A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA Dom Amilton Manoel da Silva, CP Texto-base da palestra proferida no encontro de Frades da Frente de Evangelização das Paróquias, Santuários e Centros de Acolhimento. Rondinha, maio de 2019
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
As conferências AL falaram da VRC, numa perspectiva missionária: 1. Medellín/1968. Impulsionou, a Vida Religiosa na direção da superação de uma mera “modernização”, na busca de um novo “lugar social” no meio do povo, junto aos pobres. Ela foi convocada a viver a sua missão profética, como testemunha do Reino, no compromisso por uma “evangelização libertadora”. 2. Puebla/1979. Trouxe a Vida Consagrada no contexto social e eclesial do Continente AL. São extensas as suas considerações: acerca dos votos (vida, missão e serviço), do comprometimento com as causas sociais (pobres) e particularmente da inserção na Igreja particular como “lugar” da vivência da vida religiosa e do “compromisso eclesial evangelizador”. O doc. afirmou que o religioso (a) não descobriu como conviver numa diocese. Há, por isso, tensões entre a missão do bispo e o carisma próprio da Vida Religiosa, com falta de diálogo. 3. Santo Domingo/1992. Trouxe 7 pontos e 1 numero sobre a Vida Religiosa a serviço da educação católica. Foi um resultado magro em relação às orientações de Puebla. Deu continuidade a Medellín e Puebla, pedindo uma evangelização inculturada junto aos pobres, aos indígenas, afro-descendentes e minorias. 4. Aparecida/2007: Acentuou a raiz batismal da Vida Religiosa – santidade - no discipulado e na missionariedade, para uma presença profética na sociedade e na Igreja, como sinal escatológico do Reino. Elogiou a presença da VRC em situações de pobreza, risco e de fronteira. Desafiou a VRC em meio a uma sociedade individualista e consumista e sinalizou o secularismo presente na VRC. 3
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
A RE- VITALIZAÇÃO DA VIDA RELIGIOSA PAPA FRANCISCO 5. Esta nova eclesiologia marca um caminho de renovação da Vida Religiosa Consagrada. 6. Francisco convocou um ano para a VRC (2015) e a carta apostólica convocando a Vida Consagrada para o ano: “Testemunhas da alegria” foi um programa de vida, de espiritualidade e ação. Frente a uma Vida Consagrada um tanto cansada e em crise, Francisco relança uma mensagem de alegria e esperança, de profetismo, pondo Cristo no Centro. 7. Duas expressões do Papa continuam a nos provocar: “Temos que nos perguntar: Jesus é realmente o primeiro e único amor como nos foi proposto quando professamos os votos?” “Nossos ministérios, nossas obras, nossas presenças respondem ao que o Espírito pediu aos nossos Fundadores, são adequados para responder sua finalidade na sociedade e na Igreja hoje?” 8. Francisco insiste em não ceder à tentação dos números e da eficiência e menos ainda em confiar nas próprias forças. É preciso olhar o presente e o futuro com muita esperança, compromisso e vigilante espera.
