Concordo totalmente com a eliminação de muitos preconceitos e tabus que, durante séculos, a sociedade e a Igreja foram incutindo e mantendo. No entanto parece-me que estamos a cair no extremo oposto. A educação das gerações mais recentes parece-me demasiado liberal. Parece-me que tudo favorece a libertinagem e a falsa responsabilidade. Viva a eliminação de tabus e preconceitos! Mas onde fica a educação para os valores e o bom senso na relação entre as pessoas e no trato social?
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13. Viver como as flores!
Repara bem nas flores.
As mais belas nascem porque Deus assim quer, algumas nascem entre pedras e espinhos, mesmo assim florescem.
Outras nascem até no esterco, mas não permitem que o azedume da terra manche o frescor de suas pétalas. Extraem do adubo malcheiroso tudo que lhes é útil e saudável e mantêm-se sempre puras e perfumadas. É humano e verdadeiramente justo angustiar-se com as próprias culpas, mas não é sábio permitir que os vícios dos outros nos importunem demasiado. Os defeitos dos outros são deles e não nossos. Se não são meus, não há razão para preocupação exagerada. Exercitemos, pois, a virtude de rejeitar todo o mal que vem de fora. Há muitas formas de aprender pela imitação ou pelo confronto. Imitamos as virtudes e recusamos o resto. Isto é viver como as flores.
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14. a saudade, às vezes
Rouba-nos o sorriso
Aperta-nos o peito Tolhe-nos o coração Deixa-nos com um nó na garganta. Faz-nos falta o sorriso O carinho, o mimo A alegria que tu estejas.
Completa insatisfação Tudo fica sem cor Nem sonhar apetece. Como pode um único sentimento, a saudade, Controlar e influenciar todas as coisas?
Talvez porque as outras não sejam importantes Quando falta essa. (para ti, Duarte)
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15. o que vejo?
Corações fechados. Empedernidos, azedos.
Por mil válidos motivos tristes e magoados. O que queria ver? Corações em paz. Alegres por dentro. Generosos e atentos. Disponíveis.
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16. surdo/mudo!
Li há tempos que o vizinho de um salão de uma seita qualquer processou os membros dessa confissão religiosa pelo excesso de barulho. Havia sempre muito barulho e berravam muito dentro desse salão. Esse homem escreveu ao tribunal que respeitava muito ideias diferentes e novas a respeito da fé, mas queria que o tribunal lhe desse razão na expressão: DEUS NÃO É SURDO!
Para falar com Deus não é preciso gritar. Ele ouve sempre com a máxima atenção vigilante. E mesmo que pareça que é um Deus mudo, que não fala connosco, que está distante, não é de certo assim. Deus fala connosco de muitas formas, por muitos sinais e muitas pessoas. Apenas exige que estejamos atentos. É um Deus que não vive apenas para cumprir os nossos “caprichosinhos”, mas, como Pai providente, nada de essencial deixa faltar aos seus filhos.
Mais ainda: o Deus em quem acreditamos deseja que não sejamos nunca surdos à voz d’Ele e à voz dos que connosco estão. Nem deseja que calemos a nossa voz face a injustiças ou problemas que temos de enfrentar.
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17. somos fracos?
Reparem bem como a escuridão termina quando a luz (por
mais pequena que seja) é acesa. Demasiadas vezes continuamos a pensar como dissipar totalmente a escuridão e ficamos mais preocupados com a luz que ainda falta do que com a luz que já será suficiente. Olhando para nós parece-me que está na altura de pararmos de pensar apenas nas nossas fraquezas e limitações. É tempo de dar o devido valor às nossas qualidades e capacidades – para assim vivermos em paz, com sincera e sentida alegria, capaz de superar tudo o que é negativo.
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18. sucesso O sucesso é algo que perseguimos sempre, ainda que por vezes seja de forma inconsciente. A necessidade de ganhar, de conseguir isto ou aquilo é uma sede insaciável, é como uma essência maravilhosa que corre pelas nossas veias e que nos impulsiona a seguir sempre em frente. Durante o tempo da nossa existência terrena vamos perseguindo uma série de sonhos e metas. Constantemente os vamos alterando e ajustando. Outros conseguimos concretizar e, nesses momentos, parece que todo o mundo cabe no nosso coração e transbordamos de alegria como se o tempo parasse. Quando realizamos os nossos sonhos e tocamos o sucesso, renovamos a esperança e a crença na nossa força interior. Hoje quero pedir a Deus este sucesso. Só este tipo de sucesso.
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19. onde está o teu coração?
Aí está o teu tesouro.
Onde está o meu coração? Interessante e importante esta pergunta. De todas as perguntas que a existência nos pode trazer, esta será sem dúvida das mais importantes. A que temos preso o nosso coração? A quem? Ao quê? À família, aos amigos, aos sonhos, à esperança. Se for assim estamos de parabéns!
Aos bens, ao que queremos, ao que achamos merecer? Cuidado. Atenção. Assim vamos perder o tesouro e jamais voltaremos a ter coração.
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20. Homenagem aos meus amigos!
Um amigo é alguém que consegue fazer parar o tempo.
Ainda que não haja tempo e o tempo passe a correr junto dele. Um amigo é aquele que sente vontade de estar contigo, de te ver. Antecipando-se até à tua necessidade de estar com ele. Um amigo é alguém que consegue perceber quando deve falar e quando tem de escutar. Um amigo verdadeiro é aquele que sabe que é tão bom necessitar como ser necessitado. Um amigo é alguém com quem nunca terminamos as nossas conversas: mesmo que passe imenso tempo sabemos sempre onde recomeçar o diálogo. Um amigo genuíno é aquele que consegue apagar o passar do tempo com o som inesperado da sua voz. Um amigo verdadeiro sabe quando é necessário preparar tudo para que tu sejas surpreendido. Tudo faz para que aprendas que a vida é assim mesmo, uma sucessão de fracassos e vitórias, mas que vale a pena pela atenção que damos uns aos outros. Um amigo és tu sempre que quiseres. Obrigado!
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21. agradar a todos!
Como é tempo perdido o tempo gasto a odiar. Não há
tempo mais mal aplicado. O tempo e a energia são para gastar a amar. Não há de sobrar tempo para perder com aqueles que te querem mal. Na vida só nos podem fazer aquilo que nós permitirmos que nos façam. Não percas tempo a tentar justificar-te, porque quem acredita em ti não precisa das tuas explicações e quem não acredita se calhar não as merece. Para, escuta, sente e deixa entrar o amor e o carinho daqueles que te querem bem. Aprecia esta felicidade que é ter quem gosta mesmo de nós. Toma atenção: não esbanjes esta felicidade. Um sorriso, um conselho, uma palavra, podem mudar a vida de alguém e também a nossa. Portanto vamos ser generosos nos sorrisos e nas atenções uns pelos outros. Querer agradar a todos é não agradar a ninguém...
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22. ele conta cada lágrima
Só Deus sabe quanto tu estás cansado e desencorajado por
tantos esforços que não deram frutos. Só Deus sabe o quanto tu tentaste, o quanto até choraste, com o coração cheio de angústia. Só Deus sabe como tu te sentes quando parece que perdeste a vida a colher insucessos e, com voz suave e serena, Ele te convida novamente a recomeçar. Uma e outra vez. Sempre. Quando sentires que já tentaste tudo não te esqueças de simplificar. Faz como fazias em criança: pede ao Pai; insiste. Faz birra com Ele.
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23. Hoje é um dia especial
Hoje é um dia especial.
Simplesmente porque todos os dias são especiais. Hoje quero que seja especial. Nós estamos aqui. Não vale a pena passar o tempo a chorar lágrimas derramadas por motivos do passado ou medo do futuro. Este dia tem de ser um espetáculo de emoções. Não podemos perder tempo. Cada segundo que passa terá de ser uma nova conquista. Não é o tempo que nos agarra a nós. Somos nós que temos de agarrar o tempo. Sente-te livre de indecisões e dúvidas e abraça a vida sem pensar. Vive o dia de hoje porque o ontem é passado, o amanhã mistério. Interessa o hoje; e o hoje é dádiva. Por isso lhe chamamos presente.
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24. transformar cada momento...
Aqui ando eu a correr ao “sprint” para chegar a todo o
lado. Parece-me que a vida é isto mesmo, uma corrida ao “sprint”, mas que exige que em muitos momentos tenhamos a coragem de ver e rever as corridas em “slowmotion”: em câmara lenta e bem atentos para descobrir como haveremos de correr da próxima vez. Pedem-me que transforme cada momento com a alegria e a força da minha presença. Mas cansa ser o centro das atenções. Se vamos e convivemos não deveríamos; se não vamos deveríamos porque temos de conviver. Os finais de domingo são assim. Depois do “stress” e da correria celebrativa ficamos assim: pensativos. Por mais que eu queira e tente não cabem todos no meu coração; também alguns não querem mesmo estar. Mas eu não desisto. Transforma-me, bom Pai do Céu! Preciso da tua força para que nas tempestades da minha vida me dês a mão como deste a Pedro quando ele se afundava ao tentar caminhar nas águas.
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25. Pois é...
Pois é, a vida é assim mesmo
Quase nunca é como queremos Dificilmente é como sonhámos
Demasiadas vezes temos de enfrentar situações que nos [afligem. E temos medo. Revoltamo-nos. Choramos até! Pois é, a vida é assim mesmo… Consola-me a certeza que cada momento da minha vida, Cada lágrima derramada, Cada sorriso partilhado, Está escrito no diário de Deus. Ele toma nota de todos os segundos, Não esquece as nossas lutas, Os nossos desânimos e fracassos. Luta a nosso lado e conduz-nos por onde entende. Confiamos e avançamos. Sofremos, mas venceremos!
Não vale a pena desistir dos nossos sonhos e projetos. Deus olha por nós. Deus está connosco!
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26. Quem gosta de nós?
Secretamente todos gostamos que gostem de nós. Que apreciem o que fazemos, que saibam dar valor ao que nos preocupa ou conseguimos.
Todos precisamos secretamente deste reconhecimento de terceiros daquilo que nos vai ocupando e inquietando.
Tanto gostamos que gostem de nós que temos tendência, até, a guardar, só para nós, aquilo que achamos que pode magoar as pessoas que olham por nós. Temos tendência para esconder insucessos ou derrotas apenas com o receio que isso magoe aqueles de quem tanto gostamos e a quem queremos sempre proteger.
