CENOGRAFIA E ARQUITETURA: DIÁLOGOS PEDRO BERGI
CENOGRAFIA E ARQUITETURA: DIÁLOGOS
Aluno Pedro Henrique Bergi Reis Orientadora Profª Drª Luciana Tombi Brasil FAU Mackenzie Junho de 2021
RESUMO
Dividida em três atos, esta monografia consiste no estudo das relações entre Cenografia e Arquitetura a partir de um ponto focal. Paisagem, Corpo e Luz são os temas que dão ignição ao diálogo proposto. A cada temática proposta, são realizadas aproximações através da História da Arquitetura, da Arte, da Moda, do Teatro, dos espetáculos e Shows, a fim de revelar caminhos para a realização do Projeto de Arquitetura estruturado a partir da reflexão crítica amparada no campo dos conceitos, e na interlocução com a Teoria. O trabalho busca, através da narrativa proposta, realizar a operação investigativa própria para a invenção livre do Projeto.
ABSTRACT
Divided into three acts, this work consists of the study of the relations between Scenography and Architecture from a focal point. Landscape, Body and Light are the themes that give ignition to the proposed dialogue. To each proposed theme, approximations are carried out through the History of Architecture, Art, Fashion, Theatre and Shows, in order to reveal paths for the realization of the Architecture Project - structured from critical reflection supported in the field of concepts, and in the interlocution with Theory. The work seeks, through the proposed narrative, to carry out the own investigative operation for the free invention of the Project.
para Terezinha
AGRADECIMENTOS
À minha mãe, a quem dedico esta monografia, meu obrigado por sempre me incentivar a ir atrás dos meus desejos, por me dar o poder da escolha, por confiar nas minhas empreitadas pela vida. Obrigado pelo amor infinito. À minha família, que mesmo longe é fonte de afeto. À minha orientadora Luciana Tombi Brasil: obrigado pelo acolhimento, pela confiança, pelo percurso guiado e, principalmente, pela força que me deu para chegar até o fim. Ao meu orientador Lucas Fehr, obrigado pelos ensinamentos de projeto, pelas discussões em sala, pela leveza que conduziu o ano. Aos meus amigos, que mesmo à distância, me ouviram, me deram força e me acolheram nos momentos que precisei. Em especial aos amigos: Marcelo V., que sempre incentivou minhas loucuras e acreditou em mim nos momentos que eu não acreditei; Júnior F., pelos momentos de acolhimento durante o desespero e agonia; Lucas R. e a Lívia M., pelos momentos inesquecíveis nestes anos que passamos estudando juntos; Rachel B., pelo acolhimento e companhia durante este ano; Yuri Q., pelas conversas e vinhos; Marcela D., por ler meu trabalho; Isabella B., por fazer a revisão.
Aos demais colegas da FAU Mackenzie, por terem contribuído com a minha formação, obrigado. Aos professores da FAU Mackenzie, que contribuíram com a minha formação. Em especial a professora Larissa Ferrer Branco, por sempre ter sido atenciosa, e por ter assinado a carta de recomendação para o meu intercâmbio. Aos professores de projeto que tenho profunda admiração: Maria Isabel Villac, Flávio Marcondes e Luiz Backheuser. A São Paulo, cidade que me acolheu seis anos atrás, obrigado pelos amigos que me proporcionou, pelas experiências, pelas descobertas e por contribuir na construção de quem eu sou hoje. A Marcelo F, obrigado por me ajudar a guiar este barco que navega por entre as tempestades. A todos os artistas. Muito obrigado.
“A arte existe porque a vida não basta” Ferreira Gullar
17 Prelúdio 23 Ato I: A terra que se constroi Sobre a construção de paisagem 65 Ato II: De onde se vê Sobre corpo, espaço e níveis de olhar 101 Ato III: Luz que molda o espaço Sobre a luz na construção de espaço e sentido 143 Final 167 Anexo 207 Bibliografia 215 Referências
Prelúdio
O interesse pela cenografia apresentado neste trabalho dá-se anteriormente ao interesse pela arquitetura. Dá-se, especialmente, pelo fascínio pessoal pelos shows de música vistos na televisão, o que deu início a uma coleção de registros audiovisuais, composta por artistas como Caetano Veloso, Maria Bethânia, Marisa Monte, Madonna, Kylie Minogue, Michael Jackson, Britney Spears, para citar alguns. Este interesse também se expandiu para o campo da moda, com o encantamento pelos desfiles. O ponto de partida para o trabalho foi o estudo da História da Cenografia. Apesar de o nome derivar do grego skenographie, onde skené é cena, e graphie é desenho. A cenografia nasce, segundo Del Nero (2008), antes dos gregos. Ela é a luz que entra na oca durante o ritual religioso, que toca fumaça do fumo, que banha o traje do ritual. Os meios e serviços teatrais são anteriores ao teatro ocidental. Muitas vezes, não compreendemos como é possível chamar de “cenografia’ um trabalho realizado com os meios cenográficos para dramatizar um evento, uma vitrine. Entretanto, temos que nos lembrar que a cenografia servia a propósitos que não eram os teatrais milhares de anos antes do teatro. Servia aos curandeiros, aos xamãs, nos confins da Sibéria. E os propósitos apenas não eram os de dar environment a um texto, mas a uma situação (DEL NERO, 2008 p. 12). 19
Nesta busca pela História da Cenografia, toma-se a consciência que o assunto já foi amplamente discutido em livros e trabalhos acadêmicos, e que não seria interessante realizar uma cronologia sobre a cenografia. A extensa bibliografia de fácil acesso inclui “Cenografia”, de Anne Mantovani (1989), “História mundial do teatro”, de Margot Berthold (2014), “Cenografia: uma breve visita”, de Cyro Del Nero (2008), e a dissertação “A linguagem cenográfica”, de Nelson José Urssi (2006). Esta monografia se organiza com objetivo de criar debates entre Cenografia e Arquitetura. Portanto, a construção de uma linha cronológica não é o compromisso dela, mas as entradas históricas ocorrerão como instrumento localizador e direcionador, a fim de estabelecer as relações necessárias entre as duas temáticas. Para gerar o diálogo proposto, uma estratégia foi escolhida: delimitar três pontos - neste trabalho livremente chamados de “Atos” - com a apresentação de um exemplar de Arquitetura, e um de Cenografia, capazes de estabelecer a interlocução pretendida. O primeiro ato, A terra que se constrói, pretende discorrer sobre a construção da paisagem em duas obras: o espaço cenográfico criado para o desfile da Dior Primavera/Verão 2016, e do Pavilhão de Osaka, do arquiteto Paulo Mendes da Rocha. Uma questão inicial é posta: “o que é paisagem?”. A partir disso, busca-se na Geografia, na Arte e na Arquitetura um direcionamento para entender o que seria paisagem. De onde se vê é o segundo ato do texto. Nele, a análise será feita a partir do ponto de vista do corpo, a partir do aprofundamento na construção dos níveis de olhar, e do espaço a partir dele. Para tanto, serão analisados o Teatro Oficina e o desfile de alta costura da Dior de 2015 primavera/verão. Uma investigação sobre o corpo no lugar teatral, na arquitetura e na arte guia este debate. O terceiro e último ato, de título Luz que molda o espaço, tem como ponto de partida a luz. O estudo inicia traçando o uso da luz na Arquitetura, no Teatro e na Cenografia de shows, para, por fim, debater sobre a cenografia do show do cantor norte-americano Kanye West, e do projeto Louvre Abu Dhabi, do arquiteto Jean Nouvel. 20
Por fim, e como objetivo desta construção teórica, são apresentadas as interlocuções entre os campos propostos com o resultado obtido através do Projeto de Arquitetura desenvolvido: a Fábrica de Possibilidades Cenográficas. As peças gráficas finalizadas decorrem deste processo, e de um percurso investigativo, do qual se verifica o raciocínio feito para a realização do trabalho a seguir apresentado.
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Ato I:A terra que se constroi
PAISAGEM
Ao indagar-se “o que é paisagem?” inúmeras respostas podem surgir, sendo elas relacionadas à Geografia – referente ao conjunto de elementos da natureza como rios, mares, montanhas, florestas, mas também aos espaços construídos e habitados pelo homem. Outra resposta para essa pergunta estaria na Arte, podendo ser relativa a uma pintura, uma fotografia (imagem 1), um vídeo, ou literatura. É possível também que a resposta para “o que é paisagem?” consiga compreender todas as opções anteriormente citadas. Há quem diga que paisagem é “Um lugar com sensação de tranquilidade, com presença da natureza”, ou “É quando se tem noção do horizonte”, ou “É um conjunto de imagens”. Ao buscar a definição dada pelo dicionário, encontra-se: 1 Extensão de território e de seus elementos que se alcança num lance de olhar; panorama, vista. 2 Espaço com geografia e clima de determinado tipo: rural, urbana, montanhosa etc. 3 Desenho, quadro, gravura, foto ou qualquer outra manifestação artística cujo tema principal é a representação de uma paisagem, geralmente de lugares campestres (MICHAELIS ONLINE, 2021).
Tende-se a separar a noção de paisagem nos campos disciplinares da Geografia, da Arte e da Imagem. Mas é fato, como inicialmente citado, que a definição não se apresenta de forma única, precisa, certeira. 25
Abre-se uma gama de possibilidades de uso da palavra Paisagem em diversas áreas, reforçando uma pluralidade de abrangência. A geografia nos é familiar, fez parte da nossa educação básica, é parte dos estudos da arquitetura e urbanismo, e do cotidiano. A definição do dicionário reforça o nosso entendimento de paisagem a partir do olhar, do conjunto de elementos naturais, mas também para a “extensão de território e seus elementos que se alcança num lance de olhar” (MICHAELIS ONLINE). Estes elementos, para a geografia, vão além dos naturais, são os elementos artificiais – edifícios, ruas, praças etc. Este entendimento de paisagem como a abordagem desses conjuntos de elementos já foi muito aplicado, mas atualmente abre-se lugar para a [...] Geografia Cultural, na qual a paisagem deixa de ser considerada a representação de uma extensão territorial para ser entendida como a imagem matriz de possíveis incursões, migrações e deslocamentos que podem ser efetuados pelo homem (SANTOS, 2007).
Vladimir Bartalini nos diz, em seu ensaio A Paisagem em Arquitetura e Urbanismo: Retomar às ‘nascentes’ como opção metodológica, publicado em 2013, que “A trajetória do pensamento geográfico registra inflexões importantes nesta tradição baseada no contato direto com a paisagem sob o comando da visão”. Há a linha da geografia pragmática onde “(...) o empirismo da observação visual é substituído pelo das estatísticas, dos modelos, dos sistemas”, e que também abre espaço para “(...) valorização subjetiva do território, a consciência do espaço vivenciado, o comportamento em relação ao meio (...)” (MORAES, 1982, p. 100-106 apud BARTALINI, 2013, p. 77). Esta vertente tem Milton Santos como defensor: A paisagem nada tem de fixo, de imóvel. Cada vez que a sociedade passa por um processo de mudança, a economia, as relações sociais e políticas também mudam, em ritmos e intensidades variados. A mesma coisa acontece em relação ao espaço e à paisagem que se transforma para adaptar às novas necessidades da sociedade.(SANTOS, 1997, p. 37 apud SERPA, 2010, p. 133).
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Outra vertente apresentada por Bartalini é a geografia
Imagem 1: German Lorca, Vila operária de Quatá - Lauro Miller, SC, 1970. Fotografia. MASP (Museu de Arte de São Paulo) São Paulo - SP.
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fenomenológica, a qual a diferenciação de espaço e paisagem não faz sentido, ela, a paisagem, é “(...) introjetada no sistema de valores humanos, definindo relacionamentos complexos entre atitudes e percepção sobre o meio” (RIBEIRO, 2007, p. 24 Apud. BARTALINI, 2013, p.78). Dentre os nomes que figuram esta linha está Jean-Marc Besse, que diz: “A paisagem é da ordem do sentir, ela é participação e prolongamento de uma atmosfera (...)” (BESSE, 2000, Apud. BARTALINI, 2017, 47). Se pensarmos no que Besse pondera, ou seja, que a paisagem é da ordem do sentir, pode-se criar uma relação com a Arte. Essa que mexe diferente com cada espectador, essa que não age de forma única sobre o indivíduo. O sentir não está apenas no espectador, mas também, e sobretudo, no autor, já que é a partir de sua experiência com a paisagem que ele executa sua obra. Isso caracteriza uma experiência estética, visto que a palavra estética origina do grego aisthesis e significa sentir, apreensão pelos sentidos, percepção. Nas pinturas do século XVII, quando a paisagem se firma como especialização artística, o que se buscava era uma cópia aproximada do que se via, já que não havia outro meio de registrar o que era vivenciado. Os artistas flamengos tiveram um maior destaque neste gênero de pintura, como Jacob Van Ruisdael em Paisagem com ruínas de um castelo e uma igreja (Imagem 2), de 1665. É visível que o objeto central é a paisagem holandesa, caracterizada com moinho, igreja, parte alagada, campo, pastores e a linha do horizonte. Com o advento da tinta em bisnaga, a pintura de paisagem se projeta, possibilitando a experiência com o espaço de forma ampliada, já que se podia pintar in loco. William Turner (Imagem 3), em suas paisagens, transcende a ideia de registro do espaço. Suas pinturas além da explosão da luz, apresentam uma nova forma de representação, como a definida por Argan (2010): [...] as imagens, em vez de aproximadas e definidas por ela, são afastadas e dissolvidas; subtraídas à experiencia; confundida numa vibração rítmica ilimitada; mas, ao mesmo tempo, despidas de toda analogia naturalista, propostas como puras imagens ou 28
Imagem 2: Jacob Van Ruisdael “Paisagem com ruínas de um castelo e uma igreja”, 1665. National Gallery, Londres, Reino Unido.
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até apenas como possibilidade de imagem, como luz (ARGAN, 2010, p. 119).
Quando Argan (1992, p.17-18) discorre sobre o belo, ele argumenta que reconhecer algo como belo é um juízo: “(...) a coisa não é bela em si, mas no juízo que a define como tal”. O autor, ao falar do “belo pitoresco” e o “belo sublime”, revela que são duas formas de juízo “(...) que dependem de duas posturas diversas do homem frente à realidade (...)”. Argan nos apresenta duas formas de ver a natureza pela arte, concomitante ao ver a paisagem. Para o pitoresco, como apontado por Argan, a natureza é uma fonte de estímulos, mas não é fonte única de sentimento. O pitoresco se expressava na jardinagem, um “(...) educar a natureza sem destruir a espontaneidade(...)” (ARGAN, 1992, p. 19). Reflete na pintura de paisagem, então, manchas mais claras e escuras, cores quentes e luminosas, um enfrentamento entre o homem, em sua pequenez, e a natureza, em sua imensidão. Turner é um dos pintores que representa o “pitoresco”, além dos paisagistas R. Wilson e J. Constable. Ao lado do “pitoresco” está o “sublime”, que teve W. Blake e J. H. Fussli como difusores. O modo sublime se definia como: [...] visionário, angustiado: cores às vezes foscas, às vezes pálidas; desenhos de traços fortemente marcados; gestos excessivos, bocas gritantes, olhos arregalados, mas a figura sempre fechada num invisível esquema geométrico que aprisiona e anula seus esforços (ARGAN, 1992, p. 19).
Segundo Argan (1992, p. 20), fica explícito, na contradição dialética de “pitoresco” e “sublime”, o problema da época “(...) a dificuldade da relação entre indivíduo e coletividade.” O “pitoresco” vê integração entre indivíduo e ambiente natural, já o “sublime” vê o resultado do isolamento do indivíduo, a angústia e o medo da solidão. Quando já não se tem o interesse em ser fidedigno, visto que a fotografia já havia tomado este local, a pintura se expressa a partir das impressões e, posteriormente, sensações do artista. Como dito por 30
Imagem 3: Joseph Mallord William Turner, “Sun Rising through Vapor”, 1807. National Gallery, Londres, Reino Unido.
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Argan (1992, p. 75), “(...) é difícil dizer de quem partia o maior interesse, se era dos fotógrafos pelos pintores ou dos pintores pela fotografia”. Surge aí a “(...) necessidade de redefinir sua essência e finalidade frente ao novo instrumento de apreensão mecânica da realidade” (ARGAN, 1992, p. 75). O movimento Impressionista, que surgiu em Paris entre 1860 e 1870, rompe com o passado para abrir caminho para a pesquisa da arte moderna. Gustave Courbet já havia anunciado, em 1847, seu programa que visava “(...) realismo integral, abordagem direta da realidade, independente de qualquer poética previamente constituída” (ARGAN, 1992, p. 75). Há uma tomada de consciência de que existe uma importância na história dos grandes mestres do passado, mas é necessária uma ruptura com o “clássico” e o “romântico”, sendo incontornável o enfrentamento da realidade sem eles, e também [...] libertar a sensação visual de qualquer experiência ou noção adquirida e de qualquer postura previamente ordenada que pudesse prejudicar a sua imediaticidade, e a operação pictórica de qualquer regra ou costume técnico que pudesse comprometer sua representação através das cores (ARGAN, 1992, p. 75).
Os contornos são suprimidos, o chiaroscuro não é utilizado, há uma sucessão de pinceladas justapostas de cores vivas que dão uma vibração à pintura, não havia um cânone preciso, não havia concordância ideológica e política, mas havia pontos que eram consonantes, como dito por Argan. Há uma repulsa à Arte Acadêmica, uma escolha pelo realista, um interesse pela paisagem e natureza-morta, rechaçando o objeto, entre outros pontos. Dentre os nomes do Impressionismo, circulam Claude Monet, Paul Cézanne, Pierre-Auguste Renoir e Edgar Degas. A partir de 1880, os Impressionistas começam a sentir a necessidade de ir além, e começam a “investigar a estrutura da sensação”, como disse Argan (1992). 32
Cézanne e Van Gogh são alguns dos artistas que compõem o
Imagem 4: Vicent Van Gogh, “Campo de trigo com corvos”, 1890. Van Gogh Museum, Amsterdã, Holanda.
