Revista Racine (Edição 105)

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Editorial Câncer Progride em Incidência e em Custos de Tratamento Na Revista Racine número 104, veiculada no bimestre passado, demos início à exploração das maiores causas de mortalidade verificadas hoje em nosso País, tratando das Doenças do Aparelho Circulatório. A etiologia cardiovascular (infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral) para óbito foi, segundo o Ministério da Saúde, em 2002, pelo menos duas vezes mais comum que outras etiologias.

105 Ano XVIII Julho/Agosto de 2008 Câncer

Estas enfermidades, assim como o Câncer, segunda maior causa de óbitos hoje no Brasil e tema desta edição 105 da Revista Racine, são, na grande maioria das vezes, evitáveis, pois têm como fatores de risco os hábitos que próprio indivíduo adota como estilo de vida. A exposição ao tabaco, o etilismo, a alimentação inadequada, o sedentarismo e a obesidade, apenas para citar alguns, complementados por aspectos fora de seu controle como idade e história familiar. A vida contemporânea e estes comportamentos vêm contribuindo para alterar o cenário da saúde mundial em relação ao perfil epidemiológico das doenças crônicodegenerativas. Neste panorama, as neoplasias destacam-se pelo rápido aumento de sua incidência, pelo alto índice de mortalidade que ocasionam, pelos fatores de risco já citados e pelos avanços no tratamento de alguns tipos de câncer, o que, aliado à maior sobrevida dos pacientes, gera altos custos ao sistema de saúde. Para debater este tema, recorremos, para realizar a Mesa Redonda, a um centro referência em tratamento e em pesquisa científica na área oncológica, o Hospital A. C. Camargo, que atua de modo multidisciplinar desde a prevenção até a reabilitação e nos cuidados paliativos. O debate suscitou relevantes questões como os tipos de tumores mais incidentes e os de maior expressão nos índices de mortalidade, avanços no diagnóstico e no tratamento, aspectos emocionais e relativos à formação dos profissionais que atuam em oncologia.

Envie seu trabalho para publicação na Revista Racine A Revista Racine é um periódico técnico-científico direcionado a profissionais que atuam em farmácias comunitárias, hospitalares e/ou nos serviços públicos de saúde, que traz bimestralmente temas de relevância em saúde pública, levando em consideração aspectos como o impacto na morbimortalidade, os desafios do diagnóstico ou tratamento, as questões de incidência ou prevalência e os recursos destinados a sua atenção ou assistência, entre outros aspectos. Envie seu trabalho para o e-mail revista@racine.com.br. Ele será avaliado pela coordenação editorial e pode ser publicado.

Os profissionais desta instituição contribuíram também produzindo artigos que trazem a experiência de atuação de cada um frente ao paciente, aos seus familiares e à equipe de saúde, cujo resultado você confere lendo os Especiais de Capa. O farmacêutico, nesse contexto, possui diversas possibilidades de atuação, tanto em ambiente hospitalar - por meio de atividades administrativas ou clínicas - quanto em farmácias comunitárias e com manipulação, desde a promoção da prevenção - orientando sobre fatores de risco - até o acompanhamento farmacoterapêutico do tratamento. Na seção Farmácia Hospitalar, chamamos sua atenção para o artigo que apresenta uma nova área de atuação clínica do farmacêutico hospitalar, a Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, destacando pontos fundamentais que levam em consideração peculiaridades dos neonatos como superfície corpórea, peso e alterações farmacocinéticas e de vias de administração de medicamentos, dentre outras. Mais uma edição da revista Racine que, temos certeza, contribuirá com o ganho de qualidade no exercício profissional farmacêutico. Boa leitura!

Nilce Barbosa Presidente do Grupo Racine e Coordenadora Técnica Editorial da Revista Racine Revista Racine 105 - Julho/Agosto de 2008

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Panorama Geral

Incidência, Etiologia, Fatores de Risco e Tratamento do Câncer: Visão Brasileira Sobre uma Ameaça Global José Augusto Rinck Jr.

Em 2007 o câncer foi responsável por 7,9 milhões de mortes no mundo (aproximadamente 13%), tornando-se a principal causa de mortalidade, com estimativas de alcançar 12 milhões em 2030. Cerca de 80% das mortes naquele ano ocorreram em países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. Fonte: Organização Mundial da Saúde (OMS)

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Panorama Geral tumores de mama, de colo de útero e colo-retal. O tumor de pulmão é o que mais ocasiona mortalidade, sendo responsável por mais de um milhão de mortes anuais. Em relação ao sexo, nos homens, os três principais tumores são, em ordem decrescente, o de pulmão, o de estômago e o de fígado e, entre as mulheres, os de mama, os de pulmão e os de colo de útero (Figura 1) (1).