PROVOCAÇÕES/ DESAFIOS – PAPA FRANCISCO Despertar o mundo! Se a Igreja cresce através do testemunho, não do proselitismo... A vida religiosa deve promover um crescimento na Igreja via atração. Radicalidade evangélica é exigida de todos. Os religiosos seguem ao Senhor profeticamente. A prioridade da Vida Religiosa é a profecia do Reino, e profecia se “faz barulho”. SECULARIZAÇÃO E MUNDANISMO - A ênfase no aqui e no agora. Parte disso é a tentativa para apagar o “Sagrado” em tudo. Quando a vida religiosa começa a assumir normas não evangélicas do mundo secularizado, dando 4
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
ênfase no aqui e agora, os valores evangélicos são relativizados. Compramos a propaganda de poder, prazer e materialismo da pós-modernidade. Consequências: Perda de nossa força profética na Igreja e no mundo. Não vivemos o que professamos. Ficamos exatamente “como o resto”. Ficamos com profecias ocas porque vivemos exatamente o que condenamos. Mudar o foco: Da periferia para o centro, o que exige uma VRC em constante saída. Para entendermos a realidade, precisamos nos distanciar da posição central de calmaria e de paz, e nos dirigirmos às áreas periféricas, evitando o centralismo e abordagens ideológicas; para ver a realidade de vários pontos de vista. INCOERÊNCIA NO SEGUIMENTO DE JESUS CRISTO - Começamos a esquecer de nossa identidade religiosa, isto é, que somos pessoas consagradas na Igreja. Agarramos em estruturas para nossa defesa e paramos de crescer e mudar; entramos no comodismo e a acídia toma conta... Consequências: Formalismo (fazer por fazer), sem vida e sem experiência de Deus. Peso/ cansaço/ desilusão/ e desanimo na vida consagrada. Perda da força profética mais uma vez. Ênfase no Carisma: O carisma de uma Congregação é o fermento, é ele que dá continuidade à Congregação, é criativo e busca sempre novos caminhos, as obras passam. Há muitos religiosos confundindo carisma com obras. O carisma não é uma garrafa de água destilada, precisa ser vivido de acordo com cada lugar, tempo e indivíduo, inculturado. 5
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
VENCER O ATIVISMO - Muitas vezes reduzimos a vida religiosa em fazer coisas... E no processo abandonamos coisas essenciais que precisam para manter a vida consagrada (oração/momentos de qualidade na comunidade/ retiros/ leitura, formação permanente, etc.) Sem esses elementos haverá crise. Buscamos salvar obras e não o carisma. Consequências: sentido de vazio interior/ desânimo/ dúvidas vocacionais/ sentimento que somos mais nada do que “leigos glorificados” FALTA DE FRATERNIDADE – DOMÍNIO DO INDIVUALISMO - A vida comunitária tem sofrido muito por causa de nossas crises. Parece que nos amamos uns aos outros menos. O Individualismo doentio tem destruído o sentido de comunidade. Consequências: O “eu” e não mais “nós” (subjetivismo). Vivemos juntos, mas sem gerar a vida e a profecia – falta de amizades criativas. Tal falta de amor não atrai vocações. A fraternidade. Quem não consegue viver em fraternidade, não viverá autenticamente. Muitas vezes as obras, podem se tornar uma fuga da vida fraterna. Os Conflitos comunitários são inevitáveis e necessários, para crescer em relações sinceras e honestas. Os conflitos devem ser encarados e não camuflados ou ignorados. A unidade em torno do carisma e da missão devem prevalecer sobre os conflitos. A formação é uma obra de arte: Combater a imagem da vida religiosa entendida como um refúgio e consolo, em face de um mundo externo, difícil e complexo. Integrar os quatro pilares (humano, espiritual, intelectual e pastoral). É necessário diálogo, confrontação e vencer a propensão ao clericalismo. A formação é uma obra de arte, não uma ação policialesca. Devemos formar o coração dos jovens, pois do contrário, formaremos pequenos monstros que formarão o Povo de Deus. É preciso formar o jovem para acolher e amar o povo, pois há religiosos 6
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
que têm o coração tão cheio de ácido quanto o vinagre, eles não foram feitos para o povo. Não devemos formar administradores, gerentes, mas pais, irmãos e companheiros de viagem. Para vinho novo, odres novos - Formação contínua (permanente): - Na formação permanente, o cuidado com cursos sem continuidade e o perigo de termos religiosos (as) com bons títulos acadêmicos, mas com frágil formação no seguimento de Jesus. É preciso mais formação sobre a vida consagrada. - Criar a cultura da formação permanente, sobretudo com a revisão e verificação da vivência concreta das comunidades. - Deve ser orientada segundo a identidade eclesial da VRC; consolidar e reencontrar o lugar na Igreja. - Incluir sempre a reflexão sobre a dimensão institucional (carisma) e apostolado (obras). - Cada um (a) é chamado (a) a deixar-se tocar, educar, provocar e iluminar pela vida e pela história, por aquilo que anuncia e que celebra...
