Cozinha Comum Itinerante

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As definições apresentadas a seguir tratam-se de ideias em movimento. Com elas pretendemos introduzir o leitor à prática da Cozinha Comum Itinerante a partir alguns conceitos presentes no desenvolvimento do trabalho, constando nossa percepção dos locais pelos quais a cozinha transitou, e também as pessoas e coletivos que fizeram parte da construção e desenvolvimento do projeto.


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Belo Horizonte Para que mais de 4 milhões de habitantes possam se alimentar, a cidade comporta em sua estrutura uma rede de transporte do que é produzido no campo ou na região metropolitana aos centros de distribuição, e de lá para mercados locais, de onde são comprados e depois preparados. Uma complexa rede de relações sociais, trabalhistas e estruturas espaciais é construída e mobilizada nesses processos. Discutir alimentação na cidade é pensar as formas de produção existentes, resistentes e apagadas pelos processos de urbanização, e a diversidade de culturas que habitam o ambiente urbano.

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Cozinhar Cozinhar é uma possibilidade de intensa troca, onde conflitos se transformam em relações de aprendizado mútuo. Cozinhar nas cidades Nas cidades grandes a atividade de cozinhar geralmente ocorre em espaços privados. Muitas pessoas não cozinham em casa, se alimentando de comidas feitas por outros. Pouco se sabe sobre o local de onde vêm, como são preparadas, transportadas e quem são as pessoas envolvidas nesses processos. A aglomeração de sujeitos no espaço público através de preparos coletivos possibilita uma outra relação com o ambiente construído, reivindicando o caráter coletivo e a apropriação subjetiva da cidade.

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Espaço público Lugar que permite o encontro de diferentes atores sociais, favorecendo a criação e a articulação de parcerias para a produção e manutenção do espaço de uso cotidiano. Estratégias de ação As estratégias de ação são desenvolvidas pelo coletivo junto aos parceiros. Partindo dos interesses em comum, delimitamos as possibilidades de trabalho em cada situação e a prática se dá sem projeto prévio, sendo construída coletivamente através de um processo compartilhado e adaptável aos contextos e circunstâncias do projeto. Provocação O convite a levar a atividade de cozinhar para a rua junto a desconhecidos funciona como provocação à reflexão acerca da dinâmica cotidiana, e tem o potencial de criar novas relações entre quem participa. Saberes tradicionais Englobam receitas, usos medicinais da comida, usos rituais dos alimentos, formas de preparo, artesanias e modos de produção tradicionais a cada cultura e tempo. Saberes que, em uma dinâmica de consumo urbana, tornamse ameaçados. A prática do arquiteto Partimos do incômodo de, em nossa formação acadêmica, sermos provocados a imaginar, propor e atuar constantemente no território de um outro. Levamos a essas pessoas imaginários de cidade que nos parecem interes-


santes, enquanto nossa faculdade e vizinhança por vezes não recebem a mesma atenção. A cozinha itinerante como dispositivo consegue se inserir em contextos diversos, se adaptando às dinâmicas locais e propondo novas formas de agir. Alimentação A alimentação pode ser um processo distinto daquele que nos é oferecido, quando nos damos conta da complexidade que o ato de se alimentar representa. Percebemos uma distinção entre aquilo que se considera “alimento de verdade”, e os alimentos processados, pobres em nutrientes, atualmente oferecidos em grande escala nas redes de distribuição. Cozinha coletiva A cozinha é um espaço de troca e criação de vínculos entre pessoas. A Cozinha Itinerante explora o potencial educativo presente no compartilhamento de práticas de preparo coletivo, tornando-se um lugar onde o fazer aproxima as pessoas sem apagar suas individualidades, permitindo trocas informais. Evidencia-se o lugar político da cozinha, onde decisões são tomadas em várias escalas. Trabalhar com o outro Pensamos coletivamente o uso da cozinha enquanto dispositivo, exercitando suas potencialidades e possibilidades. Foram realizados preparos, mutirões, cinema, festas, exposição, publicações, oficinas, troca de mudas e outras situações.

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Territórios É importante ter o cuidado de conhecer o território a ser trabalhado, buscar parceiros ou agentes culturais locais para fazer a interlocução entre a comunidade e o coletivo, abrindo possibilidade de diálogos e criação conjunta de um modelo estrutural para atuar como ativador do projeto em cada território. As metodologias adotadas visam assegurar o contato na escala do corpo, 1:1, assumindo as responsabilidades que surgem no contato direto. Acreditamos que a criação de situações de diálogo fortalece a compreensão do sentido de sociedade e, através delas, parcerias são articuladas provocando uma redescoberta da potência das micro ações, permitindo uma conscientização que somos sujeitos ativos na transformação de nossos espaços. Linguagem Para que as atividades aconteçam de maneira clara, tentamos criar uma linguagem acessível, que não intimide as pessoas a participar. A cozinha se transforma então em um mecanismo de diálogo e a práxis em expressão. Prática processual O tempo previsto para as ações muitas vezes é maior que o planejado, os desvios no planejamento são assimilados nos processos. Sendo assim, é de extrema importância deixar claro aos parceiros que as atividades propostas nem sempre terão um produto final como retorno. As estruturas

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de funcionamento propostas são trabalhadas constantemente e, assim, consideramos os momentos em que o projeto perde a força importantes para rever a prática, as estratégias utilizadas ou se houve uma mudança no foco de interesse.

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Desdobramentos Os desdobramentos percebidos por vezes não serão acessíveis, pois são subjetivos, acontecem na escala do corpo e da transformação do pensamento. Podemos, no entanto, observar, através das situações, que a ação exerceu alguma influência. No Morro das Pedras, por exemplo, adolescentes que se mostravam no início das atividades pouco receptivos às atividades propostas, aos poucos começaram a despertar a confiança e se tornaram ativos nos processos, quebrando barreiras e fazendo adaptações das receitas experimentadas. Cozinha Comum A Cozinha Comum teve início em 2013 quando um grupo de alunos da Escola de Arquitetura da UFMG montou uma cozinha coletiva na faculdade. A ideia nasceu da necessidade de autonomia alimentar para os estudantes. Aa cozinha ganhou formas diversas tanto no que diz respeito a sua estrutura espacial quanto ao seu funcionamento, em experiências pontuais que permitiram compreender a estrutura necessária para a atividade de cozinhar na rua e sua potência enquanto prática urbana.

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Bairro Funcionários Um dos mais antigos bairros da cidade de Belo Horizonte, foi sede do poder administrativo e centro comercial voltado às classes de alta renda. As casas com quintais foram aos poucos substituídas por prédios, restando poucas hoje em dia. Nesse contexto se localiza a Escola de Arquitetura e Urbanismo da UFMG, nosso ponto de partida para transitar a Cozinha Comum Itinerante. A cozinha no Funcionários Propusemos um calendário com atividades que buscaram uma aproximação da vizinhança e o estabelecimento de diálogos específicos em torno de temas que nos interessavam como linhas de pesquisa no território. Morro das Pedras Belo Horizonte é uma cidade planejada a partir de uma malha ortogonal delimitada pela Avenida do Contorno. Fora desse perímetro, zonas de chácaras e uma das pedreiras utilizadas para retirada de matéria-prima para construção da cidade, onde hoje se encontra uma das entradas do complexo de favelas do Morro das Pedras. História em Construção Coletivo cultural formado em 2008 por moradores do Morro das Pedras para, através da arte e política, questionar um processo de intervenção urbana na Vila Antena vinculado ao Programa de Aceleração do Crescimento – PAC – urbanização de vilas e favelas. Atualmente, passadas as demandas mais urgentes e havendo conquistado um espaço físico, o grupo movimenta even-


tos e ações dentro da favela, ligadas às memórias e tradições dos moradores e à ação direta no espaço público. Família Canuto A família Canuto nos conta que chegou no Morro das Pedras quando ali era tudo mato. Haviam poucas casas espalhadas em uma vegetação densa. Eles contam que lá as pessoas sabiam viver do território: identificar plantas comestíveis, cultivar hortas, criar galinhas. A matriarca lembra do tempo em que descia até a atual Avenida Barão Homem de Melo para buscar água para a casa. Na época, tudo precisava ser aproveitado. Uma vez por semana levava todos filhos para o rio, para lavar roupas com outras mulheres. Famílias como os Canutos, que se instalaram no território há muitos anos, ainda mantêm vivas práticas tradicionais ligadas à alimentação. A cozinha no Morro das Pedras A Cozinha Itinerante atuou em três eixos simultâneos. O primeiro consistiu em ações semanais com a turma do ProJovem, programa municipal de arte-educação para jovens de 13 a 17 anos. O segundo tratou de ações com famílias tradicionais e o terceiro eixo corresponde a ações protagonizadas pelos moradores do Morro, que se apropriaram da cozinha para agregar propostas a atividades comunitárias da Vila da Antena. Urca A consolidação do conjunto cultural da Pampulha induziu o crescimento informal de localidades em seu entorno. Dentre elas se inclui o bairro da Urca.

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Centro Cultural Pampulha Antes de se institucionalizar como Centro Cultural, a comunidade utilizava da área para realizar eventos no bairro. A atual equipe gestora do Centro Cultural agrega a vizinhança envolvendo pessoas da comunidade na elaboração de suas atividades. Costumes alimentares da Urca Conhecendo a história e as referências alimentares das mulheres do bairro, conseguimos entender melhor suas relações com o consumo de comida. Muitos dos costumes que nasceram enquanto elas cresciam continuam presentes atualmente, sendo reinventados de forma criativa a partir de uma situação social de maior estabilidade. A cozinha na Urca O interesse do grupo de mulheres da Urca em aprender práticas alimentares saudáveis levou ao formato de atuação através de encontros semanais para preparos coletivos, pautados por elas. Essa foi uma estratégia para, a partir dos preparos, estimular a troca de saberes pelo grupo. Propusemos o preparo de alimentos que expandissem o universo culinário formado por elas, com ingredientes ora livres de glúten, açúcar ou de derivados animais, ora ricos em carboidratos complexos, fibras e proteínas. Durante as 8 semanas de atividades, experimentamos pratos e conhecemos histórias e receitas baseadas em trajetórias particulares mas que remetem a um campo maior do saber culinário.

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COZINHA NA HORA TROCA DE MUDAS ALIMENTOS QUE CURAM COZINHA DA OCUPAÇÃO PASSEIO PANCS BANQUETE “MEMÓRIAS DE RESISTÊNCIA” OCUPAR, COZINHAR E RESISTIR COZINHA COM SECUNDARISTAS CAFEZINHO CONTRA A PEC CARTILHA COZINHAR E RESISTIR ZINES E CARTAZES

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Bairro Funcionários – escola de arquitetura da ufmg. O coletivo propôs um calendário de ações que nos aproximaram da vizinhança: cozinha na hora; troca de mudas; alimentos que curam; caminhada PANC e memória gustativa. A partir dessas ações, desenvolvemos linhas de atuação para o território, que envolveram os vizinhos, alunos e funcionários. O uso do calendário foi substituído por atividades que deram apoio à ocupação estudantil que aconteceu durante os 2 meses finais de trabalho no bairro.

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Cozinha na Hora

14 de outubro de 2016

duração: 10h às 16h local: feira semanal na região do bairro Funcionários público estimado: 100 pessoas (feirantes, vizinhos, trabalhadores da região, alunos da Escola de Arquitetura da UFMG) de onde vem: A escolha desse local se deu por ser uma feira pequena, na escala da vizinhança, onde os feirantes e clientes se conhecem e estabelecem trocas. Essa é uma das feiras de alimentos que ainda resistem à uma tendência de transição do consumo para supermercados e lojas de grandes redes que atualmente dominam o comércio nas cidades. processo: Preparo de alimentos com ingredientes vindos da feira, escolhidos na hora a partir do diálogo com os feirantes e consumidores. As comidas foram oferecidas aos feirantes, vizinhos e transeuntes como forma de convidá-los a trocar receitas e saberes culinários. Na falta de ponto d’água foi utilizada uma bacia para armazenamento e outra para limpeza dos utensílios. Distribuímos um calendário com as ações planejadas para a permanência da cozinha no bairro. efeito: Algumas pessoas se aproximaram para tomar um chá, suco ou provar a comida. Experimentando os alimentos, estabeleceram diálogos. Alguns deixaram receitas ou contaram histórias e ajudaram a conseguir um ponto de coleta de água para os preparos. cardápio: Suco de laranja, chá de casca de laranja com hortelã, tabule servido na casca de laranja

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Troca de Mudas

15 de outubro de 2016

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duração: 10h às 16h local: Praça externa da Escola de Arquitetura da UFMG público estimado: 30 a 40 pessoas (vizinhança do bairro) de onde vem: O coletivo se interessou por investigar o plantio nas residências da região, caracterizada pelo alto número de edifícios e poucos espaços verdes. O convite para trocar mudas e receitas teve como intenção iniciar um diálogo com vizinhos que possuem plantas em seus apartamentos e descobrir suas estratégias de cultivo. processo: Organizamos as mudas sobre as prateleiras da Cozinha Itinerante e fizemos chás para receber os vizinhos que se aproximavam. Pessoas que tinham visto a divulgação realizada anteriormente no bairro apareceram, junto a transeuntes interessados. Propusemos troca de receitas por mudas. efeito: A pequena escala deste evento contribuiu na maior proximidade com os vizinhos. Pessoas se sentaram conosco, trocaram receitas e histórias. Criamos novas relações na vizinhança e aprofundamos o contato com vizinhos que já conhecíamos. Uma vizinha escolheu uma muda de malva, nos contou de uma receita de pudim com essa planta e nos convidou para ir em sua casa provar o doce que tinha feito. Depois um amigo compartilhou sua receita de moqueca capixaba de banana da terra e preparou o prato na praça, servindo de almoço às pessoas presentes. cardápio: Chás e moqueca capixaba de banana da terra mudas trocadas: Tomilho, sálvia, alecrim, lavanda, alfazema, guiné, malva, morango, peixinho, capuchinha, babosa, melissa, hortelã, pimenta biquinho, alho poró e pimenta dedo de moça. T1


Troca de Mudas

15 de outubro de 2016

Receita da Tônia de pudim de malva: 4 ovos 1 lata de leite condensado 1 lata de leite 1 colher de maizena folhas de malva Colocar o leite para ferver com as folhas de malva (ela usou 4 e achou pouco). Coar o leite e esperar esfriar, em seguida bater no liquidificador com os outros ingredientes e assar em forno médio até dourar.

Receita do Rafael Machado de moqueca capixaba de banana da terra: Colocar alho, sal e urucum para fritar na panela. Adicionar uma cebola picada e deixar por um tempo, depois acrescentar quatro tomates, um molho de coentro, um molho de cebolinha e meio pimentão, todos picados miúdos. A banana da terra deve ser partida ao meio e adicionada quando os temperos já estiverem bem cozidos.

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Não mexer muito para não desmanchar a banana (usar colher de pau).

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Alimentos que Curam

17, 18 e 19 de outubro de 2016

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duração: Preparo: dia 17 de outubro (9 às 18h) / evento no bairro Funcionários: dia 18 de outubro (16 às 19h) / evento no Campus Pampulha da UFMG: dia 19 de outubro (16 às 19h) local: Praça externa da Escola de Arquitetura da UFMG e gramado da Escola de Música do Campus Pampulha da UFMG parceiras: Zora Santos, Ana Cimbleris e Cozinha Comum público estimado: Cerca de 200 pessoas de onde vem: Ao receber um convite da Semana do Conhecimento da UFMG para trabalhar uma abordagem dos saberes tradicionais ligados a saúde e bem-estar do corpo, construímos a proposta de um preparo coletivo aberto e dois dias de compartilhamento das receitas e saberes. processo: Iniciamos um diálogo com Zora Santos, cozinheira e pesquisadora de receitas de tradição negra a partir das memórias de sua família, e Ana Cimbleris, pesquisadora de plantas medicinais no Vernalis. A partir da conversa com Zora elaboramos o cardápio em torno de um único alimento, o cará, devido à sua riqueza medicinal. Com Ana construímos jardineiras temáticas, com espécies medicinais utilizadas no tratamento de doenças comuns no nosso cotidiano. Com participantes da Cozinha Comum da escola de arquitetura, editamos um material gráfico sobre as plantas medicinais, seus efeitos e usos. efeito: O evento discutiu e coletou dicas e receitas para saúde e bem estar, e distribuiu zines sobre as plantas medicinais. cardápio: Pão de cará, geleia de maçã verde, pimenta e chuva de ouro, geleia de hibisco, conserva gengibre, patê de cará, chás de ervas medicinais. T1


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Conserva de gengibre da Zora

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“Tinha uma conserva que minha mãe usava em sanduíches e saladas que faço até hoje. Depois de descascar o gengibre, ela o laminava de forma a ficar transparente. Depois levava ao fogo com água até levantar fervura. Escorria e deixava esfriar. Enquanto isso, fervia uma parte de vinagre branco, duas partes de água, uma pitada de sal e uma parte e meia de açúcar. Depois de frio, misturava as duas partes deixando o gengibre mergulhado na calda. Os vidros eram esterilizados em uma panela grande. A conserva colocada cuidadosamente nos vidros que eram fechados hermeticamente e lacrados com cera de abelhas. Depois de abertos eram conservados em geladeira”.

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Pão de Cará

Misture o fermento com a água e deixe hidratar por uns 5 minutos. Coloque no liquidificador o ovo, o fermento, o sal, o cará e o leite. Bata até virar um creme grosso. Coloque esta mistura numa bacia e junte a farinha de trigo integral. Vá juntando farinha de trigo branca aos poucos, mexendo sempre com uma colher de pau. Quando ficar difícil de mexer, comece a sovar com as mãos, juntando mais farinha até conseguir uma massa lisa que não grude mais nas mãos. Junte a manteiga em pedacinhos e sove para homogeneizar a massa.

Se precisar, acrescente mais farinha. Cubra com plástico e deixe a massa crescer até dobrar de volume. Passe a massa para uma superfície enfarinhada e divida em três porções. Modele os pães e coloque em assadeira untada e enfarinhada, deixando espaço entre eles. Deixe crescer novamente. Pincele leite, faça cortes na superfície. Leve ao forno pré-aquecido à temperatura alta e deixe assar por 10 minutos. Abaixe a temperatura e deixe assar por mais 50 minutos ou até que fiquem dourados.

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1 envelope ou 1 colher (sopa) de fermento biológico seco 4 colheres (sopa) de água 1 ovo 1,5 colher (chá) de sal 2 xícaras de cará cozido, espremido e frio 1 xícara de leite morno 150 g de farinha de trigo integral 500g de farinha de trigo branca 40 g de manteiga sem sal leite para pincelar


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Patê de cará Cará, azeite extra virgem, sal, pimenta dedo de moça, noz moscada. Cozinhar o cará e depois bater no liquidificador com um pouco da água de seu cozimento, até obter uma massa pastosa. Refogar o patê no azeite, misturando os outros temperos.

Geleia de Hibisco

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Flores de hibisco desidratadas e açúcar cristal Hidratar o hibisco em água morna por uns 20 minutos. Levar ao fogo o líquido do hibisco com açúcar cristal na mesma proporção, mexer com uma colher de pau até dar ponto.

Geleia de Ipê Amarelo com pimenta 100g de flores de Ipê (usamos chuva de ouro) açúcar cristal 100g de pimenta dedo de moça picada 06 maçãs verdes Ralar as maçãs e ir acrescentando açúcar para não escurecer. Levar a maçã ao fogo, junto dos outros ingredientes, misturando, até obter o ponto de geleia. O ponto da geleia: pegue um pouco do xarope fino e levante a colher, a última gota deve gelatinizar em sua borda.

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Uma reflexão sobre plantas anônimas com utilidade alimentícia e medicinal, Ana Cimbleris Começamos essa reflexão por dois dizeres que você provavelmente já ouviu antes. O primeiro foi proferido por Hipócrates: “que seu remédio seja seu alimento, e que seu alimento seja seu remédio”. Esse dizer, revolucionário para o seu tempo, é agora objeto de pesquisa da área da saúde em diversos campos, como a medicina preventiva, a nutrição funcional e diversas outras.

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O segundo dizer é popular: “para quem não conhece, toda planta é mato”. A contrária é verdadeira: para quem conhece, todo mato é planta. Muitas são as plantas que crescem como “mato” e que podem ser usadas na alimentação e na medicina. As plantas espontâneas apresentam altíssimo valor nutricional, por retirar o melhor do solo, mesmo quando esse é pobre em nutrientes. Além do mais, podem ser gratuitas e excelentes para a saúde, promovendo segurança alimentar e nutricional, além de uma gastronomia rica e surpreendente. Para obter esse mato, não precisamos comprar sementes, mudas, regar, adubar ou usar nenhum tipo de produto contra pragas. Até mesmo nas áreas urbanas, onde os caminhos geralmente são calçados ou pavimentados, elas podem ser observadas nos terrenos baldios e rachaduras das construções. Surgem também nos quintais não capinados e nas áreas abandonadas.

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Muitas vezes as pessoas se esforçam para cultivar as espécies convencionais, “da moda”, esquecendo-se de aproveitar plantas espontâneas, que poderiam ser usadas medicinalmente ou na culinária, sendo deliciosas e ricas em nutrientes. São cotidianamente arrancadas dos canteiros planejados para couve e alface: molhos e molhos de caruru, beldroega, bertalha, dentede-leão, serralha, tanchagem.... Com o processo da globalização, a biodiversidade dos diversos países muitas vezes sumiu das mesas, e o Brasil não é exceção nesse cenário. Muitas dessas espécies contam com indicação comprovada cientificamente para diversos problemas de saúde comuns, como gripes, ansiedade, gastrite, inflamação, feridas, dentre diversas outras. Um conceito que está sendo difundido atualmente é “planta alimentícia não convencional” designada pela abreviação “PANC”. Já ouviu falar? Elas não são consumidas pela grande maioria da população nos tempos modernos, por falta de costume ou de conhecimento. Esse termo se refere a partes das plantas (frutos, folhas, flores, rizomas, sementes, etc) que podem ser consumidas pelo homem, cruas e/ou após preparo culinário. Além das ‘partes de plantas não convencionais’, também trata das ‘partes não convencionais de plantas comuns’, como por exemplos o uso das folhas de batata-doce e do mangará (coração) da bananeira na alimentação. As PANC têm potencial para complementação alimentar, diversificação do cardápio e dos nutrientes ingeridos. Também podem representar uma diversificação das fontes de renda T1


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familiar, através da venda de partes das plantas ou de produtos processados (geleias, pães, farinha etc), que pode inclusive incrementar o turismo rural ou gastronômico. Muitas das PANC, assim como plantas medicinais desconhecidas pela grande população, são referenciadas como mato ou plantas daninhas, por brotarem espontaneamente entre as plantas cultivadas ou em locais onde não “permitimos” que isso ocorra. Além disso, não são difundidas pelos meios de informação, caindo muitas vezes em desuso.

O resgate e a valorização das variedades tradicionais das espécies representam ganhos importantes do ponto de vista cultural, econômico, social, nutricional e de saúde. O cultivo dessas espécies é feito na sua grande parte por populações tradicionais e agricultores familiares que preservam o conhecimento acerca de seu cultivo ou extrativismo, e também do seu consumo, passando-o de geração a geração.

lista de plantas selecionadas pela Ana Cimbleris >

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Diversas espécies importantes do ponto de vista medicinal e gastronômico, hoje desconhecidas, tiveram um papel importante no passado. Muitas vezes, foram largamente utilizadas pela população, e, por mudanças históricas, passaram a ter expressão econômica e social reduzida, perdendo espaço e mercado para outras opções, como alimentos e medicamentos industrializados. Diversas espécies de plantas úteis não estão organizadas enquanto cadeia produtiva propriamente dita, não despertando o interesse por parte de empresas em geral.

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a. serralhinha b. mil folhas c. saião d. tanchagem e. beijinho f. melissa

g. cidreirinha (capim-carona) h. capuchinha I. alfavaca-cravo j. capim cidreira k. hibisco l. maria-gondó (capiçoba)

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m. gengibre n. funcho o. cará p. damiana q. bel droega r. coentro do pará

s. hortelã-pimenta t. jambú u. centela

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Cozinha da Ocupação

24 de outubro a 16 de dezembro de 2016

duração: 55 dias local: Escola de Arquitetura da UFMG público estimado: 40 cozinheiros, 400 estudantes e professores, centenas de transeuntes e visitantes. de onde vem: A Escola de Arquitetura da UFMG foi ocupada por seus estudantes em mobilização contra a PEC 241 (depois PEC 55). Tomamos a decisão de flexibilizar a estratégia de ação da cozinha no território e apoiar a causa estudantil. processo: A ocupação se organizou através de Grupos de Trabalho (GTs), dentre eles o GT Cozinha, responsável por alimentar participantes e visitantes diariamente. Os pratos eram desenvolvidos de acordo com as doações recebidas pela ocupação, pensando sempre em elaborar uma alimentação inclusiva (vegetariana e que levava em consideração intolerâncias alimentares dos participantes). A princípio foram pensados alimentos para comer com as mãos, pela falta de utensílios. Com a arrecadação de pratos e garfos a forma de preparo foi também se alterando durante o período. efeito: Cozinhando na praça chamamos atenção de passantes que se surpreenderam ao ver em uma atividade política dois dispositivos móveis de cozinha. Alguns se aproximaram e, conversando sobre as comidas, passaram a se interessar pelo movimento e apoiar a ação dos estudantes. Nesse período, vizinhas conversaram, compartilharam receitas pessoais, doaram alimentos ou dinheiro para a cozinha, e chegaram até a participar dos preparos conosco. cardápio: centenas de receitas foram desenvolvidas. T1


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Receitas sem data quibe guacamole creme de abóbora semente de abóbora assada berinjela refogada iogurte natural feijão tropeiro com ora-pro-nóbis capitão de feijão com abóbora capitão de feijão com batata doce panqueca de banana e laranja com recheio de geléia de damascos jiló refogado cuscuz com queijo e coco cuscuz com goma de tapioca e coco cuscuz com molho de tomate e espinafre feijão de corda molho de berinjela mandioca no azeite com alho frito e cebolinha espetinho de legumes com curry e ervas finas farofa de banana com queijo e manteiga bolinho de arroz com molho verde

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farofa de banana com legumes e ovo maionese de ervas farofa de banana com ervas batata rosti macarrão de abobrinha falafel caldo de mandioca com pimenta caldo de mandioca com curry caldo de mandioca com canela tabule servido na folha de alface molho de tomate com ervilha e milho caldo de feijão com legumes bolinho de arroz torta de legumes crepe vegano salada de batata inglesa patê de abobrinha abobrinha grelhada tapioca com quiabo frito no dendê tapioca com doce de banana patê de inhame com alho torrado mandioca cozida com manteiga suflê de legumes

trouxinha de repolho com legumes batata recheada yakissoba vegano bolinho de chuva berinjela à parmegiana pão chapati macarrão da alzira beringela à parmegiana crepe vegano salada de agrião com manga capitão de feijão de corda torta de legumes salada de frutas legumes no shoyu purê de batata com beterraba couve refogada legumes cozidos bobó de mandioca no tomate assado com azeite e ervas arroz com açafrão batatas chips abóbora com pesto risoto mexicano salada de folhas e tomate empadão vegetariano carne de casca de banana verde creme de beterraba macarrão com molho T1


de legumes salada de repolho com limão lasanha de berinjela e abobrinha arroz integral com talos de hortaliças maxixe recheado com feijão de corda arroz com cenoura arroz com passas arroz com legumes arroz com espinafre banana verde frita suco verde suco de laranja suco de limão suco de laranja com chá de hibisco suco de melão com hibisco suco de laranja com maracujá chás café águas aromatizadas pão de abóbora pão 10 dobras pão de batata pão de café pão simples pão de queijo pão recheado pão de cebola na frigideira pão de banana

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doce de casca de abacaxi geléia de manga batata assada com alecrim chutney de jabuticaba com pimenta geléia de pimenta sorvete de banana mingau de milho na casca de laranja com confit de limão geléia de casca de maçã geléia de jabuticaba geléia de casca de beterraba jambo cristalizado chutney de manga pudim de leite condensado com malva salada de frutas geléia de maracujá e manga brigadeiro geléia de goiaba pudim de abóbora e coco com confit de limão macarrão com molho branco e espinafre macarrão alho e óleo bolo de chocolate bolo de maracujá bolo de fubá bolo de cenoura bolo de maçã

bolo de banana bolo de limão bolo de maçã e banana bolo de bagaço de milho bolo de banana caramelada bolo de cacau e beterraba flocão de milho bolo de chocolate vegano bolo de maçã e creme bolo de merengue invertido bolo de mandioca torta de maçã

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Cozinha da Ocupação

Cardápio de uma semana Segunda-feira, 24/out Não teve café da manhã. Almoço: Bolinho de arroz (com páprica picante), torta de legumes. Jantar: Caldo de mandioca com pimenta, caldo de mandioca com curry, caldo de mandioca com canela, caldo de feijão e legumes.