Figura 1 - Mundo: número de casos (todas as idades) de câncer Tipo

Homens

Pulmão Mama Cólon e reto Estômago Próstata Fígado Cervix uterino Esôfago Bexiga Linfoma não-Hodgkin Leucemia Cavidade oral Pâncreas Rins Ovários Corpo uterino Cérebro, sistema nervoso Melanoma de pele Laringe Tireóide Faringe* Mieloma múltiplo Nasofaringe Linfoma Hodgkin Testículos

Mulheres

Figura 2 - Curva de mortalidade por câncer nos Estados Unidos da América (EUA) Menos de 85 anos 340 320 300

Doença cardiovascular

280 260

Taxa por 100.000 habitantes

A

estatística mundial demonstra números impressionantes em relação ao câncer: incidência de 10.862.496 casos em 2002, sendo responsável pela morte de 6.723.887 pessoas e com uma prevalência, nos últimos cinco anos, de 24.570.115 casos. Em homens, os três tumores mais incidentes são, em ordem decrescente, o de pulmão, o de próstata e o de estômago. Já em mulheres, os mais incidentes são os

240 220 200

Câncer

180 160 140 120 100 80 60 40 20 1975 1977 1979 1981 1983 1985 1989 1991 1993 1995 1997 1999 2001 2003 2004

0

Ano de falecimanto

85 anos e mais 8.000

7.000

Doença cardiovascular

Casos Mortes

1.200 1.000

800

600

* Exceto rinofaringe, orofaringe e hipofaringe

Em países desenvolvidos, como os Estados Unidos da América (EUA), desde o final da década de 90 o câncer já ultrapassou as causas cardiovascu-

400

200

0

200

400

600

800

1.000 1.200

Fonte: GLOBOCAN 2002, IARC

lares no ranking de mortalidade, principalmente nas faixas etárias abaixo dos 85 anos, tornando-se a principal causa de óbito (Figura 2) (2).

5.000

4.000

3.000

2.000

Câncer 1.000

0 1975 1977 1979 1981 1983 1985 1989 1991 1993 1995 1997 1999 2001 2003 2004

Taxa por 100.000 habitantes

6.000

Ano de falecimanto

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Panorama Geral Nos EUA modifica-se sensivelmente o ranking dos tumores. Os líderes de casos novos são os tumores de câncer de próstata, nos homens, e câncer de mama, nas mulheres, mas na segunda e terceira posições são os mesmos tumores, câncer de pulmão e de cólon e reto para

ambos os sexos. Em relação à mortalidade, o câncer de pulmão se mantém líder em ambos os sexos, bem como o de cólon e reto no terceiro lugar, alternando apenas o segundo lugar com câncer de próstata nos homens e de mama nas mulheres (Figura 3) (2).

Figura 3 - Incidência e mortalidade de câncer nos EUA

NOVOS CASOS ESTIMADOS Próstata Pulmão e brônquios Cólon e reto Bexiga Linfoma não-Hodgkin Melanoma de pele Rim e pelve renal Cavidade oral e faringe Leucemia Pâncreas Todos os tipos

186.320 114.690 77.250 51.230 35.450 34.950 33.130 25.310 25.180 18.770 745.180

25% 15% 10% 7% 5% 5% 4% 3% 3% 3% 100%

Mama Pulmão e brônquios Cólon e reto Útero Linfoma não Hodgkin Tireóide Melanoma de pele Ovário Rim e pelve renal Leucemia Todos os tipos

182.460 100.330 71.560 40.100 30.670 28.410 27,530 21.650 21.260 19.090 692.000

26% 14% 10% 6% 4% 4% 4% 3% 3% 3% 100%

Pulmão e brônquios Mama Cólon e reto Pâncreas Ovário Linfoma não Hodgkin Leucemia Útero

71.030 40.480 25.700 16.790 15.520 9.370 9.250 7.470 5.840 5.650 271.530

26% 15% 9% 6% 6% 3% 3% 3% 2% 2% 100%

MORTES ESTIMADAS Pulmão e brônquios Próstata Cólon e reto Pâncreas Fígado e ductos biliares intra-hepáticos Leucemia Esôfago Bexiga Linfoma não Hodgkin Rim e pelve renal Todos os tipos

38

90.810 28.660 24.260 17.500 12.570 12.460 11.250 9.950 9.790 8.100 294.120

31% 10% 8% 6% 4% 4% 4% 3% 3% 3% 100%

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Fígado e ductos biliares intrahepáticos Cérebro e outros de sistema nervoso Todos os tipos


Panorama Geral No Brasil, os dados estatísticos são subestimados, mas vêm sendo obtidos com constante melhora nos últimos anos, graças aos esforços de instituições como a Fundação Oncocentro de São Paulo (FOSP) (3), no Estado de São Paulo, e do Instituto Nacional de Câncer (INCA), em todo o Brasil (4). Desde o lançamento da Política Nacional de Atenção Oncológica (PNAO), em dezembro de 2005, todo empenho foi dado para a promoção de ações integradas do governo com a sociedade para implementar uma nova política que reconheça o câncer como problema de saúde pública e estruture a realização de ações para o seu controle, no Brasil, por meio da Rede de Atenção Oncológica, com participação direta e indireta do governo federal, das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, das Universidades, dos serviços de saúde, dos centros de pesquisa, das organizações não-governamentais e da sociedade de forma geral. Dentre os componentes fundamentais da PNAO, destacam-se a promoção e a vigilância em saúde, em que os sistemas de informação configuram-se como alicerce para a implementação das ações nacionais. As ações relacionadas à vigilância do

câncer são realizadas com base em informações obtidas dos registros de câncer e oriundas principalmente dos Registros de Câncer de Base Populacional (RCBP), supervisionados pelo INCA/Ministério da Saúde (MS), e do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, centralizado nacionalmente pela Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS). Em 2008 são esperados no Brasil 466.730 casos novos de câncer. Os tipos mais incidentes, à exceção do câncer de pele do tipo não melanoma, serão os cânceres de próstata e de pulmão, no sexo masculino, e os cânceres de mama e de colo do útero, no sexo feminino, acompanhando o mesmo perfil da magnitude observada na estatística mundial. Efetuando a separação por sexo, são esperados 231.860 casos novos para o sexo masculino e 234.870 para o sexo feminino. Estima-se que o câncer de pele do tipo não melanoma (115 mil casos novos) será o mais incidente na população brasileira, seguido pelos tumores de próstata (49 mil), de mama feminina (49 mil), de pulmão (27 mil), de cólon e reto (27 mil), de estômago (22 mil) e de colo do útero (19 mil) (Figura 4).