7
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
A PARÓQUIA E O RELIGIOSO/PRESBÍTERO 1 – EXPERIÊNCIA DE DEUS/ESPIRITUALIDADE/CARISMA 1. Essa palavra esta na moda: viver mais para o espírito como retorno à salvação da alma, métodos de concentração de relaxamento para vencer o stress, auto ajuda, espiritualidade holística, espiritualdiade ateísta (junta-se meditação, respiração e até o uso de alucinógenos – materialismo, racionalismo e naturalismo). 2. Hoje as pessoas buscam a espiritualidade e não religião (se casam: individualismo, imediatismo e consumismo). O mercado tem se colocado à disposição dessa espiritualidade ou “espiritualidades”, é o mercado da fé, por vezes sincretista, onde as pessoas buscam viver a seu modo, com o seu Deus. O pior é que essa relidade está presente dentro da Igreja e de alguma forma nas Congregações religiosas. O Papa Francisco vem nos alertar para o perigo das 4 falsas espiritualidades: religiosidade meramente de cunho neopentecostal, intimista (EG), pelagianista e gnóstica (GE). 3. É preciso perguntar sempre se é espiritualidade cristã. Se “é a espiritualidade de Jesus, segundo o seu Espírito. Suas opções deverão ser as nossas opções, suas atitudes nossas atitudes, sua práxis, a nossa práxis” (Pedro Casaldáliga). 4. O clamor da mística: “A espiritualidade continua a ser uma busca que caracteriza o ser humano, pois só uma espiritualidade criativa, ao mesmo tempo sólida e capaz de oferecer energia, também socorre como remédio e inspiração. Nesse sentido, a centralidade da Palavra de Deus, a leitura orante, o exercício do silêncio, enfim os recursos que a história do cristianismo oferece, não são um luxo descartável, mas um ponto crucial nas condições contemporâneas. É exemplar o trabalho do filósofo italiano Giorgio Agamben em Opus Dei ao recuperar, como inspiração para sociedades seculares contemporâneas, o sentido monacal do Ora et Labora, a liturgia, a espiritualidade efetivamente exercitada em comunidade, não apenas teorizada, 8
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
como inspiradora e modeladora do conjunto da vida, inclusive da vida política, dando-lhe coerência e profundidade.(Frei Luiz Carlos Susin – Horizontes da VRC – Clamores da Igreja e da VRC hoje). 5. ESPIRITUALIDADE DE TESTEMUNHO: A vida religiosa se converte em testemunha do Deus da vida em uma realidade que relativiza seu valor (obediência), é testemunha de liberdade frente ao mercado e às riquezas que valorizam as pessoas pelo ter (pobreza), e é testemunha de uma entrega no amor radical e livre a Deus e à humanidade frente à erotização e banalização das relações (castidade)” (DAp, 219). 2 - VIDA FRATERNA Sociedade individualizada (José Lisboa – Viver em comunidade para a missão) 1. As pessoas usam os dons e capacidades para ir tocando a vida, não para empregarem em causas nobres. 2. Formam-se “comunidades de fugitivos”. O que mais atrai é a ausência de compromisso, mesmice e repetição das coisas. Pessoas deprimidas que tem dificuldade de amar na gratuidade. Quase sempre se fazem de vítima. As relações são de dominação, instrumentalização = desumanização. Relacionamentos a partir de procedimentos vazios e privados, sem significação. Há uma rejeição do outro o que leva a rejeição de Deus. Uma calamidade quando se encontra esse tipo na Igreja e na VRC. 3. COMUNIDADE: Não é comunitarismo: Aqui os interesses do grupo estão acima de qualquer coisa. Não há lugar para as diferenças, liberdade e individualidades. As “obrigações” são impostas. Pessoas insatisfeitas, porque não participam do processo e das decisões. A realidade é mais importante do que a ideia: “A realidade simplesmente é, a ideia elabora-se. Entre as duas, deve estabelecer-se um diálogo constante, evitando que a ideia acabe por separar-se da realidade. É perigoso viver no reino só da palavra, da imagem, do sofisma”. (EG) 4. COMUNIDADE. A vida fraterna: se inspira na comunidade utópica de Atos: persevera na escuta da Palavra de Deus, a 9
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