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Terça-feira, 25/out Café da Manhã: Pão vegano, bolo de cenoura, geleia de maçã e biscoito de aveia. Almoço: Crepe vegano com patê de abobrinha crua, tomate, cebola, cenoura, pimentões (verde, vermelho, amarelo) picados, quibe de berinjela, guacamole, pudim de leite condensado com malva (receita da Tônia, vizinha). Lanche da tarde: Crepes e salada de frutas. Jantar: Creme de abóbora, semente de abóbora assada, berinjela refogada, bolo de banana.

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Quarta-feira, 26/out Café da Manhã: Pão de cebola, pão simples com pesto, geleia de goiaba, bolo de maçã e bolo de cacau. Almoço: Omeletes variados, abobrinha grelhada, capitão de arroz e feijão vegetariano e vegano. Lanche da tarde: Bolos maracujá, chocolate e fubá. Jantar (102 pessoas): Macarrão com tomates, queijo e manjericão (receita da Alzira, vizinha), bolinho do almoço grelhado, capitão de feijão com abóbora (vegetariano), capitão de feijão com batata doce (vegano), quibe de abóbora japonesa com curry, salada de alface. Quinta-feira, 27/out Café da Manhã: Geleia de maracujá e manga, pão 10 dobras, bolo de chocolate, café e chás Almoço: Suflê de legumes, tabule servido na folha de alface, salada de batatinha inglesa cozida, panquecas, molho de tomate com ervilha e milho. Jantar: Panqueca com legumes no shoyo, purê de batata com beterraba, arroz com legumes no shoyo. T1


Sexta-feira, 28/out Café da Manhã: Doação de pães de sal da padaria, broa, geleia de goiaba feita derretendo a goiabada recebida nas doações. Almoço: Arroz com cenoura, espetinho de legumes com curry e ervas finas, abobrinha recheada com tomate, manjericão, alho e queijo e 3 farofas diferentes: uma de banana com queijo e manteiga, uma de banana com legumes e ovo e outra vegana de banana com ervas frescas. Jantar: suco verde de laranja, banana, espinafre, maracujá (tinha muita fruta madura) para entrada, torta de legumes, purê de batatas, abobrinha refogada com alho poró, salada de tomate com alho picado e manjericão, cenoura ralada, salada de alface e rúcula com molho de limão . Sábado, 29/out Café da Manhã: Broa de milho flocão, pão de cebola, bolo vegano de chocolate, café e chá mate. Almoço: Cuscuz com queijo e coco, cuscuz com goma de mandioca e coco, feijão de corda, mandioca no

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azeite com alho frito e cebolinha, jiló e batatas chips, abóbora com pesto ao forno, salada de folhas com tomatinho, suco de laranja com maracujá, geleia de casca de beterraba com opção de acréscimo de gengibre. Jantar: Risoto de arroz branco, abobrinha, cenoura, açafrão, curry e um pouquinho de queijo minas, macarrão com molho branco e espinafre e macarrão com molho de tomates. Domingo, 30/out Café da Manhã: Bolo de banana invertido, pão de queijo, patê de inhame com limão e cheiro verde, bolo de maçã e café. Almoço: Yakisoba vegano com brócolis, cenoura, couve flor, ervilha, gengibre e shoyu. Lanche da Tarde: Bolinho de chuva, bolo de cenoura (para comemorar uma semana de ocupação) e brigadeiro de colher. Jantar: Arroz, feijão, ovo cozido, farofa, salada.

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Cozinha da Ocupação

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Passeio PANCs

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duração: Passeio e colheita: dia 27 de outubro (16 às 18h) / preparo: dia 28 de outubro (10 às 18h) local: Passeio: vizinhança do Funcionários / preparo: cozinha da ocupação parceiro: Lucas Mourão público estimado: 30 pessoas de onde vem: Interesse de investigar e identificar as Plantas Comestíveis Não Convencionais que nascem nas ruas e canteiros da vizinhança do Funcionários. processo: Foi realizada uma pesquisa prévia sobre a área, uma caminhada pública para compartilhar as descobertas com outros interessados e um preparo coletivo para experimentar as possibilidades de uso de plantas da região na cozinha. efeito: Descobrimos agentes que cultivam plantas alimentícias entre jardins ornamentais, fundos de estacionamentos, canteiros públicos e quintais do bairro. A maioria destes sujeitos são trabalhadores da região, que usam de seu espaço e tempo de trabalho para se dedicar a essas plantas, que são utilizadas em sua alimentação. Descobrimos junto aos demais participantes da caminhada um outro formato de relação com a cidade, o espaço público, o paisagismo e a culinária que essas pessoas experimentam. cardápio: Geleia floral de jasmim manga, chuva de ouro e gardênia, chá de folha de goiabeira, doce em calda de jambo amarelo, suco verde de maracujá com ora-pro-nóbis.

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Plantas identificadas 8. Quiabo (Abelmoschus esculentus): folhas, fruto, semente, rica em proteína, flor. 9. Hibiscus (Hibiscus rosa sinensis): flores, folha tem uso similar à couve, pode ser refogada. 10. Jasmim manga (Plumeria rubra): flores. 11. Chuva de ouro (Cassia fistula): folhas jovens, flores e frutos. 12. Serralha (Sonchus oleraceus): folhas, flores. 13. Serralhinha (Emilia sonchifolia): mesmos usos da serralha. 14. Trapoeraba zebra (Tradescantia zebrina): folhas, flores. 15. Dinheiro em penca (Callisia repens): folhas. 16. Árvore do viajante (Ravenala madagascariensis): sementes, seiva do caule. 17. Erva do carpinteiro (Rivina humilis): seus frutos têm

potencial uso como corante 18. Taioba (Xanthosoma taioba): folha, rizoma. Ambos podem ser ingeridos após cozimento 19. Trapoeraba (Tripogandra diuretica): folha, flor. 20. Buva (Conyza bonariensis): sua folha parece pimenta. 21. Jambo amarelo (Syzygium jambos): fruto, flor. 22. Amendoeira da praia (Terminalia catappa): fruto, semente, folha, utilizada para envolver comidas. 23. Maracujá (Passiflora edulis): Polpa. Folhas têm uso medicinal, a parte branca (mesocarpo) é rica em pectina, boa para fazer geleias. 24. Goiaba (Psidium guajava): Fruto. A folha tem uso medicinal contra diarreia e distúrbios gastrointestinais. 25. Tamareira anã (Phoenix roebelenii): frutos

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1. Jabuticaba (Plinia cauliflora): folhas, fruto, casca. Uso medicinal. 2. Sapucaia (Lecythis pisonis): fruto, folhas. Importância ornamental. 3. Gardênia (Gardenia jasminoides): flores, frutos. Boa para fazer geleia. 4. Bougainville (Bougainvillea glabra): flores, utilização como corante alimentício, uso moderado, 5. Caruru (Amaranthus spp.): folhas, talos e sementes. Quanto mais forte a cor do caule e presença de espinhos, maior o cuidado ao usar na comida, precisando ferver mais. 6. Ora-pro-nóbis (Pereskia aculeata): folhas, frutos, flores, talos. 7. Melancia (Citrullus lanatus): folhas, semente, casca interna do fruto. A casca é boa para fazer geleias, pois é rica em pectina.

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PANCs Brasileiras, Lucas Mourão

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O Brasil possui rica diversidade de PANCs: muito comuns, entre elas estão a jaca, o jatobá, pequi, picão, serralha, taioba, capuchinha, jerivá, azedinha…Todas aquelas plantas que são pouco (ou nunca) cultivadas, frutos nativos pouco vistos no mercado, plantas muito utilizadas antigamente por nossos avós porém hoje nem tanto, bem regionalizadas, vistas como mato/erva daninha, comuns em outras culturas mas não na nossa, em resumo: todos aqueles vegetais que não são utilizados no cotidiano e com pouco valor comercial (ainda...). Por não serem cultivadas comercialmente, as PANCs têm maior teor de nutrientes (principalmente micronutrientes) em relação aos seus pares vendidos nos sacolões. Exemplo: o feijão mangalô (Lablab purpureus) tem maior teor de proteínas e ferro que o feijão comum (Phaseolus vulgaris). Uma outra grande vantagem dessas plantas é que são pouco ou nada atingidas por agrotóxicos e adubos químicos, justamente pelo fato de não serem oficialmente cultivadas! Vemos muitas delas pelas ruas das cidades, porém como ornamentais. Seguem seu tempo, slow, espontâneas... Podem aparecer em frestas de edifícios, rachaduras de calçadas, onde menos se espera! Sua sazonalidade faz com que aguardemos pacientemente pelo momento de colher seus frutos... T1


Banquete “Memórias de Resistência”

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duração: 24 horas de preparo e 1 hora de banquete local: Escola de Arquitetura da UFMG público estimado: 70 pessoas de onde vem: O banquete foi pensado como momento de reconhecimento da produção que vinha sendo desenvolvida na cozinha ao longo de duas semanas. processo: Os preparos se estruturaram em dois dias de planejamento, com a intenção de colocar em discussão a importância política de nossas escolhas alimentares. Elaboramos um cardápio a partir de nossa atuação na cozinha, de maneira cruzada com uma pesquisa de alimentação como símbolo de resistência cultural. efeito: O preparo do banquete permitiu ao GT Cozinha compreender e expressar de forma sensível a produção de conhecimento que se dava nos preparos. cardápio: Tapioca com recheios de quiabo com dendê e doce de banana, patê de inhame com alho torrado, mandioca cozida com manteiga e azeite, mingau de milho verde na casca de laranja com confit de limão, banana verde frita, maxixe recheado com feijão de corda, capitão de feijão de corda com farinha de rosca, pudim de abóbora com coco e confit de limão, pão de banana, bolo de milho, pão de milho, bolo de mandioca, bobó de mandioca no tomate assado com ervas, bolo de banana, geleia de manga, chutney de jabuticaba com molho de pimenta, folhas de couve e hortaliças para servir, suco de laranja com chá de hibisco, chá de hibisco com melão, chás variados e águas aromatizadas. T1


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Banquete “Memórias de Resistência”

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Conversa realizada durante a Ocupação da Escola de Arquitetura e Design da UFMG, entre membros do GT Cozinha Comum T: A ideia de termos essa conversa é poder fazer um registro do que está acontecendo na ocupação. Nós acreditamos que o registro mais potente disso tudo é a experiência de cada um, como estão entendendo essa experiência e o que estamos aprendendo individualmente e coletivamente e a partir dessa vivência. C: É um momento da gente aqui na cozinha também parar e pensar, já que tudo acontece tão rápido, é necessário poder parar e refletir sobre o que está acontecendo. Acho que isso é muito importante para todo mundo e para a Escola de Arquitetura. Essa ocupação é um marco para a Escola, bem como a presença da Cozinha Comum Itinerante, e com certeza esse momento irá transformar as relações que existem aqui dentro. Queríamos primeiro entender o que fez vocês se envolverem com a cozinha. MB: Quando eu cheguei aqui eu não tinha contato direto com a Cozinha Dona Lourdes porque quando ela começou eu estava de intercâmbio e quando eu voltei não tive tempo por causa de estágio e aulas. No primeiro dia de ocupação me colocaram no GT (Grupo de Trabalho) de comunicação, me enfiaram nele: “Você é do design? Então vai pro GT de comunicação, fazer uns flyers”. Foi extremamente cansativo, estressante e ruim. No outro dia que eu vim dormir aqui, resolvemos ir pro GT

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de cozinha. Para mim o que me fez me envolver cada vez mais foi essa sensação completamente oposta do que a que o GT de comunicação tinha me proporcionado. A relação dentro da cozinha é calorosa, é próxima, o espaço é de descontração e afetividade, já que todo mundo está tentando solucionar coletivamente o caos que é a alimentação de todos. Essas relações foram sendo estabelecidas sem hierarquia, todo mundo resolvendo junto, pensando no que cozinhar… isso criou outro tipo de relação de trabalho, diferente da comunicação que resolvia algo entre todos e depois disso cada um ia pro seu computador fazer e liberar arquivo. C: É uma gestão que estamos aprendendo todos juntos. Cada dia a cozinha funciona de um jeito diferente, dependendo das pessoas que estão aqui, porque tem pessoas que já têm uma experiência, outras não, têm pessoas que já cozinharam para muita gente... MB: Tem pessoas que tem uma postura de liderança mais clara, tem pessoas que preferem ser conduzidas, e a gente vai se configurando a partir disso, de forma fluida. CN: No primeiro dia eu nem sabia que estava acontecendo ocupação. Mas eu cheguei e resolvi ficar, ver o que estava rolando. Daí o que estava precisando de fazer eu fazia. Acho que isso é muito de cada pessoa… Não tinha nenhum amigo meu envolvido na ocupação, eu não estava em nenhum GT oficialmente.

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Ocupar, cozinhar e resistir

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Todos: Tava sim!

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CN: Eu não estava na hora que foram divididos os GTs, mas foi onde eu me encontrei mais. No primeiro dia eu vi o que estava rolando, daí no segundo dia eu trouxe pão, e fui entrando na cozinha pouco a pouco. Nunca tinha entrado na Cozinha Dona Lourdes, eu sabia dela mas não frequentava muito a faculdade, tinha visto algumas coisas só no facebook. S: Eu tive um contato muito pequeno com a cozinha antes da ocupação. Acho que umas duas ou três vezes acompanhando o W, uma tarde que o amigo dele veio fazer panquecas. Aí outro dia eu comprei um negócio que precisava de geladeira, e eu já me senti melhor para entrar e usar a da Cozinha e tal… Eu cheguei de intercâmbio recentemente e antes disso, acho que entrei no DA (diretório acadêmico) uma ou duas vezes durante meus quatro anos na Universidade. Era um espaço que eu não me sentia bem vinda de maneira nenhuma, não sentia uma abertura para conversar com as pessoas, nem a vontade de entrar. Com a ocupação todos os espaços da faculdade ficaram mais abertos. As pessoas também ficaram mais abertas, até eu mesma. P: Durante a ocupação não tem ninguém regulando em quais espaços nós somos permitidos ou não. No cotidiano da Escola isso é muito mais complicado, têm áreas que não podemos utilizar e a ocupação, de certa forma, suspende isso. Como

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nós temos pessoas de diversos grupos presentes na ocupação, criamos a partir deles grupos novos, que configuram o uso dos espaços de uma forma muito diferente. M: Com certeza. MB: Uma coisa legal que a P está falando é que com a ocupação e com a cozinha nós criamos relações com pessoas que não esperávamos criar. S: Mas acho que essa é uma característica da cozinha em todos os lugares em que ela existe. Quando conhecemos pessoas de fora de Minas Gerais a gente ouve que a festa da família mineira acontece na cozinha e não na sala. Você recebe as pessoas pela cozinha. Acho que a cozinha por si só tem esse potencial agregador e estar na cozinha para mim foi isso… era o lugar no qual me sentia mais segura para fazer as coisas. VA: Acho que isso também vem de um envolvimento anterior. Não com essa cozinha aqui, mas com cozinhar de maneira mais geral. As pessoas trazem a experiência pessoal delas e agregam nesse espaço aqui. T: Quando nós trouxemos a cozinha para cá uma das primeiras coisas que aconteceu já no primeiro evento era a galera se aproximar por sentir um cheiro, um barulho diferente, algo que mexe muito com as sensações do corpo. – VB: Uma coisa que acho legal é que a cozinha nunca teve uma estrutura grande e rígida. Ela está aqui, se você T1


quiser vem e faz. É uma coisa natural. AJ: A gente tem personalidade muito forte também, isso às vezes é um problema, pois não parece muito convidativo para alguns. A gente não é tão convidativo quanto poderia ser. C: Mas é porque ficamos muito tensos cozinhando também, porque apesar de tudo precisamos fazer aquela comida sair. S: O grupo é grande, né, e a gente fica numa angústia para fazer as coisas darem certo... igual os problemas que aconteceram com pimenta, às vezes a produção é tão grande que nem todos sabem passar para os outros as informações sobre tudo o que estamos fazendo, e acontece de algumas vezes virem reclamar de alguma coisa da comida. P: É que mesmo a cozinha se propondo a funcionar de maneira autogestionada, em qualquer erro que cometemos as pessoas que estão de fora reclamam muito. Então além da responsabilidade de fazer a cozinha funcionar nessa escala muito grande, a gente também não pode errar. As reações são muito desproporcionais à quantidade de erro, que para mim mostram que muitas vezes as pessoas têm uma relação um pouco infantilizada com a cozinha, de não querer participar mas de serem os primeiros a apontar qualquer falha. C: Não só infantilizada, mas também enxergam a cozinha como prestação de serviço, pois estão acostumados a receber a comida pronta. AJ: Mas a gente que cozinha desen-

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volve uma relação de valor muito diferente com a comida, eu morro se um bolo meu sola. Eu fico muito tenso, muito chateado. Ao mesmo tempo, tem gente que não entende esse tipo de coisa. VA: Eu tinha cozinhado uma vez aqui, no dia que almocei aqui com as intercambistas alemãs. Foi muito engraçado porque eu não conhecia ninguém além da Isabela, e nós cozinhamos todo mundo junto. E essa liberdade não é a de você ir e fazer sozinho, mas é aquela liberdade de você poder experimentar junto, propor. Olhando pra ocupação, é o GT que mais se permite errar, nesse sentido. Como alguém vir com a ideia “Vamos fazer um caldo com canela”, quem teve essa ideia idiota? Mas ficou tão bom. E a melhor parte é que esses erros que acontecem dentro do GT são aprendizados e são fundamentais. E a gente caiu no GT da cozinha eu, Matheus e Fernanda, mais ou menos do mesmo jeito. A gente estava no GT da comunicação e foi muito estressante. Lá na comunicação era cada um fazendo o seu, daí a gente tentava criar uma integração mas acabava em disputa, um tentando ser mais crítico do que o outro… S: Teve uma época que alguém falou de criar um GT para receber as novas pessoas que iam chegando na ocupação. E a cozinha é um ótimo lugar, porque sempre tem alguma coisa para fazer e se a pessoa se identificar com outro grupo ela pode mudar.

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P: Eu estava pensando um pouco sobre isso e acho que nossa ocupação tem uma forma bastante prédefinida, os grupos foram divididos durante o ato de ocupar e muitos dos GTs estão trabalhando de uma forma muito mecânica. Enquanto isso, a cozinha é tanto uma espacialidade quanto uma proposta muito diferente. A cozinha, esses carrinhos, essas coisas todas que surgiram enquanto a ocupação está aqui não são coisas presentes em todas ocupações. Não é algo que tem um molde de uso. E acaba que a gente consegue fazer as coisas de forma muito livre, ir experimentando e fazendo, mesmo em dias de demanda grande a gente consegue ainda ter completa autonomia para decidir o que a gente quer fazer. Ao mesmo tempo não são coisas que te vinculam para sempre. Os preparos duram cerca de duas horas, depois disso, se quiser, você pode ir embora, não precisa assumir tarefas e ficar preso nelas a semana inteira, com prazos… Isso é algo muito potente.

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– T: Acho que cabe pensar como a cozinha se transformou na ocupação e como ela transforma a ocupação. Acho que se transformar sempre foi um jeito da cozinha se reerguer e existir. Cada vez que mudamos ela de lugar, ou inventamos um novo jeito de usar ela, com almoço todo dia, oficinas, ela se atualiza e mobiliza novas pessoas. Acho que a Ocupação também é mais uma transfor-

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mação da cozinha. Teve a Ocupação e os Carrinhos, os dois chegaram meio juntos e gerou uma grande transformação na história da cozinha. AJ: Sem querer ser prepotente, eu acho que a cozinha é a base da ocupação. Se não fosse comida teria uma zona, o povo ficaria desesperado porque tem que fazer já muita coisa e ainda parar para fazer comida ou cada um iria sair para comer. Iria ser uma dissociação muito grande. Sem falar que a cozinha não só está virando uma porta de entrada para as pessoas conhecerem a ocupação mas também está virando o marco dessa ocupação. As pessoas conhecem a gente por causa da cozinha, não porque temos a ação X, Y ou Z. A ocupação da Escola de Arquitetura está sendo conhecida por causa da nossa dinâmica na cozinha. M: Uma coisa que acho super legal é que a cozinha conseguiu criar dentro da ocupação uma dinâmica um pouco divertida. Porque assim, uma coisa que percebo com as pessoas, é que já existe uma curiosidade a respeito do que vamos preparar. Eu já vi várias pessoas perguntando. Essa dinâmica do que a cozinha está fazendo, de como isso vai afetar a galera, do que que a gente vai comer, da surpresa “nossa vocês fizeram bolo de manga, nossa, vocês conseguiram fazer chutney”. Essa inventividade da cozinha tem promovido uma curiosidade nas pessoas. AJ: E acho legal que isso não é uma coisa que é falada, é experimentada. M: No dia que fizemos pão de feijão por exemplo foi uma atração. A gente abria T1


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Doações de alimentos arrecadadas no período de 4 a 15 de novembro de 2016: leite 32l; leite condensado 3 cx; limão 15 kg; maçã 8kg; macarrão 20kg; manga 12 kg; massa de bolo 8 pcts; melancia 3 unidades; molho de tomate 12l; mostarda (folha) 2kg; óleo 26l; ovos 12 dúzias; palmito 1kg; panetone 3 unidades; pão 24 pcts; pepino 2kg; pimentão 3kg; presunto 1kg; queijo 3kg; rabanete 1kg; repoljo 8kg; sal 9kg; salsicha 1kg; suco 19l; tomate 24kg.

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abacaxi 4 unidades; abóbora 5 unidades; abobrinha 28kg; açúcar 17kg; alface 2kg; alho 7kg; arroz 20kg; batata 26kg; bananas 27kg; beterraba 2kg; berinjela 15kg; biscoito 12 pacotes; cacau 600g; café 25kg; caldo de galinha 1 pct; cebola 19kg; cebolinha 7 maços; cenoura 12 kg; coco 1kg; couve 2kg; farinha 28kg; feijão 10kg; fermento químico 2; filtro de café 4 pcts; goiabada 4 pcts; hortelã 2 maços; jiló 2kg; laranja 20kg;

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o forno e chegava 5 pessoas para ver como estava. Aí passava mais um pouquinho vinha mais 5 pessoas “nossa, que pão enorme!”... C: As pessoas estão perdendo algumas resistências alimentares também, porquê elas têm necessidade de comer carne, elas não entendem o que é uma comida vegetariana, e acham que vegetarianos não têm opções comer. E o que a gente está fazendo mostra várias possibilidades de se comer sem carne. W: Acho que é dessa forma que a cozinha extrapola a ocupação, na transformação dessas questões. LR: Ontem todo mundo comeu jiló! AJ: Eu odeio jiló!

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W: Repensar os ingredientes, o modo de trabalhar eles, entender por exemplo que o arroz não é só branco. E isso é muito curioso porque a gente costuma passar pelos alimentos sem pensar a respeito deles, sem crítica. VA: Acho que sim, afetou internamente as pessoas da ocupação, mas no começo a cozinha também atraía muitas pessoas de fora. As pessoas passavam, ficavam interessadas no que a gente estava fazendo e sempre perguntavam, pediam pra provar. Foi um jeito de aproximar essas pessoas. Diminuiu um pouco isso agora, acho que é um problema da ocupação mesmo, que deu uma estagnada como um todo. E uma coisa que fiquei pensando é que a gente já começou uma movimenta-

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ção forte em torno da comida, do alimento, aqui. Acho que a gente tem que aproveitar isso para na pós-ocupação, começarmos a questionar a cantina. De fato a comida não é boa, é caro, enfim… C: De fato uma das coisas que nos motivou a querer ter uma cozinha na escola é isso: não tem opção, o que tem é caro, não atende, então a gente poderia ter autonomia para preparar nossas coisas. W: Isso é uma das coisas que mais me motiva para estar na cozinha. Pensar que podemos ter outros alimentos que não aqueles congelados há 10 meses! M: E também que a única opção vegetariana é soja. P: No contrato da cantina é colocado que os alimentos servidos devem ser congelados, e não feitos aqui. Isso é um requerimento da UFMG. Então rever isso envolve algo muito maior. – V: Essa questão da comida, justamente por ser tão “vou ali e compro” e poder ter essa relação muito menos afetiva com o alimento, acho que era problemático para uma grande parte das pessoas. Inclusive para mim, que pensava que não ia ficar aqui cozinhando porque tinha que ir para aula. Mas daí com a ocupação a necessidade de fazer, de ter, de cozinhar trouxe uma energia. Porque a gente tem que fazer a comida, ela tem que sair e as coisas têm que acontecer. Daí botamos a mão na massa. E é legal que juntou um grupo de pessoas que está afim disso mas não de fazer só um macarrão com moT1


lho de tomate, é uma galera que já tem o mínimo de interesse de experimentar a cozinha e colocar isso em ação. E acho que todo mundo aprendeu com todo mundo aqui, outro dia fiz receitas da ocupação lá em casa. M: Também queria reforçar essa questão de estarmos criando pessoas mais conscientes em relação à alimentação. Eu mesmo passei a odiar margarina (requeijão também!). Além disso, desenvolvemos uma consciência econômica. Outro dia foi levantado na assembleia que a gente fica fazendo coisas que dão muito trabalho, tipo pão, e que a gente poderia ir na padaria e comprar o pão de sal. Mas a galera não pensa que o pão de sal é muito mais caro. E a gente faz porque a gente tem os ingredientes disponíveis aqui, que chegam de doação, é muito mais barato, muito mais saudável, agradável e vai alimentar muito mais, e além de tudo a gente gosta de cozinhar. T: Normalmente nós temos uma relação com a comida que é a relação de produto né? Algo a ser consumido. E aqui a gente cria a relação do fazer, do processo, que é afetiva. – C: E como é cozinhar para muita gente? Como se organizar, como pensar as receitas? P: É legal porque tudo foi mudando né? Em um mês ficou tudo diferente. VA: Não é uma pitada de sal, é sempre uma mão. AJ: Eu lembro a gente fazendo pão e vendo “então a receita tem tantas

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coisas… 5 receitas dessa, 5 dessa, 4 daquela….”. A gente fez umas 20 receitas! Quando a gente ia fazer isso na vida? Vira uma padaria né. M: Foi sensacional! Nesse dia a gente estava fazendo pão para o pessoal levar pra Brasília. Eram seis pessoas aqui na cozinha e a gente pensou que tínhamos que fazer pão para todo mundo que estava indo para durar 12 horas. Então saiu uma equipe para comprar o que estava faltando enquanto outra equipe ficou aqui para começar. Quando voltamos, quem ficou tinha organizado a mesa para sovar o pão, a mesa para fazer cada receita, tudo organizadinho, os ovos e leites separados, o que fez a produção ser muito mais legal. Porque enquanto um estava fazendo um pão o outro estava fazendo outro e a gente colocava etiquetas falando que horas tinha que tirar cada receita. S: E eu acho muito bonito porque é muito uma relação de afeto. A gente não vai dar umas bolachas de água e sal para o pessoal comer. E eu lembro de ver o povo agradecendo com as sacolinhas de comida, isso foi muito emocionante. C: Acho que isso é uma característica de todo mundo que entrou na cozinha, de querer cuidar das pessoas, querer sempre o melhor. Por isso ficamos discutindo o que fazer para o povo levar. Eu acho que não é uma preocupação comum de qualquer pessoa.

