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Capítulo Quinze .......................QUÍRON

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Índice Remissivo

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Eu queria que Quíron, filho de Filira... que partiu, vivesse ainda, filho esclarecido do uraniano Kronos; e que reinasse sobre os vates de Pélion, animal selvagem das montanhas De coração amigo dos homens, que outrora criou O gentil ferreiro que acalma a dor e cura o corpo, Asclépio, o herói que combate todas as doenças. — Tíndaro, Third Pythian Ode (trad. Richard Lattimore)

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O "planetóide" Quíron foi descoberto em 1977 e batizado, como era o costume, pelo astrônomo que o descobriu — no caso, Charles Kowal. O mapa astrológico da descoberta sugere o encontro de algo incrivelmente profundo: o ascendente corresponde ao centro da galáxia (26 graus de Sagitário), enquanto Plutão está no Meio-Céu e o próprio Quíron é um solitário hemisférico, retrógrado e baseado na Quarta Casa em Touro. Todos os outros planetas estão acima do horizonte109 . Os astrólogos foram rápidos em usar Quíron desde o momento em que sua presença foi anunciada. Em seguida à publicação do primeiro material sobre Quíron por pesquisadores

109. Clow, Barbara Hand, Chiron: Rainbow Bridge Between the Inner & Outer Planets, St. Paul, MN, Llewellyn Publications, 1987, pp. 215-27.

como Zane Stein110 , os astrólogos começaram a colocar essa estranha criatura em mapas e a observar seu comportamento em trânsito. Desde sua descoberta, há apenas uma quinzena de anos, ele se tornou um grande sucesso.

Os astrônomos, por outro lado, não sabem muito bem o que fazer com ele, mas já surgiram várias teorias; aquelas que o tratam como um forasteiro que foi capturado por nosso sistema solar parecem ser as mais comuns. Ele se assemelha um pouco aos asteróides, aos pedaços de rocha que orbitam entre Marte e Júpiter, mas Quíron, embora tenha aparência similar a um asteróide, está muito longe do cinturão de asteróides. De fato, sua órbita, entre Saturno e Urano, constitui uma anomalia, por ser extremamente elíptica. Já fora chamado de planetóide ou planeta pequeno. Recentemente, porém, os astrônomos sugeriram que Quíron é na verdade um cometa, ou ao menos uma "bola de neve suja" que estava em processo de tornar-se um cometa quando foi atraída para orbitar em torno do Sol.

Por causa de seu pequeno tamanho e sua localização peculiar, assim como sua órbita incomum, os astrólogos começaram a aplicar a palavra "dissidente" a Quíron — um dissidente é um ser que age independentemente de qualquer grupo social e se recusa a conformar-se a

qualquer tradição em particular, vivendo segundo suas próprias regras. Zip Dolbyns o compara a uma combinação de Júpiter-Urano, Zane Stein o liga a Sagitário, Bárbara Hand Clow e Philip Sedgwick o dizem regente de Virgem, Erminie Lantero e Tony Joseph sugerem uma mistura Escorpião-Sagitário (Ofíoco, o gigante Asclépio) e Al Morrison, o especialista em esquisitices astrológicas, insiste em que cometas não regem nenhum signo! Richard Nolles também acha que a regência é, em geral, desnecessária.

Uma representação de Centaurus (Phyllirides — o nome poético de Quíron). do Astronimicon de Higino, Veneza, 1482

110. Stein, Zane, Interpreting Chiron, Lansdale, PA Associates for the Study of Chiron, 1983.

O que c mais importante para nosso propósito, porém, é que Quíron é uma das primeiras descobertas planetárias a ser relacionada desde o início à mitologia. Estudos pioneiros de Erminie Lantero e do falecido Tony Joseph tratam de Quíron como um verdadeiro arquétipo emergente, haurindo em fontes místicas para determinar qual a provável influência astrológica de Quíron111. Isso demandou muita pesquisa, pois a história de Quíron é encontrada em obras clássicas obscuras como a Biblioteca de Apolodoro e a Argonáutica de Apolônio de Rodes, e não em poemas homéricos, em Hesíodo ou nas Metamorfoses de Ovídio, que são mais familiares.