Amar é mesmo isto: tão simples como estar atento! Tão atentos que conseguimos antecipar aquilo que pode ferir ou magoar o outro que tanto amamos. Amar é tudo fazer para que o outro não seja arrastado pelas nossas limitações e dificuldades. Amar é tudo fazer para que o outro se sinta a estrela que mais brilha na nossa existência. O melhor disto tudo é quando sentimos isso, da parte dos outros, em relação a nós. Quando sentimos que nos envolvem e protegem ao limite máximo de nos quererem proteger daquilo que a eles próprios tanto magoa.
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27. Cansado!
Parece que a nossa sina é correr de um lado para o outro
como um bombeiro voluntário que não sabe a que incêndio acorrer primeiro. Precisamos de reencontrar aquela paz interior que em criança de forma tão evidente se manifestava. Um dia de cada vez e cada problema a seu tempo. Descobrir que a vida é muito mais e muito maior que os nossos problemas. Por maiores e mais complicados que sejam. Cansa sentir a nossa limitação. Cansa sentir que não controlamos quase nada por mais poderosos que possamos ser. Cansa correr tanto e descobrir que o resultado do nosso esforço é sempre limitado e parcial. Cansa correr tanto e sentir que a maior parte das vezes este esforço máximo que fazemos não é minimamente reconhecido e justamente retribuído. Mas continuamos a correr porque a vida não é uma prova de cem metros; é uma longa maratona e no final se farão as contas. É constantemente acertar o passo, encontrar o ritmo e continuar. Estoicamente.
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28. silêncios!
Fazer silêncio é das coisas que mais custa. Permanecer
calados ainda vamos conseguindo mas silenciar as inquietações interiores é bem complicado; para muitos é mesmo impossível. Um facto que considero inegável é a necessidade imperiosa que todos temos de fazer verdadeiro silêncio. Precisamos fazer silêncio para nos encontrarmos profundamente com a nossa consciência. Principalmente, vejo como fundamental fazer silêncio para escutar a voz de Deus, que sussurra no mais profundo do nosso coração. Quem experimenta com frequência fazer silêncio sabe que é mais difícil do que na realidade parece! Enfrentar a nossa subjetividade, enfrentar os nossos erros e limitações, escutar as interpelações que Deus faz ressoar no mais íntimo de nós, faz-nos tremer interiormente. É desagradável, por isso, na maior parte das vezes, criar autêntico silêncio. Há silêncios que criamos, há silêncios que falam. Outros nem por isso. Inquieto-me com os silêncios que se criaram nas comunidades cristãs. Onde está o “feedback” ao trabalho dos padres? Queixam-se de forma genérica que os padres falam demais, que dizem sempre o mesmo, que são “chatos”. Poderei até concordar parcialmente. Pergunto-me, no entanto, o porquê de tantos silêncios no final das nossas celebrações. Será que a mensagem não 39
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chegou às pessoas? Será que não lhes interessa minimamente? Custa-me bastante terminar uma qualquer celebração e não sentir minimamente se fui entendido. Sei que tenho um vício terrível. Eu sei que falo depressa demais. Quiçá na nossa formação académica não tenhamos passado demasiado tempo em estudos filosóficos, quando seria necessário estudar a comunicação, a dicção. Mas gostava mesmo assim de sentir o “feedback” das pessoas. Silêncios destes incomodam mais que muitos berros.
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29. Propósitos!
Meu Senhor e meu Deus, nesta cultura violenta quero testemunhar-Te, levando ao mundo palavras de união.
Neste tempo onde todos querem ser servidos, que eu manifeste no mundo a alegria que é servir.
Quando tantos fecham a mão para bater, para agredir, que eu abra o coração para acolher. Num mundo que adora a máquina e a técnica que eu saiba humanizar a pessoa.
Neste mundo que perdeu o sentido do valor da vida, que eu ajude a dignificar a existência humana como dom do Teu amor. Meu Pai do céu: em Ti confio! Em Ti deposito meus sonhos, projetos e anseios! Serei feliz porque jamais abandonas aqueles que amas.
Neste mundo onde todos olham apenas a terra, que eu saiba sempre olhar e apontar o céu.
Nas tuas mãos, ó Pai, entrego confiadamente a minha vida. Faz de mim teu fiel instrumento. Para sempre.
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30. o que procuras?
N
“– a vida ou procuramos estabilidade ou dinheiro ou conhecimento!” Alguém me queria vender esta ideia como verdade revelada. Até posso concordar parcialmente. Se pensar a vida apenas com o intelecto. A verdade é que todos procuramos pelo menos duas destas variantes: estabilidade e dinheiro ou estabilidade e conhecimento. Preferia a segunda à primeira. No entanto acho que na vida procuramos algo mais. É isso que faz andar inquieto o nosso coração enquanto não repousa em Deus.
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31. minuto de silêncio!
Quem me conhece pessoalmente sabe que gosto mesmo
muito de vibrar com o futebol. Tenho assistido a um fenómeno muito interessante. Este fim de semana respeitou-se, antes do início dos jogos, um minuto de silêncio. Um minuto de silêncio como quem diz; agora já não se fazem minutos de silêncio – batem-se palmas. Será que este facto não quer dizer ou simbolizar algo? Claro que simboliza uma bela homenagem. O aplauso é sempre simpático. Eu acho que sim. As pessoas agora têm medo do silêncio. O silêncio interpela e convida à oração. E isso nunca!
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32. a fé das velinhas!
Sexta-feira. Noite do dia 12 de maio.
Junto da porta principal da igreja matriz da cidade um grupo grande de gente, de todas as idades, de vela na mão, aguarda a saída da procissão de velas. Tarda a procissão a sair. Alguém espreita dentro da igreja e reza-se o terço. As pessoas do lado de fora ficam em estado de choque. Então não há procissão de velas este ano? Opinião unânime: os padres tiram-nos a fé e este padre velho já devia ter ido embora. Alguns vão-se embora enquanto outros ficam mais algum tempo. Se tivessem entrado na igreja teriam descoberto que o pároco havia sido internado no hospital há alguns dias e aquele terço estava a ser rezado pelas suas melhoras. “Haja paciência para tão pouca inteligência”– e nenhum amor ao serviço sacerdotal.
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33. Prestígio ou serviço!
Durante muitos anos era um grande prestígio nas pro-
cissões levar as insígnias, as bandeiras, a cruz ou o pálio. Havia terras onde só podia levar a andor do padroeiro a autoridade civil maior presente na terra. Era um prestígio desfilar ao lado do Senhor Prior no ponto alto da vida anual da localidade. Atualmente nota-se cada vez maior dificuldade em encontrar gente generosa para prestar esse serviço. As comissões de festas, as irmandades ou as comissões fabriqueiras debatem-se com dificuldades em arranjar pessoas para levar os símbolos nas procissões. Ainda bem que deixou de ser prestígio e agora é serviço! Descubram as diferenças.
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34. Um restaurante “chique”
Aconteceu faz já algum tempo, num restaurante chique
onde fui a convite de dois amigos. Antes de me sentar, discretamente, muito discretamente mesmo, fiz a minha oração pessoal e terminei fazendo o sinal da cruz. Que cara feia, que cara de escândalo, fizeram na mesa do lado! Aposto que se tivesse dito dois grandes palavrões o escândalo não seria tão grande. Peço desculpa por ter ferido sensibilidades. A fé é o maior mal que afeta a humanidade e por isso tem de ser reduzida ao foro privado de cada um.
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35. Porque será?
Às vezes vou a casamentos onde me custa imenso estar
por diversos motivos. O principal é sentir que o casamento é um pró-forma necessário para a aparência social e para a beleza das fotografias. Habitualmente pouca gente responde na cerimónia. Parece tudo muito distante. Outro motivo é a camada de verniz com que se reveste esta cerimónia. A maior parte dos convidados não se conhece enquanto outros estão por obrigação – e a maior parte está chateada por ter de dar uma prenda ou por ter gasto rios de dinheiro na “toilette”. Hoje estive na ordenação de colegas: três novos padres e dois novos diáconos. Que diferença abismal! Tantos sorrisos e tanta espontaneidade nos aplausos. Gente que canta com alegria, jovens e adultos e mesmo até os idosos vivem este momento com intensidade. Porque será?
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36. oração: gozo ou sacrifício?
A mim custa-me bastante rezar e calculo que não seja só
dificuldade minha. Ou porque estou com calor ou tenho frio, ou porque julgo que fazer outras coisas é mais importante, ou porque estou eufórico ou porque estou com tédio... Tudo serve como desculpa para descurar ou minimizar o tempo de oração. Mas vou tentando rezar; tentando sempre. Esta tentativa e este esforço já são, de certo, oração. Às vezes buscamos na oração um tempo de gozo pessoal e de satisfação espiritual interior. Tantas vezes a oração não é nada disto. Tantas vezes a oração é sacrifício e aridez. Tantas vezes se trava uma luta interior de motivação para rezar – e nada. A oração não terá de ser necessariamente um tempo de gozo e de satisfação (não quer isto dizer que muitas vezes não seja) mas a aridez e a dificuldade em rezar são, por certo, uma bela forma de oração.
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CEM PENSAMENTOS SEM SENTIDO
37. os meus óculos
Disseram-me que os óculos de sol foram inventados pelos
chineses que os utilizavam sempre que faziam negócios. Parece que, quando gostamos muito de uma coisa, a pupila dos olhos se dilata; por isso os chineses utilizavam os óculos para disfarçar a vontade de adquirir algum produto e conseguiam assim adquiri-lo a um preço mais baixo. Aderi à moda dos óculos de sol. Realmente são práticos, principalmente para conduzir. Uma coisa me incomoda bastante: não consigo falar com ninguém enquanto utilizo os óculos de sol e custa-me bastante estar a falar com alguém que não os retira quando interage comigo. Quando isto acontece parece-me que falta intensidade e autenticidade na conversa. “Cada burro com a sua mania...”
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ANTÓNIO MARTINS
38. Conversas do PaC!
Parece-me que a cultura religiosa (não estou a falar de fé)
cada vez é mais diminuta. Reparo que as conversas informais, as conversas de café ou de circunstância entre um padre e outras pessoas (com maior ou menor formação) acabam por ir parar quase sempre ao PAC. Para as pessoas a vida religiosa resume-se ao PAC. Os problemas da Igreja são só os do PAC. A falta de fé ou de cultura religiosa é do PAC. Será? Será que na Igreja só temos três problemas para resolver? Preservativo, Aborto, Celibato?