Koinonia (comunhão fraterna), fração do pão e da oração e partilha. A comunidade é sujeito e o lugar da missão e a vida fraterna em comunidade é um dom para a missão. É a Trindade que suscita diversidade de carismas, de ministérios e serviço. Dessa forma não pode haver individualismo pastoral, os dons não são dados isoladamente. FALSAS COMUNIDADES: 5. Comunidades Cassino, onde as pessoas entram para jogar (atendem os próprios interesses). As carências pessoais geralmente vêm à tona. Aqui as comunidades se formam em torno de eventos e não de causa duradouras e objetivos. 6. Comunidades Cabides, onde se penduram os conflitos internos (e faz-se de conta que está tudo bem), as dores do outro (insensibilidade e descompromisso) e até pessoas... 7. Comunidades Museu, de preservação e autoconservação. Ordem da casa: manter o que se tem, mudar? “Não vai dar certo”. “Sempre fizemos assim”. “Time que está ganhando não se mexe”. “Vai dar trabalho...” Nessas comunidades tudo é superficial, transitório, sem responsabilidades e sem ética. 8. ESPIRITUALIDADE PARA O REINO: A comunidade religiosa não existe em função de si mesma, mas existe em vista de uma comunidade maior, à humanidade inteira – a temperatura da fé de uma comunidade é determinada por sua abertura à missão. VIVEMOS JUNTOS PARA A MISSÃO. Jesus reuniu a sua comunidade apostólica, para participarem da vida Dele e depois continuar a missão que lhe foi confiada por seu Pai (Jo 17, 18; 21,21). Nessas comunidades, o ponto de partida é a busca em comum dos valores pra o Reino, o que favorece a transcendência e o compromisso. MISSÃO (José Lisboa e Dom Víctor Manuel Fernandez – arcebispo de La Plata) O QUE É MISSÃO? 1. Não existem missões isoladas, confiadas a uma pessoa em particular. O que existe é um projeto missionário confiado a um grupo que se percebeu convocado por Deus para tal 10
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
tarefa. 2. Missão não pode ser confundida com “fazer pastoral”, nem mesmo com “realizações de missões”. Parece que, quando os religiosos não estão na pastoral, se sentem frustrados e injustiçados. Se as pessoas precisam sair de um lugar para fazer “missão” em outro lugar, a comunidade religiosa está em lugar errado. O espaço missionário da comunidade é onde ela se encontra: testemunho, serviço, comunicação e partilha; voltada, sobretudo, para o trabalho com os pobres. 3. A Missão da VRC é a mesma da Igreja, mas a VRC tem algo específico: a liminalidade – atitude corajosa para colocar-se na fronteira, puxando toda a comunidade cristã na direção da radicalidade evangélica. A VRC tem a capacidade de manter a chama da profecia acesa na Igreja. Ela é ponta de lança, aquela que puxa, vai na frente... 4. Infelizmente a VRC ficou refém das paróquias, com isso afastou-se do seu referencial e dos seus primórdios. Nas origens da VRC, não está a PASTORALIDADE, mas a profecia e a LIMINALIDADE. Quem ia para o deserto buscava radicalidade... contra aqueles que estavam se aliando ao império e afastando-se do evangelho. 5. A “pastoral” fez a VRC cair no ativismo, absorveu os vícios do ministério ordenado. Na prática ela continua fazendo muito e às vezes sendo pouco ou quase nada. Gastamos energias demais em obras e atividades que, na maioria das vezes nada expressam a identidade carismática. 6. A Missão da VRC é ser ao mesmo tempo: Simbólicopolítica (profética): um grupo liminal – separados de estruturas convencionais em nome de uma especial dedicação ao Sagrado-Absoluto. Com projetos que interessam a sociedade, ela aceite ou ignore. Assim a VRC deveria ajudar a Igreja a não se distanciar de sua verdadeira missão – ela testemunha, articula e motiva valores que brotam desse grande referencial. Simbólica – mística: Ela não pode fugir do mundo, mas ela deve viver a sua 11
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
