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Viagem Medieval
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06.AGO.2018
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Viagem Medieval Alferes Pereira encarna O Justiceiro
VIDA DE REI Acompanhámos Alferes Pereira, o pigeirense que veste o papel de D. Pedro I, durante o primeiro dia da Viagem Medieval e podemos garantir que ser El-Rei não é fácil. É preciso conjugar a vida pessoal e profissional com a nova experiência de ator. 08h: É a esta hora que Alferes Pereira acorda todos os dias. A primeira tarefa é descer as escadas e abrir a porta para Baltazar, o seu cão, fazer o seu passeio matinal.
08h30: Tempo para a primeira refeição do dia. 09h: Por questões físicas, não houve alternativa e o pigeirense teve de adquirir uma joelheira para combater o desgaste dos próximos 11 dias. 09h15: Alferes senta-se a verificar o correio eletrónico, a fazer alguns telefonemas pendentes e a tratar de questões profissionais.
10h: Com tudo resolvido, o foco vira-se, na íntegra, para a Viagem Medieval. Altura de ler e reler textos até à exaustão.
12h30: Embora a viagem até à cidade da Feira seja feita, na maioria das vezes, de autocarro, no primeiro dia de Viagem, Alferes foi à boleia.
12h50: Segunda refeição do dia. 13h30: Ainda que com alguma antecedência, o pigeirense desloca-se à Casa do Moinho, já dentro do recinto, e os preparativos iniciam-se para a primeira tarde de representação. Tempo para falar e acertar pormenores com toda a equipa. 14h15: Alferes Pereira inicia o processo de transformação para D. Pedro I. O stress e o nervosismo começam a acumular-se.
14h35: Ainda com 25 minutos para o início da 22.ª edição da Viagem Medieval, ElRei está pronto para a primeira aparição pública em Santa Maria da Feira.
14h50: D. Pedro I, O Justiceiro, vê Garoto aproximar-se. O cavalo do Rei está pronto a
ser montado. Os figurantes alinham-se, Alferes incluído, e aguardam que o presidente da Câmara da Feira, Emídio Sousa, dê o arranque oficial da Viagem.
15h: Começa a cavalgada até à Nau e El-Rei fala ao povo que estará hospedado em Santa Maria da Feira durante todos os dias do evento. 15h20: A cerimónia de abertura encerra e D. Pedro I, em cortejo pelas Tabernas, dirige-se à zona cavaleiriça.
16h: Disfarçado de monge, sem coroa e manto, regressa à Casa do Moinho para destrajar e vestir-se à civil. Pelo recinto, Alferes cruzou-se com amigos até encontrar a Comunicação Social. O Jornal de Notícias quis uma entrevista com o homem que encarna D. Pedro I, assim como a Rádio Clube da Feira. 18h30: Por esta altura, Alferes decidiu visitar Tabernas de amigos e conhecidos, mas não conseguiu marcar presença em todas as que desejava. 20h: Terceira refeição à séria do dia. Já no espaço do Grupo Gólgota, aproveitou também para ultimar detalhes para a peça que iria realizar-se pela noite. 20h30: Ainda à civil, desloca-se até ao Castelo da Feira. Encontra os figurantes, cumprimentando-os. Todos preparados, interrogam-se o porquê de El-Rei ainda estar vestido… à Alferes Pereira. 21h10: Desloca-se ao ‘quartel-general’, o Museu Convento dos Lóios, para, mais uma vez, vestir o traje respectivo. 21h40: Nova subida, ao encontro dos seus soldados, até ao Castelo. Agrupam-se e descem para a Igreja Matriz. Inicia-se o primeiro quadro de atuação. Em Cortejo fúnebre, vão até à Nau. 23h30: Desmobilização atrás das Piscinas Municipais. Tempo para reunir e falar da atuação. A opinião é unânime, correu bem, mas há sempre Pub. espaço para melhorar. 00h30: Reunião com os encenadores Zé
Carlos e Filipe Dias.
01h: Mais uma refeição. Desta vez, não faltam as
papas. Tempo também para trocar algumas notas com membros da organização e confraternizar com amigos. Ficha técnica Direcção Orlando Macedo Coordenação Daniela Castro Soares Redacção Daniela Castro Soares, Marcelo Brito e Nélson Costa Fotografia Albino Santos Paginação Pedro Almeida
02h15: Já sem transporte para regressar a
casa, Alferes Pereira, El-Rei D. Pedro I, apanhou boleia. A exaustão era notória.
PROCURO COM URGÊNCIA T2 ou T3 (apartamento ou vivenda) na zona da Cruz em Santa Maria da Feira. Contacto – 914063014 (Dª Adelina Santos)
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Especial
Viagem Medieval CONHECER
DE TRAGÉDIA EM TRAGÉDIA ATÉ À COROAÇÃO
Nome Manuel José Alferes Pereira Nascimento Pigeiros, 19 de Outubro de 1970 Idade 47 anos Profissão Agente imobiliário Partido CDS-PP Clube FCP Animais Baltazar (cão)
Texto Daniela Castro Soares Fotos Albino Santos
As fotografias são raras. Da comunhão, aliás, apenas tem uma. “A máquina encravou. Quando eu estava a receber o Senhor, o meu pai fez sinal ao fotógrafo, mas ele só conseguiu tirar uma fotografia, o rolo queimou”. Uma ‘tragédia’ num rol extenso que Alferes Pereira enumera à medida que conta a sua história. “Em princípios de 80, perco a minha irmã, morreu na Noite de Reis no Hospital de Oleiros, não havia médicos disponíveis e a parteira estava alcoolizada. O meu pai, a caminho, passa na linha do comboio, entra-lhe um ferro pelo carro adentro e fica bloqueado. A minha mãe já tinha problemas graves de saúde, a partir daí caiu a pique e acabou por morrer poucos dias depois de eu fazer 10 anos. A minha vida é composta de tragédias”. A perda da mãe, vítima de um cancro pro-
As vidas de D. Pedro I e Alferes Pereira não são assim tão diferentes. O primeiro é conhecido por ter sido cruel, o segundo por ter ‘cara de mau’. O primeiro tinha um amor de caixão à cova por Inês de Castro, o segundo tem uma dívida de gratidão para com a esposa Celeste. Ambos têm coroa, D. Pedro I há séculos atrás, Alferes Pereira até ao final desta semana, não fosse ele o XXII Rei da Viagem Medieval. longado, fez com que procurasse conforto nos mais próximos. “Durante muitos anos, senti falta dessa presença feminina. Tinha a minha tia, irmã gémea da minha mãe, e uma vizinha, a Sra. Micas, que foi quase uma mãe, que me deram muito apoio; e a infância foi-se construindo com outras referências”. A família já era pequena mas o falecimento da mãe “fechou ainda mais” o núcleo. Alferes aprendeu, desde cedo, a desenrascar-se sozinho. “O meu pai saía de manhã e chegava de madrugada. Eu comia quando calhava, muitas vezes em casa de vizinhos, algumas vezes sozinho e assim aprendi a cozinhar”.