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CEM PENSAMENTOS SEM SENTIDO
39. os defeitos dos outros!
Facilmente admiro as capacidades das pessoas. Cresci
aprendendo a admirar gente que se entrega a causas, a sonhos. Gente abnegada, esforçada. Tenho agora o privilégio de ser colega, irmão no sacerdócio, de alguns desses que tanto admiro. Acho interessante descobrir, no mais secreto de mim, uma certa satisfação quando descubro nessas pessoas algum pequeno defeito ou limitação. Paradoxalmente, admito que estas pequenas descobertas são para mim um incentivo, não a esconder as minhas limitações e defeitos, a não desistir de procurar ser um sinal positivo da presença e do amor de Deus no mundo – como essas pessoas que admiro sempre foram.
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40. Geração do polegar!
Eu assumo!
Pertenço à chamada geração do polegar ou geração SMS. Durante a minha adolescência generalizaram-se os telemóveis e na altura chegou a ser para mim um vício enviar SMS. Atualmente, muito mais moderado, assumo que continuo a gostar muito de trocar/receber SMS. Desde as mais simples como seja um “bom dia”, “boa noite”, àquelas que eu gosto mais como “reza por mim”, “entrei na universidade” ou “hoje estou triste, não queres ligar?”. Ainda bem que temos estas facilidades de comunicação. Graças a estas “smallmessages”, parece que as conversas nunca acabam e a amizade pode partilhar-se ininterruptamente. A nossa relação com Deus também deveria ter alguma coisa disto. Algo que permanece. Deveríamos permanecer em contínuo contato. Contato simples mas permanente, sincero e intenso – como as SMS. E hoje: já enviaste uma SMS ao Pai do Céu?
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CEM PENSAMENTOS SEM SENTIDO
41. “rally” paroquial...
S
“– enhor padre, eu nunca vi o seu colega em oração pessoal frente ao Santíssimo, não me admira!”
Disse-me alguém, um destes dias, a respeito de um sacerdote que abandonou o ministério. Assustou-me esta constatação. Eu que sou um apressadinho e “stressadinho”. Se calhar também paro poucas vezes em frente ao Santíssimo. Se calhar também entro, demasiadas vezes, nas Igrejas pela porta da sacristia e saio, pela mesma porta, mal retiro os paramentos. Que padres para este tempo? É uma pergunta que me coloco constantemente. Se calhar este tempo, apesar de exigir padres do “rally” paroquial sacramental (missas),não precisa assim tanto deles. Se calhar precisa de padres que sejam verdadeiros mestres de oração.
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42. Um estranho colar!
Numa conversa informal, de amigos, uma das partici-
pantes, que eu mal conhecia (de 16/17 anos), falava convictamente do seu cristianismo não praticante. Conversa fiada e afiada sobre celibato. Depois as larachas habituais, como“a missa é uma seca”. Falámos durante algum tempo sobre os temas habituais. A determinada altura, já cansado de repetir os mesmos argumentos sobre a insensatez da afirmação cristão não praticante, resolvi mudar o rumo da conversa e elogiei-lhe o que trazia ao pescoço. Perguntei-lhe: – Foi alguma dádiva familiar? – Não! Vi-o, gostei e comprei este colar. – Colar – perguntei eu. – Sim! Este fio – respondeu-me. – Isso que trazes ao pescoço é um terço! Não sabias? – Terço?! Aquilo que se reza? E lá tive eu de explicar, pacientemente, a finalidade do colar. Parece-me que temos perdido muitas batalhas na apresentação da proposta de Jesus, mas o pior é que estamos a perder até a guerra da cultura.
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CEM PENSAMENTOS SEM SENTIDO
43. “Café desca(fe)inado”
O meu vício é o café! Aquele aroma, aquele gosto forte.
Criei esta necessidade do café para andar bem disposto! Intriga-me bastante o café descafeinado. Já tentei até, por diversas vezes, trocar – mas sem sucesso. Para mim o descafeinado não substitui o café com a cafeína que tanto mal faz mas que, convenhamos, tão bem me sabe! Às vezes penso que podia comparar o café descafeinado à fé cristã. O descafeinado sabe a café e cheira a café, até parece café, mas… não é capaz de nos tirar o sono. O descafeinado pede-se para matar o vício e para fazer convívio social. A fé que vemos generalizada é um pouco assim, tal qual como o café descafeinado. As pessoas vão à igreja como quem vai tomar um descafeinado. Parece fé; mas não tira o sono e não desafia. Tudo fica na mesma. As pessoas vivem a fé como vício tradicional ou como forma de convívio social. E mais nada. Ficamos pelo aroma da fé. Tomar café é um ritual que criamos. Fico triste quando vejo que a fé está tantas vezes reduzida a um ritual que realizamos e normalmente de forma tão... descafeinada.
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44. Bruxinhas!
Estive há tempos a trocar ideias com um professor de
Religião e Moral. Queixava-se das dificuldades que tinha para exercer da melhor forma a sua missão. Julguei que as dificuldades fossem colocadas por parte dos alunos devido ao fraco substrato familiar e à dificuldade que têm em cumprir regras e aceitar a autoridade de quem exerce o ministério de ensinar. Explicou-me o professor que essa nem era a maior dificuldade que tinha. O maior problema era o próprio ambiente escolar que tem pouco de humano e nada de cristão. E passou a explicar-me com alguns exemplos. Colocar um cartaz alusivo a qualquer festividade cristã é expressamente proibido. Explicar o que é a Quaresma, o Advento, a Páscoa ou até mesmo celebrar o Natal não é permitido; viva a liberdade e laicidade! O mais hilariante, e para mim vazio de sentido, é promoverem o enfeite da escola na época do halloween (que significa véspera de todos os santos, mas que vive uma mística nada cristã). Acho desconcertante porque pode ser publicitado e vivenciado na escola este tipo de festividade e valores dando, em alguns casos, até, direito a folga para atividades extracurriculares.
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45. Um simples código de barras!
Fui com um dos meus meninos às urgências de um centro
de saúde e, apesar das contingências, posso dizer que fomos bem atendidos e muito bem tratados. Havia bastante tempo que não recorria a estes serviços e por isso surpreendeu-me uma novidade. Agora colocam no pulso dos doentes, depois do rastreio inicial, uma pulseira autocolante com um código de barras. Podem dizer-me que utilizam este procedimento como forma de organização e podem até argumentar com uma maior eficácia, rapidez e qualidade no serviço prestado. No entanto, por limitação minha de certo, não consigo deixar de pensar na desumanização das pessoas. Cada vez mais somos um número e não uma pessoa. Qualquer dia implantam-nos um chip e deixamos de ter nome e subjetividade. Seremos um registo informático. Um simples código de barras.
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46. a guerra é um aborto!
Um homem, muito inteligente, decidiu um dia convocar
uma conferência de imprensa. Chamou todos os meios de comunicação social e declarou solenemente: – Somos todos contra a guerra e bem sabemos que a guerra é errada e temos de legislar a este respeito. No entanto, a guerra é inevitável, temos por isso de arranjar uma solução para a tornar lícita e legal. Temos de arranjar uma maneira para que a guerra não incomode terceiros e possa fazer-se da forma mais silenciosa possível. Toda a gente na sala se agitou. Aquele homem não devia estar perfeitamente lúcido. Mas ele continuou: – Sugiro que façamos (melhor: aluguemos) grandes pavilhões longe das populações, e quem quiser guerrear que entre nesses espaços. Temos de colocar um limite máximo de tempo que a guerra possa durar (dez ou 12 semanas; ou 20...isso depois poderemos discutir). O que importa agora é saber que nesses pavilhões as pessoas poderão matar, em condições de higiene e segurança e com acompanhamento médico. O problema da guerra fica assim automaticamente resolvido. Esta será a solução para a guerra no futuro. Quem quiser guerrear basta ter vontade disso e deslocar-se a estes espaços. Assim a guerra será legal, digna e justa. Mesmo que não concorde, os governos deverão usar os seus impostos para pagar o aluguer destes pavilhões.
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47. santos da terra!
Faz já algum tempo fui celebrar uma festa a uma terra
onde nunca tinha ido. Ninguém me conhecia nem eu conhecia tal localidade. Por isso fui cedo para descobrir a capela do santo que se pretendia honrar. Desta vez correu bem e facilmente descobri o lugar. Como tinha muito tempo decidi ir tomar o meu medicamento matinal: o meu café! Entrei no primeiro café que encontrei e o tema, por todos discutido, era a festa do mártir e as tradições de antigamente. Discutiam-se ainda as qualidades do pároco da terra, que por motivo de doença não podia estar. Como ninguém me reconheceu como padre (não cumpro o código que me recomenda traje eclesiástico), a conversa continuou animada. O nosso padre é isto, anda com aquela, só liga ao doutor fulano tal, já cá está há tempo demais, diz sempre o mesmo e é controlado por tal grupo. Não sei até que ponto tudo isto seria verdade. Conhecendo a pessoa em questão sei que exageravam nitidamente. Nada disse. Saí e celebramos demoradamente a festa religiosa com todas as tradições habituais. No final, alguém com quem eu tinha cruzado o olhar no café dirigiu-se a mim e disse convictamente: – O senhor padre é que devia vir para cá! O senhor bispo devia mandar para aqui um padre assim novo e simpático! A minha resposta pronta foi: – … (Pi) Santo é o que cá têm e dizem tão mal dele... Imagino de mim! Acho que escandalizei alguém. 59
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48. Quem me dera ser frigorífico
Hoje apetece-me pedir a Deus que me faça ser mais como
um frigorífico. Pode parecer estranho, mas é isso que peço hoje a Deus. Que eu seja cada vez mais como um frigorífico. Por isso não importa o meu exterior, se sou branco ou preto, lacado ou cor de metal. Não importa se me revisto de forma mais elegante ou me apresento de forma mais simples. Hoje quero ser como um frigorífico. Descobrir que apenas interessa o meu interior. O que guardo. O que cuido. O que conservo. Quero, como o frigorífico, apenas precisar de eletricidade e do gás invisível que refrigera. A eletricidade, acredito, é o próprio Deus que torna possível que eu conserve e cuide. O gás há-de ser o Espírito Santo que me dá a força para nunca deixar de cuidar o que guardo.
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49. dizer mal da igreja!