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M: É, por exemplo, a gente trocou T1


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metade da receita de pão por farinha integral, para o pessoal ter fibra, ter o que alimentar. V: E eu lembro o pessoal achando muito chique quando fizemos o pão na forminha de cupcake, como uma trouxinha com recheio. E isso não é chique, é pão aberto. Mas é esse cuidado né? Não é só comer, é comer com prazer, com o olhar, com as sensações. E era muito legal as pessoas colocando aquilo no prato e era o que mais queriam comer. Falando como ficou bonitinho. C: O que acho mais legal é que todo mundo fala que a comida é chique mas a gente cozinha com o que recebe de doação. Isso faz parte também do cuidado com o que a gente pede de doação, que colocamos sempre coisas saudáveis nos preparos e isso influencia no que recebemos. W: Também temos que pensar no lugar privilegiado na cidade em que a gente está, né? O que facilita chegar certo tipo de doação.

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C: É mesmo, enquanto isso a galera que está ocupando faculdades no Campus tem que pedir pras outras ocupações quando acaba algo quando acaba a comida de lá. M: Acho que isso tem a ver com a Escola de Arquitetura esta integrada na cidade, não é igual o Campus que está cercado, isolado e protegido. Estamos perto de um sacolão, um supermercado. AJ: Eu acho que o que mais influen-

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cia é o fato de estarmos na Savassi. Aqueles dois meninos que vieram de São Paulo falar aqui ocupam a fábrica de cultura que fica no meio da favela do Capão Redondo. E eles falaram que comida é pra eles é muito complicado porque o povo que mora no entorno vai lá comer. Aqui na vizinhança vem poucas pessoas. P: Principalmente no início da ocupação vinha muita gente de fora para almoçar. Isso foi variando com as semanas, mas bem no início, quando montamos as estruturas, as pessoas estranhavam, chegavam mais perto para ver como estava funcionando se surpreendiam com o fato de poder comer e contribuir com o tanto que pudessem. Isso atraiu muita gente até do nosso ciclo mesmo que vinham só para o almoço. E além disso porque a comida era ótima, hahaha. A: É, verdade, isso atraiu muita gente. Ao ponto de chegarem desconhecidos e até mesmo me xingarem quando a comida não estava pronta. C: É, e isso levanta outra questão: como é cozinhar na rua? A: Mas eu ainda acho que essa rua nossa é uma ideia de rua. Não acho que essa rua seja rua. C: Mas assim, cozinhar fora. Deslocar a cozinha para o lado de fora e o que isso provoca em nós que cozinhamos, nas pessoas e na cidade. As relações que criamos com os vizinhos… M: Sábado mesmo duas senhorinhas estavam passando, viram a gente cozinhando e perguntaram se estávamos T1


precisando de alguma coisa. Daí falaram da amiga que tem coisas orgânicas e que poderia trazer para a ocupação. Então ainda que existam pontos ruins de estarmos expostos, “vulneráveis” de certa forma, também tem outra situação que é do ambiente agregador. Que é transpor essa cozinha, esse espaço familiar para o cotidiano urbano.. S: Eu acho que não dá para desconsiderar que é rua. Por menor que seja a escala. Outro dia veio uma senhora e me contou que produz o sabão dela, ela indo embora eu lembrei dos óleos que temos aqui, perguntei o que ela usava e ela respondeu “óleo e gordura”. Ela foi para o trabalho, voltou na hora do almoço, trouxe uns galões com funil, a gente pegou os óleos e entregamos para ela. W: Eu acho que o ponto que o André estava querendo levantar falando do pessoal de Capão Redondo era de que quando formos pensar nossa ocupação, na cozinha lá fora, sempre ter em mente nossa situação e contexto social na cidade. A: Tem a questão da nossa estrutura, temos cozinha, os carrinhos, ponto d’água. Além disso, a questão territorial: estamos na Savassi, só tem gente rica no entorno que não precisa de comer aqui. S: O fato da gente ter recebido doações de mais de 300 reais mais de uma vez. Qual outra ocupação de BH já teve isso? O contexto é muito específico. C: Eu acho que muito da estratégia de o que pedir tem que ser considerado. Porque é uma opção. Na lista de coisas

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que as pessoas do Campus estão pedindo não tem legumes, eles não tentaram pedir isso. Tinha enlatados, margarina, leite condensado... Isso é uma opção. Se você pensar no poder aquisitivo, no Campus têm unidades onde estão pedindo carne, e isso é bem mais caro do que pedir vegetais. Então é uma opção, mas tem uma cultura por trás disso. AJ: Acho que é uma coisa de preconceito, porque eu era desse jeito. P: Mas não precisa ser necessariamente um preconceito que a pessoa nutre. Você não enxerga opções, e a carne parece necessária, é o item básico presente na alimentação. C: Como se ela fosse todo o sustento da refeição. W: É essa coisa montada, como se a carne fosse a proteína, o feijão o ferro, o arroz carboidrato… T: Hoje em dia existem até mesmo pesquisas financiadas. Tem aquela história que a presença do leite em nossa cultura se deu por conta de pesquisas financiadas e encomendadas por empresas de laticínio, para fazer as pessoas acreditarem que tinham que beber leite todo dia. É uma questão cultural associada também a uma questão de mercado, uma cultura produzida e induzida por esse mercado.

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M: E é uma cultura criada no ocidente. No oriente grande parte da população não tem as enzimas necessárias para digerir leite. Porque o desenvolvimento foi diferente. T1


Ocupar, cozinhar e resistir

P: Quando a gente foi para a aldeia Xacriabá a gente viu muito a questão da propaganda, e das pessoas acreditarem que é muito bom para saúde por causa disso. Não tem um entendimento das propriedades, nutrientes e tal. E vem um discurso de cima que convence todo mundo.

28 de novembro de 2016

um jeito e nós fomos ficando tão dependentes da carne que nosso corpo parou de conseguir metabolizar elas dos vegetais, mas ainda assim a vitamina está lá. W: A B12 em vegetais e legumes é encontrada no contato da casca do alimento com a terra.

T: Eles são muito reféns dessa cultura produzida pela mídia e os padrões estabelecidos a partir daí. E acho que o Matheus está certo quando diz que é uma cultura ocidental, uma amiga indiana já me falou que lá é comum comerem carne uma vez por semana ou até uma vez por mês. MM: Um amigo meu me falou que eles nem deixam de comer carne de vaca por ser um animal sagrado, mas por pensarem que é muito melhor ter ela para dar leite do que comer a carne dela.

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W: Sim, é muito mais inteligente você ter o animal vivo e a partir dele poder produzir outros tipos de alimentos. AJ: Lá em casa quando me perguntaram como está sendo na ocupação, o que a gente está comendo, e eu falei que a gente não está comendo carne, ficaram preocupados. Não existe esse pensamento de “você está substituindo a proteína?”, porque carne é carne. S: Eu sempre fico vendo falando sobre vegetarianismo e falando sobre essa coisa da B12, e a B12 era encontrada nos vegetais. Só que as coisas foram desenvolvendo de T1


Cozinha com Secundaristas

1 de dezembro de 2016

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duração: 14h às 18h local: IFMG – Instituto Federal de Minas Gerais, unidade Santa Luzia parceiras: Silvia Herval e Bruna Piantino público estimado: 25 pessoas de onde vem: A experiência de se pensar cozinha e política de forma integrada tornou a produção de alimentos da Ocupação da Escola de Arquitetura da UFMG uma referência para outras escolas ocupadas. Além disso a cozinha como local de inclusão, integração e expansão do movimento fortaleceu o envolvimento interno dos alunos. processo: Os cozinheiros iniciaram contatos com outras cozinhas de ocupações secundaristas e universitárias, trocando listas de doações, receitas, dicas de preparo, dentre outros. Com esse reconhecimento de nossas atividades realizamos uma parceria com a ocupação estudantil do Instituto Federal de Minas Gerais para cozinhar com eles um dia em um momento de troca de experiências e receitas. efeito: A cozinha para a ocupação visitada não era uma questão relevante. Conversamos sobre seus hábitos alimentares, o uso de alimentos industrializados e possibilidades de autonomia e saúde alimentar utilizando das doações ou ingredientes baratos. cardápio: Hambúrguer de feijão, pão 10 dobras, guacamole, maionese de ervas, geleia de hibisco, suco de inhame com limão, focaccia de sal grosso e alecrim.

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Cozinha com Secundaristas

1 de dezembro de 2016

Bolinho de feijão 1 xícara de feijão preto cru 1 e ½ xícara de cebola picadinha 2 dentes de alho 1 colher de sopa de orégano desidratado 2 colheres de sopa de azeite ½ ramo de salsinha picada 1 colher de sopa de suco de limão sal e pimenta a gosto ½ xícara de aveia em flocos finos ½ xícara de farinha integral Bater metade da quantidade de feijão no liquidificador e amassar a outra metade com o garfo. Misturar com os temperos e ervas, depois adicionar as farinhas e fazer pequenos bolinhos. Fritar ou assar. Hoje fizemos 10 receitas!

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Deixar o feijão preto de molho por 12 horas (economiza energia de cozimento e elimina toxinas na água). Escorrer, descartando a água. Lavar e cozinhar na panela de pressão.

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Cozinha com Secundaristas

1 de dezembro de 2016

Pão de frigideira Uma xícara e meia de farinha, meia xícara de água morna, salsinha e cebolinha picadas, sal e azeite à gosto. Misturar a farinha com a água morna até chegar a um ponto em que a massa não gruda mais nas mãos. Adicionar os temperos e fazer bolinhas com a massa. Abrir no formato de panqueca e colocar na frigideira até chegar ao ponto.

Maionese de ervas Meio litro de óleo, 1 litro de leite integral, 1 ramo de salsinha fresca, sal e pimenta do reino.

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Bater tudo no liquidificador, adicionar o óleo para dar consistência aos poucos.

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Cafezinho contra a PEC

08 de dezembro de 2016

duração: 16 às 19h local: ponto de ônibus intermunicipal próximo à Escola de Arquitetura da UFMG público estimado: 40 pessoas de onde vem: Observando a potência da Cozinha enquanto dispositivo de diálogo, que convidava as pessoas a se aproximarem e entenderem o movimento dentro da ocupação, o Cafezinho contra a PEC foi desenvolvido, como intervenção urbana. processo: Levamos o dispositivo a pontos de ônibus intermunicipais próximos à faculdade. Oferecemos café e convidamos as pessoas a ouvir alguns pontos de debate levantados pela ocupação a respeito da PEC 55 e seus prováveis efeitos para os próximos anos. Junto ao café foi distribuído um material gráfico desenvolvido pelo GT de comunicação. efeito: As pessoas foram surpreendidas ao receberem de um movimento político um café e o convite para conversar, procedimento que quebra com a lógica de panfletagem e as acerca à discussão. cardápio: Café e pipoca registro: https://vimeo.com/194417839

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Cartilha “Cozinhar e Resistir”

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de onde vem: Ao analisar a lista de pedidos de doações de outras ocupações da cidade consideramos extremamente preocupante o fato de tanto secundaristas quanto universitários pedirem por enlatados e condimentados. Conversando com pessoas dos GTs de Cozinha de outros lugares pudemos observar que para muitos a atividade de cozinhar era vista apenas como subsistência e não de forma articulada a outras questões de ordem política. processo: Organizamos algumas dicas de cozinha que acreditamos serem muito importantes para a manutenção de uma ocupação, com um cardápio saudável e que forneça energia a todos, além de aproximar as questões alimentares das discussões centrais do movimento estudantil. efeito: Essas dicas foram organizadas em formato digital, divulgadas pela página da Cozinha Dona Lourdes no facebook, e em cartilha impressa, provocando novas trocas com grupos distantes de nós.

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Zines e cartazes

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data: Do início das atividades no território Funcionários até o início da Ocupação da Escola de Arquitetura da UFMG local: Funcionários designer: Lucas Kröeff público estimado: n/a de onde vem: n/a processo: Pensamos em ao organizar um calendário de eventos ligados a Cozinha Comum Itinerante no território e divulgar a programação de forma a engajar pessoas do bairro nas vivências que propomos. Dessa forma confeccionamos um calendário de ação com as atividades propostas e as informações do projeto, além de cartazes e flyers espalhados em diferentes pontos do bairro para cada evento realizado. efeito: n/a

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Zines e cartazes

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DA GONÇALVES DIAS

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Projeto

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Zines e cartazes

dia 18 : PRAÇA ESCOLA DE ARQUITETURA _ 16H dia 19: CAMPUS UFMG - 16H

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Apoio

Projeto

Realização

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Zines e cartazes

Projeto

coletivo

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VISITAS A FAMÍLIAS TRADICIONAIS PROVA ÀS CEGAS – PROJOVEM BOLO DE CHOCOLATE VEGANO – PROJOVEM PREPARO NA RUA – PROJOVEM CINE-PAREDE PASSEIO PELOS QUINTAIS – PROJOVEM MUTIRÕES SABERES CULINÁRIOS DA FAMÍLIA CANUTO PREPARO DE QUIBE – PROJOVEM FESTIVAL DA QUEBRADA TROCA DE MUDAS NO DIA DAS MÃES OUTRAS CONVERSAS

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território 2

cozinha comum itinerante

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Morro das Pedras - A Cozinha Comum Itinerante foi experimentada a partir de três eixos de ação simultâneos: trabalho de conscientização alimentar e reconhecimento territorial com alunos do ProJovem; pesquisa e ação de alimentação tradicional, memória e novas práticas alimentares com famílias pioneiras da Vila da Antena e acompanhamento do uso autônomo dos dispositivos pelos moradores do Morro das Pedras, em um período de 4 meses.

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Visitas a famílias tradicionais

entre janeiro e maio de 2017

duração: n/a local: Morro das Pedras público estimado: n/a de onde vem: Junto ao grupo História em Construção nos propusemos a investigar práticas culinárias tradicionais da comunidade conhecendo as famílias que vivem ali acompanhando a construção e transformações da vila. processo: Os parceiros da comunidade nos apresentaram algumas famílias. Aos poucos criamos vínculos e visitamos quintais e cozinhas; propusemos pequenos preparos para compartilharmos receitas, escutarmos histórias e trocarmos experiências através de práticas culinárias. efeito: Através dessas visitas criamos laços com diversos moradores do Morro das Pedras. Nas conversas conhecemos receitas que pontuam e conduzem as histórias individuais dos moradores, ao mesmo tempo que refletem a história coletiva da comunidade. Saberes como modos de preparo ligados a situações vividas pelos moradores, uso de recursos locais, plantas nativas e manejo sustentável do território foram compartilhados em preparos da Cozinha Comum Itinerante na comunidade junto com as histórias nos quais estão inseridos.

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Visitas a famílias tradicionais

M: Aqui como é só nos dois eu faço arroz na panela de pedra. Socador eu tinha o de alumínio, mudei pro de pedra. Eu não soco não, só macero. Assim eu como bem, estou mudando até os utensílios de casa para comer melhor, com o tempo vai ficar igual as cozinhas da TV. Essa aqui também eu ganhei, ela é de barro, eu uso ela mais de enfeite, acho que não tem como cozinhar com ela não.

tia que tinha a pele maravilhosa! Ela morreu tão esticadinha tadinha, e foi o inhame viu? Sabe por quê? Todo santo dia ela comia inhame no café da manhã. C: Em pernambuco a gente tem costume de comer inhame ou mandioca no café da manhã. Ou na janta também. M: No café da manhã ela cozinhava o inhame e ao invés do pão comia um inhame no café. C: Inhame limpa o sangue né? M: Limpa mesmo, essa minha tia é um exemplo, todo dia comia inhame de manhã.

C: Tem sim, essa usam para fazer moqueca de banana, fica muito bom. Você come dendê, essas coisas?

C: E você tem algum segredo para descascar o inhame? Minha pele fica toda irritada.

M: Eu não sou muito chegada não. Dendê e aquela folhinha, coentro. Eu não gosto, não. Agora lá em casa eu faço uma farofa de banana caturra com farinha de milho, né filho? Ele é viciado. Mas é uma coisa assim, no dia que faço nem faço arroz. Aqui em casa a gente não come muito arroz não.

M: Tem dois tipos de inhame, né. O inhame é grandão, o cará é pequinininho.

F: Ou é batata, batata doce, ou uma abóbora. M: A gente faz também uma tortinha de batata, um bolinho de batata. Mas eu não frito, eu asso. Batata, duas colheres de farinha de trigo, queijo parmesão, orégano, 2 ovos, um pouquinho de leite, faço a massa, coloca um pouquinho só de fermento e leva ao forno. Aí a gente não come arroz mas substitui. Inhame também sou apaixonada. Eu tinha uma

C: Sim. Mas tem uns que ficam meio aguados, né? M: Tem uns que ficam batumados. Mas acho que nem tem como você saber se vai estar assim ou não. Acho que é pela casca. Quando meu filho teve dengue eu fiz um suco de inhame que fica parecido com um leite, é bem gostoso.

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Em nossa visita à família Canuto aprendemos muito sobre a história do Morro das Pedras. A conversa apresentada aqui aconteceu durante um almoço na casa de dois membros da família.

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– M: Agora aqui em casa a gente compra muito ovo. Nossa senhora, será que é bom pra saúde comer tanto ovo assim? Porque usa de manhã no café da manhã... T2


Visitas a famílias tradicionais

T: Acho que para quem não come carne não é um problema. P: Cada médico fala uma coisa né? Acho que cada pessoa tem que entender o que é bom pro seu próprio corpo. T: Normalmente você cozinha só para vocês dois? M: É. Só para nós dois aqui em casa, toda semana eu invento alguma coisa. Todo dia. É mais difícil para quem não come carne ficar na mesma rotina né? T: Acho que quem não come carne costuma se aventurar muito mais na cozinha, ser mais inventivo. M: Então, é o meu caso. Eu invento muito mais coisa. Vou inventando para não ficar naquela mesmice. Aqui em casa meu filho já não faz muito. Faz umas coisinhas que ele gosta. Mas vir para cozinha para fazer mesmo não. Aí isso aí já é comigo.

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T: Onde você vai buscando receita? Você usa a internet? M: Ah, aqui (mostra os livros de receita). Eu vou comprando livro, revista, vou inventando moda. Você já comeu gengibre no arroz? Se vocês comerem vocês vão pirar. Na hora que eu estou torrando o arroz, na hora que você joga o alho você joga o gengibre. Vocês não tem noção. C: Eu gosto de abóbora com gengibre, você já comeu? M: Aí, isso eu nunca comi. Agora o arroz… eu aprendi ele porque eu trabalhei para uma menina que ficava

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assim “ah eu vou parar de comer carne” aí parava por um tempo e depois voltava. Ela me ensinou umas coisas, entre elas o arroz com gengibre. Acho que agora ela tá comendo carne. Porque ela ficava um pouquinho mas não dava conta. Queria parar mas não conseguia. C: Tem muita gente que tem muita dificuldade, porque a carne é muito arraigada né? M: Igual lá em casa, com meus irmãos lá, minha mãe chega a fazer 3 frangos num dia quando a família vai comer. E antes do almoço sair ainda tem aqueles aperitivos e coisas assim. O povo come muita carne, muita carne mesmo. C: E carne é caro, né? Com o dinheiro de um quilo de carne você compra muito mais legumes e uma variedade bem maior também. T: E é caro o ano todo! Os legumes vão mudando de valor de acordo com a época de cada um, e isso ajuda também a variar a alimentação, comer mais coisas diferentes. M: É tudo questão de costume! Depois que começa a fazer... – C: Você ficou na ocupa do CRJ? Como funcionava a cozinha lá? F: Então, como a maioria não comia carne – tinha 6 pessoas que comiam – era bem separado. Umas pessoas ficavam por conta dos que comiam carne, outras dos vegetarianos e outras dos veganos. E o legal da ocupação do CRJ é que ela acolhia os moradores de rua da região, que são muitos, né? Em troca todo T2


Visitas a famílias tradicionais

M: Aqui na cozinha vou fazer uma parede. Eu tenho um sobrinho que está estudando arquitetura, e ele gosta de reforma. Aqui a gente pode fazer alteração, só não pode quebrar parede. Mas sabe aquele tijolinho furado? Com forma de flor? Eu quero colocar ele, porque não dá sombra nem barra o vento. Eu quero dar uma cara de cozinha antiga. Sabe aquela moda de a cozinha ter um cantinho só para o café? Eu achei um caixote, peguei ele e pensei “gente esse caixote dá para fazer um armário para colocar canequinha”. Levei no meu irmão e pedi para ele fazer, ficou show de bola. Vou colocar aqui na parede e ter meu cantinho do café. Eu pensei em pintar de vermelho, mas teria que pintar a bancada também. Aí acho que vou deixar a madeira crua mesmo. Agora tem isso, o cantinho do café. E como aqui em casa nós somos viciados em café… quando a gente está sozinho em casa passa nessa aqui (coador individual) e quando estamos nós dois tem essa garrafinha que dá duas xícaras. T: No dia que fomos na casa de sua mãe eu reparei, são 3 garrafas de café, o mais doce, o médio e o sem açúcar.

Tudo quentinho. M: A casa da minha mãe é casa de avó mesmo. Eu falo que lá tá precisando fazer mais uns quartos, sabe? Porque a gente vai pra lá e depois do almoço não tem quarto para dormir. Só esse que é o problema. Aqui em casa eu já acho a cozinha meio sem jeito. A cozinha e o banheiro. Precisamos fazer uma reforma mesmo. T: Há quanto tempo vocês moram aqui? M: Eu moro aqui há 9 anos. T: Eu não sabia que esses prédios eram dessa data não. Eles têm cara de novinhos. Você morava em casa antes de vir pra cá? M: Eu sempre morei em casa, sempre tive quintal, sempre tive horta. Tô olhando aqui, uma salsa custa R$1,99. Se você tiver uma plantação você economiza muito. Aqui é muito regulado, a gente não tem espaço. Agora lá no Cascalho tinha uma vizinha minha que tinha uma horta que qualquer um podia ir lá e pegar. O Cascalho é lá no Grajaú. – M: Vocês colocam o quê no seu tabule? P: Acho que cada um faz de um jeito né? A gente coloca tomate, cebola, hortelã, limão, pimenta e um pouco de azeite.

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mundo ajudava trabalhando, limpando os espaços e tal. Eram entre 200 e 300 pessoas. Eu ficava limpando a biblioteca. Só que no fim da ocupação galera fez muita sujeira lá, ninguém sabe quem fez, acho que era gente infiltrada. E hoje lá tá com programação muito legal, acho que foi importante ocupar até abrir mesmo! Depois que a ocupação acabou foi muito tenso com os moradores de rua, porque eles não sabiam mais para onde ir.

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M: Às vezes coloca pepino. Mas cada semana eu faço de um jeito. Só para não enjoar. Agora o tradicional mesmo é isso aí, o verdadeiro. Mas o meu T2


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Visitas a famílias tradicionais

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Visitas a famílias tradicionais

– M: Quando a gente fala que não come carne p pessoal até acha ruim. F: Um amigo meu parou de comer carne. A mãe dele tem experimentado cada receita, outro dia teve um risoli muito gostoso. T: E como foi para você parar de comer carne? M: Como começou? Ah, eu comecei com abstinência. Onde eu ia sentia cheiro de carne. Mas depois eu acostumei. Eu cozinho carne lá no serviço, né? E tudo fica uma delícia sem eu nem ter que provar. C: E por quê você decidiu parar? M: Porque a gente começou a ver uns vídeos sobre o assunto. O jeito como mata frango, coelho, é muito cruel. Quase como se fosse um assassinato. O cara metendo um martelo, gente! Isso não existe mais não! F: Vai fazer um ano agora em junho que a gente parou de comer carne. M: Mas aí foi através dessas coisas. O que adianta você ter prazer de um lado, comer bem, se dou outro o bichinho está sofrendo? – M: Pimenta eu compro em grão, para moer na hora. C: Eu amo pimenta. M: Eu também! E meu irmão, ele não pode comer pimenta. Não pode porque tem problema. Aí o que ele fez?

Você sabe qual pimenta que ele fez? Pegou a semente de mamão, deixou secar e virou pimenta. O mesmo sabor, a mesma ardura. Ele deixa secar no sol ou no forno. E vai moendo. Você não tem noção do sabor. E ele inventou isso, ele viu em uma matéria algo sobre e resolveu testar. Porque a sementinha arde né? – M: Essa panelinha o bom é que quando você desliga ela, ainda fica quente. Preserva muito mais calor. Quando eu era mais nova a gente usava. Mamãe já tinha uma. O ruim é que eu não paro aqui dia de semana, chego 18, 19 horas. No dia-à-dia a gente faz só janta. T: Como era a cozinha na sua antiga casa? M: Nossa, minha cozinha era enorme, porque eu era salgadeira. P: E a cozinha da sua outra casa era perto da casa de sua mãe? M: Não. Eu morava lá no Grajaú. Depois que eu separei que eu vim pra cá. A cozinha de lá era enorme, tinha até televisão! Tinha freezer. Porque eu mexia com salgado, vendia congelado. A gente tinha uma lanchonete ali na região.

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eu coloco com milho, azeitona…

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– M: Esse limãozinho veio lá de Itabirito. Onde eu trabalho eles têm um sítio. Por exemplo, milho lá eles não compram, traz do sítio e coloca num saquinho. Lá tudo é natural. É minha cara, porque eu gosto desses trem. T2


Visitas a famílias tradicionais

Eu era diarista lá e ela me contratou. Já faz 8 anos que estou lá. Eu cozinho e ajeito. Fica no Gutierrez. Lá no serviço eu aprendi a cozinhar na panela de pedra, lá eles usam tudo assim. Eu coloco milho na omelete. Tem gente que não gosta né? Eu faço um risoli de milho... A massa leva leite, manteiga, farinha de trigo e uns temperinhos. Temperinho que eu digo é alho, qualquer tipo que vocês usarem. O milho bate com creme de leite e faz um engrossadinho. Você abre a massa e coloca aquele recheio dentro. Vocês não tem noção. P: Lá na Ocupação da UFMG fizeram uma torta de legumes. Uma menina puxou uma torta vegetariana, cheia de legumes e queijo, ficou uma delícia. Tipo uma torta de frango mas sem frango. M: E é difícil comer sem carne né? F: Gente, parece até religião. Nos lugares, mesmo se tiver pizza de alho poró, ela tem frango. Tem sempre que levar uma frutinha na bolsa.