Brincadeiras e traquinices
Ainda assim, houve tempo para as normais traquinices de criança. “Morava junto à escola de Pigeiros, na casa onde nasci
construída pelo meu pai, mas era sempre o último a chegar, eu e outro vizinho de cima, o Paulo, levávamos cada reguada…”, conta. Passava tanto tempo no recreio da escola que muitas vezes até se esquecia de regressar a casa. “Às vezes, era preciso ir buscar-me pelas orelhas e com a chibata, uns paus compridos das macieiras, que servia para ‘conduzir’ a malta”. Alferes brincava com carrinhos mas era muito mais de jogar à bola. “Jogávamos à bola, não jogávamos futebol, são coisas diferentes. O Cristiano Ronaldo e o Messi jogam à bola; os outros são jogadores de futebol. A diferença está na vontade. Nós jogávamos com uma alegria imensa”. Os jogos faziam-se na estrada principal de Pigeiros – “impensável nos dias de hoje” – e quando vinha um carro, “havia sempre um desgraçado que ficava a arrumar as
balizas, feitas com duas pedras”. A bola era a brincadeira principal, mas também brincavam “ao pião, aos países, à macaca, que era mais para as meninas mas também servia para nos metermos com elas”. Alferes lembra-se de receber, com 8 anos, um jogo da Majora e chamar toda a gente para sua casa. “Nem sabíamos muito bem como jogar aquilo. Pouco tempo depois, voltamos à bola, à cabra cega, às caçadas, às escondidas… às brincadeiras típicas da época”. E as subidas às árvores? “Ui… Valeram-me uns valentes tabefes do meu pai. Quando éramos miúdos, fazíamos cabanas em cima das árvores para podermos ir para lá fumar tabaco roubado”, diz, sorrindo. Andou na escola primária em Pigeiros e, depois do falecimento da mãe, foi, como interno, para o Colégio dos Carvalhos.
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Viagem Medieval RESPOSTA RÁPIDA
O que o motiva? A vida. O que o preocupa? Morrer sem fazer o que quero. Naqueles dias em que tudo parece correr mal, qual é o seu refúgio? Ir caminhando. O que mais gosta de fazer? Ouvir música. O que menos gosta de fazer? Aturar gente estúpida, mesquinha e ignorante. Se pudesse mudar uma coisa em si, o que mudava? Não teria cometido alguns erros. Não sai de casa sem… Às vezes saio sem telemóvel, sem os documentos… Não tenho nada que não me deixe sair de casa. O que para si é insuportável? A dor de uma criança. A sua palavra favorita é… Amor. Qual a figura da história que mais admira? Além de D. Pedro I (risos), D. Afonso Henriques porque foi ele que começou isto tudo. Quem são os seus heróis da vida real? O meu pai e a minha esposa Celeste. Que qualidade mais aprecia numa pessoa? Visão de futuro, coisa tão escassa. Como é para si um dia perfeito? Um dia de felicidade dos que me rodeiam. Que conselho lhe deram que nunca esqueceu? Não te esqueças de tirar o curso superior; conselho que não segui e bem me arrependo. Se pudesse voltar atrás, a que ano regressaria? Não quero voltar atrás. O que está feito, está feito, temos de olhar para o futuro. O seu lema de vida é… Tenta ser feliz hoje porque amanhã não se sabe o que acontece. O que é urgente o mundo perceber? Que precisamos de paz e que somos todos iguais.
“Foi uma altura complicadíssima, o meu pai estava completamente falido, a doença da minha mãe consumiu tudo o que tínhamos e não tínhamos, começaram a ir os anéis e depois alguns dedos, uma situação desesperante, e ele coloca-me a interno porque tem noção que eu preciso de uma educação diferente, uma educação que ele próprio terá dificuldade em dar-me, e também para me afastar de tudo o que de mau acontecia na família”. Uma criança de 10 anos compreende esta decisão? “Admito que tenha sido cruel, mas aceitei”. Ajudou muito, na altura, a “dinâmica” proporcionada pelo Colégio. “Havia um slogan que dizia ‘no Colégio dos Carvalhos dás homem; se não deres homem aqui, não dás em mais lado nenhum’. Vou para lá com aquela carga toda e o Colégio ajudava nisso, miúdos com problemas acrescidos, que sofreram perdas recentes, com problemas em casa, problemas de insubordinação, de pequena criminalidade, acabavam por superá-los e integrar-se”. A estrutura da escola era “muito intensa. Tínhamos semanas dedicadas às artes, à cultura, tínhamos trabalhos manuais, torneios de futebol, basquetebol, andebol, voleibol. O meu gosto por cinema e teatro vem do Colégio dos Carvalhos. Tínhamos sessões de cinema, em que as fitas eram cuidadosamente analisadas pelo padre, que de vez em quando deixava passar uma coisa ou outra”, revela, entre risos. Nos intervalos, permaneciam dentro do recinto,“só se pulássemos o muro mas às vezes corria mal, porque estava um padre do outro lado à nossa espera”. A ida para o Colégio foi “muito boa porque, além da responsabilidade e de uma série de coisas que me ensinou, que são a base do que sou hoje, permitiu que avançasse aquela fase da minha vida, que não foi fácil”. As idas a casa, lembra, eram “custosas. Via o meu pai a tentar refazer a vida. Era emigrante na Venezuela, fez umas casas, arrendou-as, veio o 25 de Abril e bloqueou-lhe as rendas, ficaram congeladas 20 e tal anos, teve de se desfazer das coisas como pôde”.