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grupo dos pós-impressionistas, enquanto que o primeiro se encontra nas raízes do Cubismo, e o segundo se apresenta na raiz do Expressionismo. Em Campo de trigo com corvos (Imagem 4), Vincent Van Gogh nos apresenta uma paisagem a partir de sua compreensão. Argan diz que Van Gogh é: [...] a pura e simples percepção da realidade e sua existência aqui e agora: apenas tomando consciência e forçando o limite é que se chegará a rompê-lo. O que Van Gogh quer é uma pintura verdadeira até o absurdo, viva até o paroxismo, até o delírio e a morte (ARGAN, 1992, p. 125).
O subconsciente humano também virou tema de paisagem graças aos surrealistas, que em 1924 lançavam o seu manifesto. Em 1928, na Le Surréalisme et la peinture, Breton publica a estética do movimento. O inconsciente é tido como a dimensão da arte, Argan nos diz: [...]Se a consciência é a região do distinto, o inconsciente é a região do indistinto: onde o ser humano não objetiva a realidade, mas constitui uma unidade com ela. A arte, pois, não é representação, e sim comunicação vital, biopsíquica, do indivíduo por meio dos símbolos (ARGAN, 1992, p. 360).
A paisagem Surrealista aparece como imagens misteriosas que aludem a sonhos, fantasias, mitos. O que se vê em A persistência da memória (Imagem 5), de Salvador Dalí, é explicado no site do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, o MoMA¹: At times lacking recognizable geological elements such as mountains, hills, or vistas, these works confound traditional expectations of the landscape genre, and propose that the interior world of the psyche is as complex and ripe for exploration as the world beyond our bodies (MoMA online)².
¹MoMA: Museum of Modern Art, é o museu de arte moderna de Nova Iorque. ²Tradução livre: “Às vezes, carecendo de elementos geológicos reconhecíveis, como montanhas, colinas ou vistas, essas obras confundem as expectativas tradicionais do gênero da paisagem e propõem que o mundo interior da psique é tão complexo e maduro para exploração quanto o mundo além de nossos corpos” 34
Imagem 5: Salvador Dali, “A persistência da memória”, 1931
Imagem 6: Yves Tanguy, “O sol em sua arca”, 1936, Veneza, Itália.
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Outro surrealista que cria paisagens psíquicas é o Yves Tanguy (Imagem 6). Argan (1992, p. 364) diz que Tanguy “(...) cria a antinatureza: paisagens sem fim, planetárias, sem luz nem ar, onde as únicas presenças ‘eloquentes’ são os restos de uma vida orgânica extinta há tempos imemoráveis”. O Expressionismo Abstrato, primeiro movimento pictórico norte-americano a ganhar reconhecimento internacional, se desenvolve no pós da Segunda Guerra Mundial, apresenta uma crítica à sociedade americana, ao capitalismo, articulando uma recusa às técnicas tradicionais. Willem De Kooning nos apresenta diversas pinturas de paisagens, como Duas figuras numa paisagem (Imagem 7). Barbara Hess em seu livro sobre De Kooning diz: O conceito de “paisagem” tomava uma interpretação muito pessoal nas mãos de Kooning, sendo apenas muito indiretamente relacionado com aquilo que se apresenta ao olhar no mundo exterior. Aquilo que ele tentava fazer era captar na tela percepções e sensações, impressões de cor e atmosfera. Ao contrário dos famosos pintores de paisagem do século 19, como Monet ou Constable, ele não trabalhava no exterior mas sim no atelier (HESS, 2009, p. 51).
O que fica claro é que a paisagem não se limita ao concreto, ao que é palpável como natureza – rios, mares, montanhas etc.; ela também se dá no abstrato, no sentimento. Para ilustrar isso há um trecho de Ritter em que ele se refere a Humboldt: Para pintar a natureza em toda sua grandeza não se deverá então ficar simplesmente nos fenômenos exteriores; será preciso também representar a natureza tal como ela se reflete na interioridade dos homens (HUMBOLDT, 1845-1862 Apud RITTER, 1997, p. 65).
Win Wenders, em uma das primeiras linhas de seu texto A paisagem Urbana, diz que ele “(...) fixou sua câmera diante de numerosas paisagens, especialmente diante de paisagens urbanas, mas também campos, perto de fronteiras, sob cruzamento de autopista ou no deserto”. Aqui o autor 36
Imagem 7: Willem De Kooning, “Duas figuras numa paisagem”, 1967. Stedelijk Museum, Amsterdã, Holanda.
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delimita que as imagens geradas a partir de sua câmera eram capturas de paisagens, e que estas, no ponto de vista dele, não abarcam somente elementos naturais, mas também edifícios, ruas, etc. Em seu texto, Wenders diz ainda que a imagem acompanha a mudança das cidades, concomitantemente, da paisagem. A imagem da paisagem de uma cidade já foi registrada por pintura, passou pela fotografia (que permitiu uma reprodutibilidade da imagem), e em seguida veio o cinema que “animou” este desenvolvimento. Mais tarde, a televisão virtualizou o acesso à imagem, permitindo ver a paisagem em tempo real. Não que isso afirme que a paisagem é uma imagem de um enquadramento de uma visual. No entendimento de Wenders, a imagem é um enquadramento de uma percepção de paisagem do outro. Pode-se entender isso no seguinte fragmento: Fiquei espantado ao saber que cada formação da paisagem encarna para eles um personagem do seu passado mítico. Cada rocha traz em si uma ‘história’ que remonta a ‘época dos sonhos’ dos aborígines (WENDERS, 1991).
Ou seja, para o aborígine, ver a imagem da paisagem o remete a algo que não remete o autor, e possivelmente não comunica com outras pessoas que não são nativas do espaço. É interessante pensar, então, que a paisagem carrega uma história, que é assimilada pelo expectador da paisagem, e isso conversa com a seguinte fala de Vania Bartaneli: Como testemunho da passagem humana na Terra, a paisagem é plástica, maleável e entremeada pelos projetos de sentido que se dão ao longo do tempo, em conformidade com as possibilidades abertas em cada tempo. Paisagem é, portanto, História, e isso nos concerne em primeira instância, pois é produção humana em qualquer dimensão que se apresente (BARTALINI, 2017, p. 48).
Fica evidente que não há uma definição uníssona do que seja paisagem. O que se tem é uma certeza que ela é um produto, como supracitado, do ser humano, podendo ser um conjunto de imagens, um agrupamento de elementos, ou um plano literário onde “(...) as incursões do leitor sobre a superfície textual se fazem como espécie de 38
reconhecimento da topografia narrativa (...)” (SANTOS, 2007, p. 40). A paisagem é, portanto, o resultado da forma de sentir o espaço pelo indivíduo. Por isso, não se pode limitar a forma de sentir a paisagem no visual – os cegos, por exemplo, também têm essa experiência a partir dos outros sentidos. Por meio do tato, da brisa no corpo, do perfume das flores ou do cheiro da maresia. O enquadro de uma paisagem depende individualmente das sensações geradas pelo espaço para com o indivíduo. A natureza é um espaço que existe antes do homem, que se define sozinho. Os termos utilizados para nomear, e/ou “personificar” os recursos naturais, vêm do homem. Antes da existência humana, não havia rio, mar, terra, montanha, vegetação. Existiam estes recursos aos quais utilizamos os nomes. Se suprimirmos os nomes, os recursos continuam existindo; mas se suprimirmos os homens, a paisagem deixa de existir, pois como já dito e visto, a partir de diversas formas de entender a paisagem, é que sem o homem não há paisagem. A interação humana é que cria a paisagem, seja ela natural, seja ela construída – como as cidades; seja ela psíquica – com as pinturas surrealistas, como os sonhos. A paisagem não é, e não precisa ser a mesma para todos, ela é individual, ela é experiência. Pontos em comum podem existir, mas dissonâncias sempre ocorrerão. A paisagem só existe através de nós e para nós.
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SOBRE DESFILES E CENÁRIOS
Foi-se a época em que as maisons haute couture³ apresentavam suas coleções em seus ateliers em Paris. Christian Dior, Chanel, Yves Saint Laurent gozavam de edifícios bem localizados em Paris onde recebiam suas clientes exclusivas, e também os jornalistas. Para a população que não podia pagar pelos modelos, restavam as revistas de moda para acessar a coleção da temporada. A Dior ocupa, até hoje, o número 30 da Avenue Montaigne. Lá ele tinha sua loja, em um andar superior o seu salão para receber as clientes, e nos pavimentos mais altos os ateliers. É claro que na nos anos de 1947, quando ele inaugurou sua “casa”, o conceito de ready-to-wear – pronto para uso, em tradução livre do inglês – ainda não era explorado pelas grandes casas de costura, apesar do conceito existir nos Estados Unidos da América.
³Maisons haute couture: ou casas de alta costura, são denominados aqueles ateliers que fazem parte da federação de alta costura e moda (Fédération de la Haute Couture et de la Mode), podendo ser membros permanentes ou convidados. Para fazer parte, a Casa deve ter seus ateliers em Paris, deve realizar dois desfiles sazonais todo ano e suas peças são feitas a mão e sob medida. 40
Imagem 8: Yves Saint Laurent, 1966, Museu YSL Paris, Paris, França
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O ready-to-wear, ou prêt-à-porter para os franceses, é a roupa feita em grande escala, com medidas padronizadas e que podem ser vendidas em lojas sem a necessidade de se encomendar. As roupas “prontas para uso” já eram febre nos Estados Unidos da América. Apesar disso, naquele tempo ainda, quem ditava as tendências e o consumo do vestuário eram os ateliers. As roupas eram feitas sob medida, divididas por temporada, outono-inverno, e primavera-verão. Apesar de ter sido Pierre Cardin o primeiro grande nome da moda francesa a colaborar com uma loja de prêt-à-porter, foi Yves Saint Laurent (Imagem 8), junto de seu companheiro de vida e sócio Pierre Bergé, que trouxe o conceito de pronto para uso para o mundo do luxo. Saint Laurent propôs ainda uma mudança de “lado” em Paris, abrindo sua loja na Rive Gauche, na parte sul de Paris. As demais casas de costura se localizavam no lado norte do Rio Sena, na região entre a Place Vendôme, a Champs-Élysées e a Avenue Montaigne. Com a absorção do conceito ready-to-wear pelas grandes casas de costura, o número de desfiles aumentou, ganhou mais temporadas e se expandiu pelo mundo. Hoje, juntamente com Paris, as semanas de moda de Milão, Londres e Nova Iorque são consideradas como referências. Atualmente, as semanas de moda se organizam em duas coleções femininas anuais – outono-inverno e primavera-verão; duas semanas no mesmo esquema, só que masculina, a coleção pre-fall – que é uma meia estação pré-outono; e a resort, ou outra denominação dependendo da marca, que é uma coleção de meia estação. Nem todas as marcas respeitam esta lógica. A italiana Versace desfila sua coleção masculina junto com a feminina, por exemplo. A Dior tem duas coleções anuais femininas, duas masculinas, a resort feminina e a pre-fall masculina, sem contar com as duas coleções de alta-costura. Até o fim dos anos 1990, os desfiles aconteciam com um cenário “simples”(Imagem 9), composto por uma passarela linear (ou uma passarela de formas simples), um logo da marca, e espectadores sentados de forma frontal. A partir dos anos 2000, com o advento da 42
Imagem 9: Prada RTW Primavera Verão 1996, WEB
Imagem 10: Chanel RTW Outono Inverno 2017/2018, WEB
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internet e das transmissões on-line, os desfiles começaram a ter cenários mais elaborados, e também a ter um local fixo. A Chanel, por exemplo, começou a usar o Grand Palais em Paris para apresentar as suas coleções, onde já recriou o lançamento de um foguete (Imagem 10), as geleiras da era glacial (Imagem 11), e até uma praia. Já a Dior, e outras marcas do conglomerado de luxo LVMH4, começaram a usar edifícios e espaços ligados à arte, como o museu Rodin e o Louvre. A Saint Laurent costuma usar o Jardim do Trocadero para erguer os seus cenários. Neste período pandêmico, as marcas se adaptaram aos desfiles on-line, pré-gravados, mas não abriram mão das estruturas. A Dior utilizou a sala dos espelhos do Palácio de Versalhes com intervenção da artista Silvia Giambrone5, já a Prada manteve sua parceria com o AMO – estúdio de Design do OMA – para o seu desfile de “possibilidades de sensações” (Imagem 12). Os desfiles de moda luxo, hoje, não são apenas sobre apresentar peças de roupas para os consumidores. Eles são a ignição de marketing da coleção, uma forma de criar mídia para as marcas. Cada vez mais as grandes marcas de moda e luxo investem em desfiles grandiosos para poder atrair mídia e dialogar não só com seus compradores, mas criar desejo em quem vê.
LVMH: Maior conglomerado de luxo do mundo, que envolve diversas marcas de diversos nichos: roupas, couro, bebidas, jóias, perfume etc. O nome deriva das iniciais das principais marcas da empresa a Moët (Champanhe), Hennessy (conhaque) e Louis Vuitton (Malas, acessórios de couro, roupas, jóias, perfume). 4
Silvia Giambrone: Artista italiana nascida na Sicília e formada na Academia de Belas Artes de Roma. Representada por galerias como Richard Saltoun Gallery em Londres, Stefania Miscetti Studio em Roma e Galleria Marcolini em Forli. 5
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Imagem 11: Chanel RTW Outono Inverno 2010/2011, WEB
Imagem 12: Prada Masculino RTW Outono Inverno 2021/2022, WEB
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DIOR
Nascido em 21 de janeiro de 1905 em Grandville, França, Christian Dior veio a ser o nome mais significativo da costura francesa no pós Segunda Grande Guerra. Após anos de recessão, escassez e roupas mais “enxutas”, menos tecido, Dior surge na cena francesa com o seu revolucionário New Look (Imagem 13). O termo usado por Carmel Snow, redatora-chefe da Harper’s Bazaar, definia o novo visual que o estilista propôs para as mulheres. Saias amplas, cintura marcada, bustos em evidência, romantismo e metros de tecido. Sobre esse período, Dior disse em sua autobiografia: “Eu desenhava ‘mulheres-flores’, com ombros delicados, bustos salientes, cinturas finas como caules e saias enormes como corolas”. Christian Dior era apaixonado pelas flores e sua paixão vinha de berço: herdou de sua mãe. Ele amava viver entre as plantas no jardim de sua casa de infância em Grandville. Suas coleções refletem o seu amor pelas flores, na escolha dos bordados, nos desenhos das silhuetas. Ao assumir o cargo de diretor criativo de 2012 até 2015, o estilista belga Raf Simons disse que sempre foi visto como um estilista minimalista, mas que iria provar que sabia ir além. Como apresentado no documentário Dior e Eu, Raf não era um candidato para assumir a marca após a abrupta saída de John Galliano. Raf era o oposto de Galliano, que 46
Imagem 13: Cristian Dior, Tailleur Bar, 1947 WEB
Imagem 14: Cristian Dior, Haute Couture, Outono Inverno 2012/2013, WEB
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sempre criou uma Dior extravagante, um pouco rebelde – possivelmente advinda da sua formação da Central Saint Martins de Londres. Em seu primeiro desfile pela Dior – Alta Costura inverno 2013 –, Raf Simons presenteia o público com um percurso entre as silhuetas Dior, o New look representado pelo Tailleur Bar, e referências florais que tanto inspiravam o monsieur Dior. Além disso, Raf insere camadas de referências artísticas aos modelos, como a utilização de telas do artista Sterling Ruby para a criação de vestidos (Imagem 14). A arte é um fator determinante na criação do estilista belga. Ao idealizar o espaço onde seria o desfile juntamente com o Bureau Betak6, Raf propõe cobrir as paredes da casa com flores (Imagem 15), não só por ser algo que remete à Dior, mas por ser um ponto importante da coleção. Para ele, a casa coberta de flores seria o negativo, o inverso do cachorro de flores do artista Jeff Koons, seria a imersão do espectador na arte. Para o desfile da coleção primavera-verão 2016 prêt-à-porter da Dior, Raf escolheu mais uma vez o Bureau Betak para a produção e execução do cenário do desfile. O local escolhido foi o Louvre, especificamente a praça quadrada. A coleção, segundo Raf, era uma imersão na paisagem do sul da França, com cores que remetem aos campos de lavanda e o céu ensolarado, mas com toques da cidade grande. Os recortes, a roupa funcional e a fusão de técnicas de costura remetem a esta cidade. Como o próprio estilista disse em uma entrevista, após o desfile, a coleção é “Suave futurista, um suave impactante”.
Bureau Bbetak: Fundado em Paris no ano de 1990 por Alexandre de Betak, o escritório Bureau Betak é hoje um dos maiores nomes na categoria de cenografia para moda. Com escritórios em Paris, Nova Iorque e Singapura, realizou mais de novecentos projetos como desfiles, espetáculos e exposições. Com foco no mercado de luxo, os projetos visam transmitir emoções, criar uma memória afetiva com o público e fomentar trocas artísticas entre o design e o espectador. 6
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Imagem 15: Cristian Dior, Haute Couture, Outono Inverno 2012/2013, WEB
Imagem 16: Jeff Koons Puppy, 1992,Guggenheim Bilbao WEB
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Frente a estas informações, a resposta do Bureau Betak para a cenografia foi a inserção de um campo de lavandas no Louvre (Imagem 17). Exteriormente era possível ver uma elevação de lavandas que remete a fonte de inspiração da coleção, os campos do sul da França, face à cidade grande, inserida no meio de Paris, nas proximidades de avenidas e fluxo constante de pessoas. Um pequeno recorte no centro da colina com um letreiro “DIOR” direciona o espectador para adentrar o cenário. Do lado de dentro há uma nova surpresa: um local extremamente branco, com linhas retas, totalmente o oposto a fachada da cenografia (Imagem 18). A posição dos bancos retilíneos remete a cidade projetada com suas ruas, os canhões de luz reforçam a artificialidade do espaço “suave futurista”. Ao fundo do interior deste paralelepípedo branco se vê novamente um anúncio de colina de lavanda, com um outro recorte de onde saem as modelos. Durante quinze minutos esta é a paisagem que a Dior imerge o espectador para apresentar sua coleção.