experiência do Sagrado – Absoluto no meio da humanidade. Assumir compromissos e responsabilidades históricas, a partir do carisma fundacional – expressão de compaixão e de misericórdia. A compaixão dá a medida evangélica da vida religiosa e a liberta de suas tendências narcisistas, dos medos e das seguranças institucionais. 7. A ressurreição faz da vida uma Missão, é um caso de amor. É uma força que sai de dentro e se lança para fora. Os Evangelhos ligam a ressurreição à Missão. Quando Maria Madalena reconheceu Jesus ressuscitado, ele respondeu: “Não me segure... Vá dizer aos meus irmãos... Então Maria Madalena foi e anunciou aos discípulos: “EU VI O SENHOR” (Jo 20,17-18). O mesmo se deu com os discípulos de Emaús: perderam o medo e o desânimo e partiram para a missão. Voltaram para Jerusalém, de onde haviam fugido desesperançados. 8. Para o Papa Francisco, MISSÃO vai nessa linha, Não é preciso anunciar todas as doutrinas do catecismo da Igreja Católica, mas o núcleo do Evangelho: o Kerigma onde seu conteúdo “é beleza do amor salvífico de Deus manifestado em Jesus Cristo morto e ressuscitado” (EG 36), quem se encontrou com a pessoa de Jesus Cristo encheu a vida de amor e de alegria – a evangelização é a comunicação dessa alegria. 9. No entanto, não basta anunciar o Kerigma, mas sim mostrar o atrativo que possui, para que todos apreciem sua mensagem, acolham e se alegrem. Para isso é necessário criatividade para fazer com que esse anúncio chegue a cada um, de tal forma que possam admirar sua formosura e sentir-se pessoalmente atraído. 10. O eixo principal aparece em Jo 3,16: “Deus amou tanto o mundo...”; em Paulo o anúncio do Evangelho se concentra mais na força salvadora da cruz: “Me amou e se entregou por mim” (Gl 2,20). Também em Rm 3, 23-24: “Todos pecaram e estão privados da graça, porém fomos justificados em Cristo Jesus”. Em At 13, 32-33, o destaque está na ressurreição: “Vos anunciamos uma boa notícia de que a promessa de 12
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
Deus Pai se cumpriu em nós, seus filhos, ao ressuscitar Jesus.” Este núcleo missionário é o paradigma de toda ação pastoral da Igreja; é o núcleo do evangelho, que deverá levar as pessoas ao amor a Deus e o próximo. 11. Seria uma “nova evangelização”? Sim, mas na linha franciscana, onde Francisco de Assis não queria uma evangelização, mas o evangelismo, a evangelicidade..., deixar que o “centro do evangelho” penetre todas as regiões, do nosso ser e aí possa impregnar o mundo ao nosso redor. OS POBRES 12. Sem a conversão pessoal e pastoral não há Missão ou Evangelização: mudar as estruturas, repensar os objetivos, o estilo e os métodos evangelizadores das comunidades (EG 33). A presença misericordiosa e o anúncio com proximidade estão acima das preocupações com estruturas, organização, reuniões, discussões e formalidades. O agente de pastoral deverá gastar grande parte do seu tempo no “corpo a corpo” levando esse primeiro anúncio. 13. Em toda Assembleia paroquial deve constar a pergunta: Como fazer para que a paróquia seja missionária em seu próprio território? A novidade será colocar todos a serviço do anúncio do kerigma: mudança de costumes, de estilo, de linguagem e até os horários... Sempre visando que o anuncio primeiro chegue a todos. 14. O Papa indica quais são os lugares dessa presença missionária: “Os que estão afastados de Cristo”. Aqui ele retoma São João Paulo II: “buscar as estes é a tarefa primeira da Igreja.” (Redemptoris Missio 34). 15. Os pobres (1): Os afastados de Cristo, não são apenas aqueles que não o conhecem, mas também os batizados que não vivem segundo o seu batismo, “não tem a pertença cordial a Igreja e já não experimentam o consolo da fé” (14). Na AL há poucos ateus e que desprezam Jesus Cristo, porém há muitos que não experimentam a alegria e o gosto da fé, deixaram de sentir-se parte 13
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