Evolução de mau para bom aluno
Aplicou-se no Colégio e fez um percurso notável. “Comecei mau aluno, acabei o primeiro ano como bom aluno e depois fui um dos melhores alunos da turma até ao 9.º ano. Comecei a ganhar método de trabalho, interessar-me pelas coisas. No 10.º ano, esbarrei-me”, diz. O que aconteceu? “Mudo de edifício, de professores e, talvez o mais importante, a entrada das meninas no Colégio. Foi uma tragédia para muita gente”, diz, rindo. As disciplinas preferidas eram História, Francês, Geografia e, mais tarde, Sociologia. O objectivo era seguir História, a paixão que ficou, mas… “Era um desejo proibido. Já havia um desemprego medonho na área. Tanto me desviaram que fui para a área económica. Quando temos 15 anos, sonhamos ser grandes empresários e ter montes de dinheiro. Se não podia seguir História, apostei em ser um grande empresário. Mas depois chega-se à faculdade e vê-se que não é bem assim”. Entra para o Instituto Superior de Administração e Gestão, curso de Contabilidade e Gestão, com a Ges-
tão Financeira em vista, mas a tropa meteu-se no caminho. “Não consegui adiar mais e fui à tropa. Ganhei amigos e responsabilidade. Algumas coisas que se aprende na tropa, eu já as sabia, por ter sido interno no Colégio. Mas retiro da experiência a camaradagem, o saber reconhecer que somos todos diferentes mas, com a farda vestida, estamos numa situação em que somos todos iguais”. A tropa, contudo,“foi um ano parado. Foi deixar o comboio passar, estar à espera de outro e depois não ter pedalada para o apanhar porque muita coisa já estava esquecida e não tinha aquela dinâmica de faculdade. Chego, já não sou caloiro, por isso não sou praxado, senti-me isolado e tive alguma dificuldade em encaixar-me. Fui andando, mas muito cedo desliguei-me, vi que não era aquilo que queria”. Desistiu e foi estudando algumas matérias que lhe despertavam interesse. Um convite de uma amiga acabou por levá-lo para a área imobiliária. “Fui-me aperfeiçoando, estou como freelancer e trabalho ao meu ritmo. Vivemos épocas douradas em termos de negócio, é um trabalho estimulante mas desgastante. Quem quiser ganhar dinheiro a sério nesta área, ganha”. No ramo há cerca de oito anos, inscreveu-se agora no curso de Gestão Imobiliária na Escola Superior de Actividades Imobiliárias, em Lisboa. “Este semestre foi todo para o tecto por causa da Viagem Medieval, mas isto acabando, vou-me enfiar dentro de casa para os exames de Setembro”, garante. Uma área que se tornou uma paixão mas que em nada se compara à História. “Um dia, enquanto reformado, se tiver disponibilidade física e financeira, hei-de tirar um curso de História, nem que seja só para pôr em cima da lareira”.
El-Rei D. Pedro I
O mais recente desafio permitiu-lhe extravasar este gosto. “Quando fui escolhido para Rei da Viagem Medieval, já tinha na ponta da língua este reinado e depois devorei, em pouco tempo, tudo o que havia sobre D. Pedro I”, garante. Quando se candidatou, às 23h00 do último dia, “nunca pensou ser escolhido”. Mas a verdade é que “o perfil pedido encaixava que nem uma luva. As expressões faciais contam muito e uma das razões para ter sido escolhido foi por causa da cara de mau que muita gente diz que eu tenho, embora seja a pessoa mais doce do mundo”, diz, sorrindo. Um “abanão completo” na rotina do dia-a-dia que já lhe valeu alguns sustos. “A Valentina [égua] atirou-me ao chão. Uma pequena distracção, a égua assustou-se e eu caí. No dia seguinte, ainda montei, mas dois dias depois senti dores fortes, fui ao hospital e vi que tinha uma costela fracturada. Já estou melhor, basta algum cuidado, são ossos do ofício”, afirma. A experiência está “a correr lindamente” e só tem elogios para a equipa que lhe dá “almofada e aconchego para que possa levar a sério este papel”. A mediatização da personagem no concelho da Feira, garante, “foi arrasadora. No país todo, na verdade, porque o cartaz é bom, a imagem é forte, graças à grande qualidade do fotógrafo Frederico Martins e equipa, mas aqui na Feira, toda a gente conhece o Alferes Pereira como figura do mundo associativo e político”.
Um brilhozinho nos olhos… político
E de política não poderíamos deixar de falar. “Com quatro, cinco anos, assisti ao período quente da revolução. Lembro-me de estar fixado a olhar para a televisão e a minha mãe comentar ‘ele está sempre a ver coisas de política’”, recorda. Um bichinho que já estava dentro dele mas que foi potenciado pelo pai que fez parte do Executivo da Junta de Freguesia de Pigeiros, entre 79-82, como tesoureiro. “O meu pai foi uma pessoa da política mas nunca gostou de se envolver demasiado na política, era a terra, Pigeiros, que lhe importava. Uma vez, teve um convite para ir para uma Distrital de Aveiro, mas não quis”. Foi acompanhando o pai, via os debates com ele e lembra-se de “comícios do CDS extremamente complicados. Uma vez, em Vale de Cambra, tivemos de nos enfiar debaixo de camiões e carros por causa das bombas”. Ainda recorda, vividamente, o dia em que recebeu “a comunicação da morte de Sá Carneiro e Amaro da Costa na televisão. Comecei a chorar e fui acordar o meu pai com a notícia”. Alferes participou na Aliança Democrática e fugiu do Colégio, em 1985, para seguir Freitas do Amaral, na altura da sua candidatura contra Mário Soares. “Fugi eu e muitos, para o seguirmos, porque sentimos que, pela primeira vez, poderíamos ter um presidente de Direita”. À medida que o tempo ia passando, mais ele se ia envolvendo na política.“Começa a ficar sério com os meus 16 anos. Espicaçaram-me para ir para a Juventude Centrista. Com os nossos contactos, ressuscitámos a JC, que tinha tido uma série de concelhias mas tinha acabado, e formou-se um grupo de amizades que perduram até hoje”. Embora adeptos da mesma ideologia, ele o pai, “os dois teimosos”, tinham grandes discussões sobre a forma como esta deveria ser defendida. “Tínhamos ideias um pouco diferentes sobre o que devia ser o CDS. O meu
ALFERES COM OS PAIS
GUARDA-ROUPA DA VIAGEM MEDIE
EVAL
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Viagem Medieval pai era institucionalista, uma lógica conservadora, e eu mais liberal, em termos económicos, e mais democrata-cristã. A Esquerda diz que a área social é deles mas não é, o CDS tem na sua génese essa característica”. Alferes gosta muito de ‘arreliar a malta da Esquerda’. “Já cheguei a mandar e-mails a dizer ‘camaradas’. Em algumas matérias, sou progressista, há quem me diga ‘tu devias era ser de Esquerda’, mas não, o que eu não sou é quadrado”. Quando Manuel Monteiro aparece e “abana” o partido, o pigeirense “deixa tudo para se dedicar à política”, inclusive os estudos. “Se calhar foi o maior erro da minha vida. Dediquei-me à política, com alguns trabalhos pontuais para me ir desenrascando, porque… Os grandes amores não se explicam”. O objectivo era “mudar o mundo. A maior parte dos jovens andava na política de forma séria e acreditava naquilo que fazia; alguns já andavam a ver como podiam subir para chegar a algum lado. Naquela altura, eram alguns, hoje a maioria anda nas ‘jotas’ para subir na hierarquia, e alguns andam por convicção. E estou convencido que quanto mais perto do poder estão as ‘jotas’, menos jovens há com essa inocência de pensamento e atitude”. E conseguiu mudar o mundo? “Não consegui, mas consegui mudar alguma coisa. Fizemos coisas fantásticas na Feira, éramos quase uma associação cultural; não era como agora que as ‘jotas’ só fazem comunicados para os jor nais”. Chegaram a realizar “torneios de futebol, provas de atletismo, rally papers, peddy-papers, provas de perícia, festas em discotecas e bares” e havia muita discussão salutar. “Hoje em dia, não se discute nada, e depois quando as coisas já estão consolidadas é que vêm dizer que está mal. As pessoas têm de se habituar a discutir. Quando está aprovado, devemos estar na linha
da frente”. Durante muito tempo, foi o rosto mais visível do CDS-PP feirense, com candidaturas a vários órgãos políticos, suportado por equipas “o mais abrangentes possível, inclusive com pessoas que tinham dúvidas e criticavam o seu projecto e práticas. Se o CDS teve uma série de pessoas que saíram para a montra, deve-se a esse trabalho começado em 2009, porque quando pegámos no partido, era um desastre absoluto, para formar uma concelhia de cinco pessoas estivemos uma semana, ninguém queria dar a cara pelo partido. Quando eu deixo o partido, deixo-o com muitas figuras conhecidas no Concelho; é sinal que o trabalho foi bem feito”. Depois de desavenças com os actuais líderes da Concelhia feirense, afastou-se e candidatou-se a presidente da Concelhia Nacional, mandato que entretanto terminou. Continua como “militante de base” e vai “acompanhando, analisando, sem grandes interferências, a vida do partido. Acompanho, sobretudo, os núcleos de freguesia. Um núcleo de freguesia é mais estimulante que a Assembleia da República porque é estar junto das pessoas, discutemse os problemas reais. Na AR é tudo muito vago, a malta vai pura e vem cheia de vícios”.