Quíron, de acordo com um dos relatos mitológicos, era filho de Cronos ou Saturno. O primeiro pai dos deuses perseguiu e fez amor com uma ninfa chamada Fílira, mas foi surpreendido em seu ninho de amor por sua esposa enganada, Réia. No momento do clímax, Cronos transformou-se num garanhão e fugiu da ira de Réia. Mas a mistura de cavalo e deus já havia se cumprido; Filira deu à luz Quíron, meio humano e meio cavalo, e foi dele que surgiu a raça dos centauros.

No mito grego, em geral, os centauros eram retratados como criaturas de baixos instintos, que apreciavam a bebedeira e a sensualidade desinibida, por vezes violenta (muito semelhante ao aspecto negativo de Touro). Quíron, porém, é uma exceção à regra. O centauro-rei vivia em isolamento meditativo em sua caverna no monte Pélion, um filósofo recluso que ocasionalmente saía de sua solidão para ser o mestre de mortais excepcionais. Possuía o conhecimento da mecânica celeste (ou seja, astronomia e astrologia), natureza, medicina e matemática, e sua perícia nessas áreas era respeitada até mesmo pelos deuses. Entre seus mais famosos pupilos mortais estavam Acteão, Enéias, Aquiles e, mais

Um centauro típico

______________________________________________________________________ 111. Joseph, Tony, The Arquetipal Universe, ibid.; e Erminie Lantero, The Continuing Discovery of Chiron, York Beach, ME, Samuel Weiser, 1983.

especialmente, Jasão, cuja relação com Quíron está detalhada na Argonáutica de Apolônio de Rodes. Quíron treinou todos esses homens para tornarem-se guerreiros sagrados. Foi também mestre de Asclépio, filho de Apolo e de uma mulher mortal. Asclépio aprendeu a arte da medicina de Quíron — mas, por ser filho de um deus da cura (Apolo), ultrapassou seu tutor e tornou-se conhecido como a divindade padroeira das

artes da cura. Seu símbolo era um bastão com uma serpente entrelaçada, similar ao caduceu de Hermes, que tinha duas serpentes. Em ambos os casos, o simbolismo parece representar a passagem do kundalini, o poder da serpente, pela coluna espinhal, que, no caso de Asclépio, sugere que essa força vital interior é o princípio operativo de toda cura verdadeira. Asclépio foi fulminado por um dos raios de Zeus quando usurpou o privilégio dos deuses e começou a trazer os mortos de volta à vida112 . Quíron encontrou seu fim de um modo muito peculiar. O herói Hércules, em meio a seus Doze Trabalhos, parara no monte Pélion para dividir um barril de vinho com os centauros. A festa se transformou numa briga de bêbados e Hércules começou a atirar nos centauros suas setas envenenadas. Os gritos e barulhos na batalha perturbaram Quíron em sua caverna. Perguntando-se o que interrompera sua meditação, ele saiu — e foi imediatamente atingido no calcanhar (ou, em algumas versões, na coxa) por uma das setas mortais. Embora Hércules lamentasse ter ferido seu velho amigo, não

Asclépio, aluno de Quíron e renomado curandeiro. Ilustrado por Diane Smirnow

112. Graves, Robert, The Greek Myths, ibid., Vol. 1, pp. 173-8.

O centauro Nessos, fiel às violentas paixões de sua espécie, foi morto por Hércules quando tentou violentar a mulher do herói, Dejanira. De uma ânfora Ática, século VII a.C.