da Igreja e estão próximos das nossas casas. As periferias são esses. Depois se verá como integrá-los... Estar sempre buscando, pescando..., eis o desafio o evangelizador. 16. Para este trabalho precisamos estar convencidos de que cada ser humano tem um valor imenso. Na cruz, Jesus Cristo deu o seu sangue precioso por essa pessoa, cada um é imensamente sagrado e merece o nosso afeto e a nossa dedicação. Por isso, se consigo ajudar uma só pessoa a viver melhor, isso já justifica o dom da minha vida (274). Não devemos esperar que as pessoas venham a nós. Tomemos a iniciativa de ir a elas. Temos que alargar os braços do Senhor, deixar-se impulsionar pelo Espírito, crer que vale a pena e sentir que essa missão deverá ser cumprida. 17. Os pobres (2): Francisco disse que a Evangelli Gaudium não é um documento social, seu tema é o anúncio missionário (missão – evangelização). Mas dedica um capítulo a dimensão social. Faz isso porque o anúncio do evangelho é comunitário e social. Por isso não podemos entender como uma questão individual (minha relação com Jesus pede...). A experiência com Jesus deverá trazer consequências sociais (180). 18. A tarefa missionária da Igreja se faz por atração, atraindo as pessoas para a beleza que se propõe. Se transmitimos um Cristianismo individualista, não convencerá ninguém. A união com Deus e com o próximo é que atrai e seduz no evangelho – a mística e opção pelos pobres – a amizade com Deus e a preocupação com a sociedade. 19. Para explicar quem são os pobres de hoje, Francisco recorre a uma fundamentação bíblica (Gl 2, 10), quando Paulo, querendo saber se a sua forma de evangelizar estava correta, foi aos apóstolos e estes disseram que sim porque ele “não estava esquecendo os pobres”. Voltar-se para os pobres, nas primeiras comunidades, demonstrava que as comunidades haviam saído do paganismo e encontrado com a pessoa de Jesus. Na 14
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
evangelização pessoa a pessoa não poderá faltar os pobres, os abandonados, os descartáveis da sociedade... Se nos esquecermos deles a nossa missão não terá toda a força do Espírito. 20. PASTORES DABO VOBIS (30). A pobreza do presbítero se expressa como: Ø Sequela Christi; Ø No cuidado primeiro com os pobres e os mais fracos (opção preferencial por eles); Ø Numa vida simples e austera, renunciando generosamente às coisas supérfluas; considerando Jesus crucificado como modelo de despojamento interior e exterior, que deve inspirar o amor pastoral pelos irmãos; Ø No saber usar bem o dinheiro que se recebe pelo trabalho (côngruas); Ø Na transparência da administração dos bens da comunidade; Ø Na comunhão e ajuda, quando necessária, aos irmãos do presbitério; Ø Como sinal profético em meio às sociedades opulentas e consumistas; Ø Como consciência de que somos pobres, dependentes de Deus, e Ele nos chamou a dar da nossa pobreza, a dispensar as suas riquezas...
ESPIRITUALIDADE DE COMUNHÃO São João Paulo II salientou que a Vida Religiosa precisa ter uma “espiritualidade de comunhão”, um “Sentire cum Ecclesia”. O fruto mais notável dessa “espiritualidade de comunhão” está na colaboração 15
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
que os religiosos dão à Igreja particular (dioceses): no âmbito da evangelização, da catequese, da vida das paróquias e das pastorais diocesanas, pastorais sociais, etc.
DIRETRIZES GERAIS DA AÇÃO EVANGELIZADORA (2019 – 2023) Ø Inspiração: Documento de Aparecida, 34 (mudança de época) Ø Porta Fidei, 2 (possibilitar uma experiência de encontro com Jesus Cristo) Ø Evangelii Nuntiandi, 19 – ultrapassa-se a compreensão geográfica entre urbano e rural, pois ninguém hoje está fora dessa realidade ou “mentalidade” chamada urbana. Ø DGAE: Utiliza o conceito “urbanização” numa perspectiva cultural. Embora o documento não se detém as questões específicas de cidades grandes, meio ambiente, entre outras. Ø DGAE: Pano de fundo: Comunidade e missão (como duas faces da mesma moeda). Ø Na dimensão ad intra: Se insiste no processo de “capilarização” (melhor distribuída); que a Igreja se faça cada vez mais presente em cada ambiente. Ø Na dimensão ad extra: Em fidelidade ao Evangelho, manter a missionariedade. Ø Para tal, usa-se a imagem da casa, onde aparecem quatro pilares: PALAVRA (iniciação cristã e animação bíblica), LITURGIA (liturgia e espiritualidade), CARIDADE (serviço à vida plena) e AÇÃO MISSIONÁRIA (estado permanente de missão). 16
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
Ø Neles, as mesmas urgências das diretrizes passadas, ganham uma nova perspectiva. Ø Cada diocese ou regional tem espaço para organizar seus projetos pastorais.