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Panorama Geral Tabela 1 - Estimativas, para o ano de 2008, de números de casos novos por câncer no Brasil, em homens e mulheres, segundo localização primária* Localização Primária Neoplasia Maligna Próstata

Estimativa de casos novos Masculino Feminino 49.530

-

49.530

-

49.400

49.400

Mama feminina

Figura 4 - Tipos de câncer mais incidentes, estimados para o ano de 2008, na população brasileira, sem pele não melanoma

Feminino Masculino

50.000

27.270

14.500

26.990

Estômago

14.080

7.720

21.800

Colo e útero

-

18.680

18.680

Cavidade oral

10.380

3.780

14.160

Esôfago

7.900

2.650

10.550

Leucemias

5.220

4.320

9.540

Pele melanoma

2.950

2.970

5.920

Outras localizações

55.610

62.270

117.880

175.970

175.750

351.720

55.890

59.120

115.010

231.860

234.870

466.730

*Números arredondados para dez ou múltiplos de dez

30.000 20.000

Pele melanona

Leucemias

Esôfago

Cavidade oral

Colo do útero

Estômago

Cólon e reto

Mama feminina Traquéia, brônquio e pulmão

10.000

Próstata

9.460

12.490

Todas as neoplasias

40.000

Fonte: Ministério da Saúde (MS)/Instituto Nacional de Câncer (INCA)

Os tumores mais incidentes para o sexo masculino serão devidos ao câncer de pele não melanoma (56 mil casos novos), de próstata (49 mil), de pulmão (18 mil), de estômago (14 mil) e de cólon e reto (12 mil). Para o sexo feminino, destacam-se os tumores de pele não melanoma (59 mil casos novos), de mama (49 mil), de colo do útero (19 mil), de cólon e reto (14 mil) e de pulmão (9 mil) (Tabela 1). 40

17.810

Cólon e reto

Pele não melanoma

60.000

0

Traquéia, brônquio e pulmão

Subtotal

Nº de casos

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Total

A distribuição dos casos novos de câncer, segundo sua localização primária, é bem heterogênea entre Estados e capitais do País. As regiões Sul e Sudeste, de maneira geral, apresentam as maiores taxas, enquanto as regiões Norte e Nordeste mostram as menores taxas. As taxas da região Centro-Oeste apresentam um padrão intermediário. A publicação recente pelo INCA das Estimativas 2008 de Incidência de Câncer no Brasil traça um panorama dos principais tumores e as suas diferenças regionais na população brasileira: • Câncer de mama: o número de casos novos de câncer de mama esperados para o Brasil, no ano de 2008, é de 49.400, com um risco estimado de 51 casos a cada 100 mil mulheres. Na região Sudeste, o câncer de mama é o mais incidente entre as mulheres, com um risco estimado de 68 casos novos por 100 mil. Sem considerar os tumores de pele não melanoma, esse tipo de câncer também é o mais freqüente nas mulheres das regiões Sul (67/100.000), Centro-Oeste (38/100.000) e Nordeste (28/100.000). Na região Norte, é o segundo tumor mais incidente (16/100.000); • Câncer de pulmão: o número de casos novos de câncer de pulmão estimados para o Brasil, no ano de 2008, é


Panorama Geral

de 17.810 entre homens e de 9.460 entre as mulheres. Esses valores correspondem a um risco estimado de 19 casos novos a cada 100 mil homens e de dez para cada 100 mil mulheres. Sem considerar os tumores de pele não melanoma, o câncer de pulmão em homens é o segundo mais freqüente nas regiões Sul (36/100.000), Sudeste (22/100.000) e Centro-Oeste (16/100.000). Nas regiões Nordeste (9/100.000) e Norte (8/100.000), é o terceiro mais freqüente. Para as mulheres, é o quarto mais freqüente nas regiões Sul (16/100.000), Sudeste (11/100.000), Centro-Oeste (9/100.000) e Norte (5/100.000) e o quinto mais freqüente na região Nordeste (5/100.000); • Câncer de estômago: o número de casos novos de câncer de estômago estimados para o Brasil, no ano de 2008, é de 14.080 entre homens e de 7.720 nas mulheres. Esses valores correspondem a um risco estimado de 15 casos novos a cada 100 mil homens e de oito para cada 100 mil mulheres. Sem considerar os tumores de pele não melanoma, o câncer de estômago em homens é o segundo mais freqüente nas regiões Norte (10/100.000) e Nordeste (9/100.000). Nas regiões Sul (21/100.000) e Centro-Oeste (12/100.000), é o terceiro mais freqüente e na região Sudeste (18/100.000), o 42