Curtas-metragens e piri-piri
Presença constante no mundo associativo, foi dirigente da Associação Ambientalista e Cultural dos Amigos do Uíma, durante muitos anos, e fez parte do Grupo de Carnaval das Caldas de S. Jorge quando o evento era “enorme” e apenas tinha concorrência em Mosteirô e Paços de Brandão. “Hoje há Carnaval em todo o lado, é mais difícil, a associação vive dias complicados”. Acompanhou os Persona “para trás e para a frente” e não perde, apesar das noites mal-dormidas e do
A ESPOSA CELESTE
BALTAZAR O “HERDEIRO”
Um Livro O Novíssimo Príncipe, Adriano Moreira Uma Viagem Pólo Norte e Pólo Sul Um Som O ladrar do meu cão Um Filme Cinema Paraíso Uma Cor Preto Um Cheiro Mar Um Lugar Um lugar ao sol Uma Música Decades, Joy Divison Um Prato Cabrito assado Um Animal Cão Um Objecto Telemóvel Uma Frase “Eu bem te avisei” trabalho envolvido, um Festival de Cinema Luso-Brasileiro. “Sou activo no Festival, adoro. É uma semana extremamente desgastante, dormese três horas, não se come direito, ganha-se uns quilos…”. O gosto pela área é tão grande que já pensou em estudar Cinema e, no currículo, conta com teatro amador e algumas participações em filmes, como figurante, e um papel de vilão na curta-metragem ‘Haikai Diamante’, do realizador brasileiro André Francioli, em que interpretou o “chefe do bando que andava à procura do protagonista para recuperar um diamante. O André estava a passar uma curta no Festival e andava a analisar-me. Explicou-me o projecto, aceitei e gravámos nas Guimbras. Calhou numa altura complicada, eu andava rouco e tinha de gritar, era só pastilhas de mentol, doía-me os ouvidos, mas lá se conseguiu. Foi uma experiência diferente”. Algo que, garante, gostaria de explorar mais a fundo. “Se um dia mais tarde aparecer alguma coisa na área que me interesse, vou”. A viver na casa do pai em Pigeiros com a esposa Celeste – “quero deixar-lhe uma palavra porque, com a política, tem sido uma sacrificada” – e o ‘herdeiro’, o cão Baltazar, Alferes, quando questionado sobre o futuro, vai buscar o tradicional provérbio. “Dizem que antes de morrer se deve plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho. O filho já será difícil. Tenho meio livro escrito sobre a juventude na política mas não quis levar para a frente, para já, porque desmistificava e tornava público algumas questões. E ainda há dias plantei o meu quintal todo de novo, além de que nos Amigos do Uíma fartei-me de plantar árvores, sempre com a certeza de que, onde elas eram plantadas, ficavam; não é como nas inaugurações em que se planta uma árvore, tira-se a foto e passados dois meses a árvore já não está lá ou secou porque ninguém cuidou dela”. Com 47 anos, mantém o espírito “provocador. A vida tem de ter pimenta, ou piri-piri, é irrelevante, desde que pique”.
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Especial Viagem Medieval
12 140 67 140 1692 24 DIAS DE ANIMAÇÃO E RECRIAÇÃO HISTÓRICA
HORAS DE ANIMAÇÃO DURANTE O EVENTO
ESPETÁCULOS DIÁRIOS
APRESENTAÇÕES DIÁRIAS
APRESENTAÇÕES NOS 12 DIAS
ARTESÃOS, MERC E REGATÕES
SEJAM BEM-VINDOS AO REINADO D’O JUSTICEIRO Iniciou-se mais uma edição, a 22.ª, da Viagem Medieval em Terras de Santa Maria… da Feira. São 12 dias de recriação histórica do Reinado de D. Pedro I, O Justiceiro. O centro da cidade volta a acolher milhares de comerciantes, visitantes e atores de vários cantos do país e do estrangeiro. Os espetáculos são o ex-libris da máquina do tempo que é esta viagem ao século XIV. E 76% são produzidos, na íntegra, por associações e companhias feirenses. Texto Marcelo Brito Fotos Albino Santos
FEIRA Dia 1. A azáfama é grande. Os últimos preparativos concluem-se e tudo é acelerado quando o relógio aproxima-se das 15 horas. Dá-se o início da 22.ª edição daquela que é uma das maiores recriações histórias de Portugal e da Europa. Acompanhado pela Corte e Escudeiros, El-Rei D. Pedro I desmonta o seu cavalo e fala à população.Rapidamente vêemse mendigos a pedir, comerciantes a vender, guerreiros a treinar e cavaleiros a montar. A música da época predomina,mas ainda que por breves segundos pareça que estamos no século XIV, não estamos. Corre o ano de 2018 e também vemos centenas de visitantes, curiosos, portugueses e estrangeiros e de telemóvel na mão a registarem os vários momentos. As primeiras honras foram proferidas pelo representante máximo do Município. “Eu, Emídio Sousa, pela graça do povo, s a ú d o - vo s . Mandamos que se faça, e se possa fazer no dito lugar da Feira, de hoje em diante até aos 12 dias de agosto do ano de Cristo de
2018, a Viagem Medieval em Terra de Santa Maria”. De seguida, El-Rei intervém. “Eu, Pedro, pela graça de Deus, Rei de Portugal e do Algarve, ao serviço da Justiça e da boa governança de meus reinos e meus povos,estarei hospedado em Terra de Santa Maria”.As palavras foram contempladas com dança e música até O Justiceiro, de cognome, retirar-se.