De tempos a tempos, como padre, apetece-me dizer mal
da Igreja. Apetece-me falar dos erros que comete e das omissões que pratica. Da carga demasiadamente institucional de que tantas vezes se reveste. Penso muito nisto e procuro fazer a minha parte para que, cada vez mais, isto seja coisa do passado. Mesmo assim, às vezes, apetece-me dizer muito mal desta Igreja que amo e, porque a amo, preocupo-me com ela e desejo constantemente que seja ainda mais santa para ser mais fiel a Jesus, seu fundador, e claramente guiada pelo Seu Espírito. Procuro publicamente não criticar esta Igreja e não considero que isto seja uma atitude cobarde ou amedrontada da minha parte. De certo teria muito sucesso. A comunicação social adora um padre “espalha brasas” e, mesmo que só diga asneiras e barbaridades (e por isso mesmo), tem direito a algum tempo de antena na televisão. Parece-me que dizer mal é muito fácil e já temos até gente demais para desempenhar essa importante missão (tanta crítica injusta, desajustada e exagerada): dizer mal só por dizer, ou para ser mais popular ou fazer parte do grupo da maioria. Prefiro olhar e fazer parte do outro lado. Daqueles que amam e servem os irmãos e que, apesar de reconhecerem as limitações e fragilidades da instituição que servem, não desistem de a amar. Sou mais necessário deste lado. 61
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A santa democracia constrói-se sobre maiorias; a Verdade percorre outros caminhos. Aposto que o título fez muita gente ler este artigo. Se o título fosse “dizer bem da Igreja” certamente, julgo eu, não teria tanto sucesso.
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50. Pairar...
Acredito que todas as decisões que temos de enfrentar
exigem de nós várias coisas: 1º – Hipóteses múltiplas; 2º – Tempo para amadurecimento e para a reflexão ponderada; 3º – Oração; 4º – Correr o risco de tentar. Como gostava de poder pairar sobre o mundo e as coisas. Como gostava de poder elevar-me até distanciar-me e ver assim mais claramente a realidade que me cerca – e mais facilmente encontrar o rumo mais correto e direto para os problemas e dificuldades que tantas vezes se colocam no caminho.
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51. tipologia
Em matérias de fé, e sem querer ser demasiado taxativo,
considero ser necessário distinguir três tipos genéricos de pessoas: – as que duvidam; – as indiferentes; – os distraídos. Para mim a dúvida (quando sincera) é sempre legítima e penso ser sinal de quem anda à procura. De quem procura a verdade na fidelidade à sua consciência ou inteligência. Já a indiferença considero-a própria de quem procura fugir à questão central do sentido da vida e da existência – ou porque se julga superior à questão ou porque prefere viver alienado dessa problemática. Mas pior que tudo isto é viver distraído. Viver culpando tudo e todos por causa das questões a que não consigo dar resposta. O pior de tudo, penso, é encher o coração de rancores e/ou colecionar erros de terceiros para lançar confusão. Ou andar de tal forma ocupado em faitsdivers como se estes pudessem alguma vez dar sentido à existência – ou pelo menos serenar ou minimamente saciar a ânsia íntima de felicidade autêntica. Que forma tão estranha tenho eu de pensar. Porque hei-de eu julgar que terei razão?
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52. a.m.a. – as três atitudes fundamentais da vida
A
BANDONAR tudo aquilo que não condiz com o nosso caráter, sentido de vida, objetivos e metas. Tudo aquilo que não agrega, nos distrai e afasta da direção que decidimos dar à nossa vida deve ser abandonado em favor desta causa maior. Muitas pessoas não chegam onde desejam porque ficam prisioneiras do apego a hábitos e a circunstâncias. O apego a coisas erradas é uma âncora que nos mantém presos e nos impede de navegar ao largo.
MANTER tudo aquilo que agrega valor e está em coerência com o sentido de nossa vida, objetivos e metas. Mesmo que muito custe, temos de ser capazes de manter pelo tempo necessário os esforços que fazemos para que, a seu tempo, apareçam os resultados – e estes possam crescer em quantidade e qualidade.
ADQUIRIR o conhecimento, as habilidades e as atitudes para fortalecer as nossas competências – para construir o futuro que buscamos. Deveremos procurar adquirir o que nos falta para tornar as nossas forças mais fortes e trabalhar para diminuir ao máximo as nossas fraquezas e limitações. Se praticarmos os princípios A-M-A (Abandonar, Manter e Adquirir), a nossa realização e os nossos sonhos estão a ser conseguidos.
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53. encontros e desencontros
Encontramo-nos por tantos motivos.
Por motivos sérios, por causas nobres, por motivos laborais – e também por motivos fúteis ou para simples convívio e partilha da amizade. Todos estes encontros, espontâneos ou não, formais ou informais, exigem de nós atitudes próprias adaptadas às circunstâncias. A nossa inserção na família social depende muito da forma como sabemos estar. Viver é isto mesmo: encontrar e desencontrar. Tenho pensado como têm sido os meus encontros com Deus? Mesmo como grupo (familiar, laboral, social) não valeria a pena fomentar mais este tempo de encontros com (e em) Deus? Acredito, sinto e vivo na certeza que o tempo que Lhe damos é o tempo que nós ganhamos.
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54. Comigo são generosos!!!
Contam, como tendo acontecido na minha terra natal há
longos anos, que uma senhora cheia de generosidade foi levar à casa paroquial um cesto de maçãs. Esta senhora foi recebida pela irmã do senhor prior da freguesia (naquela época era habitual as irmãs do senhor padre serem as governantas da casa paroquial). Contam as pessoas mais idosas que terá acontecido o seguinte diálogo: A irmã do senhor padre terá dito: – Temos cá muitas maçãs. As pessoas têm-nos dado, temo que estas se estraguem! A generosa senhora, sem medir e com certeza sem intenção, terá dito: – Aceite-as, menina, porque eu também lá tenho muitas. Olhe que se não são para o senhor prior tenho de fazer como fiz às outras: vão para o porco.
Parece-me que estamos a crescer numa cultura pouco generosa. Damos apenas daquilo que nos sobra – mesmo o nosso tempo. Dar até doer, pelo menos a mim, continua a desafiar-me.
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55. o último ou o primeiro?
A sabedoria popular vai nos ensinando que, se quisermos
ser felizes, deveremos viver a nossa vida como se cada dia fosse o último dia da nossa existência. Tem muita razão esta sabedoria genericamente aceite. Cada dia deve ser vivido com o máximo de intensidade, alegria e entrega. Como se fosse o último dia da nossa passagem pela terra. Apesar de fazer sentido esta sabedoria tradicional, eu prefiro remar contra a maré do senso e sentido comuns e pensar que não deveremos viver a nossa vida como se cada dia fosse o último. Deveremos viver a nossa vida como se cada dia fosse o primeiro. Se cada dia for vivido como o primeiro dia da nossa vida, vamos constantemente surpreender-nos com a beleza da criação, vamos encantar-nos com os afetos e vamos sentir a novidade que é poder ter 24 horas todos os dias para administrar o mais belo tesouro que temos. A vida, claro.
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56. Visualizando rostos...
Tenho amigos com um sorriso radiante, um olhar límpido,
um rosto que evidencia verdade. Tenho amigos sempre atentos e próximos, verdadeiramente solidários e empenhados em colaborar comigo. Tenho amigos que tornam, pela alegria, mais leve a cruz do meu dia a dia. Tenho amigos que continuamente me surpreendem pela forma como na simplicidade são capazes de me estimar. Tenho amigos que considero como “anjos da guarda” que tenho o privilégio de ver.
Os amigos são os irmãos que podemos escolher – disse alguém com muita verdade; eu digo mais ainda: para mim os amigos são um sinal visível de que Deus nos ama mesmo, e de que é possível viver desde já, e aqui, no seu Reino.
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57. o menino do balão
Presenciei certo dia esta deliciosa cena: alguém dá um
balão a um menino, que estava, durante o dia, confiado aos cuidados de um tio por indisponibilidade da mãe. O menino tentou de todas as formas encher o balão. Mas, porque era ainda muito pequeno (não tinha muito mais de dois anos), não conseguiu. Entretanto liga a mãe e pergunta se tudo está a correr bem. O tio do menino, para atestar o momento engraçado, passa o telefone à criança que, colando o telemóvel junto da boca do balão, pede: – Mãe, enche o balão. Enche!
Às vezes a nossa relação com Deus é assim como crianças birrentas que apenas sabem fazer uma coisa: ajuda-me, Pai. Ajuda-me! Fazemo-lo de forma consciente e de forma inconsciente. O que é certo é que habitualmente confiamos e sabemos que é Deus e só Ele que, em última instância, nos pode socorrer. Somos, tantas vezes, assim como a criança que não consegue encher o balão e pede, sem duvidar, ajuda à mãe para encher um balão ao telefone.
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58. o símbolo que não é...
Enquanto me paramentava aproximou-se de mim uma
criança dos seus seis anos. Intrigado, questionou-me: – Como se chama isto que estás a vestir? – Alva ou túnica – respondi eu. Pouco depois interpelou-me novamente e disse: – Agora puseste uma corda na cintura e um cachecol. Prontamente emendei. – Chama-se cíngulo a isto e estola a isto e agora vou colocar a casula. Cada cor tem seu símbolo. – E expliquei de forma muito simples as cores litúrgicas. A criança olhou-me, admirada. – Então isto que vestes é tudo um símbolo. Representa alguma coisa. Só ainda não entendi uma coisa. O cachecol também é um símbolo? – A estola? Sim, claro. – Mas tu escondes o símbolo debaixo da casula.
Quando um símbolo basta… basta! Para muitos símbolos litúrgicos as palavras serão supérfluas ou mesmo desnecessárias! Mas quando o símbolo não é claro ou escondido: como efetivá-lo?
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59. Procura-se
Todos gostamos de ser procurados. Estimados.
Gostamos que seja reconhecida a nossa presença. E mesmo, especialmente, a nossa falta. Parece-me que é isto que está em falta no nosso tempo: Que olhemos não apenas uns para os outros – mas uns pelos outros. Procuremos e deixemo-nos encontrar. Busquemos os outros e deixemos que os outros nos descubram. Aposto que até Deus quer ser procurado. E aposto que gosta de ser procurado. Só nos encontramos se O encontrámos.
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60. “ode” aos meus ombros...