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Imagem 17: Cristian Dior, RTW Primavera Verão 2016, WEB
Imagem 18: Cristian Dior, RTW Primavera Verão 2016, WEB
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O PAVILHÃO DE OSAKA
No ano de 1969, os arquitetos Paulo Mendes da Rocha, Jorge Caron, Julio Katinsky e Ruy Ohtake venceram o concurso para o pavilhão da Expo’70. Fazia doze anos que o Brasil não participava de uma exposição universal. Até o ano de 1969 não havia interesse militar em promover esta troca com as outras nações. O Ministério das Relações Exteriores solicita ao presidente do IAB, Eduardo Kneese de Mello, um nome para desenvolver o pavilhão. Vendo um conflito ético nesta posição o presidente do IAB propõe que seja feito um concurso nacional. Vinte e cinco dias foram dados para os interessados enviarem suas propostas. De forma unânime, o grupo supracitado ganha o concurso. Ruth Verde Zein e Izabel Amaral, em seu artigo A feira mundial de Osaka de 1970: o pavilhão brasileiro, define que o júri “(...) reconheceu no projeto uma poética inconfundível, muito ligada às tradições brasileiras”, concretizada por uma “abordagem nitidamente brasileira”, baseada na “liberação do terreno” e resultando em um “espaço rico em formas e conteúdos” (ZEIN; AMARAL, 2010, p. 109). O terreno brasileiro tinha 50 metros de frente por 82,5 metros de profundidade, o pavilhão que media exatamente a largura do terreno, 50 52
Imagem 19: Pavilhão do Brasil Expo Osaka, planta terreo, WEB
Imagem 20: Pavilhão do Brasil Expo Osaka, planta corte, WEB
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metros, tinha 32,5 de profundidade. Ele foi posto a 20 metros de distância da rua de acesso, deixando um espaço de fundo de 30 metros. Sendo assim, a soma dos dois recuos dão a largura do terreno e concomitantemente do pavilhão, 50 metros (Imagem 19 e 20). A cobertura fica apoiada em quatro pilares, sendo três deles “camuflados” no relevo artificial criado (Imagem 21). As áreas de estar estão semienterradas, sendo uma deslocada do eixo da cobertura, e outra nos fundos do terreno – ambas são acessadas por rampas. Paulo Mendes da Rocha, em uma entrevista para Andrea Macadar, define o pavilhão da seguinte forma: (...) o que aquele pavilhão queria exprimir, antes de mais nada, era a consciência da ocupação dos estados naturais da América com as construções. Então, simbolicamente, era um teto ideal, que teria um teto de cristal da nossa FAU, colocado sobre a própria paisagem, que seria a paisagem simulada naquelas colinas, com um número mínimo de pilares, ou seja, uma especialidade técnica de construção que pretendia revelar nítido conhecimento técnico para fazer o que quisesse. Portanto duas boas vigas para aquele vão e cada viga apoiada em dois pilares com a sucessão mais normal, mais tranqüila de esforços: balanço – vão central e balanço lateral, porém não em quatro vezes. Um dos apoios se transforma na cidade de modo simbólico. Aqueles dois arcos cruzados são a cidade. E chamamos “largo do café” para dizer uma cidade brasileira, do ponto de vista simbólico.
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Imagem 21: Pavilhão do Brasil Expo Osaka, 1970, WEB
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DIÁLOGO
O arquiteto-paisagista português João Nunes, em sua entrevista para o Inquérito Portugal, diz que: “(...) é preciso ter a noção de que o local muda, e que a dinâmica é uma constante inerente à própria ideia de paisagem. Porque não há sítios estáveis, nenhuma realidade que seja fixa” (NUNES, 2017). Esta ideia de não-estabilidade da paisagem, da sua constante mudança devido a interferências no espaço é vista a prova nos dois projetos apresentados. O primeiro projeto, referente à cenografia, se insere em uma paisagem conhecida, mesmo que por fotografia: o Louvre. Esta Paisagem já estava “posta”, já existia por se tratar de um espaço de um monumento que foi inserido centenas de anos antes. A inserção do Palácio Real Francês, atual Museu do Louvre, também foi uma transformação, uma mudança na dinâmica do espaço que antes existia. Por isso, mesmo que temporária, a cenografia gerou uma nova paisagem, gerou uma nova percepção de espaço, gerou um embate entre o novo e o existente, entre a cidade e o campo. Este projeto cenográfico escolhido trata da recriação de um lugar – os campos sulistas da França cobertos de lavanda – sobre uma cidade carregada de monumentos, espaços milimetricamente projetados, de acordo com a organização urbanística e com o desenho dos edifícios 56
Imagem 22: Sanaa, Grace Farms, WEB
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propostos pelo urbanista francês Haussmann. Enquanto a cenografia tenta compreender, em suas formas, a visão de um espaço – remetendo aos campos de lavanda, o segundo projeto escolhido – O Pavilhão de Osaka de Paulo Mendes da Rocha – cria um novo espaço através do relevo. Um espaço que não referencia um lugar específico, mas que representa um todo, uma “paisagem simulada” como o autor mesmo diz. É comum a estes dois projetos a criação do relevo para construir a paisagem. O cenário constrói de forma “fidedigna” ao tentar criar com cores, forma, textura e perfume a paisagem com relevo, enquanto Mendes da Rocha nos apresenta um relevo de concreto, que por meio de suas linhas nos remete às curvas de uma montanha, ou até mesmo de uma duna. Carlos Alberto Maciel, em seu texto Topografias ou a construção como paisagem, trata de várias obras arquitetônicas que interpretam e reinterpretam a topografia como forma geradora de seus projetos. Ele diz que “Essas intervenções ora reeditam topografias variadas dissimulando a construção da paisagem, ora criam acidentes geográficos artificiais em locais originalmente planos” (MACIEL, 2006, p. 16). Fizeram isso arquitetos como Oscar Niemeyer – no térreo do Copan; Sanaa – em Grace Farms ao usar do relevo para pousar o edifício (Imagem 22); e na Biblioteca da Universidade de Tecnologia de Delft (Imagem 23) projetada pelo escritório Mecanoo – que cria um “acidente geográfico” que em certo ponto oculta o prédio. No Pavilhão de Osaka, Paulo Mendes se apropria de um terreno plano, e com o desenho de uma nova topografia cria o espaço, transformando não só o terreno, mas também o entorno, ao propor uma arquitetura que visa dialogar e se aproximar dos pavilhões lindeiros a ele. Carlos Alberto Maciel então salienta que: Essa estratégia transforma os possíveis objetos edificados em paisagens artificiais, reforçando a prevalência do espaço público e aberto e fazendo da intervenção topográfica fato 58
Imagem 23: Mecanoo, Biblioteca Universidade de Tecnologia de Delft, WEB
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gerador do projeto, a construir rica oposição com a cobertura tecnologicamente edificada (MACIEL, 2006, p. 17).
Assim como o Pavilhão de Osaka, a cenografia é projetada em um local plano, gerando um “acidente geográfico”, mas também se apresenta como uma escultura – uma intervenção no espaço da arquitetura. O espectador não consegue decodificar aquele relevo no espaço até vislumbrar a fenda de entrada, e visualizar o nome “Dior”. Trata-se de um morro de lavanda que desestrutura a paisagem “original” – pátio interno do Louvre. Em outro momento, que não fosse a Semana de Moda de Paris, o espaço se encontraria “vazio”. Essa situação remete à discussão iniciada por Rosalind Krauss sobre A Escultura no Campo Ampliado, e sucedida por Anthony Vidler em O Campo Ampliado da Arquitetura. A Escultura no Campo Ampliado, publicado em 1979 por Rosalind Krauss, debruça-se sobre a mudança ocorrida na “escultura”, não exatamente no termo, mas sobre o espectro que ele abrangia até, mais ou menos, dez anos antes do texto ser publicado. Para a autora, a escultura, em um período da história, transita na lógica do monumento quando ela funciona como marco, como referência a algo. Alguns exemplos são os bustos em praças e os obeliscos, que eram postos sobre um pedestal, com a função de comunicar aquilo, “memorialização”: [...] As esculturas funcionam portanto em relação à lógica de sua representação e de seu papel como marco; daí serem normalmente figurativas e verticais e seus pedestais importantes por fazerem a mediação entre o local onde se situam e o signo que representam (KRAUSS, 1979, p. 131).
O esmaecimento do “local específico” e a perda da “lógica do monumento” ocorre no fim do século XIX, sendo exposto por Krauss quando a autora comenta duas obras de Rodin, Portas do Inferno (Imagem 24) e a estátua de Balzac. Segundo ela, elas seriam o “limiar da lógica do monumento”. As obras encomendadas respectivamente em 1880 e 1891, “falharam” não só por ter diversas versões espalhadas em diversos lugares, 60
Imagem 24: Rodin, Portas do Inferno, 1880, WEB
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mas, também, por não terem sido alocadas no local que foram designadas. Ou seja, não teria sido “cumprida” a função de “memorialização”. A partir da ruptura gerada por Rodin, mas sobretudo nos trabalhos dos artistas da década de 1960, como Richard Serra e Christo, surge um desvio, uma curva, uma expansão nas fronteiras entre as disciplinas – arquitetura, artes-plásticas – paisagem. Os primeiros artistas que exploraram as possibilidades da arquitetura mais não-arquitetura foram Robert Irwin, Sol LeWitt, Bruce Nauman, Richard Serra e Christo. Em todas essas estruturas axiomáticas existe uma espécie de intervenção no espaço real da arquitetura, às vezes através do desenho ou, como nos trabalhos recentes de Morris, através do uso do espelho (KRAUSS, 1979, p. 136).
É notado que a arte, através dos artistas, começa a invadir campos antes não explorados. Há uma extrapolação das escalas, já não sendo essas mais suportadas por galerias e museus. Há um transbordamento para um território que antes era “exclusivo” da arquitetura, provocando a transição da neutralidade, uma dissolução das fronteiras ao identificar que ela está interagindo na construção e na manipulação de um território, no desenho do espaço, na construção poética do lugar, ressignificando um sítio. Vidler, ao discutir o “Campo Ampliado da Arquitetura”, retoma a Richard Serra para salientar a forma que a escultura “invade” o território da arquitetura: O Tilted Arc é simultaneamente escultural e arquitetônico, tal como os arquitetos contemporâneos acreditam ser as formas interiores e exteriores de suas construções. No fundo, elas são vivenciadas pelo tato, em virtude de sua projeção, e oticamente pelo olhar; ambas se impõem e reagem igualmente ao corpo; ambas apresentam uma combinação de “uso” vivencial, estético e funcional (VIdler, p. 246).
A definição de Vidler sobre a obra Tilted Arc, de Richard Serra (Imagem 25), nos remete à cenografia em questão. Ambas se encontram 62
Imagem 25: Richard Serra, Tilted Arc, 1981, WEB
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posicionadas no meio de um espaço praça, e ambas promovem o reposicionamento do expectador-transeunte. Quando elas – a escultura e o cenário – não existiam, a dinâmica do espaço se apresentava de outra forma. Percursos lineares curtos, apenas para cruzar o espaço, promoviam a não observação do espaço, a falta de contemplação e experimentação. Ao serem inseridas no espaço, elas fomentam um novo modo de percorrer o espaço, um prolongamento no trajeto, uma forma de provocar a pessoa que passa, através da dilatação do espaço. Se exteriormente a cenografia se apresenta como uma escultura, internamente ela se apresenta como uma pintura de uma paisagem. Um paralelepípedo branco que no fundo apresenta um relevo de lavanda com uma fenda no meio. A não existência de adornos nas paredes, a cor única branca intensifica a sensação de um enquadramento de paisagem, tanto pintura como fotografia. Seja a partir de um relevo artificial coberto de plantas, ou uma ondulação de concreto, ambas as obras nos fomentam a sensação de paisagem. Elas nos inserem em paisagens ficcionais que transformam o espaço real. Seja ele a praça de um museu ou um terreno ao lado de outros pavilhões. A criação se dá a partir do autor, mas a vivência da paisagem é singular, individual. Como disse João Nunes (2019, p. 73): “Transformação é vida, e a construção da paisagem é transformação.”
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Ato II:De onde se vê
SOBRE O CORPO
O corpo é indissociável de nós, é parte do que somos, é a massa que habitamos, que tem suas singularidades e que se desloca no espaço. Pensar o corpo no cotidiano é refletir sobre as diferentes formas com a qual ele interage e é estimulado - nos campos visual, tátil, através do paladar e das formas auditiva, olfativa e (por que não?) através do registro sentimental. O pensamento sobre o corpo está em constante mudança, seja na arquitetura, na arte, na cenografia e nas outras inúmeras áreas de conhecimento. Entender esse corpo no lugar teatral é compreender como ele é inserido, como se relaciona, como vê e é visto, como ele participa. O lugar teatral é o espaço onde “(...) se estabelece a relação cena/público” (MONTOVANI, 1989, p. 7), sendo o corpo/público elemento de fundamental criação deste local teatral. A palavra teatro deriva do grego theatron, que seria “lugar de onde se vê” (DEL NERO, 2008, p. 14). Este lugar não é exclusivamente o edifício teatral, ele pode ser qualquer espaço que possibilite o estabelecimento da relação entre o apresentado e o que vê, embora haja uma “estrutura”, como define Anna Montovanni: “o lugar teatral é composto pelo lugar do espectador e pelo lugar cênico – onde atua o ator e acontece a cena” (MONTOVANI, 1989, p .7). Sabe-se que o teatro surge nos primórdios da humanidade, muito 67
antes do teatro grego e suas tragédias. Para Margot Berthold, em seu livro História Mundial do Teatro, é possível estudar o teatro primitivo a partir dos ritos das tribos aborígines que têm pouco contato com o resto do mundo por meio das pinturas das cavernas (Imagem 26), a partir utensílios dos povos pré-históricos, e também por meio das diversas danças e costumes populares que existem até hoje. É atribuído às danças e rituais dos líderes religiosos o início do teatro. Nesses momentos existiam movimentos, cores, vestimentas, fogo, animais abatidos, e outros artifícios que compunham esse momento de “catarse”. O teatro primitivo utilizava acessórios exteriores, exatamente como seu sucessor altamente desenvolvido o faz. Máscaras e figurinos, acessórios de contraregragem, cenários e orquestras eram comuns, embora na mais simples forma concebível (BERTHOLD, 2014, p. 3).
Fica entendido, então, que havia uma construção de um espaço, de uma ação entre o xamã e os outros que, segundo Berthold, ocorria em um lugar aberto de “terra batida”, possivelmente circular, de forma que, ao centro, poderiam estar compondo a cena produtos alimentícios, flechas e ou um totem central. Pela forma circular, não havia um “fundo”, os corpos que viam a cena eram parte do conjunto. Também se configurava em formato circular o início (a raiz) do teatro na Grécia, que tem origem, segundo Cyro Del Nero, na eira – um espaço para moagem dos grãos onde ocorriam comemorações, danças, cerimônias religiosas, orgias em celebração à colheita. Essa celebração era atribuída ao deus Dionísio, até então “(...) deus do vinho, da vegetação, e do crescimento, da procriação e da vida exuberante.” (BERTHOLD, 2014, p. 103). Dionísio se torna deus do teatro no momento que estes ritos, feitos na eira, se “(...) desenvolveram e resultaram na tragédia e na comédia” (BERTHOLD, 2014, p. 103). Pisístrato (600-528 a.C.) foi quem construiu o Teatro de Dionísio em Atenas (Imagem 27), na encosta da colina do santuário de Dionísio. Além 68
Imagem 26: Pintura em rocha, cena de dança ritual. Lérida - Espanha, WEB
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do theatron, havia “(...) um altar, uma gruta e uma “orquestra” (do verbo dançar) circular de terra batida ou areia (arena) (...)” (DEL NERO, 2008, p. 13). A troca de vestimenta dos atores era feita na skene, uma tenda que ficava atrás da orquestra. Foi da evolução desta tenda que surgiu a cenografia. Essa skene se modificou e a cada período histórico, passando por diversos estágios, desde o improvisado até abrigar uma skenoteca, quando abrigou costumes, adereços e cenografia [...] Mais tarde, ela se tornaria uma stoa, com portas e saídas de atores, decorada com fachada de palácio, ou templo, com escadas, altares ou o que fosse requerido pelos dramaturgos (DEL NERO, 2008, p. 14).
Apesar da origem circular na eira, o edifício teatral grego não era completamente circular. A parte cênica permanece no formato de círculo, mas o teatron – onde se vê, era semicircular. Passa a existir um “fundo” como já dito, inicialmente, a skene e, consequentemente, evolui para paredes, colunas, elementos que compusessem a dramaturgia. Dá-se início a uma nova relação de visual, em que o espectador tinha visão total do lugar cênico. Sabe-se que o estudo do corpo, das proporções, da beleza ideal, tem início na Grécia, vide a evolução das estátuas e dos templos. Mas foi em Roma que estudos sobre as métricas do corpo começaram a ser vinculados à arquitetura, transformando o corpo em um “(...) alicerce básico do pensamento arquitetônico ocidental” (AGREST, 1988 apud NESBITT, 2010, p. 585). Desde Vitrúvio, segundo Diana I. Agrest, o corpo foi fixado como base do sistema da arquitetura, o logocentrismo e antropomorfismo masculino. Em seu texto À margem da arquitetura: corpo, lógica e sexo Agrest, a autora expõe a forma que o corpo foi relacionado à arquitetura e como o corpo da mulher foi reprimido, apresentando textos que abordam “sobre a transferência simbólica do corpo para a arquitetura”. O homem é apresentado como possuidor do atributo das proporções naturais perfeitas. Assim, a relação analógica entre arquitetura e o corpo humano parece garantir a transferência para 70
Imagem 27: Ruína Teatro Dionísio, Atenas - Grécia, WEB
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a arquitetura das leis naturais de beleza e natureza (AGREST, 1988 apud NESBITT, 2010, p. 587).