havia nada a fazer. O ferimento era mágico, e nem mesmo Quíron, o grande curandeiro, poderia curá-lo. O rei-centauro tinha tanta dor que se cansou da vida. Durante sua longa e filosófica existência, a morte havia sido a única coisa que ele nunca experimentara e, mesmo tendo nascido imortal, ansiava agora por ser mortal — por morrer. Mas, mesmo no final, conseguiu uma troca com o Olimpo que provou ser de imenso benefício para a humanidade. Prometeu, o Titã rebelde que auxiliara a humanidade contra os deuses, sofria no alto de uma montanha, amarrado a uma rocha por ordem de Zeus. Este decretara que Prometeu apenas poderia ser libertado se um dos deuses imortais morresse e descesse ao Hades — uma perspectiva bastante improvável. Mas, agora, Quíron exigia que Prometeu fosse libertado, já que as condições do decreto haviam sido atendidas. Quíron foi de boa vontade para o mundo subterrâneo e Prometeu, salvador da humanidade, voltou à terra113 .

Todos os componentes da história mítica de Quíron têm uma forte relevância na interpretação de Quíron no mapa astrológico, mas o que deve receber mais atenção é seu papel de curandeiro. A constelação

113. Graves, Robert, The Greek Myths, ibid., Vol. 2, pp. 113, 148-9.

de Ofíoco representa Asclépio e fica próxima a Escorpião, o que pode relacionar-se à tradicional associação de Escorpião com as artes médicas. Mas, não temos nenhum planeta ou asteróide que represente esse deus da cura. Por isso, Quíron parece ter se tornado o mensageiro do arquétipo de Asclépio, o que quer dizer que pessoas que estejam fortemente sob a influência de Quíron podem também incorporar as características arquetípicas de Asclépio (esse conceito de "mensageiro" de um arquétipo se mostrará importante nos próximos dois ensaios, quando discutiremos Urano como mensageiro do arquétipo de Prometeu e Netuno como mensageiro de Dioniso).

Os métodos de cura de Quíron baseavam-se principalmente em dietas — Aquiles fora alimentado primordialmente com favos de mel, tutano de urso e miúdos de leão e de javali selvagem. Asclépio também curava utilizando técnicas que atualmente associaríamos à magia. Os sacerdotes do templo de Asclépio (dos quais ainda existem dois, um em Epidauro e o outro na ilha de Cos) recomendavam jejum e meditação ao paciente. Assim preparado, ele passava por uma limpeza ritual e o mandavam dormir na vizinhança do templo. Na manhã seguinte, ele contava seus sonhos aos sacerdotes, que diagnosticavam e prescreviam de acordo com isso.

Quíron está mais ligado aos métodos alternativos de cura do que aos tradicionais. Na época da descoberta de Quíron, os transplantes de coração, fígado e rins haviam estendido a vida humana a um grau tal que pareciam oferecer uma séria alternativa à morte — a mítica confrontação de Quíron com o senhor do mundo subterrâneo. Mas tornamo-nos dependentes da tecnologia para nossa própria sobrevivência. Ao mesmo tempo, outro interessante fenômeno ocorria na medicina — uma estranha cria chamada "tratamento holístico" começava a se destacar; a medicina do século XX era realmente desafiada pela primeira vez. Milhares de pessoas começaram a procurar a medicina holística para obter respostas a problemas que a ciência moderna não queria ou não podia resolver. Durante os primeiros anos após a descoberta de Quíron, em 1977, ainda havia apenas um punhado de praticantes holísticos. Eram quiropráticos — o termo "quiroprático" relaciona-se linguisticamente a Quíron. O nome Quíron significa "a mão" e o termo "quiropraxia" fala de alguém que pratica a medicina com as mãos. A quiropraxia foi desenvolvida por Daniel Palmer quando ele tinha 51 anos, ou seja, quando Quíron estava voltando ao lugar que ocupava em seu mapa natal114. No início da década de 1980, houve um surgimento de outros curandeiros holísticos, como acupunturistas e naturopatas. Um número

114. Nolle, Richard. Chiron: The New Planet in Your Horoscope, Tempe, AZ, American Federated Astrologers, 1983.

Asclépio e sua filha Higéia, que como deusa da saúde, estava intimamente associada ao culto de seu pai

impressionante desses praticantes tem posicionamentos muito fortes de Quíron em seus mapas astrológicos. Nesse novo campo, houve muita especulação, tentativa e erro e a exploração livre de métodos totalmente desconhecidos e inovadores. Antes da década de 1970, a massoterapia (outra arte eminentemente quirótica) ainda era associada a salinhas escuras em casas de luz vermelha. Agora, apenas uma década e meia após a descoberta de Quíron, a massoterapia tornou-se um tratamento de cura muito procurado, junto com a massagem esportiva, remédios herbais, terapias crano-sacrais e uma porção de outras artes. Esse campo é uma indústria fervilhante de milhões de dólares, adquirindo milhares de novos seguidores anualmente.