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quarto mais freqüente. Para as mulheres, é o terceiro mais freqüente na região Norte (5/100.000). Na região Nordeste, é o quarto mais freqüente (5/100.000). Nas demais regiões, Sudeste (10/100.000), Sul (10/100.000) e Centro-Oeste (6/100.000), é o quinto mais freqüente; • Câncer do colo do útero: o número de casos novos de câncer do colo do útero esperados para o Brasil no ano de 2008 é de 18.680, com um risco estimado de 19 casos a cada 100 mil mulheres. Sem considerar os tumores de pele não melanoma, o câncer do colo do útero é o mais incidente na região Norte (22/100.000). Nas regiões Sul (24/100.000), Centro-Oeste (19/100.000) e Nordeste (18/100.000), esse tipo de câncer ocupa a segunda posição mais freqüente e, no Sudeste (18/100.000), a quarta posição; • Câncer de próstata: o número de casos novos de câncer de próstata estimados para o Brasil, no ano de 2008, é de 49.530. Esses valores correspondem a um risco estimado de 52 casos novos a cada 100 mil homens. Sem considerar os tumores de pele não melanoma, o câncer de próstata é o mais freqüente em todas as regiões, com risco estimado de 69/100.000 na região Sul, 63/100.000 na região Sudeste, 47/100.000 na região Centro-Oeste, 38/100.000 na região Nordeste e 22/100.000 na região Norte;


Panorama Geral • Câncer de cólon e reto: o número de casos novos de câncer de cólon e reto estimados para o Brasil, no ano de 2008, é de 12.490 casos em homens e de 14.500 em mulheres. Esses valores correspondem a um risco estimado de 13 casos novos a cada 100 mil homens e de 15 para cada 100 mil mulheres. Sem considerar os tumores de pele não melanoma, o câncer de cólon e reto em homens é o terceiro mais freqüente na região Sudeste (19/100.000). Nas regiões Sul (21/100.000) e Centro-Oeste (10/100.000), este tumor ocupa a quarta posição. Nas regiões Nordeste (4/100.000) e Norte (3/100.000), ele ocupa a quinta e a sexta posições, respectivamente. Para as mulheres, é o segundo mais freqüente na região Sudeste (21/100.000), o terceiro mais freqüente nas regiões Sul (22/100.000), CentroOeste (11/100.000) e Nordeste (6/100.000), enquanto na região Norte (4/100.000) é o quinto mais freqüente; • Câncer de pele: o número de casos novos de câncer de pele não melanoma estimados para o Brasil, no ano de 2008, é de 55.890 entre homens e de 59.120 entre mulheres. Esses valores correspondem a um risco estimado de 59 casos novos a cada 100 mil homens e de 61 para cada 100 mil mulheres. O câncer de pele não melanoma é o mais incidente em homens na maioria das regiões do Brasil, com um risco estimado de 82/100.000 na região Sul, 68/100.000 na região Sudeste, 47/100.000 na região Nordeste e 27/100.000 na região Norte, enquanto na região Centro-Oeste (45/100.000) é o segundo mais freqüente. Nas mulheres, é o mais freqüente nas regiões Sul (82/100.000), Centro-Oeste (64/100.000), Nordeste (53/100.000) e Norte (28/100.000), enquanto na região Sudeste (64/100.000) é o segundo mais freqüente. Quanto ao melanoma, sua letalidade é elevada, porém sua incidência é baixa (2.950 casos novos, em homens, e 2.970 casos novos, em mulheres). As maiores taxas estimadas em homens e mulheres encontram-se na região Sul; • Tumores pediátricos: o percentual mediano dos tumores pediátricos observados encontra-se próximo de 3%. O número de casos novos de câncer estimados para o Brasil, no ano de 2008, é de 351.720, à exceção dos tumores de pele não melanoma. Depreende-se, portanto, que ocorrerão cerca de 9.890 casos novos de câncer em crianças e adolescentes com até 18 anos de idade;

Etiologia e fatores de risco A etiologia do câncer é multifatorial. Participam do seu desenvolvimento processos de herança genética de predisposição, de exposição a agentes carcinogênicos ambientais, de ganho de vantagens proliferativas celulares, de falha no sistema de vigilância imunológica e até de intervenção ou não em lesões pré-malignas. Entre os fatores de risco para os principais tumores que afetam a população brasileira estão (5): • Idade: a longevidade aumenta o risco de uma célula normal transformar-se em célula neoplásica, quer seja por falhas nos seus sistemas de divisão celular ou pelo simples fato de ter um maior tempo de exposição a agentes carcinogênicos. Alguns estudos apontam para dois tipos de câncer de mama, por exemplo, relacionados com a idade - o primeiro tipo ocorre na prémenopausa e é caracterizado por ser mais agressivo e estrogênio receptor (ER) negativo, já o segundo ocorre na pós-menopausa e está associado com características indolentes e, principalmente, por ser ER positivo. Também é considerado um fator de risco para tumor

Como se pode observar há uma grande variação entre as regiões, sendo algumas, como a Sudeste, com incidências típicas de países desenvolvidos e outras, como a Norte, com incidências típicas de países subdesenvolvidos. Estas diferenças são oriundas de uma conjuntura de fatores que vão desde as condições econômicas, administrativas e sociais, até as ambientais e nutricionais. Revista Racine 105 - Julho/Agosto de 2008