Li, num desses “powerpoints” com português do Brasil
que recebemos em doses admiráveis da parte dos amigos, um texto de que gostei bastante e me fez pensar. Defendia o texto que a parte mais importante do corpo são os ombros. E argumentava longamente na importância que os ombros desempenham na vida humana. Realmente a vida vale pelos ombros que somos capazes de dar aos outros. Vale na medida em que somos capazes de disponibilizar os nossos ombros aos outros, para saborear vitórias ou conquistas e para amparar e servir de base e apoio nas derrotas e dificuldades. Não tenho os ombros muito largos. Sou por natureza franzino mas tenho muita boa vontade e, se há coisa que me faz feliz e sinto valer a pena, é poder disponibilizar os meus ombros para os meus amigos e para todos aqueles que me procuram – seja para uma palavra amiga, para o Sacramento da Reconciliação ou simplesmente para desabafar. Obrigado, Senhor, pelos meus ombros.
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61. Vida...
Como gostamos de ser importantes De ser o centro das atenções Os mais sábios nas opiniões
Tanto que parecemos figurantes De uma peça teatral Que de tão mal Preparada Encenada Fica sem público Sem nada Fica sem sentido Sem rumo Sem futuro Sem prumo Sem viver Apenas existir.
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62. ...
Fazer silêncio
Silenciar tudo à minha volta Tenho medo De escutar o silêncio Desafia-me Interpela-me Mas sabe bem Entrar no coração Sentir-me em comunhão contigo comigo mesmo
Orar é silenciar o que nada interessa. Orar é partilhar o silêncio do amor, da confiança e da [entrega nas mãos de Deus. Para quê as palavras? Se o silêncio basta Para estar comigo Para Te encontrar Para me encontrar Para ser mais em Ti Faço silêncio Para Te falar Para me falares.
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63. Greve... de zelo!
Hoje vou fazer greve De zelo Vou rezar mais Muito mais que habitualmente
Por todos os que se sentem injustiçados E pelos que são injustos Vou rezar pelos que lutam E pelos que se submetem Pelos que mandam E pelos que obedecem
Vou pedir sem desfalecer Justiça social Solidariedade fraternal Amor verdadeiro Entre todos e para todos Junta-te à minha greve!
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64. o meu guarda-chuva
Em questões de Igreja ou em matéria de fé ou testemunho
cristão parece-me que nos abrigamos demasiadas vezes debaixo do guarda-chuva. Até ouvimos, entendemos e aceitamos como válida, a mensagem eclesial mas pessoalmente vivemos como que ignorando esta mensagem e os constantes desafios que esta nos faz. Como que abrigados e protegidos debaixo do nosso egoístico e egocêntrico guarda-chuva. Só aquilo que nós pensamos é que está correto. Só aquilo que vivemos tem valor. Só eu me basto, por isso, que nada me incomode demasiado. Eu até podia ser leitor ou acólito na igreja… mas a vergonha, o trabalho que dá, o incomodo que causa… melhor ficar abrigado debaixo do guarda-chuva da vergonha! Eu até podia ajudar nos cânticos ou no arranjo da igreja ou em alguma comissão paroquial. Mas estão lá aquelas pessoas. Nunca me relacionei muito com elas ou nem gosto muito delas! Será melhor ficar bem resguardado debaixo do meu guarda-chuva da indiferença ou da minha superioridade moral em relação aos outros. Eu até podia ser mais generoso, dedicar-me ao voluntariado ou dedicar mais tempo àqueles que mais precisam… mas prefiro, quase sempre, ficar debaixo do meu guarda-chuva do comodismo e do “não te rales… não te incomodes”! Experimentem, este domingo, não levar um guarda-chuva para a igreja. 77
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65. o sono dos justos...
Fui, faz já algum tempo, pregar a uma festa num domingo
ao final da tarde. Estava já algum calor. O colega que me pediu este favor é já um sacerdote de alguma idade e com bastantes comunidades cristãs ao seu encargo (calculo que sejam pelo menos seis). Pediu-me na sacristia, antes de iniciarmos as cerimónias, para que eu presidisse à celebração, que ele ficaria no primeiro banco porque já tinha celebrado demasiado (admito que não me atrevi a perguntar quantas). – Com certeza – acedi prontamente a mais esta solicitação, e começou a celebração. Eu presidi e ele não concelebrou. Durante as leituras tudo correu bem; no entanto, mal comecei a homilia, passados nem dois minutos, reparo que no primeiro banco alguém dormia. E tão profundamente... Fiquei preocupado. Pensei estar a dizer banalidades que nem ao colega interessavam. No entanto, no final da celebração, fiquei mais sossegado quando uma daquelas “santas”, que há em todas as comunidades cristãs, me disse: – O nosso prior é um santo. Consegue estar em todo o lado. Não pude deixar de sorrir.
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66. 50€
D
“ ou 50 euros a quem me indicar para batizados e casamentos.”
Foi esta a mensagem que recebi no meu telemóvel. Desconhecia o número remetente. E fiquei inquieto. Será alguma piada de algum colega? Algum padre gosta assim tanto destas festas? Descobri, passados alguns dias, que se tratava do número de um fotógrafo profissional. Admito que me apeteceu responder: “Dou 50 euros a quem quiser substituir-me naqueles que eu já aceitei e só me querem lá por causa das fotografias.”
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67. ao mais importante...
Não tenho tempo para
Não tenho disposição para Não me lembro de Não sei Rezar
Vivo inquieto Desassossegado Preocupado Talvez porque me esqueço Do mais importante O importante é amar Ao próximo A Deus
O mais importante É viver em comunhão Com Deus Com o próximo
O fundamental é viver Com as mãos no trabalho O coração em Deus E o espírito disponível para amar.
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68. a igreja em constantes “cuidados paliativos”.
P
arece-me a mim que muitas das coisas que faço, muitas das cerimónias em que participo, alguns dos projetos que sou desafiado a participar, são cuidados paliativos que tenho de prestar. Os últimos cuidados que se prestam antes de morrer. Certas cerimónias, tão só produto da tradição, e até certos projetos, parece que é aguentar até acabar. Preocupa-me bastante descobrir nas paróquias uma religião tão só de tradições e hábitos. Apetece desligar a máquina e deixar mesmo morrer. Mas depois o que fica? Que propomos em troca? Estarão as pessoas dispostas a trocar a religião do “sempre foi assim” pela religião verdadeira e viva? Pior ainda: certos projetos eclesiais que resultaram numa sociedade de cristandade e que ainda mantemos. Avancemos com confiança em quem tudo pode. Dignifiquemos o que está em cuidados paliativos, mas procuremos novas formas e novos caminhos de levar o Evangelho às pessoas. Este não é só o trabalho do padre. Esta é também a tua missão. Estou certo ou estou errado?
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69. aqui...exatamente aqui
Li recentemente alguns relatos de pessoas que escaparam
em Nova York aos atentados do 11 de setembro por se terem atrasado por coisas banais. Um dos casos descritos era o de um advogado que se irritou bastante porque o dono do café permitiu que outros clientes lhe passassem à frente. Outro caso descrito era o de um gestor que apanhou demasiado trânsito e passou o tempo a lamentar a sua falta de sorte. Outro caso era o de uma jovem mãe que se atrasou porque as crianças decidiram fizer birra logo pela manhã e ela demorou mais tempo do que habitualmente a deixá-las no infantário. Intrigante… Naquele dia, para aquelas pessoas, se tudo corresse bem, sem dificuldades ou problemas, estariam no emprego a horas e teriam provavelmente falecido. Estariam no lugar errado na hora errada. Fiquei a pensar. Por mais que me custe a missão que tenho a desempenhar, por maiores que sejam as dificuldades que tenho de enfrentar, onde eu estiver procurarei sempre assim pensar: – É aqui, exatamente aqui, que Deus quer agora que eu esteja.
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70. a sinceridade das crianças!
Numa dessas festas de catequese, o sacerdote percorria a
ala central da igreja, durante a homilia, em diálogo aberto com as crianças. Tentava desta forma explicar agradavelmente as leituras usando este método dialogado. Foram surpreendendo o sacerdote a forma como as crianças respondiam com qualidade às perguntas colocadas. Estavam muito bem preparadas! Pior foi quando quis falar sobre a importância da Eucaristia, a centralidade deste sacramento e a necessidade de a Eucaristia ser sempre uma festa. Dizia o sacerdote: – Se a missa não é uma festa não faz sentido celebrá-la! E, se a missa não é uma festa, a culpa será de quem? As crianças ficaram envergonhadas e a resposta não foi pronta, como nas questões anteriores. Surgiu entretanto alguém corajoso, que disse baixinho: – … do padre? Não conseguiu o padre deixar de rir pela sinceridade da resposta. Muita gente crescida também pensa assim. Vivem como se Jesus tivesse dito: – Fazei isto, padres e bispos, em memória de mim e se algo estiver mal a culpa será só vossa! Pobre culpa que morre sempre solteira.
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71. Para tudo “PP”
Quando tudo parece estar mal e não consegues os teus
objetivos, pensa PP. Quando te sentires sozinho, triste ou doente, pensa PP. Quando desanimares com a vida, ou com as pessoas que fazem a tua vida, pensa PP. Quando te sentires impotente face ao mal, pensa PP. Quando disserem mal de ti de forma injusta, pensa PP. Entendido? Então não te esqueças de pensar PP: Paciência e perseverança. Sempre!
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72. maravilhas
Foram há tempos divulgados os resultados das novas sete
maravilhas do mundo. A maior maravilha são as pessoas; por isso, aqui apresento aquelas que considero ser as minhas sete maravilhas pessoais: 1– Saber que sou amado por Deus, por isso vivo. 2– Saber que tenho na minha família o meu porto seguro de abrigo. 3– A certeza da amizade sincera de tantos. 4– A alegria de poder ajudar de forma descomprometida. 5– A grandeza do meu ministério. 6– Saber que estou nas mãos de Deus. 7– Todos os dias poder aprender e crescer na comunhão. E as tuas: quais são?
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73. descubro-me!
N
“ ão existe nada mais sem sentido do que procurar o sentido das coisas!” (Frase que retirei de um e-mail que recebi e desconheço o autor.)
Se pudesse atribuir um Óscar à frase mais sem sentido dos últimos tempos, sem dúvida escolheria esta. Enquanto nos contentarmos com as aparências e o superficial, ou com as respostas mais evidentes, tenho a certeza de que jamais seremos capazes de encontrar a raiz (essência) da felicidade. Qual a nossa essência? Qual o nosso sentido? O que nos define mais profundamente? Que horizontes buscamos? Que conquistas interiores ansiamos? Voltas e voltas poderemos dar, mas tenho a certeza de que a Jesus iremos sempre parar, pois apenas Ele pode responder-nos a estas inquietações tão profundas. Apenas Ele nos pode conduzir na autêntica e profunda descoberta de nós mesmos. Na exata medida em que conheço a Deus descubro-me a mim próprio.