Quíron pode ter uma grande importância para a astrologia médica. Pessoas com doenças mortais que conseguem a cura são bons exemplos dos poderes de Quíron; a localização de Quíron no mapa astrológico pode indicar não apenas a parte do corpo mais propensa à tensão, como também a fonte interior do problema. Por exemplo, Quíron em Câncer

pode indicar um estômago sensível, mas também deve atrair nossa atenção para desequilíbrios no corpo emocional ou problemas duradouros da situação da família que podem ter levado àquele estômago sensível.

Nem todos, porém, que têm um Quíron proeminente trabalharão com as artes curativas. Quíron é tanto o mestre quanto o curandeiro; muitos professores, especialmente de nível superior, parecem ter uma influência poderosa de Quíron — como o professor de ciências em The Centaur de John Updike, que se viu vivendo o mito de Quíron em sua própria vida cotidiana, lutando para curar os ferimentos em sua alma.

O ferimento mágico talvez seja a contribuição mais notável de Quíron para os mapas de homens e mulheres comuns. Quíron foi ferido no calcanhar ou na coxa e apenas a morte podia aliviar a dor. A posição de Quíron no mapa astrológico pode apontar algum tipo de ferimento interior da psique do nascituro. O ferimento é freqüentemente sexual, porque se diz que Quíron foi ferido na coxa. De qualquer forma, uma parte de nós deve morrer para curar esse ferimento interior. Devemos renunciar a algumas partes velhas e fora de moda de nossos seres, algum ferimento cármico ou de infância — e, ao fazê-lo, descobrimos que libertamos nosso verdadeiro potencial criativo. Prometeu fora solto e o poder inspirador de Urano está livre para entrar em nossas vidas. Portanto, essa ferida pode nos tornar completos novamente e, por isso, é uma ferida "mágica".

Para muitos americanos e europeus modernos, especialmente homens, o ferimento mágico de Quíron envolve o pai. Saturno ou Cronos era pai de Quíron e fugiu no exato momento da concepção dele, para nunca mais voltar. Portanto, o abandono do filho pelo pai está envolvido nesse arquétipo. De 1935 a 1939 e novamente de 1945 a 1952, Saturno e Quíron estavam em quadratura — ou seja, estavam num ângulo de 90 graus um com o outro, uma das relações mais difíceis da astrologia. De 1986 a 1988, estavam em oposição. Durante esses anos, o pai forte, positivo, estava notoriamente mais ausente na sociedade moderna. Vem ocorrendo uma separação entre pais e filhos desde a metade do século XIX. Cada vez mais, os homens pararam de trabalhar sua própria terra ou a se devotar à prática comercial em suas próprias lojas e oficinas. O advento da industrialização e o sistema de fábricas separou os homens de seu modo de vida tradicional. Separou também pais e filhos. Os meninos não mais participam com seus pais no trabalho dos campos nem aprendem o ofício da família.

Na época em que Quíron e Saturno entraram em quadratura, entre 1945 e 1952, a força paternal fugira de nosso mundo tão rápido quanto Cronos fugira da cena da concepção de Quíron. Quase todos os homens americanos ou europeus haviam se tornado habitantes de cidades, que

dirigiam até o trabalho de manhã, voltavam cansados, de mau humor c distantes à noite. Filhos e esposa experimentavam o pai ou marido principalmente como uma criatura frustrada, isolada e infeliz. Durante essa época, surgiram tiras de quadrinhos como Blondie ou Life with Father, retratando o pai como um indivíduo tolo, simplório e preguiçoso, servil ao regimento de uma esposa poderosa, fugindo à sua ira assim como Cronos fugiu de Réia. O arquétipo do pai atingira seu ponto mais baixo. Durante a oposição de Saturno com Quíron, em 1986-88, o divórcio chegou a um ponto em que de 25 a 30% das crianças americanas eram criadas em casas sem pai nenhum115 .