Beneficiação da circulação
Depois da cerimónia de abertura da Viagem Medieval de 2018, grande parte do tecido político e social concelhio acompanhou o edil feirense, Emídio Sousa, e o presidente da FeiraViva,Paulo Sérgio,numa espécie de visita guiada pelo recinto. O representante máximo da empresa responsável pela dinamização do evento, Paulo Sérgio, aproveitou para justificar algumas alterações. “As Tabernas saíram da Praça da Nau. O objetivo passa por reduzir o fluxo de pessoas, ou seja, que haja uma diminuição da pressão populacional e consequentemente uma maior fluidez, assim como melhores condições de segurança. A implementação de uma nova bancada, nas Guimbras, é para melhorar a qualidade do usufruto do visitante – já que alguns espetáculos são mais extensos – e o acesso é gratuito”. O presidente do Feira Viva adiantou ainda que 76% dos espetáculos são produzidos, na íntegra, por associações sedeadas em Santa Maria da Feira. Já dentro dos Banhos de S. Jorge, Emídio Sousa garantiu que a recuperação do espaço tem como objetivo “a preservação das árvores, das espécies e dos caminhos pedestres”.
Diversão diurna e noturna
Os sorrisos dos agentes organizadores e promotores da Viagem Medieval são inevitáveis, mas também aqueles que querem usufruir deste evento não escondem a alegria de marcarem presença em mais uma edição. E o movimento não é apenas diurno. O povo da Feira vê, também noite dentro, chegarem pessoas de todos os cantos do povoado que são as Terras de Santa Maria – e não só. O Anfiteatro da Praça Gaspar Moreira, por exemplo, não tem um espaço livre. As animações garantem a continuidade dos visitantes que não prescindem de fazerem-se acompanhar do icónico copo do estilo medieval. As ruas, repletas de trânsito humano, comprovam a adesão, em massa, ao evento. As mesas da zona destinada às Tabernas não têm tréguas. Os grupos juntam-se, comem, bebem, desfrutam.
D. Pedro I, O Justiceiro
A edição de 2018 da Viagem retrata a vida de D. Pedro I, O Justiceiro, uma figura, como tantas outras, icónicas e eternas da história de Portugal. É representado pelo pigeirense Alferes Pereira. O infante desde cedo acompanhou seu pai na governação. Ao ser aclamado Rei de Portugal e do Algarve, D. Pedro I já detinha um conhecimento abastado do território nacional. Percorreu-o de lés-a-lés, levando consigo a justiça que o caracterizava, por vezes com excessiva dureza e pouco rigor.O povo sentia-se protegido, a Nobreza temia-o e respeitava-o e o Clero mostrava empatia.O Estado começava a afirmar-se perante a Igreja. Promoveu leis que fomentaram o comércio marítimo, criou
novos concelhos, fomentou a agricul- t u r a e conseguiu manter estagnadas as desavenças com Castela. Reinou durante 10 anos e conseguiu a prosperidade financeira para Portugal. Mas há um capítulo identitário na história de D. Pedro I e de Portugal. O Justiceiro viveu um amor proibido com Inês de Castro, dama de companhia da sua mulher, D. Constança Manuel. Os Jardins da Quinta das Lágrimas eram o local dos encontros românticos secretos, mas depois da morte de Constança, Pedro e Inês passaram a viver juntos em Coimbra com os seus três filhos. O pai de Pedro, D. Afonso IV, reprovava a relação e mandou assassinar Inês. O infante reagiu e liderou uma revolta contra o pai. Mais tarde, afirmando ter-se casado com Inês, impôs o seu reconhecimento enquanto Rainha do Reino de Portugal. ‘No dia em que eu for Rei, tu serás a minha Rainha’, esta é a frase inscrita nas pulseiras da Viagem.
Agenda cultural preenchida
Os olhares estão virados para os espetáculos de grande formato. São a grande montra da recriação e retrocesso ao século XIV, mas também há tempo e espaço para cortejos. ‘De amada a Rainha’, que inicia-se no Castelo e termina na Praça da Nau, retrata o momento em que D.Pedro,após ser coroado Rei,manda desenterrar Inês de Castro e coroa-a Rainha, obrigando os fidalgos a beijarem-lhe a mão. ‘Justiceiro e Cruel’,da Misericórdia ao Povoado,demonstra a crueldade de El-Rei. ‘AVingança’e‘Momentos daVida D’El-Rei’são
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02.JUL.2018
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Especial Viagem Medieval
42 350 2000 33 700 11
CADORES
mil
VOLUNTÁRIOS
PESSOAS A TRABALHAR DIARIAMENTE
HECTARES DE ÁREA
VISITANTES ESPERADOS
PRÉMIOS E DISTINÇÕES
Portuense e gaiense dão nó ‘não oficial’
Há casamento na Viagem… de Pedro e Inês
episódios daquela época medieval. O primeiro mostra que D. Pedro I não desiste de vingar a morte de Inês. Fá-lo da forma mais impiedosa que idealizou. O segundo, como indica o nome, traz aos visitantes a oportunidade de ficarem com o conhecimento de como era a vida de um Rei de Portugal. Voltemos aos espetáculos de grande formato que decorrem no Terreiro das Guimbras. A peça ‘Folguedos de D. Pedro I’ retrata as festas e os arraiais imprescindíveis quando El-Rei marcava presença. ‘Amor Até ao Infinito’ espelha a sede por justiça e vingança de D. Pedro I. Já ‘Sangue de Portugal’ mostra o início da retaliação do Rei após a morte de Inês de Castro, não olhando aos meios, iniciando inclusive uma guerra contra o próprio pai, D. Afonso IV. Três espetáculos diferentes, autónomos, mas com uma sequência. Episódios da governação de D. Pedro I. Junto ao Castelo. Muitas são as experiências que o visitante pode vivenciar, tais como Tiro com Lanças, Corrida de Sacos, Tiro com Catapultas, Luta de Gladiadores, Lançamento da Ferradura, Corridas com Barrote de Madeira, Corrida com Pés Grandes, Equilíbrio em Traves de Madeira, Equilibrismo, Pêndulo e Pontaria com Fisga.
Mas não são apenas estes teatros que embeleza todo o evento.Os detalhes mostram a meticulosidade com que esta Viagem até o século XIV está preparada.Pelas ruas vêem-se mendigos, enfermos, Nobreza e Clero. A Viagem Medieval conta com a participação de 52 entidades de Santa Maria da Feira e 18 sedeadas no resto do território nacional e espanhol.