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74. saudades do verão
Verão, férias para o descanso e para a diversão. Quebra-
-se, num curto ou longo espaço de tempo, a rotina do dia a dia. Cada um, a seu modo, aproveita para fazer algo que gosta: um passeio cá dentro ou fora, uma praia para bronzear, um espaço para visitar, um encontro com amigos que não se veem constantemente, entre outras tantas coisas. No entanto, outros também aproveitam para pensar e avaliar o que têm feito, outros anseiam pelo futuro: se irão ou não entrar na universidade tão desejada, onde irão ser colocados no próximo ano letivo, onde irão exercer e desempenhar aquilo para que se formaram ao longo de todo um curso. E todos anseiam pelo melhor, com mais ou menos entusiasmo. Neste período de tempo, Deus continua presente, embora, às vezes, mais esquecido pelos seus filhos. Ele continua presente em qualquer espaço em que nos encontremos. E continua a amar-nos, a contar com a nossa atenção. Deus chama em qualquer estação do ano, em qualquer lugar. Basta estarmos um bocadinho atentos, disponíveis para O escutar.
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75. serenidade
M
“ arta, Marta, andas inquieta e preocupada com muitas coisas, quando uma só é necessária. Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada». (Lc 10, 42) Sempre a correr Sempre inquietos Sempre ocupados Por isso Sempre longe De Deus
Jesus porque nos ama Porque se preocupa connosco Quer ver-nos serenos Tranquilos Quer encontrar-nos Centrados No que é mais importante Nele próprio E na sua mensagem
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Da conversa à conversão Da conversão Ao verdadeiro acolhimento Dos irmãos De Deus Muito que fazer? Nunca. Muito que rezar: sempre!
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76. milagres: que os há...há!
Como gostávamos de os ver e de os atestar constante-
mente! Como gostávamos de ver as leis da natureza serem constantemente alteradas em função das nossas vontades, desejos ou caprichos… Eu acredito que todos os dias sucedem milagres, pequenos e grandes. O mais difícil é estar atento e ser capaz de os descobrir. Reparemos em casos concretos: este ou aquele venceu, pelo seu esforço e apoio divino, esta ou aquela dificuldade; teve sucesso em determinado empreendimento ou venceu tentações ou limitações que impedem a liberdade e felicidades mais profundas. As coisas mais simples do dia a dia são muitas vezes as mais ignoradas; no entanto, parece-me que, na maior parte dos casos, são as mais grandiosas. Constituem, em si próprias, os maiores milagres. Hoje quero falar de uma pessoa que faz milagres… Sim! Faz! E já conseguiu muitos. São milagres pequenos, praticamente impercetíveis, mas tenho a certeza de que fez, pela perseverança na oração e pela confiança em Deus, ao longo da vida, imensos milagres. Ultimamente essa pessoa precisa ela própria de um milagre. A doença grave ameaça-a de forma violentíssima e, com a mesma confiança em Deus que com ela aprendi, peço eu hoje ao bom Pai do céu um milagre. No entanto, 90
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sei e sinto, quero e anseio que se faテァa sempre a Vossa Vontade. Mas como eu gostava que, neste caso, a Vossa Vontade fosse a minha. Bendito sejais Senhor agora e para sempre! テ[en.
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77. tantos s(s)...
Se tudo for feito com Amor e ingenuidade,
Se todos se amarem mutuamente, Se a felicidade for uma Eternidade, Se a tristeza for mera passagem, Se a amizade for sincera e de Verdade, Se a vida, for um Dar acima de receber, Então descobriremos que foi em cada um desses momentos que nosso coração bateu mais forte e que agimos pura e simplesmente como seres Humanos.
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CEM PENSAMENTOS SEM SENTIDO
78. a minha mochila
A vida é uma caminhada. Para uns uma caminhada longa.
Para outros uma caminhada mais breve. Para alguns uma caminhada mais intensa; para outros uma caminhada mais serena. Importa que caminhemos, trilhemos o nosso caminho e não passemos o tempo a ver os outros caminhar e apenas apontar o dedo como juízes de todos os outros. Todos caminhamos. Peregrinamos na vida. Ao longo da vida vamos completando a maior universidade. Os maiores ensinamentos são trazidos pelos dias que passam e pelos anos que se somam. Enquanto caminhamos vamos arranjando bagagem que colocamos às costas. Enquanto peregrinos da existência levamos como que uma mochila, na qual colocamos tudo aquilo que serve para caminharmos tranquilos, prontos para cada acontecimento e para estarmos seguros de chegar onde queremos. A mochila que carregamos ao longo da nossa existência humana dá-nos a segurança de termos o essencial para progredir dia a dia; e vamos ao longo dos dias acrescentando coisas. Importa não carregar demasiado a mochila, para não nos condenarmos a carregar com pesos excessivos, para não nos sentirmos tentados a não prosseguir viagem. Hoje queria interrogar-me sobre aquilo que trago na minha mochila da existência. 93
ANTÓNIO MARTINS
Que coisas carrego? Serão assim tão importantes e fundamentais para mim ou ando a sobrecarregar-me com coisas supérfluas que em nada me ajudam a caminhar? Quero em primeiro lugar transportar, na minha mochila da existência, a linha do horizonte. Quero ao longo da vida ser capaz de subir mais alto, para ver mais longe. Quero ser capaz de colocar a esperança mais longe do que o tempo que dura a caminhada. Quero colocar as mãos no trabalho com generosidade, mas sem nunca esquecer de colocar o coração em Deus. Sempre mais, sempre melhor, sempre mais próximo de Deus. Quero transportar também comigo a minha família e amigos. Eles são os mais importantes ao longo da caminhada. Eles são o nosso porto de abrigo, são a nossa âncora da existência. Na mochila invisível que carregamos todos os dias, convêm também levar uma toalha que pode servir para descansar, para me renovar, para me limpar daquilo que não me dignifica. Deus quer sempre perdoar-me e tudo o que deseja é que eu me levante sempre mesmo que caia muitas vezes. Convêm também carregar um par de chinelos – para o caminho. Quero na minha mochila transportar uns chinelos como sinal de quem está disponível para seguir a vontade de Deus – mesmo que essa vontade não seja a minha. Queremos ter sempre a coragem para nos colocarmos no caminho a caminho de Deus (Deus não nos faz sempre as vontade todas; mas não nos há de deixar faltar o essencial para o caminho). Terço – porque convém trazer sempre uma arma connosco. Uma arma poderosa que vence todas as outras. A arma da oração. Quero também carregar alguns medicamentos – para tratar as feridas do caminho. As minhas e as dos outros. Ao longo 94
CEM PENSAMENTOS SEM SENTIDO
do caminho podemos magoar-nos e precisamos do abraço, do beijo, do carinho, da saudade de quem gostamos. Que tenha sempre medicamentos destes para mim e para partilhar com os outros que no caminho precisam. Transportarei na minha mochila alguma água – que renova, limpa, refresca, revigora. Quero carregar também a alegria e a responsabilidade de ser batizado. Na mochila que carregamos todos os dias, importa também levar alguns valores – não apenas valores financeiros que dão apenas segurança aparente, mas os valores da paciência para o caminho, silêncio, fraternidade, amor e fé. Deus não pesa na mochila; pelo contrário, ajuda-nos a caminhar – não somos nós que O levamos. É Ele que nos leva a nós. Que Deus abençoe a nossa caminhada diária e nos ensine a distinguir o essencial do acessório. Que caminhemos com Deus e para Deus.
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79. Um abraço
Quem não gosta de um bom abraço? Um abraço forte e
sentido? Dizem que um abraço é o espaço mais curto entre dois amigos. Os abraços são dados de muitas formas e com diferentes significados. Há abraços que dizem: “Fico muito contente com a tua amizade...” Existem abraços que expressam o orgulho que se sente por alguém especial. Também há abraços que dizem: “Não existe ninguém no mundo igual a ti.” Há abraços doces e ternos que são dados em momentos de tristeza... Com um abraço também podemos dizer “Sinto muito”, quando alguém está a passar por um momento difícil. Há abraços que damos para dizer “Que bom teres vindo”, e outros que dizem: “Sentirei a tua falta quando estiveres longe de mim...” Não faltam também abraços perfeitos para fazer as pazes. E os abraços cheios de carinho, que nascem do coração. Existem abraços para diferentes ocasiões; abraços rápidos e abraços demorados, um para cada razão, um para cada momento. Porém, de todos os abraços, o mais carinhoso é aquele que diz: “Tu estás sempre no meu pensamento. Porque és meu amigo e eu quero-te sempre muito bem”. Diz a sabedoria popular que só se realiza um grande amigo depois de um grande abraço.
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80. Justo juiz
Ninguém é justo juiz em causa própria. E menos justos
somos quando julgamos os outros. A cegueira do orgulho impede-nos demasiadas vezes de ver e assumir os nossos limites e defeitos e, nessa mesma medida, impede-nos de ver e reconhecer o valor e as qualidades dos outros. Por isso, somos habitualmente demasiado condescendentes para connosco e excessivamente severos para com os outros. Deus não se deixa ir em cantigas, não se deixa cativar por meras palavras – por mais belas que sejam. Deus não se deixa impressionar pelas aparências. Por mais hábil que alguém seja na arte de iludir, não consegue enganar a Deus. Por isso, para quem quer e procura a salvação de Deus, só lhe resta o caminho da humildade e da sinceridade, da verdade e do amor, do arrependimento e do perdão. Quem vive deste modo passará, muito provavelmente, despercebido aos olhos dos homens. Mas conseguirá a aprovação e a recompensa de Deus.
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81. o único tesouro
Um tesouro é algo raro, recorda histórias de piratas,
diálogos de namorados, sonhos de riqueza. Um tesouro acorda esperanças, ultrapassa comodismos e medos, dá coragem e confiança. Deus como tesouro significa que Ele não é uma renúncia, uma diminuição, uma mortificação, mas é uma conquista, um luxo abundante, mais vida dentro da própria vida. Quando conquistado não se troca por nada, não se vende, não se perde. Como tesouro, Deus é o contrário das coisas banais e supérfluas, o oposto de uma vida qualquer, mas é multiplicação de vida, de projetos, de possibilidades. É surpresa, encanto, horizonte ilimitado. Por um tesouro arrisca-se tudo. É o que Deus sempre faz; o seu tesouro é o homem. Por nós, abandona a tranquilidade da eternidade para contemplar o homem na palma da sua mão, como pérola preciosa, resplandecente do Espírito que anima a argila modelada. Deus vende tudo, entrega tudo, por causa do tesouro da humanidade. Até o seu bem mais precioso: o próprio Filho – no Calvário.