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Panorama Geral de cólon e reto, uma vez que tanto a incidência como a mortalidade aumentam proporcionalmente à idade; • Histórico familiar e pessoal de câncer: há evidências na literatura de que pessoas que têm câncer de pulmão apresentam o risco aumentado para o aparecimento de outros cânceres de pulmão e de que irmãos(ãs) e filhos(as) de pessoas que tiveram câncer de pulmão apresentaram um risco levemente aumentado para o desenvolvimento desse câncer. A história familiar de câncer de cólon e reto também oferece maior risco para o desenvolvimento destes tumores. Para o melanoma, um maior risco inclui história pessoal ou familiar de melanoma; • Exposição hormonal: os fatores de risco relacionados à vida reprodutiva da mulher (menarca precoce, nuliparidade, idade da primeira gestação a termo acima dos 30 anos, uso de anticoncepcionais orais, menopausa tardia e terapia de reposição hormonal) estão bem estabelecidos em relação ao desenvolvimento do câncer de mama. Por outro lado, a terapia de reposição hormonal na menopausa parece diminuir a incidência de tumor de cólon, reto e endométrio. Em tumor de colo de útero há a associação de sua maior incidência com a do uso de anticocepcionais orais, embora seja discutível sua ação como agente etiológico; • Genético: mutações em determinados genes como BRCA 1 e 2 podem levar ao desenvolvimento de tumores de mama e ovário. A predisposição genética ao desenvolvimento de doenças crônicas do intestino (como as poliposes adenomatosas) pode levar ao desenvolvimento de câncer de cólon e reto em até 100% das vezes; • Tabagismo: nos países ou nas regiões em que há longa história de consumo de tabaco, cerca de 90% dos casos de câncer de pulmão em homens são relacionados ao tabaco. O hábito de consumo de tabaco é o mais importante fator de risco para o desenvolvimento do câncer de pulmão. Comparados com os não fumantes, os tabagistas têm cerca de 20 a 30 vezes mais risco de desenvolver câncer de pulmão. Em geral, as taxas de incidência em um determinado país refletem seu índice de consumo de cigarros. Muito mais importante que o número de cigarros consumidos por dia é o tempo total de exposição ao tabagismo. Obviamente, quanto maior o numero de cigarros consumidos, maior ainda é este risco. Trinta e cinco por cento (35%) de todas as mortes por câncer são atribuídas ao tabagismo, chegando em alguns tumores, como o de pulmão, a 85% (Tabela 2) (6). O tabagismo passivo é responsável por 25% dos tumores de pulmão em não fumantes, acarretando cerca de 3.000 mortes por ano. O risco de câncer ao casar44

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se com fumante aumenta em 20% e o segundo fator mais importante do tabagismo passivo é o ambiente de trabalho. Outros tumores também relacionados ao tabagismo são de colo de útero, cabeça e pescoço, esôfago, estômago, bexiga, rim, pâncreas, cólon e reto; Tabela 2 - Tipos de câncer e mortes atribuídas ao tabagismo

Tipos de câncer Pulmão Laringe Faringe, boca e lábios Esôfago Bexiga Rim Colo de útero Pâncreas Estômago

Mortes atribuídas ao tabagismo 85% 80% 80% 75% 45% 35% 30% 30% 20%

• Etilismo: o excessivo consumo de álcool está associado ao desenvolvimento de tumor de cavidade oral, faringe, laringe, esôfago, fígado, colorretal e mama (7). Apresenta, ainda, efeito sinérgico com o tabagismo nos tumores de cavidade oral, faringe, laringe e esôfago; • Comportamento: multiplicidade de parceiros sexuais e iniciação sexual precoce estão associados a tumor de colo de útero; • Exposição ambiental: fortemente relacionada a exposições ocupacionais (Tabela 3). Estudos epidemiológicos apontam como importantes fatores de risco para o câncer de pulmão a exposição ao asbesto, ao gás radioativo radônio, à poluição do ar, ao urânio, ao arsênio, aos cromados de níquel, ao cloreto de vinil, ao carvão mineral, ao gás de mostarda e ao éter de clorometil. O asbesto também confere maior risco de desenvolvimento de tumor de pleura (mesotelioma);


Panorama Geral Tabela 3 - Exposição ambiental e câncer

Carcinógeno Asbesto Benzeno Arsênio Níquel, cromo Serragem Hidrocarbonetos policíclicos Aminas aromáticas Vinil Radiação Petróleo, óleos minerais

Câncer Pulmão, pleura, peritôneo Leucemia Pulmão, pele, fígado Pulmão Nasal Pulmão Bexiga Fígado Leucemias, pulmão, osso, pele, mama (dez a 16 anos), tireóide, sarcomas Pele

• Sol: a maioria dos cânceres de pele é devido à exposição excessiva ao sol. A Sociedade Americana de Câncer estimou que, em 2007, mais de um milhão de casos de basocelulares e células escamosas e cerca de 60 mil casos de melanoma estariam associados à radiação UV (ultravioleta). A sensibilidade da pele

ao sol, bem como a história de exposição solar excessiva, entram nesta equação de maior risco para o desenvolvimento de câncer de pele; • Infecções: sabe-se que, atualmente, para o surgimento do câncer do colo do útero, a condição necessária é a presença de infecção pelo vírus do papiloma humano (HPV). Quase todos os casos de câncer do colo do útero são gerados por um dos 15 tipos oncogênicos do HPV, sendo os tipos mais comuns o HPV16 e o HPV18. Infecções pulmonares de repetição estão associadas ao desenvolvimento de câncer de pulmão. Infecção por Helicobacter pylori está associada a risco maior de câncer de estômago, principalmente o linfoma do tipo MALT, contudo apenas uma pequena parcela dos pacientes com esta infecção desenvolverá câncer. A infecção por Schistosoma haematobium aumenta o risco de câncer de bexiga. Infecção sem controle pelo HIV aumenta o risco de desenvolvimento de uma série de tumores, entre eles linfomas, sarcoma de Kaposi e tumor de canal anal. No sarcoma de Kaposi há também forte associação com infecção VHH (vírus da herpes humana tipo 8) (Tabela 4);