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M: O pessoal me fala assim “Deus fez os bichos para comer mesmo”. Eu respondo que eu sei, mas eu não quero.

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M: Vocês gostam de bolo de cenoura? Eu queria comprar uma batedeira porque gosto de bater o ovo. Mas faço no liquidificador mesmo. Eu bato os molhados: o óleo, a cenoura, o açúcar e os ovos. Quatro ovos, uma xícara de açúcar, no máximo umas quatro cenouras e bato. Depois joga na batedeira e vai colocando o seco: 2 xícaras de farinha de trigo, meia de maizena. O fermento tem que ser o último né? Aí é só colocar no forno. Faço uma caldinha de chocolate. A calda eu faço com leite. – M: Vocês já comeram carne de coco? é o coco cru mesmo, você abre ele. F: Nossa, na casa de minha avó tem muita conserva de coco . Vidros bem grandes de água salgada e coco la dentro. Na Solange também tem conserva de brócolis. T: É legal que muita coisa tradicional aqui é vegetariana né? Tipo o ora-pronóbis. M: O ora-pro-nóbis, lá na mamãe tem. Outro dia a gente tava lá, eu fiz ele picadinho refogado no azeite, faz rapidinho. T: E o povo ainda tem costume de comer?

F: Deus não criou nada para morrer desse jeito não.

M: Lá na casa da minha mãe tem um pé, na entrada.

M: Não, do jeito que a gente tá fazendo, não.

F: Ali descendo pra minha avó tem um também.

C: É, outra coisa você comer um frango que foi criado em casa, você mesma matou. Tem responsabilidade sobre aquilo…

M: Aqui o pessoal ainda usa demais. Um dia desses eu fiz mini-pizza de abobrinha. Coloquei a abobrinha dentro do forno e deixei ela dar uma murchada. Daí coloquei tomatinho, mussarela, T2


orégano e bastante azeite. Nossa, você não tem noção. Ela fica fininha, murcha tanto que fica crocante. M: Existem quatro tipos de ora-pronóbis. Eu não sei o nome… mas eu sei que um é barquinho, outro é folhinha comum, tem até um sem espinho. Você já ouviu falar de cansansão? Ele é assim, se você encostar a perna, ele sapeca tudinho. Mas se você comer é uma delícia. Ele baba, e a folhinha é grossinha. Mas se você encostar nele queima a largada. – M: Lá na casa da minha mãe dois irmãos cuidam da horta. E outro usa o fogão do corredor o lado para cozinhar feijão. P: Ele nos falou de quando foi matar um ganso e o bicho saiu correndo sem cabeça. Das farofas de gato que eles faziam quando eram pequenos... M: Faziam mesmo. Não podia achar um gato no meio da rua. Quantas vezes a gente já comeu coxinha de gato achando que era de galinha. Agora não faz isso mais não, mas antigamente fazia. P: É, ele falou que vocês pegavam as comidas todas do mato né? Iam achando as plantas e cozinhando… M: Naquela época era muito diferente! Não tinha casa em volta, era só mato. Depois que abriu a rua, foi aparecendo outros moradores. Mas cada esquina tinha um pé de trem… jambo, pau doce, você já comeu pau doce? Lá tem um pézão carregado. É um pauzinho, com umas bolotinhas, e tem um gostinho doce.

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M: Você come ele cru, ele é molinho tem uma carninha. F: E tem muita coisa que tem lá que hoje em dia é desperdiçada, igual, por exemplo, a jaca da nossa vizinha. O pé da casa dela dá um tanto e perdeu tudo, ela não vende, ela não dá. M: Eu detesto desperdício. Nessa garrafa aqui de café cabem duas xícaras grandes e quatro pequenininhas. Não fica café aí P: E quando sobra café fica meio ruim, né? M: Você sabe que quando sobra ele fica meio verde? Por exemplo, você fez café, tomou um pouco e deixou o resto na garrafa. Aí no outro dia você vai fazer outro, aquele que você jogou fora tá verdinho. P: Os melhores cafés produzidos no Brasil são enviados pra exportação, né! A regulamentação para exportação é muito mais rígida do que a aqui de dentro. F: A mãe de uma amiga comprou uma máquina para moer o café na hora.. M: Tem aquela cafeteira francesa que tem que fazer com o café triturado, porque não pode ser pó. Daí ela prensa o grão triturado na hora de passar.

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P: Mas o que você faz com ele? T2


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Prova às cegas – ProJovem

16 de março de 2017

duração: 3 horas local: ProJovem Morro das Pedras público estimado: 18 pessoas de onde vem: Após uma conversa inicial sobre alimentação com os adolescentes do ProJovem percebemos que o tema, de pouco interesse, não está presente em suas discussões cotidianas. Achamos que poderia ser interessante promover uma atividade de sensibilização. processo: Levamos dois alimentos para todos provarem de olhos vendados e, pelo paladar, falar quais ingredientes estavam presentes. Uma das meninas da turma fez anotações sobre o que cada pessoa falava. efeito: A atividade foi bem aceita para alguns da turma, enquanto outros se mantiveram mais resistentes a comer o que estávamos oferecendo. Percebemos que os alimentos artificiais são muito presentes no repertório dos jovens, que associaram sabores naturais a temperos artificiais. Os alunos com experiência em cozinha se mostraram mais apurados na identificação dos sabores e sua associação aos verdadeiros ingredientes. cardápio: Goulash de beterraba e cacau torrado

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Bolo de chocolate vegano – ProJovem

23 de março de 2017

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duração: 3 horas local: Rua de acesso ao ProJovem público estimado: 12 jovens e alguns funcionários da instituição de onde vem: Com parte da turma sensibilizada em relação à alimentação, propusemos a realização de um preparo coletivo na rua. Decidimos iniciar uma discussão sobre alimentação vegana, trazer aos alunos alimentos que expandissem seus universos culinários e gustativos, para entenderem outras formas de se fazer receitas convencionais. processo: Levamos ingredientes para fazermos um bolo com o cacau que havíamos experimentado na semana anterior, mas sem ovos nem leite. Preparamos calda de beterraba e um doce de caqui, por ser uma fruta da época, barata e que poucas pessoas conhecem. A escolha dos sabores partiu da ideia de continuarmos experimentando outras possibilidades de uso de um mesmo ingrediente. efeito: Durante o preparo alguns funcionários se envolveram. Um grupo subiu com mulheres que trabalham na cozinha do local para colher ervas na horta comunitária e preparar chás. Os alimentos foram muito bem recebidos pelos jovens, que quiseram bater outro bolo logo em seguida, dessa vez fazendo a receita do jeito que se lembravam. cardápio: Bolo vegano de cacau, calda de beterraba, doce de caqui, chás de ervas.

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Bolo de chocolate vegano – ProJovem

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Preparo na Rua – ProJovem

30 de março de 2017

duração: 3 horas local: Rua Central, Vila da Antena público estimado: 18 pessoas e transeuntes da rua de onde vem: Em uma de nossas visitas a uma família tradicional do Morro das Pedras preparamos com eles alguns petiscos empanados. Decidimos compartilhar a história dessa família aos jovens e cozinhar legumes empanados e molhos em uma das ruas principais da Vila da Antena. processo: Observamos nesse preparo como o coletivo se comportava em relação às articulações necessárias com a vizinhança para o preparo: conseguir ponto de água, trocar o botijão de gás, visitar uma vizinha para usar o liquidificador para o preparo do molho. O processo envolveu tanto jovens quanto moradores mais velhos da rua. efeito: O envolvimento de pessoas da vizinhança permitiu uma troca de experiências e saberes através da cozinha. Alguns jovens não estavam confortáveis em cozinhar na rua. O preparo do peixinho, uma folha que ao ser empanada, tem sabor de peixe frito, foi uma grande surpresa não apenas para os jovens, mas também para outros moradores que nos acompanhavam. cardápio: Abobrinha empanada, peixinho empanado, couve flor empanada, espeto vegetariano, maionese de ervas.

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Preparo na Rua – ProJovem

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Cine-Parede

1 de abril de 2017

duração: 5 horas local: Praça atrás do centro cultural História em Construção público estimado: 20 pessoas de onde vem: Cine-Parede é um cineclube de rua que o grupo História em Construção realiza em fachadas cegas da favela. Fomos convidados para levar algum preparo para a cozinha durante uma sessão de cinema. processo: Decidimos fazer algo simples para não interferir muito na dinâmica do evento, que estava cheio de crianças. Levamos alguns sacos de milho para estourar pipoca. O dispositivo da cozinha despertou curiosidade nas crianças presentes, que se organizaram para fazer e servir a pipoca, arrecadar entre eles dinheiro para comprar mais milho e suco em pó e negociaram com uma vizinha para prepará-lo em sua casa. Quando acabou a pipoca improvisamos com o que tínhamos de ingredientes e um copo de óleo cedido por uma vizinha, com cebola, farinha de trigo e temperos preparamos cebolas empanadas. efeito: A forma como as crianças se organizaram foi uma experiência onde aprenderam a cooperar para todos comerem um pouco. Durante o processo vizinhas e transeuntes também se envolveram e integraram o grupo para compartilhar a pipoca. cardápio: Pipoca, cebola empanada, sucos

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Passeio pelos quintais – ProJovem

6 de abril de 2017

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duração: 03 horas local: Quintais do Morro das Pedras público estimado: Cerca de 12 jovens de onde vem: Após alguns preparos coletivos propusemos uma atividade para sensibilizar os jovens em relação à cultura culinária local e às histórias e tradições que passam por elas. Além disso, o passeio foi uma chance para muitos aprenderem a reconhecer diversas plantas de uso cotidiano cultivadas pelos moradores do morro. processo: Realizamos uma caminhada guiada pelos próprios conhecimentos territoriais do grupo, visitando as casas com quintais que conheciam e desviando a rota quando olhares atentos encontravam alguma planta que se avistasse da rua. Durante as visitas fomos realizando fotos e breves conversas com os moradores, perguntando sobre a história deles no Morro das Pedras e de seus quintais - como iniciaram o plantio, o que escolheram plantar, os usos que fazem dos quintais. efeito: As conversas foram sendo conduzidas de modo informal, sem seguir um roteiro, estimulando nos jovens a curiosidade de se aprender com os moradores mais velhos e frisando que todas pessoas são possíveis professores para nossa vida cotidiana.

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Passeio pelos quintais – ProJovem

A primeira casa que visitamos tinha apenas uma moradora, que veio da Bahia para Belo Horizonte há alguns anos. Sua casa possui algumas plantas caindo para fora de seu muro. V: Esse ora-pro-nóbis do muro eu mal uso, dou mais para o povo que pede. Nó: É mesmo? Você não gosta não? V: Na Bahia não faz muito disso não. Nó: Ah, é verdade. Mas o chuchu você usa né? V: Eu uso. Mas é muito também né. Olha ali o tanto pendurado. Nó: É muito mesmo! E você planta tempero, alguma coisa assim? V: Não, não sou muito de plantar não viu. Porque aqui tem gato. Nó: E o que você gosta de fazer com o chuchu? V: Ah, ontem eu cozinhei um bocado. A gente fez com camarão. Nó: olha, que interessante, nunca vi! Ele refogadinho?

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V: A gente bate o camarão no liquidificador e joga no chuchu quando ele tá quase cozidinho Nó: Na Bahia a senhora usava o chuchu também? V: Na peixada a gente usa muito chuchu. Eu bato ele com outros temperos e quando ele tá quase cozido eu jogo, Nó: E o bolinho de feijão você bate também?

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V: O bolinho de feijão é o acarajé né. Bato no liquidificador com gengibre, cebola. O segredo do acarajé é bater bem a massa dele. sabe como colher de pau. Daí bater bem bem que na hora de fritar ele incha. então o segredo é esse. A menina não sabia e fritou sem fazer isso. Nó: Fica pesado né? V: É, eu falei que não, tem que bater bem com a colher de pau. É o segredo. Daí coloca a cebola e o gengibre na massa. Nó: Eu nunca tinha visto gengibre no acarajé. V: É tem que colocar cebola e gengibre. Nó: Mas você refoga o gengibre? V: Não, não. Você descasca ele. Quando vai passar o feijão do acarajé no moinho, você coloca um pedaço do gengibre. Não pode colocar muito! E a cebola! Depois você passa no acarajé e coloca vinagrete, camarão, vatapá e caruru. Sabe o que é caruru? Nó: Não. V: Caruru é quando pega o quiabo, corta bem miudinho, pica bem picadinho, e depois você coloca camarão, cebola, tomate, pimentão, coentro e todos os temperos. Daí bate no liquidificador camarão e os temperos e coloca dentro do caruru. Aí vai cozinhar o quiabo, né? Depois você coloca azeite de dendê e o coco. Vatapá é a mesma coisa, você vai fazer vatapá de pão, aí você coloca o pão de molho, bate no liquidificador com todos temperos, camarão, castanha, amendoim, tudo! Depois vai mexer no fogão. T2


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Nó: Quanto tempo? V: Ah, fica um tempo. Quando você vê soltando da panela já, quase igual mingau de milho, dando aquelas bolhas, aí já tá no ponto. Nó: E na Bahia você tinha quintal também? Plantava? V: A minha mãe plantava. Plantava alface… minha família é do interior. Nó: E há quanto tempo a senhora está morando aqui em Minas? Nó: O ora-pro-nóbis aqui você que plantou? V: Eu cheguei e encontrei já aqui. Só que eu encontrei só aquele negocinho fiado, sabe? Aí comecei a zelar, a tocar minha mão. Porque minha mão é muito boa para planta. Aí comecei a tocar nele e ele começou a fazer isso aí. Só que não dá gosto porque o caminhão vem e arregaça tudo. Caminhão vem e.. olha o chuchu aqui pendurado, olha! Vem até aqui. Eu mando o pessoal pegar, mas eles esquecem e o caminhão vem e leva com tudo. Nó: Aí perde né. V: Não, não faz gosto não. Eu às vezes penso em mandar tirar tudo. Porque você zela, você molha e limpa a coisa toda. Daí vem um caminhãozão pesado que tá fazendo esse estrago. Isso aqui não é lugar de passar caminhão não. É muito estreito.

essas coisas. Ó aí o chuchuzinho. Esse é do verde, é uma delícia. Nó: Sabia que esse chuchu, quando tá novinho, dá para comer o talo também? V: O talo? Você come? Nó: É, você branqueia ele, ferve na água quente, aí dá para comer na salada. V: Olha só! Essa folha aqui mesmo eu não comia. Nó: Ora-pro-nóbis? É mineiro. Tem muita proteína. V: E dá uma flor tão bonita. Dá para comer, fazer doce. Eu vou tirar uma muda para vocês plantarem, tá bem? Vou levar um maracujá para vocês também!

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V: Já faz uns 15 anos que eu moro aqui.

Nó: Obrigado, e desculpe o incômodo tá? V: Ih! Que nada.

Nó: Qual caminhão é? Do lixo? V: Não é só caminhão do lixo não. É caminhão de concreto, pessoal que bate lage, T2


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A dona da segunda casa foi uma das primeiras moradoras do Morro das Pedras. Ela distribui as uvas que cultiva aos seus vizinhos. Nó: A senhora sempre morou nessa casa? P: Eu vim pra cá há 50 anos. Eu sou de Nova Lima, nascida lá. Só que acontece que vim pra cá com 16 anos, para Belo Horizonte. Mas depois voltei para Nova Lima, me casei em Nova Lima. Nó: Aí você ficou lá mais um tempo? P: Não, saí daqui, fui me casar lá e voltei. Nó: A senhora sempre plantou aqui? P: Aqui ó, esse pé de laranja, tem mais que 50 anos! Nó: Ele veio pra cá com você então? P: Não, ele veio na minha frente. Nó: Quando a senhora chegou já tinha ele aqui? P: Não. Eu mandei ele vir na frente. Aqui era a casa da minha sogra. Nó: Como que foi? P: Aqui era a casa da minha sogra né. E isso tudo era dela. Então nós, depois de 3 anos de casados, viemos morar aqui com ela porque ela já estava meio adoentada. Mas esse pé de laranja eu mandei na frente, porque Geraldo morava com ela. Então plantei ali, onde era nossa entrada. Dela restou só isso. Nó: Era mais de um pé? P: Eram muitos. E eram muitos porque era meu sonho, porque quando eu era

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menina, o vovô tinha um sítio e o sítio dele era assim. Era a entrada no fundo e na frente só laranja. Nó: Onde era o sítio dele? Nova Lima? P: Em Belo Horizonte. Onde é o Salgado Filho hoje. Nó: E aqui era bem diferente também quando a senhora chegou né? Devia ser muito mais arborizado. P: Nossa… eu não quero nem lembrar. Era ruim mesmo. Para começar fazia até medo. Ali tinha umas plantas muito grandes. E lá escondiam pessoas. A gente vivia com o portão trancado. Nó: E aí foi melhorando? P: Sim. Hoje nós estamos no céu. Né, Marcos? Nó: Quando a senhora chegou aqui tinha água na sua casa? Ou tinha que descer para buscar? P: Não. Eu pagava para buscar. Porque eu não dava conta de buscar também. Nó: E a senhora pagava quem? P: Tinham aquelas pessoas que enchiam o tambor para gente e então a gente pagava. Era 1 real por lata. Nó: E a senhora gastava mais ou menos quanto de água?

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P: Era um tambor por dia! Nó: E tinha esse tanto de planta. Dava para regar elas todas? P: Ué menina, você tá doida. Aproveitava a água. T2


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Nó: Onde a senhora mandava buscar? P: Ali em cima, onde tem aqueles… olha, no interior a gente fala é bulcera mas aqui já fala que é apartamento. Daí eu digo aqueles “apertamentos” ali… Ali em frente à padaria, pois é. Nó: E como é que a senhora aproveitava a água? P: Uai, água que cozinhava arroz, que cozinhava feijão, tudo você guardava. Nó: Hoje em dia a senhora ainda aproveita a água? P: Hoje não. Hoje é mais fácil. Não estou falando que a gente está no céu hoje? Nó: E a senhora costuma cozinhar com as coisas do quintal? P: Eu não tenho coisa para cozinhar assim não. Nó: É mais tempero, né? P: É, mas nem isso eu tenho. Nó: E por que a senhora planta?

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P: Porque eu gosto, eu gosto das coisinhas assim sabe. Aquela uva ali ó, casou com a outra e agora tá dando essa preta. Nó: E a uva que dá aqui a senhora faz o que? Você come, faz doce? P: Não, eu dou para os outros. Nó: Tem mais vizinho aqui que planta, para você trocar muda com eles? P: Não. Eu sou muito grande né?

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Você está vendo meu tamanho (risos). Então eu espero que a pessoa apanha e eu fico com um pouco. Tem hora que eu não tenho quem panhar daí dou dinheiro e o menino apanha. É, meu filho, você tem que se virar. Esse ano não deu muita não, deu até pouca. Mas ano passado deu uva. Nó: Tá na época? P: Já passou, agora só dezembro. Se vocês estiverem aí pode pegar. Nó: Ali na outra casa a menina falou que passa o caminhão de lixo e ela fala para eles pegarem o chuchu que dá no muro também… sempre teve esse costume de passar o caminhão de lixo recolhendo as coisas? P: Não, eles não recolhem não. A gente chama. Eles param para recolher o lixo e a gente chama eles. Aí é ótimo, faz amizade... Chama para um café. O que vale é a amizade que a gente faz! E graças a Deus, um dia a gente repassa isso para frente. Nó: E quando a senhora faz festa aqui chama os vizinhos também ou só família? P: Mais é família né? Porque graças à Deus minha família é grande um pouquinho. A vizinha fala assim “a senhora faz festa todo dia!” Mas é só a gente mesmo. Agora aquele vizinho que chega também pode vir. Nó: E tinha época que tinha festa na rua também? Ou nunca teve isso de reunir a vizinhança e fazer festa na rua? P: Nós já tivemos sim. Nós tínhamos uma vizinha aqui que já morreu. Mas ela era quem fazia a festa… como chaT2


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ma? São Cosme e Damião. Nó: Legal. Vocês distribuíam os doces? P: Ela fazia festa lá em frente à casa dela, que é ali na frente da pracinha. E nós tínhamos também muita festa na igreja, na quadra aqui em cima. Mas tá vendo, eu tô por fora. E aqui na rua também tinha a vizinha ali na frente, queimava o judas ali, daí jogava bala para cima dos meninos... Nó: E a de Cosme e Damião era como? Quem fazia esses doces? P: A dona ia e trazia do mercado. Porque o marido dela era fiscal lá no mercado. Era muito legal, coisa boa mesmo. Essa festa da igreja também era coisa muito boa. Porque a última que fizeram aqui, menina mas que coisa linda, ficou na história mesmo. Deu meia noite quando acabou a festa. Mas que coisa. Ih, tem quantos anos filha? M: Tem tantos anos mãe, eu estava na adolescência. Foi em noventa e... dois?

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Nó: E por que parou de ter essas festas? P: Para minha idade acho que tem que deixar para os jovens. Mas eu gosto de jovens, gosto mesmo. Eu participava do grupo ali da Igreja, eu era a vovó dos jovens. Isso era gostoso, porque a gente viajava... era até ruim, toda hora vinham falando “a cama da senhora está pronta”, ou “aqui a comida da senhora”. Gente eu não morri ainda não!

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Nó: É, mas eles cuidavam bem de você né. P: Mas pois é, eles cuidavam tanto que tinha que brigar com eles. Aí eu vim embora antes da turma também. Eles me levaram para Sete Lagoas, me colocaram dentro do ônibus. Meu Deus do céu, gente fica parecendo que eu estou velha! Sou velha não, só tenho 47 anos (risos). Vocês estão achando que eu estou velha? Acham que eu estou mentindo? Nó: Os filhos da senhora moram onde? P: Cada um para um canto. Ih, vai casando… mas no domingo, minha filha, isso aqui enche. Nó: E como é que a senhora passa no domingo? P: Eu sou a primeira a comer e falar mas tá é boa! E depois eu chamo “tá pronto fulano” “tá pronto fulana” e ninguém vem. Nó: E o que eles gostam mais que a senhora cozinha? P: Minha feijoada é gostosa. Meu caldo. Faz um tempero gostoso. Mas seu eu estiver cansada ou com raiva eu não faço. Por que você vai fazer? Porque cozinhar com amor é o principal. Nó: A senhora já provou essa uva preta que nasceu misturada com a rosé? P: Ainda não, essa que veio para cá é a rosé e agora ela casou com a outra e deu uva preta. Mas eu não queria essa não, queria era a rosé, que é diferente. Agora que já casou tenho que conseguir outra muda.

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A terceira casa que visitamos é de uma família que planta há muitos anos. A senhora compartilha suas ervas com vizinhas, e seus netos cozinham para a família e para fora.

Nó: Ah sei, ali no norte. A senhora plantava lá também?

A: Você veio buscar chá? Nó: O que é?

Nó: Todos seus filhos moram aqui em BH?

A: É poejo. Vai levar para ela.

A: Nem todos.

Nó: É bom para que?

Nó: Mas todos tem gosto para plantar?

Nó: E você planta aqui?

A: Eu planto para eles. Quando precisa eu dou.

A: Eu planto poejo, hortelã, cebolinha, babosa.

Nó: Como você começou a plantar?

Nó: E você usa tudo? A: Uso. Agora esses dias não estou muito bem, aí meu filho está cuidando. Nó: A gente está fazendo uma pesquisa com os meninos do ProJovem para entender o que as pessoas plantam em suas casas. A: Ora-pro-nóbis eu tenho na minha horta também. Nó: Você é cozinheira né? A: Eu? Ninguém conta. Nó: Tem quanto tempo que a senhora planta aqui? Desde quando você chegou? A: É! Graças a Deus. Nó: A senhora é de Belo Horizonte mesmo? A: Não, nós somos do interior. Nó: De onde? A: De Governador Valadares.

A: Veio um amigo meu aqui e olhou para minha horta e deu para mim até uma semente… Nó: Como que é esse chá? A: Esse é pra saúde da criança. Esse aqui é algodão, esse funcho, hortelã. Esse aqui é o poejo. Esse aqui eu não sei o que que é., acho que é gengibre. Nó: E como você aprendeu essas receitas com chá? A: Da cabeça, das ideias. Tá tudo aqui. Eu não gosto de tomar remédio, eu gosto de tomar chá. Nó: O remédio é uma indústria né? Que quer te ver sempre dependente.

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A: Para gripe né?

A: Lá eu não mexia com planta não. Trabalhava com lavoura… Não dava tempo não, mexer com horta.

A: Nossa agora a um tempo atrás aqui tava cheio de almeirão e alface. Você precisava de ver o quanto que tinha. Tinha muita mesmo. Nó: E quando tem muita assim você distribui? T2


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Nó: O pé você tratou com alguma planta ou tomou remédio? A: Quando eu vou no médico o único remédio que eu uso é o de pressão e assim para dor… aí o resto eu prefiro tratar com chá. N: Como você descobriu que eu estou cozinhando? H: O tropeiro que você vende, ue. Nós já comemos. Nó: Você faz em casa mesmo? N: A um tempo atrás eu estava fazendo. Mas eu trabalho é com idoso, sou cuidadora. Nó: Mas daí você faz em dia de evento? N: Faço Nó: Você vende onde? N: Em casa mesmo. Nó: Aí quando você faz você avisa como que vai ter? N: Quando tem meus meninos falam, põe no facebook, daí eu faço. Mas falar para vocês, tem um macarrão perfeito. Você pica o alho, depois pica o bacon, aí frita. Depois você pica cebolinha, cheiro verde e camarão. Cebola e tomate. Aí você mistura ali com o que já ta frito joga e da uma misturada. Daí você coloca o verde; cebolinha salsinha, o que você quiser… A minha mãe usava muito tempero mas tudo natural. Picava o alho, a cebola. Nada de tempero industrial. Mas ela fazia todo tipo de comida. Quando a gente veio aqui para Belo Horizonte ele tinha 12 anos. Daí sabe ali

na trincheira? Na contorno? Ela trabalhou numa casa ali de muitos anos de cozinheira. Esse daí está fazendo curso de gastronomia. Nó: E você gosta de cozinhar que tipo de coisa? P: Eu faço de tudo, desde o básico até elaborado, o que precisar de fazer. Igual eu tinha que fazer um trabalho para escola, fiz um bolinho de batata recheado de carne moída. Frito. N: Deu trabalho para ele coitado. P: Eu falei: eu vou fazer com carne e vou fazer assado. Coloquei carne, cebola, pus farinha de pão, passei molho, empanei e ficou uma delícia. Nó: E por que você escolheu gastronomia? P: Porque sempre gostei de cozinhar, e não tem nada melhor do que escutar uma pessoa que está comendo elogiar o seu trabalho. Nó: Dá prazer né? P: Sim. Domingo mesmo veio meu colega aqui comer lasanha com molho branco. N: A comida só tem uma coisa, você tem que fazer… igual meu filho fala, a comida da minha mãe pode ser arroz com feijão mas é uma delícia. Mas tem que fazer com amor. Entendeu? Se você faz com amor e carinho, aquilo que você come vai estar uma delícia. Tem aquelas pessoas que reclamam “que porcaria, só tem arroz e feijão” e não sentem prazer em fazer.