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82. sem título
No mais profundo do nosso ser ansiamos pela imorta-
lidade. Na rotina do dia a dia ansiamos pelo reconhecimento do nosso trabalho ou das nossas ideias. Talvez este desejo de imortalidade aliado à necessidade de reconhecimento das nossas ideias me leve a querer escrever estes textos. Apetece-me chamar sempre ao que escrevo: “Sem Título”. Porque é assim que começa: sem título, sem ideias, sem pretensões. Sinto a inquietação de olhar uma folha em branco. Uma folha vazia pode ser algo assustador ou, pelo contrário, será algo extremamente libertador. Ambas as coisas serão verdade. Assusta porque responsabiliza; mas também liberta de amarras o que apenas pensamos. Escrevo apenas porque acho importante fazê-lo; porque penso que as palavras que ressoam dentro do meu coração não podem ficar amordaçadas. Atraiçoar-me-ia se não partilhasse estas ideias desconexas que, de forma tantas vezes arrebatadora, guerreiam o meu espírito e me ocupam fechado no meu mundo mais secreto e interior. Gostava que este texto fosse catártico. Escrever é comprometer e só assim faz sentido. Por onde hei-de começar? Talvez por aquilo que é mais importante: o amor. 99
ANTÓNIO MARTINS
O que saberá um padre sobre o que é amar? Poderão pensar que pode ter amado, mas não experimentou o compromisso que o amor sempre traz consigo. Poderá buscar o Amor de Deus e procurar de que forma Deus ama. Por isso, quando um dia escrever um livro, ele deverá ter os seguintes capítulos: 1 – Capitulo I – O Amor – Fé; 2 – Capitulo II – A Paz – Amor Prático – Caridade; 3 – Capitulo III – A Esperança – O Sentido e Meta. Aposto que nunca o conseguirei escrever em papel. Tentarei, no entanto, escrever nas páginas da vida que todos os dias, queira ou não, escrevo.
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83. Uma prenda: aceita-a
Habitualmente falta-nos o tempo. Dizemos que não temos
tempo para nós, que não temos tempo para concretizar os nossos sonhos, que não temos tempo para ir à igreja. Não temos tempo para estar com os amigos ou para simplesmente descansar. Mas felizmente vai havendo pessoas que conseguem aumentar o tempo e de forma generosa colocam ainda o seu tempo ao serviço dos outros. Como gostaria de oferecer, como prova de gratidão, a todas essas pessoas um relógio. Uma prenda muito simples e bem singela. Esta prenda seria o símbolo que orgulhosamente poderiam usar no braço por usarem bem o tempo que de Deus generosamente receberam. Que Deus lhes dê muito tempo para poderem gastá-lo connosco. Que nós consigamos aprender, da melhor forma possível, os valores cristãos que transmitem pelo seu exemplo.
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84. recordo-vos
Recordo mentalmente muitos rostos e muitos sorrisos!
Recordo momentos únicos e pessoas que, sendo humanas, têm a centelha divina. Recordo tantos que se levantam cedíssimo, arrumam e preparam tudo, para que durante o dia a casa fique em condições e não falte a refeição a nenhum dos membros da família, trabalham todo o dia e suportam tantos problemas. Isto todos os dias. Heróis sem nome próprio: o pai, a mãe, aquele amigo. Recordo aqueles que, apesar disto tudo, ainda encontram tempo para ajudar alguma associação ou grupo eclesial. Recordo aqueles que ainda são capazes de dar o seu tempo, a sua motivação e a sua energia para o bem comum. E agradeço a Deus por nos colocar tantos anjos no caminho. Agradeço a Deus por todos os dias nos ensinar a dignidade do trabalho e de aprender com os outros. Agradeço a Deus por colocar no nosso caminho tantos que mereciam uma estátua – como exemplo e testemunho para os outros. Exemplo de luta, esforço, trabalho, persistência. No fundo: exemplos de amor.
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85. as coisas mais belas
O
1– sorriso é o cartão-de-visita das pessoas saudáveis. Tenho de o distribuir gratuitamente e de forma generosa.
2– O diálogo é a ponte que liga as duas margens, do Eu e do Tu. O diálogo há de ajudar a resolver todos os problemas de relação entre as pessoas.
3– A bondade há de ser a flor mais atraente do jardim de um coração bem cultivado. Temos de oferecê-la gentilmente. 4– A fé é a bússola certa para os corações errantes. Temos de utilizá-la sempre.
5– A alegria é o perfume gratificante, fruto do dever bem cumprido. O mundo precisa deste perfume.
6– A esperança é o bom vento que empurra as velas da barca da vida. Deixemo-nos guiar. 7– O amor é a melhor música na partitura da vida. Sem amor, a vida será desafinada.
8– A paz interior é o melhor travesseiro. Que sempre consigamos viver em paz com Deus, com os irmãos e com nós mesmos.
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86. estimada vida...abre o coração!
Estimada vida!
Fica a saber que tu és a “pendura”; eu sou o motorista. Estimada vida! Fica a saber que tu vais no lugar do morto e eu quero encontrar a VIDA.
Por isso, hoje quero dar conta de que o coração que trago no peito é como uma porta que tanto abre para dentro como abre para fora. Quem quiser viver em paz consigo e com Deus tem de ser capaz de abrir, em primeiro lugar, a porta do coração para dentro: – Para se conhecer bem. – Para constantemente verificar os valores e princípios mais marcantes que ocupam o seu coração. – Para permanentemente se desafiar a melhorar e a crescer por dentro no amor a Deus e ao próximo.
Também será importante, para quem queira alcançar a salvação, abrir a porta do seu coração para fora: – Para ajudar os outros. – Para partilhar valores e princípios. – Para manifestar externamente a alegria e paz em que queremos sempre viver.
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87. Pedrinhas...
Encontrei na Internet a seguinte história que conto à
minha maneira. Certo monge encontrava-se muito doente na sua cama. Era já idoso e havia tropeçado numa pequena pedra quando ia buscar água para o convento e tinha fraturado alguns ossos nas costas. Com muitas dores, mas lúcido como sempre, recebeu de um monge seu colega um importante ensinamento. – Caro amigo. Que esta queda te sirva de ensinamento. Habitualmente são as pedras pequenas que nos conseguem derrubar, pois nas grandes nós tomamos atenção e desviamo-nos a tempo. Assim acontece na nossa vida. Habitualmente negligenciamos os pequenos factos e acontecimentos, deixando-os de lado, o que mais tarde nos poderá trazer grandes transtornos ou problemas. Nós, porque somos racionais e inteligentes, vemos bem, e antecipamos os problemas grandes e tomamos as devidas providências para resolvê-los. O problema habitualmente está nas pedras pequenas que, no caminho que percorremos, podem facilmente derrubar-nos. A pequena pedra da preguiça, a pequena pedra do nosso orgulho, a pequena pedra da nossa distração, fazem-nos cair demasiadas vezes e esquecer a fidelidade a Deus e aos irmãos. Na nossa vida poucas são as pedras grandes que nos afastam de Deus. Habitualmente são as pedras pequenas 105
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da rotina, do não te rales, que nos fazem cair e nos impedem de ser mais de Deus e mais próximos do nosso próximo.
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88. Caminho parecido... destino comum
Durante a nossa vida terrena todos percorremos um caminho parecido. Para uns mais longo, para outros mais curto; para uns mais fácil, para outros mais exigente.
Durante a nossa vida terrena todos percorremos um caminho parecido. Lutamos por sonhos e projetos, construímos as nossas relações de familiaridade e amizade de forma muito semelhante. Na vida todos temos um caminho parecido e um destino comum. Durante a nossa vida terrena cada um percorre o seu caminho, busca os seus sonhos, tenta situar-se da melhor forma possível nas circunstâncias que tem de enfrentar. São caminhos diferentes que cada um de nós percorre em relação aos outros; mas são sempre caminhos muito próximos e semelhantes. Para todos o caminho da vida física termina de forma igual. O caminho da vida é semelhante, mas o fim da vida terrena é igual para todos. Todos um dia partiremos, deixaremos este lugar e teremos contas a apresentar Àquele que, por dom gratuito de amor, nos quis dar a vida e este tempo de partilha da existência, cruzando os nossos caminhos com o caminho de tanto outros. O nosso destino comum é este desejo profundo que sentimos de repousarmos na paz e no amor pleno que o Criador nos tem. 107
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Durante o caminho que é a nossa existência deveremos procurar merecer esse destino comum. Deveríamos pensar muitas vezes nesta realidade. Sentir que percorremos um caminho semelhante aos outros que connosco partilham a existência. Se nós temos problemas e dificuldades, os outros também têm. Se nos sentimos por vezes desanimados ou perdidos, de certo não estamos sozinhos: muitos dos que conhecemos passam por iguais ou maiores dificuldades. Sentir que percorremos um caminho semelhante aos outros deve fazer de nós pessoas mais tolerantes, generosas e pacientes. Sentir que temos todos o mesmo destino comum deve fazer de nós pessoas mais fraternas, sentir que todos somos irmãos, que caminhamos para o mesmo fim: a comunhão plena com o Pai que, Misericordioso como é, nos irá acolher e dar a bem-aventurança. Se temos o mesmo destino de que vale a pena tanta confusão, tanta trapalhada e desassossego?
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89. toda a minha força
Um menino pequeno estava a esforçar-se ao máximo para
mover um pesado armário, mas o móvel não cedia. Ele empurrava e puxava com toda a sua força, mas não conseguia movê-lo nem um centímetro. O pai, que ali chegava, parou para observar os vãos esforços do filho. Finalmente perguntou: – Filho, estás a usar toda a tua força? – Sim, estou – gritou o garoto, exasperado. – Não – disse calmamente o pai. – Não estás. O menino parou de tentar empurrar o móvel e interrogou o pai porque dizia tal coisa, visto que já suava por todos os poros por fazer tanto esforço. O pai, calmamente, disse-lhe: – Sabes porque é que ainda não estás a usar toda a tua força? Porque ainda não me pediste para te ajudar.