ü O centro das DGAE: COMUNIDADES ECLESIAIS MISSIONÁRIAS (no contexto urbano - perpassa todo o texto). ü Capítulo 1: Jesus, a missão, a Igreja, a cultura urbana e as comunidades eclesiais missionárias no contexto urbano. ü Capítulo 2: O olhar do discípulo missionário para esse mundo que se transforma. Fala-se de uma grande cidade onde Deus habita. ü Capítulo 3: Ilumina a presença da Igreja nas casas. Casa como metáfora, símbolo de acolhimento. Comunidade, muitas vezes, como único espaço para viver e conviver. A fundamentação bíblica vem de At 2,42. Casa que se torna comunidade de comunidades, compreensão desenvolvida no documento 100. Segue-se falando dos quatro pilares, com destaque para o pilar 4 - missão paradigmática e programática (paradigma missionário com programas e ações missionárias). ü Capítulo 4: Igreja em missão - Sugestões para ações no espírito do que se refletiu anteriormente.
17
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
MISSÃO É RELAÇÃO Amadeo Cencini – Relação Pastoral e Equilíbrio na Vida Afetiva do sacerdote 21. O Cristianismo é uma religião de Relação – Tudo diz respeito à relação com Deus e à relação com o outro, com o planeta... Não se compreende o padre, como senão na sua vocação relacional, o que significa: saber encontrar a justa medida na dinâmica relacional, pessoa prudente e inimiga de excessos, respeito aos limites fronteiriços de si e do outro, discreto e não invasivo. Um homem “equilibrado”. 22. Segundo Freud, a sexualidade ocupa um ligar central em nossa geografia intrapsíquica. De fato o ato sexual é a ação que gratifica não apenas o impulso sexual, mas de modo indireto todas as realidades humanas. Em resumo> O ato sexual é um elemento de equilíbrio intrapsíquico na vida da pessoa normal – fator equilibrante. O padre que ESCOLHEU LIVREMENTE RENUNCIAR o impulso genital sexual se torna um NORMAL DESEQUILIBRADO, ligado à sua escolha. Ninguém pode ser ordenado sem essas 2 certezas: Ser amado e ter capacidade de amar (de forma madura). 23. Na EG, o Papa Francisco cita três fatores que se alimentam um ao outro, sendo desafio e tentação – levando o celibatário a viver ainda mais DESIQUILIBRADO. Individualismo – Autoerotismo presbiteral O maldito demônio que leva o padre a pensar sozinho, caminhar sozinho, projetar-se sozinho. O individualismo é a forma insana e um tanto frustrada de amor por si mesmo, com raiz narcisista: fecha o sujeito em si e nos 18
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
seus limites, busca estar no centro – relação tipicamente autoerotica. Não ama gratuitamente e geralmente a relação é de poder e dominação. – a pedofilia está nessa linha... Tendência a possuir o outro: a minha Paróquia, o meu ministério, a minha gente, os meus amigos... Autoerotismo clerical: teológico (estudo para se exibir), pastoral (para ser protagonista sem discussão), litúrgico (no centro do rito – ritualismo vazio - excessivo cuidado com detalhes exteriores), até o ponto de atingir o autoerotismo clássico: a masturbação. Sobre esse tipo de padre, falou Dom Lambiasi: “A Igreja mais do que necessitar de presbíteros, precisa de presbitério.” Crise de identidade – Clericalismo É a dúvida ou ignorância do que constitui o padre enquanto tal, sua identidade. O problema não está no conteúdo, nem na teologia presbiteral, mas na positividade do ministério, ou seja, como ele se coloca diante de Deus e aprecia o seu “ser consagrado presbítero”, o que deve elevar sua estima. O Clericalismo é a procura de positividade fora de si mesmo – competição, exibição das qualidades próprias, na perfeição da conduta, na realização de obras relevantes que constem seu nome, busca de visibilidade social e eclesial e alimentar a própria imagem, fazer carreira, gasta energia em sentimentos de inveja e ciúmes clericais – nas exibições visa resultados. Perfeccionismo que o leva a não aceitar os próprios erros – não aceitar a misericórdia e ser testemunha dela... Enfim, colocou a estima de si no lugar errado, acabando na dependência de todas essas realidades: o papel, os resultados, a valorização dos outros, o próprio sucesso... A obediência assume caricaturas (oriundas do universo clerical): simulada, ostentada, tarifada, na medida, indignada... O Papa diz que se trata de “instrumentalizar a própria identidade presbiteral”. 19