A História conta que D. Pedro e Inês de Castro, então dama de companhia da mulher do Rei, Constança Manuel, mantinham encontros românticos nos Jardins da Quinta das Lágrimas. Depois da morte de Constança Manuel, Pedro e Inês viveram em Coimbra com os seus três filhos. Uma história de um amor não consensual e oculto. Agora, em 2018 e em plena Viagem Medieval, assistiremos a outro casamento – não oficial – entre… o portuense Pedro e a gaiense Inês. Nasceram em lados opostos do Rio Douro, mas vão dar o nó matrimonial, em plena Viagem Medieval, no dia 12, de forma simbólica. “Encontrei o meu D. Pedro em contexto profissional. Trabalhamos para a mesma entidade”, recorda Inês. A ideia de unirem e celebrarem votos em Santa Maria da Feira, numa das maiores recriações históricas de Portugal e da Europa, foi consensual. “A Inês encontrou uma referência na página da Viagem Medieval. Concordei que seria giro. Adoro as recreações da época e no tempo livre de que dispomos, gostamos muito de viajar
pelo património histórico medieval”, conta Pedro. Já Inês explica o processo:“Enviámos um e-mail, só a pedir informações, na brincadeira, e quando a organização respondeu, percebemos que teríamos hipótese de participar. O gosto pelas cores, sabores, cheiros e sons não deixou outra alternativa que não aceitarmos”. É impossível ainda não ter reparado na coincidência dos nomes, mas Pedro, o nortenho que irá ‘casar’ na Viagem Medieval, reitera que “a história de D. Pedro e Inês de Castro” teve influência. “Íamos à Feira de qualquer forma, mas assim podemos fazer de conta que somos parte da mais bela história de amor”. A gaiense Inês conta que “é usual” ouvirem o trocadilho alusivo à história do ex-Rei de Portugal, algo que “reveste tudo de um maior significado. Quando soube do tema deste ano, sabia que tínhamos de fazer parte. Foi isso que levou-me a pesquisar e a encontrar o casamento”. Apesar de admitirem estar ‘à nora’ com o que podem encontrar no seu próprio casamento medieval, Inês garante que “vai ser espetacular. Um sonho perfeito”.
fotolegenda O Museu Convento dos Lóios conta com uma exposição temporária que recria momentos do filme ‘Pedro e Inês’ do realizador António Ferreira e que estreará em outubro. A película inspirada no romance ‘A Trança de Inês’, de Rosa Lobato Faria, conta com Diogo Amaral, Joana de Verona,Vera Kolodzig, Cristóvão Campos, Custódia Gallego, João Lagarto, entre outros nomes do cinema português. O apoio da Viagem Medieval ao filme foi protocolado entre a Feira Viva, a Federação das Coletividades, a Sociedade de Turismo e a produtora Diálogos Atómicos.
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Especial
Viagem Medieval Vital Santos mostra-se crítico
“É MAIOR A PREOCUPAÇÃO ECONÓMICA DO QUE CULTURAL” São palavras do presidente da Voltado a Poente, a associação integrada na Federação das Coletividades que há menos tempo participa na Viagem Medieval, algo que “não acarreta maior responsabilidade”.Vital Santos afirma que a VaP promove e atua em atividades itinerantes por opção da associação. A Associação Cultural Voltado a Poente (VaP) é a coletividade que há menos tempo participa na Viagem Medieval. Foi em 2014, há quatro edições, que começou a desempenhar um papel ativo naquela que é uma das mais emblemáticas reproduções históricas nacionais. “A VaP foi fundada em 2008 e os objetivos, culturais, integravam, entre outras, duas grandes áreas: o teatro e a preservação do património. Como associados da Federação das Coletividades, começámos a receber informações relativas à Viagem Medieval. Vendo que era um evento de grande relevância económico-cultural, após experiências muito reduzidas em 2012 e 2013, foi, em 2014, decidido aceitar o convite do responsável pela animação âncora para abraçar esta área temática de forma profunda e liderante”, contextualiza o presidente da Associação, Vital Santos. A VaP mantém a preocupação em não desviar-se dos seus objetivos, optando assim pela participação na vertente cul-
ASSOCIAÇÃO CULTURAL VOLTADO A POENTE
tural. “Em 2012 e 2013, a VaP integrou o povoado com um grupo de associados e participou com atores de forma avulsa na animação âncora, mas desde 2014, até à data, tem participado de forma organizada e como grupo liderante no teatro da animação âncora. Propôs uma nova área temática – Estaleiro Naval – que liderou durante um ano e que teve um grande impacto, mas que em breve foi desvirtuada e, de alguma forma, abandonada pela organização. Desde 2015, passou também a participar com um grupo de dança e, desde 2016, colaborou com um grupo de teatro deambulante”. O facto de ser a associação com menos tempo ‘de casa’, não acarreta, segundo Vital Santos, uma maior responsabilidade. “É sempre a mesma. Nas apresentações públicas, temos sempre a consciência que faz sentido fazer o melhor possível, independentemente da quantidade e qualidade de quem temos à nossa frente. Diria que maiores são as dificuldades
porque quem já está no processo há longo tempo não percebe que quem acaba de chegar precisa de esclarecimentos e informações que, para esses, são situações óbvias”. O presidente da VaP considera a Viagem Medieval “o maior evento cultural do Concelho” da Feira e “um dos maiores e de maior qualidade” de Portugal. “No entanto, tem havido um afastamento da genuinidade que deve ter uma recriação histórica. Parece que é maior a preocupação económica do que a cultural. Acho que seria muito mais interessante haver recantos ou espaços onde os visitantes fossem ‘surpreendidos’ por situações do quotidiano da época do que a grande aposta ou investimento nos grandes formatos, na ‘espetacularidade’. Nada contra este tipo de atividades, mas não neste contexto cultural”. A VaP não está situada num local fixo, mas promove e atua em atividades itinerantes. Esta é uma opção da associação. “Não so-
mos tão itinerantes quanto desejamos. Somos demasiado espartilhados”. A vertente económica é vantajosa,“mas apenas positiva porque os associados fazem tudo de forma totalmente gratuita, recebendo uma senha de refeição, retirada da receita da VaP. Inclusive, há atividades que só não dão prejuízo direto à associação porque são cobertas por receitas de outra origem”, explica Vital Santos. Para desempenhar as funções assumidas na Viagem Medieval, o presidente afirma que são precisas mobilizar entre 50 a 80 pessoas. Sobre o futuro da associação, Vital Santos afirma que a VaP “quer continuar a impor-se no panorama cultural regional. A grande aposta vai continuar a ser a sua genuinidade revelada no teatro, na música e na defesa do património, com ênfase especial para o Castro de Romariz. A sua luta vai continuar a pautar-se pela defesa da descentralização da ação cultural. Não aceitamos o esquecimento a que está votado o nordeste concelhio”.
Adriano Costa destaca responsabilidade
“TEMOS DE DAR O EXEMPLO”
O presidente do Rancho Folclórico ‘As Florinhas’ das Caldas de S. Jorge, Adriano Costa, não esconde que o facto de serem uma das duas associações mais antigas a participar na Viagem Medieval acarreta responsabilidade. O Rancho Folclórico ‘As Florinhas’ das Caldas de S. Jorge é uma das duas associações, integradas na Federação das Coletividas, que há mais tempo participam na Viagem Medieval. A primeira vez que apresentaram as suas valências neste evento cultural foi em 2002. Nas 16 edições que participou, o Rancho já experiênciou e dinamizou várias atividades. “Desenvolvemos uma Taberna medieval, participámos no Assalto ao Castelo, estivemos presentes no Auto de Fé e
RANCHO FOLCLÓRICO ‘AS FLORINHAS’ DAS CALDAS DE S. JORGE
nos Jogos Medievais, nos quais ganhámos às equipas participantes. Inclusive, como prémio, fomos jogar a Castro Marim. Vários elementos do grupo já participaram na representação medieval, no Povoado, e também nos diversos Cortejos medievais”, enumera o presidente Adriano Costa. O facto de serem uma das associações mais antigas, o que representa longevidade e estabilidade edição após edição, acarreta uma maior responsabilidade. “Ao sermos
dos primeiros grupos a participarem na Viagem Medieval, temos de dar o exemplo aos novos para que o evento cresça cada vez mais”. Presidente há quatro anos, Adriano Costa destaca a preocupação dos agentes dinamizadores do evento. “A preocupação com o valor histórico é cada vez mais maior para que os visitantes sintam-se na época representada”. O Rancho Folclórico mantém o seu espaço aberto, desde 2002, na Praça Gaspar Moreira “com uma ementa variada e
respeitando a época”. O presidente não esconde que a vertente económica da Viagem Medieval “é uma boa fonte de rendimento para a associação”. Para que toda a logística esteja bem definida e haja o menor número de sobressaltos possível, o Rancho conta com a ajuda de 35 colaboradores. Para o futuro, Adriano Costa, que já desempenhou as funções de presidente entre 2005 e 2007, aponta “dar continuidade aos 59 anos de existência do grupo”.
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Especial
Viagem Medieval Cristina Soares destaca evolução do evento
“TODO O AMBIENTE QUE RODEIA A VIAGEM É RIGOROSO” Há 19 anos que participa na Viagem Medieval. O Rancho Folclórico Recreativo e Cultural ‘As Florinhas’ de Rio Meão é das associações que há mais tempo contribui para a evolução do evento. A presidente há cinco anos, Cristina Soares, destaca o rigor daquela que é das maiores recriações históricas do país. O Rancho Folclórico Recreativo e Cultural ‘As Florinhas’ de Rio Meão participa na Viagem Medieval há 19 anos. A primeira intervenção registou-se em 1999.“Começámos dentro das muralhas do Castelo a convite da Federação das Coletividades da Feira. Os primeiros anos eram feitos por ‘amor à camisola’. Nunca imaginámos que estávamos a começar um grande projeto”, contextualiza a presidente Cristina Soares. Durante quase duas décadas de participações, muitas foram as atividades desenvolvidas. “Durante os primeiros anos participámos em recriações históricas como o Assalto ao Castelo, nos Cortejos, entre outros. Estávamos sempre disponíveis para colaborar. O evento foi crescendo e fomo-nos adaptando. Começámos com um grupo de danças medievais, com cerca de 30 jovens, que tem-se prolongado até os dias atuais e ainda outro de adufeiras. E vamos sempre participando em parceria com outras associações que precisam de
RANCHO FOLCLÓRICO RECREATIVO E CULTURAL ‘AS FLORINHAS’ DE RIO MEÃO
elementos para dança ou figuração. Não interessa se é a associação A ou B que está a fazer a dinamização, interessa participar, aprender, partilhar experiências e manter os meninos ocupados”. A longevidade d’As Florinhas de Rio Meão é algo que permite aos responsáveis do Rancho não cometerem erros. “Não digo que somos um exemplo porque era estar a ser demasiado ambicioso. Não queremos isso, mas é lógico que toda a experiência torna possível o facto de não cometermos tantos erros como as associações que estão a iniciar a sua jornada na Viagem Medieval.Há que ter atenção ao valor histórico e à segurança e higiene alimentar. Temos de ser rigorosos e de querer crescer mais com projetos culturais”. A evolução do evento é algo que não passa despercebida a Cristina Soares.“Sinceramente, nunca imaginei que a Viagem ia crescer tanto como cresceu. Acreditava que era um projeto com pernas para andar, porque era diferente, não havia nada parecido na área
medieval. A organização conseguiu fazer crescer muito o evento e com prestígio. A aposta nas recriações foi um sucesso. Aproveitaram as associações do Concelho da Feira ao envolverem-nas.Todos os fatores ajudaram a Viagem Medieval a crescer. É no rigor que tem-se conseguido manter o sucesso do evento.Todo o ambiente que rodeia a Viagem é rigoroso”. Todos os anos é possívelencontrar a Taberna do Rancho em locais diferentes. “Já percorremos praticamente todos os espaços que existem porque não é o Rancho que escolhe, todas as associações submetem-se a sorteio. Nunca sabemos onde vamos estar”. O fator financeiro é crucial para as contas e bem-vindo para dar seguimento à construção da Sede. “Estaria a mentir ao dizer que não temos algum retorno económico. As contas são públicas,mas não é o dinheiro que move o Rancho para aViagem.É lógico que ajuda e vai ajudar porque temos uma Sede em construção e precisamos. Queremos dar seguimento a
projetos culturais e envolver os jovens e a comunidade. Rio Meão começa a estar cada vez mais envolvido com as suas associações. Isso é imporante”. Presidente há cinco anos,Cristina Soares conta com a colaboração de 35 pessoas em probono na Taberna. Sobre o Rancho Folclórico Recreativo e Cultural ‘As Florinhas’ de Rio Meão,espera uma rápida conclusão das obras na Sede e objetiva continuar a crescer no setor cultural.“Não estamos parados,mas atualmente estamos um pouco limitados em alguns projetos que queríamos desenvolver porque não temos espaço físico.O existente está muito degradado e ainda em remodelação. A ideia é continuar a crescer, apostar nos jovens, dar seguimento às tradições, mas sem esquecer a modernidade. Temos atividades de Dança e Teatro, mas queremos crescer mais a nível Cultural.Não devemos esquecer a parte social até porque fazemos parte do Fórum Social de Rio Meão. No fundo, o objetivo é trabalhar em prol e para a comunidade”, aponta. Pub.
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Viagem Medieval Os melhores dos melhores
DOCES IMPERDÍVEIS DA VIAGEM Queríamos escolher apenas os três melhores mas dada a variedade – e qualidade – foi impossível e, à semelhança do ano passado, apresentámos seis (dos) melhores doces desta Viagem Medieval.
TORTA DE CENOURA
TOUCINHO DO CÉU
BOM BOCADO DE AMÊNDOA
Renascer O toucinho do céu do Renascer já foi eleito no ano passado e volta a figurar na nossa lista em 2018 por uma simples razão… é divinal. Alguns vão torcer o nariz. “Toucinho do céu? Deve ser enjoativo”. Não é. A chila corta o doce. “Chila? Não gosto”. Pois, eu também não, mas a questão é que… apenas a consistência denota a chila, no sabor… nem se sente. Mesmo, podem confiar. A fatia é generosa mas come-se bem, deixa satisfeitos os que comem pouco e com barriga para mais os que, como eu, guardam sempre espaço para mais uma sobremesa. O toucinho do céu encontra-se com facilidade pelas barraquinhas da Viagem Medieval mas como este… não há igual.
Delícias do Castelo Mais um doce comum mas que, feito da forma certa, garante entrada para a lista dos melhores exemplares. O bom bocado de amêndoa nada mais é que um doce com farinha, ovos, manteiga, açúcar, amêndoa e… um ingrediente secreto. A fatia é bem grande, chega e sobra para ficarmos saciados, mas vale a pena pelo sabor diferente, provavelmente devido ao tal ingrediente que lhe dá um toque especial. Ajuda, muito, que a amêndoa seja bastante triturada, ao ponto de não se destacar do bolo, mas fazer parte dele, não constituindo, como em tantos outros, aquele elemento duro e acessório que enfeita o bolo. Nas Delícias, recomendamos ainda a excepcional regueifa doce.
BOLA DE BERLIM
SANTIAGO
PÃO-DE-LÓ DE OVAR
Doces D’El Rei As queijadas são a especialidade desta casa, mas olhando para a montra foi a torta de cenoura que nos despertou a atenção. Um doce menos comum que este ano leva o troféu pelas cinco estrelas em todos os critérios. A massa é húmida, recheada de creme de ovos, e com uma textura tão suave que se desfaz nas mãos e na boca. O sabor denuncia a cenoura e é doce no ponto certo, apesar da fatia generosa, não se torna enjoativo. Há quem procure fitas e pães-de-ló de Ovar, e os fãs fazem muito bem, mas se fosse a vocês espreitava também a torta de cenoura. Satisfação garantida.
Krapfen Conhecemos Aurélia Cavaco pelo salão de chá, Mr. Tea, do qual é detentora em Santa Maria da Feira, e pelos bolos caseiros que tem sempre expostos na montra. Agora, ficamos a conhecer também as suas maravilhosas bolas de Berlim. Diferentes das que se encontram por aí nas pastelarias portuguesas, a massa é tão fofa e doce que nem precisa de recheio, embora haja muitos à escolha. Como uma nuvem que nos é dada para saborear.
Gula dos Anjos Um almendrado de côco. A montra da pastelaria é recheada, olhamos e é difícil escolher, mas de repente vemos um bolo peculiar. “O que é o Santiago?”, pergunto. “É um almendrado de côco”, responde a simpática menina da Gula dos Anjos. É esse mesmo e… em cheio na mouche. O bolo leva farinha de amêndoa, côco, açúcar e claras de ovo, e a combinação da amêndoa com o côco resulta na perfeição. Haja gula para experimentar o resto.
Vários É difícil errar o pão-de-ló de Ovar e por isso não destacamos uma casa específica mas prestamos homenagem a todas as que disponibilizam este clássico doce na Viagem Medieval. Alguns mais queimados, outros mais claros, o importante, para os verdadeiros apreciadores de ovo moles, é que esteja bem cremoso, quase líquido, a escorrer pela colher. Já dizia alguém, não é para os fracos de vesícula, mas é daqueles… imperdíveis.
CERCIFEIRA TEM A MELHOR MONTRA MEDIEVAL De 87 espaços, três levaram o troféu no habitual concurso de montras municipal intitulado ‘Estabelecimento Medieval Oficial’ do Projecto Envolver, que visa envolver o comércio e serviços de Santa Maria da Feira no espírito da Viagem Medieval. Cercifeira, Café Ideal e Sexyline ficaram em primeiro, segundo e terceiro lugar, respectivamente.
CERCIFEIRA
CAFÉ IDEAL
SEXYLINE
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Viagem Medieval O rei da próxima Viagem Medieval
D. FERNANDO I: O SENHOR QUE SE SEGUE Na próxima edição, a Viagem Medieval em Terra de Santa Maria terá como protagonista D. Fernando I “O Formoso”, filho de D. Pedro I e nono rei de Portugal – último da Primeira Dinastia –, que reinou entre 1367 e 1383. Em paralelo com a ordem cronológica da História dos Reis de Portugal, D. Fernando I, cognominado “O Formoso”, mas também de “O Belo” e “O Inconstante”, sucede a D. Pedro I como o protagonista da Viagem Medieval em Terra de Santa Maria 2019. Assim, a próxima edição reproduzirá momentos e costumes dos anos compreendidos entre 1367 e 1383, do Século XIV. D. Fernando I foi o nono rei de Portugal, último da Primeira Dinastia (Afonsina) e o último monarca português da Casa de Borgonha. Era filho de D. Pedro I e da Rainha D. Constança Manuel. Nascido a 31 de outubro de 1345, o reinado de D. Fernando I durou cerca de 16 anos (1367 – 1383), até à sua morte, altura em que ocorreu a Crise de 1383-1385 em Portugal, que vai culminar com a subida ao poder de D. João I, Mestre de Avis (início da Segunda Dinastia). O reinado de D. Fernando I, que terá ascendido ao trono com 22 anos, ficou marcado por vários conflitos, quer pela política externa (tentou várias vezes obter o trono castelhano), quer pelo casamento com D. Leonor Teles Menezes, como também por não ter deixado
descendentes masculinos.
Conflito com Castela
Aquando da subida ao trono de D. Fernando I, a monarquia de Castela estava envolvida em lutas fratricidas, entre D. Pedro, filho legítimo de Afonso X, e Henrique de Trastamara, um dos muitos bastardos do falecido rei com D. Leonor de Gusmão. Após D. Pedro ser assassinado (1369), D. Fernando, como bisneto de D. Sancho IV de Castela (mas mais ainda pela rivalidade comercial e marítima entre Lisboa e Sevilha), abandonou a sua neutralidade e declarou-se herdeiro do trono, envolvendo-se em três conflitos com Castela, saindo, no entanto, sempre derrotado. Foi também durante o reinado de D. Fernando I que se promulgou a Lei das Sesmarias (baseava-se no princípio de expropriação da propriedade caso a terra não estivesse aproveitada) e que nasceu a aliança luso-britânica.
Casamento com D. Leonor de Teles
O casamento entre D. Fernando I e D. Leonor Teles aconteceu no Mosteiro
de Leça de Balio, em 1372, numa cerimónia praticamente em segredo, pois a união desencadeou forte contestação interna, especialmente da nobreza portuguesa. Isto porque infringia um acordo com Castela que implicava o casamento de D. Fernando I com uma das filhas de Henrique II, e porque a nova Rainha já fora casada com João Lourenço da Cunha, algo pouco comum e que não era bem visto na altura. Ignorando as consequências, D. Fernando I, após conseguir a anulação do anterior casamento de D. Leonor Teles, seguiu com um matrimónio que nunca agradou à Nação. Do casamento com D. Leonor Teles nasceram três filhos, dois que morreram de tenra idade, e D. Beatriz, que casou, em 1383, com D. João I, rei de Castela, morrendo naquele reino depois de 1409. Sem descendentes masculinos, a morte de D. Fernando I deu origem a um período de forte instabilidade dinástica. Desencadeando-se o que ficaria conhecido como a Crise de 1383-1385, que viria a culminar com a subida ao poder de D. João I, Mestre de Avis, dando-se início à dinastia de Avis. Pub.
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