Acontece-nos isto, por certo, muitas vezes. Lutamos muito. Fazemos imensos esforços e, se calhar, até reclamamos porque ninguém nos ajuda. Pensamos que usamos toda a nossa força e coragem para resolver os nossos problemas – mas, se calhar, com frequência esquecemo-nos de pedir ajuda ao nosso Pai do Céu (ou à nossa Mãe).
Hoje queria pensar sobre esta necessidade, que sempre deveremos sentir, de pedir ajuda ao Pai do Céu. Igualmente também pedir ajuda à nossa Mãe e Mãe de Jesus – e só estaremos a usar a nossa força toda quando os sentirmos connosco. 109
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90. Faltar o combustível
Os Evangelhos contam-nos uma parábola sobre as lâm-
padas que se apagaram porque faltou o combustível. Faltou o azeite para manter as lâmpadas acesas. Falta-nos também o combustível para tantas coisas: 1 – Falta combustível nos carros (cada vez está mais caro e sentimos a dificuldade em manter todas as deslocações que fazíamos); vivemos na ditadura da economia e temos de manter toda esta estrutura económica pesadíssima que não olha nem cuida das pessoas – apenas se serve delas. 2 – Falta combustível nas relações: parece-me que está a faltar verdade nas relações e as pessoas relacionam-se revestindo-se de poderosas armaduras interiores, para não correrem riscos de ser mal interpretadas ou mal avaliadas. 3 – Falta combustível na nossa relação com Deus. Falta dar tempo Àquele que nos dá o tempo todo.
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91. Vamos dialogar
O que é dialogar? É comunicar do coração ao coração.
1º A clareza Para que todas as palavras e gestos sejam compreendidos por ambas as partes. Esta clareza supõe atenção ao que se diz e atenção ao que o outro diz. Esta clareza exige falar verdade. Faltar à sinceridade é destruir, pela base, qualquer diálogo.
2º A mansidão O diálogo não é orgulhoso, não é altivo, não é ofensivo. A autoridade vem-lhe da verdade que expõe, da caridade que difunde, do exemplo que propõe; é proposto – não é imposto. O diálogo é pacífico, evita os modos violentos, é paciente e é generoso. Por isso, ele supõe a humildade, a disposição para reconhecer com apreço a parte de verdade que o outro tem e a parte de erro ou culpa que eu possa ter.
3º A confiança A boa fé, a reta intenção, com que cada uma das partes, parte para a conversa, sem preconceitos, aceitando o outro, respeitando-o – e colocando-se até, por vezes, do seu lado, para compreender o seu ponto de vista.
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4º A prudência É preciso saber as condições psicológicas e morais, daquele(s) com quem quero falar, se é criança, se é inculto, se está indisposto, se parte para a conversa desconfiado ou hostil. Essa prudência leva a tomar pulso à sensibilidade alheia e a modificarmos as nossas palavras e modos, para não sermos desagradáveis ou incompreensíveis.
5º A seriedade Saibamos ainda preparar um diálogo sério com o outro conversando primeiro com Deus, pedindo-lhe discernimento e sabedoria para aquilo que queremos compreender, propor, mudar ou alcançar.
Se conseguirmos assim dialogar sempre uns com os outros, o nosso mundo será de certeza absoluta muito melhor. Haverá muito menos palavras balofas. Haverá muito menos líderes sem coração e muito menos egoísmos na relação entre as pessoas.
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92. aprende!
P
1– odes ser importante, podes ser fundamental, podes ser absolutamente necessário. Mas não és insubstituível. 2– Só és essencial a quem te ama. 3– Às vezes é preciso sair de cena e esperar que o sábio tempo termine o filme de forma feliz. 4– Sem egoísmos, cuida mais de ti. Não podes nem deves viver a vida que os outros querem que vivas. A vida é dom de Deus para ti. Arruma-te. Administra-te.
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93. solução
Como gostava de ter sempre uma resposta pronta e sábia
para todas as questões que me levantam. Como gostava de ter um conjunto de receitas prontas a servir face às dúvidas e inquietações que tantos me levantam. Como gostava de saber citar sábios autores e ter sempre na ponta da língua a resposta da Sagrada Escritura. Mas não tenho. Então: serenidade e trabalho. A pressa é má companheira para quem busca a autêntica sabedoria.
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94. o que deixo
Desta vida nada se leva, sรณ se deixa.
Entรฃo vou procurar deixar sempre o meu melhor sorriso, o meu maior abraรงo. Vou procurar sempre deixar atrรกs de mim a mais linda histรณria, a mais compreensiva com todos.
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95. Uma ideia absurda!
O absurdo é talvez a única realidade que verdadeiramente
faz sentido. Não resolvo nada de absoluto, não entendo nada de forma final. Então só o absurdo consigo assumir como realidade que faz sentido. Por isso acredito em Deus. Ele é absolutamente absurdo. Sabiam que absurdo não significa apenas “incompreensível”? Esta palavra tem a sua raiz no Latim “absurdus”, que significa “desagradável ao ouvido”. É isto mesmo que, hoje, Deus é para a nossa cultura.
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96. Quero ser cruzeta
Para segurar os outros.
Para manter sem vincos os que em mim se amparam. Para carregar tudo o que tiver de ser pendurado, sabendo que hei de ficar bem preso ao varão do armário que me há de sempre segurar. Peçam-me e convençam-me a mudar de opinião, mas nunca tentem mudar-me os sentimentos!
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97. ser ombro
Ombro amigo.
Todos precisam de um ombro amigo e precisam também de ser um ombro amigo. Ajudar os outros a carregar as suas cargas é nobre e produz a experiência de se sentir útil, para que aquele “osso fraturado” seja colocado no lugar e se calcifique. Mais do que simplesmente dar a mão. Mais que permanecer atento ao outro. Procuremos ser ombros uns dos outros. Carregando-nos e sendo carregados.
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98. simplifiquemos!
Temos uma tendência natural para complicar as coisas,
para tornar tudo demasiado confuso e complexo. Isto aplica-se a todas as dimensões da nossa vida e ao próprio sentido e finalidade da existência.
De onde viemos? Que fazemos aqui? Para onde vamos? Serão sempre as grandes interrogações da humanidade que se hão de sempre colocar a todos os que vivem com intensidade a vida e não passam apenas pela vertigem do tempo – sem se interrogarem sobre o seu sentido, caminho e destino. Viemos de Deus. Acreditamos em Deus Pai Criador. Acreditamos que, por amor primeiro e por amor generoso, Deus quis criar todas as coisas e criar o ser humano. Cada um de nós é obra-prima, obra especialmente amada, do Deus Criador e Senhor de todas as coisas. Nenhum de nós pediu a vida; acredito que é dom gratuito de Deus. Estamos aqui enquanto peregrinos e temos como modelo Jesus Cristo – a revelação plena de Deus para nós. Acreditamos em Jesus Salvador! Não estamos sozinhos. Acreditamos no Espírito Santo que nos fortalece, auxilia e caminha connosco. Acreditamos na presença constante e íntima de Deus em nós pela força do seu Espírito. Sabemos e de alguma forma sentimos que a força de Deus nos ajuda, a cada dia, a carregarmos a cruz das nossas 119
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dificuldades e inquietações – a continuarmos a ter esperança que o dia de amanhã há de ser melhor e mais positivo na dimensão humana e na dimensão da paz espiritual que todos gostaríamos de sentir permanentemente.
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99. sensibilidade(s)
Quem não gosta de aplausos? Por mais tímidos que sejamos gostamos da alegria de um aplauso sentido. Hoje, ao assistir na televisão à transmissão das cerimónias de Fátima, feriu-me a sensibilidade tantos aplausos. Consigo entendê-los (sei da sinceridade de muitos) mas custa-me suportá-los. Cada vez mais as coisas sagradas parecem um espetáculo a que se assiste – mas que não compromete.
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100. Posso passar a limpo?
Acontece, com muita frequência, quando peço aos meus
alunos algum trabalho escrito ou marco algum exercício prático: perto da hora de entregar o resultado final há sempre alguém que me pede: – Posso passar a limpo? Ainda tenho tempo? Às vezes não deixo. Outras vezes, facilito ao máximo para que voltem a ler o que escreveram e acrescentem mais qualquer coisa.
A vida é assim mesmo. Queremos fazer tudo muito bem e nem sempre conseguimos. Riscamos e tentamos de novo. Às vezes fazemos um balanço e olhamos para o global e apetece-nos passar a limpo. O melhor de tudo é que Deus deixa-nos sempre passar a limpo. Para Deus estamos sempre a tempo de passar a vida a limpo.
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Posfácio
Flashes da vida que fazem pensar A vida que vivemos, no deslizar imparável do tempo, aparece-nos sempre como sendo uma sequência de momentos mais ou menos relacionados entre si e ponto final. De facto, não é assim, porque cada acontecimento é, de facto, um alçapão que pode abrir ou não para dimensões novas, embora desconhecidas de quem, por inércia ou culpa da cultura ambiente, anda distraído. Ora, esta sequência de textos, que se leem com prazer, é, na realidade, sequência de flashes de luz que pretendem tão só abrir brechas e alçapões na vida quotidiana para a outra dimensão. Podem ser realidades materiais, como o carro e a casa; realidades das novas tecnologias, como um simples “power-point” que nos traz desassossegos; são sentimentos que atravessam a alma da pessoa, como a relação com os amigos; mas também podem ser experiências de perda e insucesso que levam a lágrimas contadas; é o sentimento de fazer com que cada momento seja o primeiro elo criativo da novidade que sonhamos; é o silêncio, por vezes pesado, que abre para novas dimensões da vida. Tudo isto é o dia a dia da nossa existência no tempo, que, de facto, nos questiona sobre o presente e sobre o futuro. O que está em causa é encontrar o fio da meada e com a originalidade que lhe é própria e em que mais ninguém o pode substituir. É este entusiasmo pela vida e pela vida com verdadeiro sentido que encontramos no texto Cem pensamentos sem 123
ANTÓNIO MARTINS
sentido (ou com muito sentido). Cada um sentirá, no fio da sua leitura pessoal, que o muito sentido se vai sobrepondo ao sem sentido aparente desta sequência de reflexões feita ao ritmo do dia a dia. É este também o meu voto.
Guarda, 13 de fevereiro de 2014 Manuel R. Felício, Bispo da Guarda
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