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Panorama Geral Tabela 4 - Agente etiológico e câncer

Agente infeccioso Vírus Epstein-Barr Vírus hepatite B e C HPV-16 e 18 HIV HHV-8 HTLV I HTLV II Helicobacter pylori Aspergillus

Câncer relacionado Tu nasofaringe, linfoma de Burkitt, imunoblástico Tu hepático (CHC) Tu colo uterino, vagina, vulva, canal anal, pênis Sarcoma de Kaposi, linfoma Sarcoma de Kaposi Leucemia/linfoma de células T do adulto Leucemia de células cabeludas Tu gástrico (linfomas tipo MALT) Tu hepático

Schistosoma haematobium Tu bexiga Fascíola hepática

Tu vias biliares

Tu = tumor; CHC = CarcinomaHepatoCelular

• Doenças: certas doenças, como retocolite ulcerativa e Crohn, conferem maior risco para o desenvolvimento de câncer de cólon e reto, principalmente quanto maior for o tempo de sua duração e mais extenso o seu acometimento intestinal. Doenças imunossupressoras também são fatores de risco para todos os tipos de câncer de pele; • Alimentos: aproximadamente 1/3 das mortes por câncer estão relacionadas com tipos de dieta alimentar. A deficiência e o excesso de vitamina A, por exemplo, estão associadas com câncer de pulmão. Dietas pobres em ingestão de frutas, legumes e verduras, ricas em uso de sal, e condições ruins de conservação dos alimentos aumentam o risco de desenvolver câncer de estômago. A ingestão crônica de alimentos em alta temperatura, como mate na região Sul do País, aumenta o risco de câncer de esôfago. Uma alimentação com base em gordura animal, carne vermelha e cálcio tem sido associada ao aumento no risco de desenvolver câncer de próstata. Já uma dieta rica em vegetais, selênio, vitaminas D e E, licopeno e ômega-3 tem indicado proteção para o desenvolvimento dessa neoplasia. O fator de risco mais importante para tumor de cólon e reto é uma dieta à base de gorduras animais, baixa ingestão de frutas, vegetais e cereais; • Obesidade: há associação com o desenvolvimento de câncer de mama e de cólon e reto. Alguns estudos também apontam a obesidade como fator de risco para a mortalidade por câncer de próstata; • Sedentarismo: a prática de atividade física regular está associada a um baixo risco de desenvolvimento do câncer de cólon, reto e mama. 46

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Tratamento do câncer O tratamento do câncer, nos últimos dez anos, passou por uma grande transformação, fruto de um melhor conhecimento, principalmente molecular, permitindo identificação não apenas de fatores de prognósticos como também de fatores preditivos de resposta aos tratamentos e, principalmente, alvos para intervenções terapêuticas de maneira mais específica e seletiva. O desenvolvimento e a melhora do conhecimento de técnicas imunológicas ao longo da década de 90 também permitiram a criação de anticorpos monoclonais desenhados especificamente para alvos tumorais ou para fatores relacionados ao crescimento e proliferação tumoral, além de servirem como carreadores de drogas ou de radiofármacos para ação local no tumor. Em alguns tumores, como o tumor de estroma do trato gastrointestinal (GIST), a descoberta de um medicamento, o imatinib, inibidor de uma enzima que é componente primordial no processo de desenvolvimento, modificou completamente a evolução deste tumor. O tumor de rim, para o qual havia pouquíssimas opções terapêuticas sistêmicas e com baixíssimas taxas de resposta, viu nos últimos dois anos o surgimento de um verdadeiro leque de opções terapêuticas muito mais efetivas como sunitinib, sorafenib, temsirolimus e evirolimus. A descoberta de inibidores da ação de receptores de fatores de crescimento tumoral, como EGFR e Her-2, também direcionaram o desenvolvimento de terapêuticas-alvo como erlobinib em tumor de pulmão, cetuximab em câncer de pulmão, de cólon e reto e de cabeça e pescoço e trastuzumab em câncer de mama. Um anticorpo direcionado a bloquear fatores de crescimento vascular (VEGF) também vem produzindo, em associação com quimioterapia convencional, aumento não somente de taxas de resposta antitumoral como até ganho de sobrevida em tumores de cólon e reto, pulmão, mama e rim. Os tumores hematológicos também têm tido grandes avanços com as terapias alvos como o rituximab em linfomas não-Hodgkin (LNH) de alto grau, imatinib em leucemia mielóide crônica (LMC) e alemtuzumab em leucemia linfocítica crônica (LLC). Embora todas estas inovações tecnológicas no tratamento do câncer tenham trazido significativos aumentos nas taxas de respostas, nos períodos livres de progressão da doença e, em alguns casos, até uma maior sobrevida, ainda não representam a cura, principalmente em tumores mais avançados. A prevenção e o diagnóstico precoce ainda são as mais potentes armas no combate ao câncer.