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N: Distribui né? Ela não podia mexer porque estava com pé inchado...

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P: Igual minha colega ela é mulher e me pergunta “não sei onde você tem tanta paciência para cozinhar. Eu cozinho por causa do meu filho, se não fosse por ele nem na cozinha eu entrava”. N: Eu gosto de experimentar sabe? Pensei, sonhei e fiz. Eu invento e faço dar certo. Eu não anoto. Outro dia meu filho falou, que ele é garçom, que eu nunca ia conseguir trabalhar com cardápio. Dá vontade de fazer mesmo um restaurante sabe? P: Ali também quem cozinha bem: comida simples, caseira… A: Eu não sou de misturar assim não.. feijão, arroz, angu, abóbora, chuchu, tomate, pimentão. Nó: E tem alguma coisa muito diferente que você aprendeu na escola de gastronomia? P: Eu estava na teórica. Hoje vai começar a prática.

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Nó: Mas na teoria aprendeu algo novo? P: Nossa, praticamente tudo né. Porque igual acontece, é muita coisa que você ve no supermercado e fala assim “a partir de hoje eu não entro mais naquele supermercado, açougue”, a pessoa fica com todos sentidos mais aguçados em questão de alimentação. Nó: Você fala do supermercado por causa dos produtos industrializados? P: Também. Igual meu professor chegou e falou que essas latas que vem comida pronta geralmente são

produtos que já estão vencendo, eles colocam um tanto de conservante e vendem para o consumidor. Nó: A comida que eles chamam de congelada, aquilo não é bom não. É bom fazer na hora mesmo. P: Outro dia eu vi uma reportagem um senhor falando que nem chama isso de comida, chama de produto comestível. Porque comida mesmo é o que a gente colhe, cozinha né… N: É, igual o macarrão. Eu trabalhei com uma senhora ela é italiana. Você sabe um macarrão do tipo bico de pato? Ele é um macarrão grosso, aí o que acontece. Ela picava presunto e mussarela, deixava na água 15 minutos, aí ela fazia o molho e punha camada por camada, camada por camada…. daí vinha com o molho diferente, daí outra camada. Ele é tipo uma lasanha, só que com o próprio macarrão, recheado em cada camada. Nó: É muito diferente de você comprar uma comida pronta né? Você não sabe o que vem em uma comida pronta. Você sabe que está escrito um tanto de nome que a gente não entende. Mas não tem T2


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como garantir nada. N: Exatamente. Então a comida congelada, ela não tem um sabor igual a comida feita na hora. Nó: Igual esses molhos brancos, pode ser farinhado que a gente nunca vai saber. Sabe? Não tem como a gente saber. P: Você só sente o gosto, mas não sabe o que é. Nó: E pode ser até um gosto gostoso, mas ser tóxico para gente. N: Igual você vê la. Eu inventei uma vez lasanha de arroz. Sabe o que acontece? Vai fazer um prato só. A lasanha de arroz é igual você faz a lasanha. Só que você coloca uma camada de arroz de molho… não sobra arroz? As vezes muita gente joga ele fora. mas o que acontece, você pica a cebolinha, tempere, refoga ele. Aí você põe uma camada de arroz, uma de molho, presunto e mussarela. Por último você pega um pote de requeijão e põe por cima para gratinar. Aí faz uma salada de alface e não precisa de mais nada. Nó: Você já tem todos nutrientes, né? N: Exatamente. Mas essa lasanha de arroz fui eu mesma que inventei.

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Nó: É bom ser inventivo na cozinha né? Porque sempre vira coisa nova, não fica sempre a mesma coisa. E hoje na aula prática vai ser o que, você sabe? P: Vai ser degustação. Nó: Há quanto tempo você está fazendo? P: Há um mês. E dura dois anos e meio.

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Mutirões

08, 14, 21 e 28 de abril de 2017

duração: 09 às 19h local: Morro Verde público estimado: cerca de 30 pessoas por dia de onde vem: As áreas abaixo da linha de transmissão de energia que atravessam o Morro das Pedras foram removidas por obras públicas, que nunca foram concluídas. O História em Construção se articulou com um grupo de vizinhos de uma dessas áreas de remoção para a construção de uma horta comunitária, batizada de Morro Verde. processo: O início dos mutirões para remoção dos entulhos que estavam há mais de 5 anos no terreno se deu quando a Cozinha Comum Itinerante estava em posse compartilhada com o História em Construção. O grupo de moradores do Morro das Pedras utilizou a cozinha para realizar preparo de refeições para todos que trabalhavam no projeto. efeito: A cozinha contribuiu para movimentar os mutirões, pessoas se aproximavam, interessadas pelo equipamento e pelo cheiro dos preparos. As refeições eram feitas por um grupo de crianças e adultos, que as ensinavam como fazer receitas, enquanto outro grupo trabalhava na horta. Crianças que não tinham hábito de cozinhar em casa iam aprendendo com pessoas mais velhas a manusear utensílios e fazer a comida. cardápio: Arroz, feijão, arroz temperado com milho e orégano, macarrão com legumes, saladas.

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Saberes culinários da família Canuto

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duração: 8 às 20h local: Beco dos Canutos público estimado: 60 pessoas de onde vem: Durante nossas visitas às famílias tradicionais do Morro das Pedras construímos uma relação afetiva especial com os Canutos. A família reside no lugar há cerca de 50 anos, acompanhando muitas das transformações do território, algumas vezes refletidas em sua alimentação. Com eles aprendemos muito sobre receitas, histórias, lutas, cultura e modos de vida consciente. Decidimos junto a alguns membros da família levar a Cozinha Itinerante até o beco que leva o nome deles, para realizar um evento de memória gustativa. processo: Construímos junto com eles um cardápio. Uma das irmãs, há mais de um ano vegetariana, incluiu receitas tradicionais repensadas de forma a não usar carne. Durante o evento a família se reuniu para cozinhar e fazer samba, movimentando várias pessoas da vizinhança, num lugar de encontro, confraternização e troca. Algumas pessoas levaram ingredientes de seus quintais, como pau doce e folhas de louro. efeito: Nas conversas durante o evento conhecemos muitas histórias sobre a comunidade, a família e o território. O momento de confraternização na rua foi muito apreciado pela família e vizinhança, valorizando a produção cultural e tradição presente nas práticas da família Canuto. cardápio: Feijoada, canjiquinha com suã, canjiquinha vegana com ora-pro-nóbis, estrogonofe vegetariano de abobrinha, café, caipirinha. T2


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Preparo de quibe – ProJovem

15 de abril de 2017

duração: 03 horas local: História em Construção público estimado: 12 pessoas de onde vem: Para esta oficina a ideia foi apresentar uma releitura de um prato que todos conhecem, o quibe, introduzindo na receita a abóbora, ingrediente nutritivo e tradicional da culinária mineira. processo: Propusemos uma dinâmica na qual cada jovem prepararia um quibe para dar de presente a outro; assim, mais pessoas participariam do processo. Logo eles começaram a se articular e a criar parcerias, combinando entre si as trocas da comida e como iam querer o seu salgado. efeito: Um vizinho participou ativamente do processo, além de ensinar aos jovens algumas técnicas de cozinha, saiu, comprou utensílios para o preparo de café e levou biscoito para os alunos comerem. Uma das alunas nos contou que não come quibe, mas que dessa maneira ela havia gostado e que poderia ser vendido, ela levou parte da massa para cozinhar para sua família. cardápio: Quibe vegano de abóbora, biscoitos e café.

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Festival da Quebrada

29 de abril de 2017

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duração: 12 horas local: Rua no Conjunto Santa Maria, localizado ao lado do Morro das Pedras público estimado: 400 pessoas de onde vem: O Festival da Quebrada é um acontecimento cultural do Conjunto Santa Maria, organizado pelos próprios moradores do local. Foi uma decisão dos realizadores utilizar a verba que seria gasta para produção de comida de camarim para fazer refeições para todo o público do festival e articular essa produção com cozinheiras locais da comunidade. Fomos convidados para sermos parceiros nesse preparo e utilizarmos a Cozinha Comum Itinerante como estrutura para ele acontecer na rua. processo: Junto com as cozinheiras criamos um cardápio. Elas trouxeram a preocupação de ser uma comida popular e bem apresentada, para as pessoas do evento verem que o preparo foi um processo cuidadoso. Cozinhamos o dia inteiro, alimentando todos os presentes no almoço, fornecendo lanche para as crianças e janta para os artistas. efeito: Observamos que a cozinha na rua afetou de forma positiva a dinâmica do espaço, atraindo vizinhos ao preparo e permitindo trocas e cooperações diversas. Conhecemos vários moradores que nos contaram da história do conjunto e da comunidade. A cozinha coletiva despertou várias lembranças e permitiu a partilha de muitas ideias. cardápio: Macarrão com molho de carne, macarrão vegetariano, salada, cachorro quente, pipoca. T2


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Troca de mudas no dia das mães

14 de maio de 2017

duração: 4 horas local: Rua Principal público estimado: 50 pessoas de onde vem: Fomos convidados pelos moradores do Morro das Pedras para participar do evento comunitário de celebração do dia das mães. Como o evento esperava um público muito grande, decidimos não trabalhar com a produção de comida mas realizar uma troca de mudas, receitas e preparo de chás, aproveitando a oportunidade para apresentar o Morro Verde a outros moradores do Morro. processo: A escolha das mudas para o evento foi feita a partir de nossa observação de plantas convencionais dos quintais, que nos levaram a procurar mudas não tão comuns na região e que poderiam despertar maior interesse dos moradores. Nossa escolha também levou em conta as plantas com propriedades medicinais, para provocar conversas a respeito de seu uso, e plantas alimentícias não convencionais que não havíamos encontrado por lá, para introduzirmos outros cultivos no cotidiano do local. efeito: A proposta permitiu a coleta de receitas, dicas de cuidado com plantas, visita a quintais e várias conversas com os moradores. cardápio: Chá de capim cidreira, chá de hortelã. mudas: Carqueja, citronela, capuchinha, terramicina, alfavaca, alfavaca cravo, nirá, guaco, peixinho, levante, guiné, melissa, luzia, funcho, orégano, cânfora, alho social.

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Troca de mudas no dia das mães

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Outras conversas

Conversa com uma moradora da Vila da Antena que cuida da horta comunitária (Morro Verde). Nos encontramos lá em um sábado e ela nos convidou para conhecer sua casa, seu quintal e sua horta. C: Que horta linda! Podemos tirar algumas fotos? G: Claro, quase todo mundo que vem aqui pede. H: Isso aqui vai dar mamão demais uai. G: Vai dar muito não, porque o mamão tá miudinho, então não vai dar muito não. T: Há quanto tempo você cultiva aqui? G: Ó, tem sete anos que eu moro aqui, quando eu cheguei aqui esse barraco tava praticamente no chão. T: Mas não tinha nada plantado?

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G: Só capim navalha. Daqueles capim navalha que passa na gente e corta tudo. Isso aqui já deu mamão para mim dar, para mim vender… Olha os pés de quiabo, olha para você ver. E aí eu deixei ele endurecer e aí ó (amassa o quiabo com uma mão) tá tudo duro, não presta mais. P: Isso é quiabo? Ele é diferente. T: Mas ele dá para comer quando chega nesse tamanho? G: É, para comer. T: Mas é da mesma espécie daquele que encontramos no mercado?

G: Ah, esse já é outro. Esse eu não sei te informar não. Só sei que esse é para aquelas pessoas que não gostam de comer quiabo com semente. T: Ah, ele não tem semente? G: Ele tem semente, mas ela é mais fácil para tirar. P: Será que ele dá menos baba? G: Dá menos baba! Mas a baba do quiabo é muito fácil para tirar! É só pegar um tomate de vez e cortar no meio dele, na hora que você por ele lá, já vai a baba toda. P: Antes de cozinhar? G: Na hora que você acabar de refogar ele. Refogou ele, aí soltou a baba você joga um tomate descascado de vez lá que a baba dele vai embora na hora. Aqui ó o que eu vou te dar, está até seco aqui ó. P: Quando ele tá seco assim dá para tirar a semente? G: Dá. Tá caindo já, se não pegar cai. Esse aqui é chuchu, esse eu fiz um negócio nele assim ó, aqui nesses canos. ele T2


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Outras conversas

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Outras conversas

vinha aqui e ia até lá no vizinho. Daí o vizinho foi fazer o muro e derrubou tudo para baixo, aí ficou assim. Tem isso para arrumar mas não tenho tempo não. Esse pé aqui deu mamão. Esse aqui também deu muito mamão. Ele tá lá no alto. P: Olha tem muito pé de cana! G: Ah, você gosta de cana? Quer levar uma? P: Uai, quero! G: Ultimamente graças a Deus quando alguém vem aqui tem sempre coisa para dar. P: Aqui você está secando jiló né? G: Não, não é que eu tô secando jiló. O jiló era para estar seco. É que a chuva veio e molhou ele. T: Ele é para as galinhas ou para comer? G: Não, é para secar, para pegar a semente para espalhar, né? Aí depois eu venho aqui e pego ele. T: As galinhas você cria onde?

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G: Eu vou te mostrar. Temos que entrar lá dentro para te mostrar. G: Olha aqui para você ver como a couve é tão danada. Plantei essa couve aqui a tanto tempo e ela está dando muda! Semente de couve! C: Eu não sabia que couve tem semente! G: A gente compra semente de couve! Mas ela não sai a semente, já sai as sementeiras, aquele tanto de muda assim em volta. Quando vai dando

muito assim eu tenho que tirar e jogar fora. Não tem para quem dar. – G: Aqui, o chuchu daqui é verdinho, olha. Verdinho, verdinho. Ali, atrás daquela folha. Ali do lado também tem. Ele costuma crescer e cair aí para o chão. T: Gente, quando você chegou aqui então não tinha nada? Você plantou isso tudo? G: Nada. Nada. Não tinha saúde não. Eu comecei com couve. Aí depois eu plantei o chuchu. Aí depois eu busquei as taiobas lá embaixo perto do posto de saúde. T: Buscou onde lá? G: Longe demais. Desce toda vida. O moço falou assim ó, eu falei “ô moço, me dá uma muda de taioba” ele respondeu “oh moça, arranca tudo e leva aí para mim por favor, é bom que você limpa aqui para nós”. T: Era no lote dele? G: Sim, no lote dele. Ele falou “então você limpa aqui para mim”, aí levamos essas taiobas para limpar e comer. Mas T2


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T: Senão ela fica grande também né. G: Não. Isso depende do tamanho da batata. Se for pequenininha a folha vai ser pequena. Se a batata for grande vai dar folha grande! T: Quanto mais velha ela vai ficando as folhas vão se tornando maiores? G: É, e se a gente não tirar a folha, aí dá muda. E se a gente tirar aí não dá muda. É muito legal mexer com planta, eu amo mexer. Isso daqui eu ganhei um galhinho desse tamaninho assim... T: De quem? G: Dessa dona que mora aqui em cima. Ela perguntou, “você quer um galhinho de elevante? Você anda tão nervosa…” Aí eu falei “eu quero um galhinho”, ela tirou um bem pequeno e me deu. Levei e plantei ali naquele cantinho mas o negócio ficou grande. Foi até ali na frente e estava tomando conta. T: Mas é um tipo de hortelã? G: É, um tipo, da família do hortelã. T: Nossa, muito lindo isso tão pequeno virar isso tudo. Foi muito tempo né? G: Muito tempo nada menino! À medida que a gente vai jogando aí já vai virando grande. Essa abóbora aí você acha que eu plantei? Precisa plantar não, tudo que eu jogo aqui já nasce! Você viu ali meu pé de couve como está cheinho de muda? Aqui ó. Ó o que eu falei para você, está descuidado! (mostra uma praga

dando em algumas folhas) T: E como você cuida dessas pragas? G: É com detergente de coco. Eu tenho aqui e jogo a água com o detergente de coco bem forte. Aí depois eu venho com outra água e enxáguo. E as folhas que estão muito contaminadas eu tiro para não passar para as outras. É o único remédio que eu sei para usar. T: Coisa química você compra? G: Não não, porque é tudo natural né… Nem adubo a gente pode pôr muito. Eu ponho muito adubo do galinheiro. P: Casca de banana também é muito bom! G: Todas as cascas são boas! Essa daqui, chama macaé. Ela é remédio para dor de barriga e gripe. Só que para dor de barriga a gente esfrega ela em água fria. E para gripe a gente pega ela, ferve a água, joga e abafa daí a pouco toma ela quentinha e dorme que ela joga a friagem do corpo toda para fora. C: Você conhece tanto da propriedade das plantas. Você chega a tomar remédio? G: Nada. Eu sou analfabeta.

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não tinha ferramenta não. Só que a taioba é assim, a folha dela desenrolou tem que tirar. Porque se deixar ela começa a amarelar daí já perde.

C: Mas olha o tanto de coisa que já nos ensinou. T: E onde você foi aprendendo tudo isso? G: Eu fui aprendendo comigo mesma, as galinhas também aprendi a cuidar delas comigo mesma. Agora mesmo T2


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elas estão doentes, vou te mostrar daqui à pouco. T: E quando elas estão doentes o que você faz para tratar? G: Ó, eu chego lá e vejo que a galinha tá meio triste e não tá te escutando. O moço fala para dar remédio para ela, aí eu penso, como vou dar remédio para elas? – G: Olha esse dedo de moça como tá grande! Falam comigo para pegar um copo daqueles de cachaça, encher de água e por uma medidinha daquelas e encher de dedo de moça. E tá tudo muito grande, temos que passar para horta. Ali, ó, as morangas. E pessoa já veio aqui e já comprou umas 6 morangas. H: Você já tem moranga madura? G: Tem uma quase madura ali. Mas as pessoas sempre querem comer ela verde. Falam para antes de amadurecer eu dar. Porque é mais gostosa ela verde ne. Esse pessoal da roça mais antigo gosta de comer assim, porque já é acostumado. Então quem vem é só essas pessoas assim, comprar uma couve… aí eu tenho que cuidar.

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H: Mas ela depois fica amarelinha, né? G: Agora ela tá com a cor meio desbotada. Precisa cuidar, é muita coisa, eu tenho que tirar para plantar em um outro lugar porque a abóbora saiu destruindo as plantas todas. Tem que tirar com cuidado para levar para sua hortinha…. Nossa hortinha! Ele falou que é nossa! Vem cá para vocês

verem os galos que eu tenho. (entramos pela casa dela) H: O que é que você faz com as cascas de ovo? G: Olha, eu costumo fazer cálcio. Eu lavo bem lavadinho, deixo secar em cima da bancada, aí eu levo na panela, seca bem sequinho. Vou torrando e vou quebrando, aquele restinho que sobra que ficou meio espedaçado eu levo no liquidifcador seco sem água, bato, e aí eu ponho na comida. Aí ela fica assim esfarinhada tá vendo? Tem gente que torra no forno, eu prefiro na panela porque vai misturando e já vai quebrando. Você não pode bater tudo de uma vez não. Você vai lá, bate, deixa descansar, aí vai descer a poeira que é da casca do ovo. Aí depois você vai lá, dá outra batida, é aos pouquinhos. Com ovo branco não é muito bom, tem que fazer mesmo com ovos de galinha capirira. Eles têm mais cálcio porque as galinhas são mais alimentadas com mais verdura, coisa diferente. Tem ração também, mas come muito brócolis… Quando eu parei de mexer com verdura elas sentiram um pouco, a verdura delas caiu um cado. Elas tavam acostumando um pouco com as folhas. H: E os pintinhos? G: Os pintinhos já viraram galo, já foram para barriga… H: Outro dia vim aqui e estava muito cheio! P: Nossa, que galinha gigante. G: É gigante não, é sapateira. Elas comem ração de cachorro, ração de crescimento, milho, tá vendo? T2


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P: E essa galinha deitada aqui, preguiçosa! G: Ela tá chocando! T: Fica quantos dias chocando? G: É 22! Aqui ó, essas daqui tão fazendo cocô branco. Tem que tomar remédio. São poucas pessoas que mexem com esse tipo de galinha, dá muito trabalho. T: E esse poleiro, dormem todas aí?

P: Como que ela chama? G: É Criosa! Eu tinha Ana Paula, Vitória não sei o que lá, só que uma hora falei que ia parar de pôr nome. Agora só essa que tem. E eu tenho que ficar procurando quem vai querer esse tanto de ovos. T: Quantos mais ou menos que dá? G: Todo dia a galinha põe ovo, aqui está na faixa de 15. Um por galinha. T: E o pessoal compra na vizinhança? G: Compra! T: Mas como é que eles ficam sabendo? A senhora anuncia? G: Eu quando vendo verdura saio falando que vendo galo caipira, a galinha caipira, ovos… T: Você vende galinha também? G: Vendo. A pessoa escolhe, aí eu vejo se tá com saúde. Você sabe que galinha é mais cara que o galo né? Essa galinha aqui tá na faixa de 35 reais, porque essa não choca. Ela não aguenta chocar.

– G: Você não come carne não? Ah, eu não como é carne congelada. Ah aqui ó, todas eu que cuidei. Se chegar para mim e perguntar quanto é a galinha e depois vir dizendo “mas você limpa ela para mim?”, eu limpo, mas daí tem que me pagar a limpeza da galinha né? “Quanto você vai me cobrar?” “5 reais, para entregar ela morta e limpinha”. E pode ser uma que eu cuidava, quantos pintinhos não dormem do lado da minha cama dentro da minha casa... Olha aqui para você ver quando a galinha tá chocando. Quando a galinha quer chocar, não tem jeito, tem que deixar. H: Você não tinha um pato também? G: Tinha, mas eu fiz uma burrada, porque eu estava precisando de dinheiro para comprar um gás, aí eu peguei o meu galo bonito e dei para aquele homem. Aí ele colocou naquele caixotinho lé em cima olha (aponta para um cercadinho na laje do vizinho). Eu fiquei com dó, fui pegar o galo de volta. Ele falou que queria dois frangos

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G: Não, só as menorzinhas aqui. As grandes dormem lá. Essa aqui ó, ela teve uns pintinhos, aí essa é criosa, gosta de colo e tudo. Agora ela tá meio fraquinha…

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e o pato. E eu falei que ia dar só para comer ele, porque não queria ver ele sofrendo desse jeito não. Aí ele já estragou o galo, porque galo não pode dormir no chão. Se dormir no chão perde peso e de repente já começa a adoecer. Minhas galinhas gostam de dormir no poleiro esparramada, não gosta de poleiro fininho não. Por isso que tem que por essas tábuas assim. T: Os pintinhos pequenos assim dormem no chão mesmo? G: Não, os pequenininhos eu tenho mais cuidado com eles. Esses maiorzinhos aqui dormem aqui. Esses filhotinhos são aqui nessas prateleiras com cobertinha, eles mesmos entram. T: Eles sentem muito frio? G: Sente não, porque tem a pena né? Mas galinha é muito fraca, adoece atoa. T: E aqui venta muito né? Você criava galinha antes de mudar pra cá? G: Tinha quando era criança, eu saí daqui com 16 anos. Aí um cado de gente morou no barraco quando minha mãe deixou ele aí.

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T: E onde você prefere morar? G: Eu prefiro aqui, lá onde eu morava tinha baile funk todo dia, muito barulho e confusão. O cara que morava do meu lado cheirava direto! Zeca Pagodinho e aquele outro zuando o ouvido. Eu pensei, “vou morrer aqui”, e mudei. T: Nossa. Mas você já construiu tanta coisa… a casa, toda essa plantação.

G: Tudo tudo! A menina que mora aqui do lado é muito gente boa. Mas aí teve briga porque a mulher queria pegar o quintal todo aqui, pegar lá na frente tudo, e eu falei “ó, sua divisa é pra lá” e peguei e arrumei tudo. Ela plantou um pé de ora-pro-nóbis ali, tá vendo? T: Ah, isso que ia te perguntar, não tinha visto ora-pro-nóbis aqui até agora, e todo mundo tem. G: Eu tenho também. Mas as galinhas não deixam, elas vão comendo. T: O espinho não machuca elas não? G: Machuca se tiver velho. Se estiver novo não. Eu plantei um esses dias aqui e aqui ó, elas já vieram aqui e já comeram. Mas o galho velho elas não comem. Esse aqui fazia parte dessa casa aqui, mas minha irmã já vendeu. Você sabe que isso é remédio também né? T: É boldo? Nunca vi um desse tamanho! G: Aqui eu tenho uma mão. Não é só eu não, Sidney também. A gente não precisa plantar abóbora não. A gente joga. T: As galinhas não comem o boldo não? T2


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T: E é bom para elas? G: Elas comem coisa que faz mal também. Joga arroz ali que elas veem correndo. Arroz mata elas, mesmo assim elas estão doentes e comem arroz. Porque o arroz não tem vitamina, e ainda tem gordura e sal. O organismo delas não acostuma. T: Você vê muita diferença aqui no morro de quando você era criança para cá? Essas duas épocas diferentes em que morou aqui. G: Oh eu vejo diferença… Eu cheguei foi com 4 anos, depois eu sai com 16. E voltei com 47. Agora eu estou com 53. P: Com quatro anos você veio então para essa casa? G: Era um comodinho só. Um comodiinho pequeninho e o quintal era grande. A gente foi tirando barranco e usando o adobe para fazer casa. Que minha mãe estava sem meu pai. Depois ele descobriu que a gente estava aqui e veio ajudar a fazer o adobe, tem parede aí que é de adobe. T: Com a terra daqui mesmo? G: Isso. Mas esse daqui não, essa parte eu mesma que levantei! Eu pus os tijolos furados. Essa parte de adobo eu paguei para rebocar. P: Você fez muita coisa aqui né? G: É, eu gosto muito de plantar. Toda vida

eu plantei. Eu tenho minhas plantas. A samambaia, a orquídea, que está com flor. Eu gosto muito dessas coisinhas, toda vida eu gostei. – G: Tá comendo pouco, querido. Na sua casa só come rúcula e manga né? (...) Eu sei mais ou menos o que de verdura eles gostam, porque compravam muito da minha mão. P: Mas essas coisas você já não tem mais aqui não? G: Não! A rúcula eu buscava longe. Rúcula, manga, almeirão. Eu buscava lá em Neves ou lá em Contagem. Lá é horta mesmo, de madrugada eles estão ali. Eu gosto de trabalhar com coisa natural e lá eles não colocam nada não. T: Você saía vendendo em carrinho? G: Eu tenho um balaio. Depois que eu conheci esse rapaz daí ele começou a vender no carrinho. Eu já não estava aguentando mais de dor e parei. Eu tinha dois cestos. Enchia um de alface e almeirão. Outro de couve, taioba e alguma coisa. Cana eu pegava e cortava uma bitelona punha nas costas. E começaram a comprar na minha mão. E vendia bem! A 8 ou 10 conto a cana. A gente tem que saber se virar na vida né? Eu se fosse vocês levava um pedacinho para chupar em casa, não vou vender para vocês. Eu levava lá. Agora não estou saindo mais para vender, o povo não tá comprando mais. Mas quando vem alguém eu ranco e dou, não nego.

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G: Comem, e é ótimo para elas. Mas é muito pouco, só as folhinhas debaixo. Elas não gostam muito não, porque amarga demais. Agora as florzinhas elas comem muito.

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Outras conversas Durante um evento o Festival da Quebrada cozinhamos com algumas moradoras do Morro das Pedras. Uma delas nos convidou para um café, uma caipirinha e uma prosa em sua casa na semana seguinte.

H: Sobrou muito trabalho aquele dia? J: No outro dia eu e minha filha arrumamos a casa, a louça… H: Vocês cozinharam aqui dentro? J: Não, a gente trouxe aqueles carrinhos de cozinha e deixamos aqui fora. Todo mundo gostou demais né? Todo mundo elogiou. O povo foi comendo… A gente ficou o dia servindo comida! Foram uns 40 pacotes de macarrão! Eu pensei que ia sobrar, mas o pessoal comeu tudo. E todo mundo elogiou, porque normalmente quando você faz um trem desses, pessoal acha o que reclamar. C: Mas acho que na cozinha é muito difícil alguém implicar com alguma coisa... J: Ah não, esse negócio de juntar muita gente as vezes dá bagunça. E não é aquela bagunça sadia não. É aquela coisa desorganizada. A coisa tem que ser organizada, ficar bonitinho, se coloca muita gente não dá mais.

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– P: A gente foi esses dias na casa de uma moça e ficamos comendo cana um tempão. J: Ah, eu estava pensando outro dia, porque ninguém fala que cana é fruta? É fruta, não é, gente? Eu acho que a cana é fruta, não é? Ninguém nunca

falou isso! Ninguém nem vê mais cana plantada, né? H: Você tem que conhecer o quintal dela, tem umas canas enormes. J: Eu queria ter um quintal assim, só para ter essas coisas. Tudo saudável né. A gente não aproveita o espaço. T: Aqui no Conjunto Santa Maria as casas já tiveram espaço para horta? J: Sempre teve, mas o pessoal vai construindo e vai perdendo espaço. A família vai crescendo. Ali para baixo tinha uma pessoa que plantava, mas agora não mais. O pessoal de hoje, menino não sabe nem o que é quintal. Quem gosta de plantar é esse pessoal mais velho. T: Na horta comunitária ali em cima é legal que as crianças estão tendo contato com isso, aprendendo a colocar semente na terra. J: Mas hoje o pessoal não pensa mais nisso, “eu vou construir aqui mas vou deixar um pedaço de terra para plantar um alface e outra coisa” não tem mais. Ninguém liga para isso. Também né… T: Mas quando a gente planta a gente sabe, de onde vem né! – J: A gente está muito acostumado a ser servido. Mas a gente também vai quebrando barreirinhas.Começamos a fazer a coisa da maneira certa... A pessoa repara de que jeito foi feita aquela comida, de onde que vem. Igual eu falei pra minha menina, a touca é a muito importante, porque a primeira coisa que quem tá de fora olha é se está sendo feito com higiene. Então põe a touquinha né! O negócio T2


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H: Nesse sentido a coisa é muito pedagógica. Você consegue ver várias questões que a gente discute sobre educação, do grupo, da gangue, de ser aceito… criar um preconceito antes de identificar a coisa, e depois de identificar todos quererem fazer parte. Ainda mais com criança! J: As condições agora para estudar são bem melhores do que as que a gente tinha antes. Eu sou mais velha que você né? Você tem a idade da minha filha. Eu tenho 53. Na minha época ainda era muito difícil. Hoje em dia é difícil mas ao mesmo tempo é um pouco mais fácil. C: Existem possibilidades de acesso, antigamente era muito mais fechado. T: E tinham tudas as coisas que vocês precisavam que fazer além de estudar, né, coisas do dia-à-dia mesmo. Ir pegar água, cuidar da família… J: Sim, tinha tudo isso. E é uma geração que eu falo que é super bem educada. Porque a geração de hoje tem tudo; não todos, claro. Mas o ser humano cresceu muito, a gente vive mais, tem mais possibilidade de viver melhor… A minha casa não tinha cerâmica, a minha casa era só chão. Hoje em dia você até encera a cerâmica se quiser. C: Parece que hoje para essa geração é tudo como se fosse um caminho natural, né, eles não conseguem entender o que tem por trás daquilo. J: Sim! E hoje a gente tem acesso às coisas com muita facilidade. Né? E são uma geração mal educada. São mal educados, são mal acostumados. Mas aí

o que acontece, você tem água, tem tudo bonitinho. E antigamente não, a gente tinha que sair para poder buscar lenha, para poder buscar água, o chão a gente tinha que varrer mesmo para ficar limpinho. Hoje em dia não. O pessoal tem tudo com muita facilidade, porque a vida melhorou bastante. Temos acesso. C: A gente tem tanto acesso que já não nos deixa aprofundar nas coisas. J: O seguinte, mesmo que a gente tenha a facilidade, tenha muito acesso, o pessoal não quer saber de nada. Eu sou um exemplo, na era que estamos vivendo eu não me interesso por celular, por essas coisas. Aí com o tempo você tem tudo mas você chega aqui, não fala nem boa noite, bom dia. Não, passa direto assim, ó, nem olha para sua cara. E a vida dos meus filhos é muito diferente. Eu vou ser avó velha, já estou com quase 60 anos, com idade de ser bisavó. E meu filho não pensa nisso ainda. As coisas mudam né. Eu estava falando um dia desses, meu sobrinho chega aqui já olhando o tablet. Eu pergunto “não tem caderno não? Livro?”. P: Mas nossa geração pegou essa transição, na minha época de escola você ainda tinha que consultar as enciclopédias. Quando eu entrei na quinta série já começou a entrar a internet. Então o pessoal um pouco mais novo cresceu com tudo computadorizado.

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é esse mesmo, no início pode estranhar mas depois entende que é importante.

J: Antes você tinha que ir até a biblioteca. Hoje você para fazer pesquisa é só ir ali na máquina. É uma diferença muito grande. Mas o mundo T2


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vai mudando né. E o ser humano vai acompanhando essa mudança. Todo mundo vai mudando. Acho que no geral as pessoas vão ficando mais individualistas. Tá mudando, mas no meu pensamento tá mudando muita coisa para pior. C: Mas acho que ao mesmo tempo tem uma tentativa de um grupo muito pequeno aqui de criar uma resistência. Tentar resgatar um pouco as coisas. É o que eu percebo.

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J: Mas isso porquê? Porque eu nunca interessei na internet, não aprendi muita coisa porque não me interesso. E isso influenciou meus filhos, ela mesma não se interessa muito por internet, ela lê muito. H: Eu estava pensando nessa questão das transições, acho que é muito importante ter pessoas como você que relatam essa vivência, que traz esse tempo para os meninos. E tem essas duas coisas em contato, essa inovação tecnológica e esse tempo que eles não conhecem, esse tempo do fazer, do processar, que são processos, são etapas. Muitos dos jovens hoje, até os perto da minha idade, dos 30, as gerações são muito líquidas. Porque de de 15 para 30 anos é muito curto. De 7 para 14 é muito curto. Então, por exemplo, vocês conseguem conversar com os jovens daqui de um lugar parecido. A transição de geração está aqui. J: Tem gente que não entra nessa fase. H: É, nós já temos o hábito de sentar e estabelecer essas trocas. Tem alguma

coisa muito parentesca ali que, bem, a gente gosta de saber disso, conhecer pessoas e ouvir suas histórias. Essa galera não, eles sabem fazer e não querem escutar. Não querem escutar quem já fez. Outro dia os meninos estavam falando de alguma música, falando que era das antigas, mas era uma que tocava ano passado. É das antiga por quê? Porque produz muita coisa, é uma produção desenfreada. A referência de tempo e envelhecimento é outra. Não é das antigas igual nós falamos, é o das antigas deles. J: O lema nosso, da geração de 90 e anterior, era viver o momento. Hoje em dia o lema é “tempo é dinheiro”. E fica tudo completamente diferente, e reflete em por exemplo não conseguir absorver a qualidade desse momento. Se chegar uma pessoa mais nova aqui ele vai ficar impaciente porque isso aqui para ele não é viável. Para ele é viável mexer no novo jogo que lançou. P: Também tem uma coisa, se você não estiver estimulando ele com a mesma intensidade não atrai ele, é outro tipo de fruição. Não tem nada a ver para alguém que está sendo estimulado o dia inteiro com outras coisas mais fortes. J: Mas a galera não é estimulada. – J: A minha menina falou que aquele dia estava todo mundo elogiando a comida, dizendo que foi feito com cuidado e estava gostosa. T: Eu achei muito bonito aquele dia o quanto todo mundo se tratava com cuidado. Quem estava servindo comida, quem estava recebendo. E quando falava T2


Outras conversas

que não custava nada a pessoa ficava chocada de estar sendo tratada daquele jeito sem ter que pagar nada.

aqui ajudar em alguma coisa, nós temos por obrigação fazer com que ele se sinta à vontade.

J: Acontece que hoje em dia o ser humano é tão interesseiro que ninguém faz nada em troca de nada. A maioria das pessoas quando faz alguma coisa é com interesse em outra. Quando acontece uma coisa dessas a pessoa não espera. É uma coisa que hoje em dia você não vê. Quer dizer, pode até ver, mas é difícil uma coisa organizada, bem feitinha.

T: Tem muito lugar, principalmente bairro de classe alta, em que as pessoas não sabem receber bem. Estão te olhando, vigiando, julgando o tempo todo. E para mim a cidade é essa diversidade, esse tanto de gente diferente num mesmo lugar, e se você não souber conviver, ficar construindo suas ilhas, você não vive a cidade.

T: E o legal é que é uma coisa da comunidade para comunidade, que é muito diferente quando vem alguém de fora e faz algo com cara de caridade. Vem da própria comunidade e é para todo mundo, para acolher, integrar, conviver com quem é diferente.

J: Essa coisa de juntar é bom demais. O ser humano está precisando disso. Então as vezes quando a gente faz uma coisa assim e o pessoal participa, respeita, é bom.

T: Eu fico feliz com um evento desses, porque consegue despertar ainda que minimamente outro sentimento nas pessoas, a ideia de que a gente é melhor junto, respeitando, dialogando. J: A gente conviveu como se se conhecesse há tempos…. T: Sim. E eu acho legal como as pessoas se envolvem, aquele moço que veio só fazer o carreto já chegou ajudando a picar a cebola. J: É que tem lugares que as pessoas não sabem receber os outros. Se vem alguém

J: Agora vou ficar em casa, porque a firma que eu trabalhava praticamente faliu. Era uma fábrica de salgados. Aí faliu vai fazer um ano. Um ano que estou em casa e até agora não resolveu nada de acerto, e eu preciso receber porque com o dinheiro eu vou reformar aqui em casa, trocar essas telhas, colocar uma mais bonitinha, trocar esse piso e fazer uma lanchonetizinha aqui nessa área da varanda. Aí tem que fazer uma coisa bonitinha. T: Eu estava reparando que uma coisa muito positiva aqui é as casas terem esse contato direto com a rua, então muita gente tem seu pequeno negócio em casa. Isso é muito bom. E hoje você pega esses conjuntos Minha Casa Minha Vida, o lugar já é super ilhado e é proibido comércio ali dentro. Você poderia ter um comércio

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J: É isso que estou falando, porque hoje em dia ninguém tem esse contato de conversar um com o outro. A gente conversa mas é aquela coisa, eu sei que todo mundo tem sua vida, cada um tem seus compromissos, mas assim, cada um recebendo cada um a coisa fica mais fácil.

T: Hoje em dia você trabalha só de casa?

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pequeno para te dar uma autonomia, uma renda extra, mas não pode. O poder público tem que entender que as pessoas precisam gerar essa renda. J: Mas o poder público na verdade quer ganhar o deles e acabar com as favelas. Hoje em dia a gente fala comunidade, mas são as favelas antigas. E eles querem acabar com isso, colocar cada um no seu lugar, e quando faz isso as pessoas ficam ainda mais fechadas. E aí a pessoa se subjuga a um emprego ruim. O governo quer acabar com isso, mas não acaba não, porque o Brasil tem favela demais.

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T: E comunidades fortes, né? Que sabem o que querem e o que precisam. J: Eles querem acabar com o espaço da favela e colocar todo mundo em prédio. Só que a convivência dentro desses prédios é precária. E acontece muito conflito. Colocam todo mundo um em cima do outro. Cada um com uma vida e sitaução diferente. Vira um ambiente insuportável. E na maioria das vezes o tráfico toma conta, está imperando nisso. O governo quer acabar com isso, colocar todo mundo ali, e quem for mais forte engole, né? Eu fui criada lá em baixo no Morro das Pedras, ali no Cascalho. Eu conto um caso sempre, porque tinha uma guarita ali em baixo, na Rua Bento, no Nova Granada, do outro lado de onde é a Silva Lobo, uma das primeiras guaritas que foi feita no Brasil. E na época ninguém conhecia pé de maconha. Os meninos foram em cima da guarita e plantaram uma maconha, e eles não fumavam perto dos outros não, respeitavam demais. Aquela rua

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era cheia de pés de eucalipto, bem velhos, centenários. Então o trem cresceu e ficou grande lá, e ninguém sabia que os meninos fumavam maconha. E não tinha esse negócio de vender não, eu lembro que eles subiam ali em cima pelos pés de eucalipto e pegavam. Teve um dia que um coronel foi fazer uma visita ali, e na hora que ele desceu do carro e bateu o pé em cima da lage ele reparou que tinha um trem esquisito ali. O policial respondeu “sei lá, nasceu e cresceu aí, não sei de onde veio”, e esse moço pegou e subiu. Os meninos colocavam umas telhas e tábuas lá para cima, mas ela foi crescendo e deu para ver. Quando ele chegou lá e viu tinha um pé de maconha enorme e cheio de folha seca. E o negócio começou a circular “descobriram o pé de maconha em cima da laje!”. Aí o coronel falou que ia arrancar o pé. Os meninos subiram, invadiram a guarita, arrancaram o pé de maconha e subiram a rua com ela. A polícia atrás deles subindo o morro e as folhas tudo caindo. Caia folha, a polícia correndo e as galhas quebrando e eles pegando. A polícia não pegou, ninguém viu e ninguém vê. Só sei que a semente dela rendeu foi maconha demais. Ninguém descobriu quem plantou, ninguém acusou ninguém, e os policiais que estavam lá nem sabiam o que eram. Ninguém sabia onde fumavam, ninguém conhecia maconha. Só sei que ela rendeu muito pé de maconha, eles pegaram semente, pegaram mudas… não conseguiram prender ninguém! E eu estava lá, isso é lendário, e aí que todo mundo foi descobrir o que era maconha. Eles fecharam a guarita. Ela era um ponto de entrada e saída do morro, divisa da favela com os bairros. Nessa época não existiam muros. Antigamente T2


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H: Eu lembro que o pessoal pegava esses colchões quando ficavam velhos e usavam as molas para fazer grade, depois vinha e ia crescendo o ora-pro-nóbis. Era muito prático! Imagina colocar um colchão desses de mola e um pé para crescer. É arte contemporânea! J: Eu estudava em uma escola modelo, feita pela prefeitura. Eles davam do sapato ao uniforme. Depois veio o primeiro colégio modelo. Eu lembro quando veio Tancredo Neves pra cá. Tinha o campo de São Jorge na época e eu lembro quando ele veio para sua inauguração. Nós saímos da escola com bandeirinha para receber ele, cantando e tal. Ele chegou até a guarita lá e falou alguma coisa. Era uma farra, era uma festa. De vez em quando tinha banda ali na guarita, a gente saía da escola e ia atrás da banda. A guarita tinha história viu! Mas depois que descobriu o pé de maconha tiveram que fechar ela. T: Com qual idade você morou lá em baixo? J: Morei lá até casar! Eu casei com 22 anos, então minha infância e adolescência foi toda lá. Eu nasci por lá mesmo. Mas na minha época não existia adolescência não, isso eles inventaram é agora. Ficam criando nome para cada coisa. Aí hoje você vê os meninos tudo fumando e bebendo. A gente via os pais da gente, eles não bebiam cerveja não, era cachaça mesmo, na época cerveja não tinha muito não. Eles tomavam as pinguinha deles, fumavam o cigarrinho deles. Aprendi a fumar de tanto acender cigarro no fogão de lenha. Para você ver como as coisas

mudam. Era aquele cigarro sem filtro. Tinha o de enrolar também. Muita gente fumava cachimbo. E a gente ia pro fogão de lenha, me pediam para acender e chegava lá só com metade do cigarro. H: Eu sou de 1984. Eu tenho uma lembrança muito forte da mudança da casa da minha mãe e da minha avó. A casa de lata. O chão batido. O chão de piso queimado. Daí depois vem a primeira parte de alvenaria. Eu lembro demais. Lembro que quando chovia naquela parede de lata… nossa mãe… cheiro, cor, textura, tenho todas essas lembranças. J: O mato tinha um cheiro diferente. Quando chovia, o cheiro da terra molhada era diferente. H: As paredes da minha casa eram um mosaico de lata. Abriam a lata de óleo, abria ela assim e pregavam ela. J: Ou aqueles tambores também. H: Até 1990 lá em casa acho que era assim. Foi quando começou a transição. Lá em baixo ainda tinha muita casa que era assim. Na rua da pedreira, na boca do lixo. Eu lembro do fim da boca do lixo. Minha mãe conta muitas histórias Iá, nos shows do Roger. J: Gente aquilo era um espetáculo! Sua mãe deve ter a minha mesma idade, 53. A gente ia no som do Roger. O pai dele era detetive da Civil. E ele era um dos meninos, uma das primeiras pessoas que vi que estudou fora. Quando ele veio para cá era época do James Brown. James Brown já estava fazendo sucesso lá, mas já tinha aque-

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as casas lá eram todas cercadas, essas de arame farpado. Não tinha muro.

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Outras conversas

la coisa da maconha, da droga, então ele vivia muito preso. Mas quando ele ia fazer os shows dele, lotava. Então o Roger estudou lá fora, e quando ele veio aí ele pediu o pai dele para fazer essa quadra, e o pai dele fez a quadra. E ele falou para ele “só não quero droga”, não falava droga na época, era “entorpecente”, “tóxico” e a tal da maconha. – J: Mas nessa época a gente que era adolescente não usava droga né. A gente ia mesmo só para dançar. Então eu lembro que começava umas 15h, quando era 20h no máximo 21h, 22 horas tava acabando. Aí no sábado ia até 23h ou meia noite. Então a gente dençava, mas a gente tinha hora para estar em casa. 22 horas tinha que estar em casa, a gente começava a entrar. E a gente namorava os meninos mas os meninos não namoravam a gente não. Então a gente dançava e 22 horas tinha que estar dentro de casa.

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H: Outra figurassa que tinha aqui no Morro da nossa época era a Marcela. Que era travesti, andava com a Cida Preta. J: Marcela? Ela não é viva mais não, é? A Marcela que conheci foi casada, teve dois filhos, depois foi para São Paulo e voltou travesti. H: É essa mesma. Eu estou falando assim porque pela época eu lembro que era um rolê dela cabuloso. Era uma agitadora cultural muito foda. E engraçado porque ela saía muito com minha mãe e as amigas dela.

J: Mas na verdade hoje, o que a gente fala de transexualidade como algo atual, pessoal que faz cirurgia, isso já existia. Pessoal já usava o famoso silicone. Todo mundo que ia para São Paulo fazia. Tinha um pessoal que ganhava dinheiro e vinha totalmente transformado, aqueles pernão, cintura, cabelo. Já vinham totalmente transformados. São Paulo é mais pra frente que Belo Horizonte, né? Porque mineiro é bem mais atrasado. Somos muito preconceituosos. H: Até questão de informação, sô. Marcela chegava lá na rua, colocava a rua de cabeça para baixo. Fazia mil e uma coisas, queima de Judas, gincana, passeio, vamos não sei o quê… era fantástico. Uma de minhas maiores referências de agitadora cultural. Hoje o que me incentiva muito no rolê é a lembrança da Marcela. J: A Marcela quando chegava vinha com a meia arrastão, aquela sainha, era show de bola. Na minha família teve meu tio Bá. Esses eventos, ele promovia tudo. Se falasse para ele “Bá, você enfeita o salão para crianças?” na hora que você chegasse ia estar lindo.. – J: E na verdade aquela rua ali, a da Guarita, era das ruas mais conhecidas daqui. Tudo acontecia ali. Todos os viados se juntavam para sacudir a rua. Carnaval, o Bá era mestre, minha tia porta bandeira. A galera subia e atravessava. O carnaval e a escola de samba são aqui. Depois do ano novo, primeira segunda-feira, o ensaio começa. A galera vinha toda. No dia de desfile ele mandava três ônibus lá para baixo. Porque lá em baixo tinha ala de passista, tinha ala de tudo quanto é T2


Outras conversas

jeito, colocava nos ônibus e ia embora.

mundo fazia junto.

H: Além disso minha mãe fala da época que a galera veio para cá para sobreviver do lixo. Aqui foi o primeiro aterro sanitário de Belo Horizonte. Foi o período que Brasil estava passando o maior perrengue. Taxa de inflação alta, natalidade alta, ditadura militar…

H: E dava para tudo mundo. Minha companheira fez uma pesquisa, as senhoras contam que tinha a época de peixe, como a semana santa, a época de frango… aí todos os bares da favela tinham só peixe, ou só frango...

T: E como era essa distribuição? J: No lixo cada um ia lá e pegava. Nas Kombis eles iam distribuindo, tipo cesta básica. H: O pessoal conta que muitos caminhoneiros faziam sacanagem, mas tinham outros que eram gente boa, já separavam um pouco as coisas. As coisas que iam para o lixo era só o que tava ruim, eles jogavam em lugares diferentes o que dava para comer. Mas tinha a galera que era sacana e misturava. J: A gente juntava ali para separar. Todo

J: A gente comia tudo isso gente. A gente não tinha condição de comprar, ninguém comprava. Vinham os caminhoneiros e separavam. E tinha saco não, misturava tudo lá no meio do lixo. E eu acho que o lixo de antes era bem pior do que é hoje. Porque hoje você tem noção de algumas coisas. Antigamente não tinha essa consciência. O poder de tudo é a higiene. Eu sou da época que tudo tinha que lavar mesmo, e até hoje eu uso muito vinagre. A higiene tem muito poder. A gente pegava coisas do lixo, mas tinha que ter higiene para lavar. Tinha essas coisas. E hoje você tem noção, tem o lixo separado, a latinha, a embalagem, tem tudo. Antes era tudo junto. P: E junta a isso uma tentativa de não levar tanto lixo reciclável para o aterro. J: É, hoje a gente sabe que tem que reciclar. É uma vida que vale a pena sustentar. O pessoal as vezes fala que dá trabalho limpar mas ninguém tem noção de como era. Hoje tem muita embalagem. As meninas mesmo falam, eu como chocolate só de vez em quando, porque minha época não é de comer doce. A gente tomava suco da fruta e o Kisuki de saquinho. Então a gente é dessa época que nossa comida era do lixo mas era uma comida mais saudável.

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J: O que o pessoal fala hoje de “reciclagem”, “é reciclável”, isso para mim já é antigo. Já fazia por necessidade. A gente sobrevivia do lixo. Hoje em dia as pessoas ganham dinheiro. Também ganhava, mas não tanto que nem hoje. Hoje em dia você cata uma lata, vende e ganha dinheiro. Mas a gente sobreviveu mesmo, da comida até a roupa, o sapato. E tinham supermercados que colocavam as coisas na Kombi, tipo presunto, mussarela, ovo, legumes, carne, sabe? E iam para lá e distribuíam. Além dos caras que distribuíam tinham os caminhões de lixo que também levavam muita coisa. O Brasil até hoje desperdiça muita comida, muita coisa. Então nós sobrevivemos desse despedício.

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Outras conversas

P: Sabe uma coisa interessante? Lá em casa sempre teve comida, comida de casa, arroz feijão, uma salada. Desde criança era assim. E na época que meus pais foram ganhando mais dinheiro, o luxo era comer comida de MCdonalds. Aquela comida horrorosa, mas era porque era de outro país. J: Mas isso é em todo lugar. Minha filha não é de comer essas coisas, já meu filho adora essas porqueiras, vira e mexe ele fala “mãe vou ali comprar um sanduíche”, só que o sanduíche dele é batata frita, refrigerante…De vez em quando eu vou e faço um estrogonofe, uma coisa gostosa assim, e ele fala que não tem jeito de fazer dieta com eu cozinhando não. Aí eu falo que aqui não é todo dia, e é feito em casa, você sabe o que tem. Agora esses sanduíches e batatas aí você nem sabe como foi feito. Que graça tem essas batatas congeladas?

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H: Lá em casa a gente tem maior costume de comprar a batata, descascar, picar, fritar. Aí é legal que mexe com todo mundo. Sem conservante, mais nada. Tem um tempo que esse rolê da comida tem mudado bastante lá em casa. Apesar de que nunca fomos essa família de comprar frios e congelados. Primeiro porque é caro, mais caro que comprar as comidas frescas. J: Na verdade, as pessoas querem só chegar em casa e ter uma comida congelada, meter no microondas e comer. E o Brasil está se não me engano em 4º lugar no ranking da obesidade. Estados Unidos é o primeiro né? Nunca vi país de primeiro mundo ter tanta obesidade, ninguém merece a comida

que eles comem, você ir num MCdonalds comprar aquela comida, fritura, massa, gordura que já foi usada… Agora você faz em casa um arrozinho com feijão e uma saladinha, é uma diferença muito grande. Aqui a gente ainda tem aquela coisa de cozinhar. De fazer mesmo. P: É um tipo de comida que tem muito açúcar, muito sal, muito óleo, então você come, fica muito cheio, mas em meia hora tá com fome de novo. Porque é um tipo de energia que quebra muito rápido. Então você fica comendo comendo, porque o preparo é rápido, mas é um tipo de comida que você tem que comer mais vezes. – J: Antigamente todo mundo tinha quintal. Abacate a gente não comprava no supermercado, a gente plantava. Mamão? Todo mundo tinha pé de mamão. Hoje em dia a gente compra porque não está tendo mais onde plantar. A gente não tem quintal mais. Mesmo assim a gente olha muito alimentação, tem muita coisa que eu não como. Tipo queijo, que como só um pedacinho assim. E vejo muita coisa que não tem necessidade de comer com compulsão. Chocolate se deixar os meninos todo dia comem, eles me dão chocolate e comem o deles. Tem gente, por exemplo, que adora macarrão, eu se comer um pouquinho já fico satisfeita. T: Acho que tem muito a ver com essa palavra que você usou mesmo. É compulsivo. Você nem pensa no que quer comer, se está realmente com fome. Pessoal come por ansiedade. J: Tem muita gente que tem essa coisa de não comer sem carne, tem que ter uma T2


Outras conversas

H: Agora tem uma ideia de que a gente pode comprar né? Essa coisa, eu tenho memória das pessoas mais velhas falando sobre isso, então para mim a carne não é tão importante. Mas eu também tenho esse olhar do domingo comendo frango, o rango especial era no domingo. J: A gente tinha a roupa de domingo, dia de domingo todo mundo tinha que ficar bonito para fazer nada! P: Igual nos Canutos, domingo é o dia de reunião da família. J: Aqui a gente recebe os amigos, minha filha traz os dela e eu os meus, eu falo que é bom a gente conviver com os outros. A gente vai envelhecendo, conhecendo gente e melhorando. A gente vai envelhecendo, você não pode ser uma senhora gente boa não? Sem ficar fechando a cara para os outros? A gente ainda tem essa coisa de família que todo mundo vem e convive. Tem lugar que não tem mais isso não. As famílias antigamente faziam muito hora dançante no domingo, festa em casa, com música dos anos 70 ou 80, tipo quarteirão do soul. E hoje o pessoal tá voltando a escutar essas músicas, Nelson Gonçalves, sabe? Era muito bom! H: Eu lembro que em 92 eu tinha 7 anos, ainda assim já tinha uma memória dessas coisas. Foi quase a segunda remoção da Boca do Lixo, né? Estava quase acabando. Aquilo tudo ali embaixo do pico era um lixão. J: Eu vou começar no processo antes do lixão, vou pegar o início para você,

eram duas pedreiras. Ali quando a gente desce, na entrada aqui, atrás da EMATER. Na altura do Hospital Madre Teresa você não desce para ir lá para baixo? Naquela época só tinha o Madre Teresa, que era o Sanatório. Atrás do Sanatório tinha uma rua, atrás dela era a primeira pedreira. A Rua da Pedreira. Divisa da Antena com São Jorge, ali tudo era pedreira. Passava a pedreira, tinha uma ruazinha, poucas casas ali… tem uma entradinha ali que um cara até montou um salãozinho, ali em cima daquela casa tem uma árvore grandona que os meninos ficam entrando, ali do lado era uma gruta. Essa gruta foi tampada. A gente brincava ali dentro. Os caminhões de lixo passavam ali por perto. Eu não sei se a gruta dava continuidade até o outro lado ou se morria ali, eu morria de medo. Mas os caminhões passavam ali e iam lá para o lixão. Onde virou o lixão era a pedreira maior. A pedreira, aos pouquinhos ela saiu. Eram pedras para Belo Horizonte, paralelepípedos, areia… Eu era pequena mas lembro que tinha essa pedreira. Depois que eles pararam de tirar as pedras, parou esse comércio de pedras, e aí surgiu o aterro sanitário. Como não tinha muita casa nem muita coisa, tinha aquele espaço da pedreira ali, surgiu então o aterro sanitário do nada. Os carros começaram a aparecer e jogar o lixo lá, só que eles não faziam isso durante o dia. Eles faziam mais à noite. Os caminhões do lixo entravam e despejavam tudo lá.

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carne. Na nossa época a gente comia só um arroz com feijão e estava tudo bem.

T: Não era um aterro oficial da prefeitura? T2


Outras conversas

J: Não. Não tinha ainda. Era um lixão a céu aberto. Aterro Sanitário só vai vir depois.

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H: E você lembra qual era o nome do senhor que tirava gás lá de baixo? J: Não… Mas esse gás ali era metano mesmo. O pessoal cozinhava, fazia o fogãozinho, sabe? E puxava mangueira. Até o momento que explodiu. Tem uma matéria sobre isso aí. Explodiu tudo, desceu tudo. Era muito gás metano que tinha ali. Muito metano. Tinha gente que morava ali. E morreu muita gente. Aí eu venho com minhas histórias, você com as suas. É por isso que chama Rua da Pedreira. Quem trabalhava nela morava ali no entorno. E depois com o lixo, pessoal foi acumulando, juntando latinhas, garrafas, e cada um ia construindo alguma coisa, fazendo alguma coisa, e foi ficando e fazendo a vida. Até o dia que explodiu, soterrou muita gente, soterrou casa. Tentaram até acabar a ocupação, mas as pessoas voltaram e construíram tudo de novo. De toda forma essa explosão já era prevista. A prefeitura estava tentando tirar os moradores e já não estava jogando mais lixo. Mas quando explodiu já estava mais controlado. Mas depois disso que passou a não jogar mesmo. Mas assim, foi depois de muitos anos, foi o primeiro lixão a céu aberto de Minas Gerais. Nossa, tem história demais gente! – J: Agora não quero mais mexer com restaurante. Porque onde a gente mora você não pode colocar um preço muito alto. Então quer dizer... você

tem que trabalhar elas por elas. Daí você paga o aluguel aqui, é mais de 2 mil reais. Você vai vender um almoço, coloca a 10 ou 12 reais, é barato. Você vai no sacolão e está tudo caro, a carne caríssima. Tá claro que arroz você compra saco grande sai barato, mas não é só arroz que o cara come né. T: Você fazia prato feito? J: Eu comecei com PF, depois passei para self-service. Quando eu fechei o restaurante eu continuei fazendo aqui em casa para o pessoal que trabalha aqui perto. Recebia eles em casa, fazia marmita. De vez em quando no domingo de manhã ainda aparece alguém querendo comprar comida. Eu fazia um preço legal, então quando via já tinham mais de 10 pessoas. Muito peão, mas eles comem pra caramba, então imagina. O marmitex dá lucro. No caso eu me responsabilizava pela minha comida, então qualquer coisa que desse caía para mim. Mas como alguns fornecedores não tinham nota para emitir para mim, então não pude continuar. Peguei pra fazer um lanche lá, para levar salgado, bolo. Eu peguei um mês. Para fazer salgado para lanche e tal, aí você inventa né? Pão de queijo, bolo, qualquer coisa você leva. Eu lembro que foi a única coisa que eu ganhei dinheiro. Eu peguei duas vezes. Eles vieram atrás e eu peguei. Depois eu não pude continuar com eles por causa de nota fiscal, emissão de nota. Porque senão eu estava com uma super fábrica de salgado, bicho. H: É igual aquele salgado do bairro Tupi que uma época bombou, o Amandelli, bicho, todo mundo comprava naquele lugar. É um lugar que vende salgado e que foi crescendo. Aí tem que crescer T2


Outras conversas

J: Eu aqui em casa pego encomenda de salgado. A última encomenda que peguei foi de 100 salgados. É uma coisa que dá muito trabalho. Você vai fazendo, vai fazendo… Quando eu estava trabalhando pagando aluguel, eu nunca pegava encomenda de salgado, porque o que eu ganhava não dava para eu comprar o material para eu fazer salgado. Mas trabalhando na minha casa não, o que eu quiser dá para pegar. Se eu quiser vender comida coloco uma plaquinha ali “vendese marmitex”, agora minha plaquinha tá lá “vendo salgados, aceito encomendas”. Aí às vezes vem encomenda e eu faço. E esse trabalho que estou fazendo é um trabalho bem feito e num preço que dá para praticar. É bem diferente de eu alugar um espaço. P: Porque já tem a conta de casa, que você paga para morar, né. Não tem como pagar a mais…. você paga um pouco mais de gastos de água, gás, mas nem se compara. E quem vai comprar é uma pessoa que provavelmente que já te conhece, pessoa daqui, ela tá sustentando com o dinheiro dela um comércio que também é daqui de dentro, não está dando lucro para empresa grande. Está ajudando você a manter suas coisas aqui.

casa. Hambúrguer, Cheeseburguer, eu vendo tudo. Eu só parei de vender porque fiz uma cirurgia, e eu tenho que evitar muito movimento por dois anos. Mas eu pretendo trabalhar aqui na minha área. E o que vou fazer? O salgado, a mão de obra é minha, o sanduíche a mão de obra é minha, a loja vai ser minha, o lucro vai ser meu. O lucro que eu vou ter dá para pagar uma pessoa para vir limpar minha casa enquanto eu estou aqui. H: Eu acho muito louco como a gente não discute, por exemplo, o jeito que o pessoal aqui de dentro pode fortalecer isso aqui. E pessoal não pensa em fortalecer o que é nosso ao invés de encomendar salgado com alguém lá de fora! P: Querendo ou não, também tem essa visão, igual eu falei antes lá de casa, que o que vem de fora é mais legal do que o que é de dentro. Os meninos do ProJovem falam que querem comer hambúrguer, não é o jiló frito da mãe não. Quer comer pizza, hambúrguer e batata frita. Referências culturais de outros lugares. E é justamente por ser o que não é disponível no seu dia a dia é muito mais valorizado do que o que temos para oferecer aqui. Sem entender que o fortalecimento mútuo pode ser muito mais interessante, né!

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sem perder qualidade. Eu lembro que todo lugar que eu ia tinha uma caixinha da Amandelli. Servia salgado, e eles começaram a fazer essa coisa do delivery, entregar o salgado pronto ou congelado, e geral começou a encomendar. Outro dia eu passei ali em frente ao EMATER, tinham umas 40 caixas.

J: É! E por exemplo, eu tenho chapa, tenho freezer, tenho tudo. De vez em quando me dá a doida eu faço sanduíche em T2


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CONVERSAS SOBRE ALIMENTAÇÃO OFICINA DE HIGIENIZAÇÃO DE ALIMENTOS QUIBE DE ABÓBORA FESTA JUNINA DO CENTRO CULTURAL PAMPULHA SALADAS NUTRITIVAS BOBÓ DE PALMITO E “ARROZ” DE BRÓCOLIS PÃES COM PATÊ TORTAS SEM GLÚTEN CONFRATERNIZAÇÃO HISTÓRIAS CARTAZES E EXPOSIÇÃO T3


território 3

cozinha comum itinerante

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Urca – O coletivo trabalhou em parceria com o Centro Cultural Pampulha, utilizando sua praça externa para a realização de preparos semanais com a vizinhança durante o período de 2 meses, totalizando 8 encontros. A cada semana um assunto relacionado a saúde e alimentação foi abordado, a partir de conversas prévias com um grupo de mulheres participantes da ação.

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Conversas sobre alimentação

17 de março e 20 de abril de 2017

duração: 2 horas local: Centro Cultural da Pampulha público estimado: 12 pessoas de onde vem: Antes de levar a Cozinha Comum Itinerante para o Centro Cultural Pampulha achamos necessário conhecer as pessoas que o frequentavam e que teriam interesse em realizar as atividades da cozinha, iniciamos o diálogo com as frequentadoras do centro cultural para definirmos juntos nossa metodologia de ação no bairro. processo: Nas conversas pedimos que cada pessoa nos contasse sobre sua história com alimentação, os alimentos que marcaram seu crescimento, o que gostariam de aprender e o que poderiam ensinar para as outras. Apresentamos a Cozinha Comum Itinerante e introduzimos alguns temas como possibilidade de trabalho. efeito: Iniciamos a aproximação com algumas mulheres do grupo, que gradualmente trouxeram outras pessoas para a atividade. As anotações das conversas foram essenciais para estruturarmos nossa metodologia de ação no território. Decidimos por encontros semanais de preparo coletivo, nos quais a cada dia seriam experimentadas receitas a partir de um ou mais temas de interesse do grupo.

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Oficina de higienização de alimentos

13 de junho de 2017

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duração: 03 horas local: Praça externa do Centro Cultural Pampulha público estimado: 12 pessoas de onde vem: Uma das frequentadoras do Centro Cultural se prontificou a ensinar ao grupo técnicas de higienização de alimentos que aprendeu em um curso. Disse que tem hábito de higienizar muito bem as mãos, a casa e a comida por trabalhar em um hospital. Propusemos que a primeira oficina da Cozinha Comum Itinerante na Urca fosse ministrada por ela. processo: A moradora do bairro Urca conduziu a oficina de higienização de alimentos, ensinando técnicas simples para o cuidado com a limpeza de frutas e legumes. Após a oficina o coletivo preparou sucos e vitaminas funcionais, apresentando uma alternativa de incrementar refeições com ingredientes saudáveis. efeito: Ao longo do preparo as mulheres que estavam sentadas foram se levantando para entender os processos de higienização ou trocar dicas sobre como elas fazem para limpar os alimentos. Logo após preparamos os sucos funcionais, pensando em misturas ricas em nutrientes e boas para o funcionamento do corpo. cardápio: Suco de abacaxi com pepino, suco roxo antioxidante (beterraba, morango, açaí e mexerica), suco verde (laranja, cenoura, maçã, hortelã e couve).

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Oficina de higienização de alimentos

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Ministrada pela Elza, vizinha e participante das atividades do Centro Cultural. Ela trabalha em hospital e, por isso, tem o hábito de higienizar muito bem as mãos, a casa e os alimentos. O primeiro passo é limpar os alimentos muito bem antes de guardá-los na geladeira ou na despensa. Pode ser lavando ou passando um pano úmido. Para cozinhar, é importante começar lavando bem as mãos com água e sabão, chegando até o antebraço. Também é necessário tirar anéis, pulseiras e em caso de cozinhar para uma quantidade grande de pessoas, Elza aconselha não usar esmalte, pois pode ser que alguém tenha alergia. Prender os cabelos ou usar touca é uma forma de prevenir cabelos nos alimentos.

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Lavar legumes e frutas Os legumes e as frutas podem ser lavados com bucha, água e sabão. Alguns deles, como gengibre e pepino, podem ser colocados na bacia junto com as verduras. Com as frutas e verduras que aprendemos a limpar fizemos alguns sucos funcionais.

Lavar verduras Passar uma água em todas as folhas e depois colocar em uma bacia. Para deixar de molho pode ser na água clorada ou na água com vinagre. O preparo da água clorada é feito misturando um litro de água com uma colher de sopa de água sanitária. Dica: depois de lavar as verduras também é bom colocar as buchas na bacia para desinfetá-las. T3


Oficina de higienização de alimentos

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Suco verde

Depois de limpar as folhas, tirar os talos e bater no liquidificador. Para duas folhas bater 100ml de água, pode colocar um pouco de hortelã na hora de bater. Dica: fazer cubos de gelo com as folhas para ter sempre fácil acesso, assim, podemos, uma vez por semana, preparar gelo para os sucos da semana.

Suco roxo antioxidante 1 beterraba pequena 4 morangos 1 polpa de açaí 1 copo de suco de laranja ou mexerica Bater tudo no liquidificador.

Suco de abacaxi com pepino 1 abacaxi ½ pepino gengibre a gosto hortelã Bater no liquidificador.

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1 laranja descascada sem caroço ½ cenoura ½ maçã hortelã 2 folhas de couve (podem ser outras folhas verdes)

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Quibe de Abóbora

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duração: 03 horas local: Praça externa do Centro Cultural Pampulha público estimado: 16 pessoas de onde vem: Em nossas conversas iniciais muitas mulheres se mostraram interessadas em começar a entender a alimentação vegana. Reduzir o consumo de carne se mostra um passo importante, então decidimos realizar o preparo de alguns alimentos cotidianos como salgados e molhos sem derivados animais. processo: Escolhemos trabalhar com ingredientes tradicionais e de fácil acesso, para desmistificar o imaginário que normalmente as pessoas têm sobre alimentação vegana. Utilizamos a abóbora moranga na mistura para quibe. Para acompanhar o salgado preparamos dois molhos, o chutney de manga, temperado com gengibre, açúcar e pimenta, e pate vegano de inhame cozido, batido com salsa, cebolinha, limão e alho. efeito: As mulheres ficaram mais à vontade com a cozinha, assumindo funções no preparo e intervindo com ideias nas receitas. Uma vez que a comida estava pronta, elas organizaram a apresentação do prato, dizendo que a comida deve ser bonita para os olhos também. cardápio: Quibe vegano de abóbora, patê de inhame, chutney de manga.

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Quibe de Abóbora

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Quibe de abóbora japonesa Dicas: para fritar, usar óleo bem quente e não mexer. O quibe também pode ser assado, com ou sem o recheio, e para assar não é necessário acrescentar farinha de rosca. O purê pode ser preparado com outros legumes, como batata baroa, batata doce, cenoura, a mistura de mais de um legume, etc.

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Utiliza ½ abóbora cozida. Temperamos com alho, sal, curry e cozinhamos a abóbora em água sem óleo. Depois disso, escorremos a abóbora em uma vasilha (a água do cozimento pode ser aproveitada depois, para cozinhar ou ajudar a dar liga no quibe). Fazer um purê com a abóbora e misturar no trigo para quibe seco. Deixar o quibe hidratar no purê. Nesse momento você já pode provar o tempero da massa e ajustar de acordo com a seu gosto. Testar a liga, se ela estiver seca, colocar a água do cozimento da abóbora, se estiver mole, usar farinha de rosca. Fritamos com recheio de queijo e sem recheio.

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Quibe de Abóbora

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Quibe de Abóbora

Maionese vegana de inhame

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6 inhames pequenos 1 molho de salsa 1 molho de cebolinha 1 limão 3 dentes de alho sal a gosto azeite a gosto Descascar o inhame e lavar em água corrente para tirar a terra, cozinhar o inhame até ficar em um ponto que possa ser amassado com um garfo. Bater o inhame cozido no liquidificador até virar um creme homogêneo. Se precisar, coloque um pouco da água do cozimento, mas cuidado para não ficar aguado. Acrescentar a cebolinha, sal, azeite, limão espremido, sal e bater novamente no liquidificador. O azeite ajuda a bater as coisas mais consistentes. Se agarrar, coloque mais. Coloque o alho por 3 minutos na água quente e acrescente ele na mistura, batendo no liquidificador. Guarde na geladeira que ficará mais saboroso.

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Molho de manga (chutney) Para fazer o chutney de manga, descascar e picar mangas bem maduras em cubos, picar ou socar o alho e o gengibre. As quantidades podem variar conforme o gosto, para o preparo da oficina utilizamos: 2 dentes de alho 3cm de gengibre 4 mangas palmer 2 colheres de sopa de açúcar 1 pitada de sal e pimenta do reino Refogamos o gengibre no azeite, depois colocamos o alho até ficar moreno, depois colocamos as mangas e os temperos e deixamos cozinhar até a maga dar uma derretida. A Nilda, cozinheira que estava na oficina, falou que costuma fazer essa receita queimando primeiro o açúcar e depois adicionando a manga sem o alho.

Dica: cozinhar no vapor proporciona uma consistência final mais cremosa. TT 33


Festa Junina do Centro Cultural Pampulha

25 de junho de 2017

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data: 25 de junho de 2017 duração: 06 horas local: Festa Junina do Centro Cultural Pampulha público estimado: 400 pessoas de onde vem: Ao receber o convite do Centro Cultural para realizarmos um preparo de comida na festa junina convidamos uma das professoras - que se envolveu com o projeto da cozinha - para participar do preparo conosco. Ela trouxe uma receita do seu pai, canjiquinha com suã. Lembrando do preparo com a Família Canuto, no Morro das Pedras, também propusemos uma versão vegetariana, com ora-pro-nóbis. processo: A professora preparou a canjiquinha tradicional, ensinando os segredos aprendidos na sua família. Preparamos a receita da família Canuto, do Morro das Pedras, como uma interlocução entre os dois territórios. Durante o evento também foram preparadas duas receitas de quentão, tradicional e sem álcool. efeito: A comida foi muito bem recebida na festa. As pessoas acharam muito interessante a opção de canjiquinha vegetariana. cardápio: Canjiquinha tradicional com suã, canjiquinha vegetariana, quentão.

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Festa Junina do Centro Cultural Pampulha

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Canjiquinha com suã do Seu Geraldo, pai da Márcia Usamos 2kg de suã, com aproximadamente 2 cabeças de alho e sal. Fritar ele no óleo até o fundo da panela ficar pretinho, depois colocá-lo na panela de pressão para cozinhar os ossinhos. A rapa de fritura do suã recebe a água da canjiquinha pra virar um caldo, e a receita do Seu Geraldo não leva urucum, pois a cor vem do queimado do suã. Para a canjiquinha com ora-pro-nóbis, começamos fritando a água: refoga sal, alho e óleo na panela e depois de quente joga a água até ela ferver. Quando tiver fervido coloca a canjiquinha até cozinhar. Nós picamos o ora-pro-nóbis e refogamos com mais alho, sal e urucum. Depois misturamos na panela.

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Receita de quentão tradicional da Márcia A receita que a Márcia nos passou serve como base para todas as outras receitas que encontramos por aí. Usamos três gengibres grandes, ralados com casca mesmo. Primeiro fervemos eles com cerca de 2 litros de água, para dar um caldo bem forte. Depois de bastante fervido, acrescentamos mais água e açúcar até dar o ponto. Segundo a Márcia, 1 litro de cachaça dá para cerca de 10 litros de água. Nós servimos com e sem cachaça, pois muita gente preferiu sem.

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Saladas nutritivas

27 de junho de 2017

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duração: 03 horas local: Praça externa do Centro Cultural Pampulha público estimado: 18 pessoas de onde vem: Algumas das mulheres que acompanhavam os preparos semanais sugeriram de fazermos um dia de preparo de saladas. Pensamos então em levar receitas que procuram variar a salada de folhas, que costumamos comer no dia-a-dia, para expandir o repertório do grupo. processo: Realizamos o preparo de 3 saladas diferentes. Salada de arroz 7 grãos, salada de trigo em grão com banana, salada viva. Utilizamos nos preparos legumes comuns na culinária mineira, que podem ser substituídos a gosto. efeito: O grupo se interessou muito pela variedade de sabores possíveis em uma salada, além do uso de ingredientes pouco convencionais. Uma das mulheres rebatizou a salada de 7 grãos de “salada seca barriga” por ter identificado nela todos ingredientes que havia visto em uma lista de dicas de uma revista. Sua riqueza em carboidratos complexos torna sua digestão mais demorada, satisfazendo o corpo por mais tempo. cardápio: Salada de arroz 7 grãos (ou salada seca barriga), salada de trigo em grãos, salada viva.

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Saladas nutritivas

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Salada de arroz 7 grãos Cozinhamos um pacote de arroz 7 grãos de 500 gramas por cerca de 20 minutos, sem deixar ficar macio demais. Escorremos a água que sobrou e passamos água fria no arroz para ele parar de cozinhar. Deixamos, enquanto o arroz cozinhava, os outros ingredientes todos preparados: picamos dois abacates bem maduros (tamanho médio para grande), um molho de salsa, dois molhos de couve picada bem fininha, limão espremido, algumas castanhas (que são opcionais, colocamos pois já tinha como ingrediente da outra salada). Para misturar, começa misturando um pouco do suco de limão com a couve para ela curtir. Depois mistura ela no arroz, junto com o sal, azeite, salsa e noz moscada. Acrescenta o abacate picado, mistura de novo, acrescentando a castanha, e até depende do gosto de cada pessoa: acertar o tempero.

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Salada de trigo com banana Essa salada é muito simples; o mais difícil é encontrar o trigo em grãos para comprar. Sugerimos os mercados – como o mercado central ou mercado do cruzeiro. Cozinhamos um pacote de trigo em grãos por cerca de 20 minutos – para ficar macio, mas não muito cozido. Escorremos a água que sobrou e passamos o trigo em uma água fria para interromper o cozimento. Picamos banana prata bem madura e também algumas nozes e misturamos os três ingredientes em uma vasilha. É bom misturar com um garfo e dar uma apertada nas bananas, para eles passarem mais gosto para o trigo. É uma salada mais doce, pois as bananas maduras são bastante adocicadas. Recomendamos ela para quem gosta de comidas que misturam sabores doces e salgados.

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Salada viva Pensamos em fazer esta salada de legumes e brotos porque os brotos concentram propriedades nutricionais muito mais que as plantas já crescidas. É uma receita simples, rápida e muito nutritiva. Além dos brotos incluímos legumes e vegetais utilizados na culinária tradicional mineira. 1 pacote de broto de feijão (é necessário colocar o broto por 3 minutos em água fervente e depois dar um choque térmico em agua gelada, com gelo) 1 pacote de broto de alfafa cenoura pimenta biquinho ora-pro-nóbis (o segredo para o ora-pro-nóbis cru não soltar a baba é utilizar as folhas inteiras) carambola cebola coentro alho poró

27 de junho de 2017

Molho de amendoim com gengibre Bater no liquidificador 1 xícara de amendoim torrado, água pra dar consistência; 1 dente de alho; 1 colher de chá de gengibre picado; 3 colheres de sopa de azeite (pode acrescentar mais, para dar o ponto ou facilitar pra bater); suco de 1 limão; sal e pimenta a gosto. Se você quiser pode acrescentar cebolinha picada e pronto.

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Saladas nutritivas

Dica: Legumes, frutas e verduras, podem ser escolhidos por seu gosto ou pelos disponíveis na estação. T3


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Bobó de palmito e “arroz” de brócolis

4 de julho de 2017

duração: 03 horas local: Praça externa e sala interna do Centro Cultural Pampulha público estimado: 15 pessoas de onde vem: Nas conversas durante a oficina algumas participantes mostraram interesse em aprender receitas com baixo teor de carboidratos que pudessem introduzir na alimentação cotidiana. processo: Preparamos um “arroz” de brócolis para mostrar para elas que alguns legumes processados podem substituir o grão. O arroz comum é um alimento de rápida digestão como qualquer outro carboidrato simples, sendo assim o organismo rapidamente quebra os nutrientes gerando um pico de açúcar no sangue. É interessante enriquecer o arroz ou trocá-lo por outra fonte de carboidrato complexo. Como acompanhamento fizemos um bobó de palmito. efeito: As mulheres participaram de forma ativa do preparo e gostaram muito de aprender ambas receitas. Algumas levaram marmita ao encontro porque queriam levar o prato para seus familiares provarem. cardápio: Arroz de brócolis, bobó de palmito.

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Arroz de brócolis

Bobó de palmito

1 brócolis grande ½ colher de cebola picada 3 dentes de alho ralados 1 xicara de cenoura em cubos, cozida ½ xícara de milho verde 1 xícara de tomates em cubos 2 colheres de sopa de gergelim (opcional) 1 colher de salsa desidratada Sal e pimenta a gosto

Ralar a mandioca no ralo grosso, mais ou menos 1 kg. Refogar no azeite de dendê, cebola e tomate, juntar a mandioca e ir misturando, acrescentando água quente e sal até estar cozida e com o tempero no seu gosto. Misturar palmito picado em rodelas (ou outro recheio de sua preferência), coentro e está pronto.

Triturar o brócolis em um processador de alimentos até alcançar o tamanho de arroz ou picar bem pequenininho. Dourar a cebola no azeite, juntar o alho e dourar levemente. Misture o brócolis, refogue com sal e temperos. Adicione a cenoura, o milho, tomate e por último o gergelim (opcional). Misturar até aquecer.

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Bobó de palmito e “arroz” de brócolis

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Pães com patê

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duração: 03 horas local: Praça externa do Centro Cultural Pampulha público estimado: 16 pessoas de onde vem: Decidimos por seguir trabalhando com o grupo a questão do carboidrato. Mais uma vez optamos pelo preparo de um alimento presente no cotidiano, o pão, que elas já haviam demonstrado interesse em aprender em nossas primeiras conversas. processo: Preparamos um pão integral enriquecido com aveia, linhaça e sementes. O carboidrato complexo da farinha integral demora maior tempo para ser processado pelo organismo, saciando a pessoa por mais tempo e sendo mais nutritivo. Enquanto a massa descansava preparamos uma pasta de grão de bico com taioba, uma receita rica em proteínas e nutrientes. efeito: Durante a oficina as mulheres foram lembrando de outras formas de se fazer pão, trocando receitas e processos de preparo. A taioba também remeteu à infância de muitas delas, que se surpreenderam com a forma inusitada de uso da folha. cardápio: Pão multigrãos, pasta de grão de bico com taioba.

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Pão integral multigrãos 20 g de fermento biológico 1 colher de açúcar 500 g de farinha integral 400 g de farinha de trigo 50 g de farinha de linhaça 50 g de aveia em flocos Sementes à gosto: girassol, gergelim, abóbora, linhaça, etc. 1 colher de sal 650 ml de água morna 1 ovo 50 ml de azeite Parte 1: ativar o fermento Esquentar a água até chegar ao ponto em que você consegue colocar sua mão dentro e deixar por 10s sem queimar. Misturar em um recipiente: 20g de fermento biológico; 1 colher de açúcar e parte da água. Deixar crescendo por mais ou menos 15 minutos (irá triplicar o volume) Parte 2: preparação da massa Misturar em uma bacia todas as farinhas, a aveia, as sementes e o sal. Mexer até ficar bem distribuído e acrescentar o ovo, o azeite e o fermento

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ativado. Acrescentar o restante da água aos poucos, a mistura vai dar liga e ficar soltando da mão. Deixe descansar em local quente por cerca de 1h (no sol, dentro do forno, enrolado em um pano). A massa vai dobrar de tamanho Dica: misturar com uma colher e na hora de testar a liga usar a mão, sentindo o ponto da massa. Parte 3: enformar Untar a fôrma com manteiga e farinha (a receita rende 2 formas retangulares) Sovar a massa novamente e colocar na fôrma. Deixar descansar em um local quente por cerca de 1 hora. Parte 4: assar Coloque para assar em 230o por cerca de 30 minutos. Para checar o ponto, dar um tapa no pão, se estiver oco, estará pronto.

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Pães com patê

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Pães com patê

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Pasta de grão de bico com taioba Preparo: Refogar a taioba com o alho e um pouco de sal. Reservamos a água que saiu da taioba e utilizamos para ajudar a bater a pasta. No liquidificador, colocar os ingredientes líquidos primeiro e ir acrescentando o grão de bico aos poucos. Se estiver difícil de bater, colocar mais água ou azeite.

Ingredientes que podem ser adicionados para dar gosto: legumes cozidos, folhas verdes como couve, espinafre e mostarda.

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250g de grão de bico cozido (deixar de molho na água, de um dia para o outro, descartar essa água e cozinhar em uma nova água. No cozimento coloque um pouco de óleo para não soltar espuma e sal, folha de louro, ou outros temperos a gosto) 4 colheres de suco de limão 1 colher de chá de sal 1 colher de chá de cominho (sementes torradas e trituradas na hora, se possível) 4 dentes de alho torrado 3 colheres de sopa de azeite

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Tortas sem glúten

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duração: 03 horas local: Praça externa do Centro Cultural Pampulha público estimado: 20 pessoas de onde vem: As participantes dos preparos coletivos trouxeram a ideia de prepararmos receitas sem glúten, fizemos tortinhas com massa sem farinha de trigo. processo: Para fazer a massa da torta usamos grão de bico cozido com farinha de linhaça dourada. A mistura forma uma massa lisa, fácil de moldar nas formas de torta. Enquanto elas foram ao forno fizemos um recheio salgado com legumes e um recheio doce de frutas sem açúcar. efeito: A massa foi muito apreciada pelas mulheres. A versatilidade da receita que pode levar diversos recheios ou até mesmo ser usada para outros preparos foi de grande interesse. As participantes ficaram até mesmo pensando outras possibilidades de uso para a massa. cardápio: Torta de grão de bico com recheio de legumes e recheio de frutas.

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Tortas sem glúten

Massa da torta

Recheio salgado

6 colheres de sopa de de grão de bico (cozido) amassado – sempre lembrar de deixar o grão de bico de molho por pelo menos 8 horas antes de cozinhar. 4 colheres de sopa de farinha de linhaça dourada 2 colheres de sopa de azeite 1 colher de chá de sal

Fritar com um pouco de azeite de dendê e azeite comum uma cebola e dois tomates picados. Acrescentar os legumes de acordo com o tempo de cozimento. Utilizamos, nessa ordem: cenoura, vagem, batata, abobrinha e por último colocamos um vidro de leite de coco.

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Preparo: Misturar todos os ingredientes até formar uma massa de modelar lisa e gostosa de trabalhar. Molde em forminhas. Leve ao forno por uns 20/25 minutos a 200 graus em forno pré-aquecido.

Dica: como é um recheio evite usar muita água no cozimento dos legumes.

Recheio doce Fizemos um doce de frutas sem açúcar, esquentando na panela abacaxi, hibiscos, suco de laranja e gengibre. Pode ser batido no liquidificador ou não. Dica: sempre que possível, substituir o açúcar pelo uso de frutas doces.

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Confraternização

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duração: 03 horas local: Salão do Centro Cultural Pampulha público estimado: 10 pessoas de onde vem: Durante nossos 2 meses de atuação na Urca contamos com a presença de um grupo de mulheres que acompanharam os preparos coletivos semanais. Como último encontro no contexto do projeto propusemos uma confraternização para que pudéssemos compartilhar receitas e lanches, conversar sobre alimentação e ter um retorno sobre o período que passamos lá. processo: Convidamos as mulheres a levarem alguma comida para compartilhar com o grupo. Fomos provando as comidas e conversando um pouco sobre os pratos. efeito: Nossa conversa trouxe muitas questões interessantes sobre a riqueza de se compartilhar aquilo que antigamente era o “segredo da receita”, sobre a experiência de aprender novas coisas em um regime de troca e sobre as histórias que são transmitidas junto às receitas. Anotamos todas receitas que trouxeram e mais algumas faladas na hora e expusemos elas em uma pequena instalação dentro da galeria do Centro Cultural. Deixamos a instalação no local por 2 semanas, período durante o qual ela recebeu mais contribuições da comunidade. cardápio: Salada de abobrinha com limão e pimenta, bolo de chocolate sem farinha, bolo de chocolate sem leite, bolo de cenoura, kefir, pipoca, carambolas.

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Confraternização

Conversa entre as participantes das oficinas e o coletivo, junto ao lanche que fizemos com comidas levadas por todas. Hoje vai ser nosso último dia de atividades aqui na Urca. A gente queria antes de tudo agradecer a todos esses encontros, que para nós foram muito especiais. Adoramos conhecer cada uma de vocês, tivemos muitas histórias legais e trocas importantes. Foi uma alegria. E a gente espera que possamos continuar se encontrando, trocando receitas, mesmo depois do fim dessa atividade com a Cozinha Itinerante...

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Isso! Então, pensamos em conversar um pouquinho sobre o que cada uma trouxe hoje para a confraternização. Esses pratos que estão na mesa, cada uma podia falar sobre a receita que escolheu para compartilhar com o grupo, o por quê dessa receita, a história dela, o que gosta nela... Alguém quer falar primeiro? Eu! Esse bolo aqui que eu trouxe, eu gosto muito de bolo sem leite. Porque acho que fica mais fofinho. Então ele tem chocolate, bicarbonato, pó royal e a farinha. E só dois ovos. Acho que é uma receita econômica, não gasta muita coisa. Criança gosta muito. Se a gente fizer esse fofinho e enfeitar para aniversário fica muito gostoso. Eu fiz há dois anos atrás no colégio e as crianças amaram. E meu neto todo convencido “gente esse bolo é artesanal, foi minha avó que fez”. Que ótimo! Tem que ter orgulho mesmo do alimento que é feito com carinho e amor. Bolo grande assim é bom demais

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pro horário de recreio das crianças. E como você enfeita ele? Eu fiz dois tabuleiros. Coloquei o recheio de doce de leite. E passei o doce de leite em volta, joguei o granulado e coloquei aquela bolinha gelatinosa. E em cima eu coloquei papel de arroz. Ficou ótimo, ficou chique. Em volta da bandeja eu coloquei aquelas coisas próprias de colocar, ficou muito bonito. Ai, eu faço muito. Porque eu tenho muito sobrinho e um tanto de agregado. E eu sempre faço os bolos. Eu faço de pão de ló, com doce de leite e abacaxi. E por cima coloco glacê feito com leite condensado e manteiga. Aí eu coloco ou papel de arroz ou brigadeiro com granulado. Ou então coco. Cada ano eu fazia de um jeito. Aí teve um ano que eu fiz com papel de arroz, nunca tinha usado, mas o trem é fácil de colar. Foi o aniversário do meu sobrinho de 10 anos e ele falou “tia, foi o melhor aniversário que eu já tive”. Esse ano meu neto mais novo fez 11 anos. Aí eu fiz a sacolinha, mandei fazer adesivo com nome dele, uma chuteira e uma bola. Eu levei pra festa, mas meu menino falou assim “ô mãe, o Miguel já tá grande”, então eu deixei a sacolinha de lado e coloquei os pratinhos na mesa com os doces. Só que o recreio é muito rápido né. Então o que acontece, eles levaram as sacolinhas pra casa e o bolo comeram lá mesmo. E eu falei “bem feito para você. Eles quiseram as guloseimas, levaram tudo! Criança é criança”. Gente, até adulto gosta. A gente briga para levar uma sacolinha. E na hora de liberar a mesa? Sábado eu fui num aniversário e a mulher fez umas coisas que achei tão T3


bonitas. Eram bonecas com bolinha branca e preta e com cabelo azul. Ela pegou latinha de leite em pó e farinha lá no hospital, colocou um adesivo e fez essa boneca. Elza, e esse bolo de leite você já tentou usar algum outro ingrediente além do chocolate? Banana ou algum outro sabor? Não. Eu já até pensei em colocar um pouco de aveia. Mas achei melhor não mexer não. O interessante é ir testando essas receitas em casa. Porque dá para começar a prestar atenção nos ingredientes que estamos comendo né? Porque aí você fazer um bolo às vezes não precisa ter muito açúcar, ou ovo, ou leite… Eu trouxe carambola para vocês. Direto do meu quintal. Essa não é a doce, é a azeda. Lá em casa ninguém gosta, então trouxe um monte. Dava para trazer mais, mas para tirar do pé tem que pedir ajuda para subir. Se cair no chão elas quebram. Uma coisa que eu achei muito positiva e interessante no projeto é essa releitura de receitas, porque eu sou da época em que as pessoas não só faziam as receitas de uma maneira tradicionall como muitas vezes elas guardavam as receitas e não compartilhavam. Outro dia mesmo a minha mãe estava lembrando disso, falando que uma vizinha não dava receita de jeito nenhum. Era aquele segredo de família. Receitas que eram guardadas a sete chaves. Só a avó que ensinava para filha que ensinava para a neta. E era simplesmente para não transmitir aquela receita para pessoas de fora da família. Aqui a receita do capuccino. Eu não tenho livro não, mas eles vão andando,

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andando, andando e vai perdendo com o tempo, muita gente pega, mas a gente vai juntando. E eu acho que hoje em dia existe uma tendência que é exatamente o contrário. As pessoas querem mostrar o que elas sabem fazer, aceitam sugestões para alterar um pouco a receita, e a proposta de vocês eu achei fantástica. De trazer ingredientes – hoje está na moda o uso de grãos, né, farinhas diversificadas – que torna uma receita mais saudável, mais nutritiva, mais completa e às vezes até mais fácil. E até mais econômica né. Eu acho interessante que a gente pode entender o preparo tradicional das coisas e começar a pensar nelas de uma forma mais saudável, porque com o tempo nós vamos tendo muito mais informação sobre o que a gente come. Aí dá para ter um pensamento um pouco mais crítico, não sair comendo tudo que está em oferta no supermercado achando que é saudável. Então no preparo de coisas que são até tradicionais, a gente vê que dá para atualizar as receitas. Manter ingredientes e modos de fazer, mas também mudar coisas que talvez para nosso dia-adia não são tão necessárias. Isso não impede a gente de continuar fazendo as coisas de forma tradicional. Mas uma alimentação que para o dia-a-dia seja mais saudável, sem perder a possibilidade de fazer ela dentro de nosso orçamento. Tudo pode ser muito trocado. A verdura é a verdura do dia, o legume também. Ingredientes que você pode ir trocando e criando muitos sabores diferentes.

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Sem dúvida. No dia de preparo que T3


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eu vim vocês estavam fazendo grão de bico com taioba. Na hora que vocês falaram eu pensei “nossa até o nome é feio”. Por quê não deram um nome mais facinho para taioba? Eu pensei que ia estragar o grão de bico. Mas ficou uma delícia. Mas a taioba tem uma vitamina excelente. A batata e a folha. A batata dela é tipo um inhame. Vocês já comeram biscoito de fubá com amendoim? Fica gostoso demais. É fubá com amendoim torrado e melado de cana. Antigamente o povo era mais assim mesmo. Acho que é um pouco egoísta o povo que não gosta de compartilhar, qualquer coisa que seja. A gente desse mundo não leva nada, né? Então a gente conviver é tão bom, a gente compartilhar, aprender e o que a gente souber, também poder ensinar. É uma lembrança que fica!

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O que acho mais legal nisso é que vivemos em um país muito diverso. E nossa culinária é diversa. Tem raiz indígena, africana, portuguesa, árabe… e quando a gente começa a trocar a gente mistura isso tudo. Quando você fala uma receita a pessoa pode contar outras formas de fazer ela. Forma mais econômica, com menos tempo… dá para ir evoluindo. Sobre esse negócio de fazer biscoito eu estava até dando uma pesquisada outro dia e descobri que dá para fazer muitos com resto de suco. Você bate alguma coisa no liquidificador e sobra por exemplo aquele resto de beterraba ou de couve, você põe aveia, açúcar e

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colocar para assar. E é muito nutritivo, pois é onde está a fibra e um tanto de nutriente. A gente não tem muito costume de aproveitar a casca dos legumes e das frutas mas na verdade as vitaminas estão todas ali né? Eu vou juntando as cascas, colocando numa sacolinha, aí depois eu cozinho e vou fazendo caldo... É legal que reduz também o volume do lixo orgânico. Eu acho que brasileiro tem que mudar tanto sua concepção de lixo, de embalagem, casca… e aprender esse reaproveitamento, além de ser bom para nós, é urgente para o mundo. Olha para quem tem bebê. Aprender a fazer esses caldos com casca de fruta... As águas de cozimento também tem como aproveitar, né? Água que cozinhou batata doce, usar para o arroz. Que aí vai aproveitando os nutrientes de uma coisa para outra. E a salada de abobrinha que você trouxe? Nos conta como é? Super simples. Corta ela bem fininha, tempera com pimentão, limão, vinagre, cebola, sal, pimenta…. só isso, a abobrinha sem cozinhar. Ela novinha. Não cozinhar é muito legal porque muitas vezes no fogo as coisas perdem o nutriente... O chuchu também dá uma salada crua boa. Você passa ele no ralo de espessura fina, aquele ralador mais compridinho. Coloca de molho na água com sal e ele vai desidratando. Depois pega o pano de prato para tirar a água dele todinha, e depois você tempera. Ele fica crocante. Você tempera com cebolinha, salsinha, azeite… Fica uma delícia. ninguém dá valor para o chuchu mas T3


dá uma salada maravilhosa. Tem que torcer para tirar o excesso da água. Ele fica desidratado ele fica molinho, ele não fica moído não. Fica delicioso. Dá impressão de que ele está cozido, mas fica crocante. Você podia contar um pouco também das coisas que trouxe. O cogumelo do sol e a bactéria para fazer iogurte. Você coloca água filtrada e açúcar mascavo. Ou então coloca no leite. São dois tipos diferentes. Fica parecendo uma gelatina! É só uma colherinha de açúcar. O mascavo, diabético pode tomar. E ele vai crescendo, eu já tirei para tanta gente que já perdi a conta. O iogurte você pode bater com fruta, pega gosto e fica uma delícia. A bactéria, de 2 em 2 dias você tira e lava, com água da torneira. A água é do filtro mesmo. E não pode ser alumínio, tem que ser vidro, porcelana ou plástico. Pode bater também com gelatina sem sabor. O meu eu faço com leite desnatado e sem lactose, porque tenho intolerância. –

Eu faço o feijão do meu jeito. Ela faz do jeito dela. E ela de outro. Nenhum fica igual. É uma coisa impressionante. Nenhum fica igual. Você pode até seguir a mesma receita que fica diferente. É, às vezes a pessoa fala “a fulana me deu a receita errada”. Mas não é não. É porque quando cada um faz fica diferente. A ciência da coisa é o seguinte. Toda festa que tinha minha tia fazia um pão com carne moída. A coisa mais maravilhosa do mundo. Todo mundo comia, comia, comia. Aí uma vez a gente falou

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“Tia Lucinha, a senhora podia dar a receita pra gente”. Na próxima festa que teve minha irmã fez, mas não ficou igual. Aí a minha irmã falou “tia eu fiz igualzinho a senhora ensinou. Qual é o segredo?” e ela respondeu “as mãos”. Então é interessante, cada um vai fazer de jeito diferente. A gente tem que ter energia e fazer com amor. E a responsabilidade de quem manipula a comida é muito grande. Porque a gente coloca ali muita coisa. Por qualquer coisinha não fica igual. Conta sobre o bolo que você trouxe! Então, esse bolo é assim… Quando meus pais vieram para cá, tinham 4 famílias só no terreno. A gente tinha uma dificuldade muito grande. Aí tinha um pessoal que ajudava trazendo pacote de fubá para a comunidade. A gente fazia mingau e tal, juntava as 4 famílias para fazer. Com o que cada um tinha a gente cozinhava junto, uma levava o ovo, outra o fubá, outra o leite, a gente juntava e fazia broa de fubá. O que acho mais interessante nisso é que quando estamos em um momento de dificuldade, se a gente se junta e faz junto, a gente supera tudo. Sim! Depois começamos a vender, até ganhava um dinheiro.

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Se cada um produz uma coisa, sozinho não consegue fazer nada né? Mas juntos, tem força! E a carambola, você produz no seu quintal? Não. É um pé só, mas ele dá carambola para o ano inteiro. Essa é T3


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da azeda, não é doce. Eu dou para quem quiser, passa lá e pega o quanto que quiser. Muita gente usa para fazer doce, salada, suco... Eu acho bonito na salada, fica decorado! E no supermercado ela é cara. Mas no meu quintal cai carambola em tudo.

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Gente, a Márcia tem uma história para contar. Eu quero contar uma história que tem a ver com os meninos que vieram para cá, eles nos trouxeram uma lição importante da vida. De sentar e relembrar coisa que a gente fazia quando era menina e que com o tempo acaba perdendo. Eu pensei, vou contar uma história para eles. Eu sou contadora de histórias aqui no Centro Cultural. E essa história é assim: tinham dois meninos em uma ilha muito longe, mas ela tinha caminhos de terra que a ligavam a outros lugares. O outro pedaço era longe demais. Tão longe que ninguém nunca chegava. De lá eles só ouviam notícias das coisas que aconteciam. Um dia eles ouviram falar que tinha uma casa que chamava Casa dos Espelhos. Eles nem de longe conseguiam imaginar o que eram espelhos. Algumas pessoas falavam que era vidro. E eles pensavam “mas o que é vidro?” porque lá era tudo de palha, as casas, as roupas, não tinha muito contato com nada. Mas tinha um menino muito curioso que falou “se existe esse lugar vou descobrir onde fica. E ele saiu para encontrar esse lugar. Ele andou muito, noites e dias. Era um menino muito alegre, onde ele passasse ele ria. Quem ele via abraçava, conversava e contava

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as histórias de onde morava. As pessoas ficavam encantadas em saber que existia um lugar que era único e só deles. Até que um dia ele chegou na Casa dos Espelhos. Tinham flores lindas, ele ficou maravilhado com o que via. Foi andando pelas flores e ficou achando cada lugar mais maravilhoso que o outro, até esbarrar na casa de vidro. Quando ele chegou estava toda fechada, mas tinha uma janela. Quando ele enfiou a cabeça para ver, lá dentro ele viu um menino. Ele deu tchau e o menino deu tchau também. Ele sorriu e o menino também sorriu. Ele bateu palmas e o menino também. Ele pensou “nossa que menino alegre, que cara legal!”. Ficou tentando tirar ele de lá mas ele não saia. E ele olhava o menino sempre feliz lá dentro. Como ele estava feliz estando preso? Vou voltar e pedir ajuda. Ele veio pelo caminho noites e dias andando e dançando. Quando ele chegou de volta ele contou para o senhor mais velho que morava na ilha. E o outro menino escutou e pensou “ah, mentira. Sonhador demais. Só ver uma borboleta que já fica maluco”. “Não, é verdade! E tem um menino muito legal lá dentro, a gente precisa salvar ele”. “É mentira”. Só que a noite veio e quando todos foram dormir ele falou “vou lá só desmentir esse menino”. Foi pelo mesmo caminho. E no caminho começou a ficar cansado, emburrado, chato e xingando. Saiu andando, chutou o chão, arrancou a cabeça do dedo. Até que chegou. Quando viu o jardim pensou “vou ter que atravessar isso tudo?”. Quando ele chegou ele não conseguiu entrar. A porta continuava trancada. Ele enfiou a cabeça pela janela, e tinha um menino mal humorado lá dentro. “Esse que é o menino legal?”. Olhou de novo e o menino estava mais feio ainda. “Credo que menino chato”. Começou a T3


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fazer careta e o menino também fazia. “Olha que menino chato”. Tudo que ele fazia eram caretas e era muito mal humorado. Voltou quase revoltado para casa. Já chegou reclamando com o senhor mais velho. “Mentira pura desse menino, andei por uma estrada feia e lá tinha um jardim igual aos nossos. Quando cheguei um menino mal humorado, mal criado, horroroso”. O senhor pensou muito e falou “Ah, já sei. Então a Casa do Espelho é como a vida. A gente vê como se olha para ela”. A realidade é essa mesma. Só verdade. É o dom né? Cada um tem um dom. Ela tem o de contar histórias. Um tem o de contar história, outro o de cozinhar, outro o de ser alegre. Tem gente que tem tudo isso! (risos) Aí vai para beira do fogão, conta histórias. As histórias fazem parte da vida né? Essas histórias eu aprendi na cozinha. Ficava na beirada do fogão da minha avó escutando as histórias do meu avô. Hoje a tecnologia não deixa os meninos escutarem histórias. Tá tudo se perdendo.

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Eu acho que quando se conta uma receita também se conta uma história. Toda vez que a gente conta uma receita ela vem junto com um caso, uma situação, de onde ela veio. E a da carambola como que é? (pausa para comida)

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Márcia e Fabíola participaram da maioria dos preparos feitos no Centro Cultural Pampulha. Elas nos contaram um pouco de suas histórias e relação próxima com alimentação. Marcia Finamori Eu sou Marcia Finamori, eu participei alguns dias, com o grupo de crianças com quem eu trabalho, que chama Arte da Saúde, desse trabalho que o pessoal fez aqui no Centro Cultural, que é a Cozinha Itinerante. E a minha história é a seguinte: Eu nasci e cresci aqui no Urca, eu tenho 47 anos hoje, e meu bairro sempre foi um bairro muito pobre, ele era um bairro de pessoas muito pobres, e a gente então vivia daquilo que a gente conseguia entre amigos, os nossos vizinhos plantavam e a gente trocava entre si: a gente trocava tudo que se plantava, tinha um vizinho que tinha um pé de chuchu... e a gente comia muito essas coisas. Morando próximo ao zoológico também, ficou bem fácil de conseguir algumas coisas, porque eles jogavam as fezes dos animais em um lugar ermo que tinha, hoje foi construído o Confisco, mas na época era só mato. Aí eles jogavam lá e aquelas fezes eram bem férteis e vinham com as sementes das frutas e dos legumes que eles (animais do zoológico) comiam... então aquilo dava abóbora, dava muitas outras coisas, tomate... e a minha avó buscava esse tomate e essas abóboras lá e também pegava coisas que o pessoal não está acostumado a comer, mas a gente comia

muito lobrobô, que é o ora pro nobis que as pessoas conhecem e pegava também o broto de samambaia e aí a gente fazia aquilo. Ela fazia pra gente comer, nós éramos muitas crianças, era um lote cheio de crianças e nós crescemos então comendo essas coisas diferenciadas. Mais tarde, quando as coisas foram melhorando (...) e meu pai já cozinhava algumas coisas que a gente tinha, ele tinha arrumado um emprego, que na época era considerado bom, no hospital da Previdência e aí então a gente tinha já uma condição um pouco melhor e a gente juntava então entre os amigos pra fazer alguma coisa diferente... e a gente aprendeu a fazer essa broa, que foi feita no último dia que vocês tiveram aqui no Centro Cultural: um vizinho trazia o leite, outro vizinho trazia o ovo, outro fubá, todos juntos, meu pai fazia e assava num forno que a gente tinha no terreiro, feito com tambor, e a gente assava essa broa e depois mandava um pedaço pra cada família, era o que a gente comia no café da manhã pra ir pra escola.

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Histórias

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Fabíola Andei lembrando de umas histórias sobre a dificuldade do brasileiro pra se alimentar e, ao longo da minha vida, teve fases que a gente não tinha o que comer direito, mas minha mãe, como uma boa brasileira, sabia se virar, ela fazia pastel de caruru de porco, que no caminho da escola tinham umas ramas na calçada. Ela catava e fazia os pasteizinhos de caruru de porco e era uma delícia. Depois, mais uma vez a gente não tinha muita opção e lá em casa tinha um pé de bananeira, aí mamãe fazia banana chips, banana frita, banana assada, pastel de banana, farofa de banana... e até então, um amigo meu falou: uai Fabíola, mas você come tanta banana, você adora banana mesmo né? Ai eu falei: Nossa, eu não consigo viver sem banana, mas mamãe sempre inovava, sempre dentro das condições do brasileiro. Hoje em dia o pessoal reclama, reclama, mas a qualidade de vida melhorou muito. Hoje minha culinária aqui tem os traços peruanos também, porque agora eu me casei com um peruano... aí tem o arroz chaufa, tem o ceviche, lomo saltado, tem o estofado de pollo... então, cada época a gente se alimenta de um jeito, mas as coisas melhoraram muito, olhando de antigamente pra hoje.

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Cartazes e exposição

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data: Durante todo o período de atividades na Urca local: Centro Cultural Pampulha designer: Lucas Kröeff público estimado: n/a de onde vem: n/a processo: Pensamos em ao organizar um calendário de eventos ligados a Cozinha Comum Itinerante no território e divulgar a programação de forma a engajar pessoas do bairro nas vivências que propomos. Dessa forma confeccionamos um calendário de ação com as atividades propostas e as informações do projeto, além de cartazes e flyers montados em formato de exposição processual dentro da galeria do Centro Cultural. efeito: n/a

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Projeto, pesquisa e execução Nó Coletivo: Ceci Nery, Paula Lobato e Thiago Flores Projeto Gráfico Lucas Kröeff e Paula Lobato Projeto e execução da estrutura da cozinha No Prumo: Bernardo Carvalho e Eric Crevels Parcerias Ocupa EAD, Lucas Kröeff, Zora Santos, Jaca Verde: Lucas Mourão, Vernalis: Ana Cimbleris, História em Construção: Horacius de Jesus, Associação Cruz de Malta/ProJovem, Okenutre: Bruno Araújo, Centro Cultural Pampulha. Fotografias Anastasia Defay, André Siqueira, Andrea Flávia Costa, Ceci Nery, Horacius de Jesus, Paula Lobato e Thiago Flores Tiragem 500 livros Papel Pólen Soft 80g Fonte Formular Impressão Rona Editora, 2017 Cozinha Comum Itinerante Belo Horizonte, Brasil

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