Os romanos absorveram o teatro grego realizando algumas modificações no lugar teatral, mudanças da forma a partir dos estudos de Vitrúvio, de caráter social e religioso. O lugar cênico deixa de ser circular, como era na Grécia, e passa a ser semicircular – a plateia acompanha essa forma. É retirado, também, o caráter religioso do edifício, transformando-o em um local de divertimento. Por fim, dá-se início à demarcação dos lugares de melhor visual para os membros privilegiados. É no Renascimento que se retoma os estudos alicerçados em Vitrúvio, juntamente com a ciência a partir dos estudos dos corpos e dos estudos matemáticos. Nota-se essa influência do corpo do homem quando observa-se o Homem Vitruviano (Imagem 28), de Leonardo da Vinci – uma figura masculina circunscrita, e que tem como base para a construção deste círculo o seu umbigo, que é o centro. Além disso, suas partes corporais definem um quadrado onde a altura do corpo é proporcional à distância entre a ponta dos dedos das mãos. Os estudos sobre o corpo, a matemática, a geometria e a perspectiva não ficaram atreladas à escultura e à pintura. Na arquitetura, reverberaram-se esses estudos e não seria diferente com o lugar teatral, graças aos estudos sobre o edifício greco-romano com apoio do quinto livro de Vitrúvio, De Architectura, que permitiram a formulação do edifício teatro que mais se aproxima com o que temos hoje. Segundo Berthold, a perspectiva foi “a grande paixão do Quattrocento”, tendo influência direta no edifício teatral e na questão cênica. De início, os cenários eram modestos e com pinturas não muito assertivas do ponto de vista da perspectiva. Com o passar dos anos, ganha-se uma certa profundidade e perspectiva nestas pinturas. Foi Baldassare Peruzzi, em 1518, que realizou uma significativa mudança no lugar cênico, aumentando a área de atuação, e criando profundidade real graças à “(...) combinação entre cenário com praticáveis no proscênio e uma parede de fundo pintada em perspectiva plena” 72
Imagem 28: Homem Vitruviano, Leonardo da Vinci. Gallerie dell’Accademia, Veneza - Itália. WEB
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(BERTHOLD, 2014, p. 284). Peruzzi fixa o ponto de fuga e a perspectiva principal dentro do quadro pintado. Discípulo de Peruzzi, Sebastiano Serlio avança mais na tentativa de criar uma melhor cênica real. Em Architettura (de 1545), descreve como construir a partir de bastidores em ângulo uma perspectiva. Serlio agora projetava isto na distância, para além do prospecto pintado, ou seja, para além da parede de fundo do palco. Visava com isso frear a rapidez de redução no plano do escorço e desta profundidade ilusória ganhar algum espaço real de atuação no palco (BERTHOLD, 2014, p. 287).
Projetado por Andrea Palladio, o Teatro Olímpico de Vicenza é o exemplo de teatro do Renascimento que ainda pode ser visto. Para o projeto, Palladio seguiu o formato de auditório que Vitrúvio definiu em seu quinto livro. O palco tinha uma saída de cada, proscênio, e a scaenae frons – estrutura permanente que servia de fundo ao palco – com três recortes, onde seriam posicionadas as pinturas perspectivadas. Pouco antes da conclusão do projeto, Palladio vem a falecer, e Vincenzo Scamozzi assume o projeto, alterando esses recortes, transformando-os em “vielas praticáveis”, como diz Berthold. Seguindo Serlio, ele situou o seu ponto de fuga para a perspectiva além da cena, nas telas de fundo vistas através das três entradas, intensificando assim a ilusão de profundidade (BERTHOLD, 2014, p. 287).
As perspectivas eram melhor compreendidas nos lugares em que a visão era frontal, que eram ocupados por pessoas privilegiadas. A segregação dentro do teatro, que teve início com os romanos, continua neste período, e o distanciamento do público com o lugar cênico começa a ser maior. Nos séculos seguintes o teatro se aperfeiçoou como espaçoedifício, mas continuou com o distanciamento entre a cena e o espectador. No âmbito da cenografia, as mudanças foram muitas, passando pelas pinturas elaboradas da ópera barroca, até a renovação do teatro moderno. O cenário muda das pinturas bidimensionais para as tridimensionais 74
Imagem 29: Teatro Olímpico de Vicenza, Andrea Palladio e Vicenzo Scamozzi, Vicenza - Itália. WEB
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graças à utilização de elementos com volumes atrelados ao uso do jogo de luzes com a adoção da energia elétrica, abrindo-se assim uma nova área de experimentação na cenografia. O questionamento sobre a forma do lugar teatral, representado pelo teatro italiano, começa a surgir no fim do século XIX, reverberando no século seguinte, até os dias de hoje. Questionamentos sobre a divisão por classes, visibilidade e acústica começaram a surgir contra o paradigma do teatro italiano. Outro ponto crucial a ser transformado é a separação entre a cena e a plateia, e também a presença de uma moldura que os distancia espacialmente, fomentando possibilidades a favor da interação e aproximação com o público. Diversos diretores de teatro começaram a questionar o espaço teatral que consequentemente limitava a dramaturgia. As apresentações do início do século XX refletiam os questionamentos acerca da sociedade. Surge um grupo que explora o teatro como forma de comunicação política. Erwin Piscator foi um diretor e dramaturgo alemão que via no teatro um espaço político. Em 1919 lança um manifesto “(...) conclamando à criação de um ‘Teatro Proletário’” (BERTHOLD, 2014, p. 499). Piscator, em seu livro Teatro Político, escreveu: A arquitetura do Teatro está em estreita ligação com a forma da respectiva dramaturgia. Ambas se encontram em mútua relação. Dramaturgia e arquitetura juntas, em suas raízes, partem da forma social de sua época. A forma do palco dominante em nossa época é a forma sobrevivente do absolutismo, é o teatro da corte. Com sua divisão em plateia, frisas, camarotes e galerias, ele reproduz as camadas sociais da sociedade feudal (PISCATOR apud MANTOVANI, 1989, p. 56).
Uma série de percalços atrapalharam a vontade da criação de um espaço teatral que refletissem a época, mas em 1927 Walter Gropius, diretor da Bauhaus em Dessau, desenha para Piscator o que seria o Teatro Total (Imagem 30). A Bauhaus, antes da proposta de Gropius, já iniciava estudos sobre o teatro com o professor Oskar Schlemmer (Imagem 31), que questionava o espaço teatral limitador para a criação cênica da dramaturgia. Suas propostas tinham como objetivo modificar 76
Imagem 30: Desenho Teatro Total, Walter Gropius, 1927,WEB
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a relação público cena inserindo elementos do cinema, afastando-se da representação realista e aprofundando nos estudos da luz e da acústica. O desenho de Gropius dava ao Teatro total uma forma ovalada, na qual seria possível ocorrer os diversos tipos de apresentações: ópera, cinema, dança, conferências e teatro. Parte do piso rotacionava e permitia diferentes configurações ao espaço como anfiteatro e arena. [...] procurei elaborar uma estrutura flexível, que possibilita ao diretor uma livre escolha entre as três formas de teatro, com o uso de simples e disponíveis equipamentos [...] O público perderá a sua indolência, tão logo experimentar o efeito surpreendente do espaço conversível. Através do deslocamento da ação de uma posição cênica para outra, no andamento da representação, e através de um sistema de projeções e de máquinas cinematográficas; através dele as paredes e a cobertura podem transformar-se em cenas em movimento, todo o edifico seria o resultado de efeitos tridimensionais, ao contrário dos efeitos achatados do teatro tradicional [...] Deste modo, o teatro mesmo, resolvido no espaço maleável e ilusório da imaginação, se transformaria em espaço cênico. Um teatro como esse estimularia a criação e a fantasia do dramaturgo e do diretor, visto que, como espírito edifica o corpo, assim o edifício transforma o espírito (GROPIUS apud MANTOVANI, 1989, p. 56-57).
Cristiano Cezarino Rodrigues em seu texto, para o site Vitrúvius, “Cogitar a arquitetura Teatral” diz que a multiplicidade de espaços juntamente com a possibilidade de deslocamento, visto que o piso poderia rotacionar durante a peça, geraria uma “(...) experiência diferenciada tanto para atores quanto para o público” (RODRIGUES, 2009, s/p). Fica evidente, nesta proposta, que a integração do público na cena era bem quista, isso porque ao propor configurações diferentes e propor um espaço que participasse da cena, Gropius tende a inserir o corpo que vê na cena. Este projeto ficou apenas no estudo, nunca fora construído, mas se somou às outras propostas que repensaram o lugar teatral. Embora o corpo tenha começado a ser pensado para ser inserido na cena, a arquitetura ainda o limitava a dispositivo métrico. Le Corbusier em sua publicação Modulor (1948) e Modulor 2 (1953), redesenha e 78
Imagem 31: Balé Triádico, Oskar Schlemmer.
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reafirma o corpo como uma forma de escala humana para a arquitetura, criando referências métricas padronizadas que “orientam” a arquitetura e a produção em escala. Enquanto Le Corbusier tratava o corpo como fonte métrica, a fenomenologia inicia debates sobre o corpo, sobretudo após os anos 1960, que não se fechavam ao corpo métrico. Iniciavam-se os estudos sobre a percepção do corpo de forma singular a partir do indivíduo e suas reflexões. O corpo, então, é visto como uma interação, como uma troca de percepções acerca de si. É uma tomada de entendimento da singularidade do ser e do corpo. Na Arte, a exploração do corpo também passa a seguir um viés fenomenológico a partir da década de 1960. O corpo do artista e do espectador começam a ser inseridos na arte, a fim de criar debates sobre si e sobre o corpo, sobre identidade de gênero, sexualidade, etc. Mortalha mundo cão (1961), é o resultado de uma ação sobre um tecido feita pelo pintor francês Yves Klein (1928-1962). Klein chamava de “antropometria” as pinturas que ele realizava a partir de modelos nus com corpos besuntados de tinta, transformando assim o corpo em “pincéis humanos”, que carimbavam e deslizavam sobre a superfície a ser pintada (Imagem 32). ORLAN (1947), em maiúsculo, é a forma que a artista francesa escolheu para representá-la, explicando o porquê no seguinte fragmento: Escolhi este nome depois de uma sessão de psicanálise, quando percebi que assinava meus cheques com o nome “Morta”. Entendi então, depois da intervenção do psicanalista que apontou a anomalia, que eu nunca mais estaria naquele estado de morte lenta e foi aí que eu me dei uma nova identidade civil. Selecionei então um nome nem masculino nem feminino; este nome contém minha exigência de transgredir os tabus e de ficar à margem dos modelos de gênero [...] (ORLAN apud GONZAGA, 2012)
Ricardo Maurício Gonzaga em seu artigo O corpo como rascunho: ORLAN, o verbo feito carne feito imagem feito verbo, nos apresenta algumas questões que movem o trabalho da artista. Segundo ele, ORLAN, em 80
Imagem 32: Performance Anthropometries of the Blue Period, Yves Klein, 1960, Galerie Internationale d’art contemporain, Paris, France. WEB
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seus primeiros trabalhos, direciona “(...) sua atenção para o problema da presença histórica do corpo feminino como objeto de interesse da pintura – e da escultura - na tradição da arte ocidental” (GONZAGA, 2012, p. 808). Dentre uma de suas performances, a artista posa nua refazendo quadros em que o corpo feminino é objeto central. Nos anos de 1990 a 1993, ORLAN embarca em uma série de nove performances (Imagem 33) em que ela se submetia a cirurgias plásticas filmadas e transmitidas ao vivo. O seu rosto é o suporte em que ela busca “recriar”, trazendo para ela, como diz Gonzaga “(...) a testa da Monalisa ao queixo da Vênus de Boticelli e, assim por diante, somandose outras partes de rostos de pinturas de mulheres da tradição ocidental” (GONZAGA, 2012, p. 808). Minha série de performances foi criada para dar uma figura a minha face. É um trabalho de arte que se situa em algum lugar entre figuração, desfiguração e refiguração, num corpo que às vezes é sujeito, às vezes objeto – às vezes tendo um corpo, às vezes sendo um corpo (ORLAN apud GONZAGA, 2012).
O trabalho de ORLAN nos confunde, pois ela cria dualidades antes não comuns na História da Arte. Seu corpo corresponde a “sujeito/ objeto e autor/suporte” (GONZAGA, 2012). Nele, a obra de arte, o autor e o meio são um só. Outra artista que utiliza seu corpo como meio da criação do seu trabalho é a fotógrafa americana Cindy Sherman. Sua obra transita em temas como identidade, cinema, mulher e mídia. Suas fotografias(Imagem 34) apresentam cenas completamente construídas a partir do estudo da luz, da posição do corpo, da maquiagem, do figurino, sendo ela a modelo que deve “(...) agenciar múltiplas personas por ela fabuladas (...)” (ALVARES, 2015, p. 3). No Brasil, diversos artistas também iniciam seus estudos sobre o corpo, destacando-se Hélio Oiticica (1937-1980), Lygia Clark (1920-1988) e Hudinilson Jr. (1957-2013). O primeiro, Oiticica, desenvolve trabalhos que precisam do corpo do espectador para serem experienciados. Tanto 82
Imagem 33: Performance O rosto do século XXI, ORLAN, 1990. WEB
Imagem 34: Untitled, Cindy Sherman, 2000, Whitney Museum, Nova Iorque - EUA. WEB
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em Núcleos, quanto em Penetráveis, o deslocamento do espectador é fundamental, mas é com os Parangolés (Imagem 35) que o artista “exige” a participação do corpo. Uma capa de tecidos coloridos que devia ser vestida, e a partir do movimento da dança, os tecidos seriam ativados, gerando uma manifestação da cor. [...] o espectador “veste” a capa, que se constitui de camadas de pano de cor que se revelam à medida em que este se movimenta correndo ou dançando. A obra requer aí a participação corporal direta; além de revestir o corpo, pede que este se movimente, que dance em última análise. O próprio “ato de vestir” a obra já implica numa transmutação expressivo corporal do espectador, característica primordial da dança, sua primeira condição (OITICICA, 1964b, p. 1 apud TEIXEIRA, 2017. p. 56).
Os Parangolés, como diz Oiticica, requerem participação corporal do espectador que deixa de ser aquele que contempla, e passa a ser motriz desse evento ao dançar e correr, e gerar ação nesse espaço. Lygia Clark, juntamente com Oiticica, fez parte dos artistas da década de 1960 do Movimento Neoconcreto. Movimento esse que surge a partir do rompimento com o movimento da década de 1950 denominado Concreto. Clark, juntamente com Lygia Pape e Oiticica, eram da ala do Neoconcreto que tinha uma “(...) atuação no sentido de transformar suas funções, sua razão de ser, e que colocasse em xeque o estatuto da arte vigente” (BRITO, 1999, p. 58). A artista tem diversos trabalhos que precisam do corpo do espectador, seja ele como forma de interação, como em Bichos (1960), quanto exploração sensorial, como em A Casa É o Corpo: Labirinto (1968) (Imagem 36). Neste último trabalho citado, a pessoa entra em uma estrutura dividida em ambientes intitulados “penetração”, “ovulação”, “germinação” e “expulsão”, e é levada a experienciar sensações sensoriais. Na década de 1970, quando lecionava em Paris, Lygia cria sensação de claustrofobia e sufocamento ao propor que os corpos penetrem em um túnel de pano de 50 metros. Em determinado momento, a pessoa passa pela experiência do nascimento ao sair por um orifício criado pela artista. O trabalho de Hudinilson Jr. se estende em vários meios, dentre 84
Imagem 35: Performance O rosto do século XXI, ORLAN, 1990. WEB Nininha da Mangueira vestindo P 25 Parangolé capa 21 Xoxoba (1968), de Hélio Oiticica, durante as filmagens de “H.O.”, de Ivan Cardoso, 1979. Foto Andreas Valentim, MAM-Rio. WEB
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eles na xilogravura, colagem e fotocópia. Há, em muitos de seus trabalhos, um corpo que era o do próprio artista, fotocopiado, ou recortes de revistas. Na série Exercício de me ver (1981) (Imagem 37), o artista realiza fotocópias de diversas partes do seu corpo, fragmentando-o, gerando imagens a partir das distorções desse ato de pressionar partes corporais sobre a máquina Xerox. Ao pensar, sobretudo, no trabalho de Hélio Oiticica e Lygia Clark, observa-se que ambos tiveram destaque na década de 1960, um período, como já dito, com muita experimentação do corpo e da matéria. E no teatro não foi diferente. Segundo Elizabeth Maria Néspoli, em sua tese Teatro da Vertigem: construção poética e recepção, os anos de 1960 e 1970 foram de “Experimentação formais, temáticas e de modo de produção se multiplicaram e levaram muitos artistas para fora dos edifícios teatrais (...)” (NESPOLI, 2015, p. 42). Devido às censuras impostas pelo governo militar (1964-1985) estes movimentos são mitigados, retomando as experimentações com o fim do regime. Um dos grupos que representa essa tomada da experimentação teatral brasileira é o grupo paulista Teatro da Vertigem. Segundo consta em seu website e na tese de Néspoli, o grupo se inicia no ano de 1992 com a peça O Paraíso Perdido, embora tenham iniciado suas reuniões dois anos antes como um grupo de estudos do teatro. Os integrantes eram artistas recém-formados pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. Em sua primeira peça, O Paraíso perdido, de acordo com o website, a companhia pretendia “(...) tratar de algumas das mais recorrentes questões metafísicas: a perda do paraíso, sua nostalgia e a consequente busca de um religamento original”. Para esta encenação, eles buscam um lugar que não é o teatro, mas sim uma igreja – Santa Ifigênia, em São Paulo. Para as peças subsequentes, que formam a chamada trilogia bíblica, O Livro de Jó (1995) e Apocalipse 1.11 (2000), novamente o local não foi um edifício teatral. O primeiro se deu no Hospital Humberto I, e o segundo no Presídio do Hipódromo, ambos em São Paulo. 86
Imagem 36: A casa é o corpo Labirinto, Lygia Clark 1968. WEB
Imagem 37: Exercício de me ver II A, Hudinilson Jr., 1982. WEB
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Néspoli destaca em sua tese que: Ao encerrar a chamada trilogia bíblica [...], o Teatro da vertigem sedimentara uma poética que colocava em fricção a “realidade” dos espaços e a ficção moldada em longos processos de criação. A escolha de ambientações carregadas de sentidos fortemente impressos no imaginário coletivo que se conecta diretamente ao desejo de ampliar tensão na atividade receptiva é projeto concretizado. Porém é na montagem seguinte, de B-3 (2006), que sucede a trilogia bíblica, que o movimento do grupo em direção ao espaço público se intensifica temática e geograficamente (NESPOLI, 2015, p. 61).
A peça B-3 se desenvolve no Rio Tietê, como o grupo diz em seu website “(...) primeira intervenção em um espaço público aberto (...)”. Segundo Néspoli, esta encenação utilizava pontos das duas margens do rio em um percurso de 4,5 km percorrido por um barco que transportava os espectadores. A autora ressalta que nesse espetáculo há a inserção de um novo campo de tensão “(...) que se instaura no encontro do espectador com a obra” (NESPOLI, 2015, p. 61). Segundo a autora, o ambiente não proporciona um estar de segurança – em comparação aos ambientes arquitetônicos das peças anteriores – e havia uma “(...) zona híbrida na qual a encenação e a realidade se articulavam” (NESPOLI, 2015, p. 61), sendo o real insistentemente lembrado por meio da cidade que margeia o rio e os carros que por ali passam. O grupo deixa evidente em outras peças que deseja fazer do espaço urbano um local de experimentação urbana. Seu último trabalho foi uma performance-filme com colaboração do artista Nuno Ramos. Segundo o website do Teatro de Vertigem, a performance consistia em um cortejo fúnebre com carros em marcha ré que percorriam o caminho da Avenida Paulista para o cemitério da Consolação. Ao pensar nessa forma do Teatro da Vertigem de explorar o urbano em meio à realidade a partir de encenações, pensa-se também no carnaval. Enquanto o Teatro da Vertigem tem uma forma de acontecer, tem um jeito de elucidar sentimentos, o carnaval de rua age de outra forma: há uma imprevisibilidade constante, uma espontaneidade do evento. No 88
Imagem 38: O Paraiso perdido, Foto: Kika Antunes, 1992. WEB
Imagem 39: B-3, Foto: Rio Encena, 2006. WEB
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carnaval de rua há uma dicotomia, ou como Néspoli diz “zona híbrida” entre a cidade que mantém seu ritmo de realidade, enquanto os foliões se inserem em uma narrativa de festa, vivências, pessoas e sentimentos. O carnaval é uma vivência do corpo no espaço público, é uma transformação do espaço cotidiano onde a experiência acontece, não só por meio das vestimentas que emanam movimento e cor no espaço, mas através das ativações sensoriais por meio da interação com o outro e com o espaço que tem seu uso “subvertido” temporariamente. A construção do entendimento do corpo é constante, e permanecerá, como foi brevemente discorrido. O corpo pertence ao espaço, como diz Bragioni, “(...) a partir de seu movimento, sendo então ‘sinônimo de espaço praticado’ e ‘como o lugar de onde vemos o mundo’ e ‘como o território de onde dizemos o mundo’ (HISSA; NOGUEIRA, 2013, p. 61 apud BRAGIONI, 2020, p. 53). A prática deste espaço pode, e deve ser fortemente fomentada pela Arquitetura e pelas Artes.
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DIOR II
Na moda, as referências a outros trabalhos, sejam eles relacionados a vestimenta ou não, são constantes. Em uma Maison como Dior não seria diferente. É quisto que o designer que lidera o time criativo releia a história da casa para poder manter a alma do fundador. Christian Dior dirigiu a sua marca por apenas dez anos, mas deixou um legado enorme de referências e silhuetas, tendo seus sucessores contribuindo da mesma forma. Yves Saint Laurent foi o primeiro a comandar a casa após a morte de monsieur Dior, seguido por Marc Bohan, Gianfranco Ferré, John Galliano e Raf Simons. Atualmente quem assume a direção criativa é Maria Grazia Chiuiri, a primeira mulher a assumir a Maison. O desfile em questão foi realizado nove meses antes do apresentado no capítulo anterior. Para a coleção primavera-verão de Alta Costura de 2015, Raf Simons se inspira nas vestimentas de David Bowie, quem Raf define como “Um camaleão capaz de se reinventar” (BLANKS,2015). A partir desta ideia de “camaleão”, Raf Simons reedita silhuetas Dior através de um caleidoscópio de referências a trajes das décadas de 1950, 1960 e 1970. O que ele busca nesse desfile é quebrar o distanciamento da Alta Costura com o mundo, aproximando-a da “realidade” ao trazer novos materiais, tecidos “comuns” e reestruturação das silhuetas. Segundo 91
reportagem veiculada no website da Vogue a coleção é:
A coleção que ele mostrou foi um impressionante esforço em várias camadas que expandiram o tempo e o espaço, imaginando o futuro como visto pelo passado, reimaginando o passado com uma visão retrospectiva do futuro, tudo configurado com uma trilha sonora de canções que abrangem anos importantes na carreira de um performer que sempre fez exatamente isso com sua música. O conceito era simples em essência - Simons e Bowie dando um ao outro um pouco do amor de alma - mas devastadoramente sofisticado em sua execução (VOGUE, 2015, tradução nossa)7
Para apresentar esta coleção, que trazia casacos feitos de plástico bordados com lantejoulas, saias plissadas com cintura marcada (Imagem 40), botas coloridas envernizadas com saltos de acrílico transparente e macacões gráficos coloridos, a Maison convocou seu parceiro de longa data, o já mencionado Bureau Betak, e escolheu o Museu Rodin para a locação. Há uma poesia na escolha do lugar: ele cria uma relação entre a Alta Costura e a Arte. A meticulosidade da produção da roupa que contabiliza mais de seiscentas horas de trabalho à mão, com o trabalho de Rodin em suas esculturas. Há poesia também no percurso até o espaço do desfile, que se localiza nos “fundos” do museu. Para chegar até este espaço, passa-se em frente à casa que abriga parte do acervo, e em seguida pelo jardim com esculturas como O Pensador para, por fim, chegar até o volume monolítico branco erguido no jardim. Não há nada além da abertura central, uma escada e um letreiro que indica Dior escrito, localizado um pouco mais acima (Imagem 41). VOGUE: ”The collection he showed was a stunning multilayered effort that spanned time and space, imagining the future as seen by the past, reimagining the past with the hindsight of the future, all set to a soundtrack of songs spanning key years in the career of a performer who has always done exactly that with his music. The conceit was simple in essence—Simons and Bowie giving each other a little soul love—but devastatingly sophisticated in its execution” (VOGUE, 2015). 7
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Imagem 40: Dior HC 2015 SS. WEB
Imagem 41: Dior HC 2015 SS. WEB
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Em contraponto com o exterior extremamente comedido, o interior se mostra como uma explosão de informações (Imagem 42). Com uma forma quase circular o espaço interno se divide em dois níveis, principal e mezanino, sendo o segundo com alturas variáveis. Uma estrutura de andaimes brancos dá forma a este espaço, como se fosse o esqueleto exposto, sustentando as paredes, e as escadas que conectam os diferentes níveis do mezanino que se liga com o pavimento principal por duas escadas quase que centrais. O piso é em carpete rosa e se espalha por todo o espaço, escada e até nos blocos de bancos. Por fim, as paredes e o teto, que são cobertos por espelhos, resultam em infinitas imagens caleidoscópicas.
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Imagem 42: Dior HC 2015 SS. WEB
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TEATRO OFICINA
Dentre os grupos de teatro que questionavam o espaço cênico e a conformação da cena, os quais realizavam experimentações formais que são relevantes no teatro brasileiro, como define Néspoli (2015), está o grupo do Teatro Oficina. O início dos trabalhos se dá no ano de 1958, encabeçado por José Celso Martinez Corrêa e Renato Borghi. Era um grupo de alunos da Faculdade de Direito do Largo São Francisco que aluga, de um grupo espírita, o que era o Teatro Novos Comediantes, no Bixiga, para ali instalarem sua companhia teatral. O primeiro projeto do espaço foi feito por Joaquim Guedes que desenhou um “(...) teatro tipo ‘sanduíche’, com duas plateias frente a frente separadas pelo palco central (...)” (ELITO, 2015, p. 8). Esta configuração resiste até o incêndio de 1966. O segundo projeto é feito por Flávio Império e Rodrigo Lefèvre em 1967, e traz um palco quadrado de 9mX9m com altura de 10m. No centro do palco havia um círculo de 7 metros que era rotacionado. “Um palco italiano nu, que mantinha a relação frontal entre palco e plateia, mas pelado, contando com as maquinarias teatrais, tais como urdimento e palco giratório aparente” (MATZENBACHER, 2018, p. 99). No ano de 1981, o Condephaat tomba o Teatro Oficina. Em seu parecer, Flávio Império ressalta que “(...) um bem cultural da cidade não pela importância histórica do imóvel, mas pelo seu uso como palco de transformações do teatro brasileiro” (IMPERIO apud ELITO, 2015, p. 9). 96
Imagem 43: Teatro Oficina, WEB
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O edifício em questão é o que existe hoje, na configuração desenhada por Lina Bo Bardi e Edson Elito (Imagem 43). Após anos de problemas com o espaço, a tentativa de compra e o tombamento, finalmente um processo de reformulação do espaço pode acontecer. A ideia da rua invadir o espaço sempre existiu, como conta Edson Elito. É realizado um anteprojeto que dá início à demolição de algumas paredes. Em uma vistoria, Edson sente que todas as paredes deveriam ser demolidas, deixando apenas as envoltórias, e Zé Celso cria o teatro em rampa. Essas novas ideias são transmitidas a Lina que dias depois desenha a solução. A partir dessas ideias, desenvolvemos um novo anteprojeto demolindo todas as paredes internas e criando um palco em toda a extensão do teatro, da porta da entrada aos fundos, com trecho em rampa para vencer desnível de 3m da frente aos fundos (ELITO, 2015, p. 13-14).
O palco em rampa tem uma faixa em madeira para marcar o sentido de rua (Imagem 44 e 45), de passagem, a estrutura metálica azul que foi criada para dar apoio aos mezaninos e a cobertura contribui, também, para a estabilidade das galerias que são em tubos metálicos, como andaimes. Essas galerias são desenhadas ao longo do palco/rua, criando passagem e lugar para ver, assim como conecta mezaninos, camarins, sala de luz e som.
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Imagem 44: Teatro Oficina, WEB
Imagem 45: Teatro Oficina, WEB
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DIÁLOGO
Ao pensar o que estes dois projetos têm em comum, chega-se a similaridades que podem ser de ordem material, espacial e também de objetivo; mas também surgem diferenças, como a temporalidade e o sujeito a quem o espaço é endereçado. De início, ao ver as imagens de ambos os projetos, nota-se uma certa similaridade entre eles a partir de um elemento material que é o tubo metálico que estrutura parte dos dois projetos, criando um conjunto rítmico e estético que se torna presente. Na cenografia, ele é utilizado de forma mais “aleatória”, não tendo uma sequência rítmica e linear como no Teatro Oficina. Isso se dá também pela forma do espaço. Outro elemento que cria essa proximidade entre eles é a escada, meio essencial para fazer a ligação dos diferentes níveis, tanto do mezanino da cenografia, quanto entre as galerias do teatro. Essas estruturas tipo andaime são, de certa forma, protagonistas no projeto e ajudam a conformar o espaço, e como já foi dito, elas são parte que sustenta os diferentes níveis, o que possibilita ao espectador ter acesso a diferentes visuais. 100
Para Tschumi:
[...] o espaço não é simplesmente a projeção tridimensional de uma representação mental, mas é algo que se ouve e no qual se age. E é o olho que enquadra – a janela, a porta, o ritual efêmero da passagem [...] Espaços de movimento – corredores, escadas, rampas, passagens, soleiras; é aí que começa a articulação entre espaços dos sentidos e o espaço da sociedade [...] (TSCHUMI, 2008, p. 181).
Pensar no espaço desta forma nos leva a terceira relação: o objetivo. Ambos os projetos desejam que o espaço auxilie na criação de experimentações sensoriais, não só a partir da criação de visual – “olho que enquadra”, ou do “ritual da passagem” através de um jardim para chegar a uma abertura pequena que acessa um novo espaço, ou a partir das escadas que conectam diferentes níveis ou a rampa que é palco e que é rua. A experimentação dos sentidos se dá, sobretudo, na interação dos corpos, seja ela de uma modelo ao passar por um espaço sem conformação formal de passarela, ou pela não delimitação entre plateia e espaço cênico. Essa experiência no espaço se dá de forma diferente nos dois projetos, não só pela diferença do que está sendo apresentado, onde o desfile se mostra mais contido, pois há uma certa rigidez e padronização dos movimentos das modelos, enquanto no teatro há uma liberdade do ator e da sua interação com o público; mas há uma diferença de temporalidade. O espaço cênico do desfile só permite uma experimentação sensorial, já que ele é desmontado logo após o término da ação, enquanto o Teatro Oficina oferece diferentes experiências a cada peça. Por fim, fala-se do sujeito a quem o espaço é direcionado. O espaço do desfile atende a um seleto grupo de pessoas, são eles: os que podem pagar dezenas de milhares de euros por uma vestimenta, os editores das principais revistas de moda, artistas e influenciadores digitais que a marca gosta de ter vínculo e os diretores da marca. Aos não presenciais ficam os registros visuais em vídeo e fotografia. Diferentemente é o Teatro Oficina, onde há uma maior abertura já que não há um público alvo, existe uma intenção de atingir a todos que 101
tenham interesse. Obviamente isso não é possível, seja pelo esgotamento dos ingressos, pela falta de acesso ao local ou pelo não conhecimento da existência do mesmo. Essa segregação da experiência remonta a Jacques Rancière, em A partilha do sensível, onde este sensível é o produto de atos estéticos conformando em uma experiência. Partilhar este sensível é [...]ao mesmo tempo, um comum partilhado e partes exclusivas. Essa repartição das partes e dos lugares se funda numa partilha de espaços, tempo e tipos de atividade que determina propriamente a maneira como um comum se presta à participação e como uns e outros tomam parte nessa partilha (RANCIÈRE, 2009, p. 15).
Partilha é tomar consciência do que cabe a si e na divisão com um todo. Na cenografia, essa experiência fica limitada por não se abrir a possibilidade ao geral, ela se restringe a um seleto grupo que pode “(...) tomar parte no comum em função daquilo que faz (...) (RANCIÈRE, 2009, p. 16). É tomar o domínio daquilo e não o compartilhar completamente com os outros, é dar ao outro a parte que lhe cabe. Apesar de diferenças em níveis de experimentação, não se pode negar que ambos os projetos proporcionam a partir da arte, seja ela da criação, desenvolvimento e apresentação de uma vestimenta ou de uma peça teatral, uma experiência do corpo no espaço através dos sentidos.
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Ato III: Luz que molda o espaço
LUZ
O exercício da visão só acontece a partir da presença e da ausência da luz. Como se sabe, é o escuro e a falta de emissão de luz decorre a não visão. Para distinguir cores, formas, texturas é preciso que raios luminosos “atinjam” as superfícies e reflitam de volta para o observador. A luz nos permite ver, e mais do que isto, ela nos estimula e informa sobre o que nos cerca. Não haveria forma visual percebida sem luz. Esta condiciona a maneira com que vemos o mundo e a maneira como nos sentimos. Existem várias fontes de luz: o sol, a lua, o fogo e eletricidade, que nos causam diferentes percepções e respostas. A luz revela contornos, superfícies, formas e cores. A luz revela também a beleza, função e forma da arquitetura. Define imagem, cor, textura dos espaços, edifícios, cidades e paisagens. Determina nosso limite visual e nosso entendimento de escala (BARBOSA, 2010, p. 28).
A forma de ver o mundo e de senti-lo está muito ligada à luz do sol, que fornece diariamente luminosidade, que desenha o dia e serve de marcador temporal. Há quem diga que os dias ensolarados são mais felizes, e que os dias mais cinzentos são mais tristes. Isso diz muito sobre como a luz influencia o humor. A luz, em dia de céu limpo, atinge os materiais, refletindo a cor de maneira mais vibrante, enquanto em dias cinzas, a luz se distribui de forma difusa, não refletindo, por isso, a vivacidade da cor. 105
A ausência de sombras e uma luz muito difusa, típicas de um céu encoberto, deixam todos os objetos com uma aparência plana. Por outro lado, um ambiente luminoso com fortes sombras, típico de um céu claro, intensifica o relevo e a plasticidade dos objetos (BARBOSA, 2010, p. 36).
A luz solar proporciona, também, alterações de cor durante sua trajetória ao longo do dia, desde o nascer do sol, com uma luz mais amarela; a luz mais branca ao meio-dia, e as nuances de laranja e rosa no pôr do sol. A manipulação da luz, tanto natural quanto artificial, na arquitetura e na cenografia tem o intuito de moldar o espaço, destacar volumes, mostrar ou não os seus limites, revelar ou não certas percepções visuais de textura, tornar certos objetos na cena mais nítidos, criar foco de atenção e ilusão de profundidade. A luz altera a percepção da forma. Conforme as proporções do espaço, a iluminação pode alterar esta percepção alongando ou encurtando. A aparência da forma é interpretada através da direção e intensidade da luz. Alterando a luz de um ambiente não apenas redefinimos seus contornos e limites, mas também reinterpretamos suas características e significados (BARBOSA, 2010, p. 36).
É difícil separar a luz da arquitetura e da cenografia. Sem ela não haveria o entendimento do espaço, a compreensão dos volumes, e a nitidez. Ambas valem do jogo de supressão ou não da luminosidade para conformar volumes, ressaltar eixos visuais, destacar texturas e cores. Na história da humanidade, a luz se torna objeto de estudo e investigação desde a pré-história, a partir da busca por abrigo durante a noite – pela ausência de luz para ver os predadores; e a descoberta e manipulação do fogo. Além da manipulação da luz através do fogo, diversas civilizações começaram desenvolver relações religiosas com elementos naturais e astros luminosos, como é o caso da relação do sol com o deus Rá, no Egito. 106
É no Egito que se tem o registro, na história, do nome do primeiro arquiteto, “(...) chamava-se Imhotep, conforme inscrições em uma estátua do faraó Zozer (2635-2595 a.C.)” (SCARAZZATO, 2018, p. 13). Uma grande quantidade de obras do antigo Egito é referenciada de acordo com o sol, tendo suas portas voltadas para o nascente do astro. A luz também foi manipulada pelos arquitetos egípcios, a partir das diferenças de alturas e aberturas quem eram projetadas para que a luz pudesse iluminar os espaços. É o exemplo do Grande Templo de Amon-Rá (1530 a.C.), em Karnak, a Sala Hipóstila, sobre a qual Paulo Sergio Scarazzato diz: “A iluminação da nave central era assegurada pela diferença entre o seu pé-direito e o das naves laterais (...)” (SCARAZZATO, 2018, p. 14). Segundo Scarazzato (2018, p. 15), a arquitetura da Grécia Antiga (750-350 a.C.) se apoia na arquitetura egípcia “(...) tanto no formato das plantas como no emprego das colunas, evoluiu e adquiriu personalidade própria”. Os edifícios eram feitos para serem contemplados do lado de fora, não para serem habitados, por isso a questão rítmica e de proporção eram as mais enfatizadas. Diferentemente dos templos que eram para serem vistos, os gregos fizeram estudos de insolação para traçar suas cidades, e desenhar suas casas a fim de ter maior aproveitamento solar. Os gregos também inovaram no traçado das cidades, que contribuíram para com as questões de iluminação natural e insolação, sobretudo na arquitetura residencial. A utilização de relógios solares, introduzidos por Anaximandro de mileto (610546 a.C), a criação de quadras ortogonais nos sentidos NorteSul e Leste-Oeste por Hipódamo de Mileto (498-430 a.C), e o conhecimento do clima, induziram à construção de casas projetadas para aproveitar o sol do inverno, com ambientes principais voltados para o Sul, orientação mais insolada no Hemisfério Norte (SCARAZZATO, 2018, p. 16).
A arquitetura romana foi influenciada pela grega. As ordens Dórica, Jônica e Corintia foram “(...) adaptadas, embelezadas e reinterpretadas” (SCARAZZATO, 2018, p. 17). A coluna se torna elemento decorativo, enquanto a parede se torna estrutura. Também surgem formas redondas e ovais, além do desenvolvimento do arco, abóbada e cúpula. Scarazzato (2018) diz que estes avanços foram importantes para criar grandes 107
espaços internos, sendo necessário pensar em aberturas, já que os edifícios religiosos eram feitos para os fiéis entrarem. O Panteão (120-124 d.C.) (Imagem 46) é um exemplo do emprego das novas formas construtivas: é um templo circular com uma cúpula com uma abertura (óculo) para entrada de luz, abertura essa que simbolicamente “(...) representa a união da Terra com o Céu, do profano com o sagrado e, através dele, a oração ascende livremente ao paraíso (LOW, 2013 apud SCARAZZATO, 2018, p. 18). Essa simbologia da relação da luz com o divino perpassa por várias civilizações e séculos, mas podemos dizer que é na arquitetura gótica que essa relação se torna peça fundamental das catedrais. Como exemplo podemos referenciar a Catedral de Notre-Dame de Paris (11361250), que de acordo com Scarazzato (2018, p. 32) “(...) foi uma das primeiras grandes catedrais (...) com janelas altas acima do trifório, formadas por granes vitrais coloridos”. Outra construção que pode ser citada é a Sainte-Chapelle (1241-1248) (Imagem 47), também em Paris. A luz nas catedrais góticas representa um logro estético carregado de simbolismo. Ela atua na “desmaterialização” visual dos elementos construtivos do edifício, ao mesmo tempo em que se torna uma metáfora da presença divina entre os homens (CASAL, 1978 apud SCARAZZATO, 2018, p. 32).
No Renascimento “a arquitetura, por sua vez, deixaria de se condicionar às tradições da igreja, e focaria a precisão matemática e a racionalidade (...) E não precisaria mais apontar para o céu (...)” (SCARAZZATO, 2018, p. 34). A cúpula passa a ter uma maior importância no edifício religioso, a luz se apresenta mais difusa entrando pelas aberturas, como é possível ver na Cúpula da Catedral de Santa Maria del Fiore (Imagem 48). Já na transição do Renascimento para o Barroco, segundo Scarazzato (2018), surge uma sutileza no trato com a luz natural, para assim se conseguir uma dramaticidade e ênfase nas formas. A Revolução Industrial no século XVIII, dá início a uma drástica mudança nas cidades e na arquitetura. Cohen (2013, p. 23) destaca que “(...) muitos contemporâneos reconhecem os novos horizontes 108
Imagem 46: Panteão, Roma-Itália. WEB
Imagem 47: Sainte-Chapelle,Paris-França. WEB
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abertos pelos grandes pavilhões de ferro e vidro erigidos para atender às necessidades da Revolução industrial e das políticas públicas”. É no século XIX que há um aumento do desenvolvimento das estruturas autoportantes, modulares – como as pontes metálicas –, e do uso de vidro a promover uma montagem de um edifício em menor tempo. No período Moderno, as mudanças se tornam constantes, com a luz elétrica ganhando força, e as estruturas começam a ser cada vez mais esbeltas. As paredes começam a dar lugar a peles e vidro, diluindo o interno com o externo. Os estudos de Le Corbusier sobre luz e sombra resultam em projetos como a Villa Savoye (Imagem 49): Entre o térreo – espaço em que os carros podem circular em volta dos pilotis – e o solário na cobertura fica ao andar principal com planta em L, disposto em torno de um pátio e iluminado por janelas horizontais em fita, voltadas para o campo (COHEN, 2013, p. 127).
O estudo da luz, e sua manipulação, é algo constante na arquitetura. Diversos arquitetos contemporâneos têm trabalhos belíssimos em que a luz não só age com intuito de iluminar, mas também de conformar, construir camadas de sensações com os corpos que permeiam o espaço. No projeto da Igreja da Luz (Imagem 50) em Ibaraki, Japão, o arquiteto japonês Tadao Ando utiliza a luz não como um elemento imaterial, mas como um elemento que preenche o recorte em cruz no concreto, como diz Kate Nesbitt (2008, p. 493): “Embora muitas vezes o concreto pareça ser o único material, Ando também encaminha o uso da luz e do vento como elemento físico de suas construções”. No texto Por novos horizontes na arquitetura, o arquiteto afirma que busca criar conexão e sensibilidade a partir da presença da natureza “(...) mediante uma lógica transparente” (ANDO, 2008, p. 496). Para ele, fazer sentir a presença da natureza é um dever da arquitetura contemporânea. Quando a água, o vento, a luz, a chuva e outros elementos naturais são abstraídos na arquitetura, esta se transforma em lugar no qual as pessoas e a natureza se defrontam em permanente estado de tensão. Creio ser esse sentido de tensão que poderá despertar 110
Imagem 48: Sainte-Chapelle,Firenzi - Itália. WEB
Imagem 49: Villa Savoye, foto:Angel Fernandez Orozco, Poissy - França. WEB
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as sensibilidades espirituais latentes no homem contemporâneo” (ANDO, 2008, p. 497).
Os projetos do arquiteto português Álvaro Siza, como a Fundação Iberê Camargo em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, e o Museu de Arte Contemporânea de Serralves, em Porto, Portugal, vão em uma direção diferente daquela de Tadao Ando. Siza constrói percursos internos em seus edifícios com aberturas que se voltam para paisagens e criam sensações no indivíduo espectador. É a partir destas aberturas, e também de zenitais, que ele conforma o espaço interno. No exterior, ele usa da sombra e do contraste para modelar os volumes, que em sua maioria são brancos. Atualmente, diferentemente da arquitetura, a cenografia – principalmente de shows – utiliza a luz para a construção de cenários. Se pararmos para analisar as cenografias propostas para os grandes concertos em arenas e estádios, elas se compõem em sua maioria de holofotes que emitem diferentes cores, e de telões de LED que projetam imagens. O desenvolvimento da cenografia de shows – apoteóticos, podemos dizer – se dá muito a partir dos anos de 1980, sobretudo nos Estados Unidos e na Europa. Grupos como The Jacksons e Queen arrastavam multidões para seus espetáculos que eram feitos em arenas ou em estádios. Hoje é de fácil acesso registros audiovisuais de espetáculos, estando muitos disponíveis no Youtube. Nos anos de 1980, analisando os registros de dois shows de diferentes artistas, percebe-se um esforço enorme para a obtenção de diferentes cores e direcionamentos das luzes: em The Victory Tour 8(1984) (Imagem 52), do grupo The Jacksons, há estruturas enormes nas laterais do palco, com diferentes holofotes enfileirados. Cada conjunto desses holofotes apresenta uma cor diferente de iluminação, e o mesmo ocorre The Jacksons – The Victory Tour <https://www.youtube.com/watch?v=OJN_1uxT8JE&t=563s>. 8
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Imagem 50: Igreja da Luz, Tadao Ando, Ibaraki - Japão. WEB
Imagem 51: Fundação Iberê camargo, Álvaro Siza, foto: Fernando Guerra, Porto Alegre - Brasil. WEB
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ao fundo e no “teto”. O único movimento que ocorre é dos holofotes que iluminam os cantores, como acontece no teatro, guiados por uma pessoa. Estas estruturas de iluminação também são vistas no show histórico do Queen no Wembley Stadium9 em Londres (Imagem 53), no ano de 1986. A apresentação, na íntegra on-line, traz Freddie Mercury com sua jaqueta amarela iniciando o show no entardecer cinza de verão londrino. Percebe-se uma estrutura cenográfica com escadas, uma moldura no entorno do palco, mas a luz se comportava como no show dos The Jacksons, estática, e piscava constantemente. Há um telão neste concerto, mas ele não era usado como apoio para o cenário, estava sendo usado como suporte para as pessoas que estavam longe verem o artista “ampliado”. Dois anos depois, e no mesmo estádio do show do Queen, Michael Jackson apresentou sua Bad World Tour10. Percebe-se uma sofisticação do concerto no geral: há uma divisão do show em blocos, e também trocas de figurino. No quesito cenário, não há tanta mudança. Apesar de já ter holofotes que conseguem emitir diversas cores, é visível no palco o número de holofotes fixos. Talvez seja Madonna, com sua Blond Ambition Tour11 (Imagem 54) em 1990, que tenha feito a maior mudança na história dos shows, tendo ela criado uma fórmula seguida por diversos artistas. O espetáculo se dividia em blocos temáticos, onde a cenografia mudava conforme a temática. Para isso, uma cortina descia e subia no palco, trazendo um ar teatral para o show. Madonna também inseriu bailarinos e trocas de
Queen – Live Wembley Stadium <https://www.youtube.com/watch?v=-DAvQcP1dlE>. 10 Michael Jackson – Bad World Tour <https://www.youtube.com/watch?v=9shByOh8fVE>. 11 Madonna – Blond Ambition Tour <https://www.youtube.com/watch?v=O1q8OUcOFQ8&t=4572s>. 9
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Imagem 52: The Jacksons - The Victory Tour, WEB
Imagem 53: Queen Live Wembley Stadium, WEB
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roupas desenhadas por Jean-Paul Gaultier, o criador do emblemático sutiã cônico. No quesito iluminação, as enormes placas de luz se desfaziam, tornando um elemento menos pesado, para que a atenção ficasse no cenário. Em 1993, Madonna embarca em uma nova turnê, a The Girlie Show12, na qual ela repete sua fórmula teatral, cria temáticas, figurinos, e insere um maior corpo de baile. A cenografia é menos requintada que a de sua turnê anterior. A iluminação não apresenta grandes alterações, mas há a inserção de elementos pirotécnicos como o fogo. Na turnê History13 (1996) de Michael Jackson, incrementos são visíveis. Os holofotes que giram e mudam de cor são usados no fundo do palco, enquanto nas laterais os holofotes fixos permanecem. O artista usa um telão central para projetar vídeos e imagens durante algumas músicas, instituindo o uso deste artifício como parte do cenário, e não mais só como apoio para o público. É neste show que Michael Jackson utiliza a grua para sobrevoar o público. No fim dos anos de 1990, os shows das boy bands – bandas formadas por garotos como Backstreet Boys14 (Imagem 55) – começam a usar de elementos cada vez mais mirabolantes para construírem seus espetáculos. Cabos de aço que suspendem os cantores, fogo, fogos de artifício, telões com projeções e muita luz. Se o fim da década de 1990 foi extravagante, os anos 2000 foram o dobro disso. Cada vez mais os artistas buscam artifícios para criar espetáculos luminosos, cheios de projeções e aparatos tecnológicos. Em 2004, a cantora americana Britney Spears sai em turnê em suporte ao seu
Madonna – The Girlie Show <https://www.youtube.com/watch?v=KgrbXDSSekQ>. 13 Michael Jackson – History Tour <https://www.youtube.com/watch?v=ChrLRauOR28&t=823s>. 14 Backstreet Boys – Millenium Tour <https://www.youtube.com/watch?v=o_KRcrMD5uU>. 12
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Imagem 54: Madonna, Blond Ambition Tour, WEB
Imagem 55: Backstreet Boys, MIllenium Tour, WEB
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quarto álbum de estúdio In The Zone. Intitulada The Onyx Hotel Tour15 (Imagem 56), a turnê contava com muitos dançarinos, explosões de fogo, diversos figurinos e uma história a ser contada. O show se dividia em blocos temáticos, e esses eram apresentados como uma estadia em um hotel: desde a chegada da hóspede ao local, o bar do hotel, o jardim da construção, e a suíte. O cenário era inteiramente montado por telas de LED, que exibiam projeções que davam suporte à narrativa. Dois anos depois, Madonna inicia uma turnê que, para muitos fãs, é uma de suas mais belas apresentações. The Confessions Tour16 (Imagem 57) apresenta um palco principal retangular com uma plataforma circular ao meio, a qual girava e abaixava para a abrigar as trocas de cenário. Acima desse círculo ficava uma estrutura semicircular de LED, e outras três telas de LED configuravam o cenário. Do palco principal saiam três passarelas, duas nas laterais criando uma diagonal, e uma principal no meio que dava acesso a um palco menor, cujo piso era formado por placas de LED. Apesar da quantidade de LED, as projeções eram belissimamente construídas, e a iluminação através dos canhões de luz trabalhavam de forma pontual. A partir daí, não havia mais limites para o uso da luz em forma de telões de LED. Em 2008, a cantora australiana Kylie Minogue apresenta sua KylieX2008 Tour17 (Imagem 58), onde o palco inclinado era inteiro de LED e, ao fundo, seis telões retangulares faziam movimentos e projetavam vídeos. Em 2016, a cantora americana Beyoncé sai em turnê com a Formation Tour (Imagem 59), realizada inteiramente em estádios. O cenário consistia em um paralelepípedo de LED disposto verticalmente, que rotacionava 360° e abria ao meio. A estrutura era tão monumental que era possível se ver do lado de fora dos estádios.
Britney Spears – The Onyx Hotel Tour <https://www.youtube.com/watch?v=aa6b-MS-Gk&t=3985s>. 16 Madonna – The Confessions Tour <https://www.youtube.com/watch?v=OOkGvP0D4Bg>. 17 Kylie Minogue – KylieX2008 Tour <https://www.youtube.com/watch?v=Rrv49hK44lk&t=6049s>. 15
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Imagem 56: Britney Spears, The Onyx Hotel Tour, WEB
Imagem 57: Madonna, The Confessions Tour, WEB
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Em 2018, Beyoncé fez sua apresentação como artista principal do Coachella18, um dos diversos festivais de música que acontecem nos Estados Unidos da América. Ao contrário do que fez em 2016, neste show ela não utilizou telões de LED como suporte cênico. Eles existiam nas laterais, mas eram estruturas próprias do festival, e serviam de auxílio para a plateia que estava distante pudesse acompanhar os detalhes da performance. O cenário que Beyoncé criou era inspirado nas arquibancadas das universidades americanas, onde as bandas marciais tocavam, enquanto as líderes de torcida dançavam. Uma estrutura piramidal de ferro repleta de canhões de luz “cobre” a superfície do palco. Ao início da música, ela, a estrutura, inicia um movimento de elevação revelando outra estrutura piramidal, que se assemelha a uma arquibancada: é nela que os músicos e dançarinos ficam. Os holofotes são postos como elementos constituintes do cenário. Diferentemente dos shows internacionais, os concertos brasileiros não têm tanto patrocínio e incentivo, salvo alguns artistas que realizam grandes shows específicos para o registro em formato áudio visual. Um exemplo disso é o recente show de “reencontro” da dupla Sandy & Júnior19. Em uma série de shows ao redor do Brasil, a dupla apresentou um cenário consistente, e de acordo com o que vem sendo feito nos shows de fora do país. Muitas luzes, telões de LED e projeções bem elaboradas. Uma artista que trabalha com cenários requintados é Maria Bethânia. Em Tempo, tempo, tempo, tempo, turnê20 de 2005, a luz é utilizada por meio de projeções de grafismos simples, há cores sólidas dispostas ao fundo do palco, enquanto blocos luminosos geométricos sobem e descem, se revelando no espaço a partir do jogo de luz. Disponível na plataforma digital Netflix - Homecoming: A film by Beyoncé. Disponível na plataforma digital Globoplay - Sandy & Junior: Nossa História. 20 Maria Bethânia – Tempo, tempo, tempo, tempo <https://www.youtube.com/ watch?v=zGG5YIGcVHA&t=1359s>. 18
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Imagem 58: Kylie Minogue, KylieX2008 Tour, WEB
Imagem 59: Beyoncé, The Formation Tour, WEB
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Em 2012, na série de shows Carta de Amor21, a cenografia é ditada pelo movimento das inúmeras lâmpadas, tipo incandescentes, que ficam penduradas no palco. Elas se movem verticalmente e lateralmente dando movimento, e configurando formas. Durante todo o show, só existe Bethânia, os músicos, o chão de retalhos de tecido que lembram folhas secas, um toco de árvore, e as lâmpadas. Apenas ao fim do show as luzes saem de cena e é apresentada ao fundo uma pintura perspectivada, que lembra uma pintura de ópera barroca. Para comemorar os seus cinquenta anos de carreira, Maria Bethânia convida Bia Lessa para assinar a produção do espetáculo Abraçar e Agradecer22 (Imagem 60). No chão do palco há um telão de LED que exibe texturas e imagens. Bethânia desliza sobre ele graciosamente enquanto canta seus sucessos de carreira. Sobre os músicos, luminárias de vidro que se acendem e apagam, dependendo do contexto do espetáculo. Os canhões de luz são usados para imprimir grafismo no espaço, as luzes percorrem o palco em diagonal, na vertical e horizontal. É bonito ver Bethânia, que sempre esteve em cenografias mais teatrais, desta vez imersa em um cenário high tech.
Maria Bethânia – Carta de Amor <https://www.youtube.com/watch?v=dU4XQODt5WI&t=4775s>. 22 Maria Bethânia – Abraçar e Agradecer <https://www.youtube.com/watch?v=EOmi_ Fg9IDg&t=4523s>. 21
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Imagem 60: Maria Bethânia, Abraçar e Agradecer, WEB
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KANYE WEST, ES DEVLIN E THE SAINT PABLO TOUR
Kanye West é um artista norte-americano multifacetado. Seus trabalhos se desenvolvem no campo da música – como rapper, compositor, produtor musical; e também com direção de arte e designer de roupas. Durante anos, Kanye trabalhou com a cenógrafa inglesa Es Devlin em suas turnês, mas para a turnê Saint Pablo, em específico, ele deixou a cargo da empresa de conteúdo criativo DONDA, ao qual ele é atrelado. Kanye sempre buscou para as suas apresentações uma inventividade, e foi com Es Devlin que ele inicia uma parceria de experimentações cênicas interessantes. Em 2008, em Glow In The Dark Tour (Imagem 61), eles criam um palco que simula nuances de dunas de areia no qual ao centro repousa uma plataforma de LED que se movimenta para elevar ou projetar o cantor para frente. Atrelado a esse palco, está um imenso telão de LED de fundo, e outro menor que sobe e desce criando relação direta com a plataforma, já que ambos têm a mesma largura. Em 2011, Es Devlin desenha o cenário para a Watch The Trone Tour (Imagem 62), turnê colaborativa entre Kanye West e o rapper Jay-Z. Devlin descreve a cenografia que ela cria na série documental Abstract: The Art of Design – Netflix. Segundo ela, o título da turnê (“Observe o 124
Imagem 61: Kanye West, Glow in The Dark Tour, WEB
Imagem 62: Kanye West e Jay-Z, WTT Tour, WEB
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Trono”) a direciona a criar dois cubos de LED de 4 metros, além do palco principal. Cada um dos rappers cantaria sobre os cubos que representam o distanciamento do trono, mas também evidenciariam a vulnerabilidade do mesmo, já que o público dominava o entorno. A Yeezus Tour (Imagem 63) é a turnê de suporte do álbum Yeezus (2013). O nome do disco é a mistura entre o apelido do rapper “Yeezy”, com “Jesus”. Talvez tenha partido daí, e da música “I am a God” – “eu sou um Deus”, em tradução livre –, que se inicia o desenvolvimento da cenografia. O cenário consistia em um palco em forma de montanha, branca, cujo aspecto remete ao mármore, uma passarela que dava acesso a um segundo palco triangular com a mesma textura de pedra branca, e um grande círculo de LED que se inclinava. West, em confronto com esse cenário, aparece como um deus sobre a montanha, iluminado por um enorme sol. Mais tarde, para a Saint Pablo Tour, Es Devlin não figura como colaboradora na criação do cenário. A equipe do DONDA é quem assina o projeto. A partir dos registros disponíveis on-line – vídeos no Youtube e imagens do Google – é possível perceber que o intuito da cenografia era promover uma experiência mais ativa, e talvez menos contemplativa como a turnê anterior. Segundo artigo da INTERIORS Journal, publicação on-line sobre o espaço entre Arquitetura e Filme, para o ArchDaily, o palco se compõe em duas partes. A primeira é uma superestrutura que fica pendurada no teto das arenas em que o show será realizado, e a segunda é uma estrutura menor, uma plataforma suspensa. A superestrutura (Imagem 64) é formada por duas vigas maiores posicionadas no maior sentido da arena, e possibilitam o deslocamento longitudinal da estrutura menor. Juntamente a esta estrutura ficam placas com canhões de luz que se desprendem do teto e realizam diversos movimentos, como se aproximar e recuar do público.
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Imagem 63: Kanye West Yeezus, Tour, WEB
Imagem 64: Kanye West Saint Pablo Tour, Desenho feito pela equipe INTERIORS Journal, WEB
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A partir das grandes vigas, é suspensa por cabos e polias, uma estrutura secundária que é a que permite a plataforma suspensa a fazer movimentos transversais. Esta passarela (Imagem 65) também realiza movimentos de se aproximar do público e se inclinar. É nessa passarela que o cantor fica. Há uma esrutura de LED, mas o destaque são as centenas de canhões de luz (Imagem 66), o movimento da plataforma e o cantor.
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Imagem 65: Kanye West Saint Pablo Tour,WEB
Imagem 66: Kanye West Saint Pablo Tour, WEB
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JEAN NOUVEL, LUZ E LOUVRE ABU DHABI
Ao olhar a extensa lista de projetos do arquiteto francês Jean Nouvel, nota-se que o manuseio da luz é algo que o instiga, seja no controle da luz, como na escolha dos materiais transparentes, reflexivos e opacos. O Instituto do Mundo Árabe (Imagem 67), Paris-França, projeto de 1981-1987, é um exemplo belíssimo de manuseio da luz. Enquanto a fachada norte, que tem menos incidência solar, é totalmente envidraçada, a fachada sul apresenta um elemento a mais. Em seu website, o arquiteto diz que o tema “luz” está atrelado a fachada sul, a qual ele cria painéis com diafragmas tipo câmera fotográfica, que abrem e fecham a fim de controlar a entrada de luz, da mesma forma que seus desenhos remetem ao muxarabi. O jogo de luz proporcionado pelas diferentes aberturas contribui para a construção dos espaços internos. Diferentemente do Instituto do Mundo Árabe, a Fundação Cartier (1991-1994) (Imagem 68) não apresenta elementos “filtrantes” da luz. Ela é completamente envidraçada, tanto o muro que faz divisa com a rua, quanto o edifício, criando camadas que refletem o entorno arborizado do parque, no qual a fundação se insere. A luz natural perpassa por entre as copas das árvores e chega até as salas expositivas envidraçadas, criando uma conexão do externo com o interno. 130
Imagem 67: Instituto do Mundo Árabe, Jean Nouvel, WEB
Imagem 68: Fundação Cartier, Jean Nouvel, WEB
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Com suas telas de vidro, a Fundação Cartier apresenta uma construção quase imaterial, toda transparente e com reflexos que mudam de aspecto e de cor de acordo com os momentos e as estações. Não se trata mais de inventar uma leveza de construção, mas de “construir com a luz”, desmaterializar a arquitetura pela luz, pelos efeitos efêmeros e pelos reflexos caleidoscópicos do entorno (LIPOVETSKY, 2016, p. 234).
Já em seu projeto na Austrália, o One Central Park (2008-2014), o arquiteto se alia ao artista e botânico francês Patrick Blanc para criar um jardim vertical que cobre cinquenta porcento da fachada do edifício. Segundo consta no website, o intuito do jardim vertical é filtrar a luz direta do sol. Outra estratégia para controlar a luz, mas agora para direcioná-la, é o helióstato. Ele é instalado no balanço entre as duas torres, para que seja possível direcionar a luz para o espaço entre elas. Todos os climas gostam de exceções. Mais quente quando está frio. Mais frio nos trópicos. As pessoas não resistem bem ao choque térmico. Nem as obras de arte. Essas observações elementares influenciaram o Louvre Abu Dhabi. Ele deseja criar um mundo acolhedor, combinando serenamente luz e sombra, reflexão e calma. Quer pertencer a um país, à sua história, à sua geografia sem se tornar uma tradução plana, no pleonasmo que resulta no tédio e na convenção. Também visa enfatizar o fascínio gerado por encontros raros (NOUVEL)23
“All climates like exceptions. Warmer when it is cold. Cooler in the tropics. People do not resist thermal shock well. Nor do works of art. Such elementary observations have influenced the Louvre Abu Dhabi. It wishes to create a welcoming world serenely combining light and shadow, reflection and calm. It wishes to belong to a country, to its history, to its geography without becoming a flat translation, the pleonasm that results in boredom and convention. It also aims at emphasizing the fascination generated by rare encounters”(NOUVEL) 23
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Imagem 69: One Central Park, Jean Nouvel, WEB
Imagem 70: Louvre Abu Dhabi, Jean Nouvel, WEB
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O trecho anterior foi extraído do website do Atelier, e foi escrito pelo Arquiteto. Nele ele exprime o desejo de criar um ambiente acolhedor e sereno a partir da arquitetura, do local e também do controle da luz, criando espaços de luz e sombra. O lugar é formado por blocos brancos, que são as salas expositivas, e uma cúpula de 180 metros de diâmetro que repousa sobre eles. A luz perpassa por este domo, que tem um desenho geométrico que, assim como o Instituto do Mundo Árabe, remete aos muxarabis. O efeito resultante é uma “chuva de luz” como descrito no texto do arquiteto.
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Imagem 71: Louvre Abu Dhabi, Jean Nouvel, WEB
Imagem 72: Louvre Abu Dhabi, Jean Nouvel, WEB
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DIÁLOGO
Pensar no que a luz representa é abrir um leque de possibilidades. Falar da luz pode ser apenas falar de iluminação, ou de nuances cromáticas no céu durante o dia, ou quem sabe uma aurora boreal na Noruega. A luz pode ser um facho de esperança para o bordão “luz no fim do túnel”, ou então significar vida – ela deu à luz a um bebê. A luz, como já dito, também pode significar o contato do divino na terra, ou pode definir o humor do dia. Pensar a luz é entrar em contato com a criação de sensações no indivíduo, seja ela qual for. Ambas as obras, o Louvre Abu Dhabi e o cenário da Saint Pablo Tour, utilizam da luz para abrir e atingir um espectro de possibilidades. Seja a comunicação, a conformação do espaço, o direcionamento de foco/atenção para um ponto, a sensação de imersão e a leveza. Tomando como ponto de partida a leveza, Gilles Lipovetsy, em seu livro Da leveza, aborda a sociedade atual a partir da ideia de que ela vive do “leve”, a exaltação ao estilo de vida leve, ao corpo leve – magro, aos eletrônicos que se apresentam leves: A leveza, que era um ideal estilístico ou um defeito moral, tornou-
se uma dinâmica global, um paradigma transversal, um “fato social total” carregado de valor tecnológico e econômico, funcional e psicológico, estético e existencial (LIPOVETSKY,2016, p. 24). 136
Dessa forma, inicia-se um combate ao “peso”, que pode ser o excesso de ornamentos, o que vai além do necessário, o que é exagerado. Tomemos como ponto de partida o texto de Lipovetsky, com o exemplo dos produtos industrializados antigos que eram pesados, robustos, e que por conter estes atributos, passavam a ideia de longevidade - e o que era leve então se aproximava da vulnerabilidade, do descartável. Hoje entende-se que a premissa não é verdadeira. Há uma busca incansável na redução de linhas e na supressão de volumes, por exemplo. Dentre os vários arquétipos da leveza listados pelo autor, o da leveza aérea se encaixa bem nestes dois projetos utilizados como referência para este trabalho. O sonho de se elevar aos céus é imemorial. Inúmeros são os mitos, os contos, as crenças religiosas que expressa essa fascinação por meio das imagens ascensionais, das representações da elevação, dos símbolos destinados a alcançar o céu (LIPOVETSKY, 2016, p. 26).
O projeto do Louvre Abu Dhabi não é exatamente uma tentativa de levitação do espaço e/ou do ser, mas de proporcionar a sensação de leveza, suspensão e flutuação do domo gigantesco sobre os visitantes. O arquiteto Jean Nouvel apoia esta enorme estrutura em quatro pilares camuflados entre as diversas paredes dos blocos brancos. Dessa forma, ele utiliza menos área de apoio, culminando em menor associação do domo com a base, - é uma retirada de volumes, deixando boa parte da borda do domo em balanço. É o que Lipovetsky diria como “(...) um trabalho de subtração de “peso” que se conquista o belo, o verdadeiro e o essencial” (LIPOVETSKY, 2016, p. 225). A enorme escala da estrutura corrobora com o efeito flutuante ao bloquear as vistas destes pontos de apoio, camuflados entre raios de luz que perpassam pela grande estrutura. Além disso, as salas expositivas são volumes brancos que ampliam a sensação de leveza a partir da cor. A própria forma do domo, curvada em direção ao céu, propicia o esfacelamento da estrutura metálica que ao receber os raios solares os reflete criando uma espécie de névoa de luz interna. Esse efeito de 137
libertação do peso por meio da diluição do peso da estrutura acontece nas catedrais góticas como dito por Lipovetsky: “(...) é seu impulso na direção do céu, dá a impressão de se ter libertado do peso da pedra e da gravidade material” (LIPOVETSKY, 2016, p. 174). Essa diluição na catedral se dá muito pelo efeito da luz perpassando os vitrais multicoloridos e criando um efeito de luminosidade interna. Também com o intuito de gerar leveza a partir da luz, mas por meio da luz artificial, o show do cantor norte-americano Kanye West brinca com princípios básicos de claro e escuro. A estrutura cenográfica, sem estar em ação – ativada no concerto – se apresenta pesada. Vigas metálicas enormes cortam o teto da arena, placas com canhões de luz formam um enorme peso sobre o público. Ao iniciar o show, tudo isso some, ao passo que o ambiente está imergido em escuridão. A luz emanada destas estruturas, que se movimentam lentamente iluminando o espaço, camufla a parafernália pesada que se via antes, tornando-a leve. O cantor está a alguns metros abaixo desta estrutura luminosa flutuante, sobre uma plataforma igualmente iluminada, os fios que sustentam a estrutura do artista se desmancham no ar com a intensidade de luz emanada no espaço. A cena parece até messiânica: um ser sobre uma estrutura flutuante sobre a multidão. Talvez tenha sido este o real intuito, já que o artista já havia dito anteriormente que era um deus. Querendo ou não, a ideia de levitação remete a leveza do ser, e flutuar sobre um espaço é comum na religião. O artista que tem os seus fiéis, fãs, é o “pastor” deste rebanho. Para além da questão da leveza, estes dois projetos utilizam da luz como modelador do espaço, criador de pontos de ação e catarse. Jean Nouvel cria um espaço de passagem e contemplação sob o domo, seja do domo ou dos recortes que dão vista para o mar, a cidade e para outros blocos do museu. Nesse “miolo”, a ação da luz no domo capta a atenção do público, que faz pausa entre as galerias para admirar tal estrutura. A revolução da leveza está duplamente na origem das arquiteturasespetáculos, em razão do papel crucial dos softwares e também pelo impacto das lógicas de comunicação, de marketing e 138
de divertimento, impulsionadas pelo capitalismo da sedução (LIPOVETSKY, 2016, p. 223).
Essa contemplação do domo se dá justamente pela arquitetura do museu ser espetaculosa, no sentido de midiática, comunicativa e, por que não, cênica. Dá-se também crédito aos novos meios tecnológicos – softwares – que possibilitam cada vez mais a execução e modelagem de estruturas diversas. Outro ponto é a associação do nome Louvre a este espaço, trazendo um peso de importância. Sobre essas arquiteturas espetaculosas Lipovetsky diz: Os novos museus, com formas espetaculares, celebram muito mais o universo do lazer e do divertimento do que a elevação espiritual. Não se trata mais, na civilização da leveza, de criar grandeza, mas de produzir evento e imagem, erguer edifícios capazes de seduzir imediatamente os consumidores, melhorar a imagem da marca das cidades, em competição com as outras. A arquitetura-espetáculo aparece como uma das expressões lúdicomidiáticas do mundo da leveza consumerista (LIPOVETSKY, 2016, p. 224).
Neste trecho, Gilles Lipovetsky ressalta palavras que se aplicam diretamente ao museu em questão, mas que se ligam completamente com a cenografia. A intenção de ambos é o divertimento e o lazer, ao criar-se uma estrutura sedutora, instigante que capta o olhar e o interesse do ser a partir do inusitado. O “produzir evento e imagem” se aplica muito bem nos dois casos, uma vez que a sociedade vive atualmente da imagem produzida em telas retangulares, ao estar em lugares e registrar os momentos. Tanto o Louvre Abu Dhabi, como o Saint Pablo Tour criam, principalmente, e a partir da luz, este evento, esta atmosfera - propiciada, sobretudo, pelo enquadramento de imagem. O que une os dois projetos é a luz. Embora não haja uso da luz natural no cenário, a luz artificial faz parte de ambos. No museu ela é usada como um revés da luz natural, pois durante o dia a ela penetra o domo, criando efeitos óticos internamente; e durante a noite o efeito é inverso, criando-se um domo estrelado para a cidade – isso foi quisto pelo arquiteto e descrito em seu website. No show, a luz se apresenta 139
como um sol – uma tonalidade amarela é usada –, o que remete muito ao trabalho The weather project (2003), do artista dinamarquês com ascendência islandesa Olafur Eliasson. O trabalho realizado na Tate Modern em Londres, busca, com base no assunto climático, explorar ideias sobre experiência, mediação e representação. O que é apresentado ao público é uma representação do sol e do céu a partir de uma semiesfera composta por lâmpadas de mono-frequência, que fica presa a uma parede espelhada. Isso garante a ideia de um grande sol flutuando no espaço, como revela o artista em seu documentário para o Netflix chamado Abstract. A sala repleta de espelhos nas paredes e no teto expandem as paredes reais da galeria, e por meio de uma máquina de névoa, ele consegue criar uma ideia de espaço externo com sol e nuvens – o que contribui para a diluição do teto espelhado. A lâmpada de mono-frequência é comum em outras obras do artista. Ela permite a anulação das cores, deixando o ambiente apenas com visibilidade amarela e nuances de preto. A ideia de experiência se dá na imersão do público em um espaço que cria imagens antes imaginadas ao ar livre, e um pouco surreal – na possibilidade de contemplar o sol dentro de um espaço fechado. Com esse trabalho, ele ainda questiona a forma como o museu comunica (como faz a mediação com o espectador), por meio de propagandas, divulgação prévias de imagem e críticas de jornal. Por fim a representação: o artista não esconde a forma utilizada para garantir aquela ilusão, pois ele apresenta ao público o fundo da obra e suas “artimanhas” para conseguir tal efeito, atingido a partir da luz, seja pelo meio direto – luz como fonte; ou pelo indireto – reflexão da luz nos espelhos. A ativação da ação no show do Kanye West se dá completamente pela luz, pela aproximação dela ao público, ou pela sua intensidade. Ao ver registros amadores on-line, é possível notar o movimento ativo do público sob a plataforma-palco. O público reage intensamente como 23
Olafour ELiasson: The Art of Design - Disponível na plataforma digital Netflix
140
uma resposta ao evento ocorrido. A combinação música/imagem/ luz proporciona um evento catártico. Talvez este seja um dos poucos espetáculos em que a ativação do público se torna parte da experiência. Ao observar a luz no Louvre Abu Dhabi, ou na The Saint Pablo Tour, ou em uma obra de Olafour Eliasson, percebe-se que ela continuará sendo objeto de estudo e criação. Não é possível dissociar a luz da construção do espaço na arquitetura e na cenografia. Ambas se utilizam dela para a formação dos seus espaços, para a delimitação deles, para a criação de experiências óticas e sensoriais. A luz está presa em nossa história, ela está no cotidiano, e cabe ao corpo reagir aos estímulos dela.
141
Final
EFÊMERO ARTE AÇÃO CORPO
ESPAÇO CIDADE
CENÁRIO LUZ
PERFORMANCE
Nuvem de palavras, 2020
145
Imagem 73: Mapa Centro de São Paulo - Edifícios e Companhias Teatrais. Pedro Bergi
146
FÁBRICA DE POSSIBILIDADES CENOGRÁFICAS
A nuvem de palavras foi o primeiro produto a ser feito para iniciar o desenvolvimento da proposição projetual. O posicionamento espacial de palavras serviu como guia. A multiplicidade de formas que a nuvem pode especializar, ainda que impalpável, elucidou diretrizes a serem perseguidas. As palavras Cenografia e Arquitetura guiaram até a Grécia, berço do desenvolvimento da cenografia, juntamente com o edifício teatral. A princípio, construir um teatro para cenografias diversas parecia uma opção, mas não se mostrava suficiente, afinal a cenografia, nos dias de hoje vai além do teatro, vai além do edifício. Cenografia, hoje, está em um desfile de moda, em um show de música, em uma premiação de cinema, em um estande de uma feira, na vitrine da loja. Surge a questão: “onde se fabricam estes cenários?”. Pensar um espaço que fosse suporte e lugar cênico foi o passo seguinte. O espaço de suporte poderia ser, então, um local de criação, desenvolvimento, experimentação e construção dos cenários. O lugar cênico seria um local multiuso que permitisse diferentes configurações. Surge, assim, a ideia da Fábrica de Possibilidades Cenográficas. 147
Possibilidade não só por permitir criar cenários, mas por ser um lugar em que seu espaço pudesse ser usufruído como proposta cênica, que seus cheios e vazios propiciassem reflexões sobre novos meios de criação e execução. É construir um chassi, mas não colocar a tela. É dar espaço para encontro de coletivos, de criadores, troca entre as áreas de conhecimento, é ter uma serralheria, e também ter uma sala de ensaio. É concentrar em um lugar, para então expandir. O edifício não serviria somente para si, mas para um conjunto de espaços que habitam a cidade. Para os teatros, para as companhias que não tem espaço físico, para os blocos de carnaval de rua, para os grupos de dança, para quem precisa de suporte. Surge, dessa forma, a questão do terreno de implantação. Retomar o lugar de desenvolvimento do cenário, no teatro, foi um referencial. Inicia-se o mapeamento dos teatros e companhias de teatro na cidade de São Paulo, e percebe-se uma maior concentração e proximidade na região central (Imagem 73). A partir deste “zoom”, são mapeadas as ruas que costumam ser ocupadas pelo povo, sejam elas durante o carnaval, ou na Parada do Orgulho LGBTQIA+, em protestos políticos, manifestações de cunho social etc (Imagem 75). Por fim, foram mapeados os locais de permanência, praças e parques, que costumam ter manifestações artísticas. Praça Roosevelt, República, Rotary, Anhangabaú, Minhocão, todos em algum momento serviram para expressão popular (Imagem 75). O local em rosa (Imagem 76) marca o espaço que a fábrica vai ocupar, um terreno estreito na quadra de edifícios ícones de São Paulo, Copan, Zarvos, Itália e Louvre. O terreno apresenta duas faces, uma na Rua da Consolação e a outra, seis metros abaixo, na Rua José Paulo Mantovan Freire, a rua interna da quadra. A fachada da Rua da Consolação (Imagem 77) recua para convidar o corpo a adentrar o espaço. Além disso, unifica-se o piso da calçada com o piso interno, criando essa permeabilidade do espaço da rua para dentro do prédio.
148
Imagem 74: Mapa Centro de São Paulo - Ruas com manifestações populares. Pedro Bergi
149
Imagem 75: Mapa Centro de São Paulo - Locais de permanência. Pedro Bergi
150
Imagem 76: Mapa Centro de São Paulo - Sobreposição dos mapas e terreno em questão. Pedro Bergi
151
Com intuito de facilitar e acentuar a fruição pública, uma série de rampas, com inclinação acessível, são dispostas no terreno. Parte destas rampas se tornam um teatro-rampa, as quais remetem ao Teatro Oficina. A ideia é que este espaço público seja ativado das mais variadas formas, sendo ele o início de uma peça que se espalha pelas ruas do centro, ou o ponto final de um bloco de carnaval. O edifício se divide em três blocos e três vazios (Imagem 78). O primeiro vazio é o térreo, à direita é o acesso da Rua da Consolação, por onde se toma a escada rolante que dá acesso ao piso da Black Box, ou se acessa ao Hall dos elevadores – local com um Relevo Espacial, amarelo, de Hélio Oiticica (Imagem 79). Em seguida, ocorrem os três lances de rampas que configuram o Teatro Rampa (Imagem 80). Sobre ele, fica um andar técnico com urdimento e camarins. No subsolo se instala a parte “pesada” da fábrica. O nível inferior concentra o depósito e área técnica para maquinários e geradores. Acima ficam dois pavimentos de Oficina que contemplam: serralheria, carpintaria, pintura e montagem (Imagem 81). O deslocamento dos cenários se dá pelo elevador de carga que fica concentrado junto aos elevadores de visitantes. O bloco acima do Térreo contém a Black Box, um Teatro de Arena, um café, livraria e a fábrica “leve”. À direta, voltados para a Rua da Consolação, estão o café e a livraria (Imagem 82). Sobre eles fica uma pequena praça que dá espaço para exploração cênica. Acima deste espaço, localizam-se dois andares da fábrica “leve”, que concentra a parte de adereços e costura e, por fim, um pavimento administrativo. À esquerda, fica a Black Box (Imagem 83), uma caixa preta sem configuração de plateia, o que possibilita diferentes formas e possibilidades cênicas e espaciais.
152
Imagem 77: Foto inserção. Fachada Rua da Consolação. Pedro Bergi
153
Imagem 78: Corte Perspectivado. Pedro Bergi
154
155
Imagem 79: Hall elevadores. Pedro Bergi
156
Imagem 80: Teatro Rampa. Pedro Bergi
157
Imagem 81: Oficina - área de montagem. Pedro Bergi
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Imagem 82: Café e livraria. Pedro Bergi
159
Imagem 83: Black Box. Pedro Bergi
160
Imagem 84: Foyer. Pedro Bergi
161
Imagem 85: Praça Alta. Pedro Bergi
162
Imagem 86: Teatro Cidade. Pedro Bergi
163
Imagem 87: Vista Rua da Consolação. Pedro Bergi
Imagem 88: Vista da quadra.. Pedro Bergi
164
No centro deste bloco há um vazio vertical que concentra o foyer (Imagem 84), onde chega o público que vem pela escada rolante. Sobre ele está o Teatro de Arena. Este grande vazio, juntamente com a sucessão de recortes na laje, que direciona a luz natural até o térreo, cria uma conexão visual entre o térreo e os blocos superiores, gerando diversas possibilidades de enquadramentos de paisagens internas. Na cobertura do bloco que contém a Black Box, cria-se um terceiro vazio onde uma Praça Alta (Imagem 85) se configura como mais um espaço de experimentação cênica. Nesta cota, o público mescla o entorno edificado com a apresentação criando uma “zona híbrida” (NÉSPOLI, 2015). A paisagem da cidade se torna presente no espaço cênico, e ao mesmo tempo sofre transformação, à medida que diferentes proposições cenográficas são feitas. O último bloco se configura como o espaço de encontro e desenvolvimento dos coletivos artísticos. Salas de ensaio e montagem se configuram nas extremidades do volume, no centro ficam salas menores e espaço de reunião para desenvolvimento dos cenários – e apoio aos grupos que não tem espaço físico, ou tem um espaço restrito. Sobre este bloco se localiza o Teatro Cidade (Imagem 86), um teatro com plateia italiana, mas sem paredes. A paisagem da cidade se torna parte da cenografia, o céu, e suas variações de cores, é elemento a ser pensado no evento. A estrutura metálica branca da Fábrica de Possibilidades Cenográficas se configura como um esqueleto externo que sustenta os cheios e os vazios (Imagem 87 e 88), que a partir da incidência da luz ganha percepções diferentes. O volume em cobre oxidado da Black Box se configura como um espaço sólido, onde a ausência de luz é necessária. Nos demais volumes, chapas brancas onduladas e perfuradas garantem uma pele semitransparente a este corpo, criando trocas visuais entre o exterior e o interior.
165
O edifício se configura não só como elemento da paisagem da cidade, como mais um prédio a preencher a quadra. Ele se insere como gerador de paisagens por meio de suas diferentes cotas – que possibilitam vistas internas e externas; e através dos espaços livres de criação – que garantem a inserção de elementos cênicos na paisagem interna e na paisagem da cidade. O espaço existe para a experiência do corpo e por onde ele permeia em todo o edifício, seja sendo vivenciado a partir do trabalho, da simples passagem pela rua interna ou por meio das ações executadas. As diferentes formas de se configurar o espaço, seja na Black Box ou no Teatro Cidade, ampliam as formas de criar sensação. A Fábrica de Possibilidades Cenográficas se apresenta como a nuvem citada no início, de forma a gerar inúmeras maneiras de ocupação dos espaços, mas também se expandindo para a cidade. E isso pode ocorrer não apenas pela conexão a partir da rua interna, mas pela sua abrangência. A fábrica, como já dito, não se fecha para si, permitindo ser o suporte e se espalhar como uma nuvem que encobre toda a cidade, na qual os cenários nela produzidos atendam a diversos teatros – ainda que fora do seu raio de proximidade –, e também aos movimentos de rua e às praças.
166
Anexo
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UN
168
CONSOLAÇÃO
DA RUA
TERREO
0
NÍVEL 00.00 5
25
50
169
2
B
1
A
A
B
B
170
3
C
6
A
CONSOLAÇÃO
5
TEATRO RUA NÍVEL 00.00 C
4
0
1
5
10
171
2
B
1
A
A
B
B
172
3
C
5
6
A
DEPÓSITO + ÁREA TÉCNICA NÍVEL -15.60 C
4
0
1
5
10
173
2
B
1
A
A
B
B
174
3
C
5
6
A
MONTAGEM + OFICINA NÍVEL -11.40 C
4
0
1
5
10
175
2
B
1
A
A
B
B
176
3
C
5
6
A
OFICINA NÍVEL -05.20 C
4
0
1
5
10
177
2
B
1
A
A
B
B
178
3
C
5
6
A
PAV. TÉCNICO NÍVEL 04.20 C
4
0
1
5
10
179
2
B
1
A
A
B
B
180
3
C
5
6
A
BLACK BOX + CAFÉ NÍVEL 09.40 C
4
0
1
5
10
181
2
B
1
A
A
B
B
182
3
C
5
6
A
TEATRO ARENA NÍVEL 13.20 C
4
0
1
5
10
183
2
B
1
A
A
B
B
184
3
C
5
6
A
ARTE + COSTURA + ADEREÇO NÍVEL 17.80 E 22.00 C
4
0
1
5
10
185
2
B
1
A
A
B
B
186
3
C
5
6
A
ADMINISTRAÇÃO NÍVEL 26.20 C
4
0
1
5
10
187
2
B
1
A
A
B
B
188
3
C
5
6
A
PRAÇA NÍVEL 30.40 C
4
0
1
5
10
189
2
B
1
A
A
B
B
190
3
C
5
6
A
SALA ENSAIO NÍVEL 38.80 C
4
0
1
5
10
191
2
B
1
A
A
B
B
192
3
C
5
6
A
SALAS ENCONTROS NÍVEL 43.00 C
4
0
1
5
10
193
2
B
1
A
A
B
B
194
3
C
5
6
A
TEATRO CIDADE + CAFÉ NÍVEL 47.20 C
4
0
1
5
10
195
2
B
1
A
A
B
B
196
3
C
5
6
A
TEATRO CIDADE NÍVEL 51.40 C
4
0
1
5
10
197
2
B
1
A
A
B
B
198
3
C
5
6
A
TEATRO CIDADE NÍVEL 55.60 C
4
0
1
5
10
199
200
CORTE AA 0
1
5
10
201
CORTE BB 0
202
1
5
10
CORTE CC 0
1
5
10
203
FACHADA R. CONSOLAÇÃO 0
204
1
5
10
FACHADA QUADRA 0
1
5
10
205
Bibliografia
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Referências
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AUDIOVISUAL 1_The Jacksons – The Victory Tour https://www.youtube.com/watch?v=OJN_1uxT8JE&t=563s 2_Queen – Live Wembley Stadium https://www.youtube.com/watch?v=-DAvQcP1dlE 3_Michael Jackson – Bad World Tour https://www.youtube.com/watch?v=9shByOh8fVE 4_Madonna – Blond Ambition Tour https://www.youtube.com/watch?v=O1q8OUcOFQ8&t=4572s 5_Madonna – The Girlie Show https://www.youtube.com/watch?v=KgrbXDSSekQ 6_Michael Jackson – History Tour https://www.youtube.com/watch?v=ChrLRauOR28&t=823s 7_Backstreet Boys – Millenium Tour https://www.youtube.com/watch?v=o_KRcrMD5uU 8_Britney Spears – The Onyx Hotel Tour https://www.youtube.com/watch?v=aa6-b-MS-Gk&t=3985s 9_Madonna – The Confessions Tour https://www.youtube.com/watch?v=OOkGvP0D4Bg 10_Kylie Minogue – KylieX2008 Tour https://www.youtube.com/watch?v=Rrv49hK44lk&t=6049s 11_Beyoncé – The Formation Tour – Não há registro oficial, mas há vídeos amadores no Youtube. 12_Beyoncé – Homecoming: A film by Beyoncé – Disponível no Netflix 13_Sandy & Júnior – Sandy & Júnior: Nossa História – Disponível no Globoplay 14_Maria Bethânia – Tempo, tempo, tempo, tempo https://www.youtube.com/watch?v=zGG5YIGcVHA&t=1359s 15_Maria Bethânia – Carta de Amor https://www.youtube.com/watch?v=dU4XQODt5WI&t=4775s 224
16_Maria Bethânia – Abraçar e Agradecer https://www.youtube.com/watch?v=EOmi_Fg9IDg&t=4523s 17_Kanye West – Glow in The Dark Tour - Não há registro oficial, mas há vídeos amadores no Youtube. 18_Kanye West e Jay-Z – WTT Tour - Não há registro oficial, mas há vídeos amadores no Youtube. 19_Kanye West – Yeezus Tour - Não há registro oficial, mas há vídeos amadores no Youtube. 20_Kanye West – Saint Pablo Tour - Não há registro oficial, mas há vídeos amadores no Youtube. 21_Abstract: The Art of Design – episódio Olafou Eliasson e episódio Es Devlin – Disponível na Plataforma digital Netflix. 22_ Inside Raf Simons’ Dior, The Business of Fashion, Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=YCkpCPZ59l8>. 23_ Interview de Raf Simons en backstage du défilé Christian Dior, Vogue Paris, Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=wYFnSVkdD2g>. 24_ Dior SS 2016 – Desfile do Ato I, Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=JNCYkZxsWUc 25_Dior SS HC – Desfile do Ato II, Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=JvoktOHPLsE&t=36s
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Pedro Henrique Bergi Reis Junho de 2021