Panorama Geral As recomendações de prevenção para os tumores mais prevalentes na população, segundo o Ministério da Saúde, são (4): • Tumor de mama: exame mamográfico, pelo menos, a cada dois anos, para mulheres de 50 a 69 anos de idade, e exame clínico anual das mamas, para mulheres de 40 a 49 anos de idade. O exame clínico da mama deve ser realizado em todas as mulheres que procuram o serviço de saúde, independentemente da faixa etária, como parte do atendimento à saúde da mulher. Para mulheres de grupos populacionais considerados de risco elevado para o câncer de mama (com história familiar de câncer de mama em parentes de primeiro grau), recomenda-se o exame clínico da mama e a mamografia, anualmente, a partir de 35 anos de idade; • Tumor de pulmão: não há nenhum método eficaz de rastreamento na população em geral, sendo a principal recomendação parar de fumar; • Tumor de colo de útero: o teste de Papanicolaou convencional constituiu-se na principal estratégia utilizada em programas de rastreamento voltados para o controle do câncer do colo do útero. No Brasil, o exame citopatológico é a estratégia de rastreamento recomendada pelo Ministério da Saúde, prioritariamente para mulheres de 25 a 59 anos de idade. Recentemente, agências de regulamentação de medicamentos de vários países, como a Food and Drug Administration (FDA), dos EUA, e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), do Brasil, aprovaram para comercialização a primeira vacina desenvolvida para a prevenção das infecções mais comuns que causam a condilomatose genital (HPV 6 e 11) e o câncer do colo do útero (HPV 16 e 18). A incorporação da vacina contra HPV pode se constituir, no futuro, em 48

importante ferramenta no controle do câncer do colo do útero; • Tumor de próstata: os métodos de rastreamento disponíveis atualmente, como o Prostate Specific Antigen (PSA), não mostraram, até o momento, sucesso em reduzir a mortalidade, além de levarem a muitas cirurgias desnecessárias, causando prejuízos tanto financeiros quanto de qualidade de vida. Ainda se aguarda os resultados de dois estudos grandes - Prostate, Lung, Colorectal and Ovarian (PLCO) cancer screening trial e European Randomized Screening for Prostate Cancer trial (ERSPC) - para definição do real impacto do PSA mais toque retal no rastreamento populacional de câncer de próstata; • Tumor de cólon/reto: detecção precoce de pólipos adenomatosos colo-retais (precursores do câncer de cólon e reto) e de cânceres localizados é possível pela pesquisa de sangue oculto nas fezes e por intermédio de métodos endoscópicos. Assim sendo, recomenda-se a pesquisa de sangue oculto em três amostras distintas anualmente a partir dos 50 anos de idade. Para indivíduos considerados de alto risco como os portadores de Polipose Adenomatose Familar (FAP), doença inflamatória intestinal (Crohn

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e retocolite ulcerativa) ou membro de famílias com câncer de cólon hereditário não polipóide (HNPCC) a recomendação é o rastreamento com exames endoscópicos; • Tumor de pele: a prevenção do câncer de pele, extensiva aos melanomas, inclui ações de prevenção primária por meio de proteção contra luz solar, as quais são efetivas e de baixo custo. O auto-exame também contribui para o diagnóstico precoce. Se a pessoa notar o surgimento de manchas/sinais novos ou a mudança em alguns, deve procurar o dermatologista. A educação em saúde, tanto para profissionais quanto para a população em geral, no sentido de alertar para a possibilidade de desenvolvimento de câncer de pele e de possibilitar o reconhecimento de alterações precoces sugestivas de malignidade, é outra estratégia internacionalmente aceita. No Brasil, a grande maioria dos pacientes com câncer é tratada no Sistema Único de Saúde (SUS). Na segunda metade da década de 90 foi criado o Sistema de Autorização de Procedimentos Ambulatoriais de Alta Complexidade (APAC), que oferecia ao médico oncologista a liberdade de escolha do tratamento sistêmico (quimioterapia) para o paciente com câncer, uma vez que não determinava qual tratamento deveria receber cada tumor e sim o valor a ser pago para aquele tratamento. Desde a sua criação nunca mais foram revistos os seus valores e, como se pode ver, a oncologia teve grandes reviravoltas no aspecto do tratamento nos últimos dez anos, com a incorporação de novos medicamentos e, conseqüentemente, um grande aumento de custos. Nos dias de hoje isso gera uma avalanche de processos judiciais para obtenção de


Panorama Geral acesso aos avanços terapêuticos. Tentativas de revisão deste sistema foram realizadas de maneira insistente pela Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) junto aos órgãos do Ministério da Saúde, mas até agora foram todas frustrantes. Os custos da oncologia atual são um problema não apenas para o Brasil, mas também para países desenvolvidos da América do Norte e da Europa. Em alguns destes países as incorporações tecnológicas oncológicas ocorreram apenas após mobilização de associações de pacientes ou após grandes fóruns de discussões envolvendo sociedades médicas, de pacientes e organizações governamentais e não-governamentais a fim de decidir o que de fato trará ou não benefício ao tratamento do câncer, tendo por base as condições econômicas e epidemiológicas de cada país. No Brasil um excelente exemplo de incorporação de avanços e acesso aos mesmos são os programas nacionais de tratamento da Aids, porém, em oncologia estamos muito distantes de uma solução. O ensino em oncologia no Brasil ainda é bastante falho, especialmente na graduação, com inúmeros cursos em que o contato com o tema câncer se restringe a algumas horas durante os seis anos da graduação em medicina. Na especialização, residência médica, tem havido nos últimos anos uma atenção maior no sentido de criar um programa mínimo de formação oncológica mais abrangente. Até o ano passado apenas as residências médicas em oncologia clínica do Hospital A. C. Camargo e do INCA continham três anos de duração, um período tido como o necessário para o adequado aprendizado em cancerologia. A partir deste ano passou a ser obrigatória no Brasil a duração de três anos para residência médica em oncologia clínica, graças às recomendações de fóruns com diversos especialistas da área promovidos pelo Ministério da Saúde no INCA e no Hospital A. C. Camargo. O tratamento do câncer é, fundamentalmente, multidisciplinar, não bastando empenho e melhor formação do médico oncologista, mas também do cirurgião oncológico, do radioterapeuta, da enfermeira, da fisioterapeuta, da fonoterapeuta, da psicóloga, do psiquiatra, da terapeuta ocupacional, de professores (caso de crianças e adolescentes em idade escolar), do farmacêutico, do dentista e da assistente social. E mais do que multidisciplinaridade, há necessidade de uma perfeita interação entre estes profissionais a fim de que o paciente, objetivo maior, possa usufruir do máximo benefício, não somente em termos de resultados terapêuticos mas também em qualidade de vida.

Para o estabelecimento de medidas efetivas de controle do câncer, faz-se necessárias informações de qualidade sobre sua distribuição de incidência e mortalidade, o que possibilita uma melhor compreensão sobre a doença e seus determinantes, a formulação de hipóteses causais, a avaliação dos avanços tecnológicos aplicados à prevenção e ao tratamento, bem como a efetividade da atenção à saúde. Os dados sobre a mortalidade por câncer, no âmbito nacional, têm sido amplamente utilizados como alternativa viável frente à realidade das informações sobre incidência não serem representativas no País. No entanto, essa estratégia se mostra pouco capaz de permitir a real compreensão da magnitude do problema, uma vez que há diferenças importantes entre os vários tipos de câncer, em função da letalidade e da sobrevida. Para os tumores de maior letalidade, a mortalidade permite uma aproximação do que seria a incidência, o que não acontece com os de melhor prognóstico - como é o caso dos tumores de mama feminina e próstata. Estima-se que em 2020 o número de casos novos anuais mundiais seja da ordem de 15 milhões, sendo que cerca de 60% desses novos casos ocorrerão em países em desenvolvimento. É também conhecido que pelo menos um terço dos casos novos de câncer que ocorrem anualmente no mundo poderiam ser prevenidos. Prevenção ainda é a grande palavra de ordem em oncologia. O câncer é um gigante na saúde mundial e, como tal, precisa ser enfrentado com um empenho coletivo igualmente gigante. José Augusto Rinck Jr. é médico graduado pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), com residência em clínica médica pela mesma instituição, e especialista em oncologia clínica pelo Hospital A. C. Camargo. Atualmente é médico titular do departamento de oncologia clínica do Hospital A. C. Camargo e médico do Hospital de Clínicas da UNICAMP.

Referências Bibliográficas (1) http://www-dep.iarc.fr; (2) Jemal A, Siegel R, Ward E, Hao Y, Xu J, Murray T, Thun MJ. Cancer statistics, 2008.CA Cancer J. Clin., 2008, Mar-Apr, 58(2): 71-96; (3) www.fosp.saude.sp.gov.br; (4) http://www.inca.gov.br; (5) Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância de Câncer. In: Estimativas 2008: Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro, INCA, 2007; (6) Gritz ER. In: ACS Textbook of Clinical Oncology. 2 nd ed., Chicago, 1995; (7) www.cancer.gov.

Sites recomendados www.hcanc.org.br www.cancer.gov www.sboc.org.br

www.sbcancer.org.br www.gbm.org.br www.inca.gov.br

www.asco.org www.cancer.org www.gbecam.org.br

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Panorama Especial deGeral Capa / Entrevista Internacional

Teste seus Conhecimentos Nas questões a seguir, assinale a resposta correta: 1 Atualmente, qual é a mais potente arma no 1. combate ao câncer? a) Anticorpos monoclonais; b) Quimioterapia; c) Radioterapia; d) Cirurgia; e) Prevenção e diagnóstico precoce.

5 Qual é a porcentagem dos casos de câncer de 5. pulmão em homens relacionados ao tabaco? a) 90%; b) 80%; c) 70%; d) 50%; e) 40%.

2. 2 Em se tratando de mortalidade, qual é o tumor com maiores índices no mundo? a) Tumor de mama; b) Tumor de pulmão; c) Tumor de próstata; d) Tumor de cólon; e) Tumor de estômago.

6 Qual exame de rastreamento é indicado para 6. tumor de mama e de colo de útero? a) Mamografia e teste de Papanicolaou; b) Ultrassonografia de mama e trans vaginal; c) Exame clínico e ginecológico somente; d) Ressonância magnética de mama e de pelve; e) Mamografia e ultrassonografia abdominal.

3 No Brasil, qual dos tumores a seguir possui 3. maior incidência? a) Tumor de pele do tipo não melanoma; b) Tumor de mama; c) Tumor de pulmão; d) Tumor de próstata; e) Melanoma.

7 Assinale a associação correta entre agente 7. etiológico e câncer: a) Vírus Epstein-Barr e tumor hepático; b) Vírus hepatite B e C e Sarcoma de Kaposi; c) HPV-16 e 18 e tumor colo uterino; d) HIV e tumor de estômago; e) Helicobacter pylori e tumor de cólon.

4 Qual é o tumor mais freqüente entre as 4. mulheres da região Norte do Brasil, sem considerar os tumores de pele não melanoma? a) Tumor de mama; b) Tumor de fígado; c) Tumor de colo de útero; d) Tumor de cólon/reto; e) Tumor de estômago.

Respostas: 1 - e; 2 - b; 3 - a; 4 - c; 5 - a; 6 - a; 7 - c

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