Mas, Quíron também estava em oposição com Urano entre 1951 e 1989, um aspecto geracional que aponta o caminho para a cura da ferida do pai. Quíron libertou Prometeu e, como veremos, Prometeu está ligado de forma vital ao arquétipo de Urano. Em algum sentido, Urano é um componente do Homem Selvagem, o poder masculino profundo e criativo — um poder espiritual e vivificante. Urano, selvagem, peludo, cheio de artimanhas, é um nível de masculinidade que cura a ferida do pai ligando-nos à própria terra. Quíron é também selvagem e peludo, meio animal. E é um xamã.

Quíron corresponde ao arquétipo do curandeiro ferido, que é o xamã. Entre as tribos siberianas e de índios americanos, com freqüência o aleijado ou o neurótico é considerado como escolhido pelos deuses para ser um xamã ou médico, o curandeiro da tribo. Na Sibéria, especialmente, uma perna manca (o ferimento de Quíron) é vista como um possível indicador de que a criança ou adolescente é um xamã em germe. Entre os índios americanos, uma doença terrível com freqüência serve como a experiência que marca uma pessoa como um curandeiro — o famoso xamã Lakota Alce Negro experimentou sua grande visão da medicina durante uma doença que sofreu aos 10 anos de idade116. Se tivéssemos de interpretar esse processo psicologicamente em termos da posição de Quíron no mapa astrológico, diríamos que a tarefa de curar o ferimento interior de Quíron abre nosso próprio potencial para curar outras pessoas.

Dada sua função xamânica, não é surpreendente encontrar Quíron ligado aos índios americanos. Durante o final da década de 1970 — logo após a descoberta de Quíron —, o ato de liberdade religiosa dos índios americanos foi aprovado pelo congresso, permitindo e encorajando assim que curandeiros pudessem praticar no "mundo real", despertando o renascimento do interesse no xamanismo indígena que, atualmente, é muito forte.

115. Bly, Robert, Iron John, ibid., pp. 23, 186. 116. Neihardt, John G., ed., Black Elk Speaks, Lincoln, Universidade de Nebraska, 1961.

Quíron também pode estar conectado — ao menos no nível esotérico — com o calendário maia e seus mistérios. O calendário sagrado de 260 dias dos astecas e maias tem com o calendário solar de 365 dias uma relação tal que um ciclo completo é criado a cada 52 anos. O período orbital de Quíron é de 51 anos — uma correlação quase exata (Barbara Hand Clow acredita que a correlação deve ter sido mais precisa outrora, mas as mudanças no calendário maia ao longo dos séculos podem ser as culpadas pela diferença)117 .

Outro fenômeno interessante que ocorreu durante a década de 1970 foi a busca coletiva por respostas a questões que não podiam mais ser abordadas pelos métodos tradicionais. Foi o auge da era do guru, quando pessoas de todo o mundo, principalmente os jovens, juntaram-se em novos tipos de movimentos religiosos. O guru representa a pessoa que tem as respostas, que pode desvendar os mistérios e trazer a iluminação — a libertação dos limites do reino físico. As implicações mais profundas desse fenômeno podem ter sido uma geração coletivamente em busca de alguém que pudesse ajudar a curar as feridas do pai ausente, para servir como mentor e guia e torná-los novamente completos.

O surgimento de Quíron durante esse movimento social e espiritual pode indicar que Quíron representa, ao menos em parte, a luz por trás da escuridão de Saturno. Seu glifo (g) assemelha-se a uma chave

O centauro Quíron numa moeda de bronze da Bitínia durante o reinado de Prúsias II, 15-114 a.C. Da coleção Michael A. Sikora

117. Em conversa com os autores, fevereiro de 1990, Santa Fé, NM.

que podemos tomar como o instrumento que destranca os mistérios do universo. A posição orbital de Quíron entre Saturno e Urano nos dá outra pista quanto a seu significado. Antes da descoberta de Urano em 1781, Saturno era o fim da linha, a fronteira final do sistema solar. Os últimos duzentos anos podem ser caracterizados como de natureza uraniana, concentrados nos desenvolvimentos e avanços tecnológicos que fizemos. Mas, também começamos a ver o universo em termos de criatividade espiritual personificada em Urano, assim como em termos dos outros planetas exteriores, Netuno e Plutão — ou seja, agora vemos o universo como um campo imensamente inexplorado de luz e energia, tal qual uma possível fonte de imortalidade (ou ao menos de renascimento) à nossa espera. Essa consciência dos outros planetas está em contraste direto com o conceito de Saturno como limite final, conceito que implica morte, escuridão e as limitações da realidade física ou mundana. A posição de Quíron faz dele uma ponte entre Saturno e os planetas exteriores, uma ponte entre escuridão e luz.

Esse conceito tem sua fonte no mito de Quíron. O Titã Prometeu, o Homem Selvagem ou rebelde, deu à humanidade a criatividade e a iluminação. Roubou o fogo sagrado do céu para que os mortais não tivessem de viver na escuridão. Dessa forma, ele representa o espírito criativo que reside dentro de todos nós e que, astrologicamente, é simbolizado por Urano. Mas, a maioria de nós é incapaz de perceber nosso verdadeiro potencial ou nossa própria iluminação, porque permanecemos aprisionados em nossas fronteiras materiais e psicológicas. Estamos agrilhoados nos anéis de Saturno, assim como Prometeu foi agrilhoado ao pico da montanha com correntes de adamântio. A morte de Quíron libertou Prometeu. Da mesma maneira, nossa capacidade de curar nossa ferida interior — o ferimento mágico ou espiritual que reside no cerne de todo sofrimento humano — capacita-nos a libertar nossa criatividade uraniana e assim percebermos o poder dos outros planetas exteriores.

A classificação de Quíron como cometa também tem a ver com o simbolismo desse arquétipo. Quíron saiu de sua caverna para desinteressadamente servir à humanidade e elevar os mortais a um novo nível de consciência em relação à vida e à morte. Ao terminar sua tarefa, voltou a uma caverna ainda mais profunda, a do mundo subterrâneo (em certo sentido, Quíron, como o rei pescador do mito do Graal, com quem tanto se parece, é uma figura de Cristo; ele cura, sofre e morre para que todos possamos viver). Os cometas também em chamas vêm do espaço profundo para nossa consciência e então, após imprimir seu fogo em nós, partem. Mas, se Quíron é realmente um planeta capturado, é provável que fique conosco por muito tempo. Podemos suspeitar que o curandeiro ferido está emergindo no inconsciente coletivo em

nível mais permanente — não mais como o santo ou avatar que realiza sua missão e não é mais visto.

O ciclo de 51 anos de Quíron implica um retorno dele nessa idade. Algumas pessoas não são especialmente sensíveis a esse processo (ao menos ainda não). Para outras, esse pode ser um ponto crítico. Já vimos como Daniel Palmer desenvolveu parte da quiropraxia durante seu próprio retorno de Quíron. Outro bom exemplo pode ser visto em Elisabeth Kubler-Ross, pioneira do conceito de morte consciente no Ocidente (o próprio Quíron, ao preferir a morte a uma imortalidade ferida, é um exemplo incontestável de "morte consciente"). KublerRoss nasceu com Quíron no início de Touro; portanto, experimentou seu retorno de Quíron no próprio ano da descoberta dele, e esse foi o ano em que seu trabalho no hospital realmente começou118 .

118. Nolle, Richard. Chiron: The New Planet in Your Horoscope, ibid

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