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
Declínio de fervor – a mediocridade Que é a falta de paixão, que deveria estar na origem e no centro da escolha vocacional, durante toda a vida. O mal é que o presbítero, às vezes, pensa de forma patética, como se o “amor do início” fosse uma fase irreal ou infantil e que agora, formação intelectual o obrigasse a viver de forma mais concreta, com os pés no chão, abandonando os sonhos da juventude. Como se o adulto maduro devesse coincidir com o tornar-se frio, anêmico, medíocre e morno – é a perda de sensibilidade, quando a Palavra de Deus nos convoca: “Tende em vós os mesmos sentimentos de Jesus Cristo” (Fl 2, 5-11). A formação inicial e permanente deve proporcionar esse “alimento do fervor”: por Cristo, pela pastoral, pela oração, do anunciador... O Papa tem falado da Acídia que tem tomado conta da vida dos consagrados, o que tem levado a serem FUNCIONÁRIOS DO DIVINO. Bento XVI chamou de “Pragmatismo cinzento”, aliado a “psicologia da tumba” que pouco a pouco transforma os cristãos em “múmias de museu.” Mediocridade também é escândalo e perversão. O Equilíbrio na vida afetiva: Seu equilíbrio tem duas vertentes: humana e espiritual – psicológica e teológica.
O tesouro no campo: A vertente psicológica, como vimos, traz a precariedade e a pobreza do presbítero em manter equilibrado, por meio de compensações. Uma renúncia apenas é possível se a pessoa descobriu algo que valha mais que o objeto da renúncia. Psicologicamente é alegria da descoberta que dá força para a renúncia, o que também é espiritual. É a lógica do tesouro escondido no campo (Mt 13,44). O equilíbrio afetivo-sexual na vida do presbítero celibatário é construído sob um “desiquilíbrio alegre”, pois a 20
A VIDA RELIGIOSA E A PARÓQUIA
escolha positiva se apresenta como mais rica e mais bela, mais gratificante e plena. Quando a renúncia é fraca, sente-se o peso da mortificação de dever renunciar (buscando gratificações) que não à beleza de ter optado por Cristo e à Castidade pelo Reino. Estilo Relacional pastoral indicações práticas:
equilibrado. Algumas
Ø Colocar-se de lado porque o centro pertence a Deus (não sou eu o seu centro, mas Deus); Ø Tocar o outro, para não fazer do corpo nem o lugar, nem o motivo do encontro: o que significa fazer-se próximo, delicadeza sem ser invasivo, trato com respeito, conservando a sobriedade, senso dos limites pessoais e dos outros. O pastor exprime seu amor pelas ovelhas e se deixa amar, como gesto afetuoso de Deus, não mais do que isto. Ø Livre para hospedar a dor do outro no próprio coração. Viver a atitude do Cristo Bom Pastor na compaixão pelas ovelhas perdidas e feridas – sofrer pelo outro e com o outro – hospedar as dores alheias e carrega-las no seu coração presbiteral – OBJETIVO PRINCIPAL DO CELIBATÁRIO PELO REINO. Esta é atitude que melhor equilibra o presbítero. Ø Livres da mania de poder. A compaixão elimina a tentação de dominar e agir com poder sobre a outra pessoa. Acolher ao menos um pouco da dor do outro é a verdadeira autoridade do padre. Ø Amar a Deus com o coração humano, amar o homem com o coração divino. A verdadeira maturidade se dá quando estas duas dinâmicas se cruzam. Colocar juntos dois modos de amar: humano e divino – dois objetos de seu amor: Deus e o homem. 21
Dom Amilton Manoel da Silva, CP
Ø Quando outro é menor ou vulnerável. Merece completamente o cuidado e a proteção do pastor; atenção, respeito e ternura... “Ai daquele que escandalizar um desses pequeninos...” (Mt 18,6)
22
Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil